Movimentos
Sociais
Mônica Pereira de Santana
2015
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Minha Casa, Nossas Vidas
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Movimentos Sociais
Minha Casa, Nossas Vidas:
Construção Coletiva do Plano de Desenvolvimento Territorial Sustentável
do Residencial Bosque das Bromélias/ Salvador-BA
Apoio Financeiro
Fundo Socioambiental CAIXA
Agente Executor
Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Centro Interdisciplinar de Desenvolvimento e Gestão Social (CIAGS)
Coordenação Geral
Tânia Maria Diederichs Fischer
Coordenação Executiva
Rodrigo Maurício Freire Soares
Coordenação Pedagógica /Design Instrucional
Denise Ribeiro
EQUIPE
Design e Diagramação
Márdel Pereira dos Santos
Preparação de Mídias
Gabriela Carvalho
Ilustrações
Rubinho Fonseca
.............................................
DISCIPLINA “MOVIMENTOS SOCIAIS”
Professora conteudista:
Mônica Pereira de Santana
Jornalista, graduada em Comunicação Social pela Faculdade de Comunicação da UFBA
e Especialista em Jornalismo e Direitos Humanos. É membro do Núcleo de Incidência
Política da CIPÓ Comunicação Interativa. Atua também como assessora de comunicação, crítica teatral e educomunicadora. É mestre em Artes Cênicas pelo Programa
de Pós-graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal da Bahia.
http://lattes.cnpq.br/4153826741380831
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Minha Casa, Nossas Vidas
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Movimentos Sociais
Josilene
(Josi)
Naiane
(Nai)
Francisco
(Chico)
Olá, nós somos a família Silva!
Neste curso vamos debater sobre os movimentos sociais no Brasil.
É um tema importante, que está presente em nosso dia a dia.
Movimentos Sociais: muitas mãos mudando a história
Lutas pelo direito à moradia, pelo acesso à terra para plantar, pela igualdade de direitos e oportunidades, pelo casamento igualitário, pelos direitos trabalhistas e tantas outras lutas. Toda vez que um grupo de pessoas trabalha por mudanças e exige do poder vigente1 transformações, estamos falando de
movimentos sociais. Quando setores da sociedade unem forças para exigir transformações no cenário
político; melhorias na qualidade de vida; preservação da cultura, de hábitos, do meio ambiente; garan1 No Brasil, a estrutura política é dividida em três poderes interdependentes e complementares: Poder Executivo
(responsável pela execução das ações, programas e gestão pública), Poder Legislativo (responsável pela criação e
aprovação das leis, bem como acompanhamento das práticas do Executivo) e Poder Judiciário (que cumpre a função
de aplicar as leis e também monitorar os demais poderes.
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Minha Casa, Nossas Vidas
tia de direitos ou alterações legais podemos falar de movimentos sociais. É a intervenção da sociedade
alterando o curso da história.
Quando mobilizado, engajado e consciente de seus desejos de mudança, o povo consegue impactar os
quadros alterando os rumos políticos da nação. Nossa história recente é repleta de exemplos de mudanças provocadas pela intervenção popular direta, trazendo novas demandas e concretizando direitos. A reabertura política e a conquista do voto direto nos anos 80 são fruto de anos de engajamento de
muitos brasileiros, ganhando força com a ocupação das ruas e visibilidade nos meios de comunicação.
Atualmente é frequente relativizarmos o poder e a força do voto, e por vezes reclamamos da sua obrigatoriedade, mas a democracia atual resulta de anos de engajamento da sociedade para reconquista
da capacidade de participação política e fim dos abusos do sistema ditatorial, presente no Brasil entre
os anos 60 e 80.
Política e Participação
A política está presente em nossas vidas em tantos momentos que nem
percebemos. Temos exemplos disso, como quando negociamos o valor
de uma compra no supermercado, ou quando dialogamos com os nossos
pais para ver se dá para viajar com os amigos.
Estes exemplos do dia-a-dia têm algo em comum: duas ou mais partes
com vontades diferentes negociando entre si para estabelecer um acordo final que seja bom para todos ou que pelo menos diminua um conflito. Isto é o que torna a política própria a todas as formas de relação
social. Participar politicamente é muito mais do que votar e ter direito
ao voto, ou integrar algum partido.
