XV CONIC
XV Congresso de Iniciação Científica da UFPE
29 a 31 de outubro de 2007
20210 - EVOLUÇÃO CARIOTÍPICA NO GÊNERO NOTHOSCORDUM
KUNTH
Liliane Gallindo Dantas1; Marcelo Guerra2
1
Estudante do curso de Ciências Biológicas/Bacharelado – CCB – UFPE; E-mail: [email protected],
2
Docente/pesquisador do Dpto de Botânica – CCB – UFPE; E-mail: [email protected]
Resumo
Oito acessos de Nothoscordum foram analisados objetivando estudar os mecanismos
relacionados à evolução cariotípica no gênero, tendo como parâmetros: número e morfologia
cromossômicos, padrão de bandas CMA+ e distribuição dos sítios de DNAr. O padrão de bandas
separou os acessos nas seções já definidas morfologicamente Inodorum (quatro acessos, com
bandas CMA+ intersticiais) e Nothoscordum (quatro acessos, sem bandas intersticiais). Na seção
Inodorum, dois acessos possuíam 2n = 10 (4A+6M) e dois 2n = 15 (6A+9M), e na seção
Nothoscordum dois possuíam 2n = 8 (8M) e dois 2n = 18 (4A+14M). As análises indicaram que
uma das espécies com 2n = 10 estudadas ou outra próxima está envolvida na origem de N.
inodorum. Os acessos com 2n = 8 e 2n = 10 analisados não estão relacionados com a origem das
espécies com 2n = 18 estudadas, pois possuem bandas que estão ausentes no cariótipo em
questão. Nothoscordum pulchellum, entretanto, poderia tê-lo originado a partir da duplicação do
genoma seguida pela fusão de dois pares de acrocêntricos. A inexistência de bandas e sítios na
região proximal dos metacêntricos analisados sugere que outros eventos, além da fusão-fissão
cêntrica, estão envolvidos na origem dos números x = 4 e x = 5.
Palavras-chave: Poliploidia; fusão-fissão; CMA;FISH
INTRODUÇÃO
Nothoscordum Kunth. (Alliaceae) é um gênero de plantas herbáceas e perenes que ocorre
predominantemente no continente sul-americano, abrangendo cerca de 20 espécies (Crosa,
1996). Está dividido em duas seções, Inodorum e Nothoscordum, que diferem em diversas
características morfológicas, como cor das flores e anteras, tipo de filetes e de grãos de amido do
bulbo (Guaglianone, 1972). No Brasil, é o único gênero nativo da família (Souza e Lorenzi,
2005), e ocorre principalmente na região sul, destacando-se a espécie Nothoscordum inodorum
(2n = 19) no sul e Nothoscordum pulchellum (2n = 10) no nordeste (Guerra e Felix, 2000). O
gênero possui os maiores cromossomos conhecidos para a flora brasileira, e uma grande
variabilidade cariotípica, com números cromossômicos entre 2n = 8 e 2n = 26 (Guerra e Felix,
2000) e número básico x = 5. A evolução cariotípica no gênero parece ter se dado principalmente
por eventos de fissão-fusão e poliploidia, entretanto análises cromossômicas com as técnicas de
bandeamento e hibridização in situ (ISH), que seriam importantes para a demonstração de que
esses eventos de fato ocorreram, foram utilizadas em apenas duas espécies, N. inodorum (Crosa,
1996) e N. pulchellum (Guerra e Felix, 2000), revelando padrões distintos.
A evolução cariotípica vem sendo objeto de estudo de diversos organismos, em especial aqueles
tidos como organismos-modelo. Por suas características citológicas, Nothoscordum se mostra
como um excelente modelo didático para a análise da evolução cariotípica em plantas. Seus
cromossomos grandes permitem uma melhor visualização dos mecanismos envolvidos na
evolução cariotípica, em especial quando aliados a localização de marcadores cromossômicos,
como regiões de DNA repetitivo ou sítios de DNAr 5S e 45S. Dessa forma, uma análise através
de técnicas citogenéticas como a hibridização in situ e a coloração diferencial da cromatina
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auxiliará na compreensão dos eventos relacionados à evolução cariotípica no gênero, servindo
como modelo para os mecanismos de evolução cariotípica em vegetais.
