PALEOANTROPOLOGIA PARA
INICIANTES
UM CURSO ILUSTRADO SOBRE A EVOLUÇÃO BIOLÓGICA HUMANA
Por Euder Monteiro
(revisão e edição por Fernando Bilharinho)
Ardi (Ardipithecus ramidus) e Lucy (Australopithecus afarensis), duas damas do passado. Fonte: Revista Veja
PALEOANTROPOLOGIA PARA INICIANTES:
Um curso ilustrado sobre a evolução biológica humana
ÍNDICE:
Introdução
Capítulo1: O surgimento do Homo sapiens
Capítulo 2: Homo neanderthalensis
Capítulo 3: Homo sapiens X Homo neanderthalensis: hibridismo
Capítulo 4: Homo floresiensis
Capítulo 5: Homo erectus
Capítulo 6: Gigantopithecus, os maiores primatas de todos os tempos
Capítulo 7: Homo ergaster
Capítulo 8: Homo rudolfensis e Homo habilis
Capítulo 9: O mundo há 2 milhões de anos
Capítulo 10: Outras Espécies do Gênero Homo
Capítulo 11: O Polegar Opositor
Capítulo 12: Importantes Marcos Pré-Históricos
Capítulo 13: O gênero Australopithecus
Capítulo 14: Berço da Humanidade
Capítulo 15: Australopithecus afarensis: um velho conhecido
Capítulo 16: Australopithecus afarensis: outro velho conhecido
Capítulo 17: Australopithecus gahri: quase Homo?
Capítulo 18: Australopithecus sediba: uma descoberta recente
Capítulo 19: Australopithecus anamensis: o mais antigo
Capítulo 20: Curiosidades sobre os Australopithecus
Capítulo 21: Paranthropus: um gênero paralelo aos humanos
Capítulo 22: O início da expansão cerebral
Capítulo 23: Homossexualidade
Capítulo 24: Os grandes antropóides antigos
Capítulo 25: Bipedalismo
Capítulo 26: Parto de um chimpanzé (descrição) em relação ao parto humano
Capítulo 27: Kenyanthropus platyops: um bípede misterioso
Capítulo 28: Por que você não tem rabo?
Capítulo 29: Teorias heterodoxas
APÊNDICES:
1. Lista de espécies humanas e pré-humanas
2. Classificações completas de alguns primatas
3. Algumas observações sobre a classificação dos primatas
4. Sugestões de leitura
5. Sugestões de Livros
6. Para conversar com o autor
Introdução:
A Paleoantropologia estuda, em suma, a evolução das espécies pré-humanas e das
espécies do gênero Homo, incluindo nossa própria espécie: Homo sapiens. A
Paleoantropopologia (“Paleo”, do grego, significa antigo, indicando que se trata do
estudo da Antropologia antiga, ou pré-histórica) é uma junção de ramos científicos
importante: a Paleontologia e a Antropologia. A Paleoantropologia realiza estudos
antropológicos de todas as características físicas, modos de vida, interações sociais
e outros aspectos dos pré-humanos e dos humanos, além das relações de
parentesco entre as espécies.
A Paleontologia é bastante utilizada pelos Paleoantropólogos, como, por exemplo,
quando fósseis de animais pré-históricos auxiliam ou complementam os outros
métodos de datação dos sítios arqueológicos, tendo em vista que é possível saber
em que época determinados paleoanimais viveram.
Fonte das imagens: http://humanorigins.si.edu
A Paleoantropologia também pode valer-se de ciências afins, como a Genética, a
Arqueologia, a Geologia, e muitas outras. Quando são encontrados fósseis
acompanhados de animais pré-históricos e/ou ferramentas e/ou vestígios de
fogueira, por exemplo, é possível fazer uma análise muito mais completa do sítio
arqueológico quando os conhecimentos de todas essas ciências em conjunto forem
utilizados.
Os vestígios de ferramentas são fundamentais e, naturalmente, é possível saber de
que material as mesmas foram feitas. A Geologia informa qual o grau de dureza de
determinado material, se mais maleável como o marfim ou o mármore, ou mais
rígido como o minério de ferro. A Geologia é capaz de fornecer detalhes espantosos
sobre as pedras e rochas, como a idade delas (o que também ajuda na datação dos
fósseis).
Recentemente, a Genética promoveu uma significativa colaboração aos estudos
paleoantropológicos, tendo em vista que foi possível extrair amostras de DNA de
alguns fósseis mais recentes.
No entanto, a principal fonte de conhecimentos da Paleoantropologia são os ossos
fossilizados de humanos e pré-humanos, que, sozinhos, fornecem uma fonte
gigantesca de informações, principalmente a partir dos anos 1990, quando algumas
características não-métricas dos ossos começaram a receber tratamento estatístico
mais elaborado.
Neste curso, serão estudadas cada uma das espécies do nosso gênero (Homo) e
dos gêneros ancestrais, o paleoambiente onde viviam e os caminhos evolutivos
totalmente aleatórios e casuais (mas obedecendo as leis da Evolução) pelos quais
passaram.
Capítulo 1: O surgimento do Homo sapiens
A maioria dos paleoantropólogos acredita que o Homo sapiens surgiu na África (na
parte oriental ou no sul do continente) entre 150.000 e 200.000 anos atrás.
O fóssil mais antigo de Homo sapiens foi apelidado de "Herto", tem entre 150.000 e
160.000 anos de idade, e ainda exibe algumas características arcaicas, como
ligeiras protuberâncias supra-oculares. Essa protuberâncias são um tipo de viseira
óssea sobre os olhos que aparece em todos os hominídeos, exceto nos Homo
sapiens tardios. Sua função, segundo o paleoantropólogo Richard Klein, no livro "O
Despertar da Cultura", seria impedir que a face se partisse em duas com as forças
causadas pelos músculos das mandíbulas durante a mastigação. Nossa testa alta e
escarpada faria as vezes dessa protuberância, distribuindo e absorvendo tais forças.
Aliás, alguns povos atuais, como os aborígines australianos, os pigmeus asiáticos e
alguns povos africanos ainda exibem muitos traços anatômicos primitivos. Os
aborígines ainda possuem resquícios dessa protuberância supra-orbital, além de
alguns outros povos e pessoas isoladas.
Ao longo deste curso, falaremos mais sobre esses aspectos anatômicos.
Apesar de ter surgido há aproximadamente 200 mil anos, apenas há 50.000 anos o
Homo sapiens começou a imprimir aperfeiçoamentos constantes à sua tecnologia,
sendo também nessa época o início do pensamento abstrato e simbólico, conforme
explicou Klein em seu livro “O Despertar da Cultura”.
Alguns autores, inclusive Klein, consideram que houve uma mutação genética que
teria aumentado o número de sinapses cerebrais dos sapiens há 50.000 anos, tendo
em vista que não houve nenhuma alteração física ou morfológica nesse período.
Outros autores defendem que a capacidade de pensamento abstrato surgiu com o
Homo sapiens há quase 200.000 anos, mas apenas há 50.000 anos encontrou
condições de desenvolvimento. Atualmente, há cada vez mais evidências
arqueológicas indicando essa última possibilidade e mais, são encontradas
evidências cada vez mais antigas do pensamento abstrato/simbólico.
Pessoalmente, acredito que o potencial para o pensamento simbólico surgiu com a
nossa espécie e desenvolveu-se mais tarde, quando as condições climáticas na
Terra se mostraram mais favoráveis. Robert Foley, da Universidade de Cambridge, e
autor de vários livros (entre eles: "Os Humanos Antes da Humanidade") também
pensa assim. Ou seja, a partir de 50.000 anos, ou antes, o clima na África (berço da
cultura simbólica) teria permitido um significativo aumento populacional (conforme se
verá adiante), impulsionando também o desenvolvimento cognitivo humano.
Quando surgiu, nossa espécie dividia o planeta com o Homo neanderthalensis, com
o Homo floresiensis, com o Homo erectus e com uma espécie ainda não
identificada, cujo único fóssil é conhecido como "Mulher X". Ao longo do curso,
vamos falar mais sobre essas espécies.
Como vimos, na literatura paleoantropológica há duas hipóteses principais para o
relativamente repentino surgimento da cultura simbólica há 50.000 anos (lembrando
que apenas há 30.000 anos a revolução espalhou-se pelo mundo), a saber:
1ª. O Homo sapiens, quando surgiu, com seu cérebro reconfigurado em relação às
outras espécies Homo, já era capaz de pensamentos simbólicos e de imprimir
constante e acelerado aperfeiçoamento à sua indústria. No entanto, essa
capacidade permaneceu inerte até que o clima da Terra permitiu um aumento
populacional razoável e condições menos duras de sobrevivência;
2ª. Há 50.000, na África, houve uma mutação genética em uma das tribos humanas
que, ao longo dos muitos milênios seguintes, espalhou-se por todas as populações.
Essa mutação conferiu um aumento significativo na quantidade de sinapses ou uma
reconfiguração nos neurônios, permitindo o desenvolvimento de atividades que até
então nenhuma espécie havia alcançado, principalmente o pensamento por meio de
símbolos.
Apesar de a revolução cultural ter ocorrido há tanto tempo, apenas há 6.000 anos
(mais ou menos) proto-civilizações surgiram no planeta, em três pontos separados
do globo (Egito, Mesopotâmia e China). Com elas vieram a agricultura, as cidades,
as profissões, etc. Antes disso, vivíamos como nômades, caçando animas e
coletando frutas, sem muita expressão cultural, em comunidades pequenas e
espalhadas. Alguns autores chegam a afirmar que umas 2.000 pessoas constituíam
toda a espécie humana, e a maioria acredita que éramos, no máximo, 30.000 ou
50.000 indivíduos, divididos em aldeias de mais ou menos 200 habitantes cada.
Veja a gravura abaixo, onde se pode perceber com facilidade a evolução da
população humana ao longo dos últimos 200.000 anos:
Fonte: Revista Veja (edição 2.059, 07/05/2008)
Em seu livro “O Despertar da Cultura” (páginas 195 a 197), Craig Stanford, descreve
da seguinte maneira o grande despertar humano:
"Deixando de lado rótulos e datas precisas, o aspecto
básico é que as populações da Idade da Pedra Posterior e
do Paleolítico Superior [após o despertar] são as primeiras
a que podemos atribuir a capacidade plenamente
moderna de produzir cultura, ou talvez, com maior
precisão, a aptidão completamente moderna de inovar.
Foi com certeza essa capacidade que permitiu que os
povos da Idade da Pedra Posterior e do Paleolítico
Superior se dispersassem à custa dos seus
contemporâneos mais primitivos, começando entre 50.000
e 40.000 anos atrás. As inovações incluíram casas
construídas solidamente, roupas costuradas, fogueiras
mais eficientes e uma nova tecnologia de caça que
permitiu aos Cro-Magnons do Paleolítico Superior
deslocar seus predecessores, ajudando-os também a
colonizar as partes mais continentais e inóspitas da
Eurásia, onde ninguém havia vivido antes."
Não há dúvidas de que o despertar não fez surgir apenas pinturas rupestres, mas
revolucionou o modo de vida dos humanos.
1.1. Teorias sobre o surgimento do Homo sapiens
Existem duas teorias básicas sobre o surgimento do Homo sapiens, que, de forma
resumida, podem ser explicadas assim:
a. Teoria do Berço Africano, também conhecida como "Out of Africa" (África para
fora) ou Arca de Noé;
b. Teoria Multirregional, também conhecida por "Candelabro".
A primeira teoria, mais aceita atualmente, dispõe que os primeiros Homo sapiens
surgiram na África, provavelmente na África Oriental (ou no sul do continente) e, de
lá, se espalharam pelo Oriente Médio, Ásia, Oceania, Europa e Américas (nessa
ordem). Além de muitos fósseis darem a entender que essa teoria está correta,
agora a Genética também a corrobora. Estudos genéticos apontam claramente a
África como origem de todos os humanos atuais.
Primeiro os fósseis: na África, foram encontrados diversos fósseis que indicam
claramente a tendência evolutiva em direção ao Homo sapiens. O Homo erectus
africano, conhecido como Homo ergaster (homem trabalhador, em latim) possui uma
morfologia muito mais parecida com a nossa do que o Homo erectus da Ásia. Aliás,
muitos paleoantropólogos, como G. J. Sawyer e Victor Deak, autores de "The Last
Human – A Guide to Twenty-Two Species of Extinct Human" (um dos livros mais
atuais sobre o tema, ainda sem edição em português) e também Richard Klein,
defendem a existência de 2 espécies de Homo erectus asiáticos, a encontrada na
China e a outra da Indonésia. Realmente há diferenças pequenas entre as duas
morfologias, principalmente no formato da parte superior do crânio.
Os fósseis mostram que o Homo ergaster é o mais provável ancestral humano,
anterior ao Homo heidelbergensis. Além disso, formas claramente ancestrais, como
o Homo heidelbergensis (homem de Heidelberg, uma cidade alemã) e o Homo
sapiens idaltu (idaltu significa mais antigo, em uma língua africana da região de Afar,
também conhecido como “Herto”, descobertos por Tim White em 2003), são
encontrados na Europa e África, respectivamente. Tais fósseis demonstram que o
Homo sapiens desenvolveu-se paralelamente ao Homo neanderthalensis e
distinguiu-se das outras espécies enquanto estava em seu berço africano.
A Genética também confirma a origem africana, baseada em análises do DNA
mitocondrial e no próprio DNA nuclear. Sobre esse aspecto, para maiores
informações, sugiro o livro "Genes, Povos e Línguas" de Cavalli-Sforza, um grande
especialista no assunto.
Em relação à teoria multirregional: seus defensores acreditam que o Homo sapiens
surgiu concomitantemente na África e na Ásia (e talvez em outras regiões como a
Oceania e Europa). Argumentam, dentre outras coisas, que um surgimento isolado
na África dependeria de uma ampla substituição posterior de espécies. Ou seja, o
Homo sapiens teria que substituir, inteiramente, os Neandertais na Europa e o Homo
erectus na Ásia e na Oceania, o que seria difícil de ocorrer. Para isso, deveria haver
uma constante troca de genes entre as populações para manter todas elas unidas
em uma mesma espécie.
Essa teoria, hoje em dia, está sofrendo severos ataques, principalmente oriundos da
Genética. É que todas as diferenças étnicas são causadas por mutações genéticas
recentes na história evolutiva, indicando que as mesmas ocorreram muito tempo
depois do surgimento da espécie.
Há cada vez mais indícios de que o Homo sapiens hibridizou-se (em pequena
escala) com populações nativas de outras espécies humanas (como o Homo
neanderthalensis) em diversas partes do mundo. Mas isso não é suficiente para
fortalecer a hipótese multirregional.
1.2. Questões interessantes sobre o gênero humano:
1.2.1. Alguma outra espécie de humanos conseguiu desenvolver a cultura
abstrata/simbólica?
O único humano, além dos Homo sapiens, de que se tem alguma evidência de uma
mudança cultural foi o Homem de Neandertal. Esse humano experimentou, por 270
mil anos, a cultura Mousteriense e, só então, vivenciou as culturas
Chatelperronense, Aurignaciana, e Gravettiana, possivelmente através de contatos
com o Homo sapiens. Atualmente, há evidências de que os Homo neanderthalensis
tardios conseguiram, sem a ajuda dos Homo sapiens, aperfeiçoar sua tecnologia de
fabricação de ferramentas (Livro “O Colar do Neandertal” – ver referências no final).
1.2.2. Por que o Homo sapiens demorou tanto para desenvolver sua civilização?
Na Era do Gelo havia caça abundante. Bastava que as populações acompanhassem
as manadas em movimento para ter comida fácil. Depois, a megafauna
desapareceu, junto com as contínuas e vastas estepes eurasianas e americanas.
Tornou-se necessário permanecer próximo a vales de rios ou à beira do mar,
tentando aprender a produzir alimento, que deixou de ser fácil de obter. E fazer isso
só era possível se os humanos se agrupassem em sociedades maiores, divididas
por categorias ou classes, dedicando-se, cada uma, a funções especializadas.
1.2.3. Até quando o Homo sapiens conviveu com os outros humanos?
Até mais ou menos 16 mil anos atrás, na Ilha de Flores (atual Indonésia), ainda
havia Homo floresiensis. Até hoje, há lendas nativas sobre a existência de seres
conhecidos como “Ebu Gogo”, na ilha. Houve também uma convivência com os
Neandertais, principalmente na Europa e no Oriente Médio até uns 30.000 anos
atrás. Além disso, há evidências de convivência com os Homo erectus, na Ásia, até
uns 45.000 anos atrás. Adiante, estudaremos mais sobre tais espécies.
1.2.4. É verdade que o povo basco pode ser descendente direto dos Cro-Magnon?
Essa informação pode ser encontrada no livro "Genes, Povos de Línguas" de Luigi
Luca Cavalli-Sforza. É mesmo possível que os atuais bascos, que hoje habitam o
norte da Espanha e o sul da França, possam ser descentes dos primeiros Homo
sapiens que habitaram a Europa, conhecidos como Cro-Magnons. Sforza baseou-se
em evidências genéticas e protéicas, e também na língua falada por eles. É um
estudo muito interessante.
1.2.5. Por que alguns fósseis humanos antigos são chamados de Cro-Magnon?
Os primeiros Homo sapiens já se dividiam em etnias. Além dos Cro-Magnons, temos
os Grimaldi (de características negróides), os Chancelade (parecidos com os CroMagnons, porém mais baixos) e muitas outras. Além disso, alguns autores
subdividem nossa espécie em subespécies: Homo sapiens pressapiens, Homo
sapiens fossilis (divididos em Cro-Magnons e outras etnias já citadas), Homo
sapiens idaltu, etc.
1.2.6. Quanto maior o cérebro, mais inteligente é a espécie?
O volume cerebral não é, por si só, um bom indicador de inteligência. Se não fosse
assim, as baleias, com cérebros de 30kg seriam imbatíveis no xadrez. Nem mesmo
o tamanho relativo do cérebro é um indicador confiável, porque os ratos, por exemplo, têm um cérebro maior do que o nosso, em termos relativos (em relação ao tamanho do corpo). Tampouco podemos considerar o índice de encefalização como
um indicador confiável. Esse índice mede o tamanho esperado do cérebro em relação ao corpo, mas não leva em consideração aspectos da arquitetura cerebral. Vale
a configuração do encéfalo: o número de neurônios, o número de sinapses e a forma
como estão distribuídos nas diversas regiões encefálicas. O autor Robert Foley, em
seu livro "Os Humanos Antes da Humanidade", páginas 202 e seguintes, discorre à
exaustão sobre isso.
A comparação de cérebros é algo muito complexo, mesmo se compararmos
indivíduos de uma mesma espécie. Pessoas com cérebros pequenos, como Santos
Dumont, podem ser gênios com intelecto muito poderoso e outras, com grandes
cérebros, podem ser medianamente inteligentes. A inteligência pode assumir muitas
manifestações (inteligência emocional, esportiva, matemática, etc.), o que complica
ainda mais as comparações.
O que é necessário ficar claro é que a inteligência não está diretamente relacionada
ao tamanho do cérebro. Fatores como a arquitetura cerebral são importantes. Por
exemplo: os Neandertais tinham um cérebro maior do que o nosso, mas o córtex
frontal deles era menos desenvolvido. O cérebro deles era voltado para trás e não
para cima, como o nosso. Outro exemplo: os Australopithecus tinham um cérebro
um pouco maior do que o de um chimpanzé atual, no entanto, esse último tem um
corpo mais volumoso, o que dá a entender que o índice de encefalização
australopitecíneo era bem maior.
