PAINEL
PROJETO GONÇALVES DIAS EM CENA: GÊNERO, MEMÓRIA E HISTÓRIA NA
CENA CONTEMPORÂNEA
José Carlos Lima Costa, Graduando do Curso de Licenciatura em Teatro
Universidade Federal do Maranhão
RESUMO
O “Projeto Gonçalves Dias em Cena: gênero, memória e história na cena contemporânea”, aprovado pelo
Departamento de Extensão da Universidade Federal do Maranhão, em parceria com o “Grupo de Pesquisa
Teatral Cena Aberta” e sob a orientação e coordenação do professor Ms. Luiz Roberto de Souza do
Departamento de Arte. Desenvolve uma intervenção artístico/pedagógica em escolas públicas da cidade de São
Luís, no intuito de democratizar o teatro e a cultura maranhense a alunos do ensino médio, através do estudo dos
elementos da encenação teatral, história maranhense e montagem de texto com base na criação coletiva, tendo
como pretexto para a criação do texto final quatro dramas de Gonçalves Dias: Leonor de Mendonça, Beatriz
Cenci, Boabdil, Patkull. As personagens femininas, dos textos citados, e as relações de gênero presente nas obras
são o eixo fundamental do estudo e do processo de criação do texto final. O processo é baseado em uma práxis,
fundamentada pela apropriação de teorias do teatro contemporâneo. Portanto, se construirá conceitos sobre
criação coletiva, fragmento na dramaturgia contemporânea e propostas do teatro pós-dramático como: espaços
não convencionais, criação focada no processo, experimentação de figurinos e outros elementos da linguagem
teatral e a hibridização da cena, ou seja, composição da cena através da união de várias linguagens, sobretudo,
novas tecnologias.
Palavras-Chaves: Teatro; Escola Pública; Relações de Gênero.
1. INTRODUÇÃO
O Presente trabalho tem como objetivo analisar o projeto “Gonçalves Dias em
Cena: gênero, memória e história na cena contemporânea”, que traz como discussão a
necessidade de resgatar a memória maranhense por meio do estudo das relações de gênero
presentes na obra dramática de Gonçalves Dias. Pois é perceptível na obra dramatúrgica
gonçalviana o posicionamento de um intelectual maranhense diante das relações sociais
estabelecidas pela sociedade do século XIX, através de seus textos ele analisa e denuncia a
situação da vida social de sua época. Ao resgatar a obra dramatúrgica, citada, pretende-se
instigar um diálogo entre passado e o presente, no intuito de despertar um interesse na
sociedade contemporânea, principalmente nos jovens de escolas públicas que participarão do
projeto, pelas discussões e ideais que os intelectuais do passado nos legaram, pois os mesmos
problemas do passado ainda se refletem na sociedade atual sob máscaras diversas.
Portanto o intuito do projeto em foco é explorar conceitos e propostas do teatro
contemporâneo dentro de uma perspectiva pedagógica, como: hibridismo de linguagem,
dramaturgia fragmentária, autonomização da cena, espaços não convencionais e etc.
Destacando, também, o tema transversal Sexualidade e Gênero por meio das obras de
Gonçalves Dias (já citadas) que evidenciam a estrutura patriarcal da sociedade do século XIX,
deste modo, o projeto busca fazer um paralelo com a sociedade atual, por meio das
experiências dos alunos da oficina de teatro.
Assim o presente trabalho será estruturado da seguinte forma: haverá uma
pequena introdução acerca das bases teóricas do projeto, onde serão destacados os principais
conceitos do teatro contemporâneo e sua aplicabilidade no processo metodológico da oficina
de teatro, as discussões sobre gênero no século XIX e seu reflexo na sociedade
contemporânea e por ultimo será abordado o processo metodológico empreendido na proposta
educacional ou pedagógica.
2. FUNDAMENTOS DA PROPOSTA
2.1. Sobre a prática teatral
O projeto “Gonçalves Dias em Cena: gênero, memória e história na cena
contemporânea”, proposto por José Carlos Lima Costa, aprovado pela Pró-Reitoria de
Extensão e Coordenado pelo professor Ms. Luiz Roberto de Sousa (Luiz Pazzini) baseia-se no
processo de criação colaborativa, cujos conceitos serão explorados durante a execução prática
do projeto, através de criações individuais e coletivas por meio de pesquisas e estudos dos
textos de Gonçalves Dias (Leonor de Mendonça, Beatriz Cenci, Boabdil, Patkull).