Participar politicamente é tomar parte da vida pública. É exercitar o poder de contribuir direta ou indiretamente nas decisões políticas de sua
comunidade. É a concretização da democracia ampla.
Exemplos e histórico dos movimentos sociais NO BRASIL
Até pouco tempo atrás, a violência contra mulheres no ambiente doméstico era vista pela justiça brasileira como um crime menor, menos ofensivo, o que suavizava as penas concedidas aos condenados.
O tema já era pauta do movimento feminista no Brasil há décadas e encontrou um caso emblemático:
A história de Maria da Penha.
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Movimentos Sociais
LEI MARIA DA PENHA
Biofarmacêutica cearense, vítima de duas
tentativas de homicídio por parte de seu
esposo. O absurdo da violência vivida por
Maria comoveu mulheres de todo país e
engajou organizações não-governamentais, levando o caso à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (OEA), o que
garantiu uma pressão internacional. O autor da violência foi julgado e condenado a dez anos de prisão, contudo,
cumpriu apenas dois anos. Por conta do pouco compromisso demonstrado no combate à violência contra as mulheres brasileiras, o Brasil foi
condenado pela OEA que exigiu a criação de uma legislação própria que
coibisse práticas de violência doméstica. Nasce então a Lei 11.340/06,
conhecida como “Lei Maria da Penha”, que faz com que todo caso de
violência intrafamiliar deva ser apurado através de inquérito policial e
remetido ao Ministério Público, além disso, acabaram as penas pecuniárias (pagamento de multas ou cestas básicas).
Figura: Campanhas pelo Fim da Violência Doméstica Contra a Mulher no site http://www.compromissoeatitude.org.br, em 29 de junho de 2015.
Este é um belo exemplo de atuação continuada do movimento social, identificado com questões de
gênero e grupos de mulheres do país, fruto de longo processo de mobilização, discussão e trabalho.
As cotas raciais que já garantem a reserva de vagas nas universidades públicas e concursos públicos são
outro exemplo de conquista, resultante de décadas de engajamento do movimento negro brasileiro.
Até dez anos atrás, quando as cotas não existiam nas universidades brasileiras, os cursos mais concorridos também eram os mais elitizados, com turmas inteiras formadas por alunos brancos e de classe
alta. A compreensão de que as populações negras no Brasil não possuem as mesmas oportunidades,
passando distante dos espaços institucionais de poder e saber reconhecidos, mobilizou e ainda mobiliza o movimento negro que luta para que o Estado brasileiro repare os anos de exploração e opressão
dos afrodescendentes. Assim, hoje as universidades públicas apresentam um colorido diferente. Mesmo em cursos nos quais poucos negros chegavam até pouco tempo atrás já é possível ver uma maior
diversidade étnico-racial presente.
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Minha Casa, Nossas Vidas
Figura 1: LInha do tempo das conquistas da participação Política no Brasil desde o fim da ditadura
Fonte: Minha Casa Nossas Vidas - 2015, adaptado da autora.
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Movimentos Sociais
Enfim, ainda teríamos outros exemplos bem valiosos das mudanças promovidas pelos movimentos
sociais no Brasil e na América Latina: a Lei Ficha Limpa, que impede políticos condenados por órgãos colegiados de disputar cargos eletivos; a Proposta de Emenda Constitucional nº66 – PEC das Domésticas,
que assegura a igualdade de direitos trabalhistas das trabalhadoras domésticas com relação aos demais
empregados formais; o Estatuto da Criança e do Adolescente, que representa um conjunto de direções
para proteção da infância e adolescência no Brasil e foi fruto de ampla mobilização e discussão de pessoas e entidades engajadas na área em todo país; por fim a nossa própria Constituição Federal de 1988,
a chamada Constituição Cidadã, que marcou o novo momento democrático brasileiro e inaugurou uma
nova era de participação política, depois de duas décadas de ditadura.
Os movimentos sociais são as mãos de mulheres, homens, campesinos, operários, intelectuais, negros,
índios, as mais diversas minorias alterando o curso da história.
Movimento Negro e Cotas Raciais
A luta do movimento social negro ainda é grande. Embora, tenha também avançado na aprovação do Estatuto da Igualdade Racial, em 2010,
ainda há muito trabalho para enfrentar a fim de aplacar as significativas
diferenças sociais que vitimizam as populações afrodescendentes no
Brasil, tais como, por exemplo, o alto números de jovens negros mortos
em situações de violência. Porém, a política de cotas como estratégia
de reparação já efetiva a mudança de perspectiva e acesso ao ensino
superior a milhares de jovens, transformando significativamente o espaço das universidades públicas no Brasil e a cara das instituições nos
próximos anos.