Mamíferos, em geral, têm cérebros maiores e mais desenvolvidos. No entanto,
dentre os mamíferos, os primatas são imbatíveis quanto ao número de neurônios por
massa encefálica. Comparando, por exemplo, uma capivara e um macaco de
tamanho semelhante, pode-se identificar, claramente, um volume encefálico
aproximado entre essas espécies, porém uma enorme diferença no número de
neurônios.
Fonte: http://www.suzanaherculanohouzel.com/herculano-houzel-et-al-2007-pn
Isso se deve, em parte, à longa história de vida em grupo dos primatas, o que gera
interações complexas entre os indivíduos. Outras explicações aceitas são
relacionadas à busca por comida, a necessidade de fugir de muitos predadores, etc.
1.2.7. Quais as principais forças evolutivas? O que leva ao surgimento de novas
espécies ou a extinção de espécies antigas?
Vejam o que nos informa o livro “Genes, Povos e Línguas” (página 65):
"Desde os primórdios da genética moderna, quatro forças
evolutivas foram identificadas: a mutação, que produz
novos tipos genéticos; a seleção natural, o mecanismo
que seleciona automaticamente os tipos mutados mais
bem adaptados a determinado ambiente; a deriva
genética, que consiste na oscilação aleatória das
freqüências gênicas em populações; e a migração, às
vezes chamada de fluxo gênico. A deriva genética é a
mais abstrata delas, embora nada mais seja do que a
oscilação aleatória da freqüência gênica ao longo de
várias gerações."
Fatores como mudanças climáticas, que alteram o ambiente ao qual a espécie está
adaptada, também são importantes motores evolutivos. Outros fatores como as
mudanças nas placas tectônicas (que alteram o tamanho e a configuração dos
continentes), ciclos climáticos do planeta, interações entre espécies diferentes, e
outros, também contribuem significativamente na evolução e extinção das espécies.
O livro “Human Evolution: An Illustrated Introduction” discute à exaustão todos os
motores da evolução e da extinção. Na verdade, pequenas variações topográficas
que podem isolar membros de uma espécie podem levar ao surgimento de uma
nova espécie (especiação).
1.3. Outras Informações Importantes sobre o Surgimento do Homo sapiens
As informações abaixo foram retiradas e compiladas do livro "The Last Human", pelo
Dr. Fernando Bilharinho:
“1. O nome Homo sapiens apareceu pela primeira vez na
décima edição de Systemae Naturae de Carl Linnaeus
publicada em 1758;
2. Não existe consenso sobre o que é um Homo sapiens
moderno. Os mais antigos fósseis indubitavelmente
creditados como Homo sapiens moderno datam de 94 mil
AP (Antes do Presente) e foram encontrados em Israel.
Há muitos fósseis que apresentam pequenas variações
que devem ser consideradas aceitas dentro de uma
espécie. Mesmo entre Homo sapiens atuais, há
diferenças importantes: os !Kung San (o ponto de
exclamação no início do nome indica que o leitor deve
estalar a língua nos dentes) da Namíbia, por exemplo,
não possuem um queixo considerado moderno. Assim,
ampliando o espectro, podemos chegar a Homo sapiens
modernos já há 260 mil anos na África do Sul e 270 mil
anos no Quênia.
3. A tendência atual é considerar o Homo sapiens como
descendente do Homo heidelbergensis. Como o
heidelbergensis é muito mais parecido com o
neanderthalensis do que conosco, é provável que o Homo
sapiens primitivo, ou outro nome que venha a receber,
tenha surgido a partir dessa espécie há 600 mil anos."
Acrescento a seguinte informação: o autor Craig Stanford, autor do livro "O
Despertar da Cultura", também argumenta, na página 181 do livro supracitado, que
até mesmo os aborígines australianos têm supercílios relativamente salientes o que,
a rigor, é um detalhe não moderno de suas anatomias. Concluindo, o autor afirma
que a modernidade anatômica do Homo sapiens ainda é uma questão polêmica
dentro da Paleoantropologia. É possível reduzi-la a tal ponto que teríamos que
excluir alguns povos atuais (!), ou ampliá-la a tal ponto que poderíamos até incluir os
Neandertais nessa classificação (!).
Cor da pele do Homo sapiens (distribuição geográfica original)
1.4. Ilustrações para estudo:
Percebam nas figuras, especialmente, os seguintes detalhes anatômicos:
a. Protuberância supra-ocular;
b. Presença ou ausência do queixo (neanderthalensis não tinham queixo);
c. Formato do crânio (testa baixa e recuada dos neandertais; e alta e escarpada nos
sapiens).
Homo sapiens idaltu (Photo © 2001 David L. Brill Brill Atlanta)
Capítulo 2: Homo neanderthalensis
Há apenas 30.000 anos, Neandertais ainda perambulavam pela Europa. Seu último
refúgio foi a Península Ibérica, mas, no auge, o povo neandertal ocupou quase toda
a Europa, grande parte do Oriente Médio (principalmente nas imediações de Israel)
e também grande parte do restante da Ásia.
Os fósseis dessa espécie são encontrados desde o século XIX, e, hoje, são milhares
já catalogados, alguns em excelente estado de conservação, sendo possível,
inclusive, estudar seu genoma, que já foi quase inteiramente mapeado. Os primeiros
fósseis foram encontrados no vale do rio Neander, na Alemanha, daí a origem do
nome. Em alemão, Neanderthal escrevia-se com "th", hoje, após reformas, escrevese "Neandertal", com o "h" abolido. No entanto, o nome da espécie latinizado
mantém o "th", sendo que as duas formas são aceitas hoje em dia para se referir
coloquialmente à espécie.
O Homo neanderthalensis é a espécie humana mais bem conhecida, além da nossa,
é claro. Existe uma ampla literatura específica sobre o tema. Sugiro, para o leigo que
desejar conhecer um pouco mais sobre o assunto, a leitura do livro "O Colar do
Neandertal", escrito por Juan Luis Arsuaga, espanhol, especialista em Neandertais.
Homo neanderthalensis (Fonte: Coleção de Thomas van deer Laan – Laboratório de Estudos Evolutivos Humanos da USP)
2.1. Convivendo com Neandertais:
Com toda certeza, os primeiros sapiens a chegarem aos domínios neandertais,
principalmente no Oriente Médio e sul da Europa, mantiveram um contato profundo
com eles. Os paleoantropólogos já aceitavam a existência de troca cultural, tendo
em vista que a cultura neandertal, conhecida como Mousteriense, aparentemente
pode ter sofrido influência das primeiras culturas sapiens (principalmente a
Chatelperronense). É bom que tenhamos uma pequena noção sobre essas culturas
antigas. Vejam o resumo abaixo, retirado da Wikipedia:
"Esta cultura técnica, atribuída aos Neandertais,
designada como Mousteriense, consistia na produção de
ferramentas de pedra lascada produzidas através do
desbastamento em leque de um bloco lítico inicial (ou
núcleo), de que se formavam lascas a partir das quais se
encadeava a produção de instrumentos diversos, como
machados manuais para tarefas específicas, bifaces,
raspadeiras, furadores e lanças. Muitas dessas
ferramentas eram bastante afiadas. No Paleolítico
Superior desenvolveram uma cultura material mais
evoluída
de
talhe
da
pedra,
designada
de
Chatelperronense, caracterizada pelo desdobramento do
núcleo lítico em peças menores e mais manuseáveis."
(Fonte: Wikipedia.com)
A tecnologia Mousteriense produzia cerca de 20 tipos diferentes de ferramentas,
como machados de mão. A Chatelperronense produzia mais de 60 tipos de
ferramentas, com um acabamento ligeiramente superior. É possível que essa
superioridade tecnológica do Homo sapiens tenha contribuído para a extinção dos
Neandertais.
No entanto, as últimas descobertas genéticas, conduzidas pelo geneticista sueco
Svant Päabo, indicam o que muitos já esperavam: houve cruzamentos entre as
espécies sapiens e neanderthalensis, e isso ficou marcado no genoma de nossa
espécie até hoje. Porém, tais cruzamentos foram raros, como se verá adiante.
2.2. A aparência dos Neandertais:
Os Neandertais tinham um corpo muito adaptado a climas frios, por isso eram mais
largos e mais baixos, em média, do que os sapiens arcaicos, que evoluíram em
regiões quentes da África.
Fonte: Jornal Folha de São Paulo
Outras diferenças anatômicas poderiam ser facilmente notadas: ausência de queixo,
testa baixa, crânio voltado para trás, pernas arqueadas, dedos grossos e fortes,
músculos muito desenvolvidos, espaço retromolar (espaço entre o último dente
molar e a mandíbula), rosto projetado para frente, cérebro relativamente maior, que
poderia atingir 1.700 centímetros cúbicos (os sapiens têm, em média, 1.400 cm3), e
algumas outras pequenas diferenças.
A figura abaixo foi retirada do livro “O Despertar da Cultura” de Richard G. Klein e
Blake Edgar (figura 6.4). Segundo os autores, a ilustração foi desenhada por Kathryn
Cruz-Uribe a partir de modelos:
2.3. Curiosidades sobre os Neandertais:
2.3.1. Por terem evoluído em um clima muito frio, durante o Pleistoceno europeu, a
pele deles certamente era muito clara e, segundo indícios fósseis, seus cabelos,
quase sempre eram ruivos.
2.3.2. Alguns grupos étnicos atuais de Homo sapiens têm características
semelhantes aos Neandertais. Por exemplo: os inuítes (que não gostam de ser
chamados de "esquimós", termo considerado pejorativo por eles) também têm
corpos muito robustos e atarracados, porque residem há milênios em terras muito
frias. Os aborígines australianos, como já dito aqui, têm pequenas protuberâncias
supra oculares e, aliás, apesar de negros, são os povos mais distantes
geneticamente dos africanos. A cor da pele deles convergiu para negra após nova
adaptação ao ambiente da Oceania.
2.3.3. Estudando os ossos da boca, principalmente o hióide, é possível concluir que,
se os Neandertais falavam, a voz deles deveria ser extremamente anasalada,
gutural e seccionada. Alguns pesquisadores simularam a voz dos Neandertais e
disponibilizaram isso
na
internet:
http://www.acemprol.com/viewtopic.php?
f=16&t=245.
Fonte: Jornal Folha de São Paulo
2.4. Extinção dos Neandertais:
Quase todas as hipóteses sobre a extinção dos Neandertais passam pela
competição com os sapiens, que, além de possuírem uma tecnologia superior, eram
capazes de raciocínios estratégicos sofisticados (como, por exemplo, criar táticas de
guerra).
Juan Luis Arsuaga, em seu livro "O Colar do Neandertal", desenvolveu uma teoria
muito interessante e complexa, para explicar a extinção dessa espécie. Baseado em
vários sítios fósseis em que foram encontrados grupos inteiros de indivíduos, o autor
conclui que a média de vida dos Neandertais era menor do que a dos primeiros
sapiens (por causa de seu estilo de vida baseado na caça de grandes animais, o
que era perigoso) e, além disso, o índice de natalidade da espécie era também
menor. Com isso, o crescimento da população era muito pequeno e bastou o contato
com os sapiens (que trouxeram novas doenças e novas mortes em combate) para
que esse delicado equilíbrio fosse rompido. Em um curto espaço de tempo,
provavelmente 20.000 anos, todos os Neandertais foram eliminados.
2.5. Questões interessantes sobre os Neandertais:
2.5.1. Por que a baixa estatura e a robustez são adaptações a ambientes frios? Em
que tais características ajudam?
Essas características ajudam na conservação do calor dentro do corpo. Um corpo
mais largo, mais robusto, com mais gordura, naturalmente retém mais o calor. É que,
nesse caso, o corpo se aproxima do formato de uma esfera, que é o sólido que
possui a menor área de superfície em relação ao seu volume. Um corpo magro e
esguio, como o dos africanos equatoriais, tende a reter menos calor, facilitando a
sobrevivência em ambientes quentes, tendo em vista que têm uma maior área de
pele, em relação ao volume do corpo.
2.5.2- O contato com os Neandertais deixou alguma marca na cultura sapiens?
Algum aspecto, atividade ou tecnologia foram estimulados ou desestimulados por
esse contato?
O contato, como demonstraram as últimas pesquisas, deixou marcas no genoma
dos povos não-africanos. Em termos culturais, é possível afirmar que a cultura
neandertal, conhecida como Mousteriense, muito provavelmente sofreu influência de
uma das primeiras culturas dos sapiens, conhecidas como Acheuliana ou
Chatelperronense. Após os contatos, os artefatos Mousterienses passaram a ter um
refinamento parecido com os da indústria Acheuliana. Atualmente, há pesquisadores
que criticam esse raciocínio, indicando evidências de que a cultura neandertal
desenvolveu-se sozinha.
Portanto, a maioria das evidências indicam que, se houve troca de tecnologia, foram
os sapiens que a transferiu para os Neandertais.
2.5.3. Qual foi a motivação para essas grandes migrações de sapiens rumo aos
territórios neandertais? Busca de novos recursos?
Os sapiens, segundo as últimas pesquisas, surgiram na África. Os Neandertais
surgiram no Oriente Médio ou na Europa. Para sair da África em direção a outras
paragens, era obrigatório para os sapiens atravessar os domínios dos Neandertais,
no Oriente Médio. Portanto, o contato foi inevitável.
Como os primeiros sapiens viviam da caça e da coleta, à medida que a população
crescia (e crescia muitíssimo devagar) e à medida que os recursos iam se
escasseando, a colonização de outros continentes tornou-se imperiosa. Além disso,
muitas vezes, os primeiros sapiens pareciam ampliar seus domínios por mera
curiosidade, atingindo até o sul da América do Sul e mais, se houvesse mais. Parece
que eles queriam ver o que havia atrás da próxima montanha, como afirmou o Dr.
Walter Alves Neves em seu livro “O Povo de Luzia”.
2.6. A proximidade genética entre sapiens, Neandertais e chimpanzés:
A diferença entre o DNA humano e o DNA do chimpanzé pode variar de 4% a 1%,
dependendo do trecho do DNA em comparação. Comparar DNAs é uma tarefa
muitíssimo complicada. Apesar de termos apenas uns 25.000 genes (antes
pensávamos que eram uns 100.000: grande engano!), temos bilhões de pares de
bases de nucleotídeos que não codificam genes e podem ser igualmente relevantes.
A tarefa mais complicada é sequenciá-los (deve-se sequenciar uma hélice da
molécula para sabermos com exatidão a composição da outra hélice; a hélice do
DNA tem 4 tipos de nucleotídeos que se combinam aos pares entre eles), depois
separar os que formam genes dos que não formam (essas sequências que não
forma genes, que antes se pensava que eram uma espécie de lixo genético, são
muito importantes no funcionamento dos próprios genes), depois montar os
cromossomos.
Além dos chimpanzés terem menos cromossomos (o que eu entendo como uma
diferença mais significativa do que ter 1 ou 4% dos genes diferentes, porque dificulta
severamente uma tentativa de cruzamento entre as espécies, sendo esse um dos
motivos das falhas nas controvertidas tentativas), esse "de 1% a 4%" de diferenças
está concentrado em genes importantes de formação cerebral, fala, morfologia do
punho, etc.
No caso dos Neandertais, a situação é bem diferente! O pesquisador sueco Svant
Pääbo, que sequenciou os genes dos Neandertais, comparou o genoma neandertal
com o genoma humano e com o genoma dos chimpanzés. Segundo ele, a diferença
encontrada entre os sapiens e os Neandertais é semelhante à de um homem atual e
seu próprio tataravô (apesar do tataravô estar muito mais próximo de nós do que um
Neandertal há 80.000 anos). Muitos seres humanos atuais têm Nandertais como um
de seus antepassados e isso foi encontrado baseado em rastros genéticos. "Em
vários casos, quando há uma diferença entre o genoma de um africano e o de um
não-africano, a versão das populações que não são originárias da África bate com a
dos Neandertais", diz Pääbo. "O único jeito de explicar esses dados é por
cruzamento", continua.
Note, portanto, que os genes neandertais estão concentrados na parte diferente do
genoma dos africanos em relação aos não-africanos. E qual seria essa parte
diferente: questões de imunidade, cor da pele, etc. Por que isso ocorre? Simples: o
DNA do Neandertal era muito parecido com o nosso DNA, porque nosso ancestral
comum viveu há apenas 600.000 anos.
É interessante notar também que não foram encontradas marcas neandertais no
DNA mitocondrial humano. Esse tipo de DNA (mitocondrial) é originário apenas da
mãe, sem sofrer o cruzamento com o DNA paterno, da mesma forma que todo o
cromossomo Y é recebido apenas pelos pais. Svant Pääbo decifrou o Genoma
nuclear dos Neandertais. O DNA mitocondrial deles já era conhecido.
A ausência de genes neandertais em nosso DNA mitocondrial pode indicar que os
cruzamentos entre homens neandertais e mulheres sapiens tiveram mais sucesso.
Pode ser que os cruzamentos entre homens sapiens e mulheres neandertais não
tenham gerado descendentes ou que os descendentes gerados não tenham sido
férteis. Sabe-se que, em uma invasão, os homens invasores tendem a raptar as
mulheres dos povos invadidos. Nesse caso, seria muito mais provável que os
cruzamentos interespécies tenham ocorrido entre homens sapiens e mulheres
neandertais, sem deixar descendentes. Esse fato poderia explicar o fato a
baixíssima incidência de genes neandertais nos povos não africanos, tendo em vista
que teriam que ser originários de cruzamentos entre homens neandertais e mulheres
sapiens.
O leitor poderá visualizar melhor essa situação, por meio da ilustração abaixo.
Ilustração: Paulo Mason
É necessário, no entanto, explicar outro aspecto: Uma coisa é você dizer que de 1 a
4% dos genes de pessoas não-africanas são oriundos de Neandertais. Esses genes
são oriundos de uma espécie-irmã. Os Neandertais eram tão diferentes dos
chimpanzés quanto nós. Outra coisa é afirmar que temos de 1 a 4% de diferenças
genéticas em relação aos chimpanzés.
Pensemos da seguinte forma: é preferível ter 4% dos genes oriundos de
Neandertais do que 4% de genes oriundos dos chimpanzés. E, é bom frisar, não
temos genes oriundos dos chimpanzés. Ou seja, após a separação das espécies,
não houve cruzamentos posteriores, como ocorreu entre os sapiens e os
Neandertais.
Ou seja, após a separação com os chimpanzés, há 6.000.000 anos, nossos
ancestrais e os ancestrais dos Neandertais pararam de receber genes oriundos dos
ancestrais dos chimpanzés e vice-versa. Começou então a saga diferenciadora das
espécies, atingindo até 4% do DNA humano atual, em relação ao DNA chimpanzé.
Fonte: Livro “Eu, Primata”
Ocorre que há 600.000 anos, começou outra saga diferenciadora, entre humanos e
Neandertais. No entanto, esse período de tempo é muito curto para criar grandes
diferenças genéticas, mas é suficiente para gerar genes específicos em cada
espécie. Então, há 80.000 anos, as duas espécies voltam a se encontrar e tais
genes específicos são trocados, em uma proporção de 1 a 4%.
É importante termos em mente que, quando duas espécies se divergem, elas
continuam compatíveis/intercruzantes durante algum tempo, até que as diferenças
genéticas sejam significativas, principalmente em termos cromossômicos. Hoje em
dia, por exemplo, o principal impedimento de cruzamentos férteis entre chimpanzés
e sapiens é a diferença no número de cromossomos.
Comparação de pés e mãos dos primatas, inclusive o homem, um grande macaco, segundo Prof. Dr. Walter Alves Neves.
Capítulo 3: Homo sapiens X Homo neanderthalensis: hibridismo
Muito recentemente, comprovou-se, após mapeamento do genoma do Homo
neanderthalensis, que o Homo sapiens possui de 1% a 4% de seu genoma
semelhante ao genoma neandertal. No entanto, isso só ocorre em povos não
africanos, indicando que os Homo sapiens que saíram da África e encontraram-se
com os Neandertais (que viviam no Oriente Médio e na Europa) cruzaram-se! Tais
cruzamentos, no entanto, foram relativamente raros.
