PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS
Departamento de Psicologia
SER PAI: SER MACHO?
Construção da identidade paterna em homens homo/bissexuais
André Geraldo Ribeiro Diniz
Belo Horizonte
2006
André Geraldo Ribeiro Diniz
SER PAI: SER MACHO?
Construção da identidade paterna em homens homo/bissexuais
Monografia
apresentada
graduação
em
ao
Psicologia
Programa
da
de
Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais, como
requisito parcial para obtenção do título de
Psicólogo.
Orientadoras: Cássia Beatriz Batista
Cláudia Andréa Mayorga Borges
Belo Horizonte
2006
Aos meus pais,
pelo reconhecimento
e por terem desprendido tamanho amor e dedicação...
AGRADECIMENTOS
A PUC Minas, especialmente a unidade São Gabriel, por ter proporcionado essa
conquista e pelo financiamento dessa pesquisa.
Ao laboratório de Psicologia Social, pelo grandioso acolhimento e por ter
referenciado grande parte da minha formação acadêmica e pessoal.
Ao Núcleo de Psicologia Política pelo auxílio na ampliação teórica e metodológica
dessa pesquisa.
Ao Núcleo de Hipermídia da PUC Minas São Gabriel, na pessoa de Carmen Borges,
pela importante contribuição.
À Cláudia Mayorga, por ter caminhado sempre ao meu lado nesse árduo trajeto. Pela
exímia competência e por ter contribuído para que me tornasse mais humano.
À Cássia Beatriz Batista, pelo profissionalismo, pelo reconhecimento e pelas
importantes contribuições nesse percurso.
À Márcia Mansur, pela compreensão, pelo carisma e pelo exemplo.
À Luciana Kind, por ter se permitido, em momento oportuno, transformar-se em
bússola.
À Tiago França, pela disponibilidade incontestável.
Aos movimentos GLBTT que receberam a pesquisa com muito apreço e atenção.
Aos membros do Orkut que permitiram ser invadidos em sua privacidade.
Aos participantes dessa pesquisa por terem compartilhado parte de suas
experiências, na tentativa de contribuir para a melhoria na qualidade de vida de sua
categoria.
Aos meus pais, pela oportunidade que me concederam e por terem desprendido
tamanho amor e carinho.
À minha família, pelos momentos de alegria.
À Luciana Bossi, por ter feito acreditar-me no inacreditável, pela cumplicidade e por
ter oferecido o ombro em sinal de compreensão e indulgência.
À Anderson Machado Maia, pelo respeito incondicional e pela cumplicidade.
Aos outros amigos, tão importantes para a concretização desse trabalho.
Aos colegas de turma, pelo acolhimento e pelo enriquecimento pessoal.
Pai de todo jeito
Tem pai que ama,
Tem pai que esquece do amor.
Tem pai que adota,
Tem pai que abandona,
Tem pai que não sabe que é pai,
Tem filho que não sabe do pai.
Tem pai ...
Tem pai que dá amor.
Tem pai que dá presente,
Tem pai por amor,
Tem pai por acaso,
Tem pai que se preocupa com os problemas do filho,
Tem pai que não sabe dos problemas do filho...
Tem pai ...
Tem pai que ensina,
Tem pai que não tem tempo,
Tem pai que sofre com o sofrimento do filho,
Tem pai que deixa o filho esquecido.
Tem pai de todo jeito
Tem pai que encaminha o filho,
Tem pai que o deixa no caminho,
Tem pai que assume,
Tem pai que rejeita,
Tem pai que acaricia,
Tem pai que não sabe onde está o filho que precisa de carinho.
Tem pai que afaga,
Tem pai que só pensa em negócios.
Tem...
Tem pai de todo jeito.
E você???
Que tipo de pai você é?
Eu quero um pai, apenas um pai que esteja consciente do amor
que tem para dividir...
Eu quero um pai, apenas um pai que seja AMIGO!
*Texto extraído da internet*
RESUMO
Tem-se como objetivo geral desta pesquisa conhecer os fatores psicossocias que estão
presentes na construção da identidade paterna em homens que se auto-definem como
homo/bissexuais. Essa experiência, ainda pouco visível no cenário social, tem demonstrado
uma série de estratégias para se consolidar, buscando inclusive, através das bandeiras de
luta GLBTT, um reconhecimento jurídico e social. Na tentativa de melhor elucidar esse
fenômeno e os possíveis fatores que nele estão presentes, torna-se necessário
compreender melhor os conceitos de homossexualidade, paternidade e construção
identitária. A metodologia adotada foi a aplicação de um questionário on-line e realização de
um grupo focal, na busca por articular dados quantitativos e qualitativos. Os resultados
trazem alguns apontamentos que dizem da resistência mantida pela sociedade na
concretização e legitimação da paternidade homossexual. Perceberam-se também duas
tendências apresentadas pelos sujeitos ao narrarem suas experiências: respostas baseadas
no pressuposto de que a paternidade e a orientação sexual são dimensões independentes e
respostas construídas na tentativa de articular essas duas dimensões. Tais tendências
apontam para estratégias privadas e políticas de enfrentamento à segregação homossexual,
na busca por consolidar a vivência da paternidade, na condição homo/bissexual.
Palavras chave: Homossexualidade; Paternidade; Identidade; Homoparentalidade.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
QUADRO 1 Opções de respostas para os itens sexo, orientação sexual e filhos
do Orkut .................................................................................................................................58
QUADRO 2 Cruzamentos realizados na ferramenta de busca do Orkut...............................59
ESQUEMA 1...........................................................................................................................64
GRÁFICO 1 População respondente em relação ao estado civil...........................................72
GRÁFICO 2 População respondente em relação à raça/cor.................................................74
GRÁFICO 3 População respondente, quanto ao nível de discriminação sofrido...................81
GRÁFICO 4 População respondente quanto ao projeto de vida em ser pai..........................84
GRÁFICO 5 Sentimento em relação às categorias identitárias.............................................90
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 Média de idade dos usuários do Orkut – Abr./Jul. 2006......................................69
TABELA 2 Média de interesses dos usuários do Orkut – Abr./Jul. 2006...............................69
TABELA 3 Média de relacionamentos dos usuários do Orkut - – Abr./Jul. 2006..................69
TABELA 4 Média por país dos usuários do Orkut – Abr./Jul. 2006 ......................................69
TABELA 5 Faixa etária da população respondente...............................................................72
TABELA 6 População respondente por orientação sexual....................................................73
TABELA 7 Situação de residência por região brasileira e cidade, da população
respondente............................................................................................................................74
TABELA 8 População respondente, em relação à moradia e dependência familiar.............75
TABELA 9 População respondente, conforme grau de instrução e renda familiar................76
TABELA 10 População respondente, quanto à utilização de espaços GLBTT.....................77
TABELA 11 População respondente, conforme orientação sexual e estratégia para
obtenção de filhos...................................................................................................................85
TABELA 12 população respondente, quanto à residência dos filhos....................................88
TABELA 13 População respondente quanto à orientação sexual e posicionamento diante
das categorias identitárias......................................................................................................93
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.....................................................................................................................12
2 HOMOEROTISMO: CRÍTICA À PATOLOGIZAÇÃO DA HOMOSSEXUALIDADE...........18
2.1 Homossexualidade: historicização das relações de opressão..................................18
2.2 Homoerotismo: novas linguagens, diferentes identidades........................................22
3 SEXUALIDADE E PRODUÇÃO DE IDENTIDADES..........................................................27
3.1 Identidade: Um breve percurso histórico.....................................................................27
3.2 “Sexualidades” e identidade: possíveis arranjos para a identidade sexual.............31
4 PATERNIDADE: ARTICULAÇÕES COM “AS MASCULINIDADES”................................37
4.1 O gênero como categoria analítica...............................................................................37
4.2 Ser pai: ser macho?........................................................................................................41
5 CAPÍTULO IV – REFLEXÕES METODOLÓGICAS...........................................................48
5.1 A questão do método nas Ciências humanas: Razão e subjetividade......................48
5.1.1 O culto à Razão: o surgimento da Ciência....................................................................49
5.1.2 Enfraquecimento do Positivismo: a realidade subjetivamente produzida......................50
5.1.3 Crítica à racionalidade científica: propondo novos paradigmas....................................51
5.1.4 Processos de globalização: Pesquisa e Internet...........................................................52
5.2 Apresentando a metodologia........................................................................................55
5.2.1 Questionário...................................................................................................................56
5.2.1.1 Captação dos sujeitos: quando o virtual possibilita o real..........................................57
5.2.1.2 Construindo questionário on-line................................................................................60
5.2.1.3 Validação do instrumento...........................................................................................62
5.2.2 Diário de campo.............................................................................................................65
5.2.3 Grupo Focal...................................................................................................................66
5.2.3 Caracterização dos respondentes.................................................................................67
5.2.4 Tratamento dos dados...................................................................................................69
6 DISCUSSÃO DOS DADOS.................................................................................................71
6.1 Pai gay: quem é você?...................................................................................................71
6.2 Algumas representações da Paternidade....................................................................78
6.3 Sou gay e tenho filhos!: Paternidade X orientação sexual.........................................82
6.3.1 Identidade Sexual: Produto ou processo?.....................................................................89
6.4 Paternidade e Masculinidade.........................................................................................94
6.5 Paternidade gay hoje... Dificuldades X possibilidades..............................................97
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................................100
8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................................104
9 APÊNDICES......................................................................................................................110
9.1 Questionário..................................................................................................................110
9.2 Roteiro para realização do grupo focal......................................................................115
9.3 Termo de Consentimento Livre e Esclarecido...........................................................117
12
INTRODUÇÃO
Esta monografia consiste num desdobramento da pesquisa de iniciação científica “os
fatores psicossociais que influenciam na construção da identidade paterna em homens
homossexuais”, aprovada pelo PROBIC/2006, com prazo de vigência entre fevereiro e
dezembro de 2006.
Tem-se como objetivo geral desta pesquisa conhecer os fatores psicossocias que
influenciam a construção da identidade paterna em homens que mantêm relações sexuais
com outros homens. Tal objetivo desdobra-se em três objetivos específicos, a saber: a)
Investigar os fatores que delimitam e influenciam a construção da identidade paterna, com
ênfase nos papéis de gênero; b) Conhecer os fatores psicossociais que estão presentes na
construção da identidade homossexual; e c) analisar os impactos da identidade sexual e
identidade de gênero na vivência da paternidade em homens homossexuais.
A metodologia adotada nesse estudo está pautada na tentativa em se articular
instrumentos quantitativos e qualitativos para uma melhor análise. Realizou-se a aplicação
de um questionário on-line, buscando encontrar dados do perfil da amostra e de alguns
apontamentos acerca de sua realidade. O grupo focal proporcionou a investigação
aprofundada dos elementos qualitativos da paternidade homossexual, buscando verificar os
fatores psicossociais que estão presentes nessa experiência. Para a participação na
pesquisa os sujeitos deveriam ter as seguintes características: a) ser do sexo masculino; b)
se auto-definir como homo/bissexuais; e c) ter filhos, biológicos ou não. È preciso lembrar
que o critério adotado para classificar os sujeitos como homo/bissexuais foi a auto-definição
de cada um deles. Sabe-se também que esse recorte metodológico pode excluir algumas
experiências e vivências que, possivelmente, não sejam contemplados por esse critério.
Na sociedade contemporânea, o pai gay é visto como um doente que irá transmitir
sua homossexualidade aos filhos. Existe ainda o mito de que eles são obcecados por sexo e
tendem a abusar de seus descendentes, ou ao menos expô-los ao ridículo perante a
13
sociedade. (RAMIRES, 1997). Essas representações foram construídas a partir de, entre
outras, concepções psicológicas alicerçadas em um certo referencial de normalidade.
Se por um lado, percebe-se a existência de representações sociais negativas acerca
dos pais gays, por outro é importante ressaltar que o interesse pelo exercício da
maternidade/paternidade entre indivíduos homossexuais começa a se tornar um fenômeno
investigado na atualidade, ainda que em passos lentos. Os estudos acerca dessa realidade
ainda são escassos, apontando para uma necessidade em se compreender os elementos
que estão ligados à essa construção e articulá-los, em nível ainda exploratório. Uma
pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa e Cultura GLS (2005), ao questionar sua
população sobre o grau de importância atribuído à aquisição de direitos civis, mostrou que
60% dos homossexuais consideram muito importante o direito à adoção de crianças e 41%
consideram muito importante o direito à inseminação artificial.
No Brasil, as discussões e debates sobre o tema surgiram com o crescimento dos
Movimentos Feministas e os Movimentos GLBTT. Esses movimentos possibilitaram uma
série de problematizações acerca do papel da mulher na sociedade, especialmente na
divisão do trabalho que atribuiu ao homem a circulação pelos espaços públicos e à mulher,
pelo privado. Buscaram também desnaturalizar o modelo heterossexista, localizando no
discurso da sexualidade, dispositivos de poder e hierarquização que buscam controlar e
vigiar o lugar de submissão aferido à mulher e as práticas sexuais historicamente tidas como
desviantes. Esses elementos contribuíram para a inserção de novos debates nessa
discussão, geralmente articulados com a diversidade sexual, cidadania, empoderamento
feminino, etc. Discussões de extrema importância, do ponto de vista emancipatório, que
acabaram por tecer uma crítica ao modelo hegemônico de família, propondo novas formas
de concebê-la.
Com a morte da cantora Cássia Eller, essas discussões tomam proporções
midiáticas, aumentando ainda mais a visibilidade das famílias homoparentais. A briga
judicial entre o pai da artista e de sua companheira culminou em uma série de reportagens e
estudos científicos, principalmente por que a sentença foi favorável à companheira de
14
Cássia Eller. Já nessa época, algumas pesquisas tentavam compreender este fenômeno,
tão raramente exposto na história da sociedade (TARNOVSKI, 2004).
Assim como o caso de Cássia Eller, o aparecimento de outros arranjos familiares
começam atribuir visibilidade às famílias formadas por gays e lésbicas, atingindo a mídia
nacional e internacional. Vários países aprovaram ou colocaram em pauta as discussões
acerca da legitimação da união homossexual. Essas discussões fomentam o impasse da
constituição familiar por homossexuais e abrem caminho para a conquista da
paternidade/maternidade, tão revogada pelo movimento GLS1 para garantir o direito de
adoção
legal
e/ou
utilização
de
tecnologias
reprodutivas
(ROUDINESCO,
2003;
TARNOVSKI, 2004).
A projeção da sexualidade fora dos padrões teóricos do Direito de Família acaba por
excluir as relações e orientações sexuais que a ela não se ajustam. A legislação vigente
ainda é obscura, ao se tratar das organizações homoparentais, negando direitos de
parentesco, filiação e adoção. Esse fato indica que, sendo a legislação, de certa forma, um
dos dispositivos de legitimação social, a sociedade ainda imputa resistência na
concretização desses papéis parentais aos homossexuais, na medida em que não aprova
leis que garantam a essa categoria o acesso à direitos historicamente aferidos aos
heterossexuais e ao arranjo familiar burguês. Apesar disso, não deixam de merecer
tratamento adequado: da homossexualidade, considerada invertida, surgem relações de
afeto, organizam-se células afetivas, constroem-se patrimônios, estabelecem-se vínculos
sanguíneos e/ou sociais, despontam expectativas de filiação, adoção e procriação (FUGIE,
2002).
Nos Estados Unidos e Canadá existem cerca de 03 milhões de pais que se intitulam
gays, trazendo a estimativa de no mínimo 06 milhões de filhos de gays e lésbicas
(ROUDINESCO, 2003; TARNOVSKI, 2004). Esses dados, ainda que não se refiram ao
1
Na época da publicação desses trabalhos utilizava-se, predominantemente, o termo “Movimento
GLS” (Gays, Lésbicas e Simpatizantes). Ao passar por uma série de discussões e reformulações, o
nome do movimento foi ampliado, passando a se chamar “Movimento GLBTTT” (Gays, lésbicas,
bissexuais, travestis, transexuais e trangêneros).
15
contexto brasileiro, demonstram a existência de uma demanda de pais/mães homossexuais
que, possivelmente, estejam vivenciando seu papel com dúvidas, angústias, medos e
receios, sentimentos oriundos, dentre outros motivos, das representações negativas ainda
reproduzidas em nossa sociedade. Daí a importância deste trabalho que, com sua
contribuição, poderá colaborar na reconstrução dos conceitos da homossexualidade e da
homoparentalidade, abrindo espaço para a discussão dessas identidades e possibilitando
uma
problematização
no
debate
que
toma
como
objeto
a
construção
da
paternidade/maternidade por homossexuais.
Para além disso, essa pesquisa é relevante, no sentido de oferecer novas formas de
localizar a homossexualidade na sociedade, contribuindo para a construção de um novo
espaço para essa experiência e buscando articular o saber produzido na academia com as
bandeiras de luta dos movimentos GLBTT. É relevante também, na medida em que propõe
um olhar diferenciado para papéis sociais, até então considerados inadequados,
apropriando-se de determinados discursos políticos, e inserindo no contexto da academia
debates acerca da diversidade sexual e da cidadania.
Nesse sentido, este trabalho poderá contribuir também nas discussões elaboradas
pelas várias dimensões do conhecimento humano, relativas à paternidade homossexual,
contribuindo para o saber científico, o poder legislativo, o saber religioso e o saber popular,
que ainda impõem grande resistência na concretização desse papel. Resistências ligadas à
falta de aparato legal que subsidie a filiação e adoção por homossexuais, e aos dispositivos
de controle exercidos sobre essas práticas e vivências, justificados nas representações
negativas acerca da homossexualidade.
A academia está em constante articulação com a sociedade, na medida em que se
apropria de suas inquietações, atribui a elas uma série de significados e oferece novos
elementos de análise e estratégias de enfrentamento a essas inquietações. Assim, da
mesma forma que o aparato legislativo, a academia, durante muito tempo, legitimou, e
contribuiu para construir as concepções acerca das relações homoeróticas. Portanto, essa
pesquisa é também uma tentativa de melhor elucidar tais questões, na busca de preencher
16
a lacuna deixada pela ciência e, conseqüentemente pela psicologia, nessas discussões,
oferecendo elementos para um olhar diferenciado do saber científico/psicológico frente a
esse fenômeno. É necessário, para isso, a inclusão de temas e debates relacionados ao
homoerotismo e paternidade nas discussões desses campos de saber para, assim, construir
diretrizes que auxiliem a compreensão e intervenção perante esse público.
O trabalho irá se referenciar no aporte teórico da Psicologia Social Crítica,
compreendendo o sujeito numa perspectiva sócio-histórica. A psicologia Social, de
perspectiva crítica sistematiza a realidade a partir de alguns pressupostos epistemológicos:
a) busca compreender a realidade numa perspectiva de produção social e não como uma
verdade real, concreta e absoluta a ser apreendida; b) procura analisar a realidade numa
perspectiva histórica; c) localiza na sociedade relações hierárquicas de poder entre os
fenômenos historicamente dicotomizados; d) procura localizar discursos ideológicos na
produção científica; e) busca desverticalizar as relações estabelecidas entre os vários
campos de conhecimento humano; f) procura estabelecer a construção de conhecimento
numa preocupação incessante com a transformação social; e g) compreende a interação
entre sujeito e objeto numa perspectiva relacional, criticando a pretensa neutralidade
científica. Entender a paternidade nesse contexto implica permear os estudos de identidade
sexual, relações de gênero e as construções histórico-culturais da masculinidade e do
homoerotismo.
Este trabalho foi divido em três capítulos para melhor elucidação didática da
problemática a ser estudada. O primeiro capítulo traz uma historicização das práticas
homossexuais ao longo da história e das representações construídas acerca dessas
práticas, acompanhada de uma crítica à patologização da homossexualidade. O segundo
capítulo discorre sobre o conceito de identidade e suas possíveis articulações com a
sexualidade e a identidade sexual, numa perspectiva sócio-histórica. O terceiro capítulo se
debruça no entendimento da paternidade e da parentalidade, pensadas a partir da categoria
de gênero. E, por fim, o quarto capítulo que apresenta o percurso histórico do saber
17
científico e suas implicações para compreensão da realidade. Ainda neste capítulo, é
apresentada a metodologia de coleta e análise dos dados da pesquisa.
18
2 HOMOEROTISMO: CRÍTICA À PATOLOGIZAÇÃO DA HOMOSSEXUALIDADE
2.1 Homossexualidade: historicização das relações de opressão
Para melhor compreender as práticas homossexuais e os significados a elas
atribuídos, faz-se necessário conhecer o seu percurso ao longo da história e a leitura que as
instituições sociais como a ciência, a religião e a filosofia, em diálogo com o saber popular,
construíram acerca dessa realidade.
Araújo (1999) faz um panorama histórico da sexualidade, situando também a
percepção das práticas homossexuais ao longo do tempo. Já na Grécia antiga, encontramse registros de práticas homossexuais. A pederastia era um costume praticado nesse
momento histórico onde, um homem tomava um menino já inserido na puberdade como
discípulo e, ensinando-o todos os preceitos intelectuais e profissionais, recebia em troca
carinho e afeto. Nessa mesma época, em Roma, as práticas homossexuais não recebiam
nenhum tipo de empecilho ou repressão, apesar de não terem o mesmo significado refinado
que na Grécia.
Com a propagação do Cristianismo, o sexo passou a ter conotação de pecado e,
com os escritos de Santo Agostinho contrapondo a virtude ao vício, quaisquer práticas
sexuais que não atendiam, exclusivamente, a necessidade de procriação, eram expurgadas
e condenadas. Inicia-se aqui um grande período de repressão sexual, que teve impacto e
ascensão na Idade Média e atingiu seu ápice com a formação da classe burguesa no século
XII (ARAÚJO, 1999).
Para a igreja, era importante manter a estrutura familiar intacta já que ela se
mostrava extremamente eficaz para manter a vigilância e controle dos indivíduos. As
cerimônias religiosas se dispunham de ritos extremamente disciplinares e seu caráter
dramático advertia a população quanto à transgressão das leis divinas e à conjuração do
19
pecado sexual. A Inquisição, por exemplo, que levou a julgamento várias mulheres,
homossexuais, loucos e “desviados” era uma cerimônia imponente que fazia alusão a Deus
como ser punitivo, de uma ira incontestável (PARKER, 1991). As termologias utilizadas pela
igreja, ao direcionar-se às práticas sexuais pecaminosas demonstram seu caráter
repugnante.
Chamavam o coito anal de “sodomia”, “tocamento desonesto”, “tocamento
torpe”, “pecado nefando”, “trabalho nefando” ou simplesmente “nefando”. Ao
pênis chamavam de “membro viril” e “natura”, ou “membro desonesto”
quando usado pecaminosamente. [...] “Abraçar” e “beijar” eram variantes
eufemísticas para a penetração anal, assim como “dormir carnalmente por
detrás” e “juntar suas naturas por diante” eram variações das posições
amorosas. “Agente” e “paciente” significavam os dois parceiros no coito
anal, sendo que o penetrado era também aquele que “usa do ofício de
fêmea” [...] (TREVISAN, apud PARKER, 1991, p. 114-115).
Como apresenta Parker (1991) ainda que a prática sexual entre pessoas do mesmo
sexo era repugnada, não havia tanto interesse em detectá-las. As pessoas que as
mantinham eram alvo de repressão social, mas não eram consideradas, inerentemente
diferentes das outras pessoas. Apesar disso, as elites utilizavam-se desse atributo para
classificarem-se como “superiores”. Isso mostra que, neste momento, as práticas
homossexuais tinham conotação bastante negativa, mas as mesmas não definiam ou eram
determinantes de uma personalidade (ou identidade) homossexual.
Adelman (2000) afirma que já nesse momento histórico (séculos XV e XVI) se
propagava um movimento de higiene social que legitimava a prática sexual do matrimônio e
estigmatizava quaisquer outros comportamentos diferentes, que se afastavam dessa norma
e os classificavam como pecaminosos. Ainda assim, tinha-se uma valoração dessas práticas
já que algumas eram consideradas menos transgressoras do que outras.