E, ao contrário da crítica mais recorrente feita à política de cotas como
uma atravancadora da qualidade do ensino e mérito dos estudantes, o
que se viu foi que alunos cotistas têm o mesmo nível de performance
dos egressos de escolas privadas, além de demonstrarem extremo comprometimento com a vida acadêmica e alterarem significativamente
os números de evasão escolar – porque muitas universidades também
deram avanços na construção de políticas internas de permanência dos
alunos ingressantes pelo sistema de cotas.
Desde a Constituição de 1988, o Brasil passou a ser uma democracia representativa e participativa. Isso
significa que os cidadãos brasileiros encontram mecanismos e espaços diversos para participar direta
ou indiretamente (por meio dos representantes eleitos pelo voto) dos indivíduos em muitos assuntos
da sociedade.
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Minha Casa, Nossas Vidas
A democracia participativa se evidencia na interação entre a sociedade civil e o poder público, na medida em que os cidadãos exercem o acompanhamento sobre a atuação do governo (executivo, legislativo
e judiciário). Por meio das ferramentas de controle social, a população pode articular mecanismos de
pressão e intervenção diante daquilo que discordar.
A sociedade de hoje é complexa e a existência de espaços democráticos torna-se fundamental para
promover a participação política de diversos grupos sociais. São vários os espaços democráticos e estabelecidos pela constituição a serem ocupados pelos que desejam mudanças: conselhos de direitos,
audiências públicas, conferências, fóruns.
Movimentos Sociais: características e possibilidades
Uma sociedade democrática e fortalecida, conta com cidadãos articulados e com participação ativa na
vida pública, trabalhando ativamente na construção da igualdade e no fortalecimento do bem comum.
Claro que existem contradições, desafios e injustiças em todas as sociedades conhecidas, mas o movimento social, nas suas diferentes formas de ser, contribui para criação de uma nova ordem social, onde
a cidadania seja respeitada e a qualidade de vida possa ser a realidade da maioria.
A ação dos movimentos sociais na América Latina tem uma trajetória comum: nascem de processos de insatisfação em relação as condições de vida de grupos ou de toda a sociedade. Longos anos
de políticas de Estado paternalistas e muito clientelismo, deram margem à naturalização da corrupção no continente. Os povos latino-americanos vivenciaram momentos políticos em que o Estado se mostrou pouco comprometido em garantir direitos aos cidadãos, fato agravado pelas longas
ditaduras que limitaram em muito a capacidade de participação social e organização popular.
Se por um lado esse cenário histórico tornou difícil e desacreditada a participação política, por outro,
não impediu que os povos lutassem para alterar sua realidade e efetivar direitos, promovendo maior
inclusão social. No Brasil e em outras partes do mundo, o cenário exige dos movimentos populares resistência e articulação para vencer a burocracia, as hierarquias e a falta de vontade política.
Mais tradicionais são os movimentos de categorias profissionais como sindicatos, grupos de direitos
de trabalhadores, agremiações estudantis, todos de papel histórico relevante na história brasileira.
Igualmente enraizado nas nossas lutas políticas estão os grupos religiosos de base que tiveram importância significativa nas lutas pela reforma agrária, reabertura política do Brasil e universalização da
educação. Por exemplo, a Teologia da Libertação, a Pastoral da Terra, os Movimentos Eclesiais de Base,
a Pastoral da Criança e do Adolescente. Temos ainda as lutas de alguns grupos pela garantia das terras
quilombolas, denúncia dos preconceitos e racismo contra as comunidades negras, bem como defesa
da diversidade religiosa.
Também temos os movimentos sociais que denunciam problemas tais como a falta de acesso a direitos
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Movimentos Sociais
básicos, a maior inclusão social, a preservação ambiental, a melhor distribuição de renda e a reforma
agrária. São exemplo disso o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra [http://www.mst.org.br/], o
Movimento dos Sem Teto [https://www.facebook.com/movimentosemtetodabahia], dentre outros.