Homo sapiens x Homo neanderthalensis (Por hairymuseummatt)
Vale lembrar que nosso ancestral comum com o Homo neanderthalensis, conhecido
como Homo heidelbergensis, viveu há mais ou menos 600.000 anos e, portanto, é
natural que mantivéssemos o potencial intercruzante, apesar de sermos espécies
separadas.
A título de ilustração, informo (baseado no livro "Eu, Primata", de Frans de Waal)
que os chimpanzés (Pan troglodytes) e os bonobos ou chimpanzés pigmeus (Pan
paniscus) tiveram um ancestral comum que viveu há nada menos do que 2,5
milhões de anos e ainda hoje as duas espécies são potencialmente intercruzantes.
O mesmo ocorre com as duas espécies de gorilas e as duas espécies de
orangotangos. Ou seja, primatas e muitos outros mamíferos têm essa característica,
mantém a capacidade de intercruzarem-se, mesmo após milhões de anos de
especiação.
Sobre os híbridos entre chimpanzés e bonobos, infelizmente, há poucos relatos
científicos sobre eles porque nenhum zoológico poderia promover o cruzamento
entre duas espécies sob risco de extinção. Veja o que afirma o autor Frans de Waal
no livro supracitado:
"Pouco sabemos sobre o comportamento de híbridos reais,
mas eles são biologicamente possíveis e existem de fato.
Nenhum
zoológico
que
se
preze
promoveria
intencionalmente o cruzamento de dois primatas
ameaçados de extinção, mas existe um relato sobre um
pequeno circo itinerante francês que possui grandes
primatas com vozes curiosas. Pensava-se que eram
chimpanzés, só que para os ouvidos dos especialistas seus
chamados são tão agudos quanto os dos bonobos.
Acontece que o circo, sem saber, adquiriu tempos atrás um
macho bonobo, batizado de Congo. O treinador logo notou
o insaciável apetite sexual desse macho, e o explorou
recompensando os melhores desempenhos de Congo no
picadeiro com encontros com fêmeas primatas do circo,
todas chimpanzés. A prole resultante — que talvez
pudéssemos chamar de "bonanzés" ou "chimpobos" —
anda ereta com notável facilidade e causa admiração por
sua brandura e sensibilidade." (página 290).
Capítulo 4: Homo floresiensis
Em nossa árvore evolutiva, o Homo floresiensis foi a última espécie de nosso gênero
a ser extinta. Essa espécie foi descoberta recentemente na ilha de Flores, na
Indonésia (daí o seu nome). Os fósseis têm entre 12.000 e 74.000 anos de idade, ou
seja, essa espécie quase atingiu períodos históricos!
Homo floresiensis – comparação de altura (fonte: Jornal Folha de São Paulo)
O Homo floresiensis era baixo, apenas 1 metro de altura quando adultos (como uma
criança sapiens de 3 anos de idade). A título de comparação, os pigmeus africanos
atingem até 1,50m. A altura reduzida pode ser resultado de um processo de
redução, conhecido como nanismo das ilhas. Espécies maiores que um coelho
tendem a ficar menores. Espécies menores que um coelho tendem a crescer. Por
meio de fósseis, é possível comprovar a existência de elefantes pigmeus e ratos
gigantescos em Flores, que foram extintos. Os pequenos elefantes eram inclusive
caçados pelos floresiensis, conforme comprovam os fósseis encontrados.
O Homo sapiens colonizou a ilha entre 35.000 e 55.000 anos atrás e, portanto, com
certeza, conviveu com os floresiensis por milhares de anos. Ainda hoje há relatos de
seres estranhos na ilha de Flores, conhecidos como “Ebu Gogo” (o leitor poderá ler
mais sobre isso na internet: http://en.wikipedia.org/wiki/Ebu_Gogo ou, em português:
http://www.fernandosantiago.com.br/anaohom.htm ).
Homo floresiensis X Homo sapiens (Fonte: http://www.talkorigins.org/faqs/homs/flores.html)
Foram encontradas ferramentas produzidas no estilo da tecnologia de Olduvai
(pedra lascada) produzidas pelo Homo floresiensis, em estilo parecido com as
ferramentas produzidas pelo Homo erectus clássico da Indonésia.
Homo floresiensis – cérebro – comparação
O tamanho reduzido do crânio (abaixo dos 400 centímetros cúbicos), menores que
os crânios do gênero Pan, dos chimpanzés e bonobos, e outros detalhes anatômicos
só encontrados nos Australopithecus, levaram muitos paleoantropólogos à dúvida:
seriam os floresiensis realmente pertencentes ao gênero Homo? Muitos cientistas
duvidam e alguns chegam a sugerir um gênero novo para a espécie. De qualquer
forma, o Homo floresiensis parece ser uma espécie cujo ancestral comum conosco
deve remontar, certamente, há tempos muito remotos, talvez superiores há 1 milhão
de anos. Atualmente, considera-se o floresiensis uma espécie descendente das
formas antigas do Homo erectus asiático. No entanto, não se sabe ao certo a
posição do mesmo em nossa árvore genealógica. Detalhes como a anatomia dos
pés e das mãos sugerem um ligação estreita com os Australopithecus, que
extinguiram-se há nada menos do que 2,5 milhões de anos.
Homo floresiensis (crânio). Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Homo_floresiensis.jpg
Apesar disso e do tamanho reduzido do crânio, a forma e o molde interno do mesmo
(que revela as curvaturas do tecido mole cerebral) indicam claramente uma
morfologia do gênero Homo. Além disso, as ferramentas encontradas vinculadas aos
fósseis indicam um nível de inteligência comparável à do Homo erectus (cujo crânio
alcançava 1.000 centímetros cúbicos - o Homo sapiens tem uma média de 1.400
centímetros cúbicos de volume cerebral). Tudo isso fortalece a teoria de eles
também pertenciam ao gênero Homo. Espera-se para os próximos anos que o
Instituo alemão Max Planck consiga codificar o DNA do Homo floresiensis. Eles
conseguiram extrair uma amostra de um dente molar. Com esse DNA codificado,
teremos como saber a origem deles.
Mais informações em: http://afarensis99.wordpress.com/2011/01/06/ancient-dnafrom-homo-floresiensis-redux/
4.1. Efeito Ilha
A imagem abaixo ilustra perfeitamente o efeito ilha. O Homo floresiensis, até o
momento, é o único hominídeo que parece ter passado por esse efeito de redução.
No caso de criaturas maiores que um coelho, a redução ocorre para garantir a
sobrevivência com menos alimento, tendo em vista os recursos reduzidos de uma
ilha. No caso de criaturas menores, como o rato, por exemplo, o aumento de
tamanho ocorre pelo mesmo motivo. É que existe uma proporção entre a área da
pele e o volume corporal que garante uma melhor retenção do calor e da energia.
Animais muito pequenos acabam tendo um área externa de pele muito grande em
relação ao volume de todo o corpo, o que acarreta uma perda excessiva de calor.
Feito Ilha. Fonte: Revista Scientific American Brasil
Capítulo 5: Homo erectus
O Homo erectus, homem ereto, inicialmente conhecimento como Pithecanthropus
erectus, é uma das mais complexas e duradouras espécies do gênero Homo. Há
fosseis que podem ter quase 2 milhões de anos, mas a maioria dos pesquisadores
acredita que o Homo erectus surgiu há mais ou menos 1,5 milhão de anos. Seu
ancestral direto e comum com os sapiens pode ser o Homo habilis ou outra espécie
ainda não identificada.
Fonte: http://historiacolegiao.files.wordpress.com/2010/03/homo_erectus_72dpi1.jpg
Richard Klein, Arsuaga e muitos outros paleoantropólogos consideram o Homo
ergaster (uma espécie de Homo erectus africano, mais antigo) o ancestral direto do
H. erectus, sendo o H. habilis, o ancestral do H. ergaster.
O Homo erectus, depois dos Neandertais, é a espécie mais conhecida e estudada.
Na Paleoantropologia há esqueletos quase completos dessa espécie, quase tão
completos quanto os esqueletos de Neandertais e dos Australopithecus. Os fósseis
de erectus vêm sendo estudados desde o final do século XIX e milhares já foram
encontrados. Só na ilha de Java foram encontrados quase 30.000 fósseis!
Em seu auge, o Homo erectus dominou quase toda a Ásia e muitas ilhas da
Oceania.
5.1. Homo erectus – complexidade
Os autores Klein e Blake Edgar encontraram pequenas diferenças nos crânios do
Homo erectus clássico da Indonésia e do Homo erectus clássico da China. Tais
diferenças, apesar de discretas, são perceptíveis até para um leigo. A principal
diferença está na testa. No erectus da Indonésia, a testa é mais baixa e recuada, no
chinês, a testa também é recuada, mas ligeiramente mais alta. Os outros detalhes
anatômicos são muito parecidos: grande arcada supraciliar em forma de saia,
curvatura craniana baixa e comprida para trás, ausência de queixo, mandíbulas
projetadas para frente e parte posterior do crânio composta de dois planos
encontrando-se em ângulo. Portanto, é possível que os fósseis que hoje são todos
classificados como Homo erectus sejam, na verdade, fósseis de duas ou mais
espécies distintas, porém, próximas.
A figura da próxima página foi retirada do livro “O Despertar da Cultura” de Richard
G. Klein e Blake Edgar (figura 4.8). Segundo os autores a ilustração foi redesenhada
parcialmente por Kathryn Cruz-Uribe a partir de originais de Janies Cirulis, in W. W.
Howels, Mankind in the Making, Nova York, Doublebay, 1997, pag. 156 a 159.
5.2. Homo erectus - aparência e tecnologia
O corpo do Homo erectus era quase tão moderno quanto o nosso. Praticamente a
mesma altura, as mesmas proporções corporais, poucos pêlos no corpo. No entanto,
o crânio era muito diferente. Com um volume craniano que podia chegar a 1.000
centímetros cúbicos, o erectus tinha um cérebro menor do que o nosso, mas maior
do que todas as outras espécies humanas anteriores. Alguns autores, no entanto,
acreditam que o volume cerebral do erectus era proporcionalmente semelhante ao
do Homo habilis, que possuía um cérebro menor, mas um corpo também menor. O
cérebro, como em quase todas as espécies do gênero era voltado para trás, com
grandes protuberâncias supra-oculares, talvez as maiores de todo o gênero Homo.
O erectus era capaz de produzir ferramentas no estilo Acheuliano (pedra polida).
Desde seu surgimento, há evidências de um avanço sobre a tecnologia de Olduvai
(pedra lascada). No entanto, ele nunca imprimiu um ritmo de aperfeiçoamento
constante às suas ferramentas. É possível distinguir pequenos aperfeiçoamentos
entre a tecnologia acheuliana antiga (1,5 milhão de anos antes do presente - AP) e a
mais recente (600.000 anos AP), mas nada muito perceptível. A verdade é que, ao
longo de quase 1 milhão de anos, o erectus não conseguiu aperfeiçoar muito a sua
tecnologia. Parece que o cérebro do erectus foi capaz de criar as mais sofisticadas
ferramentas de pedra até então produzidas, mas não foi capaz de ir além disso.
Distribuição geográfica do Homo erectus (fonte: “Human Evolution – An Illustrated Introduction”)
O mapa acima foi retirado do livro "Human Evolution - An Illustrated Introduction" de
Roger Lewin, um dos maiores paleoantropólogos do mundo.
Os fósseis encontrados na África são considerados pertencentes ao Homo ergaster
e não ao Homo erectus asiático. Muitos paleoantropólogos consideram o Homo
ergaster uma subespécie de Homo erectus ou vice-versa, inclusive Lewin.
Os fósseis de Dnamisi (na atual Geórgia) estão sendo considerados como
pertencentes a uma nova espécie (Homo georgicus), tendo em vista sua grande
antiguidade (tão antigo quanto o Homo ergaster).
5.3. Homo erectus - convivência com os sapiens e extinção:
Atualmente, a comunidade paleoantropológica tende a considerar que todas as
formas de Homo erectus asiáticas foram extintas sem deixarem descendentes. Isso
ocorre porque os fósseis demonstram claramente que as características das formas
asiáticas não são encontradas em nenhuma espécie posterior, a não ser no Homo
floresiensis.
A espécie erectus desapareceu completamente há apenas 30 mil anos e,
certamente, conviveu com o Homo sapiens por milhares de anos, principalmente na
atual Indonésia.
As formas africanas, muito próximas ao erectus, mas pertencentes a outra espécie
chamada Homo ergaster, evoluíram para formas mais recentes de espécies do
gênero Homo. O Homo ergaster teria evoluído para o Homo heidelbergensis
(pronuncia-se “Raidelberguensis”), que constitui uma espécie muito parecida com o
Homo neanderthalensis. O Homo heidelbergensis, por sua vez, evolui para o Homo
neanderthalensis e para o Homo sapiens, diretamente, ou passando por espécies
intermediárias. Esse é o pensamento dominante atualmente.
5.4. O Homo erectus e o fogo:
As análises dos sítios têm demonstrado que quanto mais recuamos no tempo, os
sítios arqueológicos contêm menos vestígios de utilização do fogo. Não se sabe ao
certo quando se começou a usá-lo, mas os indícios apontam para o Homo erectus,
há, pelo menos, 500.000 anos, como o pioneiro em sua utilização. Alguns afirmam
que os indícios encontrados nos sítios dos erectus não comprovam que essa
espécie dominava o fogo inteiramente, mas apenas o utilizava de maneira
esporádica.
O Livro "Pegando Fogo" de Richard Wrangham (não confundir com o livro homônimo
de Mag Cabot, que é um romance), traz muitas informações sobre a utilização do
fogo e sobre como os cientistas analisam os sítios arqueológicos.
Basicamente, fogueiras mais elaboradas deixam vestígios inequívocos de controle
do fogo (área pequena), utilizam material combustível mais apropriado, deixam
muitos vestígios de ossos assados de animais no entorno, etc.
Segundo o Dr. Fernando Bilharinho, comentando o livro supracitado, “se, por um
lado o salto de habilis para erectus (que o autor propõe que seja devido à introdução
de alimentos cozidos na dieta) parece realmente ter sido mais importante do que o
de erectus para heidelbergensis, por outro lado, os indícios de controle do fogo mais
antigos são de 790 mil anos, exatamente quando surgiu o Homo heidelbergensis!
Aliás, a hipótese de domínio do fogo pelo heidelbergensis é defendida por outros
autores e citada por Wrangham. O autor acha impossível o Homo erectus ter se
espalhado pelo mundo sem dominar o fogo, bem com ter escapado dos predadores
e empreendido a caça.”
Também acredito que o mais provável é que o fogo tenha sido dominado pelo Homo
heidelbergensis, ou, no máximo, pelos mais recentes Homo erectus. Nesse caso, o
cozimento, que, segundo Wrangham, aumenta muito o aproveitamento energético
dos alimentos, influiu no segundo aumento do volume cerebral (de erectus para
heidelbergensis). O aumento do volume cerebral dos Australopithecus para os
habilinos e depois para o ergaster/erectus teria sido conseqüência da mera
introdução de carne crua à dieta desses pré-humanos.
5.5. Questões interessantes sobre o Homo erectus
5.5.1. Há algum traço de influência cultural de sapiens sobre erectus e vice versa?
Não. O Homo erectus não foi capaz de produzir muita coisa além de ferramentas de
pedra polida. É difícil imaginar como poderiam ter sido os encontros de Homo
sapiens e Homo erectus. Com uma tecnologia extremamente mais sofisticada,
principalmente nos encontros mais recentes, os sapiens seriam capazes de
exterminar com facilidade todos os erectus que encontrassem. Ou, se possível,
assimilando-os por meio de cruzamentos interespécies. No entanto, não acredito
que tenha sido possível uma transferência de tecnologia, tendo em vista a limitada
capacidade dos erectus.
5.5.2. Foram os sapiens que extinguiram os erectus?
A maioria dos paleoantropólogos acredita que sim. Que houve uma substituição
sistemática ao longo de milhares de anos. Segundo a teoria dominante, os sapiens
surgiram na África a partir do Homo ergaster (Homo erectus africano) e, de lá,
colonizou o mundo, substituindo as outras espécies que encontravam pelo caminho.
Outros cientistas, a minoria, acreditam em um surgimento multirregional dos sapiens.
Segundo esses últimos, os erectus asiáticos evoluíram para sapiens de forma
convergente, mantendo cruzamentos esporádicos com o Homo ergaster que evoluía
na mesma direção na África. As recentes descobertas de que os sapiens cruzaramse com neandertalensis deu força a essa teoria, provando que eram possíveis os
cruzamentos, pelo menos com os Neandertais.
5.5.3. O Homo erectus foi o primeiro hominídeo a andar ereto, como nós?
Não. O gênero Australopithecus (ou, talvez, o gênero Ardipithecus, mais antigo)
produziu os primeiros hominídeos bípedes. Veremos isso nos próximos capítulos. O
nome Homo erectus tem um fator histórico. No século XIX, o primeiro
paleoantropólogo de todos os tempos, o holandês Eugène Dubois encontrou os
primeiros fósseis da espécie e batizou-a de Pithecanthropus erectus.
Na época, conhecia-se apenas o Neandertal (também descoberto no século XIX).
Mais tarde, a espécie foi incluída no gênero Homo e o gênero Pithecanthropus foi
abolido. Isso ocorreu porque a espécie, nitidamente, é muito parecida com as
demais do gênero Homo. O nome da espécie (erectus) foi mantido em homenagem
ao descobridor e não porque foi a primeira a andar de forma ereta.
Os primeiros Australopithecus (existiam muitas espécies desse gênero) foram
descobertos na década de 1960 e causaram um grande estardalhaço na
comunidade paleoantropológica, porque eram, evidentemente, uma forma
intermediária entre chimpanzés e humanos (com crânios muito simiescos e corpos
muito humanos). Recentemente (2008, divulgado em 2010), descobriram uma nova
espécie australopitecínea (Australopithecus sediba) já com muitas características do
gênero Homo, que também causou espanto na comunidade. Parece trata-se de uma
espécie de "elo perdido" entre Homo e Australopithecus.
5.6. Homo erectus – subespécies
O Homo erectus pertence a uma das mais bem sucedidas e duradouras espécies do
gênero Homo (durou mais de 1 milhão de anos!). É geralmente considerada a
espécie que deu origem a um grande número de espécies descendentes e
subespécies. Pelo fato de ter sido uma espécie duradoura, há muitas variações nos
fósseis encontrados, principalmente entre as formas mais antigas e as mais
recentes. As principais subespécies sugeridas são:
Homo erectus yuanmouensis (identificada no vilarejo de Danawu no Condado de
Yuanmou, na China, em 1965 por Fang Qian - fósseis de 1,7 milhão de anos) – O
nome significa “homem ereto de Yuanmou”.
Homo erectus lantianensis (o primeiro registro fóssil do homem ereto de Lantian
ocorreu em 1963 e descrito por J.K. Woo em 1964. Os restos encontrados foram
achados no Condado de Lantian, na província de Shaanxi, no noroeste da China) –
com capacidade craniana de 780 cm3 viveu entre 530 mil a 1 milhão de anos atrás.
Homo erectus wushanensis (o fóssil do homem de Wushan foi primeiramente
descoberto em Longgupo, no vilarejo Zhenlongping, Condado de Wushan, província
de Chongqing -China- em 1985). Viveu há 2 milhões de anos.
Homo erectus pekinensis (foi descoberto durante escavações nos anos de 1923 a
1927, em um local próximo a Pequim, capital da China. O material arqueológico
encontrado foi datado entre 250.000 a 400.000 anos, no Pleistoceno. Mas, segundo
estudos recentes, descobriu-se que ele poderia ter vivido há 800.000 anos) – O
homem ereto de Pequim ou de Beijing, foi chamado inicialmente de Sinanthropus
pekinensis.
