CARACTERIZAÇÃO POR TERMOLUMINESCÊNCIA E ESPECTROSCOPIA ÓPTICA DE VIDROS NAT URAIS ORIGINÁRIOS DA AMÉRICA DO SUL 1 1 2 2 1 M .S. Arantes Neto , A.P.A. Simões , A.M.O.A. Balan , C. X. Cardoso , K. Yukimitu , Av. Brasil , 56 – 15385-000 Ilha Solteira - SP e- mail: [email protected] 1 Universidade Estadual Paulista, Departamento de Física e Química, caixa postal 31, 15385-000 Ilha Solteira – SP 2 Universidade Estadual Paulista, Departamento de Física, Química e Biologia, 19060-900 P. Prudente – SP RESUMO Dentro do programa de Caracterização de Vidros Naturais ou Obsidianas originários da América do Sul, foram feitas caracterizações ópticas usando espectrômetros de UV-VIS, FTIR e TL de vidros naturais encontrados no Peru e Chile, denominados de Mullumica, Macusanita e Chile. Medidas de DTA mostraram que os vidros naturais se comportam como vidros multifases, com o transições vítreas Tg acima de 500 C. As amostras submetidas a irradiação com raios-γ a 1000Gy apresentaram mudanças na intensidade de absorção, quando comparados ao material não irradiado, na região espectral do infravermelho. Amostras “como recebidas” apresentaram emissão TL na região o o de temperaturas entre 300 C e 350 C e aquelas submetidas à radiação de raios -γ desenvolveram o picos de emissão TL a mais baixa temperaturas, na região de 200 C. Estudos do comportamento TL o o do pico na região entre 300 C e 350 C a variadas doses de raios- γ mostraram que as amostras Mullumica e Macusanita podem ser datadas, pois a emissão natural TL estão fora da regiã o de saturação. A amostra do Chile irradiada com 1000 Gy apresentou um decréscimo de emissão TL quando comparada com aquela somente com dose natural. Este fato mostra que esta amostra não apresenta características apropriadas para a datação por TL. Palavras-Chaves: Obsidiana, Termoluminescência, Vidros, raios-γ INTRODUÇÃO As Obsidianas ou Vidros Naturais foram produzidos pela Natureza por ocasião dos efluxos de lavas vulcânicas. Para identificar a origem dos complexos vulcânicos que produziram esses vidros diferentes métodos de Mineralogia, Química e Datação são utilizados. Do ponto de vista da datação, (1) muitas técnicas baseadas em diferentes princípios físicos são usadas, tais como : concentração de isótopos de 14 C, Traços de Fissão, concentração relativa de 40K – 40 Ar, relação de 234 U – 230 Th, Espectrometria de Massa Acelerada – AMS, Luminescência Opticamente Estimulada – OSL, Ressonância Paramagnética Eletrônica – EPR e Termoluminescência – TL. No presente trabalho, serão apresentados os resultados iniciais obtidos com o intuito de se (2,3) datar algumas amostras de Obsidianas encontradas na América do Sul, usando a Técnica de Termoluminescência. A Termoluminescência, técnica a ser utilizada na datação de Obsidianas no presente trabalho, é um fenômeno em que quase todos os materiais dielétricos, previamente irradiados com radiação ionizante, apresentam quando submetidos ao aquecimento. Esta propriedade, em condição adequada, pode ser usada para avaliar a idade do material. O marco zero é a época de seu aparecimento, isto é, no caso das Obsidianas o ano “zero” corresponde à época do derrame das lavas e conseqüente formação desses Vidros Naturais. Após a sua formação, como tudo que existe na Natureza, esses vidros ficaram sujeitos à radiação de fundo, ac umulando desta forma, a TL. A datação usando a Técnica da Termoluminescência correlaciona esta TL acumulada devido a (4) Radiação de Fundo, suposta constante, com o tempo da existência da Obsidiana . 