Desempenho de Motor Alimentado com Biodiesel Associado ao Biogás
Desempenho de Motor Alimentado com
Biodiesel Associado ao Biogás
Silva, Fabio Moreira da. (Professor Adjunto, DEG-UFLA, famsilva@ufla.br)
Lopes, Afonso (Professor Doutor, FCAV-UNESP, [email protected])
Castro Neto, Pedro (Professor Titular DEG-UFLA pedrocn@ufla.br)
Dabdoub, Miguel J. (Professor Adjunto, DQ-USP, [email protected])
Salvador, Nilson. (Professor Adjunto, DEG-UFLA, salvador@ufla.br)
Furlani, Carlos Eduardo Angeli (Professor Dr., FCAV-UNESP, [email protected]).
1 Introdução
O uso maciço de fontes de combustíveis fósseis, desde o início da industrialização, tem levado
a uma alteração significativa do clima do planeta, cujas conseqüências, ainda não foram medidas
em toda a sua extensão. Na atualidade, com o diesel combustível cada vez mais caro, há que se
pensar em alternativas.
O modelo energético brasileiro recomenda a diversificação de fontes energéticas, sob a premissa da existência de tecnologia disponível no País. Também nesse enfoque, a Agenda 21 da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente (RIO 92), estabelece a substituição de 20% das
fontes energéticas atuais por renováveis até o ano 2000 e 50% até o ano 2020.
Atendendo perfeitamente estas premissas, o meio rural pode se destacar pelo aproveitamento
energético dos resíduos agrícolas, principalmente, através do processo de digestão anaeróbia da
matéria orgânica, com fins energéticos e ambiental, sendo uma das opções a produção do biogás,
que purificado resulta em gás com, aproximadamente, 95% de metano.
Por outro lado o biodiesel é o resultado da transesterificação de óleos vegetais e pode ser obtido a partir do óleo de girassol, amendoim, algodão, soja, mamona, etc. Sua combustão é limpa,
produz 78 % menos dióxido de carbono, que é o gás responsável pelo efeito estufa, e 98 % menos
de emissão de enxofre.
A aplicação de óleos vegetais como combustível ou ainda o reaproveitamento de óleos utilizado em frituras em cozinhas domésticas ou comerciais, é de fundamental importância para países
com enorme potencialidade agrícola e em desenvolvimento como o Brasil, resultando em redução
do envio de divisas para o exterior, além de criar empregos e um mercado rural para a cultura de
oleaginosas, reduzindo ainda a poluição ambiental devido à menor quantidade de enxofre presente
no biodiesel e ao reaproveitamento de óleos já utilizados.
Fundamentado nos resultados de trabalhos citados pela literatura internacional a exemplo
de ORTIZ-CANAVATE et al (1981), BRANDINI et al. (1983), MITZLAFF (1988), dentre outros que
obtiveram bons resultados de motores diesel operando com duplo combustível, SILVA (1995) desenvolveu um sistema de alimentação a duplo combustível, usando biogás purificado (metano) como
combustível principal e diesel como combustível piloto, com o propósito de viabilizar o uso do
biogás em máquinas automotivas no meio rural, na maioria equipadas com motores diesel, onde a
produção de biogás é favorecida pela disponibilidade de resíduos agrícolas orgânicos.
O referido sistema consta de uma válvula redutora e dosadora de baixa pressão que tem seu
mecanismo de controle de descarga de gás, associado ao mecanismo de aceleração da bomba injetora. Neste sistema o gás metano é misturado ao ar admitido na entrada do coletor e a ignição se dá
pela injeção piloto de diesel, sendo o motor controlado pela carga de enchimento dos cilindros.
Este trabalho teve por objetivo avaliar o desempenho de um motor de trator adaptado para
operar com duplo combustível, biodiesel e biogás. Os ensaios foram realizados comparativamente
em três condições distintas de alimentação: 100% a diesel, dentro das especificações originais do
• 361 •
motor e a duplo combustível, utilizando biodiesel como combustível piloto, com biogás in-natura
ou purificado como combustíveis principais. Os ensaios constaram da avaliação da potência equivalente do motor, medida dinamométricamente através da TDP.