Homo erectus soloensis (Ilha de Java - Indonésia) - Homem ereto do Rio Bengawan
Solo (Java) - estudos mais rigorosos concluíram que, enquanto muitas subespécies
de H. erectus desapareceram do registro fóssil bruscamente 400.000 anos atrás, o
Homo erectus soloensis persistiu até 50.000 anos atrás na região de Java e foi
possivelmente absorvida por uma população local de H. sapiens na época de seu
declínio.
Outras subespécies:
Homo erectus palaeojavanensis;
H. e. nankinensis;
H. e. hexianensis;
H. e. mauritanicus;
H. e. palaeojavanicus;
Fonte: http://sasquatchresearch.net/hominoids.html
Capítulo 6: Gigantopithecus, os maiores primatas de todos os tempos
Gigantopithecus é um gênero de primatas gigantescos, os maiores que já existiram
na face da Terra, extintos há milhares de anos. Esse gênero é muito próximo do
gênero dos orangotangos, que vivem na Ásia, e ambos podem ter um ancestral
comum recente. Especula-se que tais primatas gigantes podem ter dado origem a
lendas como a do Pé Grande.
Gigantopithecus – representação artística
Os Gigantopithecus eram seres curiosos: podiam chegar a até 3 metros de altura (!)
e pesar até 600 Kg (a título de comparação, um gorila atual chega a 2 metros de
altura). Essas informações podem ser encontradas no livro “Human Evolution – An
Illustrated Introduction” do autor Roger Lewin (5ª edição, página 107). As fêmeas
tinham metade do tamanho do macho, o que indica que, talvez, viviam em "haréns",
como os gorilas. Possuíam braços fortes e compridos, comiam bambus e outros
vegetais e se locomoviam, provavelmente, sobre os nós dos dedos. Alguns o
consideram um bípede (!), mas a verdade é que não há muita evidência fóssil que
indique a forma de sua locomoção.
A maioria dos Gigantopithecus foi extinta pelo H. erectus há uns 300.000 anos. No
entanto, alguns sobreviveram até uns 100.000 anos atrás (G. blacki) e foram mortos
pelos H. sapiens ou pela competição com os ursos panda (que também se
alimentam de bambus).
Existiram 3 espécies do gênero Gigantopithecus: Gigantopithecus blacki,
Gigantopithecus bilaspurensis e Gigantopithecus giganteus. Todas viveram na Ásia
(Índia e China, principalmente), conforme pode-se ler na Wikipedia. São primatas
classificados como pertencentes à família Hominidae (a mesma dos humanos),
subfamília Ponginae (a mesma dos orangotangos). Portanto, não eram tão próximos
de nós como os chimpanzés ou os gorilas, que pertencem à mesma subfamília dos
humanos (Homininae), mas eram incrivelmente semelhantes fisicamente à nossa
espécie.
:
Gigantopithecus – comparações. Fonte: Wikipedia
Capítulo 7: Homo ergaster
Na década de 1990, na África, perto do desfiladeiro de Olduvai, foi descoberto um
esqueleto quase completo do famoso Homo erectus africano, reclassificado como
Homo ergaster. O H. ergaster é mais antigo do que o H. erectus e tem proporções
corporais ainda mais semelhantes ao H. Sapiens. Viveu na África do Sul e na África
Oriental.
Eram basicamente como nós. A principal diferença estava no volume craniano, que
não passava de 900 centímetros cúbicos (pouco menor do que o volume craniano
do erectus, que tinha, em média, 1.000 cm3 e muito menor que o nosso, de 1.400
cm3 em média). Entretanto, há fósseis mais antigos de ergaster com volume
craniano de apenas 508 a 582 cm3. O famoso Menino de Nariokotome (esqueleto
quase completo de ergaster, descoberto na década de 1990) tem esse volume
encefálico.
Os autores do livro "The Last Human" consideram o bipedalismo do H. ergaster
inquestionável, mas com base em características da cintura escapular acreditam que
as crianças ergaster poderiam demorar mais tempo para andar (uma criança
humana anda por volta dos 12 meses, os ergaster, talvez demorassem 16 ou mais
meses).
O Homo ergaster era capaz de produzir ferramentas de pedra polida (estilo
acheuliano), mas não tinha uma inteligência muito superior à do chimpanzé. Se
ainda vivessem, seriam considerados uma espécie estúpida (com pouca
inteligência) de humanos, mas, sem dúvida, tendo em vista suas evidentes
características físicas, seriam considerados humanos.
7.1. A convivência com o ergaster:
Os sapiens não conviveram com ergaster porque estes últimos viveram há, mais ou
menos, 1,5 milhão de anos, portanto, muito tempo antes do surgimento dos sapiens,
que ocorreu há apenas 200.000 anos.
Os pesquisadores entendem que o ergaster deu origem ao erectus e ao
heidelbergensis. O heidelbergensis deu origem ao neandertalensis e ao sapiens,
talvez passando por espécies intermediárias.
Apesar de não ter convivido conosco, o ergaster conviveu, em um mesmo habitat
(!!!), com o Homo habilis (espécie ainda mais antiga, de mais de 2 milhões de anos)
e o Homo rudolfensis (que parecia como o habilis, mas era maior). Além disso, o
Homo ergaster também conviveu com uma espécie australopitecínea recente,
chamada de Paranthropus boisei, também em um mesmo habitat.
Em suma, havia, pelo menos, três espécies humanas e uma australopitecínea
convivendo em uma mesma paisagem há 1,5 milhão de anos. A revista Scientific
American Brasil produziu uma interessantíssima matéria de 8 páginas sobre essa
fascinante convivência (edição especial nº 2 - Novo Olhar Sobre a Evolução
Humana). Recomendo.
7.2. Corpo moderno e cérebro primitivo:
O ergaster foi o primeiro Homo a ter o nariz proeminente, como o nosso. As
espécies anteriores, inclusive o Homo habilis e o Homo rudofensis tinham o nariz
parecido com o dos gorilas atuais, embutido no rosto. Os Australopithecus tinham
um nariz semelhante ao do chimpanzé (Pan troglodytes) e bonobos (Pan paniscus),
exceto o Australopithecus sediba, que já possuía um nariz relativamente projetado.
O ergaster também foi o primeiro a ter menos quantidade de pêlos pelo corpo (uma
adaptação ao clima, que ficou mais quente há 1,8 milhão de anos atrás ou uma
adaptação a longas caminhadas e a necessidade de suar para manter estável a
temperatura corporal).
Suas proporções corporais, vale repetir, eram semelhantes à nossa. Foi a primeira
espécie humana a ter o braço menor que as pernas, indicando o total abandono da
vida arbórea, passando para uma locomoção tipicamente terrestre. Para aumentar o
volume do pulmão e permitir caminhadas mais longas, o tórax teve de se expandir,
surgindo um tronco em forma de barril como o nosso (e não afunilado, como
veremos nos Australopithecus e no habilis).
Houve um estreitamento da pélvis (para facilitar as caminhadas), o que reduziu a
passagem dos bebês (do útero à luz) e, consequentemente, aumentou a
dependência do recém-nascido após o nascimento. É que os cérebros tiveram que
ficar menores antes do nascimento e começar a crescer depois, por causa do
estreitamento da pélvis.
O Homo ergaster, uma das espécies mais bem conhecidas pelos
Paleoantropólogos, visto de longe, poderia ser confundido com um ser humano
atual, indicando que nosso corpo (da maneira que é hoje) surgiu há quase 2 milhões
de anos. Nosso cérebro, da maneira que é hoje, surgiu há 200.000 anos, e nosso
comportamento, da maneira que é hoje (com capacidade simbólica e abstrata)
surgiu (ou, pelo menos, expandiu-se) há 50.000 anos.
Fonte: http://wiki.kkc.school.nz/index.php/Homo_ergaster
7.3. Sobre a perda dos pêlos:
Segundo Richard G. Kelin, a partir do Homo ergaster (após o Homo habilis), há mais
ou menos 1,8 milhão de anos, os pêlos começaram a ficar menores no gênero
Homo:
"Já que o ergaster foi feito para um clima quente e seco,
podemos especular que ele foi também a primeira espécie
humana a possuir pele nua, quase sem pêlos. Se tivesse
pêlos cobrindo o corpo, como os macacos, não poderia
suar de maneira adequada, e o suor é o meio mais
importante que os seres humanos - e o cérebro - têm para
evitar o superaquecimento do corpo." (página 86 do livro
"O Despertar da Cultura").
Robert Foley, no livro "Os Humanos Antes da Humanidade", concorda. No entanto,
como esse livro foi escrito há mais tempo, o autor não conseguiu determinar a partir
de qual espécie teria surgido:
"O atributo-chave provavelmente foi a perda de pêlo.
Estritamente falando, os humanos não são 'pelados', mas
apresentam uma pelagem extremamente miniaturizada,
cobrindo a maior parte do corpo, embora haja variações
drásticas, dependendo do sexo e de região geográfica."
(página 181 do livro supracitado).
O autor, depois dessa introdução, fala sobre as teorias históricas sobre a perda de
pêlos, dentre as quais, a famosa e totalmente descartada "fase aquática" dos
hominídeos. Depois, conclui:
"Os humanos modernos, pelo menos, trazem em sua
anatomia e em sua fisiologia as marcas de uma espécie
que evoluiu no contexto de estresse térmico extremo. É
impossível determinar com precisão quando esse
estresse ocorreu, mas como o bipedalismo se
desenvolveu muito cedo, e talvez ele próprio esteja
relacionado ao estresse térmico, pode ter acontecido que,
durante os estágios formativos da linhagem humana,
alguma coisa que os hominídeos vinham fazendo
resultava em que eles sentissem muito calor. Caminhar
através de vastas extensões em busca de alimento foi de
importância crítica, tanto para a evolução da fisiologia
térmica como da anatomia locomotora dos humanos, e é
também uma estratégia comportamental de importância
crucial." (página 182 do livro "Os Humanos Antes da
Humanidade").
Portanto, os pêlos podem ter caído quando o Homo ergaster, há 1,8 milhão de anos,
começou a vasculhar grandes extensões do planeta, segundo Klein. Ou, na teoria de
Foley, os pêlos podem ter caído pelos mesmos motivos que levaram os grandes
antropóides antigos a se tornarem bípedes (grandes caminhadas), e, se for assim, a
perda de pêlos teria acontecido nos últimos Australopithecus.
O melhor livro sobre o assunto, no entanto, é “O Macaco Nu”, de Desmond Morris,
um ilustre zoólogo inglês. Esse último autor, em várias páginas de seu livro
supracitado, comenta, exaustivamente, as várias hipóteses que tentam explicar a
perda de pêlos (fase aquática, parasitas de pele, sujeiras inevitáveis nos pêlos,
hipótese sexual, etc.). No entanto, o autor concorda com Klein e afirma que a
hipótese mais provável é o fato das grandes caminhadas efetuadas pelos primeiros
exemplares do gênero Homo, o que exigia um equipamento de resfriamento corporal
muito eficiente. Por isso, as glândulas sudoríparas fariam esse papel de forma mais
eficaz caso o corpo não estivesse coberto de pêlos.
Possíveis peles fossilizadas do Australopithecus sediba foram encontradas em
Malapa (África do Sul) em 2008. Se a descoberta se confirmar, será possível
analisar a quantidade de glândulas sudoríparas que possuíam, podendo-se, a partir
daí, estimar a quantidade de pêlos que possuíam. O A. sediba é um dos
australopitecíneos mais recentes (1,8 milhão de anos) e um dos prováveis
ancestrais do Homo erectus. Para saber mais sobre isso, recomendo a edição de
agosto de 2011 da revista National Geographic Brasil.
Capítulo 8: Homo rudolfensis e Homo habilis (“Habilinos”)
Provavelmente, o Homo rudolfensis ou o Homo habilis foram as duas primeiras
espécies do gênero Homo. Há indícios de que as duas espécies surgiram há mais
de 2 milhões de anos. Temos, portanto, um marco importante: 2 milhões de anos –
surgimento do gênero Homo.
Alguns autores chamam essas primeiras espécies do gênero Homo de “habilinos”.
Essa nomenclatura pode facilitar muito as coisas, quando nos referimos a tais
espécies de uma forma genérica.
Nessa época, há um ligeiro aumento do volume craniano. De apenas 450 a 500
centímetros cúbicos nos Australopithecus, o volume atingiu até 752 centímetros
cúbicos no rudolfensis e 687 centímetros cúbicos no habilis. Apesar do volume
cerebral do habilis ser menor, deve-se levar em consideração que seu corpo
também era menor. Portanto, pode-se concluir que ambos tiveram um grau de
inteligência semelhante. Eram capazes de produzir muitas ferramentas de pedra
lascada, no estilo de Olduvai. Foram os primeiros a construir ferramentas de pedra
nesse estilo. Os chimpanzés, apesar de serem capazes de utilizar ferramentas
prontas (como gravetos e pedras), não são capazes de modificar pedras
deliberadamente para que funcionem como ferramentas mais sofisticadas. Na
verdade, é necessário uma mão mais habilidosas das que as dos chimpanzés para
lascar pedras de maneira adequada.
As espécies australopitecíneas coexistiram com as primeiras espécies Homo por
muitos milhares de anos, talvez até por meio de milhão de anos. Essas espécies
australopitecíneas mais recentes são incluídas no gênero Paranthropus (antropóide
paralelo ao homem) e serão estudadas mais adiante.
8.1. Habilis / Rudolfensis: características físicas
Tanto o habilis quanto os rudolfensis possuíam muitas características primitivas, que
lembravam os Australopithecus: pés sem o arco característico, braços longos,
mandíbula avantajada, protuberâncias ósseas supra-oculares, muitos pêlos pelo
corpo, atingiam no máximo 1,40m de altura e 45Kg, tórax afunilado, pélvis
relativamente larga, etc.
No entanto, a maioria dos paleoantropólogos insiste em classificá-los como Homo,
tendo em vista seu maior volume cerebral, sua pélvis relativamente mais estreita em
relação aos Australopithecus e um prognatismo (projeção das mandíbulas para
frente - focinho) relativamente menor, também em relação aos Australopithecus.
Aliás, algumas etnias atuais de Homo sapiens ainda possuem um relativo
prognatismo, como resquício evolutivo.
O Australopithecus sediba, recém encontrado, talvez seja Homo também, por conter
quase tantas características desse gênero quanto o habilis ou o rudolfensis. No
entanto, seu descobridor classificou-o como Australopithecus, tendo em vista que
características importantes, como o volume craniano, eram mais semelhantes às
das espécies australopitecíneas.
A Figura acima foi retirada do livro “O Despertar da Cultura” de Richard G. Klein e
Blake Edgar, fig. 3.7. Conforme o livro, a ilustração foi desenhada segundo F.C.
Howel, em Evolution of African Mammals, Harvard University Press, Cambridge,
1978, fig. 10.9.
Homo habilis – reconstituição a partir de fósseis (Fonte: humordarwinista.blogspot.com)
Capítulo 9: O mundo há 2 milhões de anos
Nessa época (2,5 a 2,0 milhões de anos atrás), várias espécies da nossa subfamília
dividiram as paisagens africanas, como o Australopithecus africanus, o
Australopitecus garhi, o Paranthropus aethiopicus, o Homo habilis, o Homo
rudolfensis e outras espécies. Há muitos outros fósseis que não podem ser
claramente classificados. Podem pertencer a outras espécies ainda não identificadas
ou fazerem parte de alguma espécie já conhecida, mas, por variações anatômicas,
ainda não foi possível identificá-la.
Espécies que viveram há mais ou menos 2 milhões de anos (2,5 a 1,5 milhão de
anos):
Australopithecus africanus - com mais ou menos 2,5 milhões de anos (África do Sul);
Paranthropus robustus - 2,0 a 1,75 milhão de anos (África do Sul);
Australopithecus sediba - 1,8 milhão de anos (África do Sul);
Homo georgicus - 1,75 a ? milhão de anos (atual Geórgia – Ásia);
Australopithecus gahri - 2,5 a ? milhões de anos (atual Etiópia);
Paranthropus boisei - 1,7 a 1,6 milhão de anos (atuais Etiópia e Tanzânia);
Homo rudolfensis - 2,5 a 1,9 milhão de anos (atual Quênia);
Homo habilis - 1,9 a 1,6 milhão de anos (atual Tanzânia);
Paranthropus aethiopicus - 2,5 milhões de anos a ? (atual Quênia);
Homo ergaster - 1,8 a 1,5 milhão de anos (África Oriental).
Capítulo 10: Outras Espécies do Gênero Homo:
Terminamos aqui o estudo do gênero Homo. Como devem ter percebido, não
esgotamos o assunto. Não estudamos, em detalhes, outras espécies do gênero,
como, por exemplo:
Fonte: http://humanorigins.si.edu
10.1. Homo georgicus (espécie intermediária entre o habilis e o erectus asiático);
10.2. Homo cepranensis (espécie que viveu na atual Itália há mais ou menos 850 mil
anos);
10.3. Homo antecessor (espécie muito parecida com o Homo sapiens, porém,
ligeiramente mais antiga, que também viveu na atual Itália). Segundo o Dr. Fernando
Bilharinho, “a maioria dos fósseis do H. antecessor foi encontrada na Sierra de
Atapuerca (Espanha), mas há fósseis encontrados no norte da Argélia que também
parecem pertencer ao H. antecessor. Um terceiro grupo de fósseis encontrado em
Daka (Etiópia) provavelmente pertencem ao H. antecessor, mas há dúvidas, porque
foram encontrados há mais de 3.000km de distância dos demais. Se os fósseis da
Argélia forem realmente do H. antecessor e não do H. heidelbergensis, o nome do
H. antecessor teria que ser mudado para Homo mauritanicus (homem da
Mauritânia), nome que os fósseis da Argélia receberam em 1954. Os primeiros
fósseis da Espanha foram encontrados apenas em 1994, e o "batismo" aconteceu
em 1997. De acordo com as regras internacionais de nomenclatura o primeiro nome
recebido pela espécie deve prevalecer”;
10.4. Homo rhodesiensis (espécie que viveu nas atuais Zâmbia e Tanzânia).
Homo georgicus. Fonte: http://erroridistumpa.blogspot.com/2009/10/sunday-mixture-10042009.html
Capítulo 11: O Polegar Opositor
O polegar opositor não surgiu com o gênero Homo. Praticamente todas as espécies
primatas têm o polegar opositor, não apenas nas mãos, mas também nos pés.
Os gorilas, os chimpanzés, os bonobos, os orangotangos, os macacos do novo
mundo, todos os primatas têm polegares opositores nas mãos e nos pés.
Atualmente, apenas o homem não tem polegares opositores nos pés. Essa
adaptação (pés sem polegares opositores) surgiu, com certeza, com os
Australopithecus, tendo em vista que os Ardipithecus (gênero que antecedeu aos
Australopithecus) ainda tinham polegares opositores nos pés.
No caso específico do gênero Homo, é possível concluir que desde o Homo habilis,
o polegar opositor tornou-se mais sofisticado nas mãos, tendo em vista que essa
espécie foi uma das primeiras a construir ferramentas de pedra lascada (estilo de
Olduvai). Conforme testes em laboratório (vide livro "Eu, Primata", de Frans de
Waal) os chimpanzés não conseguem um grau de controle tão aprimorado dos
polegares. Por isso, eles não conseguem produzir ferramentas no estilo de Olduvai,
apesar de conseguirem manipular pedras, gravetos e outros objetos.
