MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO PROCESSO PGT/CCR/ICP/12799/2012 ORIGEM: PRT 4ª REGIÃO PROCURADORA OFICIANTE: DRA. ALINE MARIA HOMRICH SHNEIDER CONZATTI INTERESSADO 1: FRANCISCO GOULART JAHN INTERESSADO 2: LPS SUL – CONSULTORIA DE IMÓVEIS LTDA ASSUNTO: Fraudes trabalhistas (03.01.02 e 03.02.02); Temas gerais (09.14 e 09.17) DENÚNCIA. RECURSO. CORRETORES DE EMPRESA IMÓVEIS. IMOBILIÁRIA. NATUREZA DA ATIVIDADE. Há necessidade de que a investigação prossiga, uma vez não ter ficado demonstrado que os corretores de imóveis que atuam na empresa trabalhem, de fato, na condição de autônomo. Recurso a que se dá provimento. I – RELATÓRIO O Órgão oficiante arquivou o inquérito civil, aduzindo, no bojo, que os requisitos essenciais da relação de emprego previstos no artigo 3º da CLT, no caso de corretores de imóveis, deve ser analisada caso a caso, uma vez que a atividade pode ser desenvolvida tanto por meio do vínculo de emprego, como de maneira autônoma, conforme prevê a Lei 6530/78. Em face da decisão, o denunciante apresentou recurso administrativo (fls. 62/65). MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO O denunciado apresentou contrarrazões (fls. 94/111). É, em síntese, o relatório. II – ADMISSIBILIDADE O apelo mostra-se tempestivo, motivo pelo qual merece conhecimento. III – VOTO O Órgão oficiante, firmado no depoimento prestado por ex-empregado da denunciada (fl. 21), assim como no relatório da fiscalização trabalhista procedida na empresa (fls. 30/33), entendeu que “a situação relativa aos objetos denunciados – registro de empregados e salário mínimo profissional -,... não perfectibiliza hipótese que enseje a atuação do Ministério Público do Trabalho” (fl. 56), a partir dos seguintes fundamentos, verbis: “Em que pese o número de corretores encontrados no estabelecimento da inquirida, verificouse haver apenas 5 ações trabalhistas ajuizadas contra a empresa a partir de 01/01/2009. Dessas cinco ações, verifica-se que: a) uma foi arquivada ante a ausência do reclamante; b) uma aborda temas diversos do presente Inquérito; c) uma teve decisão, ainda não transitada em julgado, reconhecendo o vínculo de emprego entre o corretor de imóvel e a inquirida, e d) em duas, sendo uma movida pela testemunha ouvida na Procuradoria Regional do Trabalho, ainda não foram realizadas as audiências de instrução (fl. 19). O acima exposto somado ao fato de que a atividade de corretores de imóveis pode ser exercida tanto mediante vínculo de emprego quanto de forma autônoma, na forma da Lei nº 6.530/78, leva a concluir que a verificação da presença, ou não, dos requisitos essenciais da relação de emprego previstos no artigo 3º da CLT deve ser feita caso a caso.” Data vênia dos fundamentos aduzidos pela Procuradora oficiante entendo que a situação relatada no presente merece maior análise. Inicialmente, observo que o relatório do auditor fiscal do trabalho, colacionado à fl. 30, afirma a existência de MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO mais de 450 corretores trabalhando na empresa e que estes informaram “trabalhar de forma autônoma, com liberdade de horário e de fazer os plantões”. No entanto, em seu depoimento (fl. 21), o Sr. Gilberto Goldman Feder, exempregado da denunciada até 2011, assim se manifesta sobre a questão objeto do presente: “os corretores eram obrigados a usar terno e gravata..., cumprir jornada de trabalho, inclusive aos finais de semana, sem intervalo para alimentação e descanso; que a jornada era das 09h às 15h ou das 15h às 21h, mas tinham que chegar antes do horário da manhã para ser o primeiro da fila a atender o telefone; que a jornada aos finais de semana era das 09h às 20h ou 21h;... que tinham de cumprir uma meta de agenciamentos; que eram obrigados a participar de reuniões, fora do local de trabalho e convenções, sem o pagamento do deslocamento;... que, quando os corretores são contratados, assinam um contrato de prestação de serviço, se segundo a empresa, seria autônomo, no qual havia uma observação de ausência de obrigatoriedade de trabalhar apenas para a Lopes; que, no entanto, durante o contrato, era cobrada a exclusividade, verbalmente; que havia regras de trabalho, tratando sobre ponto, uniforme, etc...” (grifos nossos) Às fls. 31/33, a empresa se manifesta, reportando-se à Lei nº 6.530/78, que regulamenta a profissão de corretor de imóveis, dizendo que esta equipara as imobiliárias, pessoas jurídicas, e os corretores de imóveis, pessoas físicas, em direitos e obrigações no exercício profissional, tendo consolidado a praxe de trabalharem de forma coordenada, associada ou em parceria, “com o objetivo final de concluir a aproximação entre vendedores de produtos imobiliários e seus potenciais compradores, a resultar em um contrato principal” (fl. 32). Diz que “cada qual atua por sua própria conta e risco, em papéis diferentes, mas complementares” (fl. 32). Junta contrato de parceria e a lista dos corretores a ela ligados. Em seu recurso, o denunciante contesta o arquivamento do feito, ressaltando a necessidade de maior averiguação dos fatos denunciados, considerando as MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO condições de trabalho enfrentadas e o fato de que, muitos dos corretores de imóveis vinculados à empresa sequer têm registro no Conselho Regional específico, conforme exige a Lei nº 6.530/78. Com razão o recorrente, nem o relatório do auditor fiscal, nem a manifestação da empresa, demonstraram que, de fato, os corretores de imóveis em questão trabalham de forma autômoma. De se registrar que o trabalho autônomo, genericamente falando, privilegia a liberdade do trabalhador no desempenho de suas atividades, seja na escolha do objeto do seu trabalho, seja na eleição das condições em que este será exercido, não se vinculando a um empregador e às condições por ele impostas. Pelos fatos relatados no presente, em nenhum momento restou evidenciada a relação autônoma defendida. Ademais, a Lei nº 6.530/1978, que regulamenta a profissão não permite a interpretação dada pela empresa, uma vez não tratar da natureza do vínculo eventualmente formado com uma empresa imobiliária. O fato de o art. 3º, em seu § único, dispor que as atribuições nele referidas também podem ser exercidas por pessoa jurídica, não interfere na natureza da relação de trabalho tratada no presente. São as exatas condições em que o trabalho é desenvolvido que dirão sobre a natureza desta relação. De outro lado, considerando o grande número de corretores que atuam na empresa, todos na condição de autônomos, não há falar em investigação caso a caso, apresentando-se a necessidade de se esclarecer sobre a real natureza desse vínculo. Mediante o exposto, dou provimento ao recurso interposto para não homologar a promoção de arquivamento encaminhada. IV – CONCLUSÃO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO Diante do exposto, conheço e dou provimento ao recurso interposto. Em conseqüência, não homologo a promoção de arquivamento encaminhada. Brasília, 22 de novembro de 2012. Eliane Araque dos Santos Relatora