161 OBJETIVOS Estudo da viabilidade de datação de Obs idianas ou Vidros Naturais encontradas na América do Sul, usando a Técnica de Termoluminescência e caracterização complementar usando Espectroscopia de Absorção Óptica na Região do Infravermelho e UV - Visível. MATERIAIS E MÉTODOS Materiais Vidros encontrados na América do Sul: Mullumica, Macusanita (Peru) e Chile. Métodos Experimentais Espectroscopia de Absorção Óptica na Região Espectral do Infravermelho foram feitas com o material diluído em Kbr, na forma de pó, na proporção de 1:500, 500 mg de KBr e prensadas a 10 MPa. Espectrômetro marca Nicolet, série NEXUS 870 Espectroscopia de Absorção Óptica na Região Espectral do UV- Vis foram feitas usando-se placas do material, de aproximadamente 1 mm de espessura, obtidas usando serra diamantada. O polimento óptico foi feito usando o procedimento padrão para preparação de amostras na forma de placas, sendo que o polimento final foi feito usando pasta de Cério. O Espectrômetro UV -Vis utilizado foi um CARY -50CONC, Varian. As medidas de Termoluminescência foram feitas usando o aparelho leitor de Termoluminescência da marca Harshaw, série 3500, operando a 700 V na fotomultiplicadora, com fluxo de N2. O material para leitura TL foi pulverizado em um almofariz e grãos de dimensões entre 0,180mm e 0,075mm foram selecionados usando peneiras analíticas. O material pulverizado é utilizado para melhorar o contacto térmico entre a placa de aquecimento e os grãos do material, evitando assim incertezas na temperatura da amostra devido ao gradiente térmico. Para cada leitura foram utilizados em média 8,0 mg do material, usando como padrão um bastão de lucite, onde foi feito um orifício de 1,0 mm x 1,0mm. RESULTADOS EXPERIMENTAIS E DISCUSSÕES Com o objetivo de se estabelecer as características termoluminescentes dos materiais estudados, vidros aqui denominados de Mullumica, Macusanita e Chile, foram feitas leituras da emissão TL natural dos vidros “como recebidos” . A figura 1 ilustra a emissão TL das três amostras. 4 6 1,2x10 1,4x10 Vidros Naturais 6 1,2x10 4 Intensidade TL(u.a) 1,0x10 3 8,0x10 1 Mullumica 2 Macusanita 3 Chile 6 1,0x10 Intensidade TL(u.a) A temperatura de pico Tp das amostras Mullumica, o Macusanita e Chile foram, respectivamente 329 C, o o 333 C e 335 C. O fato das temperaturas Tp estarem o acima de 300 C indicam que os materiais são candidatos a serem datados por TL, pois amostras com altas temperaturas de pico Tp são normalmente estáveis à temperatura ambiente, condição esta necessária para o seu uso na datação. 5 8,0x10 3 3 6,0x10 5 6,0x10 3 4,0x10 5 2 4,0x10 3 2,0x10 5 2,0x10 1 0,0 0,0 100 200 300 400 o Temperatura C Fig. 1 – Emissão TL natural “como recebido” Mullumica, Macusanita e Chile As figuras 2, 3 e 4 representam a emissão TL dos mesmos materiais indicados na figura 1,submetidos a irradiação adicional de laboratório de 1000 Gy. 162 5 10000 2,5x10 1,4x10 6 Vidro Chile 6 8000 Emissão TL (u.a) 1 - Emissão TL Natural 2 - Emissão TL Natural + 1000 Gy 1,0x10 6 Emissão TL (u.a) Emissão TL (u.a) 1,2x10 1 - Emissão TL Natural 2 - Emissão TL Natural + 1000 Gy 2 Vidro Macusanita 2 Vidro Mullumica 5 2,0x10 1,5x105 1 5 1,0x10 1 8,0x10 6,0x10 5 5 1 - Natural 2 - Natural + 1000 Gy 6000 1 4000 2 4,0x10 5 2000 4 5,0x10 2,0x10 5 0 0,0 0,0 0 50 100 150 200 250 300 350 400 0 0 450 100 200 300 o Temperature ( C ) 100 200 400 o 300 400 Temperatura( C) o Temperatura ( C) Fig. 2 – Emissão TL da amo stra Mullumica natural e irradiada com 1000 Gy. Fig. 3 – Emissão TL da amostra Macusanita natural e irrad iada com 1000 Gy. Fig. 4 – Emissão TL da amostra Chile natural e irradiada com 1000 Gy Examinando essas figuras com dose adicional de 1000 Gy podemos observar que o vidro Mullumica, figura 2, apr esenta crescimento significativo da emissão TL quando comparado ao material não irradiado. Esta característica permite antecipar que o material reúne condições mínimas para a sua datação. Na figura 3 é apresentada a emissão característica do vidro Macusanita. Neste caso observamos que o material irradiado apresenta um deslocamento de pico, para temperatura mais baixa, quando comparada a emissão da amostra somente com dose natural. A figura 4 apresenta a emissão TL do vidro Chile. O aspecto relevante é que o