As ferramentas mais elaboradas de pedra polida (estilo acheuliano) surgiram muitos
milhares de anos depois (600.000 anos atrás), quando as espécies humanas já
possuíam um volume craniano ligeiramente maior. Portanto, pode ser que o habilis
já tivesse mãos capazes de produzir ferramentas mais elaboradas, mas não tivesse
inteligência suficiente para tanto.
As limitações anatômicas do chimpanzé podem ser explicadas também pelo fato
deles andarem sobre os nós dos dedos, como outros grandes primatas. Vale
lembrar que apenas o Homo sapiens é bípede, atualmente, dentre os primatas,
deixando as mãos totalmente especializadas para outras funções. Isso faz com que
os chimpanzés não disponham de músculos e nervos mais adequados para funções
superiores das mãos. O andar sobre os nós dos dedos (nodelismo) exige
adaptações específicas, como músculos que travam o pulso, dificultando o
manuseio de objetos.
Retrocedendo no tempo, sabe-se que o ancestral comum entre os pré-humanos e os
pré-chimpanzés remonta há mais ou menos 6 milhões de anos. Com certeza, nosso
ancestral comum com os chimpanzés não tinha mãos tão adaptadas ao trabalho
manual. Não se sabe se esse ancestral era mais parecido com os Australopithecus
ou com os chimpanzés atuais. Sabe-se apenas que, muito provavelmente, ele não
era bípede. O Ardipithecus ramidus, com 4 milhões de anos, e o Sahelanthropus
tchadensis, são as espécies mais próximas que chegamos desse ancestral comum.
Capítulo 12: Importantes marcos pré-históricos
(Fonte: Resumo do texto "Gerações" de minha autoria, disponível, na íntegra, em
www.paleoantropologia.com.br)
1 geração – 25 anos de duração – Convenção que usaremos neste texto;
4 gerações – 100 anos ou pouco mais – Tempo máximo de existência de uma
pessoa;
8 gerações – 200 anos atrás (a.a.) – Limite de tempo em que, geralmente, é possível
identificar nossos ancestrais;
40 gerações - 1.000 a.a. – Idade Média na Europa;
80 gerações – 2.000 a.a. – Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo;
240 gerações – 6.000 a.a. – Início da civilização: surgimento de cidades, agricultura,
escrita, etc.;
680 gerações – 17.000 a.a. – Extinção do Homo floresiensis: espécie humana de
apenas 1 metro de altura, que viveu na Ilha de Flores, pertencente à atual Indonésia;
1.200 gerações – 30.000 a.a. – Extinção do Homo neanderthalensis: espécie
humana, com cérebro maior do que o nosso, que conviveu com o Homo sapiens na
atual Europa e no atual Oriente Médio por vários milênios;
1.800 gerações – 45.000 a.a. – Explosão criativa do Homo sapiens: pensamento
abstrato e simbólico. Tecnologia sapiens entra em constante aperfeiçoamento;
8.000 gerações – 200.000 a.a. – Surgimento do Homo sapiens na África;
20.000 gerações – 500.000 a.a. – Época em que viveu, no Oriente Médio, o
ancestral comum entre os sapiens e os neanderthalensis, conhecido como Homo
heildelbergensis;
40.000 gerações – 1.000.000 a.a. – Surgimento de espécies do gênero Homo com
maior volume cerebral (ergaster/erectus) e início da tecnologia Acheuliana (pedra
polida);
80.000 gerações – 2.000.000 a.a. – Surgimento do gênero Homo, representado pelo
Homo habilis e outras espécies, na África (atual Somália, Quênia e Tanzânia). Início
da tecnologia de Olduvai (pedra lascada).
Capítulo 13: O gênero Australopithecus
13.1. Informações Básicas:
No período de mais ou menos 4 milhões de anos atrás até, mais ou menos, 1,5
milhão de anos atrás, existiam primatas bípedes muito interessantes: os
Australopithecus. Seus primeiros fósseis começaram a ser encontrados no início do
século XX, todos na África (África Oriental e África do Sul).
Australopithecus significa Macaco do Sul. Receberam esse nome porque seus
primeiros exemplares foram encontrados na África do Sul, em 1924, pelo Professor
de anatomia da Universidade de Witwatersrand (em Johanesburgo), Raymond Dart,
um inglês que havia chegado recentemente para ensinar anatomia na Universidade.
Na África Oriental (principalmente Tanzânia, onde fica o desfiladeiro de Olduvai),
Louis Leakey e Mary Leakey começaram as mais importantes escavações,
descobrindo centenas de fósseis, desde a década de 1930. O trabalho foi seguido
pelo filho do casal Richard Leakey e por dezenas de outros paleoantropólogos
famosos, como Donald Johanson, Tim White, Yves Coppens.
De lá para cá, milhares de fósseis novos foram sendo desenterrados. Para sorte dos
paleoantropólogos, foram desenterrados também alguns esqueletos quase
completos. Tais esqueletos deram aos cientistas uma noção muito boa do corpo,
dos hábitos e da capacidade cerebral dessas criaturas. Algumas espécies, como o
A. afarensis, têm quase todos os seus ossos (até mesmo os menores) conhecidos.
Os Australopithecus desceram das árvores, mas seu corpo ainda manteve muitas
adaptações para a vida arbórea, como os longos braços. Veja a ilustração retirada
do livro “Human Evolution”, de Roger Lewin:
Fonte: Livro “Human Evolution – An illustrated Introduction”
13.2. O corpo dos Australopithecus:
Os Australopithecus tinham um corpo que, na maioria das vezes, era pequeno, com
no máximo 1,20m. No ano de 2010, foi publicado um estudo em que se constatou a
existência de alguns espécimes maiores, com até 1,50m, mas, a grande maioria dos
achados demonstra claramente um tamanho menor.
O corpo australopitecíneo era incrivelmente semelhante ao nosso, por isso, vou
relacionar aqui apenas as principais diferenças:
13.2.1. O tórax era afunilado para cima, tendo em vista que o osso da pélvis era
ligeiramente mais largo, parecido com o dos chimpanzés atuais;
13.2.2. Os braços eram mais compridos, bem como os dedos das mãos (que
também eram mais curvos), o que indicava claramente um compleição corpórea
ainda voltada para a vida arborícola. Para que se tenha ideia do tamanho dos
braços, as mãos quase chegavam à altura dos joelhos;
13.2.3. Havia algumas diferenças na articulação do ombro em algumas espécies
mais antigas, permitindo aos braços um giro quase completo sobre a cabeça, ainda
uma adaptação à locomoção braquial, nas árvores;
13.2.4. Os ossos da pélvis e das pernas indicam claramente uma locomoção
bipedal, não apenas pela posição dos desgastes naturais, como também pelos
ângulos de encaixe das articulações e pelo formato característico das extremidades
(principalmente da tíbia);
13.2.5. A coluna vertebral demonstra clara, mas não completamente, adaptação ao
bipedalismo, como principal meio de locomoção. As espécies mais recentes
demonstram mais claramente essa adaptação ao bipedalismo;
13.2.6. Os pés já possuíam os polegares na mesma posição dos outros dedos, no
entanto, eram ligeiramente diferentes dos nossos, porque, na maioria das espécies,
não havia o arco típico do gênero Homo;
Enfim, para que se tenha uma boa noção, uma boa imagem mental dessas
espécies, tente imaginar um chimpanzé totalmente bípede e terá visualizado algo
muito parecido com um Australopitecíneo.
13.3: Australopithecus: corpo quase humano e cabeça de macaco:
Como se pode notar, o corpo dos Australopitecos (aportuguesando a forma latina do
nome) era quase humano. As diferenças quase não podiam ser notadas por um
leigo. No entanto, a cabeça era incrivelmente diferente:
13.3.1. O que mais chamou atenção dos paleoantropólogos foi a posição de um
aspecto anatômico muitíssimo interessante: a abertura do forame magno. O forame
é um orifício que fica embaixo do crânio, por onde se encaixa a coluna cervical no
crânio. A posição desse orifício era muito parecida com a posição encontrada no
gênero Homo. Isso indica claramente o bipedalismo. A cabeça ficava na mesma
posição ereta, dificultando muito uma locomoção sobre os nós dos dedos, como os
chimpanzés;
Fonte da imagem: http://frontiersofzoology.blogspot.com/2011/04/muhalululu-and-ngoogounogounmbar.html
13.3.2. O segundo aspecto que mais impressionou foi o tamanho reduzido do
cérebro. Os Australopitecos tinham cérebros realmente pequenos, menores do que
500 cm3. Em algumas espécies, encontramos cérebros menores do que os do
chimpanzé. Mesmo levando em consideração o tamanho do corpo (pequeno), o
cérebro deles, em proporção, equivaleria a menos da metade do nosso;
Fonte da imagem: http://ideonexus.com/2008/10/19/american-natural-history-museum-hall-of-human-origins
13.3.3 O tamanho das mandíbulas, em praticamente todas as espécies, era grande,
com forte prognatismo (focinho avantajado);
13.3.4. O tamanho dos dentes variava muito em função da espécie. Algumas
espécies tinham dentes pequenos semelhantes aos nossos, mas sempre com os
caninos ligeiramente mais avantajados. A exceção ficava com os Paranthropus,
gênero mais recente, também conhecidos com megadônticos, que tinha dentes
molares gigantescos (uma adaptação à alimentação herbácia);
13.4. Ainda sobre o crânio dos Australopithecus:
13.4.1 As mandíbulas tinham um formato nítido de "U", enquanto que no gênero
Homo, o formato era mais aberto, formando uma espécie de curvatura parabólica
(mais ou menos em “V” [ver figura no item 20.5]);
13.4.2 Em praticamente todas as espécies, havia protuberâncias supraoculares
bastante realçadas, mas o formato das mesmas variava conforme a espécie;
13.4.3. O esfenóide, um osso na base do cérebro, era muito mais plano do que o
nosso, permitindo que as mandíbulas ficassem bem avantajadas e reduzindo o
espaço disponível para o cérebro;
13.4.4. O nariz era bastante semelhante ao do chimpanzé atual (Pan troglodytes),
exceto o do Australopithecus sediba, já proeminente;
13.4.5. As espécies mais recentes (Paranthropus), tendo em vista seus gigantescos
molares, possuíam uma grande e característica crista sagital sobre o crânio. Essa
crista servia para prender os grandes músculos das mandíbulas. Tendo em vista a
pelagem, não ficavam à mostra quando vivos, mas, nos crânios fósseis, são
espetaculares;
13.4.6. O formato da face variava muito conforme a espécie. Temos faces
arredondadas, ovaladas, curtas, compridas, etc. Os Paranthropus tinham,
geralmente, uma face mais arredondada enquanto que os Australopitecos mais
antigos tinham uma face bastante proeminente (prognatismo). Alguns, como o gahri,
tinham um focinho bastante proeminente;
13.4.7. A testa era muito baixa e inclinada para trás. O formato do cérebro era
parecido com as primeiras espécies do gênero Homo, ou seja, voltado para trás;
13.4.8. Nenhuma espécie apresentava queixo proeminente, encontrado apenas nos
sapiens recentes.
13.5. Evolução do crânio:
Não é correto falar em "formas de transição", porque cada espécie tem sua
importância própria. Cada espécie criou seus próprios mecanismos para enfrentar a
vida e era a mais adaptada ao seu meio. A Evolução seleciona os indivíduos mais
adaptados ao meio ambiente utilizando-se de mutações aleatórias e outros
mecanismos já comentados.
No entanto, podemos visualizar, por exemplo, o crescimento cerebral desde os
Australopithecus ao sapiens de forma bem detalhada, com milhares de fósseis
intermediários.
Comparação de volumes cranianos. Fonte: http://www.mahjoob.com/en/forums/showthread.php?t=249696
Não há, nem de longe, uma espécie de pré-programação ou algo do tipo no que se
refere a esse aumento paulatino do cérebro. A Evolução seguiu um rumo
absolutamente aleatório. A tendência de aumento no volume cerebral seguiu
pressões evolutivas que podem ser identificadas e serão estudadas mais adiante,
em um capítulo a parte.
Fonte: http://www.mahjoob.com/en/forums/showthread.php?t=249696
13.6. Prognatismo:
Não vamos estudar aqui o prognatismo mandibular, que se trata de uma má
formação, geralmente, congênita. Estudaremos aqui o prognatismo como uma
característica anatômica de uma espécie. Veja que o dicionário traz duas acepções
para a palavra:
Prognatismo: [1] acentuada projeção do maxilar inferior para a frente; [2] disposição
da face na qual a linha do perfil, indo da fronte à parte mais saliente dos maxilares,
forma um ângulo agudo em relação ao plano horizontal do crânio.
A maioria dos Australopithecus possuía mandíbulas avantajadas. Algumas espécies
possuíam mandíbulas muito projetadas para frente. A boca era projetada para frente
mais ou menos como no chimpanzé atual.
O queixo é outra parte da anatomia que fica abaixo das mandíbulas. Apenas o
Homo sapiens tem o queixo mais proeminente, apesar de não ter mandíbulas
projetadas. Percebam a diferença entre ter um queixo proeminente, como na maioria
de nós, e ter as mandíbulas salientes, como na maioria dos Australopithecus.
O Australopithecus sediba foi o primeiro a apresentar um nariz proeminente, e não
mais embutido dentro do rosto:
Fonte: John Gurge
Capítulo 14: Berço da Humanidade
A África do Sul é chamada por muitos de "Berço da Humanidade". Na verdade, ela
disputa esse título com os países da África Oriental (Quênia, Tanzânia, Etiópia, etc.).
A grande maioria dos Australopithecus e das primeiras espécies do gênero Homo
são encontradas nesses locais. Recentemente, o magnífico Australopithecus sediba,
já com muitas características do gênero Homo, foi encontrado lá, perto de
Johanesburgo.
Se colocarmos todas as espécies de Australopithecus e todas as espécies Homo
uma ao lado da outra, poderemos perceber a Evolução, em cada detalhe anatômico:
1. Aumento gradual do cérebro;
2. Mudança gradual das articulações do ombro, da pélvis e dos joelhos;
3. Adaptação gradual dos pés à locomoção bípede;
4. Adaptação gradual do tórax;
5. Adaptação gradual da forma da coluna;
6. Adaptação gradual do comprimento dos braços;
7. Adaptação gradual das extremidades da tíbia.
14.1. Sequência evolutiva mais provável:
Australopithecus africanus
Australopithecus sediba
Homo habilis
Homo ergaster
Homo heidelbergensis
Homo sapiens (Cro-Magno)
Fonte das imagens: http://skullduggery.com/extinct.htm
14.2. Os Australopithecus são nossos avós!
Grande parte das espécies de Australopitecos foram extintas, outras evoluíram para
espécies mais recentes (Paranthropus), outras evoluíram para o gênero Homo.
Não há dúvidas de que os singelos Australopitecos eram nossos ancestrais. Além de
ser possível verificar a convergência evolutiva para o gênero Homo em algumas
espécies australopitecíneas, todas as espécies viveram nos mesmos ambientes em
que surgiram as primeiras espécies Homo. A escalada de mudanças morfológicas
começou nos membros inferiores (adaptações na tíbia para o andar bípede, há 4
milhões de anos), passou para a pélvis (estreitamento da pélvis, para facilitar longas
caminhadas), depois para o tórax (formato de barril, consequência da mudança na
pélvis, há 2,5 milhões de anos), depois para os braços (braços menores há 2
milhões de anos), depois para o rosto (rosto mais humano há 1,5 milhão de anos) e,
por fim, atingiu dramaticamente o cérebro (constante crescimento a partir de 2
milhões de anos, com grande salto há 600.000 anos, provavelmente com o Homo
heidelbergensis).
Capítulo 15: Australopithecus afarensis: um velho conhecido
Afarensis significa "da região de Afar", na Etiópia, onde foram encontrados. Viveram
entre 3 a 4,1 milhões de anos nas atuais Etiópia e Tanzânia. Os fósseis dessa
espécie tão conhecida são encontrados desde 1935 pela família Leakey, mas
recebeu esse nome apenas em 1978, após ajustes na classificação.
Fonte: Foto – Museu de História Natural de Nova York – EUA
Sabemos muita coisa sobre essa espécie e inclusive temos pegadas fósseis dela: as
pegadas de Laetoli, datadas da época em que o afarensis habitava aquelas
paragens. Tais pegadas sugerem que ele andava a maior parte do tempo sobre
duas patas. Temos centenas de fósseis e alguns esqueletos completos, cujo mais
famoso é conhecido pelo nome de "Lucy", em homenagem a uma canção dos
Beatles, e outro esqueleto conhecido como “O Filho de Lucy” ou Selan (que significa
esperança na língua local), um bebê Australopithecus, um pouco mais antigo. Na
verdade, temos centenas de fósseis dessa espécie, muitos ainda não catalogados.
Esses esqueletos quase completos trouxeram muitas informações adicionais sobre a
espécie, como, por exemplo, o padrão de crescimento dos filhotes, as proporções
corporais, a posição das articulações, etc. Temos um modelo interno do cérebro,
muitas informações sobre os pés, as mãos e outros ossos importantes para
determinar o bipedalismo (tíbia, bacia, vértebras, etc.). Aliás, o bipedalismo dos
Australopithecus é indiscutível e extraordinariamente evidente.
Há muitas semelhanças entre alguns fósseis de afarensis e o orangotango atual, o
que confunde os pesquisadores até hoje, mas as semelhanças com os demais
Australopithecus é avassaladora. No entanto, parece ter havido uma convergência
evolutiva com os orangotangos em alguns pontos do esqueleto, principalmente nos
braços.
Seu corpo tinha o mesmo tamanho de um bonobo atual (Pan paniscus). Era
pequeno, talvez o menor dos Australopithecus. É bom lembrar que quase todos os
Australopithecus não tinham caninos avantajados e, portanto, não tinham
mecanismos de defesa eficientes (eram pequenos, fracos, sem caninos fortes...).
Porém, pode-se presumir que eram muito espertos, porque sobreviveram em uma
região cheia de predadores e com escassez de comida e água. "As características
anatômicas do afarensis também são vistas em macacos e não são exclusivas de
bípedes. Os membros inferiores, por exemplo, são semelhantes aos dos babuínos
(macaco com hábitos terrestres), diferentes dos macacos escaladores. As
características dos dedos das mãos são semelhantes às do homem e do gorila"
(informações retiradas pelo Dr. Fernando Bilharinho do Livro "The Last Human").
No entanto, o cérebro do anamensis não ultrapassa os 550 centímetros cúbicos. Na
verdade, na média, ficava bem abaixo disso, talvez menos do que 400 cc. Vale
lembrar que o tamanho do cérebro, às vezes, não diz muita coisa sobre a
inteligência da espécie.
Capítulo 16: Australopithecus africanus: outro velho conhecido
Africanus significa africano, evidentemente. Essa espécie viveu há, mais ou menos,
2,5 milhões de anos na África do Sul. A linha evolutiva mais aceita não inclui o A.
africanus dentre nossos ancestrais diretos. A linha mais aceita atualmente é a
seguinte: anamensis > afarensis > habilis > ergaster > heidelbergensis > sapiens. O
A. afarensis é o mais provável ancestral do Homo habilis. Portanto, o africanus pode
ter sido um beco sem saída evolutivo, ou ser um ancestral do Australopithecus
sediba (que também viveu na África do Sul), ou ainda pode ser um ancestral do
habilis (apesar da longa distância entre os habitats, há indícios de espécies do
gênero Homo na África do Sul). Nesse último caso, teríamos o africanus e não o
afarensis como nosso ancestral. Também nesse último caso, poderíamos ter o
sediba como um intermediário entre o afarensis e o habilis.
Da mesma forma que o afarensis, temos muitos fósseis, centenas, dessa espécie.
Alguns pesquisadores sugerem dividi-los em duas ou mais espécies separadas,
tendo em vista sutis diferenças encontradas.
