Comunicação Científica A FÍSICA NAS AULAS DE MATEMÁTICA GT 06 – Formação de professores de matemática: práticas, saberes e desenvolvimento profissional José Bohland Filho, IFES, [email protected] Resumo: Este trabalho é parte de uma pesquisa mais ampla sobre o lugar da física nos cursos de formação de professores de matemática. Para este artigo selecionaram-se as entrevistas com sete professores de matemática de três escolas da rede estadual do ciclo médio de ensino para investigar se e com qual finalidade os conceitos de física são utilizados em sala de aula. O objetivo aqui é discutir sobre a presença das disciplinas de física nos cursos de formação de professores de matemática e como estas contribuem para uma melhor formação desses profissionais (FIORENTINI, 2003; BORBA, 2006; MOREIRA; DAVID, 2005). Para as entrevistas utilizou-se um roteiro de entrevistas e análise foi feita com base na análise de conteúdo (FLICK, 2004), criando-se categorias: a estrutura curricular dos cursos de matemática, as disciplinas de física presentes no currículo, o papel das disciplinas de física na formação dos professores e a interação entre a física e a matemática. O principal resultado obtido foi que estes professores utilizam os conceitos de física para a contextualização da matemática e mesmo os que não cursaram disciplinas de física em sua formação pensam que estas devem fazer parte da formação inicial de professores de matemática. Palavras Chave: Formação de professores; educação matemática; currículo. Introdução Este trabalho propõe-se a discutir sobre a formação de professores de matemática, no qual se pretende verificar o papel e potencialidades das disciplinas de física, presentes (ou não) nos cursos, e suas possíveis contribuições para a formação desses futuros professores. Esta discussão sobre o papel das disciplinas que estão presentes nos cursos de formação dos professores de matemática, e que não pertencem ao núcleo básico desta formação, ainda é muito restrita, pois o maior enfoque existente nos trabalhos sobre a formação de professores concentra-se nas práticas educativas e usos de tecnologias em sala de aula. O intuito é colaborar no sentido de levantar uma discussão ampla sobre as disciplinas de física nesta formação para verificar se e como elas podem auxiliar não só o professor em sala de aula, mas servirem como um facilitador do significado dos conceitos Comunicação Científica matemáticos e de sua utilidade. Para a realização deste trabalho foram entrevistados sete professores de matemática do ensino médio de três escolas da rede estadual de ensino do Estado do Espírito Santo, com o intuito de verificar o uso de conceitos de física em suas aulas e com qual objetivo fazem uso destes conceitos; mostrando, ou não, a necessidade da presença de disciplinas de física na estrutura curricular dos cursos de formação inicial de professores de matemática. Referencial Teórico Discussões sobre a formação de professores e mais especificamente sobre os professores de matemática já vem sendo feita por vários autores (FIORENTINI, 2003; BORBA, 2006; MOREIRA; DAVID, 2005) e passam por questões quanto à quantidade de matérias pedagógicas ou mesmo a possibilidade de cursar o mestrado o que implica numa grande quantidade de disciplinas específicas. Os trabalhos publicados sobre a formação de professores de matemática, em que são discutidos os saberes de conteúdo matemático, pedagógico e didático dos futuros professores, ressaltam que os futuros professores têm que ter uma postura crítica sobre a matemática e que esta deve estar vinculada ao cotidiano dos alunos. Muitos textos são focados no conhecimento matemático e a sua vinculação com as outras disciplinas, porém poucos deles trazem um estudo de como a matemática se relaciona com as outras ciências como a biologia, a física ou a química e como ela pode utilizar estas ciências para construir o conhecimento matemático. Moreira (1995) cita vários aspectos problemáticos e obstáculos para a reformulação dos cursos de licenciatura como: a secundarização da formação de professores/as no âmbito da universidade; a hierarquização acadêmica; a desarticulação entre