Aquilo que hoje conhecemos por “o duplo padrão” – a aplicação de critérios
de moralidade diferenciados – criava tolerâncias e punições diferenciados
que envolviam questões de gênero, classe e raça. Por exemplo, permitia
aos homens uma licença para atividade heterossexual fora do casamento
que era negada às mulheres (ADELMAN, 2000, p. 165).
20
Adelman (2000) diz ainda que no início do século XIX um outro discurso se
estabelece no cenário político, na tentativa de explicar o fenômeno da homossexualidade. O
saber médico-científico empreendeu vários estudos para se chegar à explicação das
manifestações e causas do homossexual, e propor medidas terapêuticas e medicamentosas
a esses sujeitos. Este empreendimento científico estava vinculado ao movimento de higiene
social que buscava vigiar os comportamentos sexuais dos espaços urbanos e erradicar as
práticas tidas como desviantes. Paralelamente, estudos de diversos campos do saber como
a biologia, a sexologia (nova ciência do século XIX que atendeu aos interesses positivistas
em determinar a tipologia dos comportamentos sexuais) e a própria medicina debruçavamse na tentativa em definir os padrões de normalidade e de classificação das patologias.
Ainda assim, alguns estudiosos da área tentaram provar que a homossexualidade
possuía um caráter de “inversão sexual natural” ou congênita, a qual não se poderia lutar
contra. O termo homossexualidade, possivelmente foi utilizado publicamente, pela primeira
vez em 1869, por Karl Kertbeny, escritor austro-húngaro, na tentativa de incluir nas
discussões políticas da Alemanha a reforma sexual, revogando, principalmente, as leis antisodomitas.2 O sentido dado a essa palavra (homossexualidade) estava carregado do
esforço, muito propagado naquele momento, em definir as formas e tipos, normais e
anormais, de comportamentos e identidades sexuais (WEEKS, 2001, p. 62).
A partir daí a homossexualidade foi sendo produzida, necessariamente, como
comportamento patológico. Conseqüentemente a heterossexualidade alcançou sua
hegemonia, naturalizando-se como identidade sexual privilegiada.
A
homossexualidade
(na
verdade
homossexualismo)
foi
inserida
no
CID
(Classificação Internacional de doenças) e conseqüentemente suas descrições, sintomas,
manifestações, formas de diagnósticos e possíveis tratamentos. Além das classificações
médicas, restaram ainda várias representações negativas, oriundas do emparelhamento do
homossexual
2
à
comportamentos
também
inseridos
na
categoria
de
sodomia
Weeks (2001) explica que, nesse momento, toda atividade sexual entre pessoas do mesmo sexo
inseria-se na classe de sodomia, que não representava um estado de alguém, especificamente. Era
considerado como potencial de qualquer indivíduo que estivesse enveredado no pecado.
21
(transsexualismo,
sadismo,
masoquismo,
exibicionismo
e
outro
comportamentos
considerados como “perversões”) que fizeram com que as práticas homossexuais se
confundissem com essas outras. A junção de pecado e doença, perversão e patologia
permeou toda a construção da “personalidade homossexual” como desvio.
Ainda na segunda metade do século XX, podemos encontrar teóricos que
reproduzem o discurso médico-científico moderno acerca da homossexualidade. Vários
autores acreditam numa possível cura para os homossexuais. “Os clínicos [...] apresentam
provas convincentes de que a homossexualidade é uma condição potencialmente
reversível” (MARMOR, 1973, p. 26).
Um fragmento do texto de Hooker (1973) demonstra com clareza a concepção
comungada nesse período acerca do tema. Tal concepção justifica a escassez de debates e
produções científicos nessa dimensão já que
[...] tradicionalmente, o comportamento homossexual adulto foi considerado,
como psicopatologia individual, um domínio próprio do clínico; como
patologia social, campo do sociólogo ou antropólogo interessado nos
desvios sociais; como anormalidade biológica, preocupação adequada ao
endocrinologista ou ao geneticista (HOOKER, 1973. p.78).
Na obra de Oraison (1977), apesar de tentar tecer uma concepção menos radical
ainda mantém a posição de que a homossexualidade foge à normalidade. “Nesse sentido, é
indiscutível que a situação homossexual é uma anomalia: do ponto de vista estatístico, ela
se verifica em apenas 7 a 8% no máximo da população” (ORAISON, 1977, p.52).
Com o início da modernidade, várias mudanças foram desencadeadas nas
concepções de sexo e sexualidade, mas permanecerá, na ciência, a dicotomia entre
homossexualidade e heterossexualidade. Longe de ser apenas dicotomia, essa relação
acaba por reproduzir o modelo da racionalidade moderna que, ao definir o que é e como
chegar à razão exclui o diferente (o irracional), assim como as práticas e saberes que se
distanciam desse modelo (SANTOS, 1987).
22
2.2 Homoerotismo: novas linguagens diferentes identidades
Na metade do século XX, com os novos movimentos sociais, mais especificamente
com os movimentos feministas, iniciou-se um questionamento sobre o papel da mulher na
sociedade. O Movimento de Libertação Gay contraiu dimensões políticas, contribuindo para
vários estudos de sexualidade (ARAÚJO, 1999). Os movimentos feministas inseriram no
cenário político mundial discussões que possibilitaram a problematização das diferenças
sexuais, até então tidas como naturais, propondo formas diferenciadas de ver as relações
de gênero e apontando a existência de dispositivos de poder que legitimam e se apoderam
dessas interações entre homens e mulheres, bem como comportamentos “normais” e
“anormais”. “As formas “tradicionais” (igreja, família, comunidade) e “modernas” (o Estado, a
medicina e a psiquiatria) de regulação da sexualidade começaram a ser contestadas
ativamente, através da política sexual de diversos grupos que sofriam a ação desses
sistemas [...]” (ADELMAN, 2000, p. 167).
Atualmente, o sentido atribuído à preferência por relacionamentos afetivos com
indivíduos do mesmo sexo, não possui os mesmos fundamentos ou as mesmas origens.
Alguns teóricos dizem que a orientação está voltada para fatores naturais que fogem ao
alcance do indivíduo. Outros já dizem que é atributo de própria escolha, motivado por
fatores psicológicos e sociais (TARNOVSKI, 2004).
Nos últimos anos, novas concepções acerca das práticas homossexuais vêm
surgindo no cenário científico, a partir da crítica à modernidade e ao paradigma tradicional
da ciência. Concepções estas, voltadas para uma construção psicossocial da identidade
homossexual.
Foucault (1986) subverte a linha de pensamento hegemônica de sua época,
construindo interpretações alternativas e uma possibilidade diferente de analisar a
homossexualidade. Segundo ele,
23
[...] sexualidades periféricas provocam a incorporação das perversões e
nova especificação dos indivíduos [...] É necessário não esquecer que a
categoria psicológica, psiquiátrica e médica da homossexualidade constituise no dia em que for categorizada menos com um tipo de relação sexual do
que como uma certa qualidade de sensibilidade sexual [...] (FOUCAULT,
1986, p.67).
As teorias foucaultianas inseriram, através do pensamento filosófico, uma série de
discussões nas pautas científicas. O desenvolvimento de suas idéias foi de extrema
importância para a contraposição da sexualidade à noção biologicista e patologizante que
predominou no século XIX e grande parte do século XX. Foucault discute a sexualidade, e
conseqüentemente a homossexualidade, não do ponto de vista privado, como um elemento
da dimensão individual, mas como um dispositivo de controle e poder, utilizado e propagado
pela dimensão pública. As obras de Foucault representam uma tentativa de oferecer às
discussões acerca da sexualidade, um caráter político, entendendo-a como instrumento de
massificação e submissão a normas, regras e imposições sociais.
Weeks (2001) percebe que a categoria ‘homossexual’ é construída na tentativa de se
definir as leis naturais do que normalmente era visto como patologia. A homossexualidade
tornou-se então uma “categoria científica e sociológica [...] construindo a idéia de uma
natureza distintiva e, talvez, de uma natureza exclusivamente homossexual”. A partir daí
esse autor oferece o olhar de que “a nova história da homossexualidade é uma história de
identidades: sua emergência, complexidades e transformações” (WEEKS, 2001, p.69).
O emparelhamento da homossexualidade com a categoria anormal, perversa e
desviante causou uma série de impossibilidades nas reformulações científicas, sociais e
culturais das práticas homossexuais. Com o advento da AIDS, a discriminação do gay e da
lésbica retoma fortemente seu curso, ao se acreditar que essa moléstia estava diretamente
ligada
à
homossexualidade.
Ainda
que,
antes
do
aparecimento
da
AIDS,
a
homossexualidade era considerada por muitos como um arranjo sexual alternativo, que
romperia com a norma heterossexual burguesa, na década de oitenta, as opressões e os
ataques retornam nos debates promovidos acerca dessa temática (ARÁN; CORREA, 2004).
24
A homossexualidade inicia, na contemporaneidade, um percurso diferenciado quanto
à sua reconstrução, a partir do deslocamento de estudos e pesquisas que lançam mão da
dimensão política na tentativa de melhor compreender esse fenômeno. Mais do que um
impulso sexual, uma opção, uma orientação, a homossexualidade começa a ser entendida
como movimento contra-hegemônico às normas sociais pré-definidas. Nesse sentido,
conforme dizem Arán e Corrêa (2004), esse movimento é causador de conflitos e incômodos
na sociedade, já que se revolta contra o pacto de invisibilidade traçado ao longo da história.
Para tal, ainda são proferidas manifestações tradicionalistas e ortodoxas, na tentativa de se
manter a ordem e a lógica de controle social.
Jurandir Freire Costa, em sua obra intitulada “A inocência e o vício” (1992), discorre
também sobre determinados aspectos da homossexualidade masculina. Sua tentativa
consiste em demonstrar que a categoria homossexual, da forma que é concebida
atualmente, é uma construção histórico-cultural, norteada pela noção pejorativa de desvio.
Ele também defende a concepção que demonstra a necessidade histórica em definir o
sujeito homossexual a partir de suas práticas sexuais e que a as atribuições dadas a esses
sujeitos tentam, de qualquer forma, atribuir-lhes uma identidade específica. Assim, seu
principal objetivo é
[...] mostrar que o “homem homossexual” nada mais é que uma realidade
lingüística, e não uma realidade natural. É uma forma de subjetividade que
como qualquer subjetividade pode ser historicamente circunscrita em seu
modo de expressão e reconhecimento. E, assim como em épocas
precedentes outras crenças lingüísticas conferiram foros de realidade
natural ou universal a certas formas de subjetivação, em nossa época
fizemos da “homossexualidade” uma “realidade psíquica e sexual” que nos
parece como um modo de ser do sujeito, natural e universalmente
necessário, e não culturalmente arbitrário (COSTA, 1992, p. 23).
Partindo
da
noção
de
que
“vocabulários
diversos
criam
ou reproduzem
subjetividades diversas”, Costa (1992) critica as concepções patológico-classificatórias da
homossexualidade, apresentando o conceito de homoerotismo. Para ele “a identificação
sócio-sexual é produto do imaginário histórico. Nem a fenomenologia da atração
homoerótica, nem a singularidade dos processos fantasmáticos levaram-me a acreditar na
25
existência de uma estrutura psíquica comum a todos esses sujeitos [...]” (COSTA, 1992,
p.82).
É importante justificar o uso do conceito ‘homoerotismo’, proposto por Costa (1992)
já que na modernidade o verbete utilizado para referir-se ao sujeito que mantém relações
sexuais e amorosas com alguém do mesmo sexo e sua condição, é 'homossexual’ e
‘homossexualidade’, respectivamente. A menção a esse termo está pautada na tentativa de
des-construção das representações, já referenciadas anteriormente, a que remete o uso da
palavra homossexualidade e seus derivados, como estratégia para tecer à crítica à sua
patologização. Contudo, não se pretende substituir uma pela outra, nem ao menos propor
uma hegemonia para o termo homoerotismo.
Ao construir uma crítica a patologização da homossexualidade, é preciso muita
cautela para não inverter o discurso opressor, propondo, ainda que sutilmente, a
marginalização das categorias hegemônicas. Ao contrário, é preciso promulgar a
diversidade sexual como norte das pesquisas e intervenções científicas, assim como o
fazem a maior parte das bandeiras de luta GLBTT. As políticas afirmativas acabam por
exercer um papel fundamental no compromisso histórico com as categorias minoritárias,
ainda que os elementos dificultadores estejam longe de ser apenas a escassez de políticas
públicas.
Conforme Antonio Nieto (2003) a construção de um pensamento que privilegie a
diversidade sexual tem como principal obstáculo, as representações naturalizadas que
circulam na sociedade.
El desarrollo gradual de los derechos de las minorías sexuales tiene delante
un frente de difícil penetración: la “impermeabilización” del tejido social. Es
un frente que, [...] está provisto de dos cabezas. Una, la cicatería de las
políticas ejecutiva y legislativa de los distintos gobiernos democráticos (por
no citar, obviamente, los dictatoriales) en torno a los derechos sexuales de
las personas. Otra la propia capa impermeable de sus representados. La
sociedad que mira a las minorías como “otros”, no sujetos a derechos; la
llamada, redundantemente, a mi juicio, sociedad civil. La sociedad “incivil”
de Foucault (ANTONIO NIETO, 2003).
26
Diante de todas essas representações construídas ao longo da história e das formas
que a sociedade construiu em lidar com a homossexualidade, é perceptível que, ainda hoje,
o homoerotismo é destituído de uma série de direitos, sendo banido em circular por uma
série de espaços (geográficos e sociais). Uma série de papéis, funções e privilégios que
foram construídos em articulação com a família burguesa, com a norma heterossexual, com
a noção de masculinidade e com o padrão de normalidade foram sendo retirados do
horizonte de possibilidades das relações homoafetivas, segregando ainda mais essa
categoria.
È importante, na tentativa de compreender essa segregação e as estratégias de
enfrentamento produzidas para combatê-la, conhecer as implicações identitárias que essa
construção imprime nos sujeitos e de que forma os homens que mantêm relações sexuais
com iguais articulam sua identidade sexual as reais dificuldades e possibilidades imputadas
pela sociedade.
27
3 SEXUALIDADE E PRODUÇÃO DE IDENTIDADES
3.1 Identidade: Um breve percurso histórico
Assim como a noção de sexualidade, o conceito de identidade é abordado de
maneiras diferentes por vários autores, podendo ser contemplado como elemento de
construção social como também fragmento individual e subjetivo.
Farr (1999), ao historicizar alguns pressupostos da psicologia social moderna, aponta
o principal objeto que mobilizou os estudos em psicologia social: a relação indivíduo e
sociedade. Nesse contexto, variados autores discorreram sobre essa temática, buscando
compreender tal relação e encontrar um possível ponto de articulação entre essas duas
dimensões. Em sua obra, Farr (1999) cita diversos teóricos que, com objetos, métodos e
concepções diferenciadas, contribuem fortemente para a construção dos pressupostos da
Psicologia Social Contemporânea, bem como para o conceito de identidade.
Esses teóricos, de certa forma, buscam alcançar uma possível interpretação para a
existência de um tecido social e, ao mesmo tempo, de uma individualidade. Sant´Ana
(2004), fazendo uma releitura das obras de G. H. Mead, afirma que este autor discorre sobre
a formação do sujeito, evidenciando-a nas variadas formas de interação social entre os
indivíduos e na construção de significados e regras. Depois de instituídas essas regras e
significados, os mesmos irão preceder as interações, ao oferecer previamente, diversas
representação para as situações cotidianas. Para tanto Mead constrói a noção de self, no
início do século passado.
Em seu texto, Sant´ana (2004) diz que, para Mead, o self se configura na autonomia
que tem o sujeito, em relação às regras e imposições sociais e na sua capacidade para
tomada de decisões no cenário público. Ele (o self) está em constante transformação,
possibilitada pelas experiências e interações que o indivíduo vivencia com seu meio social.
28
É o self, o organizador dessas experiências no sujeito, num movimento reflexivo que tende a
orientar sua conduta em suas relações. Ele surge no encontro de indivíduos, no ceio dos
processos de interação/socialização.
Percebe-se que, na obra de Mead, existe uma tentativa em conceber a noção de
sujeito (ainda que Mead não use esse conceito) numa perspectiva relacional, dando à
interação social um lugar privilegiado na formação dos indivíduos (SANTA´ANA, 2004).
Outro autor que contribuiu para os estudos de identidade foi Erving Goffman (1988)
ao criar sua teoria dos papéis e a noção de estigma nas interações sociais. Para este autor,
a noção de “eu” (ou identidade) é construída a partir das experiências e conhecimentos que
os outros detêm sobre o sujeito. Essas experiências e conhecimentos prévios possibilitam,
na dimensão pública, a exposição individual e a manipulação de estigmas. Goffman (1988)
já fazia distinção entre identidade pessoal e identidade social, dizendo que a primeira está
ligada às experimentações subjetivas que o sujeito tem com a manipulação e o estigma e a
segunda se articula com a experiência, propriamente dita, da estigmatização.
Farr (1999) cita também como grande contribuição para a construção da noção de
identidade os pressupostos de Berger e Luckmann, quando os mesmos atribuem a esse
conceito um caráter também relacional com a realidade social. Esses autores articulam a
construção da realidade nas dimensões objetiva e subjetiva, interpondo-se a partir dos
movimentos de interiorização da realidade social e exteriorização de si próprio nessa
realidade. A linguagem nesse contexto torna-se o instrumento mais importante de
comunicação entre as duas realidades já que é através dela que ocorrerão a objetivação e
subjetivação da realidade social e pessoal.
Além desses teóricos, alguns outros contribuíram para o desenvolvimento das teorias
psicossociais acerca da identidade. Nesse contexto, diversas correntes se constituíam na
Europa e nos Estados Unidos, articulando alguns pressupostos hegemônicos com novas
visões acerca da relação indivíduo e sociedade: a psicanálise, a psicossociologia, a
fenomenologia, o institucionalismo, a teoria das representações sociais, etc.
29
Na segunda metade do século XX, essas obras foram re-lidas e re-interpretadas por
alguns autores que tentavam construir novos rumos para a Psicologia Social, especialmente
a latino-americana. Tais re-interpretações se distanciaram de concepções internalistas e
biologicistas acerca da identidade, articulando esse conceito com outras categorias de
análise como etnia, geração, gênero, sexualidade, raça/cor, etc.
Ciampa (1994) propõe a concepção de identidade ligada à noção de metamorfose.
Segundo este autor a identidade é formada durante toda a vida e está em constante
movimento de mudança. Ela transforma e é transformada por diversos elementos que são
experienciados nas interações sociais. Ciampa (1994) trabalha o conceito de identidade,
abordando sua dimensão processual, em detrimento da idéia de identidade como produto
final, a ser alcançado em um determinado momento da vida. A identidade como processo
também é apontada por Hall (2003), ao apresentar a construção da identidade cultural na
pós-modernidade.
A identidade pessoal é aquela construída ao nível do indivíduo, distinguido de outros,
sujeito nomeado, único em sua historicidade. Já a identidade social é construída a partir de
noções de grupo social, que vão oferecer ao indivíduo suas trajetórias. A identidade social é
produzida a partir da identificação do indivíduo com os outros sujeitos que ele considera
indispensável em sua socialização. Portanto, não existe possibilidade da identidade pessoal
construir-se desvinculada da identidade social, percepção essa que supera a falsa dicotomia
entre essas duas dimensões (SILVA C., 1995; JACQUES, 1999).
Silva, Hall e Woodward (2000) tecem um olhar acerca da identidade, que é
construída a partir da diferença. Os valores e concepções de si vão se construindo a partir
dos valores e concepções do outro. Na perspectiva da identidade construída pela diferença,
pode-se dizer que esta ocorre tanto por meio dos sistemas simbólicos quanto pela exclusão
social. Assim, “a identidade não é o oposto da diferença: a identidade depende da diferença”
(SILVA; HALL; WOODWARD, 2000, p.40).
Os padrões de diferença são estabelecidos, no âmbito social e no simbólico, a partir
de sistemas classificatórios que dicotomizam a realidade, dividindo-a pelo menos em dois
30
grupos opostos. Esses grupos geralmente representam o nós/eles, eu/outro. A partir daí, as
identidades são construídas partindo daquilo que ela não é ou não pode ser (SILVA; HALL;
WOODWARD, 2000). Essas dicotomias têm caráter valorativo e regulamentam os modelos
binários de bom/ruim, bem/mal, certo/errado, saúde/doença. Com modelos identitários que
prescrevem juízos de valor, as interações e instituições sociais estabelecem relações de
poder com o diferente, atribuindo-lhes representações e espaços específicos, geralmente de
caráter negativo e restritivo.
A identidade pode ainda dizer de amarrações de traços, idéias, características,
histórias. Tal concepção ressalta a identidade em seu caráter dialético já que implica
“malhas onde se alinham e desalinham projetos, individualidades, coletividades, vidas,
mortes, caminhos se construindo” (GROSSI, 1999, p.35/36).
Torna-se importante referenciar os períodos de socialização primária e secundária na
construção de identidades. A primeira corresponde ao momento da infância onde,
principalmente através da família, o indivíduo introduzirá os valores e regras da cultura. A
segunda é o momento onde o sujeito é colocado diante de qualquer outra entidade e,
geralmente, acontece, na escola, na comunidade, no trabalho, com os amigos, etc. A
Identidade nesse contexto torna-se um “... processo de construção complexo, configurando
a identidade como uma totalidade [...] num movimento de contínua integração entre os
vários papéis e dimensões vividos pelo sujeito em sociedade” (STENGEL, 2003).
Percebe-se nessa definição que a identidade representa elemento que se constitui
na relação, na interação. A construção identitária se estabelece numa perspectiva
constitutiva em relação à heteronomia dos sujeitos, mas não predomina na perspectiva
determinista, já que a autonomia desses sujeitos possibilita a re-significação desses valores
assimilados e o posicionamento (ainda que favorável) diante das normais sociais.
Um estudo realizado recentemente pelo antropólogo inglês Stuart Hall discorre sobre
a constituição identitária na modernidade tardia, contrapondo-a com a identidade fixa e
segura que se via nas identidades modernas. Para Hall (2003), vem acontecendo um
fenômeno, denominado como crise da identidade moderna, em que os sujeitos não formam
31
uma identidade estável e segura, conforme percebido em outros momentos. Uma série de
acontecimentos sócio-econômicos desencadeia elementos e processos diferenciados para a
formação dos sujeitos atualmente, culminando no que Hall (2003) chamou de
descentramento do sujeito moderno.
O descentramento do sujeito ocorre, segundo Hall (2003) a partir de cinco
importantes fatores: a) Tradição do pensamento Marxista; b) A descoberta do inconsciente
por Freud; c) O trabalho de Ferdinand de Saussure; d) As teorias do poder disciplinar de
Foucault; e e) O Impacto do Feminismo.
Esses cinco fatores estão intimamente ligados com o descentramento do sujeito
cartesiano, produzido no início da era moderna. Assim, o sujeito descentrado não possui
uma identidade estável e fixa, mas um emaranhado de identidades, potencializadas pelas
diversas experiências que a contemporaneidade nos apresenta. Essas idéias de Hall (2003)
vão de encontro com a trajetória das abordagens psicossociais acerca do conceito de
identidade, em Psicologia Social.
A identidade, como vista pelos autores mais contemporâneos, tem vinculação direta
com outras dimensões sociais, entrecruzando-se com outros elementos do sujeito. A
sexualidade é um desses elementos e, para este estudo, torna-se necessário conhecer as
possíveis articulações da identidade sexual com a vivência da paternidade em homens
homossexuais.
3.2 “Sexualidades” e identidade: possíveis arranjos para a identidade sexual
A Organização Mundial de Saúde (1975) define sexualidade como “energia que
motiva a encontrar o amor, contato e intimidade e se expressa na forma de sentir, nos
movimentos das pessoas e como estas se tocam e são tocadas”. Tal conceito, diferente do
tradicional, referenciado nas manifestações biológicas da sexualidade, abrange melhor
32
algumas dimensões somáticas, psicológicas e sociais a que estão submetidos o
desenvolvimento e vivência da sexualidade.
