Pré-natal: Uma reflexão necessária à experiência
Nadja R. Oliveira; Arij M.R.O. Chabrawi; Lilian Bertoldi; Samille C. Cazetta
Orientadora: Daniela Sheinkman Chatelard
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Introdução
A gestação é um processo onde mudanças múltiplas se dão e se relacionam,
configurando um evento complexo que abrange processos tanto maternos quanto do indivíduo
em formação – o filho. Neste, a mãe se encontra em movimento regressivo, lidando com suas
fantasias arcaicas que emergem constantemente, assim como com a transformação de seu papel
social de mulher para mãe, enquanto o do bebê, em sua vivência intra-uterina, está iniciando seu
processo de devir enquanto sujeito.
“O bebê representado tem uma longa história pré-natal. Conforme o feto cresce e se
desenvolve no útero da mãe, o bebê representado sofre um desenvolvimento paralelo em sua
mente” (Stern, 1997). O segundo trimestre, tendo em vista o início dos movimentos fetais, leva
a gestante a pensar o bebê de forma mais concreta, implicando num ser que, apesar de
dependente dela e constituído, psíquica e somaticamente, a partir de seu desejo, é um ser
separado da mesma. Seu movimento dentro da mãe caracteriza uma maior influência sua no
bebê imaginário por ela criado, uma vez que ele passa a se mostrar, mas os significados
atribuídos a ele, a seus movimentos e a seu ser, se dão via as fantasias da mãe.
Fica evidente, assim, que a relação mãe-bebê é iniciada desde este momento gestacional,
motivo pelo qual o trabalho preventivo, no que diz respeito ao desenvolvimento psíquico do ser
em formação, deve anteceder seu nascimento. Citando Winnicott, “isto que chamamos de
recém-nascido não existe. A cada vez que existe recém-nascido existem cuidados maternos, e
que sem cuidados maternos, não existe recém-nascido”. O investimentolibidinal do filho pela
mãe, assim, é extremamente importante desde o período da gravidez, uma vez que ele, junto à
constituição do bebê imaginário, permite o bebê ser recoberto pela sua fantasia e ser. “A criança
identifica-se com a imagem que a mãe aponta como sendo ideal. É o que permite à criança
sustentar-se inicialmente em uma situação satisfatória do ponto de vista do amor” (Zalcberg,
2003).
Tendo em vista estas breves observações, a necessidade de se trabalhar desde o período
gestacional as relações mãe-bebê, as quais são permeadas pelas demais relações familiares e
pela dinâmica das mesmas, é de suma importância. Este é o motivo pelo qual o presente grupo
desenvolve trabalho preventivo junto às gestantes no ambulatório de pré-natal do Hospital
Universitário de Brasília, procurando facilitar o estabelecimento de vínculo mãe-bebê e
fortalecê-lo, propiciando assim a promoção à saúde mental das gestantes e, especialmente, de
seus futuros bebês. Contudo, um preparo e uma cautelosa reflexão cerca das questões que
permeiam esta temática e experiência são de suma importância à atuação junto às gestantes e
seus bebês, reflexão esta que deve preceder a inserção do profissional e acompanhá-lo ao longo
de suas plurais jornadas neste campo.
Reflexões e conclusões
A gestação é o momento privilegiado de implantação das bases do inconsciente na
criança?
Como a vida feminina é influenciada pelo desenvolvimento de uma gravidez e suas
representações são transmitidas às crianças?
Os profissionais e teóricos de saúde vêm se conscientizando cada vez mais acerca desta
necessidade de retroceder aos momentos mais primários da vida a fim de pensar o sofrimento
psíquico e de prevenir possíveis problemas que dizem respeito ao psiquismo do sujeito.
Olhando para a história desta área, lembramos dos anos 40 e 50, nos quais se destacaram Anna
Freud, Dorothy Burlingham, René Spitz, John Bowlby, J. Robertson, no que diz respeito às
primeiras descrições das depressões do bebê e da importância do afeto e da maternagem, sendo
estes alguns dos autores que inauguraram a preocupação com a temática do sofrimento psíquico
desde os primórdios do ser.
A partir de então, dá-se ao bebê o reconhecimento e o direito à vida psíquica. Como Golse
(2003) aponta, a busca pelo retorno às origens, especialmente da vida psíquica, se faz
urgente.
“Existe corpo sim, mas também devemos considerar o pensamento e a linguagem, onde o
contexto familiar, social e cultural se entrelaçam em suas experiências” (Chatelard, 2004).
O bebê nasce num mundo onde estes contextos já existem, ainda que os mais próximos
sofrerão modificações com sua chegada enquanto novo membro, especialmente o familiar
(Kreppner, 2000; Dessen, 1997). Estes influem na forma como sua mãe o concebe e o
representa em seu imaginário, em seus afetos e (re)significações da gestação, de forma a ser de
suma importância o trabalho não só com a gestante e com os principais agentes de maternagem
como também com sua principal rede social de apoio. Neste sentido, faz-se necessário o diálogo
entre os profissionais da área psi, sendo interessante, por exemplo, a implementação de grupos
operativos e laboratórios de família no contexto do pré-natal e do acompanhamento após o
nascimento do bebê.
Referências
Dessen,
M.A.
(1997).
Desenvolvimento
familiar:
transição
de
um
sistema triádico para poliádico. Temas em Psicologia, 3, 51-61.
Golse, B. (2003). O bebê hoje, novos dados, esperanças e frustrações. Em Sobre a Psicoterapia
Pais-Bebê: narratividade, filiação e transmissão. (pp. 13-44). São Paulo: Casa do Psicólogo.
Kreppner, K. (2000). The child and the family: Interdependence in developmental
pathways. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 16, 11-22.
Scheinkman Chatelard, D. (2004). Algumas considerações teóricas acerca de uma experiência
hospitalar. Em Revista Mal-Estar e Subjetividade. (pp. 349 -357). Vol. IV, set. 2004. Fortaleza.
Stern, D. N. (1997). A constelação da maternidade. Porto Alegre: Artes Médicas.
Winnicott D.W. (1975). O Brincar e a Realidade. Rio de Janeiro: Imago.
Zalcberg, M. (2003) A relação Mãe e Filha. Rio de Janeiro: Campus.
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