A criação colaborativa estrutura-se sob trabalhos de pesquisa desenvolvidos pelos
atores acerca de determinada temática. Os atores propõem várias experimentações de onde se
retirará materiais que posteriormente, serão organizados num texto/roteiro final pelo
dramaturg-encenador. Sílvia Fernandes descreve o processo de criação colaborativa no
espetáculo BR3 do Teatro da Vertigem, a autora narra:
No caso de Brasília e Brasiléia, procedimento de pesquisa foi uma viagem de quarenta dias e mais
de 4 mil quilômetros, feita em julho de 2004, em que dezoito integrantes do Teatro da Vertigem
atravessaram o país, unindo as três regiões investigadas. A experiência foi relatada em diários de
viagem minuciosamente documentada em fotos e vídeos.
No retorno a São Paulo, Bernardo de Carvalho propôs um roteiro, trabalhado pelos atores em
workshops e improvisações, em que lugares e personagens se entrelaçavam na saga de uma
família. (FERNANDES, et al, 2006, p 47).
O espetáculo BR 3 do Teatro da Vertigem, contou com uma pesquisa de campo
realizada e registrada pelos atores, os resultados foram coletados e organizados pelo
dramaturg-encenador para a construção do espetáculo BR 3. Esta proposta de pesquisa e
processo criativo será abordado dentro de uma perspectiva pedagógica e artística, mediada
pelo proponente do projeto.
A proposta estrutura-se sob uma metodologia de escritura cênica denominada
work in progress ou process. Como o próprio nome já refere, trata-se de um procedimento “
que organiza... diversas operações cênicas, processuais que incluem a recepção..., a gênese
criativa ... a formatação do texto espetacular , a apresentação e a poética da recepção”
(COHEN, 2006, p XXVIII). O foco do trabalho não é a obra acabada, entregue ao público,
mas todo trajeto que se fez até chegar ao produto final. Deste modo, serão organizados vários
experimentos que serão apresentados ao público com o intuito de pesquisar a recepção da
obra, as possibilidades de estruturação cênica e as possibilidades de organização espaçial da
mesma, para a coleta materiais e pesquisas, que somadas, deverão compor o espetáculo final.
Assim, busca-se construir uma base educativa estética por meio do estudo do
percusso/procedimento de criação da obra acabada e não apenas do produto entregue ao
espectador, portanto, a metodologia de intervenção pedagógica foca-se na gênese do processo
criador, estruturando um processo educacional com base na criatividade e individualidade dos
alunos envolvidos na proposta.
A modernidade com suas inovações tecnológicas trouxeram a fotografia e o vídeo,
estas novidades provocaram grande impacto na arte e motivou uma necessidade de rever
algumas estruturas, como, por exemplo, a abstração é uma recusa aos modelos de figuração
acadêmicos que entrava em crise, pois a fotografia registra o momento no instante do
acontecimento. O cimena, também, provoca uma auto-reflexão na estrutura do drama, visto
que o vídeo pode apresentar um tempo ou a sugestão de um tempo diferenciado da estrutura
da fábula, e deste modo, cria um público onde o drama clássico não surte mais efeito nenhum.
E neste contexto Heiner Müller aparece como expoente de questões referentes a teorizações
sobre o teatro e a dramaturgia contemporânea, sua dramaturgia rompe com a estrutura da
fábula, pois tem como eixo construtor a intertextualidade e a fragmentação. Pois Röhl (1997,
p. 92) enfatiza que Müller “... valoriza mais os textos interrompidos, inacabados, ou que
contenham material cru, permitindo a elaboração de camadas não esgotadas em sua
potencialidade: em vários momentos menciona a importância dos fragmentos”, e que estas
são, também, características da obra brechtiana.