Na tentativa de exposição das concepções construídas acerca da sexualidade, este
tema será estudado e abordado por muitos autores como sendo uma construção sóciohistórica. Segundo Parker (2001), as teorias construcionistas sobre a sexualidade colocam
em questão as posições essencialistas e internalistas da sexualidade, baseadas na idéia de
que esta dimensão é constituída por elementos culturais e históricos. O surgimento do
interesse pelos estudos em identidade sexual está vinculado aos empreendimentos em
conhecer as raízes da homossexualidade masculina, ainda que, posteriormente, outros
autores apontaram a necessidade em se promover o estudo separado desses dois objetos.
Piscitelli, Gregori e Carrara (2004) percebem que a sexualidade pode ser vista de
vários prismas, ao dizer que
[...] pode ser considerada em relação à família e/ou ao parentesco, pensada
como constitutivo da subjetividade e/ou da identidade individual e social,
concebida como representação, desejo ou, simplesmente, como atividade
ou comportamento (PISCITELLI; GREGORI; CARRARA, 2004, p.13).
Heilborn (1999) defende a relatividade sexual ao dizer que a sexualidade não tem o
mesmo grau de importância para pessoas diferentes. Este grau irá variar de acordo com os
fenômenos sociais que se originam no conceito de sexualidade que cada grupo social irá
definir e nos modelos sexuais, hegemônicos ou não, que tal grupo lhe apresenta como
possibilidade.
A cultura é responsável pela transformação de corpos em entidades sexuais, a partir
da rede social de significados perpassados pelos códigos de gênero, orientação sexual, e
escolha objetal. Assim, valores sexuais vão modelando, estruturando e dimensionando
desejos e formas de vivência da sexualidade, bem como dando origem a carreiras amorosas
(HEILBORN, 1999, p.40).
Daolio (1995), citado por Caridade (1999) também enfatiza a sexualidade a partir dos
significados dados ao corpo. Segundo ele “existe um conjunto de significados que cada
33
sociedade escreve no corpo de seus membros ao longo do tempo, significados esses que
definem o que o corpo é de maneiras variadas” (DAOLIO, 1995 apud CARIDADE, 1999,
p.17).
Foucault (2001) faz uma leitura da sexualidade enquanto um dispositivo utilizado
para a massificação dos indivíduos. No século XIX, a preocupação com o sexo se fixou,
basicamente, nas classes que denegriam sua visão a partir de suas práticas, tidas como
perversas. Para ele, esse mecanismo possui outras finalidades, senão a de purificar tais
práticas. Mais do que isso, “o dispositivo da sexualidade tem, como razão de ser, não o
reproduzir, mas [...] penetrar nos corpos de maneira cada vez mais detalhada e controlar as
populações de modo cada vez mais global” (FOUCAULT, 2001, p.101).
A sexualidade, em seu caráter histórico-cultural, vai construindo arranjos e
apropriando-se do corpo enquanto instrumento para sua reprodução. A identidade sexual vai
se editando a partir desses elementos onde, a sexualidade é “uma invenção histórica, a
qual, naturalmente, tem base nas possibilidades do corpo [...]. Isso tem profundas
implicações para nossa compreensão do corpo, do sexo e da sexualidade [...]” (WEEKS,
2001, p.40).
Os códigos e identidades sexuais que tomamos como dados, inevitáveis e
“naturais”, têm sido freqüentemente forjados nesse complexo processo de
definição e auto-definição, tornando a moderna sexualidade central para o
modo como o poder atua na sociedade moderna (WEEKS, 2001, p.42).
O que Adelman (2000) chamou de institucionalização da sexualidade nada mais é,
do que a apropriação dessa dimensão pelos discursos institucionais hegemônicos (religião,
ciência, política) para definir padrões de comportamentos ideais e, conseqüentemente,
legitimar as relações de opressão estabelecidas com as categorias que se distanciam
desses modelos. A história mostra que esses processos são plenamente mutáveis,
alterados pelas atividades sociais, culturais e políticas das sociedades.
A presença de variados discursos sobre a sexualidade, a partir do início do século
XIX, conferiu às práticas homossexuais um caráter identitário, especificamente desviante.
34
Após o discurso hegemônico da ciência que patologizou a homossexualidade, iniciou-se um
grande processo de politização da sexualidade, influenciada pela produção do indivíduo
moderno e pela intensificação do trabalho num cenário, até então, privado e familiar. Esta
produção abriu espaço para a construção da idéia de sexualidades individuais, íntimas,
mesmo quando estas iam contra uma norma social vigente. Esse fenômeno mobilizou
pessoas e instituições que, sentindo-se ameaçados em seu lugar de poder, construíram
novas estratégias de vigilância à transgressão e políticas disciplinares das práticas sexuais.
Weeks (2001) estabelece três tipos de processos identitários no que concerne à
sexualidade, que podem ser dadas a partir de abordagens metodológicas diferenciadas: a
identidade como destino que expressa a idéia de um corpo que carrega em si uma verdade,
uma sexualidade imutável e verdadeira; a identidade como resistência que emerge
enquanto um movimento de protesto aos valores e modelos reproduzidos pela sociedade e;
a identidade como escolha, onde o indivíduo é levado, por sua própria vontade ao desejo e
vivência de sua sexualidade.
Contudo, “sentimentos e desejos sexuais são uma coisa, enquanto que a aceitação
de uma posição social particular [...] é outra. Não existe nenhuma conexão necessária entre
comportamento e identidade sexual” (WEEKS, 2001, p.72).
Para Weeks (2001) é preciso também compreender a identidade sexual enquanto
uma categoria que se constitui em articulação com outras dimensões como classe, gênero,
etnia, raça/cor, etc. Quanto ao gênero, por exemplo, é perceptível que as classificações e
definições da identidade sexual sofrem profundos impactos nas concepções de homem e
mulher na sociedade e nas relações de poder que estes estabelecem entre si. Assim, o
referencial de ativo/passivo, articulado com a noção de homem/sujeito e mulher/objeto
demonstra que as identidades sexuais reproduzem uma lógica de dominação e poder
(ANJOS, 2000; ADELMAN, 2000).
A divisão binária entre comportamento ativo/passivo é reflexa da norma
heterossexual em que, diferenças entre homens e mulheres são naturais. Esse caráter
naturalista acaba se perdendo na homossexualidade já que, nessa perspectiva, há uma
35
subversão da norma de dominação. Essa idéia foi sendo construída historicamente e a
natureza homossexual masculina foi sendo vinculada à natureza feminina, passível então de
ser categorizada como grupo inferior (ANJOS, 2000). É importante lembrar que, “dadas as
crenças populares ocidentais sobre a relação unidimensional entre sexo e gênero, esse
modelo freqüentemente funde a sexualidade com o gênero [...]” (PARKER, 2001, p. 128)
Bourdieu (1999) nos atenta para o conceito de dominação simbólica. Nesse contexto,
a identidade homossexual assimila a idéia de desvio, na medida em que absorve a prática
heterossexual como correta e percebe-se distanciado de tal norma. Essa idéia pode ser
comparada com o conceito de naturalização, tão revogado pelas teóricas feministas.
Além da categoria de gênero, determinadas posições sociais podem interferir
diretamente na constituição da identidade sexual. Esse fenômeno foi percebido na pesquisa
de Pollak, citado por Anjos (2000).
Entre os homossexuais mais velhos predominava uma experiência
escondida da sexualidade. Os entrevistados de idade intermediária em sua
pesquisa afirmavam a homossexualidade. Os mais novos não tinham
preocupação em esconder ou afirmar sua sexualidade, praticando-a de
forma “banal”. (POLLAK, apud ANJOS, 2000, p. 277 aspas do autor).
A posição social, a partir da classe, também pode ser delineadora da identidade
homossexual. Na mesma pesquisa de Pollak, foi detectada uma diferenciação entre a
representação e a vivência da sexualidade em camadas distintas.
Assim, a auto-identificação como bicha (pédé) estaria relacionada às
chamadas “classes populares”. É nelas que há a identificação entre
homossexualidade e feminilidade, o que se observaria nas escolhas
profissionais (cabeleireiro, garçom, cozinheiro), que não correspondem às
profissões manuais masculinas, na auto apresentação corporal (a bichalouca, ou, a manutenção da fachada heterossexual, o bofe brasileiro) e no
exercício da dicotomia ativo/passivo5. Entre as classes superiores, a
homossexualidade também seria identificada com o “feminino”, mas seria
uma condição menos enfatizada: haveria a valorização da discrição,
acompanhada de uma certa aceitação social e um encaminhamento para
profissões artísticas e intelectuais, relacionadas ao mesmo tempo à
sensibilidade e à “distinção”. São os homossexuais masculinos provenientes
das chamadas “classes médias urbanas” (as quais estão implicadas na
difusão da educação e na liberalização dos costumes) que vão procurar
romper com a percepção do homossexual como feminino, com a figura do
gay. Fazem isto a partir do estabelecimento de relações igualitárias, nas
36
quais os papéis ativo/passivo não existem como relação de subordinação.
Ao contrário, as relações sexuais seriam vistas como fontes de prazer,
sendo valorizadas por isto. O gay, de alguma forma, rompe com a
representação do homossexual masculino como inferior, feminino; com o
gay, a imagem do homossexual é redefinida como masculina, adotando os
signos da masculinidade (corpo musculoso, bigode, calças justas)
(POLLAK, apud ANJOS, 2000, p. 277-278 grifos do autor).
A partir da ótica construcionista, o comportamento sexual é visto como intencional,
embora esteja totalmente articulado com negociações realizadas nas interações sociais.
Tais interações são mais importantes aos estudos da sexualidade, nessa perspectiva, do
que o comportamento sexual. Dizem de carreiras sexuais, estruturada em determinados
cenários culturais e organizada a partir das possibilidades de interação sexual. (PARKER,
2001).
O que as idéias de Parker (2001), e outros autores apresentam para os estudos de
identidade sexual é que ela se distingue de comportamento, desejo e performance. Todas
essas
dimensões
estão
intimamente
ligadas
entre
si,
mas
podem
apresentar
direcionamentos diferenciados e até antagônicos, a partir das interações que o sujeito
estabelecer.
O conceito de identidade sexual é muito utilizado como orientação sexual,
especialmente, pelo discurso produzido pelo Movimento GLBTT. Essas duas expressões se
equivalem e possibilitam a relativização, em relação às performances sexuais dos sujeitos.
Pensando na identidade sexual como uma construção social, que se articula numa
perspectiva processual, iremos fazer alguns apontamos acerca da paternidade e sua
articulação com a categoria de gênero.
37
4 PATERNIDADE: ARTICULAÇÕES COM “AS MACULINIDADES”
Juntamente com família nuclear, a paternidade se delimitou a partir do matrimônio,
sendo possível apenas após o casamento entre homens e mulheres. Quaisquer arranjos ou
identidades que se afastavam daquelas necessárias para a constituição da família burguesa
estavam privadas, no imaginário social, em exercer tal função. A paternidade torna-se aqui
elemento essencial de análise, a partir da categoria de gênero, já que representa quesito
importante para a constituição da masculinidade, dada a vinculação histórica que essas
duas dimensões articularam em seu processo constitutivo.
4.1 O gênero como categoria analítica
Ao longo da história, as sociedades foram produzindo saberes e interpretações, na
tentativa de atribuir sentido às relações estabelecidas entre homens e mulheres e as
diferenças existentes nessas relações. Esses saberes, de certa forma, apropriaram-se de
alguns discursos hegemônicos, elaborados pelas diversas áreas do conhecimento humano
na história para elaborar os significados atuais das relações entre homens e mulheres.
Tais relações, caracterizadas pela hierarquização e superioridade masculina,
marcaram um cenário de opressão à mulher que, em diferentes momentos, foi vista como
inversão do homem, estudada como pessoa subdesenvolvida em relação à estética
masculina ou destinada à execução de papéis e funções consideradas menos importantes.
(NOGUEIRA, 2001)
A partir dos Movimentos Feministas, numa tentativa de desnaturalizar esses lugares
e possibilitar uma nova inserção da mulher numa sociedade mais justa e menos opressora,
aprofundaram-se os estudos, a partir da categoria de gênero.
38
Esse fenômeno, desencadeado principalmente pelos Movimentos Feministas, não
demonstra que as relações de gênero surgiram nesse momento histórico, mas afirma que:
requiere aceptar que la perspectiva de género sigue teniendo mucho que
decir sobre las sociedades occidentales contemporáneas. Para centrar la
cuestión, un posible punto de partida es la hipótesis de que las normas, las
diferencias y las estructuras de género no son un fenómeno nuevo, pero
que sin duda sus contenidos se han visto sensiblemente afectados por las
transformaciones de la modernidad (NÚÑEZ, 2003, p.227).
A categoria de gênero na Psicologia Social, a partir da crise de 70, irá trilhar
caminhos diferenciados, articulando-se com os paradigmas críticos da ciência e afastandose da preocupação inicial, fortemente influenciada pelo viés positivista, em compreender as
diferenças entre homens e mulheres numa perspectiva verticalizada e pretensões de
neutralidade (NOGUEIRA, 2001).
Um olhar antropológico da noção de gênero vai dizer que a partir da observação do
real obtêm-se uma operação lógica. Essa operação parte do “princípio da descontinuidade,
do que não é idêntico, inscrito na biologia” (HEILBORN, 1991, p.28). Portanto, as
representações simbólicas que se originam do gênero falam, antes de tudo, da
descontinuidade.
Santana, diz que
O gênero possui uma perspectiva relacional que vai além da gramática. Ele
existe para dar conta dos atributos específicos que cada cultura impõe ao
masculino e ao feminino, partindo do princípio que os lugares sociais e
culturais de cada um são construídos como a relação de poder entre
homens e mulheres, ou seja, hierarquicamente. Usar o termo gênero é, por
princípio, rejeitar o biologismo determinista implícito no termo sexo,
rompendo dessa forma com conceituações essencialistas (SANTANA, apud
CARVALHO e DIMENSTEIN, 2002, p.49).
A partir desse conceito, percebe-se que as variáveis sócio-culturais vão delimitando
as possibilidades do masculino e do feminino. Sendo assim, todos os papéis exercidos pelo
homem e pela mulher, tais como paternidade/maternidade, papéis sexuais, papéis
39
trabalhistas, etc, vão tomando diferentes formas, a partir do momento histórico e do contexto
cultural no qual estiverem inseridos.
Weeks (2001), percebendo a noção de gênero como uma divisão crucial para
demarcar as diferentes representações dos significados de homem e mulher, vem propor
que
o gênero não é uma simples categoria analítica; ele é, como as intelectuais
feministas têm crescentemente argumentado, uma relação de poder. Assim,
padrões de sexualidade feminina são, inescapavelmente, um produto do
poder dos homens para definir o que é necessário e desejável – um poder
historicamente enraizado (WEEKS, 2001, p.56).
Os padrões de gênero acabaram por delimitar estereótipos que “se tornaram tão
profundamente arraigados que passaram a ser considerados expressão das diferenças
biológicas entre os gêneros” (RAMIRES, 2000, p.40). A naturalização dessas expressões
acaba por construir modelos e estruturas de personalidade. Ao gênero feminino são
atribuídas características como passividade, dependência, afetividade, exclusividade no
cuidado da casa e dos filhos. No caso do gênero masculino, atribuem-se características
como atividade, racionalidade e independência.
As determinações sociais para os modelos sexuais não atingem somente o âmbito
relacional. Elas acabam agindo na dimensão corporal já que
[...] as normas regulatórias do “sexo” trabalham de uma forma performativa
para constituir a materialidade dos corpos e, mais especificamente, para
materializar o sexo do corpo, para materializar a diferença sexual a serviço
da consolidação do imperativo heterossexual (BUTLER, 2001, p. 154).
Portanto, a vivência homoerótica também é marcada por essas relações de poder, já
que fogem ao padrão determinado pela sociedade do que é ser homem e ser mulher e de
como estes devem vivenciar sua sexualidade.
Ramires (1997) vem propor que a categoria de gênero é articulada por três
dimensões.
A
atribuição
de
gênero
é
a
transmissão
de
valores
acerca
da
masculinidade/feminilidade que a sociedade irá exercer sobre o recém-nascido, baseando-
40
se nas características anatômicas. Identidade de gênero diz respeito à percepção estável de
pertencimento a um gênero ou a outro, sendo determinado pela atribuição de gênero. Por
último o papel de gênero que engloba as expectativas e exigências de comportamento
social atribuídos a homens e mulheres, delimitando os modelos a serem seguidos por estes.
Mais do que as diferenças entre homens e mulheres, o conceito de gênero se
articula com outras dimensões, entrepondo-se de forma decisiva na constituição de outros
papéis e funções na sociedade. O conceito de parentesco já foi estudado, ainda que numa
relação de influência, em distinção ao de gênero. Algumas feministas como Heiborn (1999)
e Piscitelli (1997) buscam compreender a construção de parentescos como um elemento
que se constituiu a partir dos referenciais de gênero. Essas duas categorias se constituem
paralelamente, já que ultrapassam a barreira do privado e agem diretamente no cenário
público.
Para Piscitelli (1997) é possível refletir sobre essas relações entre gênero e
parentesco, na medida em que as representações existentes acerca da função parental
articulam-se com as possibilidades do que é ser homem e mulher na sociedade. Ampliando
a reflexão, ao se pensar parentalidade para além das fronteiras familiares, percebem-se
várias articulações desse conceito, no que diz respeito à sexualidade, classe social, raça,
etc.
As possibilidades de ser pai, por exemplo, fogem à mera discussão biológica ou
familiar, propriamente dita, e toma contornos diferenciados nos limiares da orientação
sexual, das possibilidades em prover e de outros elementos que reforçam esse caractere na
sua dimensão pública.
Ainda assim, a representação que esse conceito tem no tecido social ainda mantém
vinculação com fenômenos naturais. “O processo de procriação como tal é visto como
pertencendo ao domínio da natureza, e não ao domínio da sociedade. Por outro lado, o
parentesco é visto como um arranjo social dos fatos naturais, conectando assim os dois
domínios” (COSTA, 2002, p. 343). A família, então, passa a ser considerada uma instituição
natural, especialmente nos moldes burgueses. Essa organização se torna insubstituível em
41
seu caráter controlador já que, estruturalmente, possibilita a vigilância da monogamia
feminina e o controle da sexualidade dos filhos. A mulher, no contexto familiar, está mais
suscetível ao controle masculino, já que se encontra no lugar que lhe foi conferido pelas
construções e representação acerca de seu papel. Tais dispositivos intensificam as relações
de opressão à mulher e a repressão sexual, legitimando a dominação masculina.
4.2 Ser pai: ser macho?
As literaturas que se debruçaram na historicização da família, ateram-se na
descrição e relato, especificamente, do exercício da maternidade. A relação mãe-filho/filha
sempre teve privilégio nas descrições literárias, visto que os dados acerca da história da
paternidade são escassos.
Atualmente, os estudos sobre paternidade têm aumentando gradativamente,
geralmente relacionados à adolescência e saúde reprodutiva. Esse aumento se dá, entre
outros fatores, à mudança de papel da mulher e, conseqüentemente, do homem na
sociedade, proveniente da inserção feminina no mercado de trabalho, das discussões
promovidas acerca dos papéis sexuais e da necessidade em se pensar estratégias de
inserção do homem nas políticas públicas. (LEVANDOWSKI, 2001; TRINDADE &
MENANDRO, 2002; BUSTAMANTE, 2005). Tais discussões foram possibilitadas a partir da
inserção de debates, pelos movimentos feministas e, posteriormente, pelos movimentos
GLBTT, que procuraram desnaturalizar os papéis de gênero, a partir da crítica à lógica de
dominação que se instaurou com a determinação social de tais papéis.
A paternidade foi descoberta há seis ou sete milênios, pelos egípcios e indoeuropeus. Até então, as sociedades organizavam-se em protofamílias centradas na mãe, os
ritos religiosos pautavam-se na fecundidade feminina e a prática sexual era marcada pelo
livre desejo (DUPUIS, apud RAMIRES, 1997).
42
O homem toma também um lugar diferenciado na estrutura da sociedade a partir das
guerras, tornando-se reis, chefes de família, senhores da sociedade. Mesmo com a
descoberta da paternidade, ainda não se faziam alusão desta com a função educativa, já
que tal função é anterior à paternidade (RAMIRES, 1997).
O modelo do pai-provedor, exercendo sua principal função no espaço
público, distante dos filhos/filhas, representante da autoridade e da lei, mais
temido do que respeitado e objeto de identificação idealizado (porque
longínquo e impalpável), foi sendo construído ao longo da história e
consolidou-se como patrimônio da família nuclear burguesa ou patriarcal
(RAMIRES, 1997, p.27).
Ramires (1997) ainda reitera que na burguesia, com a divisão dos papéis sexuais, o
homem tornou-se responsável pelos trâmites públicos e o cuidado dos filhos tornou-se
função exclusiva da mãe. Assim, a construção da representação do pai ausente e distante
intensificou seu processo de construção nesse momento.
É perceptível que as reformulações da vivência e representação da paternidade
acompanharam a ruptura gradativa, que se intensificou na alta burguesia, das dimensões do
público e do privado. Ao papel masculino, vinculado ao papel paterno, foram atribuídas as
funções de circular no mundo econômico, nos trâmites administrativos, nas articulações
trabalhistas, ou seja, nas relações sociais que se davam na cena pública.
Ao pai, aferiram também atributos como provedor financeiro da família e responsável
pelo sustento material dos filhos. Assim, trabalho remunerado se tornou um elemento
essencial para a consolidação da função de pai e para a sua manutenção na categorização
masculina. O cuidado corporal das crianças e a educação moral e afetiva estenderam-se,
conseqüentemente, à função materna.
A paternidade se diferencia da maternidade, na medida em que a construção
identitária da mãe passa por um viés do corpo. Conforme Piccinini et al (2004), o homem
não passa pelas experiências de gerar, parir e amamentar seus filhos. Isso faz com que sua
experiência seja diferente daquela vivencia pela mulher.
43
Esse fato observável foi, e é utilizado até hoje, para justificar a idéia naturalista
atribuída à função de maternar, de cuidar. Essa representação, assimilada inclusive pelas
mulheres, contribuiu para a intensificação do distanciamento dos pais da criação de seus
filhos e à aproximação da imagem da mulher aos atributos da natureza. Esse
distanciamento diz respeito não só à presença física, já que o homem passava mais tempo
fora de casa do que com a família, mas a um distanciamento afetivo, uma vez que oferecer
carinho, cuidado e educação se constituíram historicamente como atributos da mãe. A
racionalidade aferida ao homem fez com que a paternidade se articulasse com as idéias de
razão, sendo o responsável por levar ao lar os avanços culturais adquiridos no mundo
público. As nuances do mundo privado, eram de responsabilidade da mãe, vinculada ao
sentimento, ao “instinto de cuidar”.
Ainda assim, a vivência da paternidade lançou mão de justificativas biológicas para
se constituir como papel natural. Como mostra Costa (2002), em sua pesquisa realizada
com homens que procuravam tratamento para infertilidade, o fator biológico é de extrema
importância para a constituição da paternidade física. Os elementos como amor, educação e
afeto ficam a cargo da chamada paternidade moral, que é percebida, por exemplo, ao criar
filhos de outros homens.
A paternidade está vinculada à masculinidade, mas não da mesma forma que a
maternidade se articula com a feminilidade. A maternidade, para as entrevistadas da
pesquisa de Costa (2002), parece ser a extensão de um projeto que iniciou juntamente com
a própria vida da mulher. É como se ser mãe fosse realizar um sonho existente desde
sempre. No caso dos homens, eles contextualizam o desejo de ser pai, que é construído a
partir de um determinado momento e que tem mais vinculação com a concretização do
matrimônio e da descendência do que com um projeto do passado longínquo. (COSTA,
2002). Reitera-se aqui a importância da organização familiar que, diante de seus
dispositivos de controle, garantia ao homem a possibilidade da descendência, a certeza da
monogamia e, conseqüentemente, a certeza da existência de filhos legítimos (biológicos).
Ainda que algumas mudanças acerca das representações construídas por essa organização
44
tenham se aferido, até pouco tempo, a legislação legitimava essa relação ao garantir,
apenas ao homem, direitos relacionados à partilha e à propriedade de bens e heranças.