Por fim, também temos os movimentos que se opõem aos modelos políticos dos governos vigentes,
buscando reformas e revoluções – como tivemos durante os 21 anos de ditadura militar, além de tantas
lutas e insurreições ao longo da nossa história.
Num estado democrático como o nosso, os movimentos sociais têm autonomia para criar suas estratégias organizativas - associações, centrais sindicais, grêmios, redes de articulação social etc. Não há
forma única de atuar, tendo em vista que cada bandeira de luta e direitos encontra suas estratégias
próprias de “fechar” parcerias e fazer sua militância.
Paternalismo e Clientelismo
Paternalismo consiste numa prática política em que o governante se
entende como um chefe de família e os cidadãos são seus filhos. Por
meio dessa lógica, ainda vigente em muitos países da América Latina,
o princípio de autonomia e liberdade é afetado, para que os cidadãos
tenham pouca capacidade de independência com relação às políticas de
Estado, com restrita iniciativa individual. Muito próximo do paternalismo, o clientelismo consiste na prática política da troca de favores, onde
os eleitores são entendidos como “clientes”. Ou seja, o governo entende
que deve executar suas ações para os seus próximos, para aqueles que
investiram de alguma forma em sua eleição. Seja em recursos, seja em
troca de votos, empregos, ou toda sorte de benefícios públicos.
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Minha Casa, Nossas Vidas
Em nossa história recente é valioso também relembrar as inúmeras revoltas, levantes, marchas e
muitas estratégias de luta em prol da transformação social:
• Revolta dos Malês: encampada por negros muçulmanos da Bahia da segunda metade do século
XIX, denunciando as misérias do sistema e buscando o direito de professar sua religião;
• Revolta da Chibata: no início do século XX, os marinheiros denunciaram os abusos físicos e torturas
realizados pela Marinha Brasileira, clamando fim das longas sessões de chibatadas nos marujos,
mais tarde garantindo o fim da prática;
• Resistência ao Golpe Militar de 1964: diversos grupos esquerdistas, intelectuais, movimentos campesinos e grupos religiosos ofereceram resistência à ditadura militar que se instalou no Brasil e
suprimiu os direitos civis. No meio urbano e rural, esses militantes revelaram os abusos do sistema
e desenvolveram ações em nome da restauração da democracia brasileira.
AÇÃO POLÍTICA
A ação política é uma interferência na realidade, visando influenciar o
poder público para garantir a criação e efetivação de direitos. É a prática desenvolvida pelos movimentos sociais para pressionar o Estado e
influenciá-lo mais diretamente para que atenda às suas reivindicações.
A ação política não tem uma única estratégia, podendo ganhar diferentes nomes e ferramentas: mobilização social, advocacy, incidência política e participação cidadã. Práticas distintas que definem os caminhos da
atuação dos cidadãos na sociedade em que vivem.
A ação política pode ser a transformação progressiva da sociedade e do
Estado, mas também pode significar a manutenção de certas estruturas. Por exemplo: uma comunidade que se mobiliza para que a indústria
poluidora do rio local seja responsabilizada pelos danos provocados e
modifique suas práticas, faz uma ação política.
É importante sabermos que existem não só ações políticas comprometidas com a sociedade, com seu desenvolvimento ou efetivação dos direitos humanos. Há pessoas que realizam ações em nome de interesses
privados visando somente ao lucro e à manutenção das desigualdades e
da estrutura de poder vigente.
Em 2013, o Brasil estremeceu com uma série de manifestações exigindo o passe livre nos transportes
públicos, mas no decorrer dos dias, uma série de pautas difusas assumiram os cartazes e palavras de
Movimentos Sociais
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ordem. A indignação com os casos de corrupção, violência, na demanda da reforma política, as críticas
à forma de construção da Copa do Mundo de 2014 dentre outros temas apareceram nas ruas. Estas
manifestações se estenderam, fazendo gente de todo país ocupar as ruas, muitas vezes a partir de
mobilizações geradas pelas redes sociais, especialmente o Facebook. O Brasil foi palco de algo que não
se via há muitos anos. As pautas e bandeiras de luta eram muitas e por vezes contraditórias, não havia
liderança, nem clareza do poder público que não sabia com quem negociar e o que negociar – o que
dificultou que diversas demandas pudessem ser encaminhadas, discutidas e atendidas.