Cumpre reafirmar que o teatro contemporâneo estabelece conexões entres várias
linguagens, o ator/criador se faz presente a través de um procedimento denominado
presentificação. A ideia de gesamtkunstwerk (obra de arte total) é subvertida, ou seja, não nos
se estrutura nos termos conceituais de Richard Wagner, onde há uma fusão de elementos de
outras linguagens artísticas e os elementos da encenação teatral são independentes e
funcionam em prol, não de um ilusionismo como Wagner propunha, mas de uma teatralidade
contemporânea sem hierarquização de elementos. Sílvia Fernandes (2009, p. 13) afirma no
seguinte trecho:
Como se vê, Lehmann compartilha com Puchner o reconhecimento dos processos literários e
cênicos multifacetados que forçam o limites do que se considera especialmente teatral, para
avançar as fronteiras de criação da teatralidade até constituir, no final do século XX, a pluralidade
fragmentária da cena contemporânea. Especialmente essas espécies de teatro total, que ao
contrário da gesamtkunstwerk wagneriana, rejeitam a totalização e cujo traço mais evidente talvez
sejam a frequência com que se situam em territórios híbridos de artes plásticas, música, dança,
cinema, vídeo e novas mídias, e a opção por processos criativos descentrados, avessos à
ascendência do drama para a constituição de sua teatralidade e seu sentido.
Logo, os textos elaborados para a montagem serão criados pelos
atores/pesquisadores e mediado pelo proponente do projeto, inspirados na construção dos
textos do pós-dramático que têm como características a criação através de ações que visam
suscitar materiais criativos para a montagem, bem como, a hibridização e autonomização da
cena. Todos os conceitos propostos são explorados na teoria e na prática por meio de jogos
teatrais adequados a realidade dos alunos.
2.2. Sobre as relações de gênero
A sociedade brasileira do século XIX tem como base economica uma estrutura
latifundiária cuja principal atividade é a agroexportação, o modelo familiar ainda permanecia
patriarcalista tanto no Brasil quanto na Europa. Nesta estrutura familiar a figura do pai tinha
uma posição de destaque no meio familiar enquanto os outros membros da familia se
submetiam as suas vontades. Mesmo na educação estas diferenças estavam presentes, poucas
eram as escolas que aceitavam meninas em seu quadro de discentes. A educação feminina
tinha o objetivo mais de preparar donas de casa do que profissionais áptos a trabalharem em
um emprego fora de casa. Portanto a função da mulher na família é somente cuidar da casa,
dos filhos e ser responsável pelos criados, conforme é evidenciado na passagem:
A dona-de-casa burguesa depende da soma que lhe é passada pelo marido (...). Ela tem a
responsabilidade de zelar pela família e de manter a casa em ordem: arrumação e limpeza da casa
ou apartamento, lavagem e repassagem das roupas, elaboração dos cardápios das refeições,
cuidados e educação das crianças, organização das soirées familiares, recepções para a sociedade.
(PERROT, 2008, pág. 116)
Entretanto, há algumas exceções principalmente no proletariado onde a reda
familiar é baixa e a mulher tem que trabalhar juntamente com o marido para complementar a
renda da família, contudo as condições de trabalho feminino são desumanas, pois além de
enfrentar uma jornada de trabalho exaustiva tem ainda de se responsabilizar pelos afazeres
domésticos.
No prólogo do texto Leonor de Mendonça, com palavras breves, Gonçalves Dias
destaca a condição da mulher de seu tempo, em seu pronunciamento fica claro que já algumas
ideias e discussões são levantadas, mas que não saem do campo do discusso. Pois os casiais
anida são obrigados a casarem-se (casamento arranjado) e a ainda mulher deve sujeição ao
domínio masculino como evidencia o trecho abaixo:
Há aí também outro pensamento sobre que tanto se tem falado e nada feito, e vem a ser a eterna
sujeição das mulheres, o eterno domínio dos homens. Se não obrigassem d. Jaime a casar contra a
sua vontade, não haveria o casamento, nem a luta, nem o crime. Aqui está a fatalidade, que é filha
dos nossos hábitos. Se a mulher não fosse escrava, como é de fato, D. Jaime não mataria sua
mulher. Houve nessa morte a fatalidade, filha da civilização que foi e que ainda é hoje. (DIAS,
1974, p. 4)
De acordo com Simone de Beauvoir (2001, p. 169) a legislação romana entregava
a mulher nas mãos do marido e do mesmo modo no século XIX, por meio da lei de 1942,
francesa, exigia obediência da mulher ao marido, visto que ele era o chefe da família, pois era
detentor da renda familiar (como já citado). Ela rompe com seu passado, entrega a vida ao
esposo e insere-se no universo dele ao qual deve devotar uma fidelidade austera.
