10 popular catarinense > imbituba > sexta-FEIRA - 1 - fevereiro - 2013 Maria Aparecida Pamato Santana Revivendo a História Imbitubense UM PESCADOR QUE JAMAIS PISOU NAS ÁGUAS DO MAR E m grande parte da sua vida, destacou-se como empresário da pesca. Suas atividades pesqueiras eram direcionadas à pesca artesanal (tainhas, anchovas corvinas e outros) e à caça a baleias quando se mudou, com a família, para Garopaba; mais tarde, para Imbituba. Seu pai, o italiano Victor Sanceverino, natural de Milão, ao vir para o sul de Santa Catarina, no século XIX, com a família, optou por morar sozinho, em São José de Terra Firme (São José- SC). Trabalhava como mascate. Comprava ouro, prata, pedras preciosas e ia vender na Itália, em Portugal, na França. De lá, trazia novidades para vender na sede da Província Catarinense. Em São José, Victor casou com uma jovem açoriana, Florentina Amâncio Sanceverino. O casal teve um único filho, Francisco Victor Sanceverino; mais conhecido nas nossas redondezas por “Pudico”. Seu pai faleceu quando tinha apenas três anos. Sua mãe contraiu segundas núpcias, gerando outros filhos. Já mocinho, Francisco Victor deixou a casa e foi trabalhar por conta própria, negando-se a receber parte da herança deixada pelo pai. Namorou e casou com uma das filhas do açoriano Virgilino Ferreira de Souza, Maria Joaninha de Souza; de uma família tradicional de São José e respeitada no mundo político da Província, contou-me a filha do senhor Pudico, dona Ládia Sanceverino Martins que foi casada com o expedicionário Mário Martins, de Garopaba. “Meu avô era funcionário do Governo e chegou a Prefeito de São José. Mantinha relações de amizade com o Governador Adolpho Konder. Meu pai nunca quis ser submisso a políticos, embora a mãe de Ivo Silveira (que veio a ser Governador do Estado) fosse sua prima- irmã. Tornou-se, como o meu avô Victor, comerciante ambulante”. Comentou, ainda, que sua avó paterna, Florentina, contava aos netos que, quando nasceu seu filho Francisco Victor, o marido preparou o primeiro banho do filho, colocando numa banheirinha, vinho morno e moedas de ouro no fundo. Dizia ser costume na sua terra. Assim, o menino se tornaria rico ao crescer. Em São José, nasceram os oito filhos do casal; quatro homens: Alberto (Bebeto), Alécio, Ari e Aldo; e quatro mulheres: Maria, Alaíde, Ládia e Albertina. Quando irrompeu a “Revolução de 30”, o senhor Francisco se mudou, com a família para Garopaba. Deixou-a na casa de compadres, no Macacu e foi esconder-se, com amigos, numa ilha próxima. Receavam ser convocados para engrossar as fileiras dos revolucionários getulistas. Dona Ládia afirmou: “Minha mãe era uma mulher muito corajosa e religiosa; passava entre a tropa acampada no centro, em busca de alimentos para os filhos”. O marido e os amigos só retornaram para suas casas depois que os revolucionários seguiram em direção a Florianópolis. Na Armação de Garopaba, seu Pudico possuía lanchas baleeiras e comercializava óleo e barbatanas na Capital. Seu filho Bebeto foi um dos primeiros arpoadores de baleias. Durante a Segunda Guerra, Bebeto foi nomeado Guarda- Marinha no Município. E dona Ládia continou: “Meu pai era um homem muito comunicativo; inteligente; de boa conversa e bem informado. Lia jornais diariamente. Não era ambicioso. Gostava muito das festas açorianas do “Arraiá”. Promovia, no seu sítio, a “Farra do Boi”. Comprava bois dos criadores “Pereira”, de Araçatuba, e um barril de pinga. Deste modo, alegrava a população. Ele costumava criar carneiros. No sítio passava um riacho, onde as lavadeiras da vizinhança lavavam roupas. Meus irmãos, Bebeto e Alécio buscavam os mais bravos que corriam atrás delas. Ele sempre tinha armas penduradas nas paredes de casa (revólveres, espingardas de caça). Segundo a neta Kleid: “Vovô gostava de caçar !!! Preparava os apetrechos de caça e lá ia ele. Retornava com aipim, chuchu, laranja...! Já residia em Imbituba. Foi