Ao afirmar que essas duas funções parentais são construídas de forma distinta, não
se pretende reproduzir esse discurso, mas, ao contrário, oferecer subsídios para a
“desnaturalização” dessa relação. Conceito este tão defendido pelas teorias críticas para a
erradicação das relações de opressão, especialmente pela categoria de gênero.
Ainda nos séculos XVIII e XIX, a sociedade passou por uma série de
desestruturações de ordem política e econômica (público) que influenciaram diretamente
nas relações familiares (privado), culminando no que alguns autores chamam de início da
crise masculina. Essa crise se deu a partir das indagações realizadas nesse momento,
possibilitadas pela ascensão dos valores reproduzidos pelos ideais franceses e que fizeram
com que o homem construísse um medo de perder a masculinidade (SILVA, 2000).
A preocupação com uma possível feminilização por parte de alguns
homens, fizeram com que investissem e construíssem para si uma série de
papéis e traços representativos da sua condição “masculina”, de forma que
descrevesse melhor o atual homem vitoriano, em contraste com o seu
oposto, a mulher, e mais inadvertidamente, a seu inverso, o homossexual
(SILVA, 2000, p. 11).
As mudanças sócio-econômicas e culturais que se deram na segunda metade do
século XX fizeram emergir discussões acerca dos papéis do homem e da mulher. Com
essas discussões buscou-se estabelecer novos parâmetros para as relações sociais e para
a estruturação da família. Nesse sentido, surgem “[...] estudos sobre a construção social da
masculinidade, diretamente beneficiados pelas reflexões em torno do conceito de gênero”
(HENNIGEN, 2002, p.53).
Uma pesquisa realizada em 2002, com o objetivo de conhecer as representações do
homem sobre paternidade e as possíveis articulações desta com a masculinidade, mostra
que ser pai não é elemento básico para a consolidação de “todas as masculinidades”.
Sendo referência apenas para a masculinidade do homem casado, a paternidade é
apontada como elemento fundamental para aquele que passa pelo matrimônio. À
45
masculinidade do solteiro, são oferecidas outras possibilidades de auto-afirmação como
liberdade sexual, falta de responsabilidade, etc (COSTA, 2002).
Essa pesquisa reafirma o fato da paternidade ter sido construída, numa vinculação
direta com o matrimônio e, conseqüentemente, com a heterossexualidade. Da mesma forma
que a esterilidade do homem está ligada à impotência sexual, ‘ter filhos’ está diretamente
associado à virilidade heterossexual. Nesse sentido, a orientação heterossexual torna-se
atributo da paternidade e da masculinidade. (COSTA, 2002).
Atualmente, as relações familiares têm passado por uma série de problematizações,
possibilitadas pelas discussões oriundas de várias dimensões da sociedade. Os movimentos
feministas, os movimentos GLBTT e, gradativamente, o saber científico têm inserido nas
pautas públicas a importância em se debater essa temática. Com isso, variados arranjos
familiares começaram a conquistar visibilidade, apresentando dinâmicas diferenciadas e
sofisticadas estratégias de manutenção e reprodução. Dentre as bandeiras do movimento
GLBTT, a aquisição de direitos negados à comunidade gay e lésbica justificada na
necessidade em conferir um status de cidadão, aos sujeitos homossexuais, é talvez a mais
importante. Conforme aponta Anjos (2002) a noção de cidadania, de livre participação e
igualdade de direitos suprime a noção de inferioridade. Assim, a busca pelos movimentos
GLBTT em erradicar a homofobia se concentra, especialmente, na busca pelo
reconhecimento cidadão.
Com isso, a sociedade tem questionado o papel do homem, tanto no cenário público,
quanto na dimensão privada. Conforme citada por vários autores, vem surgindo uma “nova
paternidade” no cenário contemporâneo em que, diante desses questionamentos, a relação
entre pais e filhos/filhas tem sofrido alterações, abrindo espaço para o estreitamento dos
laços afetivos, a participação nos cuidados corporais e nos afazeres domésticos e a
tentativa em se diminuir a presença paterna representada pela figura do homem autoritário e
hostil (LYRA (1998); TRINDADE; MENDRADO, 2002; LEVANDOWSKI; PICCININI, 2002;
ROUDINESCO, 2003; GOMES; REZENDE, 2004;).
46
As
bibliografias
que
discorrem
acerca,
especificamente,
da
paternidade
homossexual, buscam compreender as tendências que tais estudos desenvolvem no
processo de análise desse fenômeno e as possíveis diferenças que existem entre as
criações de filhos por homossexuais e heterossexuais.
Stacey e Biblarz (2003) fazem um levantamento dos argumentos que vão contra e a
favor
da
paternidade/maternidade
homossexual.
Esses
autores
afirmam
que
os
posicionamentos desfavoráveis alicerçam-se na concepção burguesa de família e na
hipótese da homossexualidade configurar-se em patologia ou anomalia. Em contrapartida,
os discursos favoráveis buscam tecer uma crítica histórica à patologização da
homossexualidade, compreendendo a família e a sexualidade como instituições e
dimensões sociais construídas sócio-historicamente.
Outro dado importante relacionado a parentalidade homossexual é que, geralmente,
essas famílias são encaradas como monoparentais, já que um dos parceiros não é
reconhecido, nem judicialmente, nem socialmente. A tendência em isolar a variável
orientação sexual no processo de análise e interpretação de famílias homoparentais ainda
representa um ideário heterossexista e uma representação de que homossexuais
prejudicariam seus filhos. (UZIEL, 2004). Em seu trabalho, esta autora analisa uma
coletânea de estudos que desprenderam esforços em detectar possíveis diferenças entre
famílias homoparentais e àquelas constituídas por pais heterossexuais. Conforme aponta
Uziel (2004), não encontram nenhuma diferença relevante nesses estudos, a não ser alguns
elementos positivos, presentes na criação de filhos por algumas lésbicas.
Tarnovski (2004) apresenta uma pesquisa sobre as representações acerca da
paternidade em homens homossexuais e traz alguns apontamentos da paternidade,
analisada a partir da identidade de gênero. Nessa pesquisa, os sujeitos afirmam, entre
outras questões, que não se sentem diferentes dos pais heterossexuais, podendo criar seus
filhos da mesma forma que esses últimos. Aponta-se também uma necessidade em se
pensar a identidade sexual para além de elementos ligados à sexualidade, buscando
47
compreender que esta identidade define, muitas vezes, espaços de participação e
identidades políticas.
Assim, a partir da crítica a patologização da homossexualidade, da constatação de
que a identidade e a sexualidade são frutos de uma construção sócio-histórica e que os
papéis de gênero – diretamente ligados à paternidade – também são constructos sociais,,
pretende-se apontar alguns fatores psicossociais que influenciam a construção da
identidade paterna em homossexuais.
48
5 CAPÍTULO IV – REFLEXÕES METODOLÓGICAS
5.1 A questão do método nas Ciências humanas: Razão e subjetividade
Durante toda a história, homens e mulheres buscaram atribuir sentido para a
existência, procurando compreender a realidade e os desafios apresentados por ela. Na préhistória e nas civilizações antigas, o homem utilizava-se de sua experiência com a natureza
para apreender a lógica de seu funcionamento. A experiência direta com os fenômenos
rotineiros servia de base para a produção de sentido ao mundo e à própria existência. Além
da experiência, a crença no “sobrenatural” e a criação de mitologias também exerceram
papel fundamental na emissão de respostas acerca da vida e do cotidiano, assim como a
transmissão de informações e crenças através da tradição e da autoridade (LAVILLE e
DIONNE, 1999).
Conforme Laville e Dionne (1999), até então, a sociedade utilizara-se basicamente
da intuição, da fé e da tradição para a construção de respostas para o mundo. Foi quando, a
filosofia, numa preocupação em produzir conhecimentos fundamentados na razão, constituiu
uma nova forma de apreender a realidade. O conhecimento filosófico desconfiou dos
saberes que se originavam dos deuses, dos astros, das crenças, da magia. Em troca deles,
acreditou-se que apenas o exercício da mente poderia produzir o saber, propriamente dito.
Pode-se dizer que Platão e Aristóteles, na Grécia Antiga, foram os principais precursores do
surgimento da filosofia, propondo lógicas como contraposição do objeto com o sujeito, a
noção de causalidade, etc.
49
5.1.1 O culto à Razão: o surgimento da Ciência
O saber filosófico permaneceu hegemônico durante séculos, articulando-se, em
determinados momentos, com o saber religioso e utilizando-se, principalmente, da
concepção matemática. Com o passar do tempo, alguns pressupostos foram construídos,
sendo determinantes para a constituição da ciência moderna. Já no século XII, surge a
preocupação em antecipar a observação empírica do fenômeno, antes de interpretá-lo,
submetendo-o à análise e experimentação profunda. O método experimental inicia sua
ascensão nesse momento e atinge seu apogeu no século XVII, quando a ciência moderna
se objetiva. O conhecimento científico passa a ser produzido numa lógica experimental a
partir da qual o objeto poderia ser apreendido pela observação empírica e submetido à
validação e experimentação. Acredita-se assim, que seria possível chegar à verdades
mensuráveis, absolutas e universais.
No século XIX, a Ciência alcança enormes dimensões, referenciada pelo método das
ciências naturais. Ela se desenvolveu, juntamente com uma concepção ideológica de
produção de saber, pautada na objetividade, experimentação, empirismo, validade e a
sujeição à leis e previsões: o Positivismo. Essa corrente influenciou fortemente o
desenvolvimento das ciências humanas já que a submeteu ao método das ciências naturais.
Acreditava-se que se o método era aplicável na natureza, seria também ao ser humano, um
ser natural. Assim, a ciência seguiu seu curso, produzindo uma série de verdades e variadas
concepções acerca da realidade (LAVILLE e DIONNE, 1999).
50
5.1.2 Enfraquecimento do Positivismo: a realidade subjetivamente produzida
Ao definir os padrões de racionalidade, separando os campos de saber que deveriam
ou não ser objetos da ciência, a corrente positivista acabou por definir duas dimensões do
conhecimento humano como “não científicos”: o senso comum e os estudos humanísticos –
as histórias, as filosofias, os estudos jurídicos e literários, etc. (SANTOS, 1987) A
irracionalidade aferida pela ciência a esses saberes imputou grande dificuldade na
ampliação desses estudos e na legitimação de sua relevância para o desenvolvimento das
ciências humanas.
Diante de determinadas reformulações teóricas, de discussões realizadas no século
XX e do desenvolvimento das ciências humanas e sociais, o método das ciências naturais
foi sendo questionado em sua aplicabilidade generalista. A realidade natural não teria o
mesmo funcionamento que o homem, surgindo a necessidade em se construir métodos
alternativos.
Como aponta Santos (1987), várias rupturas teóricas e epistemológicas contribuíram
para a desestruturação da corrente positivista e para a diminuição do autocontrole interno e
externo da ciência. Assim, as teorias de Einstein, os estudos da microfísica, da mecânica
quântica, do rigor matemático, da biologia e de outros campos de saber foram de suma
importância para a chamada “crise da ciência moderna”. Além desses elementos teóricos,
Santos (1987) cita a presença de elementos sociais que foram importantes nessa
construção. Pode-se especular e pensar na contribuição das Revoluções do século XIX, nas
grandes guerras ocorridas no século XX, na ascensão dos movimentos sociais e em alguns
estudos humanísticos como os de Foucault, Boaventura de Souza Santos, Sigmund Freud,
etc. De certa forma, é perceptível a importância desses fenômenos na problematização da
ciência moderna.
Esses fenômenos propuseram diferentes concepções acerca da produção de
conhecimento científico, no tocante à implicações metodológicas e à epistemologia do
51
conhecimento, como: relação tênue entre sujeito e objeto; realidade construída e não
somente apreendida; presença de discurso ideológico na ciência, etc. Sendo a ciência, um
fenômeno social, não pode escapar ao posicionamento político-ideológico, ainda que de
forma implícita ou latente.
A relação entre sujeito e objeto começa a ser vista de forma diferenciada nas
ciências humanas e sociais, já que alcançar a objetividade do fenômeno era impossível, na
relação com o sujeito do estudo. Esse fato desencadeia a formulação de novos métodos de
pesquisa nas ciências humanas, que possam dar conta da complexidade social.
5.1.3 Crítica à racionalidade científica: propondo novos paradigmas
Conforme nos aponta Minayo (1994) a ciência se tornou o meio de produção de
saber hegemônico nas sociedades ocidentais, recebendo críticas por tecer um novo mito de
único dispositivo a encontrar a verdade. Existem problemas sociais como a miséria, o
preconceito, as guerras, etc. que a ciência ainda não respondeu. Isso mostra o déficit
apresentado pela impenetração da ciência em determinados contextos sociais.
Nesse sentido, a racionalidade científica da modernidade se constituiu de forma
totalitária, ao negar o caráter racional às formas de se produzir conhecimento que se
afastavam de seus pressupostos epistemológicos e de suas regras metodológicas,
atribuindo valores negativos às mesmas.
A ausência de crítica ideológica da ciência moderna causou profundo impacto em
todas as dimensões da sociedade, estabelecendo relações de pretensa neutralidade,
subjugando saberes e campos do conhecimento, rotulando comunidades e culturas como
subdesenvolvidas ou primitivas e colocando à margem da razão, importantes formas de
produção de saber.
52
A crítica que se constrói acerca da racionalidade moderna aponta para um novo
paradigma que se estabelece no cenário científico. Mesmo não tendo contato direto com a
objetivação desse paradigma, Santos (1987) oferece algumas categorias que podem clarear
o futuro do pensamento científico: a) Todo conhecimento científico-natural é científico-social;
b) Todo conhecimento é local e total; c) Todo conhecimento é autoconhecimento: e d) Todo
conhecimento científico visa constituir-se em senso comum.
Esses elementos são importantes para as reflexões elaboradas pelos campos de
saber da ciência contemporânea. A racionalidade moderna ainda oferece diretrizes para a
construção de saber na ciência, colocando ainda hoje em pauta a cientificidade das ciências
humanas e sociais. Contudo, novos pontos de vista têm aparecido nesse cenário,
articulando concepções que buscam desverticalizar os campos do saber e imprimem no
discurso científico um caráter político-ideológico, mais preocupado com a aplicabilidade
social de suas produções.
5.1.4 Processos de globalização: Pesquisa e Internet
O surgimento da internet no mundo reorganizou uma série de processos sociais que,
geralmente, aconteciam presencialmente e/ou utilizando outros meios de comunicação de
massa como a televisão, o telefone, etc. Seu caráter dinâmico, dada a agilidade das
informações e as vastas possibilidades de relação, configurou novas formas de
posicionamento diante da educação, dos processos econômicos e das micro-relações. As
categorias de tempo e espaço, por exemplo, são citadas por Nicolaci-da-Costa (2005) como
categorias mutáveis a partir do contexto sócio-cultural em que são produzidas e, a partir da
inserção das tecnologias de informação e telecomunicação, são tomadas como categorias
distintas que passam a ser analisadas de forma independente.
53
O espaço da internet, ainda que destituído de delimitações físicas, se constitui numa
possibilidade de novas relações e produções de valores e concepções. O espaço virtual (ou
ciberespaço) permite a funcionalidade de diferentes mecanismos de controle e poder, já que
permite a circulação dos bens imateriais da sociedade. (NICOLACI-DA-COSTA, 2005).
Esse movimento de concentração e distribuição de imagens e informações
tem introduzido em nosso cotidiano uma perspectiva consumidora de ser,
com reflexos em praticamente todos os setores, inclusive na educação e na
cultura, trazendo para essas duas áreas uma perspectiva individualista de
atuação social. As pessoas não estão acostumadas a atuar de forma
colaborativa, e ainda impera a lógica da hierarquia vertical, com delegação
plena de poderes a representantes. Recorre-se sistematicamente à
mediação da instância superior e, em instâncias como a da política,
observa-se indiferença em relação às decisões e a seus efeitos sociais
(PRETTO E PINTO, 2006, p. 21).
Ainda que a internet represente um espaço de reproduções ideológicas e produções
de estratégias de controle de massa, pode também ser utilizada como instrumento científico.
O debate acerca da utilização da internet como ferramenta de coleta e análise de dados em
pesquisa científica é bem recente. As bibliografias nacionais que se debruçam na
compreensão dos fenômenos sociais que perpassam o ciberespaço geralmente promovem
estudos relacionados às redes virtuais de relacionamento, e à construção e re-construção
identitária, nas dimensões individual e coletiva. (NICOLACI-DA-COSTA, 2005; PRETTO;
PINTO, 2006).
Segundo Pretto e Pinto (2006) as investigações que se originam dos estudiosos da
educação atentam para a necessidade dessa área, em assimilar os avanços tecnológicos
produzidos no ciberespaço e nas ferramentas de informação e telecomunicações, a fim de
acompanhar as mudanças que ocorrem nos fenômenos sociais e promover intervenções
que favoreçam a utilização dessas tecnologias a favor da sociedade.
A pesquisa realizada através da internet oferece ao pesquisador uma série de
benefícios que, na forma tradicional de coleta e análise de dados, não eram possíveis.
Elementos como tempo, custeamento e espaço são otimizados na utilização da internet
como ferramenta de pesquisa, permitindo que o processo entre a coleta e análise dos dados
54
se reduza e aumentando a riqueza e a diversidade das informações coletadas. (FREITAS;
JANISSEK; MOSCAROLA, 2004). Podemos citar outro elemento positivo na utilização da
internet na coleta de dados científicos: a possibilidade em oferecer credibilidade quanto à
garantia do anonimato do respondente que, ao se tratar de temáticas confidenciais ou que
incitam o aparecimento de tabus, pode resguardar seus dados pessoais.
Segundo Freitas, Janissek e Moscarola (2004) por se tratar de uma recente
estratégia de pesquisa e levando em conta suas especificidades, é preciso estar atento aos
elementos que irão influenciar o processo de coleta e análise dos dados, bem como o papel
de cada ator envolvido e as ferramentas disponíveis a cada um deles. É preciso também
construir estratégias que vão de encontro com a especificidade do ciberespaço.
Uma dessas especificidades, considerada de grande importância por esses autores,
é a possibilidade em se realizar a análise dos dados durante a sua coleta, diferente dos
modelos tradicionais de pesquisa, em que essa fase é realizada no final do processo. É
preciso compreender também que novos modelos de pesquisa oferecem diferentes papéis
para os atores envolvidos:
[...] o cliente - aquele que busca conhecimento e informação para
tomar a decisão correta no tempo certo; o pesquisador - aquele cujo
trabalho é prover informação com segurança e atualidade, no formato
desejado pelo cliente; o respondente - aquele que, sendo a fonte de
informação, é talvez o mais importante link no processo de pesquisa,
mas que é freqüentemente tratado apenas como ator passivo [...]
porfim, a Internet - considerada como um pseudo autor, envolve
tecnologias (protocolos, browsers, scripts, etc.) e organizações
(provedores, etc.) que escapam da interação entre os atores reais. No
contexto da pesquisa via Internet, este “novo ator” substitui
entrevistadores, questionários via correio e digitação de dados [...]
(FREITAS; JANISSEK; MOSCAROLA, 2004, p.3, grifos do autor)
Além da re-configuração dos atores da pesquisa científica, a utilização da internet
como ferramenta de pesquisa ainda necessita passar por uma séria de reflexões de cunho
metodológico. O acesso a essas tecnologias ainda é restrito, configurando, por exemplo, um
recorte de classe social nas populações estudadas. As informações necessitam passar por
uma série de procedimentos de validação para diminuir os riscos de falhas quanto ao
55
conteúdo, possíveis repetições, categorias de análise, confiabilidade dos dados, escolha da
amostragem, etc.
5.2 Apresentando a metodologia
Para alcançar os objetivos propostos nesta pesquisa, optamos por utilizar métodos
quantitativos e qualitativos. As ciências sociais e humanas têm como principais métodos os
qualitativos, já que eles não se atêm apenas à quantificação do fenômeno, refletindo acerca
de todas as variáveis na tentativa de compreender o significado do real. (ALVESMAZZOTTI; GEWANDSZNAJDER, 2001).
A combinação metodológica no entendimento de um mesmo fenômeno abrange o
máximo de descrição, explicação e análise do objeto. A integração da pesquisa qualitativa e
quantitativa oferece ao pesquisador a possibilidade de realizar um cruzamento de suas
conclusões, obtendo assim uma maior credibilidade em seus dados, evitando que esses
sejam
produto
de um
procedimento
específico
ou
de
uma
situação
particular
(GOLDENBERG, 1999).
Para Deslandes e Assis (2003), refletindo acerca da utilização metodológica no
campo da saúde, apontam que a importância da articulação “quanti-quali” pode ser
encontrada justamente nas suas diferenças: a compreensão em profundidade das práticas,
valores e crenças de grupos acerca da temática e a explicação em extensão de como esses
sujeitos, e/ou população estudada está em situação de vulnerabilidade em relação ao tema
ou ao objeto de estudo. Segundo esses autores, essa articulação é maior do que
entrecruzar categorias antagônicas ou distintas, mas produzir dados ressonantes no
singular, no individual e no coletivo.
A coleta de dados, inicialmente, se daria através da aplicação de 80 questionários
em sujeitos do sexo masculino, que se autodefinem como homossexuais ou bissexuais, que
56
tivessem filhos, biológicos ou não, residentes na Região Metropolitana de Belo Horizonte. A
amostra foi calculada da seguinte forma: multiplicou-se por dez o número de ONG´s que
trabalham com a temática GLBTT em Belo Horizonte. As oito ONG´s, apontadas por Diniz
(2005a) e Diniz (2005b), iriam indicar cerca de dez sujeitos com o perfil desejado para a
aplicação do questionário.
Além da aplicação de questionários, utilizou-se também de um “diário de campo” do
pesquisador, instrumento esse que possibilita a reflexão e análise dos dados implícitos e
das impressões do pesquisador durante os processos de mobilização, captação de sujeitos
e coleta de dados, propriamente dita.
5.2.1 Questionário
Esta pesquisa se propôs a utilizar tal método por duas grandes razões: a primeira é
fazer o levantamento, a partir de uma amostragem, de um perfil de pais homossexuais em
Belo Horizonte, através dos dados objetivos que foram contemplados no questionário,
conforme anexo; a segunda está ligada à credibilidade da pesquisa já que a integração dos
dados quantitativos com os qualitativos oferece subsídios qualificados para uma análise e
compreensão mais fidedignas do fenômeno observado.
O modelo quantitativo é relevante no sentido de oferecer um olhar mais panorâmico
acerca da população estudada já que possibilita algumas generalizações e a junção de
características individuais na produção de características coletivas. Dentro das ciências
naturais, pela ausência de crítica acerca da relação entre sujeito e objeto e da percepção de
que a escolha de hipóteses, categorias de análise, conceitos e variáveis a serem
manipuladas é realizada pelo pesquisador, o modelo quantitativo tem a pretensão de
57
mensurar, universalizar e conhecer para predizer, através da busca pela confiabilidade e
pela total validação dos dados (DESLANDES; ASSIS, 2003).
A aplicação do questionário foi prevista para ocorrer na presença do respondente,
individualmente, mediante leitura do entrevistador, de cada uma das 41 questões. O
questionário foi dividido em 06 blocos, a partir das características e objetivos de cada
questão: 1) Dados pessoais; 2) Escolaridade; 3) Situação econômico-financeira; 4) Vida
sócio-cultural; 5) Dados familiares; 6) Orientação sexual.
Foi realizado um pré-teste com 02 sujeitos, na tentativa de detectar possíveis falhas
na elaboração do instrumento. Algumas alterações foram concretizadas no questionário, a
partir de proposições possibilitadas pelo pré-teste.
5.2.1.1 Captação dos sujeitos: quando o virtual possibilita o real
A mobilização das ONG´s iniciou-se em Fevereiro de 2006 e, já nesse momento,
começou a apresentar algumas dificuldades. O Movimento GLBTT não conta com nenhuma
ferramenta de busca ou banco de dados capaz de fornecer informações tão precisas e
específicas. Foram feitas várias reuniões com a militância, grupos de convivência e eventos
GLBTT, na tentativa de conseguir contatos para a pesquisa. Os poucos nomes coletados
foram possíveis a partir de contatos pessoais dos militantes e dos envolvidos com o
movimento.