Embora a mulher na atualidade tenha conquistado um espaço que não foi
franqueado antes, apesar dos esforços das nações unidas em criarem programas e ações para
combater a violência contra a mulher e promover a igualdade de gênero, no entanto condições
de opressão e desigualdade ainda estão muito presentes na sociedade atual. Por mais que haja
um esforço em combater a violência contra a mulher por meio da lei Maria da Penha (Lei 11.
340/06) e de outras iniciativas do Governo Federal, no Brasil “... cinco mulheres são
agredidas a cada dois minutos. Isso significa que pelo menos 7,2 milhões de brasileiras com
mais de 15 anos de idade já sofreram algum tipo de violência doméstica. Para cada cem
mulheres assassinadas, 70 o são no âmbito de suas relações” (FEGHALI et al, 2011).
A condição que promove emancipação feminina é a inserção no mercado de
trabalho, pois, deste modo, a mulher não depende de seu marido ou da família para seu
sustento. Contudo, esta é uma realidade atual, ou seja, a partir do final do século XIX elas
foram introduzidas em vários tipos de atividades produtivas. Entretanto os indicadores sociais
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em pesquisa feita em 2010,
comprovam que ainda há disparidades entre gêneros em relação às condições e divisão e
trabalho. Assim, o número de trabalhadoras que estão em atividades informais com idade
entre 16 e 24 anos é de 69,2% e com idade acima de 60 anos de 82,2%, em relação aos
homens.
A renda é outro fator de desigualdade entre os sexos. Com o mesmo nível de
escolaridade as mulheres, em 2009, recebiam cerca de 74,6% do salário dos homens. No
mercado informal elas recebem 63,2% do rendimento masculino. As mulheres dedicam-se
tanto a trabalho produtivo e em maior tempo aos afazeres domésticos e por não ter um valor
na sociedde atual torna-se uma espécie de “trabalho invisível”, portanto a mulher gasta no
serviço doméstico “(...) mais do que o dobro da média de horas despendidas pelos homens.
Em 2009, enquanto as mulheres ocupadas gastaram, em média, 22,0 horas semanais em
afazeres domésticos, a média entre os homens foi de 9,5 horas” (IBGE, 2010, p. 257).
Portanto percebe-se que muitos são os discursos sobre igualdade de gênero, mas
na prática há pouco progresso. A sociedade brasileira tem em suas raízes a estrutura patriarcal
que ainda se perpetua até a atualidade, este pensamento permeia todos os ambientes sociais:
família, trabalho, religião, educação, saúde e etc., e se repetem de maneira mascarada, cujo
objetivo é assegurar a submissão da mulher a valores antiquados oferecendo uma qualidade de
vida, muitas vezes, precária, visto que permite a violação de seus direitos sem que isto seja
visto fora de um padrão de normalidade. Segundo dados do IBGE (2010) A Central de
Atendimento a Mulher registrou cerca de 401730 atendimentos, onde 52,3% pediam
iformações sobre temas referentes à violência contra a mulhe, mas entre os relatos de agressão
cerca 53,9 era Violência Física (lesão corporal leve, grave e gravíssima); 33,2% casos de
Violência Psicológica (ameaças, danos emocionais, perseguições, assédio moral no trabalho);
8,8% de Volência Moral (difamação, calúnia e injúria); 2,0 % Violência Patrimonial; e 1, 4 %
Violência Sexual (estupro, exploração sexual e assédio no trabalho (IBGE, 2010, p. 280). Os
dados apenas reafirmam que a maior parte das agressões acontece dentro das residências, no
âmbito de suas relações, e apenas um percentual mínimo de agressões que são sofridas
3. PROPOSTA METODOLÓGICA
O objetivo fundamental da proposta é montar um espetáculo inspirado numa
proposta de encenação contemporânea, tendo como vetores da criação dramatúrgica os textos
teatrais de Gonçalves Dias, destacando as relações de gênero implícitas no conflito entre as
personagens para estabelecer um paralelo com as relações de gênero na sociedade atual. A
proposta estrutura-se sob uma metodologia de escritura cênica denominada work in progress
ou work in process, que consiste na construção da encenação através de materiais criativos
coletados e organizados durante o processo de pesquisa e experimentações. Neste percurso,
vários mini-espetáculos-experimetos serão organizados e apresentados ao público, e,
posteriormente incorporados ao espetáculo final, de modo que, fiquem claros os caminhos que
se percorreu até a construção da “obra acabada”.