Vou postar abaixo um trecho do livro "The Last Human", gentilmente traduzido pelo
Dr. Fernando Bilharinho, sobre o Australopithecus africanus. O livro é escrito por
Esteban Sarmiento, com colaboração de G. J. Sawyer e Richard Milner. Ainda não
há edição em português. O texto está resumido e descreve o Australopithecus
africanus:
"Crânio e dentes com muitas características parecidas
com as dos homens:
(1) face relativamente plana e disposta verticalmente;
(2) mandíbula relativamente curta;
(3) musculatura do pescoço com inserção bem baixa no
crânio;
(4) forame magno posicionado mais adiante e orientado
mais para baixo do que nos macacos, indicando
bipedalismo;
(5) volume craniano parecido com o dos grandes macacos
africanos, 400cc. Peso de 25 a 30kg.
(6) O pé do A. africanus é muito mais móvel, não possui
arcos fixos como os humanos e possui um grau elevado
de divergência do hálux (dedo grande do pé, conhecido
também como primeiro pododáctilo) em relação ao pé
humano. A coluna lombar aparentemente não
apresentava a lordose lombar característica do nosso
andar bípede.
(7) Viveu há 2,5 a 3,5 milhões de anos. Há um fóssil com
possibilidade de 4,0 milhões de anos [a datação na África
do Sul é muito menos precisa do que no Grande Vale da
Fenda, conhecido como desfiladeiro de Olduvai, pela
raridade de vulcões na região]."
Fonte: Jornal Folha de São Paulo
Capítulo 17: Australopithecus gahri: Quase Homo?
Não vou descrever aqui todos as espécies de Australopithecus, porque senão
perderíamos o foco, por isso não falarei sobre o Australopithecus bahrelghazali, e
outros. No entanto, vale a pena descrevermos o Australopithecus gahri. “Gahri”
significa “surpresa” em um língua africana. Ele viveu por volta de 2,5 a 2,6 milhões
de anos de na Etiópia. O fóssil mais famoso da espécie é conhecido como "Crânio
Negro". Esse macaco bípede viveu em uma época em que começavam a surgir o
gênero Homo e o gênero Paranthropus, portanto, em uma época crucial para o
entendimento de nossa origem.
De novo, vou recorrer ao grande livro "The Last Human", traduzido pelo Dr.
Fernando Bilharinho, para descrever o gahri:
“(1) O volume encefálico foi estimado em 450 centímetros
cúbicos;
(2) Os ossos da cintura escapular apresentam mais
características humanas do que os do Australopithecus
afarensis;
(3) O dedo maior do pé (hálux) sugere que o A. garhi se
locomovia predominantemente no solo, mas persiste a
dúvida quanto ao tempo em que andava sobre duas ou
quatro patas, porque, a princípio, todos os grandes
macacos andam ocasionalmente sobre duas patas;
(4) Apesar da longa distância entre os sítios, o garhi se
parece muito com o africanus da África do Sul, sugerindo
algum grau de parentesco;
(5) Ferramentas: Não foram encontradas ferramentas
associadas ao A. garhi. Entretanto, ossos de antílopes
com marcas de cortes e quebrados para retirada de
tutano foram encontrados no mesmo depósito dos fósseis
do garhi. É provável então que, ao invés do Homo habilis,
o A. gahri tenha sido o primeiro a fabricar ferramentas no
estilo de Olduvai;
(6) Animais e habitat: Os animais encontrados sugerem
habitat aberto com grama e arbustos e longas estações
secas. Florestas estreitas e clareiras gramadas devem ter
existido próximas a lagos e cursos de riachos.”
Capítulo 18: Australopithecus sediba – uma descoberta recente
Sobre o Australopithecus sediba, podemos dizer:
18.1. Os esqueletos encontrados estão muito bem conservados, sendo que existe a
possibilidade de ter sido preservada um pedaço da pele no topo de um dos crânios
(da criança, o que possibilitaria a análise do couro cabeludo) e um trecho da pele da
mandíbula (no crânio da fêmea, o que possibilitaria a análise da quantidade de glândulas sudoríparas, uma quantidade alta é imprescindível para a existência de
cérebros grandes);
Australopithecus sediba (o mais novo membro da família, encontrado em 2008)
18.2. Foram preservados pequenos ossos das mãos e dos pés, indicando que:
a. As mãos são relativamente modernas, semelhante às dos habilinos, permitindo a
construção de ferramentas;
b. Os pés têm características modernas e arcaicas: tornozelo moderno, mas com
calcanhares primitivos (mais primitivos do que os do A. afarensis, que é 1 milhão de
anos mais antigo);
c. Cérebro pequeno (mais ou menos 420 centímetros cúbicos, média dos Australopitecos primevos), porém, com uma característica moderna: lobos frontais assimétricos, com o hemisfério esquerdo maior (como nos humanos atuais), além de existir
uma protuberância na Área de Broca (relacionada à fala);
d. Pélvis moderna, indicando bipedalismo completo;
e. Dentes e músculos de mastigação relativamente pequenos, o que também o aproxima do gênero Homo;
f. Nariz projetado para frente (atenção: essa característica só era encontrada no
Homo ergaster, muito mais recente do que o A. Sediba!).
Capítulo 19: Australopithecus anamensis: o mais antigo
Anamensis significado "do lago" (“Anan”, em um língua loca africana, significa
“lago”), essa espécie viveu há mais ou menos 4,2 milhões de anos na atual Etiópia e
no atual Quênia. Trata-se da mais antiga espécie australopitecínea conhecida. Não
está absolutamente claro se essa espécie já era bípede, mas há muitos indícios
fósseis para se chegar a essa conclusão.
Os membros superiores do anamensis parecem manter as características de
animais capazes de se moverem com destreza dependurados em galhos e se
moverem no chão sobre os nós dos dedos ("nodelismo", ou "andar sobre as juntas"),
como os chimpanzés.
Para ser franco, apesar do anamensis já possuir diversas características que o
fazem um Australopithecus verdadeiro, ele mais parecia um grande macaco, um
antropóide antigo (estudaremos mais adiante os grandes antropóides antigos). O
anamensis parece ser uma espécie de "elo perdido" entre os grandes antropóides
antigos e os Australopithecus mais recentes. Muito provavelmente é o ancestral de
todos os Australopithecus posteriores.
Capítulo 20: Curiosidades sobre os Australopithecus
20.1. O ancestral comum entre os pré-chimpanzés e os pré-humanos (como também
podem ser chamados os Australopithecus), conforme os últimos estudos genéticos
(confirmados, em alguma medida, pelos fósseis) remonta há mais ou menos 6
milhões de anos, 2 milhões de anos antes dos primeiros Australopithecus;
20.2. O ancestral comum entre o pré-humano-chimpanzé e o pré-gorila, viveu há
10.000.000 de anos;
20.3. É importante que saibamos uma informação sobre essa relação homemchimpanzé-gorila: o chimpanzé é mais próximo geneticamente de nós do que dos
gorilas;
20.4. O ancestral comum entre o pré-humano-chimpanzé-gorila e o pré-orangotango
remonta há 15.000.000 de anos.
20.5. Gravuras sobre os Australopithecus:
Comparação de mandíbulas. Fonte: http://australianmuseum.net.au/Shorter-jaws-with-smaller-teeth
Australopithecus africanus. Fonte: http://psicologiapratodos.blogspot.com/2010/04/veja-imagens-realistas-da-face-dos.html
Australopithecus afarensis. Fonte: http://redepsicologia.com/faces-da-evolucao-imagens-realistas-dos-antepassadoshumanos/australopithecus-afarensis
A. africanus (crânio). Fonte das imagens dos crânios: http://skullduggery.com/extinct.htm
A. afarensis (crânio). Fonte das imagens dos crânios: http://skullduggery.com/extinct.htm
Forame magno (orifício embaixo do crânio por onde entra a coluna cervical) - quanto mais próximo do centro do crânio, mais
bípede é a espécie. Fonte: http://scienceblogs.com/afarensis/2006/12/18/australopithecus_afarensis_and/
.
Criança de Taung: molde natural do crânio de um bebê AustralopitecoFonte: arquivo pessoal. Foto de uma réplica do Museu
de História Natural da UFMG
Capítulo 21: Paranthropus: um gênero paralelo aos humanos
O nome Paranthropus significa antropóide paralelo, porque esse gênero viveu
paralelamente ao gênero Homo. Há 2,5 milhão de anos viviam o Paranthropus
aethiopicus, o Australopithecus africanus e as primeiras espécies do gênero Homo.
Todos eles podem ser descendentes do Australopithecus afarensis ou de outra
espécie parecida.
O Paranthopus aethiopicus provavelmente evoluiu para duas formas paralelas
interessantes: o Paranthropus boisei (mais recente) e o Paranthropus robustus,
também conhecido como Paranthropus crassidens.
Os Paranthropus eram muito parecidos com os primeiros Homo, e também eram
totalmente bípedes. Os paleoantropólogos costumam confundir os ossos de
Paranthropus com os dos primeiros Homo, devido à incrível semelhança. Na
verdade, na prática, apenas os dentes e o crânio são diferentes.
Com a grande seca que atingiu a África há mais ou menos 2 milhões de anos, ficou
muito difícil conseguir alimento. Então, alguns Australopithecus evoluíram para
formas adaptadas à alimentação exclusivamente herbácea gerando os
Paranthropus. Qualquer tipo de vegetação poderia servir de comida para eles,
inclusive grama (em 2010, um grupo da Universidade de Utah - EUA, encabeçado
pelo pesquisador Thure E. Cerling, analisou o carbono presente no esmalte de 24
dentes de 22 indivíduos que viveram no leste africano entre 1,4 milhão a 1,9 milhão
de anos atrás, descobrindo que eles também comiam grama). Por isso, eles tinham
um intestino maior, para facilitar a digestão, e mais: possuíam os maiores dentes
molares de toda a história dos hominídeos bípedes.
Tais dentes, gigantescos, eram de 3 a 4 vezes maiores que nos nossos! Esses
enormes dentes ficavam em mandíbulas igualmente gigantescas, que dependiam de
enormes músculos mastigatórios. Tais músculos precisavam de uma crista óssea
sobre o crânio (crista sagital) para prendê-los.
Estas eram as principais características dos Paranthropus, também conhecidos
como megadônticos ou como australopitecos robustos:
a – Enormes dentes molares;
b – Enormes mandíbulas;
c – Crista óssea sobre o crânio, maiores que a crista dos atuais gorilas;
d – Grande intestino (barriga avantajada), devido à digestão mais difícil dos
alimentos;
e – Totalmente bípedes;
f – Volume craniano semelhante ao dos Australopithecus mais graciosos.
21.1. Paranthropus aethiopicus
O Paranthropus aethiopicus era uma espécie australopitecínea posterior.
Aethiopicus (pronuncia-se etiópicus) significia “da Etiópia”. É mais provável que o
Paranthropus aethiopicus tenha evoluído a partir do Australopithecus afarensis.
Também é extremamente provável que o aethiopicus tenha evoluído para o P. boisei
e para o P. robustus. Ou seja, seria um ancestral comum dessas duas espécies.
O aethiopicus ainda possuía muitos traços semelhantes ao afarensis antes de
evoluir para as duas espécies supracitadas. No entanto, já era um Paranthropus
verdadeiro, porque já possuía uma grande sutura (crista) sagital sobre o crânio, seus
dentes já eram ligeiramente maiores e suas mandíbulas também. Sua dieta era
muito volumosa e pobre em nutrientes: verduras, hortaliças, forragem, raízes,
tubérculos e, quando disponíveis, frutas (sabemos disso por meio de análise de seus
dentes).
Por muito tempo se pensou que o Homo habilis tivesse sido a primeira espécie a
construir ferramentas no estilo de Olduvai, mas fósseis do P. aethiopicus foram
encontrados associados a ossos que parecem ter sido processados com a ajuda de
ferramentas.
Gravura retirada do livro “Human Evolution” de Roger Lewin. Note a enorme crista sagital no topo do crânio do Paranthropus
aethiopicus.
21.2 Paranthropus robustus / crassidens:
Crassidens vem do latim e significa grosso. O nome foi escolhido por Broom devido
aos dentes e mandíbula largos da espécie, mas são também chamados de robustus
(de robustez mesmo).
São os maiores Paranthropus. Mas, ao contrário dos outros, viveram na África do
Sul. O esqueleto pós-craniano (sem a cabeça) é muitíssimo parecido com o
esqueleto dos primeiros Homo. Os robustus podem ter vivido até há 1 milhão de
anos, paralelamente ao Homo habilis e ao Homo ergaster.
21.3 Paranthropus boisei:
Essa espécie ganhou esse nome "boisei" (pronuncia-se “boiseai”) em homenagem a
um dos patrocinadores da equipe Louis Leakey e Mary Leakey, Charles Boise. O
primeiro fóssil atribuído ao boisei teria sido encontrado por Louis Leakey em 1955,
na Tanzânia. Mas não é certo que o canino e o molar de leite encontrados sejam
dele. O primeiro fóssil indubitavelmente pertencente ao boisei foi encontrado por
Mary Leakey em 1959. Nesse mesmo ano ele recebeu o nome de Zinjanthropus
boisei num artigo de Louis publicado na revista científica “Nature”.
Obs.: A família Leakey (Louis, sua esposa Mary e o filho do casal, Richard)
contribuiu com um grande número de achados durante quase todo o século XX. Eles
encontraram diversas espécies australopitecíneas e Homo. Além disso, eles foram
os primeiros a mapear com grande exatidão os sítios arqueológicos, permitindo
classificar com mais segurança os fósseis e os artefatos, e, com isso, melhorar a
datação dos mesmos. Os artigos e os livros publicados por eles ainda hoje são
referências de estudo.
Segundo o livro “The Last Human", os fósseis atribuídos ao P. boisei foram
encontrados da Etiópia (ao norte) à Tanzânia (ao sul), passando por vários sítios no
Quênia. A idade dos fósseis varia entre 1,4 e 2,3 MA.
O boisei conviveu com o Homo habilis por milhares de anos. O esqueleto póscraniano do boisei é muito parecido com o do habilis, as diferenças mais
significativas estão no crânio (dentes e mandíbulas muito maiores, crista sagital,
etc.). Há muitos ossos encontrados na mesma estratificação cronológica do terreno,
tornando impossível distinguir o que é boisei e o que é habilis. Os paleoantropólogos
acreditam que essa longa convivência tenha sido na maioria das vezes pacífica,
tendo em vista as diferenças na alimentação. Porém, não descartam a possibilidade
dos habilis terem atacado os boisei para se alimentar da carne deles. Com efeito, o
Homo habilis comia qualquer coisa que encontrasse pela frente, principalmente
outros animais, inclusive insetos, plantas menos fibrosas, frutas, etc.
Vale dizer que o gorila atual mantém uma dieta semelhante à dos Paranthropus, por
isso, ele também possui algumas características parecidas, como a crista sagital.
Mas os gorilas não são descendentes dos Paranthropus, porque, além desses
últimos terem sido bípedes, eles viveram em áreas distantes dos atuais gorilas. Além
disso, os ancestrais dos gorilas divergiram dos nossos ancestrais há 10 milhões de
anos. Os Paranthropus têm um ancestral comum bem mais recente conosco,
datando de, mais ou menos, 2,5 milhões de anos.
Capítulo 22. O início da expansão cerebral
Uma parte dos Australopithecus graciosos (mais antigos) evoluíram então para
Paranthropus. Outra parte deles evoluiu para Homo. Outra parte foi extinta sem
deixar descendentes.
A partir de 2,5 milhões de anos atrás, a situação ficou muito difícil para os pobres
Australopithecus graciosos. Havia grande escassez de comida na África. Grandes
secas, temperaturas elevadas, enorme quantidade de predadores, número reduzido
de indivíduos de cada espécie australopitecínea. A natureza forçava a ação da
seleção natural em um nível de extrema crueldade.
Por isso, a solução encontrada por algumas espécies australopitecíneas foi se
especializar em comidas altamente fibrosas, que estavam fartamente disponíveis,
mas eram de difícil digestão. Começaram a surgir então os Paranthropus. As últimas
espécies de Paranthropus estavam super-adaptadas a essa dieta, por isso, às
vezes, o Parantrhopus boisei (um dos últimos do gênero) é chamado de
Paranthropus hiper-robusto, por ter características super-acentuadas desse gênero.
Por outro lado, outros australopitecíneos continuaram a procurar outros tipos de
comida, principalmente carne. A fome era grande, a pressão era muito forte. Era
necessário andar quilômetros e quilômetros para encontrar alguma coisa para
comer. Esse tipo de pressão exigiu uma organização maior dos grupos de
indivíduos, com auxílio mútuo na caça e até na localização de árvores frutíferas
(mapa mental primitivo).
Tais australopitecíneos evoluíram para as primeiras espécies do gênero Homo e,
logo de início, ocorreu um ligeiro aumento no volume cerebral (de 450 a 500
centímetros cúbicos nos últimos Australopithecus, para 590 a 680 cc nos primeiros
Homo - Homo habilis).
Enquanto os Paranthropus ficavam sentados em meio a arbustos comendo
fartamente, as espécies do gênero Homo continuaram suas grandes jornadas em
busca de comida, tendo que sobrepujar todo tipo de obstáculos. Esse foi o primeiro
desafio que fez disparar a expansão cerebral, que, depois, continuou por outros
motivos, que veremos depois.
22.1. Primatas são mais inteligentes:
Os primatas, desde os antropóides antigos, já possuíam tendência a uma maior
encefalização. Na verdade, comparando um primata com outro mamífero de mesmo
porte, como uma capivara, por exemplo, pode-se constatar que o primata,
geralmente, terá um maior volume cerebral relativo. Além disso, a configuração
neuronal dos primatas demonstra uma sofisticação maior em relação aos outros
mamíferos.
Isso ocorre porque os primatas vivem em grupos, com complexas relações sociais
(com hierarquias, com machos alfa, por exemplo), além de terem a aptidão de
fazerem atividades em grupos, como a caça (que exige coordenação de cada
integrante e um planejamento prévio). Por fim, muitos primatas têm a capacidade de
elaborar mapas mentais, lembrando-se de onde está a comida e criando meios de
evitar os muitos predadores.
Os Australopithecus eram primatas como quaisquer outros. O cérebro deles era
semelhante ao de um chimpanzé atual. A única característica especial que tinham
era a forma de locomoção (bípede). Quando começou a ficar difícil encontrar
comida, a mortandade começou a aumentar, as tensões internas do grupo
aumentaram (com maior disputa pela comida encontrada), mas, ao mesmo tempo,
era necessária uma maior cooperação para o êxito das caçadas (os chimpanzés
também cooperam em caçadas). Os predadores, sem alternativas, também
começaram a dificultar mais a vida dos Australopithecus.
A seleção natural começou a agir. O mais apto para se relacionar dentro do grupo,
naturalmente, obtinha uma maior número de descendentes. Ou seja, os mais
espertos procriavam mais. Todos os indivíduos continuam procriando, porém, o mais
adaptado às novas condições procriam mais e, aos poucos (ao longo de centenas
de milhares de anos), tendem a substituir os indivíduos menos aptos.
Portanto, a escassez de comida funcionou como um poderoso motor para a seleção
natural.
Robert Foley considera que o aumento da inteligência dos Australopithecus, em
direção ao gênero Homo, está diretamente relacionado à vida social. Ou seja, na
medida em que ficou mais importante a interação entre os membros do grupo, para
proteger os filhotes, para facilitar a caça, para fugir dos predadores, começou a
pesar mais a capacidade de convivência.
É sabido que, entre os primatas, nem sempre o mais forte é o líder. Muitas vezes, o
mais inteligente lidera, até mesmo entre chimpanzés. Há um relato bem
exemplificativo (livro "Eu, Primata"), em que um chimpanzé que ocupava a mais
baixa hierarquia em seu grupo conseguiu achar uma lata brilhante. O chimpanzé
começou a bater na lata com um pedaço de pedra, produzindo muito barulho.