Na busca por novas estratégias de captação dos sujeitos acabou-se chegando até o
ciberespaço. A Internet foi uma possibilidade pensada já que representa uma via de acesso
rápido dentro e fora do Movimento GLBTT. Várias instituições e organizações utilizam-se
constantemente do espaço virtual para que informações circulem com mais agilidade.
Inicialmente, a penetração da pesquisa se deu nas listas de discussão e
relacionamento GLBTT dos provedores ‘yahoo’, ‘google’ e ‘hotmail’. Foram construídas
58
mensagens de textos padronizadas e enviadas ao e-mail de cada grupo e para e-mails
pessoais daqueles integrantes que o disponibilizaram. Ainda assim, com a possibilidade de
perda do anonimato e dificuldades na conciliação de datas e horários para a aplicação do
questionário, o número de voluntários ainda continuou insuficiente diante do esperado.
Haviam sido realizados, até este momento, 15 questionários: 06 indicados por integrantes
dos movimentos, 05 através de captação pelas listas de discussão GLBTT, 03 através de
indicações de alguns respondentes e 01 através de contatos pessoais do pesquisador.
Na tentativa de otimizar o processo de captação dos voluntários, de garantir-lhes
uma participação anônima e segura, e obter uma amostra mais abrangente para pesquisa,
optou-se por realizar os contatos, através do Orkut. Este, consiste em uma comunidade online que conecta pessoas através de uma rede de amigos confiáveis3. Cada integrante da
comunidade possui uma página de identificação (profile), onde constam informações
pessoais, profissionais, de interesses, etc. Nesta página de identificação, entre outros
elementos, existem três campos que coincidem com as características necessárias à
participação nesta pesquisa: “Sexo”, “Orientação Sexual” e “Filhos”, levando-se em
consideração que o critério para classificação da categoria homo/bissexual seria a autodefinição dos sujeitos. As opções oferecidas no profile durante o preenchimento do cadastro
de usuário estão distribuídas no Quadro 1:
SEXO
ORIENTAÇÃO SEXUAL
FILHOS
1. Feminino
1. Heterossexual
1. Sim – Moram comigo
2. Masculino
2. Bissexual
2. Sim – Não moram comigo
3. Gay
4. Curioso
3. Sim – Fazem visita de vez em quando
Quadro 1: Opções de respostas para os itens sexo, orientação sexual e filhos do Orkut
O Orkut dispõe também de uma ferramenta de busca personalizada, que permite a
alternância de todos os itens constantes no cadastro de seus membros. Foram realizados
3
Esta definição é dada pelo próprio provedor do site.
Ver: https://www.orkut.com/GLogin.aspx?done=http%3A%2F%2Fwww.orkut.com%2F
59
todos os cruzamentos possíveis, intercalando-se todos os itens que abrangessem o perfil
desejado. Dessa forma, encontrou-se o seguinte número de membros:
01
02
03
04
05
06
2. Masculino
X
X
X
X
X
X
1. Qualquer
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
CRUZAMENTOS
SEXO
FOTO
Total
1. Feminino
2. Somente com
foto
1. Brasil
ONDE MORA 2. Minas Gerais
3. Qualquer
1. Heterossexual
ORIENTAÇÃO 2. Bissexual
SEXUAL
3. Gay
4. Curioso
1. Sim – Moram
X
X
comigo
2. Sim – Não
FILHOS
X
X
moram comigo
3. Sim – Fazem
X
visita de vez em
X
quando
MEMBROS ENCONTRADOS
205
432
276
237
Quadro 2: Cruzamentos realizados na ferramenta de busca do Orkut.
501
318
1969
60
Os convites realizados consistiram em mensagens personalizadas, enviadas ao
scrap4 e/ou e-mail de cada membro. A preferência foi dada para contato via e-mail,
buscando respeitar a privacidade do usuário. Na impossibilidade dessa ferramenta, a
mensagem era depositada na caixa de scrap´s.
Ainda que o Orkut seja uma comunidade de relacionamentos, é utilizado muitas
vezes para outros fins. Os profiles recebem várias personificações como objetos, eventos,
personagens de TV, caricaturas e falsas identidades (popularmente chamadas de fakes)5
Ainda que o pesquisador tenha percebido esse fenômeno, acabou por enviar o convite a
todos membros que tiveram seus profiles acusados na malha fina da pesquisa do Orkut,
buscando não inferir interpretações errôneas.
Diante da vasta possibilidade que o Orkut apresentou, no que diz respeito à captação
de sujeitos, o recorte demográfico, que antes estava restrito à Região Metropolitana de Belo
Horizonte, foi ampliado para todo o território Nacional. Outra razão para esta escolha foi a
dificuldade na utilização do item “Minas Gerais” do campo “Onde mora” na ferramenta de
busca do Orkut, que gerava dados insuficientes.
Assim, utilizando o Orkut como ferramenta de captação de sujeitos, pôde-se chegar
até os usuários que possuíam o perfil desejado para responder o questionário.
5.2.1.2 Construindo o questionário on-line
Durante levantamento bibliográfico realizado para instrumentalizar esse método de
captação e coleta de dados, percebeu-se que grande parte dos trabalhos, até então
realizados, disponibilizaram o instrumento de coleta em uma página virtual. Freitas, Janissek
4
É o nome dado ao espaço do Orkut destinado a postagem de mensagens. Diferente do correio
eletrônico, todos os membros têm acesso aos scrap´s do profile.
5
As falsas identidades são criadas, em sua maioria, para que as pessoas possam ter acesso aos
profiles alheios, sem serem identificadas, já que o Orkut oferece a possibilidade de saber quais
membros acessaram sua página.
61
e Moscarola (2004), citam vários trabalhos que utilizaram o questionário on-line para a
coleta de dados de suas pesquisas6. A partir daí, adotou-se tal técnica, conduzindo o recorte
da pesquisa para todo o território nacional.
Para tanto, foi necessária a abertura de uma página na Web, que pudesse hospedar
o questionário. A página foi construída pelo Núcleo de Hipermídia da PUC Minas São
Gabriel e as reuniões de criação objetivaram, principalmente, a elaboração de estratégias
que diminuíssem a possibilidade de erros no acesso e no processo de resposta de cada
respondente. Outro elemento importante no processo de criação do site foi a preocupação
em garantir que cada respondente lesse e aceitasse o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido e que o Layout da página tivesse o mínimo de elementos que pudessem
influenciar as respostas do participante (cor, imagens, disposição, textos, etc.).
O site ficou hospedado no domínio da PUC Minas, na extensão criada para a
Psicologia da unidade São Gabriel. Ao responder o questionário, preencher os campos para
contato ou cadastrar o e-mail para recebimento de informações sobre a pesquisa, os dados
são enviados para uma caixa de correio eletrônico, criada especificamente para esse fim7.
Além do questionário, foram colocadas na página, informações relevantes sobre a pesquisa
como objetivos, justificativa, metodologia, pesquisadores, etc.
6
a) SIMSEK, Z. (1999) - Sample surveys via Electronic Mail: a comprehensive perspective. São
Paulo: ERA – Revista de Administração de Empresas, v. 39, n. 1, Jan-Março 1999, pp.77-83.
b) SCORNAVACCA, E.; BECKER, J. L.e ANDRASCHKO, R. (2001) - E-Survey : Concepção e
Implementação de um Sistema de Survey por Internet. Anais do XXV Enanpad, realizado em
Campinas -SP, 16-19 setembro 2001.
c) BREI, V. A. (2001) - Antecedentes e conseqüências da confiança do consumidor final em trocas
relacionais com empresas de serviço: um estudo com o usuário de Internet Banking no Brasil".
Dissertação de Mestrado, PPGA/EA/UFRGS, Porto Alegre, junho de 2001.
d) MOSCAROLA, J. (2001) -Les enquêtes internet. Annecy, França: Université de Savoie, Notas de
aula.
e) LAPASSOUDE-MADRID, C.e MONNOYER-LONGÉ M.-C. (2000) -Intégration d’un site web dans la
stratégie marketing : les vins de Bordeaux. França: Revue Décisions Marketing, n. 19, Jan-Abril 2000,
pp.21-27.
f) MALHOTRA, N. K. (2001) - Pesquisa de Marketing: uma orientação aplicada. 3a. edição, 720 p.
g) ARAGON, Y., BERTRAND, S., CABANEL, M., LE GRAND, H. (2000) - Méthode d’enquêtes par
Internet: leçons de quelques expériences. França: Revue Décisions Marketing, n. 19, Jan-Abril 2000,
pp.29-37.
h) LEHU, J. M. (2000) - Internet comme outil de yiels management dans le tourisme. França: Revue
Décisions Marketing, n. 19, Abril 2000, pp.7-19
7
Domínio do site criado para a pesquisa:www.saogabriel.pucminas.br/psicologia/pesquisapaternidade
Correio eletrônico criado pela PUC Minas: [email protected]
62
5.2.1.3 Validação do instrumento
Uma das características exigidas para o método da ciência moderna é o nível de
validade de seus instrumentos e, conseqüentemente, dos dados coletados por ele. Pereira,
Almeida Filho e Rouquayrol, citados por Deslandes e Assis (2003) dizem que a definição de
validade
refere-se ao grau que o exame é apropriado para medir o verdadeiro valor
daquilo que é medido, observado ou interpretado. Informa se os resultados
representam a ‘verdade’ ou o quanto se afasta dela, sendo, portanto, muito
valorizada nos estudos quantitativos (PEREIRA, 1995; ALMEIDA FILHO;
ROUQUAYROL, 1990, apud DESLANDES; ASSIS, 2003, p. 203 grifos do
autor).
Um teste é considerado válido para esses autores quando atendem às exigências de
três tipos de validação: a) validade de conteúdo, quando um teste cobre satisfatoriamente o
campo temático que pretende estudar; b) validade de constructo, quando a medida está
ressonante com as preposições teóricas da pesquisa; e c) validade concorrente, quando o
teste é submetido à comparação com outros instrumentos que se prestam a mensurar o
mesmo objeto. (DESLANDES; ASSIS, 2003).
A validade da amostra em questão não pretende garantir a total generalização dos
dados para toda a população, nem ao menos propor que tais dados digam, fidedignamente,
da realidade pesquisada. Como a captação se deu a partir de convites realizados pelo
Orkut, não se estipulou, necessariamente, um número específico de sujeitos. Os convites
foram realizados na expectativa que o maior número possível de usuários se
disponibilizassem a participar. O número de questionários válidos (a seguir, discorreremos
sobre os critérios de validação do instrumento) foi 92, tendo representantes de 19 estados
do país e características peculiares, que serão apresentadas logo a seguir.
Ainda que não se pretenda promover a generalização total dos dados numéricos, é
possível pensar em algumas generalizações específicas, como apresenta Bronfam e Castro,
63
citados por Deslandes e Assis (2003) Segundo esses autores, diferentes tipos de
generalizações podem ser feitas com os dados, e a amostra escolhida para cada pesquisa
pode dizer de características da população. Uma delas diz respeito à
generalização por ‘tipificações’, isto é, o sentido comum, o tomado como
evidente, expresso na linguagem e reiterado regularmente por pessoas que
pertencem a certo grupo sociocultural, revela as lógicas culturais, a ordem
estabelecida e vigente para o grupo como um todo (BRONFAM; CASTRO
apud DESLANDES E ASSIS, 2003, p. 205 aspas do autor).
Percebe-se aqui que cada indivíduo, pertencente a um grupo, possui uma série de
características que dizem desse grupo, características essas expressas por vários
elementos e categorias analíticas. Assim, a amostra que se obteve nessa pesquisa é
potencializadora de determinadas generalizações, ainda que limitadas.
Desde o momento de utilização da ferramenta de busca do Orkut, até o retorno que
será dado aos sujeitos da pesquisa, foram criados protocolos que sistematizaram as ações
e estratégias de captação e coleta de dados. Esses protocolos possibilitaram a
padronização de algumas ações e algumas reflexões acerca da continuidade do processo.
Deslandes e Assis (2003) construíram um diagrama que representam muito bem todo o
processo de coleta da pesquisa, conforme esquema 01:
64
Fonte: (DESLANDES E ASSIS, 2003)
As informações contidas nesse diagrama estão didaticamente alocadas em espaços
e momentos diferenciados. Vale lembrar que, em alguns momentos várias etapas aqui
descritas ocorriam simultaneamente, dada a dinâmica oferecida pela coleta de dados
realizada pela Internet.
Alguns elementos, específicos dessa pesquisa, foram importantes para a validação
do processo já que permitiram uma maior aproximação com os sujeitos da pesquisa e
reduziram os riscos de falhas e interpretações errôneas: a) estreitamento do contato com
sujeitos que responderam positivamente os convites; b) padronização de todas as
mensagens enviadas aos sujeitos; c) construção de etapas, dentro do site, que possibilitam
65
o filtro de sujeitos sem perfil, ou com intenções diferentes dos objetivos da pesquisa; d)
divisão didática dos sujeitos por tipos de resposta, data, etc.
A validação dos questionários respondidos também representa elemento de grande
importância para a credibilidade das informações coletadas. Tal validação foi possibilitada, a
partir das ações implementadas, desde os convites (conforme citado anteriormente), até a
leitura e análise de cada resposta. Depois de pronta, a página foi divulgada para os sujeitos
que responderam positivamente. Como esse instrumento, para a garantia do anonimato,
não solicita nenhum dado pessoal do respondente, a validação de cada um deles teve de
seguir outros critérios. O primeiro deles foi identificar através da informação de dados como
e-mail, onde mora, idade e observações, quais os questionários que pertenciam aos sujeitos
que se encontravam no banco de dados do Orkut.
Como vários questionários não puderam ser identificados, outro critério de validação
foi construído. Analisou-se cada questionário a partir de sua leitura minuciosa,
especialmente das questões fechadas 01, 02, 03, 08 e 09 (que delimitaram o perfil exigido
para esta pesquisa), 06 e 26 que possibilitam a confirmação, ou não, dos dados anteriores e
das questões dissertativas 33, 37, 38, 39 e 41, que possibilitaram critérios de validação
como conteúdo do texto e coerência com as questões de múltipla escolha. Todas as
questões foram analisadas também, buscando encontrar possíveis questionários repetidos.
Assim, dos 107 questionários enviados, 96 foram validados e 11 deles, a partir de
todos esses critérios, foram considerados inválidos.
5.2.2 Diário de campo
Além do questionário, utilizou-se das anotações, reflexões impressões de cada etapa
do processo, registradas num diário de campo. Cada registro foi classificado, dentro de uma
categoria, possibilitando, inclusive, subsídios para a posterior escolha das categorias gerais
66
de análise da pesquisa. As categorias contempladas no diário de campo foram: identidade
sexual, paternidade e gênero, representações sociais, dados sobre perfil, e outros fatores
psicossociais.
Ainda que nem todas essas categorias serão utilizadas separadamente na análise
dos dados gerais, elas contribuíram profundamente para uma leitura qualitativa do processo
e da aplicação do instrumento quantitativo.
5.2.3 Grupo Focal
O grupo focal é um instrumento de cunho investigativo que visa a coleta de dados
qualitativos que podem ser contemplados no processo grupal. Mesmo se atendo à prática
de pesquisa, ele propicia a obtenção de “[...] uma variedade de informações, sentimentos,
experiências, representações de pequenos grupos acerca de um tema determinado”
(CHIESA; CIAMPONE, 1999; ALZAGA, 1998; NERY 1997; CANALES; PEINADO, 1995
apud KIND, 2004, p.126).
Segundo essa perspectiva, o grupo focal oferece informações que não se pode
conseguir em outros métodos de caráter qualitativo, já que sua coleta se desencadeia com
objetivos específicos, a partir da dinâmica do grupo. Este aspecto é possível pelo caráter
psicossocial desta técnica já que ela “[...] tem seus fundamentos nas teorias de grupos, na
sociologia e na psicologia social crítica” (KIND, 2004, p.125).
Pensando na homossexualidade e na identidade paterna como construção sóciohistórica que se dá a partir das relações, o grupo focal possibilitou, mais do que coletar,
construir os dados desta pesquisa, pelo seu caráter relacional.
Foi realizado um grupo focal, tendo a presença de 04 participantes que foram
selecionados a partir da população que foi submetida ao questionário, a partir do critério de
localização da residência (Região metropolitana de Belo Horizonte). Foram realizados 11
67
convites, tendo 07 confirmações e 04 presenças. Apesar do número reduzido de
participantes, a discussão foi bem rica, já que cada participante traz consigo experiências
bem peculiares de sua paternidade e orientação sexual.
O temário/roteiro para a realização dos grupos, que se encontra em anexo, foi
construído durante o andamento da pesquisa já que o pesquisador pretendeu utilizar-se dos
dados obtidos do questionário e no diário de campo para sua construção.
Dos participantes, 02 estão envolvidos com a militância GLBTT, tendo influências
nas conquistas de direitos e espaços para homossexuais em Minas Gerais. Os outros dois
não têm envolvimento com o movimento GLBTT e trazem discussões extremamente ricas e
conflitantes acerca de suas experiências.
5.2.4 Caracterização dos respondentes
Dos 1969 membros convidados, obteve-se 935 respostas8; 312 membros afirmaram
não obter o perfil necessário para a pesquisa; 196 proferiram respostas de indignação ao
convite, demonstrando reações homofóbicas; 87 negaram-se a responder o questionário. Do
total de respostas proferidas, 211 responderam positivamente9. Vale lembrar que, devido à
limitação de 999 membros em cada profile, o pesquisador teve de criar dois profiles, para
ampliar o número de convites.
Os convites foram realizados entre os meses de Abril e Julho de 2006. Durante
esses meses, foram coletados na própria página do Orkut, todo dia 20 e cada mês, alguns
dados demográficos da população usuária da comunidade. Essa coleta se deu a partir da
8
Chamamos aqui de respostas, quaisquer e-mails, mensagens ou textos enviados ao pesquisador
referentes ao convite realizado.
9
Mencionaram a pesquisa, confirmaram a caracterização do perfil e disponibilizaram-se a responder o
questionário.
68
necessidade em se conhecer as principais características da população de onde se obtém a
amostra. Assim obtemos as seguintes médias:
TABELA 01
MÉDIA DE IDADE DOS USUÁRIOS DO ORKUT - ABR/JUL DE 2006
Idade
18-25
26-30
31-35
36-40
41-50
50+
%
61,57
11,93
6,05
3,24
3,17
2,39
TABELA 02
MÉDIA DE INTERESSES DOS USUÁRIOS DO ORKUT – ABR/JUL DE 2006
Interesses
%
73,51
23,17
24,65
17,98
Amigos
Companheiros de atividades
Contatos profissionais
Namoro
TABELA 03
MÉDIA DE RELACIONAMENTOS DOS USUÁRIOS DO ORKUT – ABR/JUL DE 2006
Relacionamento
Não há resposta
Solteiro (a)
Casado (a)
Namorando
Casamento aberto
Relacionamento aberto
%
34,25
39,11
12,11
11,39
0,31
1,72
TABELA 04
MÉDIA POR PAÍS DOS USUÁRIOS DO ORKUT – ABR/JUL DE 2006
País
Brasil
Estados Unidos
Índia
%
60,93
14,59
11,25
69
Paquistão
Irã
Reino Unido
Japão
Portugal
Canadá
México
1,89
1,06
0,62
0,51
0,39
0,41
0,41
Pode-se perceber que a maioria dos usuários o Orkut residem no Brasil, têm entre 18
e 30 anos e utilizam esta comunidade com o objetivo de fazer amigos.
É importante mencionar também que o acesso à internet, no Brasil, ainda é restrito à
determinadas classes sociais. Não se pode perder de vista que os respondentes estão,
contextualmente, inseridos na classe média baixa e classe média alta. Isso delimita
percepções de mundo diferenciadas, acesso a espaços e serviços específicos e,
conseqüentemente, experiências distintas.
5.2.4 Tratamento dos dados
Na etapa de análise, utilizou-se a técnica de análise de conteúdo. Tal técnica se
destaca por vislumbrar duas funções em sua aplicação. A verificação de hipóteses, pela
qual se pode chegar a respostas para questões formuladas e a confirmação ou não de
afirmações produzidas anteriormente. A segunda função consiste em descobrir o que está
por trás dos conteúdos manifestos, ou seja, indo além das informações e dados explicitados
(GOMES, 1999).
O primeiro momento da pesquisa pretende analisar os dados obtidos no
questionário, construindo assim um perfil da população pesquisada e apontando elementos
para a construção do temário/roteiro e a realização dos grupos focais. Realizou-se tabulação
dos dados utilizando o aplicativo SPSS, que permite o cruzamento de variáveis específicas
70
e a construção de tabelas e gráficos. A partir dela, obteve-se um panorama quantitativo da
população que levou, posteriormente, a novos cruzamentos de dados.
O questionário tem algumas questões dissertativas que serão analisadas a partir das
seguintes categorias: identidade sexual, identidade de gênero e representações acerca da
paternidade. A essa análise serão incorporadas as informações coletadas através do diário
de campo.
Em outro momento, a análise esteve voltada para os dados colhidos nos grupos
focais, tendo como parâmetros os dados do questionário e o marco teórico construído.
Neste momento ocorreram alguns cruzamentos de dados, redimensionando informações
quantitativas e qualitativas, buscando compreender, à luz do referencial teórico e
metodológico proposto nesta pesquisa, as relações, comportamentos e sentimentos
desencadeados durante os grupos focais.
A partir dessas análises será possível ter uma compreensão dialética e mais
fidedigna dos fatores psicossociais que influenciam a construção da identidade paterna em
homens homo/bissexuais.
71
6. DISCUSSÃO DOS DADOS
Neste capítulo será apresentada a análise dos dados, mediante articulação da coleta
realizada pelo questionário on-line, pelo grupo focal e pelo diário de campo. Os sujeitos que
responderam ao questionário, para garantia do anonimato, serão chamados de S (Sujeito),
seguido de seu número identificador na planilha do SPSS. Ex. S8, S37, S45, etc. Os sujeitos
que participaram do grupo focal serão chamados por nomes fantasias, criados
aleatoriamente: Antônio, Joel, Breno e Valter.
A análise dos dados está dividida em sub-capítulos, a partir das seguintes
categorias: Perfil dos participantes, as representações da paternidade homossexual,
paternidade e identidade sexual, masculinidade e paternidade e possibilidades X
dificuldades para vivência da paternidade gay. A escolha das categorias está referenciada
nos objetivos específicos, nas hipóteses construídas ao longo do processo de coleta dos
dados e da revisão bibliográfica.
6.1 Pai gay: quem é você?
Quanto à faixa etária, percebe-se que 76,1% dos respondentes possuem mais de 30
anos. Esse dado não é equivalente à população total do Orkut que apresenta cerca de 70%
de usuários entre 18 a 30 anos. Percebe-se assim que o Orkut é constituído, em sua maioria
por jovens e, aproximadamente, 9% de seus usuários possuem acima de 36 anos. Em
contrapartida, a amostra dessa pesquisa é formada, em sua maioria, por homens acima de
36 anos, representando aproximadamente 59% do total, conforme tabela 05:
72
TABELA 05
FAIXA ETÁRIA DA POPULAÇÃO RESPONDENTE
Faixa Etária
Abaixo de 18
18-25
26-30
31-35
36-40
41-45
46-50
Acima de 50
NR
Total
Freq.
1
5
17
15
16
18
15
7
2
96
%
1,0
5,2
17,7
15,6
16,7
18,8
15,6
7,3
2,1
100,0
Os grupos focais também tiveram participantes mais velhos, entre 38 e 61 anos. Isso
faz com que vários participantes tenham filhos que já alcançaram a adolescência ou a fase
adulta.
Quanto ao estado civil, a maioria deles se identifica como solteiro. O gráfico 01
apresenta a freqüência em que aparecem as respostas dessa questão.