Assim, os participantes/alunos serão instigados a produzirem materiais
latentes/criativos com base em estudos pessoais desenvolvidos individual e coletivamente,
através da aplicação de jogos teatrais, promover discussões acerca das relações de gênero no
século XIX e na atualidade e inserção destes depoimentos/discussões nos experimentos, que
serão a posteriori, costurados e organizados pelo dramaturgo-encenador em um texto/roteiro.
Deste modo, procura-se elaborar uma encenação que em sua estrutura sejam
enxertadas as vivências, as experiências e conhecimentos prévios dos alunos/participantes.
Assim todos estarão inseridos em um processo de criação mediado pelo proponente do projeto
em prol de uma integração/composição criativa.
Assim o processo será dividido em três fases distintas, que são: primeira fase ou
sensibilização que consiste na exploração de conceitos referentes à encenação, texto
fragmentário, espaço no teatro contemporâneo; personagens e caracterização das personagens;
cenografia e iluminação; sonoplastia; produção; voz e novos conceitos estruturados nas
discussões do teatro pós-dramático, como: presentificação/personas; hibridização da cena –
teatralidades contemporâneas; fragmento e hipertexto; collage; environment – espacialização:
trata-se da “organização espacial por territórios literais e imaginários substitui a organização
tradicional – narrativas temporais e casualidades... (paradigma contemporâneo) de substituir o
tempo pelo espaço como dimensão encadeadora”. (COHEN, 2006, p. 26) e outras
estruturações da encenação contemporânea. Haverá também um estudo sobre a vida de
Gonçalves Dias e de personalidades importantes, maranhenses de sua época.
A Segunda Fase ou Criação Coletiva é o momento onde serão trabalhados alguns
procedimentos para a construção do texto/roteiro final, a criação ficará a encargo dos
alunos/participantes que será orientada pelo mediador do processo, através da aplicação de
jogos teatrais e criação de partituras grupais e individuais, propostas de performances e
experimentos públicos, experimentação de espaços não convencionais e etc. Esta fase será
baseada no vetor do projeto: os dramas de Gonçalves Dias e os estudos realizados na primeira
fase, aqui serão coletados e registrados materiais latentes para a criação da encenação, os
alunos/participantes serão instigados a manipular aparelhagens técnicas, a criarem luz,
figurino, maquiagem e etc. (O intuito do projeto é a participação ativa dos alunos no processo
criador). Assim, o trabalho será estruturado da seguinte forma:
Experimento Leonor ou Experimento 1; Experimento Beatriz ou Experimento 2;
Experimento Patkull ou Experimento 3: neste momento são trabalhadas leituras, análises,
estudos históricos e sociais acerca dos textos “Leonor de Mendonça, Beatriz Cenci, Patkull,
Boabdil”. Ocorre o processo de construção da encenação de acordo com os materiais
criativos produzidos pelos alunos/participantes acerca do texto de Gonçalves Dias, para isso,
serão criadas performances, experimentos textos e encenações/ mise-en-scènes propostos
pelos atores. Haverá sempre apresentações públicas durante e depois da construção dos
experimentos para que se trabalhem as relações de recepção da obra junto ao público da
cidade de São Luís.