universidade e os sistemas de ensino; e afirma: Reformas curriculares formais, que simplesmente acrescentam, eliminam ou substituem disciplinas e conteúdos, conservando a justaposição entre a formação referente ao conteúdo específico e a formação pedagógica, pouco têm contribuído para o enfrentamento dos entraves. (MOREIRA, 1995, p.7) Considerando a associação ensino-pesquisa na formação docente, elemento chave para o encaminhamento de algumas destas questões, Giroux (1997) coloca os professores Comunicação Científica como intelectuais transformadores, como agentes para fortalecer os estudantes na sua abordagem crítica e, comprometidos com o desenvolvimento de um mundo livre da opressão e exploração; livres para interpretar o mundo e mudá-lo quando necessário. Para essa interpretação crítica do mundo, é interessante pensar que precisamos dominar as técnicas de produção, a tecnologia e a ciência e, para isso o ensino de ciências não deve ser, simplesmente, a reprodução de equações matemáticas. Ao contrário, as práticas bem sucedidas nas pesquisas sobre ensino de física podem ter um papel importante na democratização do ensino de ciências, tornando mais acessível a compreensão do mundo a nossa volta. Moreira (1995), falando sobre o papel transformador do professor, discute a relação entre a universidade e a escola, sugerindo: A participação efetiva na melhoria da escola demanda do/a futuro/a professor/a tanto a compreensão do processo de escolarização como competência no planejamento e desenvolvimento de currículos, aulas e demais atividades pedagógicas, assim como no estabelecimento de relações facilitadoras de um trabalho efetivo (MOREIRA, 1995, p.14). Para o autor a universidade utiliza a escola como fonte de pesquisa, porém não ocorre um retorno à escola dos resultados destas pesquisas, seja na forma de mostrar a própria escola como ela está e o que pode ser melhorado ou modificado. Este retorno não ocorre nem no interior da própria universidade com mudanças nos cursos de formação dos futuros professores ou nos currículos que passem a levar em conta a atual realidade escolar. Essa discussão sobre a formação dos professores não pode passar ao largo da estrutura curricular dos cursos de formação de professores e das discussões no meio acadêmico sobre sua reformulação. Não podemos esquecer o papel dos atores nesse processo, pois como coloca Ferraço (1995, p. 227), o currículo “é produzido e realizado por pessoas concretas em determinados contextos sociais e históricos”. O trabalho de Santos (2007) mostra as contribuições de Paulo Freire e Ubiratan D'Ambrosio para a formação de um professor crítico/libertador, com uma prática transformadora e num processo de transformação própria e inserido na realidade social. O futuro profissional é pensado como um sujeito crítico, voltado à realidade, etc., porém as estruturas dos cursos permanecem as mesmas, bem como a forma como os conteúdos são vistos, ou seja, houve uma modernização dos discursos sobre a formação de professores, mas não uma mudança real desta formação. Com base nisso, que se pretende compreender um pouco mais sobre a formação dos Comunicação Científica professores de matemática, discutindo a relação existente entre a matemática e outras ciências e mais notadamente as disciplinas de física, presentes na maioria dos cursos de formação de professores. Método e Resultados Para realizar a pesquisa com os professores de matemática da rede pública de ensino, foi elaborado um questionário com treze questões que serviu como um roteiro de entrevista para ser aplicado nas escolas escolhidas por critérios de conveniência de localização. Duas foram escolas estaduais que possuem ensino médio, uma situada na capital e outra no interior do Estado. As entrevistas foram transcritas e analisadas com base na análise de conteúdo (FLICK, 2004) criando-se categorias analíticas: a estrutura curricular dos cursos de matemática, as disciplinas de física presentes no currículo, o papel das disciplinas de física na formação dos professores e a interação entre a física e a matemática. Na primeira das escolas a entrevista com três dos professores de matemática foi realizada