47
Bars show counts
40
Count
30
18
20
15
16
10
Solteiro
Desquitado/Separado
Casado
Divorciado
Estado Civil
Gráfico 01: População respondente, em relação ao Estado Civil
73
É importante perceber que pouco mais da metade do sujeitos passaram pela
experiência do casamento e aproximadamente 32% já se encontram divorciados ou
desquitados. Em relação à faixa-etária, esse dado se aproxima mais dos usuários do Orkut,
já que, em relação ao relacionamento, este apresenta cerca de 40% de membros solteiros,
ainda que este dado não fale, especificamente do estado civil.
Pela orientação sexual, a amostra é mais representada por homens que se
autodefinem como homossexuais. Chegando a 43,8%, os sujeitos que se autodefinem como
bissexuais representam a segunda categoria mais representativa. É importante salientar que
o questionário possibilitou ainda a opção “transexual”, que não identificou nenhum
representante.
TABELA 06
POPULAÇÃO RESPONDENTE POR ORIENTAÇÃO SEXUAL
Orientação Sexual
Bissexual
Homossexual
Travesti
Outra
Total
Freq.
42
52
1
1
96
%
43,8
54,2
1,0
1,0
100,0
Quanto à cor, a amostra apresentou cerca de 60% de brancos e 25% de pardos. A
discussão de raça/cor pode oferecer alguns apontamentos para a questão de classe social,
ainda que não seja o foco deste estudo. Todos os sujeitos dessa pesquisa têm acesso à
internet e, conforme indicado mais à frente, possuem uma renda que permite classificá-los
como
membros
das
classes
médias.
Diante
da
constatação
de
uma
grande
representatividade branca, percebida através do questionário, pode-se articulá-la com a
categoria de classe, deixando o seguinte questionamento: sendo a pesquisa, realizada com
sujeitos de camadas sociais mais baixas, o índice de representatividade branca e negra
seria o mesmo?
74
Obteve-se assim um percentual de aproximadamente 10% de respondentes negros,
conforme o gráfico 02.
2,08%
Cor
9,38%
Branco
Pardo
Negro
Outro
99
Pies show counts
25,00%
62,50%
Gráfico 02: População respondente em relação à cor
A situação de moradia dos respondentes demonstra que a maioria reside na região
Sudeste do Brasil, apresentando o percentual aproximado de 54%. Outros 35% estão
distribuídos nas regiões Sul e Nordeste. Percebe-se ainda que pouco menos que a metade
reside nas capitais brasileiras e cerca de 50% mora em outras cidades, conforme tabela 07:
TABELA 07
SITUAÇÃO DE RESIDÊNCIA, POR REGIÃO BRASILEIRA
E CIDADE, DA POPULAÇÃO RESPONDENTE
Características
Região
Centro-Oeste
Norte
Nordeste
Sudeste
Sul
Total
Cidade
Capital
Outras cidades
NR
Total
Freq.
%
7
3
22
52
12
96
7,3
3,1
22,9
54,2
12,5
100,0
44
49
3
96
45,8
51,1
2,1
100,0
75
Identifica-se, contudo, um número elevado de cidades grandes como Campinas,
Governador Valadares, São Bernardo do Campo, Petrópolis, Santos, Porto Seguro, Olinda,
Caruaru, etc. Percebe-se com isso que a amostra aqui representada é constituída, em sua
maioria, por homens urbanos, que têm acesso a uma série de espaços, tecnologias e
serviços diferenciados.
A maior parte dos sujeitos divide a residência com um (uma) companheiro (a), sendo
14,6% do sexo feminino e 33,3% do sexo masculino. 27% da amostra afirmou residirem
sozinhos. Um número considerável de sujeitos respondeu, na opção “outro” que residem
com cônjuge e filhos.
TABELA 08
POPULAÇÃO RESIDENTE, EM RELAÇÃO À MORADIA E DEPENDÊNCIA FAMILIAR
Características
Com quem mora
Pais
Companheiro (a)
Sozinho
Amigos (as)
Filhos (as)
Outro
NR
Total
Exerce ativ. Remunerada
Sim
Não
Às vezes
Total
Depende da família
Um pouco
Nada
NR
Total
Freq.
%
10
30
26
1
16
12
1
96
10,4
31,3
27,1
1,0
16,7
12,5
1,0
100,0
87
6
3
96
90,6
6,3
3,1
100,0
9
86
1
96
9,4
89,6
1,0
100,0
O grupo focal foi realizado com sujeitos que residem na região metropolitana de Belo
Horizonte. Ainda assim, eles apresentam uma representatividade similar ao da população
total já que dois deles residem com o companheiro, um reside com os filhos e o último mora
76
sozinho. Esses dados são importantes para apontar um nível importante de independência
desses sujeitos, em relação à família, confirmado pelo elevado índice do exercício de
atividade remunerada e da dependência financeira, apresentados na tabela 08.
Em ressonância com a raça/cor que reflete a classe social dos respondentes, a
escolaridade e renda familiar apresentam considerável número de sujeitos com grau de
instrução igual ou superior ao Ensino Médio e renda familiar média de 10 salários mínimos.
Portanto, aproximadamente 59% apresentam renda entre 04 a 16 salários mínimos e 88%
possuem minimamente o Ensino Médio completo. Do total de respondentes, 64% tiveram
acesso ao Ensino Superior e 24% concluíram a pós-graduação.
TABELA 09
POPULAÇÃO RESPONDENTE, CONFORME GRAU DE INSTRUÇÃO E RENDA FAMILIAR
Características
Instrução
Analfabeto
Primário incompleto
Ensino Fundamental incompleto
Ensino Médio incompleto
Ensino Médio completo
Superior incompleto
Superior completo
Pós-graduação
Total
Renda Familiar*
Até 04 salários
04-08 salários
08-12 salários
12-16 salários
16-20 salários
Acima de 20 salários
NR
Total
Freq.*
%
1
1
2
7
23
18
21
23
96
1,0
1,0
2,1
7,3
24,0
18,8
21,9
24,0
100,0
26
23
23
11
5
7
1
96
27,1
24,0
24,0
11,5
5,2
7,3
1,0
100,0
* Referência em salários mínimos. Seu valor atual é R$ 350,00
Em relação às atividades realizadas nas horas vagas, as mais citadas pelos sujeitos
foram televisão, informática/internet, música, leitura, cinema e vida afetivo-sexual. 72%
deles afirmam freqüentar espaços GLS, sendo os mais citados as boates, os bares e
77
chats10. Um percentual considerável dos respondentes afirmou participar ou já ter
participado de algum movimento GLBTT. Assim, 27% dos respondentes tiveram, em algum
momento, acesso direto às produções dos movimentos sociais dessa temática. Esse dado
aponta também para a possível necessidade ou importância de articulação e participação
política para a comunidade GLBTT, conduzindo uma vivência da sexualidade articulada com
a luta e as conquistas da sua categoria.
TABELA 10
POPULAÇÃO RESPONDENTE QUANTO À UTILIZAÇÃO DE ESPAÇOS GLBTT
Características
Freqüenta espaços GLS
Sim
Não
Total
Participação Movimento GLS
Sim
Não
Total
Freq.
%
69
27
96
71,9
28,1
100
26
70
96
27,1
72,9
100
Em relação à religião, um número considerável de sujeitos afirmou não ter nenhuma
religião (25%). A amostra contemplou também 22% de católicos e o mesmo percentual para
espíritas. Um dado interessante foi possibilitado no detalhamento da opção “outra religião”
que apresentou 41,1% das respostas válidas para essa opção, religiões afro-brasileiras, não
contempladas no questionário (Candomblé e Umbanda). Os participantes do grupo focal
também apresentaram diversidade quanto à religião, tendo representantes espíritas,
budistas e um integrante que não professa nenhuma religião. A grande participação em
religiões denominadas “espiritualistas” pode estar ligada ao nível de tolerância que cada
uma delas impõe às práticas homossexuais.
Outras características da população foram contempladas, a partir de diferentes
questões do instrumento de coleta e serão apresentadas ao longo do processo de análise.
10
Chats são espaços virtuais destinados à bate-papo entre os internautas.
78
6.2 Algumas representações da Paternidade
Os dados do questionário e, especialmente os do grupo focal, trazem vários
apontamentos acerca das representações que os integrantes e a sociedade em geral têm
acerca da paternidade e, especificamente, da paternidade homossexual.
Ao serem solicitados a discorrer sobre sua experiência em ser pai, vários sujeitos
fizeram menção a essa função numa vinculação direta com necessidade em “ter maior
responsabilidade” para a criação dos filhos. A dificuldade financeira é muitas vezes
apontada e a importância da educação e orientação dos filhos aparecem como essenciais
na função paterna.
podemos ter lhe dado uma boa educação, influência cultural e espiritual e
graças a muita atenção não mais uma alienada neste mundo. (S11, 40
anos).
[...] uma das melhores coisas que me aconteceu o que complica é o
financeiro – pesa (S8, 34 anos).
Ser pai é amar incondicionalmente e oferecer orientação para os filhos [...]
(Antônio, 61 anos).
Ser pai é ter amor e responsabilidade para com os filhos, acompanhando
sua formação e sugerindo comportamentos éticos e padrão (S93, 46 anos).
A grande menção feita pelos sujeitos à questão financeira pode remeter à função de
provedor, historicamente construída. Tal função atribuiu ao homem a função de manter
financeiramente a família, já que, historicamente, a utilização de espaços públicos,
especialmente os do trabalho remunerado, foi designada aos homens. A ausência do pai,
pelo contingente de trabalho é bem explicitada por Valter, ao dizer que
como ele [seu pai] era o provedor... ele era mais interessante do que minha
mãe, só que ele não tinha oportunidade de conviver com a gente, de
educar, de ensinar umas coisas... por que ele trabalhava tanto... e minha
mãe que ficava lá com agente era uma pessoa muito menos interessante,
entendeu... então, quando agente teve oportunidade de aproximar, de ter
aquele acolhimento mesmo, legal, que a gente gostaria de ter do pai, aí ele
79
já estava velho, quase morrendo de trabalhar [...] o pai na sociedade é um
pouco distante dos filhos (Valter, 38 anos).
Nas respostas aparecem também representações que naturalizam a paternidade.
Vários sujeitos dizem que ser pai é um papel natural, sendo que qualquer pessoa pode estar
sujeito a ele. Essa questão vai de encontro com o que aponta Costa (2002) ao perceber em
sua pesquisa que o atributo biológico é de extrema importância para a constituição e o
reconhecimento social da paternidade. No questionário e no grupo focal os sujeitos dizem
que
No começo foi muito difícil, depois notei que é uma coisa tão natural. (S57,
36 anos).
eu acho que indiferente da orientação sexual do indivíduo, ele nasce com
essa... com essa propensão, né a formar novas criaturas [...] eu acho que
faz parte do instinto do ser humano, independente da orientação sexual que
ele tem.. (Joel, 53 anos).
[...] mesmo assim, considero o ato de ser pai biológico, um fato natural [...]
(S76, 59 anos).
É natural, quando encarada com responsabilidade. Isso significa cumprir as
funções sociais (S94, 32 anos).
Nesse sentido, a adoção, pela ausência da descendência biológica, acaba por ficar à
margem das representações do que é ser pai. Antônio (61 anos), pai de seis filhos adotivos
aponta que a representação que ele percebe na sociedade de “ser pai” está totalmente
vinculada com a relação sanguínea:
o que eu percebo é que noventa e nove vírgula zero nove por cento das
pessoas é que ser pai é repartir com o espermatozóide no óvulo [...] agora,
e isso me atinge muito sabe, realmente me atinge... e aí a forma como
certas pessoas me fazer perguntas: aqui... você não quis ter um filho seu,
de verdade?
Costa (2002) afirma também que, no caso da adoção, existe uma vinculação de
afeto, carinho, amor, sentimentos desencadeados na experiência de criar filhos de outros
homens. A mediação sangüínea é sempre vista como bem vinda, alterando a imagem dos
homens acerca da paternidade.
80
Os participantes do grupo focal falaram muito da experiência que tiveram com seus
pais, sendo essa uma experiência distante em que o pai nunca se via presente. Segundo
eles, as pessoas ainda vêem o pai como aquele que irá prover a família, mesmo
percebendo que essa imagem tem mudado atualmente.
Quando questionados sobre a imagem que as pessoas tem da paternidade
homossexual, todos os integrantes do grupo focal mencionam representações negativas,
carregadas de preconceito. Eles afirmam que a sociedade pensa que, por serem
homossexuais irão fazer com que os filhos tenham problemas no desenvolvimento ou vão
fazer mal a eles.
Se as pessoas não conhecem o pai gay pessoalmente, intimamente, as
pessoas imaginam que ele vai desvirtuar o filho, que ele vai corromper o
filho ou a filha, que ele vai transformar o filho ou a filha dele... é muito
doloroso esse processo, sabe... então, por exemplo, aqueles pais gays que
estão dentro do armário, que são muitos, milhares [...] acabam acentuando
para que as pessoas continuem refletindo e pensando que nós vamos, de
repente, corromper nossos filhos, que nós vamos desvirtuar nossos filhos,
que nós vamos transformar nossos filhos em aberrações, e coisas assim...
(Joel, 53 anos).
boa (a experiência de ser pai) e mais sofisticada que pais heterossexuais
apesar dos problemas diante da aceitação social (S38, 43 anos).
[...] tive uma experiência lamentável, no bairro Y, [...] correu um boato entre
rapazinhos do bairro, de que eu adotava meninos pra que no futuro eles
viessem a me quebrar o galho... e que eu adotava as meninas pra disfarçar
(Antônio, 61 anos)
A mãe da minha filha não sabe o que sou... [...} acho que nem deixaria eu
ver mais minha filha (Breno, 43 anos).
É perceptível então que existem muitas representações negativas acerca da
paternidade exercida por homossexuais. Ainda existe a imagem de que o pai irá abusar de
seus filhos e que, por serem exacerbadamente sexualizados, irão transmitir sua sexualidade
e/ou orientação sexual aos filhos e filhas. (RAMIRES, 1997).
O preconceito em relação à homossexualidade e às práticas e vivências
relacionadas a elas ainda é muito alto. As imagens negativas que a sociedade construiu
acerca do homoerotismo perpetuam-se nos vários espaços da sociedade. O gráfico 03
81
demonstra o índice de discriminação sofrida pelos sujeitos que responderam ao
questionário:
Bars show counts
2
Sofreu discrimin.
NR
Não
29
65
Sim
0
20
40
60
Count
Gráfico 03: População respondente, quanto ao nível de discriminação sofrida
Os locais de discriminação mais citados na pesquisa, respectivamente, foram o
trabalho, a família, os amigos e a escola, instituições e organizações bem próximas dos
sujeitos. Os tipos de discriminação mais citados foram a agressão verbal e a coação. Outra
citação interessante que apareceu na opção “outro” foi a violência policial. Três sujeitos
afirmaram terem sido violentados por policiais. Isso demonstra que, inclusive os dispositivos
criados para a vigilância e cumprimento da lei reproduzem as práticas de marginalização ao
homossexual.
82
6.3 Sou gay e tenho filhos!: Paternidade X orientação sexual
Ao solicitar aos sujeitos que falassem de sua experiência em ser pai, na condição de
homo/bissexual, duas grandes tendências foram percebidas: a) respostas baseadas no
pressuposto de que a paternidade e a orientação sexual são dimensões independentes; b)
respostas construídas na tentativa de articular essas duas dimensões. Em cada uma dessas
tendências, foi possível observar várias categorias que organizam a experiência desses
homens e oferecem a eles possibilidades de significação dessa vivência.
Quanto à tendência em tratar como independentes a dimensão paterna e de
orientação sexual, pode-se dizer de uma estratégia em organizar o cotidiano, de forma a
prevenir possíveis especulações e taxações por parte da sociedade. Como existe uma série
de representações que acreditam ser a paternidade uma vivência restrita aos
heterossexuais e que os homo/bissexuais irão prejudicar o desenvolvimento de seus filhos,
esses homens, possivelmente, buscam articular a função de pai separadamente das
experiências sexuais, buscando encontrar formas de garantir que a sexualidade não interfira
na criação de seus filhos. Essas respostas podem dizer ainda de alguns elementos da
relação pesquisador/pesquisado já que, ao não saber os pressupostos que norteiam o olhar
da pesquisa, torna-se importante prevenir-se de quaisquer tentativas de patologização e/ou
segregação de sua condição de pai homo/bissexual. Essas respostas podem ser percebidas
nas seguintes citações:
Na minha vida estes dois "rótulos" são independentes. Assim, ser pai é
ótimo, ser gay também (S22, 49 anos).
ser pai e gostar de praticar sexo com parceiros do mesmo sexo é algo que
não interfere em nada minha conduta de pai, desde que sempre soubesse
separar ambos os espaços (S24, 46 anos).
São campos totalmente diferentes, a sexualidade e a paternidade [...] Não é
minha sexualidade que modifica o exercício da paternidade. (S32, 31 anos)
Não permito que os personagens se confundam, ou se misturem (S27, 37
anos).
83
Outro elemento muito presente nas respostas dos sujeitos que responderam ao
questionário é em dizer que essa experiência é “normal”. Essa tentativa, possivelmente, está
ligada à tentativa em manter-se numa posição de normalidade na sociedade, buscando,
mais uma vez, “proteger-se” de discursos patologizadores, apontando para uma possível
estratégia de enfrentamento às práticas segregadoras que a sociedade produziu para
combater a homossexualidade. Abaixo, alguns fragmentos das respostas dos sujeitos que
buscam normalizar sua experiência:
normal, encaro numa boa (S39, 36 anos).
para mim não é contraditório. Normal (S47, 50 anos).
Eu encaro tudo como se fosse normal pois pra mim tudo isso é normal (S91,
32 anos).
absolutamente "normal"... (S80, 20 anos)
Nos questionários, os sujeitos que buscam atribuir independência à dimensão
paterna e à orientação sexual, geralmente, apresentam a experiência paterna como positiva,
caracterizando-a como feliz, tranqüila, maravilhosa, etc. Os participantes do grupo focal
também falam dessa experiência como extremamente gratificante, articulando-a com
dádivas divinas, missões religiosas, possibilidades de amar e ser amado, etc. Além disso, é
possível perceber que vários sujeitos tinham, em seu projeto de vida, a realização da
paternidade. O gráfico a seguir demonstra essa afirmação:
84
2,08%
Projeto de Vida
Sim
Não
NR
23,96%
Pies show counts
73,96%
Gráfico 04: População respondente quanto ao projeto de vida em ser pai
Podemos pensar que, conforme aponta Costa (2002), a paternidade é quesito básico
para a construção da masculinidade do homem casado. Dos sujeitos que responderam essa
pesquisa, 51% passaram pela experiência do casamento, podendo, em alguma medida,
justificar o elevado índice de respostas positivas em relação à paternidade como projeto de
vida, ainda que não seja a única interpretação possível para esse dado.
Esse índice é também importante para se pensar a forma em que os sujeitos
dispuseram para alcançar a paternidade. Das opções oferecidas no questionário, a única
que não foi marcada por nenhum sujeito foi a inseminação artificial. A tabulação dos dados
relacionados a essa questão foi feita mediante a freqüência de citações em cada opção, já
que o respondente poderia marcar mais de uma. Assim 79 sujeitos citaram a relação
heterossexual como a forma pela qual alcançaram a paternidade, e 17 citaram a adoção.
Entrecruzando esse dado com a categoria orientação sexual, obteremos uma informação
importante. O número de homossexuais que citaram a adoção como forma de alcançar a
paternidade é consideravelmente maior que o de bissexuais. Calculando a freqüência das
citações em proporção ao total de respondentes de cada orientação, encontra-se o seguinte
percentual: o número de homossexuais é 24% maior que o de bissexuais. Em contrapartida,
85
o número de homossexuais que afirmaram ter filhos adotivos é 83% maior que o de
bissexuais. A tabela 11 permite uma melhor visualização desse dado:
TABELA 11
POPULAÇÃO RESPONDENTE, CONFORME ORIENTAÇÃO SEXUAL E
ESTRATÉGIA PARA OBTENÇÃO DE FILHOS
Orientação Sexual
Como obteve filhos (citações)
Relação Heterossexual
Adoção
Mãe de aluguel
Inseminação espontânea
Outro
Total de sujeitos da amostra
Homossexual
39
11
1
1
4
52
Bissexual
Travesti
38
6
0
0
0
42
1
0
0
0
0
1
Outro Total
1
0
0
0
0
1
79
17
1
1
4
96
Se tomarmos como referência a categorias “relação heterossexual” e “outras formas”
de alcançar a paternidade, esse índice é ainda maior. Sendo assim, o número de
homossexuais que cita a “outras formas” para alcançar a paternidade é 183% maior que o
de bissexuais.
Essas informações são importantes para se pensar a paternidade, já que diferentes
orientações possibilitam ou restringem uma gama de opções e arranjos relacionados à
escolha e à vivência do papel de pai. Na opção “outro“, ainda para essa questão,
apareceram duas afirmações de adoção não legalizada ou “adoção à brasileira”. No grupo
focal, um dos sujeitos adotou seis filhos dessa forma, registrando-os em cartório como se
fossem seus filhos biológicos.
Essa questão nos remete à questão legal da adoção que, mesmo permitindo a
adoção individual por quaisquer indivíduos, independente da crença, orientação sexual, cor,
etc, ainda lança mão desses atributos no processo de jurisprudência (FUGIE, 2002).
Nesse recorte de uma das falas de Joel, militante no movimento GLBTT de Minas
Gerais, ele contextualiza a situação da legislação da adoção no Brasil:
86
A Legislação de adoção, na verdade, ela não existe... a legislação dos gays
ela não existe... Nós somos obrigados a pagar 47 impostos como qualquer
cidadão brasileiro, e nós temos nada mais nada menos que 37 direitos a
menos, né... entre esses direitos um deles é a adoção... [...] a legislação que
existe é para pais heterossexuais... o que acontece, que é o caso do
Antônio, por exemplo, é que ele adota sem identificar a orientação sexual
dele né... isso aos olhos vendados do judiciário, da trama da justiça, é
perfeitamente possível de passar, agora se ele assume a homossexualidade
e a parceria com quem ele vive pra os dois adotarem, aí já é uma guerra
jurídica quase que intransponível, [...] mas aí (no caso da adoção individual)
tem um procedimento muito mais cruel pra criança e pro pai do que se o pai
for hetero ou a mãe heterossexual, que é um processo doloroso mas é
menos sofrido... [...] a gente entende hoje que o judiciário é muito mais veloz
do que o legislativo... por que quando você provoca o judiciário, você obtém
respostas, quando você provoca o legislativo você obtém morosidade [...]
(Joel, 53 anos).
Apesar da legislação não permitir a adoção conjunta para homossexuais, a
jurisprudência paulista aferiu, no dia 30 de Outubro de 2006, a adoção conjunta para um
casal de homossexuais masculinos em São Paulo. É a primeira, no Brasil, favorável à
adoção para dois homens, sendo precedida por dois casos de mulheres que adotaram
conjuntamente seus filhos (REDAÇÃO TERRA, 2006).
Ainda nas respostas que diferenciam a paternidade da orientação sexual é possível
perceber que vários sujeitos avaliam positivamente a paternidade e negativamente a
homossexualidade, apontando dificuldades na vivência de suas sexualidades:
A experiência de ser pai é maravilhosa independe de ser gay ou não, já a
experiência de ser gay não sei se tão maravilhosa assim, mais é a minha
missão... (S15, 29 anos).
ah ser pai é muito maravilhoso me traz muita felicidade ser gay eu não
gosto muito (S88, 17 anos).
ser pai é maravilhoso; ser gay as vezes é um pouco frustrante (S96, 42
anos)
Nas respostas que tendenciam à reflexão e articulação das dimensões paterna e de
orientação sexual é perceptível um apontamento para a experiência paterna na condição de
homo/bissexual como vivência difícil, complicada e conturbada. Nessas respostas, que
evidenciaram o surgimento de conflitos, os sujeitos narram suas experiências, geralmente,
entrecruzando esses dois elementos: sua orientação sexual e sua condição de pai. Nesse
87
sentido, é encontrada também uma considerável preocupação com o futuro dos filhos,
dimensionando as possíveis conseqüências que este pode enfrentar, em ter um pai
homossexual. As citações a seguir, demonstram claramente essas características:
Difícil (a experiência de ser pai gay). Maritalmente, a função de pai é um
grande desafio. Pai gay ganha um acréscimo significativo em termos de
desafio [...] (Antônio, 61 anos).