Esse exemplo de nossa história ajuda a compreender o que segnifica movimento social e sua diferença para mobilização social: é preciso ter pauta, criação de estratégias e busca de pares para diálogo.
Figura 2: Movimento Social – Fluxo
•
•
•
O que não temos? - um grupo social identifica um problema estrutural como, por exemplo:
as mulheres brasileiras ganham salários menores ao desempenhar as mesmas funções que os
homens.
O que queremos ter? - mecanismos que garantam a igualdade dos salários para ambos os
gêneros.
O que estamos pedindo? - uma política pública que tenha por objetivo sanar o problema
estrutura inicialmente identificado – a diferença salarial entre homens e mulheres.
Fonte: Minha Casa Nossas Vidas - 2015, adaptado da autora.
Os movimentos sociais perduram enquanto há demandas e reivindicações a serem atendidas. Há grupos que se desfazem depois de terem conquistado a pauta trabalhada. Um exemplo disso é quando
um grupo social pede aos deputados que criem um projeto de lei de preservação ambiental e essa lei
é criada e aprovada. Contudo, é necessário que esse grupo permaneça ativo diante das propostas de
governos e organizações que ameaçam à conservação do meio ambiente.
Em todo mundo, os aspectos de afirmação das culturas e reconhecimento de diferenças ganham mais
força, no desejo de reconhecermos nossas diferenças e construirmos um mundo onde todos sejam respeitados independente de sexo, raça, idade ou crença (Temática pode ser mais bem explorada a partir
da leitura do material do curso “Cultura: Qual é a sua?” disponibilizado em nosso site: www.colabore.vc).
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Minha Casa, Nossas Vidas
É importante considerar que os movimentos sociais acabam sendo mais plurais, por conta das características de suas reivindicações. Nos últimos anos, não só no Brasil, mas em todo mundo, ganharam
importância os grupos ligados às questões de identidade e sua própria condição de estar no mundo:
são os movimentos das minorias (mulheres, negros, homossexuais, pessoas com deficiência). Nesses
coletivos, os participantes lutam pela garantia dos seus direitos, vivenciando desafios e limitações colocados pelos grupos hegemônicos.
As minorias sociais não significam grupos com menor número de pessoas, mas um coletivo com menor poder de decisão, bem como marginalizado no acesso aos direitos humanos. São todos aqueles
estigmatizados ao longo da história, tratados com discriminação e desigualdade. São indígenas, negros,
mulheres, gays, moradores de favelas, sertanejos. As minorias são geralmente oprimidas e exploradas
pelos grupos dominantes, estes detentores do poder e definidores dos padrões de comportamento. Todos os modelos de sociedade contemporânea contêm grupos minoritários, ou seja, grupos diferentes,
que lutam pela preservação de sua dignidade, igualdade de direitos e sua independência.
POLÍTICA SE FAZ NO NOSSO DIA A DIA, DESDE REUNIÕES EM QUE SE DISCUTAM TEMAS QUE TÊM
INFLUÊNCIA NA VIDA DE TODOS OU MESMO UMA SIMPLES CONVERSA EM QUE ESTAMOS EXPONDO
NOSSO PONTO DE VISTA. O SER HUMANO É ESSENCIALMENTE UM SER POLÍTICO.
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Atuação em Rede
A formação de redes se dá quando pessoas, grupos, organizações que estão dispersos, interligam-se
por possuirem vontades comuns, reconhecendo-se que a soma das colaborações agrega força e capacidade no enfrentamento de desafios e problemas. É dessa forma de atuação horizontalizada, sem
chefias e hierarquias formais, que surgem as redes de atuação social.
Movimentos Sociais
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As redes, como uma nova expressão atualizada dos movimentos sociais, nascem como uma nova estratégia para se impor diante das injustiças sociais. A diferença e a novidade dessa estrutura é buscar uma
nova estratégia mais focada nas articulações, na criação de vínculos e potencialidade da comunicação
exercida entre indivíduos, saindo do lugar mais comum de oposição: dois pontos divergentes entre si.
Na rede não existem dois lados apenas, mas múltiplos pontos, vozes, centros que juntos se unem para
enfrentar um problema em comum que só pode ser combatido através da ação compartilhada. A atuação em redes sociais existe porque apenas desse modo é possível o alcance do seu objetivo final que
normalmente relaciona-se à justiça social ou ambiental. Estar em redes faz sentido porque de forma
isolada, nenhum dos pontos da articulação conseguiria chegar ao objetivo almejado.