durante o horário de intervalo das aulas. Esta escola situa-se num bairro de classe média alta, mas os alunos que a freqüentam vem, em sua grande maioria, de outros bairros. Estes professores são concursados o que já era esperado por ser uma escola central e não de periferia e os três possuem licenciatura plena, dois em matemática e um em ciências com ênfase em matemática. Licenciatura plena é o nome que se utiliza para dizer que foi feito um curso de licenciatura em quatro anos, ou seja, com 3.200 horas de aulas. No que pese a formação, um é formado na UFES em 1992 (denominado Professor A), um na UNASP-SP (Centro Universitário Adventista de São Paulo) em 2000 (Professor B) e outro (Professor C) em Itaperuna – RJ (na Fundação São José). Estes três professores haviam cursado disciplinas de física em sua formação inicial. O professor formado pela UFES, disse que já era professor desde 1980 e se mostrou desinteressado, não só em relação à entrevista, mas com o cotidiano da escola, estando alheio à discussão sobre uma exposição sobre Einstein que ocorria na cidade. Quando da entrevista, a sensação que ele passou era que estava esperando o tempo que faltava para se aposentar passar e, suas respostas refletem um pouco isto. Comunicação Científica A segunda escola pesquisada se situa no interior do estado, numa cidade considerada de médio porte. A escola fica localizada num bairro próximo ao centro, sendo uma das duas escolas da zona urbana que possui ensino médio. Nesta escola foi marcada uma reunião que ocorreu no dia de planejamento, pois todos os professores estariam ali reunidos. Eles são efetivos e cada um deles ministra aulas para uma única série. O primeiro a ser entrevistado (professor D) não possui formação em matemática. É formado em ciências contábeis com complementação pedagógica pela faculdade Universo do Rio de Janeiro e não cursou disciplinas de física nesta sua formação para ser professor de matemática. O segundo professor (E) entrevistado é formado em matemática (licenciatura curta – curso de 2.800 horas) pela PUC – Minas Gerais com complementação pedagógica pela UNIVALE. Em sua formação inicial cursou tantas disciplinas de física que ficava pensando: “vou dar aula do que? Depois que a gente vai entendendo o porquê”. Como o curso da PUC era de ciências e, somente depois de um tempo o aluno escolhia a sua área de preferência, este professor teve aulas de física, química, biologia e matemática. O terceiro professor (F) desta escola é formado em economia com complementação pedagógica pela Unisantos, não tendo cursado disciplinas de física em sua formação. Os professores desta escola afirmam que o objetivo deles é propiciar aos seus alunos condições de pensar e de serem aprovados num vestibular, logo eles tentam fazer um trabalho sério. Mesmo não tendo formação inicial para exercer a profissão de professor de matemática, e nem terem cursado disciplina de física, eles buscam utilizá-la para contextualizar a matemática. Outro ponto levantado por eles é que há uma sintonia entre os conteúdos de matemática e física, inclusive com alterações no programa para que os conceitos matemáticos sejam ensinados antes que o professor de física vá abordar estes assuntos. Segundo eles, esta interação os auxilia muito, mesmo porque os próprios livros texto trazem, quase sempre, exemplos na física dos conceitos matemáticos. Numa terceira escola, também da capital, foram deixados os questionários e apenas um foi respondido por um único professor (G) que possui licenciatura plena em matemática. No roteiro de entrevista deu-se mais ênfase a utilização dos conceitos de física e a importância das disciplinas de física na formação do professor de matemática do que propriamente ao currículo do curso. Mesmo assim tem-se respostas sobre a estrutura Comunicação Científica curricular dos cursos de matemática, por eles cursados. O interessante dessas falas é que um dos professores sentiu a falta de uma disciplina de filosofia e outro critica o fato de não existir mais as disciplinas de português nos cursos (as falas são identificadas pelas letras). Eu acho que foram válidas. Na época o curso era anual e não sei se era