é muito complicado. Tenho por prioridade meus filhos, tomo todo cuidado
para não misturar as coisas (S85, 39 anos).
no início é estranho pois você já imagina no futuro quando seus filhos
crescerem podendo os mesmo não te aceitarem [...] (S83, 31 anos).
Não é uma experiência fácil por que você não pode agir naturalmente com
sua sexualidade como agem os heterossexuais não é? E nunca sabemos
se nossos filhos vão nos aceitar, pra quem pretende contar... (Valter, 38
anos)
De início foi assustador, pensava em todo momento como seria minha vida,
o que vão falar de mim com meu filho (S73, 31 anos).
Além disso, esses sujeitos apontam também o preconceito que interfere diretamente
na vivência da paternidade, especialmente dos que se afirmam “assumidos”. Esses
preconceitos são oriundos das imagens negativas que, conforme dito anteriormente, a
sociedade atribui ao pai homossexual. É importante ressalvar que a ciência ainda contribui
para as discussões da paternidade/maternidade homossexual, no sentido de desmerecê-la.
A própria psicanálise serve de parâmetro para vários autores defenderem a idéia de que
filhos de homossexuais podem sofrer rupturas nas relações edípicas, construindo
identidades de gênero aberrantes e comportamentos sexuais inadequados. Alguns
discursos problematizam a maternidade homossexual, ao dizerem que o ambiente onde os
filhos serão criados será desprovido de referenciais masculinos e, pelo seu ódio em relação
aos homens, aumentará a chance de constituir filhos ou filhas homossexuais (UZIEL, 2004).
Percebe-se nesses discursos que a norma heterossexista ainda prevalece,
colocando em cheque a possibilidade de crianças construírem uma identidade homossexual.
Alguns sujeitos apresentam experiências negativas da paternidade, em função de
outros elementos de sua vida. Segundo esses sujeitos, a paternidade não é (ou não tem
88
sido) uma experiência agradável, pelo distanciamento dos filhos, problemas com a mãe do
filho ou falta de identificação com o papel de pai.
Difícil, porque me sinto um pai omisso, gerando culpa em mim. Procuro
compensar, mas mesmo assim é complicado, gostaria de estar com eles, ou
passeando com eles sem precisar observar outros homens [...] (S52, 48
anos).
É uma aventura para qual não fui treinado nem preparado [...] (S29, 42
anos).
é um pouco complicado. Quando me casei achei que minha atração por
homens passaria. Mas não passou. Agora é complicado pois não deve ser
fácil para uma pessoa ver o pai como um gay (S54, 41 anos).
As vezes eu me pego sendo um pai por obrigação, simplesmente, to
tentando mudar isso agora, por que agora num tem mais obrigação, é
questão de sentimento [...] mas até hoje eu fui um pai de obrigação,
simplesmente (Breno, 43 anos).
pra mim não por ser gay, mas foi a experiência mais ruim que já tive. Tive
muitos problemas com a mãe da minha filha e com isso não pude ter a
chance de ser pai por completo (S61, 33 anos).
O distanciamento dos filhos, apontando por vários sujeitos como elemento
desagradável na experiência paterna é também percebido através da análise da questão
que objetiva saber com quem os filhos residem, conforme tabela 12:
TABELA 12
POPULAÇÃO RESPONDENTE, QUANTO À RESIDÊNCIA DOS FILHOS
Residência dos filhos
Com você
Com a mãe
Avós maternos
Avós paternos
Outro
Total
Freq.
29
50
2
3
12
96
%
30,2
52,1
2,1
3,1
12,5
100
Como se pode ver, aproximadamente 58% dos sujeitos afirma que seus filhos não
residem com eles. No item “outro”, alguns sujeitos apontam que os filhos residem
conjuntamente com o pai e com a mãe.
89
O grande número de filhos que residem com a mãe pode estar vinculado à
legitimidade oferecida à tutela do filho, prioritariamente da mãe, tanto pelo tecido social,
quanto pela legislação em vigor. O direito prioritário à guarda dos filhos ainda é dado à mãe,
reafirmando a naturalização desse papel e o fato dos dispositivos legais servirem de
instrumentos para legitimar um significado construído sócio-historicamente.
6.3.1 Identidade Sexual: Produto ou processo?
Durante o processo de revisão bibliográfica e a trajetória de coleta de dados,
apareceu aos pesquisadores uma inquietação relacionada ao posicionamento dos sujeitos
em relação à sua identidade sexual. Essa inquietação surgiu a partir da dificuldade de
alguns sujeitos que responderam à primeira versão do questionário, em autodefinir-se a
partir das categorias de orientação sexual apresentadas. A partir daí, algumas reflexões
foram feitas e, ainda que esse não fosse o objetivo principal desta pesquisa, passou a fazer
parte do objeto de estudo podendo, inclusive, ser contemplado pelo terceiro objetivo
específico delimitado pelos pesquisadores. Para tanto, foram inseridas duas perguntas no
questionário on-line, bem como ampliadas as possibilidades de resposta quanto à
orientação sexual, a fim de conhecer alguns fatores que estivessem articulados com essa
dificuldade em autodefinir-se, percebida na pesquisa de campo.
As perguntas são as seguintes: a) como se sente em ter que se auto-definir a partir
de uma das categorias de orientação sexual, apresentadas na questão 01 (possíveis
respostas: “agradável”, “desagradável” e “não sei”); b) Por quê? (questão dissertativa).
Numa análise quantitativa, obteve-se aproximadamente 60% de respostas positivas
(sente-se agradável). Cerca de 20% afirmaram sentir-se desagradável, 17% não souberam
responder e 3% não responderam. É importante dizer aqui que, a partir de uma análise
qualitativa minuciosa, percebeu-se que a questão (a) não mensurou exatamente aquilo a
90
que se propôs. Algumas respostas foram dadas, a partir do entendimento da pergunta, da
seguinte forma: Como você se sente em definir-se cormo gay ou bissexual? Ainda assim,
várias respostas trouxeram, em seu conteúdo, os objetivos a que esta questão se propôs a
conhecer, oferecendo alguns apontamentos para a identidade sexual.
3,13%
Categoria Identid.
Agradável
Desagradável
Não sei
16,67%
NR
Pies show counts
19,79%
60,42%
Gráfico 05: Sentimento em relação às categorias identitárias
A partir da análise dessas respostas, percebeu-se, da mesma forma que na pergunta
relacionada à descrição da experiência da paternidade homossexual, duas principais
tendências para justificar a resposta “agradável”: a) estratégia política; b) negação de
preconceito ou quaisquer problemas com a sexualidade. Essa segunda pode estar vinculada
ao não entendimento da questão, apresentando respostas que buscam valorizar a própria
identidade sexual e o bem-estar em exercê-la ou vivenciá-la.
Porque hoje sou uma pessoa assumida e respeitada pelo trabalho que
realizo e todos sabem de minha orientação sexual. (S2, 46 anos).
Não vejo nenhum problema em ser homossexual, sou um cidadão com
outro qualquer (S4, 30 anos).
por que sofri muito para chegar onde estou e, não devo mais nada a
ninguém (S63, 41 anos).
91
Não tenho problemas com minha identidade sexual. (S9, 39 anos).
não tenho problema alguma em me assumir gay. Sou completamente
assumido em TODOS os espaços em que circulo (S34, 38 anos).
O que se percebe em questões como as citadas acima é a aceitação de sua
condição de homossexual/bissexual, justificando-se no orgulho em permanecer nessa
condição.
Sentir-se agradável em definir-se a partir de uma das categorias de identidade
sexual, aparece também como justificativa pautada na necessidade em oferecer visibilidade
para a comunidade GLBTT. Como estratégia política, esses sujeitos buscam a visibilidade,
pensando na aquisição de direitos e de reconhecimento social.
Me sinto, como jovem que cursa uma faculdade, no dever de me autodefinir,
muito embora não seja legal possuir rótulos, mas, no caso, é dever por
mostrar a cara a outros que não admitem a própria homossexualidade,
muitas vezes por temer ameaças (S18, 27 anos).
Faço questão que a sociedade atual saiba que existimos e fazemos parte
dela. Apesar de todos os estigmas que lançam sobre os gays sou cidadão
(pago impostos, escolho representantes políticos e faço parte do sistema)
Acredito que com a assunção dos gays a sociedade fará valer o princípio da
isonomia vigente na CF, estendendo aos gays todos os direitos estritamente
reservados aos heterossexuais (S28, 28 anos).
(definir-se possibilita) segurança, sensação de autoconfiança, atitude
política e modelo positivo para novas gerações (S38, 43 anos).
sou militante do movimento homossexual (S86, 42 anos).
é a própria academia que rotula isso... eu não me sinto diferente do resto da
humanidade por ser homossexual, é um rótulo que eu tenho comigo, é a
forma que eu tenho de externar minha forma de ser, de sintetizar minha
forma de ser... mesmo por que eu faço parte de uma minoria, né... então eu
acredito que essa questão do rótulo [...] é uma naturalização que academia
coloca na sociedade... eu acho que não deveria ser assim, né... na questão
humana, eu não me sinto bem, me sinto realmente incomodado de ter que
me rotular como homossexual [...] mas enquanto pertencente a um grupo,
né, específico, eu me sinto orgulhoso de estar participando desse grupo [...]
eu percebo que isso me torna melhor como ser humano (Joel, 53 anos).
Algumas dessas citações apresentam representações acerca da homossexualidade,
para além de uma prática ou comportamento sexual específico. Elas apontam para a
construção histórica da homossexualidade como uma categoria identitária distinta,
92
possuidora de atributos e caracteres que formam uma identidade ou personalidade
específicas. (WEEKS, 2001; ADELMAN, 2000).
São detectadas também, três tendências de justificativas para aqueles que afirmam
sentir-se desagradável diante do imperativo em definir sua orientação sexual: a) a
percepção de que a sexualidade é maior do que uma categoria; b) a percepção de que a
sexualidade não é fixa; e c) insatisfação em ser rotulado pela orientação e não por outros
atributos.
Acredito no ser humano sexual, sem estas rotulações (S11, 40 anos)
Por q não gostaria q nos definisse com homossexual,heterossexual etc... e
sim com cidadão (S15, 29 anos).
Minha escolha sexual está sendo oportuna... (S16, 49 anos).
Porque acredito que a sexualidade é muito mais ampla do que tais
categorias; não sou adepto de rótulos. Além do que, não sinto necessidade
de me autodefinir...sou tranqüilo comigo mesmo e sempre me senti como
alguém capaz de amar independente de sexo, raça ou demais diferenças.
(S32, 31 anos).
a sexualidade evolui. Já gostei de mulher, hoje não gosto mais. As
classificações são pobres (S50, 42 anos).
bom, realmente não me encaixo em nenhum desses moldes. Minha
orientação sofre influências diversas (S51, 43 anos).
ainda não assumi completamente essa nova visão sexual. Tudo ainda é
novidade [...] Quando me tornei pai, pertencia ao grupo "hetero", daí era
uma conseqüência natural a paternidade. Há cerca de 3 anos atrás, num
relacionamento "hetero", apesar de já estar enquadrado no grupo dos "bi",
fui pai novamente [...] (S76, 59 anos).
Eu quando tive os meus filhos eu não sabia que era gay,estava casado com
uma mulher que eu jurava que amava (S35, 42 anos).
Vários desses recortes demonstram uma insatisfação em enquadrar-se numa
categoria identitária específica. Algumas descrições das experiências pessoais de alguns
sujeitos demonstram o caráter processual da identidade sexual. Alguns deles afirmam,
inclusive, mudanças no objeto de desejo, outros apontam diferentes comportamentos e
performances sexuais em momentos distintos.
93
A tabela 13 apresenta a articulação do posicionamento diante da definição das
categorias identitárias, em relação à orientação sexual apontada:
TABELA 13
POPULAÇÃO RESPONDENTE QUANTO À ORIENTAÇÃO SEXUAL E
POSICIONAMENTO DIANTE DAS CATEGORIAS INDENTITÁRIAS
Orientação Bissexual
Sexual
Homossexual
Travesti
Outro
Total
Sentimento em relação à identidade
Total
Agradável
Desagradável Não sei NR
42
20
11
9 2
52
38
7
6 1
1
0
0
1 0
1
0
1
0 0
58
19
16 3
96
Percebe-se que o número de bissexuais que se sentem desagradáveis em definir
sua identidade sexual é, aproximadamente, 55% maior que o de homossexuais. Esse dado
pode apontar para um controle maior de identidades flexíveis ou “mutáveis”, já que essa
categoria identitária permite uma maior circulação pelos espaços sexuais e um
comportamento sexual mais abrangente. Possivelmente, esses sujeitos que se afirmam
bissexuais passam por uma série de situações, onde são chamados a posicionar-se, numa
perspectiva mais definitiva, concreta, inflexível e direcionada (características mais atribuídas
à categoria homossexual). Daí pode-se constatar, possivelmente, uma maior inquietação em
se definir, sexualmente, pelos bissexuais.
É preciso estar atento a essas especificadas apresentadas pela construção da
identidade. A modernidade oferece arranjos alternativos de produção identitária, apontando
elementos que fazem emergir uma concepção de identidade como processo. (CIAMPA,
1994). As categorias identitárias, entendidas por alguns sujeitos como forma de sistematizar
“quem eles são” acabam por simplificar a complexidade do conceito e das manifestações da
identidade, conferindo-lhe, ainda, um caráter inflexível, como produto final a ser adquirido,
definitivamente, num determinado momento da vida.
94
Conforme propõe Ciampa (1994), as articulações da identidade com outras
categorias como gênero, sexualidade, raça/cor, etnia, geração, etc, possibilitam vários
processos de construção e desconstrução da noção de “quem sou eu”, permitindo que essa
noção se altere no decorrer da vida dos indivíduos. Contudo, recorrer a uma certa natureza
dessa identidade pode se referir a uma estratégia política, não cabendo a este estudo o
julgamento valorativo dessa estratégia.
6.4 Paternidade e Masculinidade
Outro aspecto importante a ser abordado neste estudo é a possível articulação da
paternidade com as concepções de masculinidade. É importante conhecer também em que
medida, a função paterna se aproxima do ideal do que é “ser macho” e quais os fatores
presentes nessa relação.
Vários sujeitos afirmam que após o alcance da paternidade, suas vidas mudaram
profundamente, e afirmam que alcançaram um maior reconhecimento social e foram mais
“bem vistos” pelos amigos e conhecidos.
não por ser gay mas acho que qualquer pessoa se sente assim apenas por
ser pai e progenitor (S36, 32 anos).
muito boa nunca pensei que iria mudar minha vida estou muito feliz (S45, 26
anos).
Engraçado que o povo do interior não conhece muito essas coisas (gays),
nem se falam nisso. [...] eu sou homem lá em casa... eu tenho filho ué... eles
devem pensar: que menino diferente!... mas é homem, ele tem filho...
(Valter, 38 anos).
Ser pai para min esta sendo maravilhoso, estou feliz, sua vida muda
automaticamente para melhor.quanto ao fato de ser gay [...] passei a ser
mais respeitado pela sociedade (S90, 42 anos).
95
A construção da paternidade está estreitamente vinculada às noções de
masculinidade. Ainda que de formas diferentes para sujeitos diferentes, ser pai é aumentar
as características definidoras da masculinidade (TARNOVSKI, 2004). Mesmo não tendo o
mesmo grau de vinculação que a maternidade tem com a feminilidade, a paternidade
constitui elemento importante para a construção de uma identidade masculina. Conforme,
percebe-se na história, o exercício do pai era de fundamental importância para a existência
da família já que este papel constituiu um dos tripés da família nuclear burguesa, momento
histórico de ascensão da masculinidade em que o homem, por receio em misturar-se com
as características femininas e homossexuais, definiu uma série de características
específicas para se distinguir de “seus inferiores” (SILVA S., 2000).
No grupo focal surgiram discussões que possibilitaram a verificação dessa premissa,
a partir da questão relacionada com projeto de vida. Um deles afirma que ter filhos
representava um desejo, mesmo tendo a consciência da sua homossexualidade. Outro
localiza o sonho em ser pai desde a juventude, justificando-se na crença religiosa e na
percepção de que tinha resgates de vidas passadas com a paternidade e, por isso,
identificava-se tanto com ela:
Sempre tive relações homossexuais, sempre soube disso [...] mas um dia
percebi que precisava constituir família, ter filhos e esposa. Então foi o que
fiz, entende? (Joel, 53 anos).
Desde moleque queria ser pai, achava linda essa função. Com 17 para 18,
adotei a primeira criança, foi linda a experiência (Antônio 61 anos).
Mais uma vez, o gráfico 04 que correlaciona paternidade e projeto de vida demonstra
a função paterna como elemento muito importante na vida dos sujeitos. Adequar-se às
normas sociais do que é ser homem e de como vivenciar a masculinidade é ganhar poder e
conquistar reconhecimento (COSTA, 2002; LEVANDOWSKI; PICCININI, 2002).
É interessante notar que ocorreu um considerável apontamento de sentimentos
como amor, afeto, atenção e comportamentos como cuidado e carinho, vinculados à
paternidade.
Historicamente
esses
caracteres
foram
atribuídos
à
mulher
e,
96
conseqüentemente ao papel da mãe. Contudo, tem surgido uma preocupação em dividir
essas tarefas com a mulher, estando mais próximo dos filhos, participando das tarefas de
cuidar, educar, etc. É o que vários autores vão chamar de aparecimento de um “novo pai”,
fenômeno este que se intensificou nas últimas décadas (LYRA 1998; TRINDADE;
MENDRADO, 2002; LEVANDOWSKI; PICCININI, 2002; ROUDINESCO, 2003; GOMES;
REZENDE, 2004).
Sempre amei minhas filhas como elas são, e muito embora elas tenham tido
inicialmente um choque, depois tudo se ajeitou com a afetividade, respeito e
aceitação mútua (S63, 41 anos).
[...] meu filho está com 15 anos, é possível dialogar sobre isso, os
problemas que aparecem (na escola, com as namoradas dele, em outros
locais de convívio), nós vamos resolvendo juntos [...] (S60, 50 anos).
[...] todo processo de homofobia que ela (a mãe do filho) colocasse na
cabeça dele, o meu contra seria dar muito amor né, muito amor, muito
carinho, muita atenção, até chegar o ponto que ela perceberia e ele
perceberia a diferença e foi o que aconteceu, deu muito certo [...] (Valter, 38
anos).
[...] decorridos o 1º susto apresentou surpresas agradabilíssimas como o
acompanhamento do desenvolvimento dela...seus 1º passos, suas 1ª
palavras, sua entrada na escola, seus 1º problemas decorridos do
abandono pela mãe, o acompanhamento psicológico q tivemos [...] (S1, 33
anos).
Conclui-se então, a partir dessas citações, que a paternidade tem se construído de
forma diferenciada, apostando mais em uma relação menos distanciada do filho. Além
desse elemento, outros fatores contribuem para essa nova paternidade, especialmente para
a população dessa pesquisa. De certa forma, são homens que romperam com os padrões
rígidos de masculinidade na sociedade. Assim, suas vivências estão marcadas por relações
mais flexíveis e dialogadas de gênero, divisão mais justa das tarefas de casa e do cuidado
com as crianças, etc.
Os integrantes do grupo focal, com exceção de 01, dizem manter um diálogo
constante com os filhos. A tentativa de desverticalização das relações pai-filho pode trazer
apontamentos para características positivas da paternidade homo/bissexual, em que
discorreremos detalhadamente, mais adiante.
97
6.5 Paternidade gay hoje... Dificuldades X possibilidades
Diante da exposição das experiências em ser pai homossexual e da reflexão acerca
dessa possibilidade na sociedade, os sujeitos, tanto do questionário, quanto do grupo focal,
apresentam algumas possibilidades e dificuldades na concretização e vivência desse papel.
Algumas, inclusive, já foram explicitadas nos subcapítulos anteriores, por fazerem referência
há outras categorias de análise.
Dentre as dificuldades apresentadas pelos sujeitos, as mais citadas são: a) o
preconceito e a discriminação em relação à homossexualidade e ao papel do pai exercido
por esta orientação sexual; b) o distanciamento dos filhos, oriundo da tutela dos filhos ser
aferida, tanto socialmente, quando juridicamente, à mulher e; c) a falta de identificação e/ou
preparo para exercer a função de pai. Esses obstáculos, que algumas vezes aparecem
articulados entre si na experiência de muitos sujeitos, apontam que a paternidade de gays
ainda não está socialmente legitimada na sociedade. Existe uma série de dispositivos que
se opõem à permissão da guarda e da permanência dos filhos com seus respectivos pais,
dada a sua orientação sexual. Esses dispositivos também obstruem o processo de
visibilidade que o movimento homossexual e os sujeitos que já vivenciam tal experiência
têm tentado oferecer às famílias formadas por pais gays e mães lésbicas.
Algumas pesquisas foram realizadas na tentativa de se comparar a criação de filhos
criados por pais e/ou mães homossexuais, trazendo dados interessantes. Essas pesquisas
não encontraram diferenças significativas em relação à escolha objetal dos filhos, tanto com
famílias onde apenas um dos genitores é homossexual, quando em casos onde o único
genitor é homossexual. Foram realizados também alguns testes nos Estados Unidos, na
tentativa de se encontrar tipologias patológicas em relação à orientação sexual de pais
homossexuais e heterossexuais. Além de nenhuma evidência ter sido encontrada, apontouse para uma tendência positiva em mães homossexuais, acerca de elementos importantes
na criação dos filhos (UZIEL, 2004). Esse fato demonstra a tentativa em se conhecer melhor
98
essa realidade e, dependendo da origem teórica e dos pressupostos epistemológicos da
pesquisa, apresentar elementos convincentes de que a paternidade homossexual não
oferece risco aos filhos.
Quanto às possibilidades apresentadas pelos sujeitos de pesquisa, proporcionadas
pela experiência de ser pai e gay, pode-se perceber duas grandes características presentes
na paternidade de homens gays: a) o contato com a diversidade, não somente a sexual, a
qual a criança é submetida; b) como possibilidade em se conquistar reconhecimento social,
atributo que, segundo os sujeitos, a paternidade confere ao homem.
Os sujeitos afirmam que a orientação homo/bissexual é um elemento que possibilita
o exercício e o diálogo acerca da diversidade sexual, capaz de contribuir para a construção
de um discurso mais tolerante e respeitoso nos filhos, diante da diferença sexual.
Tento passar a melhor educação possível para meu filho, de uma
forma que ele seja desprovido de qualquer preconceito, que o
importante é ser feliz, não importando de que forma e com quem [...]
(S4, 30 anos).
acho que oportunizo ao meu filho, conviver com a diversidade de uma
forma absolutamente natural. Não me sinto constrangido por isso e
ele, cada vez mais, dá demonstrações de lidar com esta informação
com equilíbrio. (S34, 38 anos).
[...] sabemos como educar sem formar pessoas brutas e delicadas
demais (S56, 40 anos).
serve até (a orientação sexual) para orientar melhor minha filha (S84,
34 anos).
Outra possibilidade, que de certa forma facilitou ou diminuiu os encargos a que se
enfrenta um pai homossexual, está ligado ao reconhecimento que este papel proporciona
para cada sujeito. Pensando na aquisição de poder, esse reconhecimento é possibilitado, na
medida em que, tornando-se pai, esse sujeito aproxima-se do modelo de ser homem a que
se espera a sociedade. Esse fato acaba sendo uma possibilidade paradoxal: ser
reconhecido é se submeter a padrões sociais: ser pai. A paternidade se apresenta, em
alguns momentos, como um certo alívio à tenção estabelecida entre a sociedade e a
homossexualidade, diante das situações de exclusão e preconceito.
99
È interessante notar que essas possibilidades apresentadas pelos sujeitos que
participaram da pesquisa surgiram num movimento autônomo em demonstrar que, diante de
determinadas dificuldades e variados obstáculos, alguns norteadores positivos e vantajosos
estão presentes na vivência da paternidade homossexual. Essas possibilidades, de certa
forma, estão ligadas às peculiaridades apresentadas pela vivência homoerótica que,
certamente, imputam processos de redução do preconceito e ampliam o pensamento
tolerante e respeitoso diante da diversidade sexual, tão importante para a construção
saudável dessa vivência.