MATERIAL E MÉTODOS
Os acessos analisados estão sumarizados na Tabela 1. Pontas de raízes de todos os acessos foram
coletadas e pré-tratadas com colchicina 0,2% a 10-11°C por 24h. As raízes foram fixadas em
etanol-ácido acético (3:1, v:v) por 24h à temperatura ambiente e estocadas no freezer. As raízes
foram digeridas com uma solução de celulase 2%-pectinase 20% por 1h e 30min a 37°C e
esmagadas em uma gota de ácido acético 45%. As lâminas foram selecionadas com
DAPI/glicerol.
Após terem sido envelhecidas por três dias, as lâminas foram coradas com CMA e contracoradas
com DAPI por 30min, de acordo com Schweizer (1976). As melhores células foram fotografadas
e as lâminas descoradas para serem posteriormente utilizadas na hibridização in situ. As sondas
utilizadas para a hibridização foram DNAr 5S obtida de Lotus japonicus, e DNAr 45S, obtida de
Arabidopsis thaliana. A marcação foi realizada por nick translation utilizando a molécula
marcadora Cy3-dUTP para o DNAr 5S e digoxigenina-11-dUTP para DNAr 45S. A hibridização
foi feita segundo Moscone (1996), com algumas modificações. As lâminas foram desnaturadas
em 50% formamida em 2×SSC por 1min e 30s. A mistura de hibridização, composta de 60% de
formamida, 10% de dextran 50% e 10% de 20×SSC, além de água e sonda, foi desnaturada a
75°C por 10min. Adicionou-se 15µL da mistura de hibridização em cada lâmina e incubou-se em
câmara úmida a 37°C por 18h, no mínimo. A sonda de DNAr 45S foi detectada com anticorpo
anti-digoxigenina desenvolvido em ovelha conjugado com FITC e o sinal foi amplificado
anticorpo anti-ovelha desenvolvido em coelho conjugado com FITC. As lâminas foram
montadas com DAPI-Vectashield e fotografadas.
RESULTADOS
Dentre os oito acessos analisados no presente trabalho, quatro se agrupam na seção Inodorum e
quatro na seção Nothoscordum. Os resultados obtidos estão sumarizados na Tabela 1. Foi
observada uma constância na fórmula cariotípica bem como no padrão de bandas CMA+ de
acessos com números cromossômicos iguais.
Nothoscordum sp 6 e N. montevidensis apresentaram 2n = 8 (8M), com cromossomos
ligeiramente maiores em N. montevidensis, e ambas apresentaram bandas CMA+ terminais em
ambos os braços do maior par cromossômico. Nothoscordum sp 5 e Nothoscordum sp 7
apresentaram 2n = 18 (4A+14M) com bandas CMA+ localizadas nos braços curtos dos
acrocêntricos, diferindo bastante do encontrado para os outros dois acessos da seção analisados.
Por outro lado, os acessos da seção Inodorum apresentaram fórmulas cariotípicas mais
relacionadas entre si. Nothoscordum sp 1 e Nothoscordum sp 2 são diplóides com 4A+14M,
enquanto Nothoscordum sp 3 e Nothoscordum sp 4 são triplóides, com 15 cromossomos, sendo
6A+9M. Os quatro acessos apresentaram bandas CMA+ nos braços curtos dos acrocêntricos e em
Nothoscordum sp 1 e Nothoscordum sp 2 foram visualizadas bandas intersticiais nos braços
longos de todos os acrocêntricos, enquanto Nothoscordum sp 3 e Nothoscordum sp 4 as
apresentaram em apenas cinco dos seis acrocêntricos. Os dois primeiros acessos foram
considerados posteriormente uma única espécie, o mesmo ocorrendo para os dois últimos.