preciso ter 2 anos de cada disciplina, mas eu acredito que eu tive disciplinas como português que eu vejo que hoje em dia não tem. [...] Eu considero que o meu curso foi legal. O que teve foi necessário (C) No período de minha formação, senti falta da disciplina de filosofia (G) Quando entrei na PUC era em ciências exatas e só depois que a gente ia para onde estava mais interessado. Nos primeiros anos estudei muita física, muita biologia muita química e muita matemática. Toda exatas eram dadas de forma muito pesada para a gente. (E) O professor E teceu alguns comentários sobre o seu curso de graduação, onde a opção por cursar matemática, física, química ou biologia só acontecia após os dois primeiros anos de curso. No que diz respeito às reflexões sobre currículo, observamos que as práticas docentes não estão sendo discutidas ou ficam num outro plano, pois como escreve Moreira (2001, p. 18) “não se pode pensar currículo sem se pensar o professor e sua formação”. Segundo o autor, O currículo é visto como território em que ocorrem disputas culturais, em que se travam lutas entre diferentes significados do indivíduo, do mundo e da sociedade, no processo de formação de identidades. [...] No caso particular da formação de professores cabe indagar: que professores estão sendo formados, por meio dos currículos atuais? (Moreira, 2001, p. 43). Sobre as disciplinas de física, presentes no currículo, alguns dos professores entrevistados não responderam a esta questão, pois não são formados em matemática e possuem complementação pedagógica. Entre os professores que cursaram as disciplinas de física no curso obtivemos respostas das mais variadas: Foram importantes para a formação. Acho que tem que ter física nos cursos de matemática, poderia não ser 4 semestres mas é importante na formação. (B) Não, não me ajudaram não. Eram muito distante, na verdade é o que acontece ainda hoje, as disciplinas são muito... Elas são muito juntas mas são separadas. Não se trabalha junto, não é feito um trabalho junto de física e matemática. (A) Comunicação Científica Não, não que eu seja contra a física não, não é nada disso. O que eu falei é que lá na própria universidade, as duas não andam juntas. Uma é independente da outra, só. Na minha formação, não tive este proveito não. (A) Estas disciplinas de ciências foram importantes para conhecimento mesmo. O meu forte era matemática mesmo. Serviam para ampliar o conhecimento. (C) Eu acho que deveria ter, nem que seja só um período, mas deveria ter. Hoje é tudo contextualizado, você tem que ter nem que seja um.... Uma base em física, química, biologia. No meu modo de pensar tem que ter no curso de matemática. (C) Muita física tanto que ficava pensando “vou dar aula do que?”. Depois é que a gente vai entendendo o porquê. (E) Muito, e era muito interessante que, mesmo não considerando a sala de aula. (E) Na verdade tive acesso aos conceitos da física utilizando raciocínio matemático (G) O professor A disse que as disciplinas de física por ele cursadas em sua formação não ajudaram ou ajudam em nada nas suas aulas, enquanto os professores B e C dizem que a carga horária de aulas de física poderia ter sido menor. O professor E, ao ser perguntado se estas disciplinas o ajudaram a compreender melhor a matemática, respondeu que os seus professores de física e matemática eram muito sintonizados, então foi fácil perceber a ligação entre as duas disciplinas. Em relação ao papel destas disciplinas de física na formação dos professores de matemática, vê-se que os professores que não as tiveram em sua formação sentem a falta destas disciplinas, no entanto alguns professores que as cursaram (A e G, por exemplo) dizem não fazer uso destas disciplinas; o que demonstra não verem uma função destas disciplinas em sua formação. A seguir apresentam-se algumas falas em relação à presença e papel destas disciplinas no curso. Eu utilizo para exemplificar algum conceito, como aplicações. Utilizo para ensinar funções de primeiro e segundo graus. Por exemplo, para trabalhar com proporções utilizei um exemplo de um termômetro onde o zero correspondia à temperatura mais baixa do lugar no ano e o 100 à