De forma interdependente com a cooperação e gestão coletiva, as redes buscam ser uma maneira descentralizada de discutir demandas sociais, articulando parcerias de organizações não-governamentais,
empresas, poder público e organismos internacionais.
Os laços que formam as redes são as relações firmadas e alimentadas pelos seus participantes, e através
da comunicação esses pontos se ligam, compartilham, planejam ações e estratégias comuns para vencer coletivamente seus desafios. Por ser um caminho mais recente de atuação dos movimentos sociais,
as redes formam relações mais horizontalizadas, quebrando com formas antigas de atuação, onde havia um centro de onde partiam as decisões. Nessa nova forma de atuação, os interesses, o cultivo da
confiança, o entendimento de que existem várias lideranças, de que todos podem ser articuladores e
atores da mudança social, norteiam as práticas. O próprio sentido de território varia bastante, tendo
em vista que essas redes podem ser amplas e espalhadas por diferentes comunidades e localidedes.
A articulação dos movimentos sociais em rede facilita a conexão dos pensamentos políticos, sociais
e econômicos convergentes, dando força à ação e ampliando o repertório político das pessoas, que
terão contato com diversas formas de pensar e compreender o mundo. Nos anos 1990 e 2000, no
Brasil, várias articulações em rede tomaram corpo para enfrentar desafios políticos e socioambientais,
dentre elas podem ser citadas: a Rede Social de Justiça e Direitos Humanos que congrega movimentos
e organizações não-governamentais de todo Brasil; a Rede ANDI Brasil, formada por organizações nãogovernamentais em defesa dos direitos de crianças e adolescentes por meio da comunicação; redes de
participação de jovens como a Rede Sou de Atitude [https://www.facebook.com/rede.soudeatitude]
ou a Rede de Jovens pelo Meio Ambiente e Sustentabilidade [http://www.rejuma.org.br/]; a Rede de
Ongs da Mata Atlântica [http://rma.org.br/], em defesa do bioma, entre centenas de outras articulações que juntas agem e negociam em prol das suas bandeiras comuns.
Estar em rede não significa que todos pensem igual ou que pertencem ao mesmo movimento. A rede
é fluida, possui ondas que levam e trazem pessoas por vezes diferentes. Nela há espaço para divergir
por se entender que os participantes podem ter opiniões diferentes sobre um mesmo assunto ou encaminhamento, contudo, prima-se pela busca do consenso e do novo. A depender da natureza da pauta
da rede, a exemplo do que vimos para os movimentos sociais, sua ação pode ter duração definida, ou
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Minha Casa, Nossas Vidas
seja a articulação tem um tempo próprio, definido conjuntamente e contemplando as metas a alcançar.
Diante dos grandes desafios colocados para os movimentos sociais no Brasil, os problemas são mais
contínuos (crimes ambientais, poucas perspectivas para juventudes, necessidade de garantia de direitos da infância e adolescência, entre tantas outras pautas).
A busca de formas horizontais e descentralizadas de agir e se administrar é um dos grandes desafios da
atuação em rede. Os pontos precisam estabelecer coesão (estar ligados, conectados e dispostos a agir
juntos), mas também ter uma ética próxima e compartilhar o entendimento do problema que enfrentam coletivamente. A forma descentralizada de uma rede implica em um tempo diferente para decidir
e atuar, o qual pode não ser mais lento do que o de uma organização mais tradicional. Nas redes as decisões partem de vários pontos, o que exige tempo, diálogo, argumentação,negociação. Enfim, política.
Mas para que tudo aconteça é preciso comunicação. É ela quem vai conectar as pessoas, mediar relações e dar visibilidade aos temas mais relevantes. Atualmente, o ambiente virtual permite o estreitamento dos laços e a atuação em rede com alto nível de interação e trocas mais efetivas que em situações de proximidade física. As comunidades virtuais, os fóruns de discussão, ferramentas de áudio e
vídeo como o skype, os grupos de discussão do facebook, ações em comum de discussao e postagem
sobre um mesmo tema via Twitter ou blogagem coletiva em sites pessoais são alguns exemplos de
como a comunicação pode ser usada para se agir em rede.