100
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Durante muitos anos, as relações homoafetivas foram consideradas desviantes,
recebendo da sociedade a representação de pecado, patologia e comportamento perverso.
A sociedade negou, e nega até hoje, uma série de direitos aos sujeitos que organizam sua
sexualidade a partir da relação homoerótica e manteve esse grupo minoritário à margem de
variados
espaços
e
possibilidades
de
vivência
sexual,
participação
política
e
reconhecimento social.
Dentre essas possibilidades, a paternidade foi excluída do repertório de papéis que
poderiam, legitimamente, ser exercidos por homossexuais, sendo atribuída apenas à
relação heterossexual, especialmente aquela mantida no seio da família nuclear burguesa.
Ainda assim, percebe-se que as famílias formadas por pais e mães homossexuais
sempre existiram, no cenário social, ainda que clandestinamente, trazendo apontamentos
para uma série de estratégias de enfrentamento ao discurso homofóbico e uma prática
contra hegemônica à norma heterossexista.
A paternidade foi construída historicamente, numa estreita vinculação com o modelo
de ser homem e, conseqüente de ser macho, na tentativa de estabelecer formas ideais de
identidade de gênero e fortalecer os dispositivos de controle sobre a mulher, sobre a
sexualidade e sobre a família. (PISCITELLI, 1997; COSTA, 2002).
Sendo assim, é perceptível que os homens que vivenciam a paternidade, na
condição homo/bissexual, atualmente, passam por uma série de embates e inquietações na
busca de encontrar as melhores estratégias de consolidação desse papel e de significação
de suas identidades, a partir de suas experiências. O distanciamento da homossexualidade
das relações de parentesco e da possibilidade de constituição familiar aumentou ainda mais
o controle homofóbico acerca dessa experiência, produzindo representações negativas para
a paternidade homossexual ao aferir a essa vivência, suspeitas de corrompimento sexual,
aberração, anomalia, etc. (UZIEL, 2004).
101
Torna-se importante, na compreensão desse fenômeno, a percepção de que a
racionalidade moderna contribuiu incisivamente para colocar a homossexualidade no hall
das patologias e aferir-lhe um lugar desprivilegiado na estrutura de poder que se constituiu
para as sexualidades.
Assim, a crítica à patologização da homossexualidade, bem como ao modelo de
racionalidade que dicotomizou e atribuiu valoração às formas de manifestação e vivência da
sexualidade, se tornam imprescindíveis para uma análise ética e politicamente
comprometida com a realidade social, mais especificamente com a experiência de homens
homo/bissexuais.
A metodologia utilizada nessa pesquisa é o primeiro elemento que buscou
ressonância com esses pressupostos já que possibilitou um processo de coleta e análise de
dados veiculada com uma crítica ao ideário positivista, trabalhando com concepções
diferentes acerca de categorias como validação, mensuração, separação sujeito-objeto e
neutralidade científica.
A utilização do espaço virtual como instrumento de pesquisa ainda é pouco
investigado atualmente, exigindo uma necessidade em se refletir acerca de suas
implicações éticas e metodológicas, bem como re-construir os significados atribuídos à
relação
estabelecida
entre
pesquisado
e
pesquisador
(FREITAS,
JANISSEK
E
MOSCAROLA, 2004). O processo de coleta de dados evidenciado nessa pesquisa, dada a
complexidade do fenômeno e as características peculiares apresentadas por ele, reafirmou
a necessidade em construir novas estratégias de aproximação do objeto de estudo e
estabelecer novos instrumentos de análise e compreensão da realidade.
O perfil determinado para a participação neste estudo ainda traz uma série de
dificuldades para adquirir voluntários, já que a temática trabalhada ainda é carregada de
tabus e as organizações homoafetivas não possuem a visibilidade necessária para ser
detectadas pelos instrumentos tradicionais de captação.
A amostra adquirida abarca uma variedade de experiências que indicam diferentes
formas de vivenciar o papel de pai na condição homo/bissexual. Homens jovens, adultos, e
102
idosos, que se tornaram pais por relações heterossexuais, adoções e outras formas,
residindo em diferentes espaços geográficos e culturais, narraram aqui suas experiências,
na tentativa de sistematizar os diferentes arranjos construídos para o alcance de um papel
considerado de muita importância pela grande maioria deles. A diversidade, e a possível
representatividade dessa amostra coloca em cheque a idéia de que o arranjo homoparental
faz parte das “novas” estruturas familiares contemporâneas, quebrando alguns paradigmas
que negaram visibilidade a esses arranjos.
Compreender a construção da identidade paterna em homens homo/bissexuais
implica se debruçar na compreensão de outras categorias psicossociais. Essas categorias
se entrecruzam, numa dinâmica dialética e processual, na construção e re-construção da
identidade sexual, possibilitando a formação de variadas carreiras amorosas e diferentes
arranjos identitários (HEILBORN, 1994).
A paternidade se apresenta, para os sujeitos da pesquisa, como possibilidades
variadas: como forma de transmissão de valores e crenças a descendentes, como
cumprimento de missões e designações divinas, como busca de reconhecimento social,
como cumprimento de regras culturais, definidas para homens e mulheres. Diante de cada
uma delas, é possível perceber importantes mudanças na vida de cada sujeito, imputadas
pelo aparecimento dos filhos e pela necessidade em re-posicionar-se no tecido social e
familiar.
As re-configurações que cada sujeito propõe para suas vidas ainda se dão, pela
omissão legislativa que não garante vários direitos civis a homossexuais, entre eles o de
adoção conjunta. Ainda que a jurisprudência tenha permitido alguns casos de adoção e
tutela, essa legislação ainda representa dispositivo de controle e vigilância que, legitimando
o preconceito e a homofobia, impossibilita o homossexual em ter acesso aos direitos de
filiação reconhecida e a concretização da paternidade a partir de um projeto de adoção
(TARNOVSKI, 2004, FUGIE, 2002).
A apropriação da sexualidade pelo discurso dos movimentos sociais, atribuiu um
caráter político a essa dimensão, colocando nas discussões públicas aquilo que, até então,
103
era atributo de resoluções privadas. A partir daí, as estruturas familiares e identidades
sexuais historicamente segregadas começam a receber visibilidade, provocando, inclusive,
questões para a academia e para os tramites legislativos.
Essa pesquisa foi bem recebida pelos sujeitos que dela participaram. Vários deles
apontaram a necessidade de se construir novas pesquisas e discussões acerca da temática
homossexual, buscando reverter o processo de marginalização das práticas homoafetivas.
Além dos sujeitos que participaram, percebeu-se um impacto em todas as dimensões que
essa pesquisa interferiu, recebendo postagens e recomendações através do orkut, dos emails cadastrados, oriundas de pessoas de todo o Brasil, inclusive do exterior. Esse impacto
mostra que a atenção aumenta, cada vez mais, em torno da problemática homossexual,
apontando para uma necessidade em se ampliar as discussões e reflexões acerca da
vivência homoparental.
Os resultados dessa pesquisa serão apresentados aos movimentos sociais,
buscando refletir junto a esse grupo as informações coletadas e os apontamentos oferecidos
para o debate e a reflexão acerca da diversidade sexual e da cidadania. É importante
salientar que a contribuição do saber produzido pelos movimentos é de extrema importância
para uma compreensão mais abrangente da realidade estudada, numa tentativa em se
estabelecer uma construção do saber científico comprometida com a resolução dos
problemas sociais.
Esta pesquisa também aponta para uma série de questões a serem desenvolvidas,
possivelmente, por outras pesquisas. A primeira delas está ligada à investigação da
homoparentalidade vivenciada por mulheres lésbicas, partindo do pressuposto de que
diferentes fatores podem estar ligados na construção da identidade materna nesse público.
Outra questão está direcionada à grande preocupação por parte dos sujeitos, evidenciada
nessa pesquisa, em refletir a identidade sexual numa perspectiva, geralmente, coletiva,
fazendo menções ao grupo pertencente e à necessidade em aquisição de reconhecimento
social para a comunidade GLBTT.
104
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110
9 APÊNDICES
9.1 Questionário
DADOS PESSOAIS
07. Qual sua cor?
01. Qual seu sexo?
1. Branco
4. Negro
1. Feminino
2. Pardo
5. Amarelo
2. Masculino
3. Indígena
6. Outro _______
02. Qual a sua orientação sexual?
08. Em qual estado você mora?
1. Bissexual
09. Em que cidade você mora?
MG ▼
2. Heterossexual
______________________________
3. Homossexual
4. Transexual
5. Travesti
10. Com quem você mora?
6. Outro ____________________
1. Pais
7. Não sei
03. Você tem filhos(as)?
2. Companheiro (a)
4. Amigos(as)
3. Sozinho
5. Filhos (as)
6. Outro _______________________
1. Sim
2. Não
ESCOLARIDADE
04. Estado civil:
11. Grau de instrução
1. Solteiro
3. Desquitado/Separado
1. Analfabeto
2. Casado
4. Divorciado
2. Primário Incompleto
5. Viúvo
3. Primário completo
4. Ensino Fundamental incompleto
5. Ensino Fundamental completo
05. Situação conjugal:
6. Ensino Médio incompleto
1. Amigado
2. Não amigado
7. Ensino Médio completo
8. Superior Incompleto
9. Superior completo
06. Qual sua idade?
10. Pós-graduação
_____
111
3. Funcionário Público
12. Estuda atualmente?
4. Atividade de Magistério Superior
1. Sim
5. Atividade de Magistério Secundário
2. Não
6. Atividade de Magistério Primário
7. Técnico de nível médio
13. Onde estuda?
8. Ocupação de escritório
1. Escola pública
9. Militar
2. Escola Particular
10. Atleta
3. Universidade Pública
11. Atividade de comércio
4. Universidade Particular/religiosa
12. Atividade de indústria
5. Aprendizagem técnica
13. Atividade Bancária
6. Pré-vestibular
14. Prestação de Serviço
7. Não estuda
15. Artesanato
16. Estagio
SITUAÇÃO ECONÔMICO-FINANCEIRA
17. Ofício _____________________
18. Outra _____________________
14. Você exerce atividade remunerada?
1. Sim
2. Não
19. Não tenho atividade remunerada
3. Às vezes
VIDA SÓCIO-CULTURAL
15. Você depende financeiramente de alguém
18. Em suas horas vagas você dedica-se,
de sua família?
principalmente, a quais atividades? (cite até
03)
1. Totalmente
3. Muito
2. Um pouco
4. Nada
1. Artes Plásticas/Artesanato
2. Atividades religiosas
3. Atividades político-partidárias
16. Qual a renda de sua família?
4. Televisão
1. Até 04 salários mínimos
5. Esporte
2. de 04 a 08 salários mínimos
6. Cinema
3. de 08 a 12 salários mínimos
7. Música
4. de 12 a 16 salários mínimos
8. Leitura
5. de 16 a 20 salários mínimos
9. Teatro
6. mais de 20 salários mínimos
10. Informática/Internet
11. Vida Afetivo-sexual
17.
Qual
a
sua
principal
ocupação
12. Outra atividade ____________________
profissional?
13. Nenhuma
1. Dono de empresa/proprietário
19. Quanto à religião:
2. Profissional Liberal
112
1. Você e sua família professam alguma religião
24. Qual(is) movimento(s)?
2. Você professa alguma religião e sua família
não
______________________
3. Você não professa nenhuma religião e sua
_________________________
família sim
_________________________
4. Você e sua família não professam nenhuma
religião
DADOS FAMILIARES
20. Sua religião é:
25. Qual o sexo de seu/sua companheiro(a)?
1. Adventista do Sétimo Dia
1. Masculino
2. Assembléia de Deus
2. Não tenho companheiro(a) no momento
3. Feminino
3. Batista
4. Católica
26. Quantos(as) filhos(as) você tem?
5. Espírita
6. Igreja Evangélica de Confissão
______
7. Luterana do Brasil
8. Igreja Evangélica Luterana do Brasil
27. De que forma você obteve filhos (as)?
9. Presbiteriana
(Cite até três)
10. Testemunha de Jeová
11. Budista
1. Relação heterossexual
12. Outra ________________________
2. Adoção
13. Nenhuma
3. Mãe de aluguel
4. Inseminação artificial
21. Você freqüenta espaços GLBT?
5. Inseminação espontânea
6. Outro
1. Sim
2. Não
22. Quais espaços você utiliza com mais
__________________________________
28. Com quem seus/suas filhos (as) residem?
freqüência? (Cite até 3)
1. Com você
1. Boates
5. Cinema
2. Com a mãe
2. Bares
6. Outro ___________
3. Com avós maternos
3. Chats
7 Não freqüento
4. Com avós paternos
4. Saunas
5. Com outro parente
6. Filho em gestação
23. Você está ou já esteve envolvido com
7. Outro ___________________
algum movimento GLBT?
29. Ser pai fazia parte de seu projeto de vida?
2. Sim
2. Não
113
1. Sim
2. Não
1. Sim
30.
Preencha
informações
o
quadro,
solicitadas
2. Não
conforme
sobre
seus/suas
35. De onde partiu a discriminação?
filhos(as):
FILHOS
SEXO
IDADE
ESTADO
CIVIL
1. Família
5. Shoppings/lojas
2. Trabalho
6. Religião
3. Amigos(as)
7. Escola
4. Outro ________________
1
8. Nunca
2
36. Que tipo de discriminação você sofreu?
3
4
5
1. Agressão verbal
6
2. Agressão física
7
3. Ameaça
8
4. Coação
9
5. Outro __________________________
6. Nunca sofri discriminação
10
37. Como você se sente em ter que se auto-
ORIENTAÇÃO SEXUAL
definir a partir de uma das categorias de
31. Seus pais sabem de sua orientação
orientação sexual apresentadas na pergunta
01 (bissexual, heterossexual, homossexual,
sexual?
transexual, travesti)?
1. Sim
2. Não
3. Não sei
1. Agradável
32.
Seus/suas
filhos(as)
sabem
de
3. Não sei
sua
38. Por quê? (em relação à resposta 36)
orientação sexual?
1. Sim
2. Desagradável
2. Não
_____________________________________
3. Não sei
_____________________________________
33. Como seus filhos (as) ficaram ou ficarão
_____________________________________
sabendo de sua orientação sexual?
_____________________________________
_____________________________________
39. Como é a experiência de ser pai e gay?
_________________________________
_________________________________
_________________________________
34.
Já
sofreu
orientação sexual?
discriminação
pela
sua
114
40.
SE
VOCÊ
RESIDE
NA
REGIÃO
METROPOLITANA DE BELO HORIZONTE,
participaria de uma entrevista coletiva com a
participação de mais cerca de 06 a 07
pessoas?
1. Sim
2. Não
41. Caso a resposta seja afirmativa, deixe email e telefone de contato:
____________________________________
41. Observaçoes:
________________________________
________________________________
________________________________
________________________________
________________________________
115
9.2 Roteiro para realização do grupo focal
1) O que é ser pai pra vocês?
Conhecer a representação do grupo do que é ser pai
2) O que vocês acham que as pessoas pensam sobre “o que é ser pai”?
PROBE: Imagem, representação
Conhecer o que o grupo pensa acerca da representação social da paternidade
3) Como vocês vivem a paternidade, sendo homossexuais/bissexuais?
Ouvir o relato do grupo da experiência de ser pai homossexual, o que pensam acerca dessa
experiência
4) Como as pessoas os vêem (ou veriam) sendo pai e homossexual/bissexual?
Ouvir sobre o conhecimento que o grupo tem da representação que as outras pessoas têm sobre ser
pai homossexual/bissexual
5) Ser pai fazia parte do projeto de vida de vocês?
PROBE: a vontade de ser pai sempre existiu? Em que momento ela surge?
Saber se a paternidade foi uma possibilidade construída ao longo da história pessoal dos integrantes
e em que circunstância ela ocorreu
6) Como é a relação de vocês com os filhos?
Conhecer a dinâmica estabelecida no dia-a-dia dos sujeitos, formas de diálogo, divisão de tarefas,
formas de educação, etc.
7) Vocês se viram diferentes, depois que se tornaram pais?
PROBE: auto-estima, auto-imagem, realização pessoal
Conhecer as possíveis mudanças que a experiência paterna trouxe para a vida do grupo.
8) Vocês acham que a orientação sexual dos pais influencia na relação com os filhos? Qual
influência?
Conhecer a opinião e as representações do grupo sobre as possíveis influências que a própria
orientação sexual pode exercer sobre o filho.
9) Vocês já foram discriminados, agredidos ou foram alvo de situações constrangedoras por
serem pais homossexuais/bissexuais?
PROBE: Na escola (a sua e/ou a dos filhos), no trabalho, na rua...
116
Conhecer a forma como a sociedade tem lidado com essa realidade e as possíveis estratégias de
enfrentamento do grupo a elas
10) Como vocês julgam a legislação vigente em relação à paternidade homossexual?
PROBE: Adoção conjunta, Adoção individual...
Conhecer o nível de conhecimento do grupo acerca da legislação e a opinião sobre os impactos
dessa, na realidade que vivenciam
11) Quais as dificuldades que vocês encontram (ou encontraram) para serem pais, sendo
homossexuais/bissexuais?
PROBE: problemas enfrentados
Conhecer as possíveis dificuldades que interpelam a vivência da parternidade homossexual
12) Quais as possibilidades que vocês encontraram (ou encontraram) para serem pais, sendo
homossexuais/bissexuais?
PROBE: vantagens, facilidades
Conhecer as possibilidades que interpelam a vivência da parternidade homossexual
13) Como você se sente em ter que se auto-definir a partir de uma das categorias de
orientação sexual apresentadas na pergunta no questionário (bissexual, heterossexual,
homossexual, transexual, travesti)? Por quê?
Conhecer o posicionamento em relação à apropriação da identidade sexual
117
9.3 Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
N.º Registro CEP: PROBIC/125
Título do Projeto: “Os fatores psicossociais que influenciam na construção da identidade
paterna de homens homossexuais”
Este termo de consentimento pode conter palavras que você não entenda. Peça ao
pesquisador que explique as palavras ou informações não compreendidas completamente.
1 ) Introdução
Você está sendo convidado(a) a participar da pesquisa “Os fatores Psicossociais que influenciam na
construção da identidade paterna de homens homossexuais. Se decidir participar dela, é importante
que leia estas informações sobre o estudo e o seu papel nesta pesquisa.
Você foi selecionado através de indicação realizada por liderança de ONG´s mobilizadas pela
temática GLBT, e sua participação não é obrigatória. A qualquer momento você pode desistir de
participar e retirar seu consentimento. Sua recusa não trará nenhum prejuízo em sua relação com o
pesquisador ou com a instituição.
É preciso entender a natureza e os riscos da sua participação e dar o seu consentimento livre e
esclarecido por escrito.
2 ) Objetivo
O objetivo deste estudo é conhecer a experiência de homossexuais que vivenciam a paternidade.
3 ) Procedimentos do Estudo
Se concordar em participar deste estudo você será solicitado a responder a um questionário sobre
alguns dados pessoas, dados sócio-financeiros, culturais, familiares e sobre sua sexualidade.
Possivelmente você poderá ser solicitado a participar de um grupo de discussão que tratará de
questões similares com as do questionário. Esta discussão será gravada.
Os dados obtidos no questionário e, possivelmente na discussão, serão utilizados para o melhor
entendimento do tema desta pesquisa.
118
4 ) Riscos e desconfortos
Ao participar desta pesquisa, é importante estar ciente da possibilidade do surgimento de alguns
desconfortos emocionais, já que as atividades de coleta de informações que você irá participar irão
tratar de assuntos pessoais e delicados.
5 ) Benefícios
A atividade poderá lhe proporcionar um espaço para reflexão das questões ligadas à sua
sexualidade. As informações obtidas por meio do estudo poderão ser importantes para a descoberta
de novas técnicas e formas de posicionar-se diante das situações que serão contempladas nesse
estudo.
6 ) Rompimento com o estudo
A participação neste estudo é voluntária. Você tem o direito de não querer participar ou de sair deste
estudo a qualquer momento, sem penalidades ou perda de qualquer benefício a que tenha direito.
Você também pode ser desligado do estudo a qualquer momento sem o seu consentimento nas
seguintes situações:
a) você não use ou siga adequadamente as orientações/tratamento em estudo;
b) você sofra efeitos indesejáveis sérios não esperados;
c) o estudo termine.
7 ) Custos/Reembolso
Você não terá nenhum gasto com a sua participação no estudo e também não receberá pagamento
pela sua participação.
8 ) Caráter Confidencial dos Registros
Algumas informações obtidas a partir de sua participação neste estudo não poderão ser mantidas
estritamente confidenciais. Os pesquisadores envolvidos e o Comitê de Ética em Pesquisa da
instituição onde o estudo está sendo realizado, podem precisar consultar seus registros. Você não
será identificado quando o material de seu registro for utilizado, seja para propósitos de publicação
científica ou educativa. Ao assinar este consentimento informado, você autoriza as inspeções em
seus registros, pelas entidades citadas acima.
09 ) Participação
119
Sua participação nesta pesquisa consistirá em responder a um questionário sobre alguns dados
pessoas, dados sócio-financeiros, culturais, familiares e sobre sua sexualidade. Possivelmente você
poderá ser solicitado a participar de um grupo de discussão que tratará de questões similares às do
questionário.
É importante que você esteja consciente de que a participação neste estudo de pesquisa é
completamente voluntária e de que você pode recusar-se a participar ou sair do estudo a qualquer
momento sem penalidades ou perda de benefícios aos quais você tenha direito de outra forma. Em
caso de você decidir retirar-se do estudo, deverá notificar ao profissional e/ou pesquisador que entrou
em contato com você. A recusa em participar ou a saída do estudo não influenciarão seus cuidados
nesta instituição.
10 ) Para obter informações adicionais
Você receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone e o endereço do pesquisador principal,
podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, agora ou a qualquer momento. Caso
você venha a sofrer danos relacionados ao estudo, ou tenha mais perguntas sobre o estudo, por
favor, ligue para Sr. André Geraldo Ribeiro Diniz, Rua Antônio Rodrigues Fróes, 695, Candelária, no
telefone (31) 97925748 ou (31) 34511886.
Se você tiver perguntas com relação a seus direitos como participante do estudo, você também
poderá contactar uma terceira pessoa, que não participa desta pesquisa, Dr. Heloísio Rezende Leite,
Coordenador do Comitê de Ética em Pesquisa da Instituição, no telefone (31) 33194517 ou (31)
33194456.
11 ) Declaração de consentimento
Li ou alguém leu para mim as informações contidas neste documento antes de assinar este termo de
consentimento. Declaro que fui informado sobre os métodos e meios de coleta de informações, as
inconveniências, riscos, benefícios e desconfortos que podem vir a ocorrer em conseqüência de
minha participação.
Declaro que tive tempo suficiente para ler e entender as informações acima. Declaro também que
toda a linguagem técnica utilizada na descrição deste estudo de pesquisa foi satisfatoriamente
explicada e que recebi respostas para todas as minhas dúvidas. Confirmo também que recebi uma
cópia deste formulário de consentimento. Compreendo que sou livre para me retirar do estudo em
qualquer momento, sem perda de benefícios ou qualquer outra penalidade.
Dou meu consentimento de livre e espontânea vontade e sem reservas para participar como
voluntário deste estudo.
120
Nome do participante (em letra de forma)
_______________________________________________
Assinatura do participante ou representante legal
_______________________
Data
Atesto que expliquei cuidadosamente a natureza e o objetivo deste estudo, os possíveis riscos e
benefícios da participação no mesmo, junto ao participante e/ou seu representante autorizado.
Acredito que o participante e/ou seu representante recebeu todas as informações necessárias, que
foram fornecidas em uma linguagem adequada e compreensível e que ele/ela compreendeu essa
explicação.
______________________________________________
_______________________
Assinatura do pesquisador
Data
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SER PAI: SER MACHO? - BVS Psicologia Brasil