Nesta perspectiva “o foco de atenção é o processo criador, é o caminho que se
trilha para chegar à obra entregue ao público” (SALLES, 2004, p. 13). O interesse do projeto
em foco visa alcançar um procedimento que valorize o que é construído nas aulas e fazer com
que estes materiais apareçam no espetáculo entregue ao público, para que o mesmo perceba e
entenda as fases da construção da obra e possa refletir e se apropriar desta criação. Deste
modo o presente trabalho busca instigar uma educação estética, nos participante do projeto e
no público maranhense.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Portanto, o trabalho em foco busca interagir com conhecimentos específicos de
teatro com o estudo das relações de gênero na sociedade do século XIX, no intuito de propor
uma educação estética por meio da apropriação dos elementos da encenação teatral, sugerir
um olhar crítico acerca das relações de gênero e a possível reflexão sobre a sociedade atual.
Trata-se de um trabalho que pretende atingir os jovens de uma sociedade mergulhada no
mundo digital e que necessita do resgate da memória histórica de sua cidade, pois São Luís
berço de grandes poetas e escritores que ganharam destaque no âmbito da literatura nacional
necessita de ser reconhecidos e lembrados.
O futuro deve ser construído a partir do diálogo com os mortos, ou seja, é
necessário que se conheça as barbáries que já aconteceram na história da humanidade, para
que não se repitam as crueldades do passado no presente. Uma das formas de prevenção é o
resgate do posicionamento dos intelectuais, que viveram antes da sociedade contemporânea,
acerca de suas realidades, e ainda, conhecer as revoluções e as lutas travadas em prol da
mudança e seus respectivos efeitos, para que as novas gerações conheçam as consequências
dos erros dos (nossos) antepassados.
As relações de gênero foram pano de fundo para muitas atrocidades cometidas
contra a mulher. Esposa já foi entendida, não como companheira, mas como propriedade
masculina, da qual do homem poderia usufruir da maneira mais conveniente, para ele.
Portanto, pode-se encontrar na obra de Gonçalves Dias temas como: a submissão da Duquesa
às vontades do seu marido, a obrigação de jovens em mergulhar em uma vida de aparências,
através, do casamento arranjado, o direito do homem em matar sua mulher para limpar a sua
honra, e entre outros temas que podem ser destacados da obra em foco. Logo, pode-se
perceber claramente o posicionamento do autor acerca das relações sociais de sua época.
Assim sendo, a abordagem central do processo de criação do espetáculo está nas
personagens femininas, protagonistas, das obras dramáticas de Gonçalves Dias, que estão
sujeitas aos padrões e convenções de uma sociedade que supervaloriza o sexo masculino e
despreza a participação da mulher nos processos sociais. Neste contexto, a mulher é
submetida a violações e violências de todo gênero, além do casamento arranjado. A obra de
Gonçalves Dias é rica em alusões sobre estas questões, tão presentes e marcantes no século
XIX, portanto, perceptível na obra dramatúrgica gonçalviana o posicionamento de um
intelectual maranhense diante das relações sociais estabelecidas na sociedade de sua época,
através de seus textos ele analisa e denuncia a situação da vida social de sua época.
Deste modo a proposta pretende resgatar a memória maranhense por meio da
leitura e apresentação de obras, pouco conhecidas, de Gonçalves Dias e, integrar a realidade
social, acerca das relações de gênero, dos alunos ao processo de criação e ao ensino da
linguagem teatral. Assim pode-se afirmar que se trata de uma aprendizagem significativa,
visto que a realidade, as vivências e o conhecimento prévio, construído através da
experiência, são aproveitados e valorizados na metodologia do projeto. Com isto os
participantes desenvolvem uma afinidade com a encenação, pois temáticas relacionadas à vida
deles são abordadas e cultivadas para que com isso gere materiais criativos na configuração
da cena. A metodologia terá três fases distintas: a sensibilização, experimentações e criação
do espetáculo final que visa desenvolver o processo criativo dos participantes e inseri-los em
um procedimento de educação estética que não tem como finalidade apenas a criação, mas a
apreciação e a contextualização. Esta proposta metodológica prevê estas fases da educação
estética à medida que introduz o sujeito na linguagem do teatro.
REFERÊNCIAS
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WERNECK, Ana Maria; BRILHANTE, Maria João. Texto e Imagem: estudos de teatro.
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