2 Material e métodos
Para a realização dos ensaios foi utilizado o motor de um trator VALMET, modelo MWM-4TVA,
diesel, de 4 tempos, refrigerado a água, com 4 cilindros em linha, cilindrada total de 3778 cm³ e
taxa de compressão 18:1, com potência nominal segundo o fabricante de 78 cv a 2300 rpm. Trator
este destinado a serviços gerais, próprio para pequenas e médias propriedades agrícolas, tendo sido
adaptado para operar com duplo combustível, biodiesel e biogás purificado (metano).
O sistema de alimentação com duplo combustível empregado foi o desenvolvido por SILVA
(1995), sendo constituído basicamente dos cilindros armazenadores, válvula rebaixadora de pressão
e válvula redutora-dosadora de gás. Este sistema se caracteriza pela adição somente de componentes externos, sem modificações técnicas do motor e pela possibilidade de acionamento do trator 100
% a diesel ou biodiesel.
Os ensaios foram realizados nas seguintes condições de alimentação do motor: 100% diesel, duplo combustível (biodiesel e biogás in-natura), duplo combustível (biodiesel e biogás purificado).
O diesel utilizado nos ensaios foi obtido na rede de abastecimento automotiva, com densidade
de 0,8186kg/L e poder calorífico inferior de 42.500kJ/kg e o biodiesel utilizado, é resultante do
reaproveitamento e transesterificação de óleos vegetais já utilizados em cozinhas industriais, produzido no LADETEL/USP de Ribeirão Preto, apresentando densidade de 0,8959kg/L.
O biogás purificado (metano) utilizado foi o resultante da purificação do biogás, contendo
96% de CH4, 2.65% de CO2, 0,59% de H2S e 0,76% outros, com poder calorífico inferior de 46.500
kJ/kg.
O biogás, por sua vez, foi o oriundo da digestão de esterco bovino, e apresentava a seguinte
composição básica: 65,8% de CH4 e 34,2% de CO2, com poder calorífico inferior de 20.706 kJ/kg.
Para a medida do consumo de diesel ou biodiesel pelo motor do trator, que é de fundamental importância para se obter a redução de seu uso, no sistema com duplo combustível, foi utilizado
o medidor volumétrico descrito por GAMERO et al (1986).
O dinamômetro utilizado nos ensaios de torque e potência consta do modelo NEB 200, marca
AW DYNAMOMETER, que transforma energia mecânica em calor por meio de um freio hidráulico,
onde o calor gerado no freio é dissipado por água de arrefecimento. O torque e a potência do motor
foram mensurados através da TDP do trator, em dois regimes de funcionamento: plena carga em
rotação nominal do motor 2200rpm, equivalendo a 700 rpm da TDP e a 1700 rpm do motor, correspondendo a 540 rpm da TDP.
3 Resultados e discussão
Os resultados dos ensaios dinamométricos são apresentados nas Tabelas 1, 2 e 3, para cada
uma das condições de alimentação do motor.
Os resultados demonstraram que com o sistema a duplo combustível, foi possível operar o
motor com nível de potência similar ao obtidos com o diesel. Em plena carga à rotação nominal de
2195 rpm, a potência obtida com 100% de diesel foi de 36,3 kW, enquanto que com duplo combustível foi 35,8 kW à 2103rpm, com redução de apenas 1,4%, o que ocorreu com injeção piloto de 31%
de biodiesel e o restante da energia sendo suplementada pelo metano. Em plena carga à 1700rpm o
comportamento foi semelhante, com redução de potência comparativamente com o diesel chegando a 8,1%, sendo injetado 26% de biodiesel.
Segundo a literatura, a taxa de substituição recomendado do diesel para o sistema a duplo combustível é de 75 %, já que taxas maiores podem danificar os bicos injetores do motor, pelo excesso
de temperatura, dado ao menor arrefecimento do mesmo, feito pelo fluxo de retorno do óleo.
• 362 •
Desempenho de Motor Alimentado com Biodiesel Associado ao Biogás
Tabela 1. Desempenho do motor alimentado 100% Diesel.