A FISH foi realizada com sucesso em N. montevidensis (2n = 8), Nothoscordum sp 2 (2n = 10) e
Nothoscordum sp 5 (2n = 18). Em N. montevidensis e Nothoscordum sp 5 os sítios de DNAr 45S
co-localizam com todas as bandas CMA+, entretanto em Nothoscordum sp 2, os sítios de DNAr
45S co-localizaram apenas com as bandas CMA+ dos braços curtos. Nesse acesso, a hibridização
do DNAr 5S revelou dois sítios adjacentes em um par de metacêntricos, sendo um na região mais
terminal e o outro um pouco mais intersticial
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Tabela 1. Sumário dos acessos analisados, seção a qual pertencem, local de coleta, fórmula cariotípica e localização
das bandas CMA+ e dos sítios de DNAr
Acesso
Seção
Localidade
2n
Nothoscordum
sp 1
Inodorum
Nothoscordum
sp 2
Inodorum
Nothoscordum
sp 3
Nothoscordum
sp 4
Nothoscordum
sp 5
Nothoscordum
sp 6
Nothoscordum
sp 7
Nothoscordum
montevidensis
Inodorum
Nothoscordum
Punta
Colorada,
Uruguay
Punta
Colorada,
Uruguay
Punta Ballena,
Uruguay
Punta Ballena,
Uruguay
Bela Union,
Uruguay
-
Nothoscordum
Nothoscordum
Inodorum
Nothoscordum
10
Fórmula
cariotípica
4A+6M
Bandas
CMA+
4A*
Sítios de
DNAr
45S – 4A
5S – 2M
10
4A+6M
4A*
-
15
6A+9M
6A∞
-
15
6A+9M
6A∞
-
18
4A+14M
4A
45S – 4A
8
8M
2M
-
-
18
4A+14M
4A
-
-
8
8M
2M
45S –
2M
*bandas CMA+ intersticiais adicionais nos braços longos dos quatro acrocêntricos. ∞ bandas CMA+ intersticiais
adicionais nos braços longos de cinco acrocêntricos. Os sítios de DNAr 45S foram co-localizados com as bandas
CMA+ terminais em todas as espécies
DISCUSSÃO
Inicialmente foram analisadas as relações entre os acessos diplóides de número cromossômico
básico x = 4 (4M) e x = 5 (3M+2A), visando avaliar se essa diferença cariotípica teria sido
devida à fusão dos dois acrocêntricos em uma espécie com x = 5, originando x = 4, ou o inverso.
Jones (1978) observou que diferentes grupos de espécies apresentam evolução aparentemente
por fusão ou fissão cromossômica, e Crosa (1972) mostrou indícios que a evolução
cromossômica em Nothoscordum se deu a partir de eventos de fusão/fissão cêntrica, entretanto
não existem marcadores dos braços cromossômicos que possam comprovar essa hipótese.
Trabalhos de fissão e fusão cêntrica são mais conhecidos em animais, onde o padrão de bandas G
(inexistentes em vegetais) permite um maior detalhamento da diferenciação longitudinal
cromossômica, permitindo demonstrar os eventos de fusão ou fissão cêntrica (ver, por exemplo,
Silva et al., 2006).
Os resultados revelaram que os acessos com n = 4, N. montevidensis e Nothoscordum sp 6, e os
acessos com n = 5 não apresentaram um padrão de bandas CMA+ e sítios de DNAr compatível
com a idéia de uma simples fusão ou fissão cêntrica. Isso porque não foram encontradas bandas
CMA+ ou sítios de DNAr 45S proximais em nenhum dos oito cromossomos metacêntricos, o que
seria esperado se tivesse ocorrido uma fusão dos acrocêntricos das espécies de 2n = 10, ou uma
fissão de metacêntricos das espécies de 2n = 8. Além disso, as espécies da seção Inodorum
possuem bandas intersticiais CMA+ que não são encontradas nas espécies da seção
Nothoscordum. Esses dados sugerem que outros eventos, além da fusão-fissão cêntrica, estão
envolvidos na origem dos números cromossômicos básicos, dando origem aos padrões
observados.