Imediatamente, ele passou a ser o macho dominante, sobrepujando, pelo medo, os
outros machos mais fortes.
Portanto, uma pequena vantagem na capacidade de lidar com as coisas do mundo
fazem uma grande diferença no relacionamento dentro do grupo e no número de
descendentes que o indivíduo vai deixar.
Não é à toa que os primeiros representantes do gênero Homo eram habilidosos com
ferramentas de pedra. Quem dominasse as técnicas da pedra lascada conseguia um
meio de defesa imbatível (machados de mão), que também servia para retirar a
carne da caça e para muitas outras atividades. Aquele que construísse a ferramenta
mais eficaz poderia ser mais respeitado dentro do grupo e, consequentemente, ter
mais descendentes.
No entanto, um cérebro maior exige mais alimentos para mantê-lo, em um aparente
paradoxo. O cérebro de um primata pode consumir até 20%, ou mais, da energia
produzida pelo corpo. Para manter cérebros grandes, talvez tenha sido
imprescindível comer mais carne. E, talvez por isso, as ferramentas de pedra
ganharam importância crucial.
Pode ter sido uma espécie de círculo virtuoso: a interação social cada vez mais
complexa e necessária selecionava indivíduos mais espertos e, com cérebros cada
vez maiores, as exigências nutritivas também cresciam, exigindo uma maior
interação social para conseguir comida.
A melhor explicação para o primeiro aumento cerebral está no livro "Os Humanos
Antes da Humanidade" de Robert Foley (páginas 210 e seguintes). Apesar da
primeira parte do livro estar desatualizada, sua tese sobre o primeiro aumento
cerebral, que leva em consideração o aumento da complexidade das interações
sociais é a mais aceita hoje em dia.
Capítulo 23: Homossexualidade
Meus estudos são mais voltados para lado biológico, morfológico e cultural da
evolução humana. Tenho pouco material sobre aspectos sociológicos da préhistória. No entanto, já que estamos falando de interações sociais, vale a pena falar
um pouco sobre um tema polêmico: a homossexualidade.
Sobre a homossexualidade (termos mais adequado do que homossexualismo, que
remete a uma disfunção ou doença), há relatos de ocorrência em várias espécies.
Nos primatas, os chimpanzés e bonobos são os mais evidentes nesse aspecto.
Alguns machos bonobos praticam a esgrima peniana (ato de esfregar os pênis) e as
fêmeas fazem a mesma coisa com seus órgãos sexuais. Isso abre a possibilidade
do homossexualismo ter existido nos pré-humanos, pelo menos desde o ancestral
comum entre as espécies homo/australopithecus e pan (há 6 milhões de anos).
Devemos encarar a homossexualidade como algo sempre presente nas sociedades
humanas, pré-humanas e primatas. Mas é possível afirmar, com 100% de
segurança, que o aparecimento desse comportamento é muito anterior ao
surgimento do próprio Homo sapiens.
Capítulo 24: Os grandes antropóides antigos
Agora vou relacionar os antigos antropóides principais, que habitaram todo o mundo
em uma diversidade fascinante. Somente na África já foram identificados 14
gêneros. Viveram entre 22 milhões de anos atrás até 6 milhões de anos (fonte:
revista Scientific American Brasil - Edição Especial n.º 17 - A reportagem é do
Professor da Universidade de Toronto, Dr. David R. Begun).
24.1. Alguns gêneros de antropóides já descobertos e catalogados:
24.1.1 Procônsul (Quênia): Cônsul era nome mais popular dos chimpanzés de circo
no século XIX e início do século XX, segundo Craig Stanford. O Pró, aqui,
significaria anterior. Há muitas espécies deste gênero, de 10 Kg até 80Kg. Provável
ancestral do Gibão e do Siamang;
24.1.2. Dryopithecus (Europa): Com 19 milhões de anos. Provável ancestral dos
antropóides africanos (chimpanzés e gorilas) e dos humanos. Seu cérebro era
semelhante ao de um chimpanzé atual. Existiam, pelo menos, quatro espécies deste
gênero;
24.1.3. Sivapithecus (Sudeste Asiático): Provável ancestral dos Gigantopithecus e
dos Orangotangos (gênero Pongo);
24.1.4. Oreopithecus (Itália): Conhecido desde o século XIX. Mais estudado, dentre
os europeus. Não vou colocar todas as informações aqui, mas era grande e de
cérebro pequeno. Talvez aparentado ao Dryopithecus;
24.1.5. Ouranopithecus (Grécia): Também pode ser o ancestral comum entre os
antropóides africanos, os humanos e os antropóides asiáticos (orangotangos e
Gigantopithecus);
24.1.6. Afropithecus (Quênia): Provável ancestral dos Sivapithecus e dos demais
antropóides asiáticos, com cerca de 16,5 milhões de anos;
27.1.7. Heliopithecus (Arábia Saudita): Provável ancestral dos Afropithecus;
24.1.8. Griphopithecus (Alemanha e Turquia): Com cerca de 16,5 milhões de anos.
24.1.9. Existiram mais uns 200 gêneros (Limnopithecus, Rangwapithecus,
Micropithecus, Kalepithecus, Nyanzopithecus...)! No entanto, parece que apenas os
Sivapithecus e os Dryopithecus deixaram descendentes nos dias de hoje.
24.2. De antropóide quadrúpede a Australopithecus bípedes:
Desde 20 milhões de anos atrás, o planeta estava então habitado por centenas,
talvez milhares, de espécies de antropóides. A grande maioria andava sobre as
quatro patas (quadrúpedes), alguns com as mãos espalmadas (palmígrados), outros
sobre os nós dos dedos (nodelismo). Outros ainda, de forma braquial (usando muito
os braços, como os orangotangos). Enfim, uma diversidade incrível e riquíssima de
seres muito parecidos conosco, exceto pelo tamanho reduzido do cérebro, pela
forma de locomoção e outros detalhes.
Alguns desses antropóides evoluíram para bípedes e passaram a ser chamados de
Australopithecus. Mas houve etapas intermediárias.
Foram encontrados restos de uma espécie chamada Sahelanthropus tchadensis e
outra chamada Orrorin tugenensis. São fortes candidatos a serem os primeiros
bípedes. No entanto, o mais forte candidato, e o mais recente (4,4 milhões de anos
atrás) é o Ardipithecus ramidus, conhecido apenas como "Ardi".
Ardi é o mais famoso bípede antigo, anterior aos Australopithecus (ou pelo menos o
mais provável bípede descoberto). Depois de 15 anos de estudos sobre um
esqueleto quase completo da espécie, os cientistas divulgaram na revista “Science”,
no ano de 2009, um dossiê completo sobre Ardi e as evidências de seu bipedalismo.
O Ardipithecus ramidus ou os primeiros Australopithecus foram os primeiros
bípedes. Abaixo, as principais mudanças anatômicas pelas quais eles passaram.
Naturamente, algumas mudanças só apareceram nos Australopithecus mais
recentes, como o afarensis, mas o curso da evolução estava pressionando para o
bipedalismo, culminando no Homo erectus, já plenamente adaptado. A seguir, o
pensamento de Stanford no livro “Como nos Tornamos Humanos”:
"Ao mesmo tempo, em todos os pontos fundamentais, a pelve,
a perna e o pé demonstravam a bipedestação. A pelve
encurtava-se de cima para baixo e alargava-se da parte
dianteira para a traseira, de modo a centralizar o tronco sobre
as articulações do quadril e, assim, reduzir a fadiga durante a
locomoção bipedal verticalizada. O fêmur se inclinava para
dentro em direção ao joelho e formava um ângulo pronunciado
(ângulo conhecido como vago) com a tíbia, de forma que o
corpo podia se equilibrar numa perna enquanto a outra
estivesse fora do chão. E o pé tinha o calcanhar alargado, o
arco ascendente e o dedo grande não-divergente (não
opositor), características essenciais para que o ser humano
pudesse andar. Nos seres humanos cada passo envolve um
golpe no calcanhar, seguido pela colocação do pé sobre o arco
e, finalmente, por um impulso do dedão. Se ainda houvesse
alguma dúvida em relação a essa sequência de movimentos do
afarensis, Mary Leakey dirimiu-a com aquilo que para muitos
teria sido a descoberta de uma vida. Nas escavações em
Laetoli, sua equipe pôs a descoberto uma trilha de 27 metros
de comprimento de pegadas, deixadas por dois indivíduos
afarensis que caminharam juntos numa superfície mole que
endureceu há mais ou menos 3,6 milhões de anos. No que se
refere ao golpe de calcanhar, ao arco e ao dedão não-opositor,
as pegadas comparam-se às produzidas pelo ser humano hoje,
ao andar descalço numa base mole." (pág. 46)
Ardipithecus em comparação com os Australopithecus. Note os pés e o tamanho dos
braços:
Fonte: Revista Veja
Ardipithecus ramidus (O primeiro bípede?)
Comparação de pés
Morotopithecus. Fonte: Wikipedia
Sahelanthropus tchadensis, também conhecido como Toumai
Orrorin tugenensis
Capítulo 25. Bipedalismo:
25.1. Detonadores Falsos do Bipedalismo:
No capítulo 6 do livro "Como nos Tornamos Humanos", Craig Stanford desmonta
todas as teorias falsas sobre o surgimento do bipedalismo, que ele chama de
"detonadores FALSOS do bipedalismo":
25.1.1 Detonador ferramenta (o uso de ferramentas): Descartada logo no início,
tendo em vista que as ferramentas foram criadas pelos hominídeos muito tempo
depois (há 2,5 milhões de anos) do surgimento do bipedalismo (há 4 milhões de
anos ou mais);
25.1.2. Detonador “olhar sobre a relva”: Descartada após as descobertas de que os
primeiros bípedes viviam em florestas fechadas. Dispunha que os hominídeos que
conseguissem andar em pé na savana possuíam uma vantagem sobre os demais,
porque podiam enxergar de longe seus predadores naturais;
25.1.3. Detonador “liberar as mãos”: A marcha sobre as juntas também permite o
transporte em grande quantidade de objetos com as mãos, como atestam os
chimpanzés e os bonobos. Por isso, esse detonador não parece forte o bastante
para ter causado todas as adaptações anatômicas necessárias para possibilitar o
bipedalismo;
25.1.4. Detonador “mudanças no habitat” (de florestas para savana): vide "olhar
sobre a relva" acima;
25.1.5. Detonador cópula: Os machos eretos demonstrariam para as fêmeas um
maior domínio. "Tendo em vista as incríveis mudanças pelas quais o corpo teve que
passar e o custo envolvido em termos de sobrevivência, uma pressão evolutiva que
atinja igualmente machos e fêmeas é algo muito mais lógico", afirma Stanford.
25.2. Bipedalismo – origem – explicação:
O bipedalismo é uma das principais características que definem um hominino. Ou
seja, uma característica essencial para definir um antropóide como integrante da
linhagem pré-humana.
As evidências indicam que talvez o bipedalismo tenha surgido há mais de 4 milhões
de anos (com o Ardipithecus ramidus), embora alguns estudiosos afirmarem que, na
verdade, o bipedalismo surgiu há não mais do que 3 milhões de anos com o
Australopithecus (tais estudiosos alegam que o bipedalismo de Ardi e nos
Australopithecus mais antigos não era completo ou não existia).
Vimos que no período anterior aos Australopithecus, de 20 a 6 milhões de anos
atrás, existiam centenas de espécies de antropóides perambulando pela Terra.
Portanto, aqueles que ficaram bípedes eram minoria, com certeza. A maioria,
utilizava outros meios de locomoção, como o andar sobre as juntas,
quadrupedalismo, quadrupedalismo com as palmas das mãos (palmígrados),
dependurado com os braços (braquial), etc. O que nos interessa aqui são os que
andavam sobre as juntas. Os chimpanzés atuais ainda se locomovem assim. São
fortemente adaptados à escalada, com o polegar opositivo nos pés. Mas também
conseguem se locomover muito bem no solo. No entanto, gastam mais energia do
que nós, enquanto estão no solo. É que o andar sobre as juntas consome mais
energia do que o bipedalismo completo.
A esmagadora maioria dos mamíferos é quadrúpede. Andar sobre quatro patas é o
meio de locomoção mais óbvio, mais fácil, mais rápido, menos dispendioso em
termos calóricos e foi o primeiro meio de locomoção dos tetrápodes (animais com
quatro patas) quando saíram da água, há mais ou menos 365 milhões de anos. Ou
seja, já na transição dos peixes para animais terrestres poderíamos ter o surgimento
do quadrupedalismo.
No entanto, quando os primatas surgiram e ocuparam as árvores, ser quadrúpede
para eles não continuou sendo tão vantajoso assim. Nas árvores, eram mais
eficientes outros meios de locomoção, como braquial (dependurado pelos braços).
Aliás, esse meio braquial permite alcançar as pontas dos galhos mais frágeis das
árvores, porque o primata pode pendurar-se nele e, mesmo que ele se envergue,
não quebrará. Mas para que alcançar a ponta de galhos frágeis? Simples: para
pegar frutas mais maduras lá, ou apenas para pular para outra árvore próxima.
Então, foi nas árvores que os primatas começaram a experimentar variantes ou
alternativas para o quadrupedalismo.
Ocorre que os antropóides maiores precisavam, cada vez mais frequentemente,
descer das árvores para encontrar comida. Com isso, alguns passaram a ficar cada
vez mais tempo no solo do que nas árvores.
Para um animal quadrúpede evoluir para o bipedalismo seria, em termos evolutivos,
uma estupidez, tendo em vista as vantagens esmagadoras do primeiro sobre o
segundo em quase todos os aspectos possíveis. Mas para um animal que utiliza o
nodelismo (andar sobre as juntas) já faria algum sentido. Caso esse animal tivesse
que caminhar distâncias maiores carregando coisas, o mais lógico seria evoluir para
o bipedalismo.
Pesquisas recentes (publicados na revista científica americana “PNAS”) mostram
que o gasto de energia andando com duas pernas é só um quarto do exibido por
chimpanzés, que andam sobre os nós dos dedos. Em um experimento (foto), que
imita antigos esquemas simplificados da evolução humana, chimpanzés (em postura
quadrúpede e bípede) e uma jovem testam seu metabolismo em uma esteira. Os
autores do novo estudo coletaram medidas do metabolismo e dos detalhes do
movimento de cinco chimpanzés e quatro humanos adultos.
Percorrendo a mesma distância, os humanos usaram um quarto da energia calculada em calorias - consumida pelos chimpanzés deslocando-se sobre quatro
patas. Os chimpanzés foram também treinados para caminhar sobre duas patas. Em
média, precisaram da mesma quantidade de calorias caminhando em duas ou
quatro patas, revelaram os cientistas.
Os pesquisadores observaram, no entanto, pequenas variações na quantidade de
energia utilizada pelos primatas, de acordo com diferenças na maneira de caminhar
e na anatomia. "Conseguimos estabelecer uma relação entre o custo energético da
marcha e a anatomia dos chimpanzés", disse David Raichlen. "Também
demonstramos porque alguns deles podem caminhar sobre duas patas usando
menos calorias que os outros", acrescentou.
Modelos biomecânicos mostraram que dar passos curtos ou possuir massa
muscular mais ativa faz consumir mais energia. Ao caminhar sobre duas patas, os
chimpanzés com pernas mais longas consumiram menos energia, concluíram os
cientistas. Os resultados dessas observações foram em seguida comparados com
fósseis de ancestrais humanos, para detectar as adaptações sofridas durante a
evolução, que permitiram reduzir o consumo de energia, levando-os a se transformar
em bípedes.
"Descobrimos que essas adaptações, como um ligeiro aumento da longitude da
virilha nos primeiros bípedes fósseis, revelaram que o consumo de energia teve
papel importante" na transformação do homem em bípede, afirmaram os
pesquisadores.
Foto: Cary Wolinsky/Divulgação
Os bípedes não evoluíram diretamente dos quadrúpedes. Alguns quadrúpedes
subiram nas árvores e, lá em cima, começaram a adotar outros meios de
locomoção, transformando-se em primatas. Alguns primatas evoluíram para
antropóides. Alguns antropóides ficaram relativamente maiores e começaram a
descer frequentemente das árvores para procurar comida no solo. Os antropóides
do oeste da África permaneceram sempre em regiões muito arborizadas (préchimpanzés e pré-gorilas, por exemplo) e não se especializaram no andar bípede.
Quando desciam das árvores adotaram uma postura semi-bípede.
Outros antropóides (Australopithecus), dos lados leste e sul da África, precisaram
ficar cada vez mais tempo em solo, tendo em vista a escassez cada vez maior de
árvores, e acabaram evoluindo para bípedes.
É importante destacar que a escassez de árvores, no caso dos Australopithecus,
ocorreu depois do surgimento dos primeiros bípedes, como o Ardipithecus ou o
Australopithecus anamensis. Portanto, tal escassez, apenas catalizou um processo
já iniciado de evolução para o bipedalismo, culminando no gênero Homo,
considerado bípede completo.
Qual foi então a verdadeira pressão seletiva que levou ao bipedalismo?
Com certeza foram as adaptações para a vida arbórea, em que alguns mamíferos
começaram a abandonar o jeito quadrúpede tradicional e a experimentar outros
meios de locomoção. Quando algumas dessas espécies desceram de novo das
árvores, para procurar comida no solo, parte delas assumiu uma postura semiquadrúpede (nodelismo) e outra parte ficou em pé (bipedalismo).
Craig Stanford (“Como nos Tornamos Humanos”), no entanto, prefere outra
explicação: ainda nas árvores, os primatas precisavam se esticar para colher frutos
nos galhos mais distantes. Esse comportamento (e não a busca por comida) teria
levado ao bipedalismo.
25.3. Outras consequências do bipedalismo:
Stanford também relaciona muitas consequências (não causas) do andar ereto,
dentre as quais: a liberação das mãos e o aprimoramento da fala (um bípede não
tem sua respiração relacionada com o ato de andar, como nos quadrúpedes,
permitindo a emissão de uma gama maior de sons).
Stanford também relaciona desvantagens, como o processo de parto. Por isso ele
descreveu um parto de chimpanzé (vide próximo item). Em suma, o bipedalismo
mudou a configuração do esqueleto e, de certa forma, contribuiu para o aumento do
volume cerebral, o que dificultou sobremaneira o parto humano. Além disso, a
diferença de altura entre um quadrúpede e um bípede, faz com que o cérebro de um
bípede fique mais distante do chão, o que ajudou em seu resfriamento (um cérebro
precisa manter-se frio para funcionar direito – sem trocadilhos). A queda dos pêlos
contribuiu também para esse processo (páginas 81 e 82).
Coloquei de forma resumida os pensamentos de Stanford. Todo o capítulo 3 do seu
livro “Como nos Tornamos Humanos”, cuida desse tema de forma detalhada.
Capítulo 26: Parto de um chimpanzé (descrição) em relação ao parto humano:
Após discorrer sobre as dificuldades dos partos humanos, causados principalmente
pelo tamanho do nosso cérebro quando nascemos, Stanford descreve um parto de
um chimpanzé:
"Para os nossos parentes antropóides, porém, o parto está
longe de ser uma provação. Uma fêmea chimpanzé
experimenta um desconforto óbvio nos últimos estágios do
trabalho de parto. Ela revira o corpo de um lado para o outro,
talvez buscando a posição menos dolorosa, mas o momento do
nascimento é muito rápido, comparando à experiência humana.
A mãe chimpanzé se abaixa, tira o nascituro do canal de
nascimento e o aninha em seus braços, tudo em um único
movimento. Com os dentes, ela corta o cordão umbilical, e seu
filhote está nascido.
