12 Pensar A GAZETA VITÓRIA, SÁBADO, 5 DE DEZEMBRO DE 2015 dança por CRESO FILHO PINA BAUSCH X HIP HOP OLD SCHOOL Pina não é a precursora da dança-teatro, mas sua principal representante. Muita gente embarcou no conceito e começou a achar que qualquer ato teatral com movimento se encaixava m 1987, eu fazia “Hair” em São Paulo, com direção de Antônio Abujamra. Ele era um desses diretores fantásticos que gostava de trabalhar com atores bem informados, além de ser ele mesmo, antenadíssimo! Acontecia na cidade também naquele período um festival de dança. Além da apresentação de várias companhias, havia, paralelamente, uma mostra de filmes de dança. Abu aconselhou a nós, do elenco, que fôssemos ver o máximo que pudéssemos. Recomendou Pina Bausch, lembro! Naquela ocasião, vi “Café Müller” na tela e fiquei encantado. Eu não tinha a menor ideia de que um dia conheceria Pina, a companhia e quase todo o seu repertório. Me mudei para Amsterdã em 1990. Logo, Pina passou pela cidade. No programa, “Café Müller”, “Nelken” e “A Sagração da Primavera”. Fiquei deslumbrado! (Continuo deslumbrado). A comunidade da dança em Amsterdã fervilhava eufórica. (Nem todos. É raro, mas há quem não goste). Eu nem era tão da dança assim... fazia aulas regularmente desde os 17 anos, mas nunca fui bom o suficiente para ousar querer fazer parte de uma companhia. (E nem queria). Eu era mesmo do teatro e já sabia muito bem disso! Contudo, fui com a seleta moçada amiga da época fazer as aulas de ballet que o mestre Alfredo Corvino dava para a companhia de Pina. Bom demais estar no meio daquela gente! Passei a frequentar mais e mais os espetáculos de dança. Todas as danças! Ballet Frankfurt, The Forsythe Company, Sankai Juku, La La La Human Steps, (a companhia acabou este ano), Les Ballets C de la B, Batsheva Dance Company, Kibbutz Contemporary Dance Company, Wim Vandekeybus, Anne Teresa de Keersmaeker, Jan Lauwers, Jan Fabre… tenho visto companhias maravilhosas. O Nederlands Dans Theater (NDT), para mim, é o que há de melhor. Que técnica! Que bailarinos, que coreógrafos! Eles são impressionantes. Têm, sim, condições para tal: digno subsídio, pessoal e material técnico de primeira qualidade... Os seus espetáculos são inesquecíveis. Pina não é a precursora da dança-teatro, mas a sua principal representante. O certo é que muita gente embarcou neste REPRODUÇÃO E A alemã Pina Bausch é uma influência para a dança contemporânea conceito. Apareceu no mundo uma moda de fazer-se dança-teatro. Sem fundamento, na grande maioria das vezes. Começaram a achar que qualquer imagem ou ato teatral com algum movimento era dança-teatro. Ui! Há que aprofundar-se muito e ter muito claro para si o que quer-se dizer, antes de fazer uma ideia virar espetáculo. (Um BOM espetáculo)! Os rótulos, os nomes, acabam nem sendo muito importantes. Tanto fará ser teatro-dança, dança-teatro, dança contemporânea, butô, tango, bal- let clássico, hip hop, jazz, etc... o que importará será a qualidade. Dança tudo é (ou pode ser). A questão é se é bom ou ruim. Pina morreu em 30 de junho de 2009. Michael Jackson havia morrido cinco dias antes. Em menos de uma semana perdi dois dos meus grandes ídolos. Em Paris, no ano passado, fui rever no Théâtre de la Ville, um dos meus espetáculos favoritos: “Palermo, Palermo”. A maioria dos bailarinos tinha já por volta dos 50 anos. Me vi ali com meu hip hop old school, que já foi streetdance, que já foi apenas hip hop, street hip hop. Recentemente estive quatro vezes em Wuppertal vendo algumas das peças que eu ainda não conhecia. Vi o primeiro trabalho da companhia sem a direção de Pina. Convidaram três coreógrafos. Dividiram a companhia em três grupos de 10 pessoas e montaram um espetáculo com três partes. Nenhuma delas chegou a me tocar. Uma delas tinha um estilo bastante urbano e muito canto. Curiosamente, o coreógrafo jamais ouvira falar em Pina Bausch. Acho louvabilíssimo a direção da companhia, atualmente de Lütz Foster, arriscar desta forma. A terceira coreografia apresentada foi a que mais se aproximou da linguagem de Pina. Particularmente achei repetitiva. Cada ideia era mostrada à exaustão. Bom, a companhia tinha que dar um passo à frente. Desde a morte de Pina, nada de novo era feito. O passo foi dado. Tenho enorme admiração pela obra de Pina. Assistir aos seus espetáculos me emociona profundamente. São sutilezas, pontos de vista, descobertas… Acho que Pina nunca teve compromisso com técnicas de dança ou teatro. Seu compromisso era com a sua sensibilidade; com sua forma sincera e particular de ver o mundo. Sempre digo que entrar para o mundo da dança, ser um profissional da dança e viver dela, é entrar para um convento! Há que se ter tanta disciplina, abdicar de tanta coisa, os obstáculos são tantos, que só mesmo quem não pode viver sem ela sobreviverá. Creso Filho é ator, coreógrafo, bailarino, mímico e acrobata. OFICINA DE HIP HOP Na próxima semana (7 a 11 de dezembro). Mais informações e preços: Escola de Dança Cridança. Av Saturnino Rangel Mauro, 235, Jardim da Penha, Vitória. (27) 3324-8797.