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Os dados obtidos também indicam que as espécies estudadas com 2n = 18 não poderiam ter
surgido por alopoliploidia a partir das espécies analisadas com 2n = 10 e 2n = 8. Isso porque os
cariótipos com 2n = 18 não possuem bandas CMA+ terminais nos metacêntricos ou bandas
intersticiais nos acrocêntricos, presentes nas espécies com 2n = 8 e 2n = 10, respectivamente. O
mais provável é que essa espécie tenha surgido de um ancestral com um cariótipo semelhante ao
de N. pulchellum, descrito por Guerra e Félix (2000), com fusão do par de acrocêntricos sem
bandas CMA. Por outro lado, o padrão de bandas dos acrocêntricos de Nothoscordum sp 2 é
muito semelhante ao de quatro dos seis acrocêntricos de N. inodorum (2n = 19), sugerindo que
Nothoscordum sp 2 ou outra espécie muito próxima a ela pode ter sido um dos ancestrais dessa
espécie.
CONCLUSÃO
O padrão de bandas CMA+ parece suportar a separação do gênero nas seções Inodorum, com
cariótipo com bandas CMA+ intersticiais, e Nothoscordum, sem essas bandas. A evolução
cariotípica no gênero, portanto, parece ter se dado de forma independente nas duas seções.
Apesar da grande variação no número cromossômico observada, espécies com números
cromossômicos iguais apresentaram idêntica fórmula cariotípica, localização e número de bandas
CMA+ e sítios de DNAr.
AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Dr. Orfeu Crosa, da Universidade de Montevidéu, Uruguai, pela inestimável
colaboração na identificação e fornecimento de material. Ao CNPq/PIBIC, pelo apoio financeiro.
REFERÊNCIAS
Crosa, O. Estudios cariología en el género Nothoscordum (Liliaceae). Bol Fac Agr Uruguay, v.
122, p. 3-8, 1972
Crosa, O. Sistemática e evolução das espécies da seção Inodorum Guag. do gênero
Nothoscordum Kunth (Allieae, Alliaceae). 1996. 247 p. Tese (Doutorado) - Genética e
Biologia Molecular, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. 1996.
Guaglianone, EA. Sinopsis de lãs espécies de Ipheion Raf. y Nothoscordum Kunth. (Liliáceas)
de Entre Rios y regiones vecinas. Darwiniana, v. 17, p.159-240, 1974.
Guerra. M; Felix, LP. O cariótipo de Nothoscordum pulchellum (Alliaceae), com ênfase na
heterocromatina e nos sítios de DNAr. Bol Soc Argent Bot, v. 35, n. 3-4, p.283-289, 2000.
Jones, K. Aspects of chromosome evolution in higher plants. Adv Bot Res, v. 6, p. 119-194,
1978.
Moscone, EA; Matzke, MA; Matzke, AJM. The use of combined FISH/GISH in conjuction with
DAPI counterstaining to identify chromosomes containing transgene inserts in amphidiploid in
tobacco. Chromosoma, v. 105, p. 231-236, 1996.
Schweizer. D. Reverse fluorescent chromosome banding with Chromomycin and DAPI.
Chromosoma, v. 50, p. 307-324, 1976.
Silva, MJJ; Patton, JL; Yonenaga-Yassuda, Y. Phylogenetic relationships and karyotype
evolution in the sigmodontine rodent Akodon. Genet Mol Biol, v. 29, n. 3, p. 469-474, 2006.
Souza, VC; Lorenzi, H. Botânica Sistemática: guia ilustrado para identificação das famílias
de angiospermas da flora brasileira, baseado em APG II. Nova Odessa: Instituto
Plantarum. 2005. 640p.
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