temperatura mais alta e falei que podíamos criar outros termômetros. Acho que até poderia utilizar mais. (B) Não tive disciplinas de física e sinto falta, porém trabalhei 2 anos com disciplinas de física na escola pois não havia professor habilitado. (D) Precisa. Você tem nos livros muitos problemas de física e você precisa saber responde-los. Não tem como não ter física, eu senti falta. (F) Comunicação Científica Na minha formação não influenciou, pois não sou habilitada para atuar na disciplina de física. (G) Quando perguntou-se sobre como é feita essa interação entre a física e a matemática, pôde-se perceber qual é a relação que cada professor possui com os conhecimentos de física adquiridos na sua formação ou de forma autônoma e, como eles fazem o uso deste conhecimento. Puderam-se separar as falas dos entrevistados em dois subgrupos: os que fazem uso dos conceitos de física em suas aulas e os que dizem não fazer uso deles. Pode-se reparar que alguns professores se enquadram nos dois grupos, talvez por não perceberem o próprio uso dos conceitos de física em suas aulas. Começando pelo grupo que disse não utilizar esses conceitos: Não, não vejo não. Esta se tentando agora no Estado (e ai começa a entrar na física), é quando da idéia de simulados das escolas, o próprio Enem, a equipe que trabalha junto de matemática e física, começa a perceber que hoje a matemática trabalha junto com a física, mas antes não. (A) Depende do assunto que vamos abordar, mas não utilizo a física (A) Não (utilizo), porque eu dou aula de matemática mesmo, eu pego mais da minha área. (C) O interessante a ser notado, é que estes dois professores possuem licenciatura plena em matemática e cursaram disciplinas de física. Por outro lado o professor A repara que, como as escolas estão realizando simulados para ENEM e devido às próprias questões deste exame, que priorizam situações problemas envolvendo as duas disciplinas, forçando um trabalho conjunto entre os professores de física e matemática. Estas imposições (provas Enem, saeb, etc) fazem com que as posturas mudem, o que não ocorre somente pelas mudanças curriculares dos cursos, mas por necessidade. O professor C, que disse não utilizar os conceitos de física, entra em contradição na seguinte fala: Eu trabalho mais com a primeira serie do ensino médio, e são poucos conteúdos que dá assim para contextualizar. Função por exemplo a gente contextualiza alguma coisa e utiliza a física, principalmente gráficos (equação do 1º grau e 2º grau). Acho que a física está mais ligada com gráficos e eu puxo mais para o lado da física, apesar de não aprofundar no conteúdo. Em probabilidade utilizo mais a biologia. (C) Sobre esta contextualização da matemática e a utilização dos exemplos de física e de outras disciplinas, as seguintes falas foram obtidas: Comunicação Científica Hoje a gente faz um trabalho com física aqui e eu sinto falta de fazermos este trabalho com outras disciplinas. Trabalhar mais integrado. (D) A gente usa só em movimento, cálculo de velocidade, o básico . Trabalhando função onde até os próprios livros relacionam alguns cálculos e função com a física. Na realidade você só aproveita da situação para desenvolver a matemática. Não é um conhecimento profundo, mas para ilustrar a matemática. (D) Acho que a biologia, na questão da probabilidade, a geografia no plano cartesiano, coordenadas geográficas. A física é a que mais faz, não tem como, a física é matemática pura. (D) Na geometria eu tive que voltar com eles e falar de vetor, força resultante, achar distancia, depois velocidade, deslocamento. Às vezes eu brinco com o professor de física “eu dei aula de física hoje”. A física está muito presente. (E) Sim, eu trabalhei vetores logo no inicio. [...]O professor de física sinaliza “eu preciso disso”, e ai quem ta naquela série vai providenciar. (E) O professor (de física) perguntou se eu estava ensinando a lei dos cossenos pois um aluno resolveu um problema de física utilizando essa Lei., então tem uma ponte legal e o nosso contato aqui é bem interessante. (E) Observamos que mesmo se utilizando de outras disciplinas na contextualização da matemática, a interação com a física