um grande paquerador. Deixou saudades. Sobre a mãe, dona Ládia disse: “Minha mãe gostava muito de plantar, desde temperos, hortaliças, aipim, batata doce, árvores frutíferas, até folhagens decorativas”. A neta Kleid completou, dizendo que a avó Maria era exímia crocheteira. Os imbitubenses que conheceram o senhor Pudico, apelido conferido pelos amigos; e, com certeza, comparando-o ao “santinho do pau oco”, lembram dele como um homem de muitos amigos, calmo, vaidoso (costumava usar terno, gravata e o indispensável guarda-chuva, com chuva ou com sol). O guarda-chuva era a sua marca registrada. Seu Pudico veio para Imbituba após a compra da “salga de peixes”, empresa de Antônio Paes, em sociedade com o filho Ari que, depois, vendeu sua parte para o irmão Alécio. O casal muito ligado aos filhos, quando aqui chegaram, morou na Praia do Porto. Anos mais tarde, comprou uma casa à Rua Irineu Bornhausen, ao lado do filho Ari. Aposentou-se como pescador, dando continuidade à compra e venda de gado e de terrenos em Campo D`Una, Praia do Ouvidor, Ibiraquera, Barra e em outros locais. Através deste comércio, conquistou muitos amigos; gaúchos, como os Gerdau, Fernando Sefton, paulistas e cariocas, tornando-se amigo de Marisa Urban. “Embora possuísse carteira de pescador, Vovô nunca pisou na água do mar”, comentou Kleid. Na foto, dona Maria Joaninha, com a neta Cleusa e o bisneto André. ximou, disseram que o presente havia chegado. Ele conseguiu um carrinho e foi com eles buscar o cão de raça. Abriu a caixa e levou um susto. Outra peça! Dessa vez, o senhor Francisco Victor prometeu um jantar para a turma. Um galo gordo, ensopado. Como o jantar não saía, um amigo foi à noite dele e roubou o galo. No outro dia, ensoparam o dito cujo e o convidaram para jantar. Quando descobriu que o penoso era o seu, deu boas gargalhadas. Era amicíssimo de Antônio de Bona, Protásio Santos, João Cargnin, Antônio Santana e Astrogildo Ferreira (parceiros de jogo), Nelson Figueiredo, Almeci de Carvalho, Tomé Manoel dos Santos, Adelpho Pamato, etc.. O casal Adelpho e Adelina eram padrinhos do neto Élito, filho do genro Edward Euzébio de Araújo e da filha Maria Sanceverino de Araújo. O senhor Pudico e esposa tratava-os, também, como compadres, tal era o apreço que unia as famílias. Aqui, o Sr. Francisco Victor abraçando a bisneta Lília e o bisneto Alexandre. Tinha estreitos laços de amizade com o Gerente da Cia. Docas, Dr. Octávio R. de Castro, e com o Presidente da Cerâmica, Dr. João Rimsa; com eles conseguia emprego para amigos necessitados. Costumava levantar-se às cinco da manhã para ir apreciar o mar e trocar histórias com pescadores. Retornava às onze e trinta, com peixes para o almoço. Mas segundo Kleid, o seu prato preferido era “roupa velha”. Descansava após o almoço e voltava à praia. No final de tarde, arrumava-se e ia até o “Ponto Chic” conversar e beber com os amigos, entre os quais: Leca, Jatyr, Alarico, Joaquim da Bilica e tantos. Aproveitava para comentar as notícias dos jornais, narrar fatos históricos e contar “histórias de pescador”. Numa das vezes, disse que amigos de Porto Alegre iriam presenteá-lo com um cão de raça. Como o presente nunca chegou, os amigos daqui pegaram um vira- lata, pintaram o bicho de várias cores, colocaram numa caixa e levaram para a Cerâmica. Quando seu Pudico se apro- O casal Francisco Victor e Maria Joaninha cumprimentando os amigos, na Missa das Bodas de Ouro. O inesquecível senhor Pudico faleceu aos 86 anos, vítima de trombose, em 1978, depois de aceitar sua internação no Hospital São Camilo, com a promessa do médico, Dr. Osvaldo, de que teria aos seus cuidados uma enfermeira de pernas grossas. SeuTomé, comovido com a morte do amigo, falou: “Morreu o nosso contador de histórias”. Disse-me a neta Kleid. A esposa, dona Maria, após duas quedas, com fraturas no fêmur, veio a falecer aos 96 anos de idade. Era membro do Apostolado da Oração.