Rotação da TDP (rpm)
Potencia (kW) Torque (N.m) Consumo L/h
Plena carga à rotação nominal do motor
Média
691
36
500
12,44
704
36,1
490
12,54
697
36,7
505
12,44
697
36,3
498
12,47
Plena carga a 1700 rpm do motor
Média
540
34,8
618
11,4
556
35
603
11,45
544
33
582
11,35
547
34,2
601
11,4
Tabela 2. Desempenho do motor alimentado com Biodiesel + Biogás purificado.
Rotação da TDP (rpm)
Potencia (kW) Torque (N.m)
Consumo L/h
Plena carga à rotação nominal do motor
Média
665
36,2
520
3,93
667
36
515
3,9
671
35,2
501
3,9
668
35,8
512
3,91
Plena carga a 1700 rpm do motor
Média
540
31,3
553
3,04
535
30
538
2,9
545
32,8
574
3,18
540
31,4
555
3,04
Obs: Biogás Purificado com 96% de pureza (metano).
Tabela 3. Desempenho do motor alimentado com Biodiesel + Biogás in natura.
Rotação da TDP (rpm)
Potencia (kW)
Torque (N.m)
Consumo L/h
Plena carga à rotação nominal do motor
Média
688
33,8
471
7,2
634
30
454
7
650
32
472
7,1
656
31,9
466
7,1
Plena carga a 1700 rpm do motor
Média
546
32,9
578
7,1
553
30,5
529
7
540
30
533
7
546
31,1
547
7
Obs.: Biogás com 65,8% de metano
• 363 •
Alimentando o motor com biodiesel e biogás, observou-se que a potência foi um pouco inferior a do diesel, o que se justifica por se tratar de gás não purificado, com apenas 65,8% de metano,
o que diminui seu poder calorífico. Nesta condição a redução de potência foi de 12%, operando
em plena carga à rotação de 2065 rpm, injetando 57% de biodiesel. Para a rotação de 1700rpm a
redução de potência foi de 9%, contudo foi necessário injetar 61% de biodiesel.
O sistema de alimentação e controle do motor a duplo combustível mostrou-se operacionalmente eficiente, possibilitando ao motor operar estável em plena carga, utilizando biogás in-natura
ou purificado, com injeção piloto de biodiesel, com potência similar ou pouco inferior à potência
obtida operando 100% a diesel.
4 Conclusões
Utilizando-se o sistema de alimentação com duplo combustível o motor operou estável, sendo
possível obter nível de potência similar ao do motor operando com diesel, para o regime de plena
carga à rotação nominal. A taxa de substituição do diesel foi total, com injeção de biodiesel de 31%,
com queda de potência de apenas 1,4%, quando suplementado com metano purificado do biogás.
Para a suplementação com biogás in-natura foi necessário injetar de 57 a 61% de biodiesel,
sendo que observou-se perda de potência de até 12%, devido ao menor poder calorífico do biogás.
• 364 •
Desempenho de Motor Alimentado com Biodiesel Associado ao Biogás
Referências bibliográficas
BRANDINI, A.; FINCH, E. O.; SILVA, J.G.; SHUNK, S.P. Fontes alternativas de energia
para máquinas agrícolas. In: SIMPOSIO DE ENGENHARIA AUTOMOTIVA, 1, 1983,
Brasília. Anais... Brasília: STI/CIT, 1983, p.283-98.
GAMERO, C.A.; BENEZ, S. H.; FURLANI Jr., J. A. Consumo de combustível em diferentes tipos de mobilização do solo. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA
AGRÍCOLA, 15, 1986, Botucatu. Anais... Botucatu: Sociedade Brasileira de Engenharia
Agrícola, 1986, p.1-9.
MITZLAFF, K.Van, Engines for biogas. Viesbaden, Veiweg, 1988, 133p.
ORTIZ-CAÑAVATE, J.; HILLS, D.J.; CHANCELLOR, W.J. Diesel engine modification to
operate on biogas. Transactions of the ASAE, St. Joseph. 808-13, 198l.
RIO 92. Plano de ação da declaração do Rio, Rio de Janeiro, 1992.
SILVA, F. M. Sistema de alimentação de motores com duplo combustível - metano e
diesel. São Carlos: EESC/USP, 1995, 121p. (Tese de Doutorado).
• 365 •
Download

Desempenho de Motor Alimentado com Biodiesel Associado ao