é muito maior. Este ato pode novamente ser entendido como um fator proveniente da origem destes cursos, pois mesmo quando se fala da matemática aplicada, ela é aplicada em sua maioria em problemas da física. Atualmente, com esta exigência de contextualização, os livros didáticos dos ensinos: fundamental e médio trazem problemas envolvendo outras disciplinas. Como se vê nas falas: Então quando ela aparece (livro) para mim é que eu utilizo. Eu não vou buscar na física para explicar algo da matemática, o próprio livro já traz. Na realidade este livro é muito bom. (E) No primeiro ano eu vejo que é bem junto, quase todo assunto que ele (livro) aborda ele põe a física lá. Às vezes eu falo pros meninos: A aula hoje é de física. (E) Pela minha experiência eu acho hoje muito mais irmãs a matemática e a física, antes era muito pior, pois os próprios livros não relacionavam a matemática com as outras disciplinas. Hoje em dia para dar aula de matemática você tem que ter o conhecimento de física senão você passa um exercício que não sabe resolver. A contextualização obriga que você tenha conhecimento de outras disciplinas (E) Esta presença de exemplos matemáticos que envolvem conceitos de outras disciplinas força os professores a buscar este conhecimento, ou rever aqueles conhecimentos adquiridos em sua graduação que na época parecia não ter nenhuma Comunicação Científica finalidade para a sua formação, mas somente completar a carga horária. Em relação às atitudes frente às disciplinas de física, tanto por parte dos professores quanto dos alunos, percebeu-se nas falas que os professores D e F enquanto alunos, gostavam de física, o que facilitou o estudo posterior desta disciplina para contextualizarem suas aulas. Eu gosto muito, me identifico muito com a matéria, não sou formado, porém estudava para trabalhar, mas senti falta de não ter feito na graduação. (D) Eu dei aula de física de elétrica e eu fiz muito curso de elétrica (a distancia), fiz curso no SENAI de comandos elétricos. Eu me senti a vontade de ensinar física pois eu tinha um conhecimento. Eu estudei, pois eu gostava muito. (D) Aprendi (física) no ensino médio. [...] Quando eu fui dar aula de física é porque não tinha mais ninguém na escola e falaram que ia sobrar para mim. Eu falei que não sabia nada de física, só o que aprendi o ensino médio, então eu peguei os livros e comecei a estudar. Aí veio uma outra professora de física e ela começou a me ensinar como eu deveria trabalhar de melhor forma a física. Trabalhei durante 3 anos dando aulas de física. (F) Em relação aos alunos, os professores percebem que ainda há um distanciamento entre estas disciplinas, como se elas fossem completamente distintas e a mudança ocorrida nos livros e nas aulas, fazendo esta correlação entre as várias disciplinas ainda não está sendo assimilada pelos alunos. Eles (os alunos) tem este problema de associar as fórmulas, mas alguns conseguem utilizar outros conceitos de matemática na física mas são poucos. (E) A gente vai tentando mas os alunos ainda vêem as disciplinas isoladas A gente vai mostrando, como quando a gente fala da probabilidade na biologia os alunos dizem: o professor falou isso mas não conseguem relacionar. Eu acho o mesmo na física. (E) Com certeza, não tem como diferenciar uma da outra. Eu dei aula para uma mesma turma de física e matemática e eles ficavam muito loucos, falavam: pelo amor de Deus, professora eu não estou entendendo mais nada se uma completa a outra ... (as vezes no meio da aula eles perguntavam: aonde eu anoto isso) (F) Algumas das falas analisadas demonstram que os professores ao dizerem não utilizar dos conceitos de física em suas aulas tem a opinião que as disciplinas no curso deveriam servir “para habilitar o professor de matemática a trabalhar com disciplinas de física” (professor G), demonstrando, a meu ver, que este professor não aprendeu física Comunicação Científica tendo em vista que esta não lhe seria útil, no entanto se fosse para ministrar aulas de física ele utilizaria estes conceitos, ou seja, é uma visão utilitarista. Já o professor A disse: Não sei, eu acho que o ensino em si deveria ser mais.... Não sei como é