material irradiado com 1000 Gy apresenta uma diminuição da emissão TL, quando comparada ao material natural. Esta característica é comum na maioria dos materiais termoluminescentes, quando a dose de irradiação absorvida pelo material ultrapassa a dose de saturação. Neste caso, a interpretação é a de que os centros de emissão no material são destruídos pela alta dose. Uma outra caracterização desenvolvida foi estudar a composição dos picos TL dos vidros. Para tanto foi utilizado o método dos aquecimentos parciais. Este método constitui- se efetuar tratamentos térmicos a diferentes temperaturas na região do pico e posterior leitura da TL remanescente. O tempo de tratamento térmico deve ser breve, normalmente durante alguns minutos. O estudo do deslocamento do pico em relação a temperatura de tratamento térmico permite determinar se o pico de emissão é composto por sobreposição de picos individuais ou se trata de um pico determinado por uma distribuição contínua de armadilhas. Normalmente os picos individuais são caracterizados por um tipo de armadilhas para elétron ou buracos. As figuras 5, 6 e 7 apresentam o comportamento da temperatura de pico dos vidros Mullumica, Macusanita e Chile. O tempo de tratamento térmico parcial foi de 2 minutos, executados em um forno resistivo. 400 400 380 CHILE 390 390 370 380 o 380 375 Tratamento Térmico Parcial 370 360 Tratamento Térmico Parcial o Temperatura de pico ( C) o Temperatura de pico ( C) Tratamento Térmico Parcial MACUSANITA Temperatura de Pico ( C) MULLUMICA 370 360 350 365 360 355 350 345 350 340 340 340 230 240 250 260 270 280 290 300 310 o Temp. tratamento térmico ( C) Fig. 5 – Tratamento Térmico parcial Vidro Mullumita Natural 320 330 230 240 250 260 270 280 290 300 310 320 o Temp. tratamento térmico ( C) Fig. 6 – Tratamento Térmico parcial Vidro Macusanita Natural 240 250 260 270 280 290 o Temp. tratamento térmico (C) Fig. 7 – Tratamento Térmico parcial Vidro Chile Natural Pode ser observado que os três vidros apresentam uma característica em comum que é a de apresentar o pico TL como composição de um pico com armadilhas simples, identificado pelos patamares no gráfico, e um outro pico produzido por uma distribuição contínua de armadilhas, caracterizado pelo crescimento contínuo das temperaturas de pico diante do aumento da temperatura o de tratamento térmico. A posição do pico de armadilhas simples são, respectivamente, 351 C – o o 345 C – 365 C para os vidros Mullumica, Macusanita e Chile. 163 A figura 8 ilustra o teste de estabilidade da emissão TL do vidro Mullumita, através do conhecido “teste de Plateau”. Este método determina a região de temperaturas do pico TL que é estável com o tempo. O procedimento consiste em relacionar a emissão termoluminescente do material “como recebido” com aquele irradiado artificialmente em laboratório. A figura ilustra o teste efetuado no material irradiado com 1000 Gy. Pode ser observado que a curva de emissão o termoluminescente acima de 320 C pode ser utilizado para datação, pois acima disto está na região de estabilidade da TL. 1,000 TLNat/(TLIrra + Nat - TL Nat) 0,998 0,996 0,994 0,992 Teste de Plateau 0,990 Vidro Mullumica 0,988 0,986 0,984 0,982 0,980 260 280 300 320 340 o Temperatura ( C) Fig. 8 – Teste de Plateau Vidro Mullumica 100 60 Mullumica - Exposição Natural 55 10 Dissolvido em KBr trasmitancia% Espectro de Absorção UV-Vis Vidro Mullumica 6 4 Transmissão(%) 40 8 Absorção (u.a) 80 50 45 35 30 25 20 15 10 60 40 Vidro Natural Muli irradiado 1000Gy idem irradiado 100Gy 20 5 0 2 Placa - espessura ~ 1 mm -5 0 -10 0 500 1000 1500 2000 2500 3000 -1 400 600 800 1000 numero de onda(cm ) 3500 4000 500 1000 1500 2000 2500 3000 3500 4000 Número de Ondas (cm- 1) Comprimento de Onda (nm) Fig. 9 - Espectro de Absorção UV -Vis Vidro Mullumica. Fig.10 - Espectro de Transmissão FTIR Fig.11 - Espectro de Transmissão FTIR Placa e dissolvido e m KBr – Mullumica. – Mullumica – Irradiado com 100 Gy e 1000 Gy. A figura 9 ilustra o espectro de absorção na região espectral do UV -Vis do vidro Mullumica. O espectro foi obtido do material na forma de placa de 1 mm. Não foi observada nenhuma banda de absorção, tanto no material “como recebido” como no irradiado com dose adicional em Laboratório. Na figura 10 e 11 observamos o comportamento do espectro de transmissão FTIR, na forma de placa -1 e dissolvida em KBr. Foram observadas pequenas mudanças no espectro, na região de 3400 cm e -1 1300 cm para amostras irradiadas, além de um deslocamento na linha base, para o caso de pastilhas de KBr com amostras de vidro Mullumica dissolvidas. As mudanças verificadas no espectro estão sendo objeto de estudos em desenvolvimento em nossos laboratórios. CONCLUSÕES . O fato das amostras estudadas apresentarem emissão TL natural, aponta para a possibilidade real de executarmos a datação usando a Técnica TL. No caso do material encontrado no Chile, a emissão TL diminuiu de uma forma bastante forte após uma irradiação adicional de 1000 Gy em Laboratório. Isto sugere a necessidade de estudarmos o comportamento da emissão TL para mais baixas doses adicionais para verificar a viabilidade de sua datação. . O vidro Mullumica apresentou características TL apropriadas para a sua datação. 164 . Os resultados apontam que os picos TL apresentados pelos materiais,do ponto de vista das suas estabilidades térmicas à temperatura ambiente, todos acima de 300 o C, em princípio podem ser utilizados para a datação . AGRADECIMENTOS - a FAPESP pelo financiamento a presente pesquisa. - ao IPEN/CNEN - SP, na pessoa da Eng. Elizabeth S. R. Somessari pelas irradiações na fonte de Cobalto/Césio. REFERÊNCIAS 1. Wintle A.G, Archaeologically-relevant Dating Techniques for the Next Century, J. Archaeological Science, 23, 123-138(1996). 2. Aitken, M.J., Thermoluminescence Dating, Academic Press, Oxford(1985). 3. Chiavari, C., Martini, M., Sibilia, E., Vandini, M., Thermoluminescence(TL) characterisation and dating feasibility of anciente glass mosaic, Quaternary Science Reviews, 20, 967-972(2001). 4. Muller, P., Schvoerer, M., Factors affecting the viability of thermoluminescence dating of glass, Archaeometry, 35(2), 299-304(1993). CHARACTERIZATION BY THERMOLUMINESCENCE AND OPTICAL SPECTROSCOPY OF NATURAL GLASS(OBSIDIAN) ORIGINARY FROM SOUTH AMERICA 1 1 1 M. S. Arantes Neto , A.P.A. Simões , A.M.O.A. Balan2,C. X. Cardoso2, K.Yukimitu , Av. Brasil , 56 – 15385-000 Ilha Solteira - SP e-mail: [email protected] 1 Universidade Estadual Paulista, Departamento de Física e Química, caixa postal 31, 15385-000 Ilha Solteira – SP 2 Universidade Estadual Paulista, Departamento de Física, Química e Biologia, 19060-900 P. Prudente – SP ABSTRACT In the research program of Characterization and Dating of Obsidian(natural glasses) originary from South America, Peru and Chile, we present results obtained of their Thermoluminescence and Optical Absorption - UV-Vis and FTIR - properties. The samples were denominated Mullumica, Macusanita and Chile. DTA measurements have been shown that its Tg were above 500oC. As received samples show TL emission in the temperature region between 300 o C and 350oC. The study of TL emission for differents ionizing radiation dose showed that Mullumica and Macusanita have potential for its dating by TL technique. On the other hand, sample denominated Chile showed a decreasing TL intensity when it was submitted to 1000 Gy aditional dose and comparing with TL signal from “as received” sample. This result point out that this sample is not suitable for TL dating. Absorption Spectroscopy measurements in the infrared spectral region point that absorption bands at 1300cm-1 and 3400cm-1 change with additional doses. This topic is in developing in our laboratory. Key-words: obsidian, thermoluminescence, dating, natural glasses 165