Quanto mais estreita for a comunicação em rede, cheia de trocas e interatividade, movida por entusiasmo e esperança, mais ativa será a rede e o movimento social vinculado a ela. Assim, as ações políticas
que fluem na direção de intervenção no problema são fortalecidas, tornando-se capazes de atuar mais
adequadamente. É a coragem, a crença e a esperança que dão liga e movem os cidadãos para uma
atuação ativa e trabalho cotidiano para se alcançar a mudança. Por exemplo, quando no início dos anos
2000, ativistas sociais de todo o planeta resolveram vir para o Brasil e construir um espaço para discutir
e pensar um outro mundo possível, no Fórum Social Mundial (FSM) [http://www.forumsocialmundial.
org.br/], o que movia todos aqueles cidadãos era a esperança.
Fórum Social Mundial
As três primeiras edições do FSM aconteceram em Porto Alegre (RS), nos
anos de 2001, 2002 e 2003. Com o objetivo de ampliar o alcance e fortalecer a internacionalização, em 2004 foi realizado em Mumbai (Índia)
e em 2006, aconteceu de forma descentralizada em diversos lugares do
mundo. A quinta edição foi na cidade de Nairobi, no Quênia, alcançando
o continente africano. Em 2008, o formato descentralizado novamente
foi adotado, gerando articulações em rede e eventos paralelos. Belém
recebeu a IX edição do fórum, fortalecendo as discussões sobre meio
ambiente e sustentabilidade. Em 2010 e 2011 o evento ocorreu em Porto Alegre e em Dacar (Senegal), respectivamente, este último dando
mais visibilidade às estratégias de luta e resistência dos povos do continente africano. Movimentos Sociais
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Embora sejam tantas e múltiplas as questões dos movimentos, as redes possibilitam que as estratégias possam ser mais abrangentes, nacionais, continentais ou mesmo globais (como no exemplo do
FSM, convergindo todas as lutas que se opõem ao capitalismo e suas mazelas). Os movimentos sociais representam uma alternativa à crise das organizações políticas, tão desacreditadas não apenas
no Brasil, quanto no mundo afora – precisando adotar novas formas de ação, adotando outras formas
de engajamento e rompendo com antigas hierarquias. A ação em rede possibilita pensar localmente
os problemas existentes, mas agir globalmente, tendo na Internet e nas novas tecnologias a forma de
aproximar e construir vínculos. E com essas ferramentas cada vez mais populares, o que se vê hoje é
uma comunicação horizontal, onde indivíduos cooperam e colaboram entre si, criando novas formas
de ativismo. As redes são muito mais pessoas, integradas pelos laços de trocas, empreendendo ações,
defendendo idéias, unindo forças, rompendo bloqueios. Tentando alterar as ordens no agora, reinventando o presente e o jeito de fazer política.
Após termos visto exemplos de movimentos sociais, como você compreende os impactos deles no seu
dia a dia? Você está engajado em alguma causa ou entende como é importante empreender esforços
para alguma? É importante nos colocarmos como protagonistas das transformações sociais, considerando ainda o poder que este protagonismo assume quando é exercido em grupo, com a participação
de outras pessoas. A concretização dos nossos desejos como sociedade, passa por essa mudança de
comportamento e pela compreensão da força que temos enquanto grupos sociais.
DISCUTA COM OS SEUS COLEGAS SOBRE A TIRINHA ABAIXO.
O QUE SIGNIFICA SER UMA “MINORIA SOCIAL”?
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Referências Bibliográficas
http://www.anpocs.org/portal/index.php?option=com_docman&task=doc_view&gid=7827&Itemid=76
CIPÓ Comunicação Interativa. Guia de Atitude: reflexões e práticas para o monitoramento e a ação
política. Salvador: CIPÓ Comunicação Interativa, 2009.
MORAES, Dênis de. (org). Por uma outra comunicação: Mídia, mundialização cultural e poder. Rio de
Janeiro: Record, 2010.
GOHN, Maria da Glória. Teoria dos Movimentos Sociais: paradigmas clássicos e contemporâneos. 10ª
edição. São Paulo: Edições Loyola, 2012.
TORO, José Bernardo. A construção do público: cidadania, democracia e participação. Cristina Duarte
Werneck e Nísia Duarte (orgs). Rio de Janeiro: Editora Senac Rio, 2005.
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Apostila: Movimentos Sociais - Co