hoje, mas parece que na nossa cabeça, matemática, física, química e biologia são caixinhas e é preciso ter uma integração. Não sei qual disciplina faria esta integração entre estas disciplinas que são correlatas. Poderia ser a didática, mas ela é tão fora da realidade da gente. Não sei quem poderia fazer esta junção. (A) Isto demonstra que é importante ter uma integração entre as ciências, e entre outras disciplinas, mas que na formação deste professor estas disciplinas foram vistas como isoladas; logo, o fato dele não fazer estas correlações em suas aulas mostra a sua dificuldade hoje em conseguir realizar essa interação. De posse destes resultados vemos que as disciplinas de física podem assumir um papel de aproximar a matemática acadêmica da matemática da sala de aula e sobre o contraste entre essas duas matemáticas, Borba (2006) questiona: Que matemática o futuro professor deve estudar para que seja um professor competente? Moreira e David (2005) mostram que existem duas tendências distintas sobre o conhecimento escolar, uma delas dizendo que ele é didatizado a partir do conhecimento científico e a outra que ele é independente do conhecimento científico. A alternativa proposta pelos autores é que a formação dos professores tematize tanto a matemática acadêmica como a escolar. Segundo os autores a questão fundamental para a Matemática Escolar refere-se à aprendizagem, portanto ao desenvolvimento de uma prática pedagógica visando à compreensão do fato, à construção de justificativas que permitam ao aluno utilizá-lo de maneira coerente e conveniente na sua vida escolar e extra-escolar. (MOREIRA; DAVID, 2005, p. 23) A meta seria aproximar a matemática do mundo real, como forma de torná-la menos abstrata e por conseqüência mais compreensível, para este fim as disciplinas de física tornam-se importantes para realizar esta contextualização. Sob o olhar dos professores da licenciatura em matemática, as disciplinas da física cumprem o papel de relacionar a matemática com as outras ciências, pois é aquela que mais aproxima os conhecimentos matemáticos. Observamos que nem todos os professores da rede, mesmo os efetivos, possuem licenciatura plena em matemática e, devido a isso, estes professores não cursaram disciplinas de física em sua formação para lecionar matemática, contradizendo a formação Comunicação Científica da maioria dos cursos das universidades públicas brasileiras que colocam as disciplinas de física nas estruturas curriculares dos cursos de formação de professores de matemática (licenciaturas), como pode ser vista no quadro 1, onde são mostradas o número de disciplinas de física nos anos de 2006 e 2010, e número de créditos (corresponde a 15 horas de aula) cursados nestas disciplinas em alguns cursos de universidades públicas do Brasil. Universidade UFES UFF UFJF UFMG UFPR UFRJ UFU UNB UNESP/RC USP/SP Dados de 2006 disciplinas créditos 2 12 2 12 4 12 3 11 2 8 3 14 2 8 4 14 2 16 6 28 Dados de 2010 disciplinas créditos 3 16 2 12 3 10 4 11 3 12 3 12 2 8 4 14 4 16 6 20 Quadro 1: disciplinas de física nos cursos de licenciatura em matemática Fonte: pesquisa por meio eletrônico nas paginas dos cursos Estes dados mostram que mesmo após a mudança da legislação, que retirou a obrigatoriedade da presença das disciplinas de física na estrutura curricular, estas disciplinas continuaram presentes nas grades curriculares dos cursos de licenciatura em matemática. Dentre os professores que fizeram um curso de licenciatura plena, apesar de dizer que as disciplinas de física foram válidas para a formação não mostram uma convicção sobre o papel destas disciplinas no curso. Perguntados se utilizam conceitos de física em suas aulas de matemática, o surpreendente foi que aqueles professores que não tiveram disciplinas de física em sua formação são mais propensos a utilizar estes conceitos em sala de aula do que alguns professores com uma formação em licenciatura plena. Um detalhe que não pode ser observado pelas respostas, mas que foi perceptível nas entrevistas é que nos locais onde ocorre uma maior interação entre os professores de física e matemática, discutindo programas e atuando conjuntamente; os professores de matemática se utilizam da física nas suas atividades didáticas, como no caso dos professores D, E e F independente de as terem cursado na formação. Comunicação Científica Em outras escolas observou-se que este interesse em trabalhar em conjunto depende do professor, pois se notou, na mesma escola, professores que interagem com os da física para discutir os assuntos e outros que não se utilizam de nenhuma forma dos conhecimentos de física em suas aulas; mesmo tendo cursado disciplinas de física em sua formação. Cabe ainda ressaltar as diferenças de respostas obtidas quando do uso de um questionário ou de uma entrevista. As respostas obtidas por meio de questionário apresentam dados que dificultam a interpretação pelo pesquisador, é como um documento que não traz a circunstância em que foi escrito e cabe ao pesquisador ter a sua interpretação destes fatos. Por outro lado, nas entrevistas, os elementos com que se trabalha são mais ricos em informação, pois existe o gestual do entrevistado, seu tom de voz, sua relação com o ambiente ao redor e que permite ao entrevistador acrescentar perguntas sobre assuntos que não seriam, em princípio, do interesse da pesquisa (não estariam num questionário), mas que estão interferindo no assunto pesquisado, como o desinteresse do professor (que espera a aposentadoria), sua relação com os colegas, etc. Com os resultados das entrevistas, pôde-se analisar melhor o foco principal deste trabalho sobre a utilização dos conceitos de física nas aulas de matemática e a importância destas disciplinas de física na formação dos professores de matemática. Considerações Finais Neste trabalho verificou-se que os professores se utilizam da física e de outras ciências no ensino de matemática, como uma forma de mostrar aos alunos o uso da matemática em situações cotidianas, deixando a matemática de ser uma ciência somente abstrata. Vários entre os professores entrevistados não tiveram disciplinas de física em sua formação inicial nem na complementação de estudos, mas mesmo assim encontraram formas de aprender um pouco mais de física, biologia, etc. para poder aplicar em suas aulas. Mesmo utilizando exemplos de outras ciências, pôde-se notar pelas respostas obtidas que os conceitos e conteúdos de física são os que mais servem para a aplicação da matemática, o que está em concordância com a histórica ligação entre as disciplinas de física e matemática. Ao mesmo tempo que os professores da rede acreditam que as disciplinas da física são úteis para contextualizar a matemática, vários destes professores que cursaram essas disciplinas na sua formação inicial evitam o seu uso, mostrando que deve existir uma falha Comunicação Científica entre a importância destas disciplinas na formação do futuro professor e a forma como estas disciplinas se relacionam com a matemática nos cursos de formação inicial de professores. Referências BORBA, M. C. (Org.) Tendências Internacionais em Formação de Professores de Matemática. Belo Horizonte: Autêntica, 2006. FERRAÇO, C. E. Pensando a formação continuada de educadores e os currículos prescritos a partir dos currículos reais: em busca de propostas de intervenção nos cotidianos escolares. Cadernos de Pesquisa em Educação, v. 7, n. 13 (dez 1995). Vitória: PPGE, 1995. FIORENTINI, D. (Org.). Formação de Professores de Matemática: explorando novos caminhos com outros olhares. Campinas-SP: Mercado de Letras, 2003. FLICK, U. Uma Introdução à Pesquisa Qualitativa. Porto Alegre: Bookman, 2004. GIROUX, H. A. Os professores como intelectuais. Porto Alegre: Artmed editora, 1997. MOREIRA, P. C.; DAVID, M. M. M. S. A formação matemática do professor: licenciatura e prática docente escolar. Belo Horizonte: Autêntica, 2005. MOREIRA, A. F. B. Currículo, cultura e formação de professores. Educar, nº 17 p 39-52. Editora da UFPR, Curitiba, 2001. MOREIRA, A. F. O currículo como política cultural e a formação docente. In: SILVA, T.T.; MOREIRA, A. F. (Orgs.). Territórios Contestados. Petrópolis: Vozes, 1995. SANTOS, B. P. Paulo Freire e Ubiratan D'Ambrosio: contribuições para a formação do professor de matemática no Brasil. São Paulo, Faculdade de Educação/USP. 2007.