E tem mais: enquanto o canal de nascimento de todos os
outros primatas é uma abertura oval que vai de um lado ao
outro no comprimento e alcança diretamente a vagina, o canal
do nascimento humano também é oval, mas apenas até estar a
meio caminho da vagina. (...). O resultado disso é que a cabeça
de um bebê para sair precisa se torcer ao ser empurrada
através do canal; sem essas torções, o bebê não conseguirá vir
à luz.
Um bebê chimpanzé emerge direto e de cara para cima. Isso
permite que a mãe veja o filho e resolva problemas
inesperados. Ela pode ver se o cordão umbilical está enrolado
no pescoço do bebê e removê-lo, bem como tirar o muco da
boca e do nariz do recém-nascido. O filhote, por sua vez, pode
ajudá-la, esticando os braços para alcançá-la. Um bebê
humano, ao contrário, vem à luz de bruços, invisível e
inalcançável para a mãe. Ainda que a mãe tivesse os meios,
naquele momento, para fazer o bebê sair do canal de
nascimento, ela se arriscaria a causar danos à espinha da
criança, em função da posição da mesma. A mãe não tem
como ver o cordão umbilical nem o rosto do neném." (págs.
78/79 - livro "Como nos Tornamos Humanos).
"Uma das maiores autoridades mundiais em Neandertais, Erik
Trinkaus, da Washington University em St. Louis, Missouri,
analisou ossos pévicos de Neandertais, concluindo que o
tempo de gravidez de suas mulheres era de um ano, em lugar
dos nove meses de hoje." (pág. 180 do mesmo livro)
O parto dos humanos começou a ficar complicado a partir do segundo grande
aumento do cérebro, provavelmente, com o Homo heidelbergensis. Esse segundo
grande aumento cerebral pode ter sido proporcionado pelo aumento no consumo de
carne e, possivelmente, pelo cozimento dos alimentos, após o controle do fogo.
Certamente, as mulheres passaram a depender uma das outras na hora do parto e
isso deve ter modificado algum padrão de comportamento. Um ato antes simples,
passou a ser complexo e a depender de conhecimentos prévios e de amizades.
Algumas conclusões, portanto, podem ser relatadas:
a. A partir do Homo heidelbergensis, em que o cérebro adulto superou
significativamente os 1.000 centímetros cúbicos, começaram a surgir dificuldades
para as mulheres na hora do parto;
b. Com o surgimento do maior cérebro de todos os tempos, do Homem de
Neandertal (com 1.600 centímetros cúbicos, em média, quando adulto), essa
dificuldade foi elevada às últimas consequências;
c. O Homo sapiens, desde seu surgimento há 200.000 anos, possui ainda um outro
complicador: o cérebro é mais arredondado do que o cérebro neandertal e quase do
mesmo tamanho (1.400 cc, em média, quando adulto).
Capítulo 27: Kenyanthropus platyops: um bípede misterioso
O Kenyanthropus platyops conviveu com os Australopithecus e, para muitos, pode
ser um ancestral da humanidade, deixando os Australopithecus relegados a um
beco sem saída evolutivo. Eram seres muito diferentes dos Australopithecus, mas
também eram bípedes. Vejam a descrição de Richard G. Klein, no livro “O Despertar
da Cultura:
"À medida que a busca de fósseis prosseguir, o garhi
provavelmente não será mais a última surpresa. Meave Leakey
e sua equipe puderam comprovar tal afirmação em março de
2001, quando descreveram um crânio notavelmente novo,
oriundo de depósitos de 3,5 milhões de anos, a oeste do lago
Turkana. Antes dessa nova descoberta, a maior parte das
autoridades concordava que os fósseis humanos relativamente
bem conhecidos de entre quatro e três milhões de anos atrás
representavam apenas o desenvolvimento de uma única
linhagem - o anamensis e seu descendente imediato, o
afarensis. O novo crânio compartilha uma camada grossa de
esmalte dentário com ambos e, como todos os crânios de
australopitecos, conteve um cérebro pequeno, do tamanho do
dos macacos. No entanto, seus dentes molares eram muito
menores do que os do afarensis e do anamensis, e seu rosto
era muito mais chato, projetando-se menos para a frente. Seus
traços individuais podem ser comparados aos das outras
espécies australopitecas, mas são combinados de maneira
única, e Leakey e seus colegas o designaram como
pertencente a um novo gênero e espécie, Kenyanthopus
platyops, ou seja, "o homem do rosto chato do Quênia.
No seu rosto chato e na forma de sua sobrancelha, o platyops
antecipa um crânio de cérebro muito maior, com 1,9 milhão de
anos de idade, agora designado com freqüência como Homo
rudolfensis. A semelhança facial, no entanto, poderia ser
simplesmente uma questão de acaso, e muitos fósseis novos
serão necessários para esclarecer as relações entre o platyops,
o Homo e os australopitecos. Por enquanto, o platyops é
importante porque mostra que, como os macacos, os antílopes
e outros grupos de mamíferos, os primeiros seres humanos se
diversificaram logo no início em múltiplas formas
contemporâneas. Dentro de poucos anos, os antropólogos
podem estar se preocupando menos com a razão pela qual a
bipedestação foi bem-sucedida e mais como o que pode ter
promovido tal proliferação de espécies.
Os antropólogos discordam a respeito do tipo de relações
estabelecidas entre as espécies australopitecas que existiam
antes de 2,5 milhões de anos atrás; e a recente descoberta do
Kenyanthropus platyops só conseguiu exacerbar esse debate.
Antes da descoberta do platyops, muitas autoridades
concordavam que o Australopithecus afarensis era a única
espécie humana entre 3,5 e 3 milhões de anos atrás e que
constituía o ancestral de todos os seres humanos posteriores.
O afarensis pode ser o ancestral mais plausível de muitos ou
de todos os seres humanos, mas o platyops fornece uma
alternativa que não pode ser posta de lado a priori. Igualmente
importante, ele sugere que as novas descobertas só aumentam
as escolhas, já que revelam uma espécie adicional e não
esperada de australopiteco. Fica claro é que, quando as
ferramentas de Oldowan apareceram, por volta de 2,5 milhões
de anos atrás, o homem dividia-se entre pelo menos duas
linhagens evolutivas. Uma levou ao posterior australopiteco
robusto e a outra ao gênero Homo.”
Vejam o pensamento de Craig Stanford, no livro “Como nos Tornamos Humanos”,
sobre os Kenianthropus:
"Em 2000, uma equipe de pesquisadores de fósseis, liderada
por Meave Leakey, anunciou a descoberta de mais um troféu
para a coleção da família Leakey. Desde 1998, os cientistas
vinham desenterrando novos fósseis em um sítio chamado
Lomekwi, na margem oeste do Lago Turkana. Tais criaturas
haviam vivido bem no interior dos domínios de Lucy, o famoso
humano fóssil, e seus confrades. Os ossos dos novos
exemplares revelaram um humano dos primórdios, com rosto e
dentes que lembravam um representante primitivo do nosso
próprio gênero, o Homo. Leakey considerou o novo fóssil
diferente o bastante dos descobertos anteriormente para
receber não só o nome da nova espécie, mas também o de um
gênero totalmente novo - Kenyanthropus platyops (o homem de
rosto chato do Quênia). Os Leakeys exultaram diante de seu
novo achado, chegando a argumentar que, com seu mosaico
de características simiescas e humanas, o Kenyanthropus, e
não Lucy, poderia ter sido o pioneiro de todos nós. Além disso,
nada lhes poderia ser mais gratificante do que a nova
descoberta, dada a rivalidade de longa data existente entre a
família Leakey e Donald Johanson, que encontrara Lucy vinte
anos antes.
Os cientistas, no momento, discutem se a pretensão dos
Leakey não seria levemente exagerada, uma vez que o
Kenyanthropus pode não passar de uma pequena variante da
espécie à qual pertenceu Lucy. Sem dúvida, porém, aquele
local estava ficando mais povoado há cerca de quatro milhões
de anos, e os fatos indicam uma coisa: assim como gorilas,
chimpanzés e bonobos vivem hoje, todos, em uma mesma
região da África, muitos tipos de hominídeos arcaicos também
viveram ali um dia." (página 85/86)
Até o momento, foram descobertos poucos fósseis sobre esse novo gênero.
Portanto, o pensamento deste autor é que não há dados suficientes para afirmarmos
que o Kenyanthropus foi realmente um ancestral direto da humanidade,
desbancando os Australopithecus. No entanto, é possível que, após novas
evidências, cheguemos a essa conclusão.
Capítulo 28: Por que você não tem rabo?
Nossos ancestrais não têm rabo há mais de 18 milhões de anos. Portanto, nossos
ancestrais comuns com o chimpanzé (há 6 milhões de anos), com o gorila (há 10
milhões de anos) e com o orangotango (há 15 milhões de anos) já não tinham
cauda.
Os animais que se locomovem sobre os nós dos dedos possuem fortes adaptações
no pulso, nas mãos e nas articulações, que permitem uma locomoção eficiente, sem
dor. Um das principais adaptações é um músculo que trava o pulso durante a
locomoção e dedos mais resistentes e rígidos. Tais adaptações também reduzem
significativamente a capacidade de movimentos finos das mãos e essa talvez tenha
sido uma limitação crucial que impediu alguns hominídeos de desenvolverem
ferramentas mais sofisticadas. Nos primatas, a principal função do rabo é de facilitar
o equilíbrio nas árvores e, naturalmente, ajudar na locomoção, de galho em galho.
É mais provável que alguns primatas tenham perdido o rabo quando passaram a
andar no solo por um tempo maior. No solo, a cauda dos primatas seria mais um
estorvo do que um auxiliador. O senso de equilíbrio dos primatas sem cauda é mais
apurado, com alguma adaptação no ouvido interno (labirinto). A ausência do rabo, e
outras mudanças importantes na pelve e na coluna, proporcionaram uma locomoção
em solo mais eficiente e, mais tarde, um bipedalismo completo, com a coluna no
formato atual.
A ausência da cauda também fez com que o órgão sexual das fêmeas ficasse mais
evidente. Um grande exemplo disso é o chimpanzé atual. Quando excitadas, as
fêmeas ficam com um intumescimento característico. Esse talvez tenha sido um
catalisador importante da perda da cauda, em conjunto com as adaptações para o
andar no solo (nodelismo, principalmente).
Capítulo 29: Teorias heterodoxas
Na primeira parte deste curso, foi postada uma gravura sobre o crescimento
populacional há 50.000 anos, após o fim das grandes secas, que coincide com o
"Grande Despertar".
O Homo neanderthalensis, conforme as últimas descobertas, parecia também capaz
de evoluir para o pensamento abstrato.
O surgimento desse tipo de pensamento, desse grande salto, não depende de
teorias heterodoxas, como invasão de ETs ou algo do tipo. Seria muito mais
plausível uma modificação genética aleatória ter sido selecionada naturalmente
(seleção natural). Seria bastante plausível também acreditar que a mutação surgiu
com o gênero Homo e só encontrou condições de se desenvolver mais tarde,
quando o fim das grandes secas permitiu o desenvolvimento das atividades
humanas mais complexas.
É importantíssimo que o leitor tenha a consciência de que a ciência trabalha com
teorias baseadas em pesquisas empíricas ou teóricas, que levam em consideração o
que é mais provável. Com os conhecimentos genéticos desenvolvidos, já é possível
concluir que a Evolução não dependeu de um laboratório alienígena. É muito mais
provável que a seleção natural tenha agido sobre as mutações aleatórias,
selecionando os mais bem adaptados ao longo de milhões de anos.
As teorias que tentam explicar o surgimento do pensamento simbólico utilizam os
conceitos próprios da Evolução (mutações aleatórias e seleção natural do mais
adaptado, principalmente) para tentar explicar esses fenômenos. Não podemos
subestimar os poderes da Seleção Natural e das demais leis da Evolução, elas
realmente são capazes de criar coisas grandiosas, sem ajuda de outros fatores
externos.
Se adotarmos a teoria de uma fator exógeno para o aumento da inteligência (como o
laboratório alienígena) teríamos que resolver se esse fator começou a agir desde o
surgimento do Homo (há milhões de anos), ou se ele nos pegou quase prontos e
apenas deu uma forcinha final há 50.000 anos.
APÊNDICES:
APÊNDICE 1. Lista de espécies humanas e pré-humanas:
(Nome da espécie (local encontrado) – significado do nome)
Homo sapiens (mundo todo, origem provável na África) - Homem sábio;
Homo erectus (África, Oriente Médio, Ásia, Oceania) - Homem ereto;
Homo erectus pekinensis – Zhoukoudian (China) – Otto A. Zdansky (1921) 300.000-780.000aa – 1015-1225cc – Homem ereto de Pequim;
Homo floresiensis (Ilha de Flores na Indonésia) - Homem da ilha de Flores;
Homo neanderthalensis (Europa e Oriente Médio) - Homem do vale do rio Neander
(Alemanha);
Homo antecessor (Espanha) - Homem ancestral, antecessor;
Homo sapiens idaltu (Etiópia) - Homem sábio mais velho, o mais antigo Homo
sapiens;
Homo cepranensis (Itália, província de Frosinoe) - Homem da cidade de Ceprano;
Homo heidelbergensis (Alemanha) – homem de Heidelberg (cidade na Alemanha);
Homo rudolfensis (Quênia) – homem de Rudolf (nome anterior do Lago Turkana);
Homo rhodesiensis (Zimbábue) – homem da Rodésia (nome anterior do Zimbábue);
Homo georgicus (República da Geórgia/Ásia, cidade de Dmanisi) - Homem da
Geórgia;
Homo ergaster (África) - Homem trabalhador;
Homo habilis (África) - Homem hábil;
Paranthropus boisei (África Oriental) - Antropóide paralelo de Boisei (Boisei,
patrocinador das pesquisas da família Leakey);
Paranthropus robustus (África do Sul) - Antropóide paralelo robusto;
Paranthropus aethiopicus (pronuncia-se "etiópicus") (Etiópia) - Antropóide paralelo
da Etiópia;
Australopithecus afarensis (Etiópia e Tanzânia) - Macaco do Sul da região de Afar;
Australopithecus anamensis (Etiópia e Quênia)- Macaco do Sul beira lago;
Australopithecus africanus (África do Sul) – Macaco do Sul africano;
Australopithecus garhi (Etiópia) - Macaco do Sul surpresa;
Australopithecus bahrelghazali (Chade) – macaco do sul, de Bahr El Ghazal (um
vale no Chade);
Kenyanthropus platyops (Quênia) – antropóide do Quênia de rosto plano;
Ardipithecus ramidus ramidus (Etiópia) - Macaco de solo, da raiz;
Ardipithecus ramidus kadabba (Etiópia) - Macado de solo, da raiz, ancestral basal da
família;
Orrorin tugenensis (Quênia) - homem original dos Montes Tugen (no Quênia);
Sahelanthropus tchadensis (Chade) – antropóide de Sahel (região ao sul do Saara
que se estende desde o Oceano Atlântico até o Mar Vermelho) do Chade.
Fonte: www.paleoantropologia.com.br
APÊNDICE 2. Classificações completas de alguns primatas:
2.1. Espécies: Chimpanzé (Pan troglodytes) e Bonobos (Pan paniscus):
Domínio: Eukaryota
Reino: Animalia
Sub-reino: Eumetazoa
Superfilo: Deuterostomia
Filo: Chordata
Subfilo: Vertebrata
Infrafilo: Gnathostomata
Superclasse: Tetrapoda
Classe: Mammalia
Subclasse: Theria
Infraclasse: Placentalia
Ordem: Primates
Subordem: Haplorrhini
Infraordem: Simiiformes
Parvordem: Catarrhini
Superfamília: Hominoidea
Família: Hominidae
Subfamília: Homininae
Tribo: Hominini
Subtribo: Panina
Género: Pan
Espécies do gênero: Pan troglodytes (chimpanzé) e Pan paniscus (bonobo)
Idade do ancestral comum das espécies: 2,5 milhões de anos
Idade do ancestral comum entre o gênero Pan e o gênero Homo: 6 milhões de anos
Volume cerebral médio das espécies: 400 centímetros cúbicos.
Tempo de gestação: 8 meses
Maturação sexual: 8 a 10 anos
Tempo médio de vida em cativeiro: 50 anos
Fontes: Wikipédia e livro "Eu, Primata".
2.2. Classificação dos gorilas:
Domínio: Eukaryota
Reino: Animalia
Sub-reino: Eumetazoa
Superfilo: Deuterostomia
Filo: Chordata
Subfilo: Vertebrata
Infrafilo: Gnathostomata
Superclasse: Tetrapoda
Classe: Mammalia
Subclasse: Theria
Infraclasse: Placentalia
Ordem: Primates
Subordem: Haplorrhini
Infraordem: Simiiformes
Parvordem: Catarrhini
Superfamília: Hominoidea
Família: Hominidae
Subfamília: Homininae
Tribo: Gorillini
Gênero: Gorilla
Espécies:
Gorilla gorilla gorilla (gorilas do oeste - gorilas da planície ocidental);
Gorilla gorilla diehli (gorilas do oeste - gorilas de Cross River);
Gorilla beringei beringe (gorilas do leste - gorilas da montanha);
Gorilla beringei grauer (gorilas do leste - gorilas da planície oriental).
2.3. Classificação dos orangotangos:
Domínio: Eukaryota
Reino: Animalia
Sub-reino: Eumetazoa
Superfilo: Deuterostomia
Filo: Chordata
Subfilo: Vertebrata
Infrafilo: Gnathostomata
Superclasse: Tetrapoda
Classe: Mammalia
Subclasse: Theria
Infraclasse: Placentalia
Ordem: Primates
Subordem: Haplorrhini
Infraordem: Simiiformes
Parvordem: Catarrhini
Superfamília: Hominoidea
Família: Hominidae
Subfamília: Ponginae
Gênero: Pongo
Espécies:
Pongo pygmaeus - Orangutangos de Bornéu;
Pongo pygmaeus pygmaeus - populações do noroeste da Ásia;
Pongo pygmaeus morio - populações do leste da Ásia
Pongo pygmaeus wurmbii - populações do sudoeste da Ásia;
Pongo abelii - orangutangos de Sumatra
Obs.: A subfamília Ponginae inclui também os gêneros extintos Gigantopithecus
(três espécies) e Sivapithecus. A palavra "orangotango" vem do malaio palavras
"orang"(homem) e"(h) utan"(floresta), daí," o homem da floresta ".
Fonte: Wikipedia.org
2.4. Classificação dos gibões:
Domínio: Eukaryota
Reino: Animalia
Sub-reino: Eumetazoa
Superfilo: Deuterostomia
Filo: Chordata
Subfilo: Vertebrata
Infrafilo: Gnathostomata
Superclasse: Tetrapoda
Classe: Mammalia
Subclasse: Theria
Infraclasse: Placentalia
Ordem: Primatas
Subordem: Haplorrhini
Infraordem: Simiiformes
Parvordem: Catarrhini
Superfamília: Hominoidea
Família: Hylobatidae
Não localizei subfamílias nem tribos.
Gêneros:
Hylobates
Bunopithecus
Nomascus
Symphalangus
Várias espécies (mais de 30) distribuídas em cada gênero.
APÊNDICE 3. Algumas observações sobre a classificação dos primatas:
Os Australopithecus estão em uma mesma subtribo (hominina) - apenas os gêneros
são diferentes (Homo x Australopithecus);
Os chimpanzés estão classificados na mesma tribo do Homo sapiens (hominini),
porém em subtribos diferentes (panina X hominina);
Os gorilas já estão mais afastados, estão na mesma subfamília (Homininae), porém,
em uma tribo diferente (Gorillini);
Os orangotangos estão ainda mais afastados, estão na mesma família (Hominidae),
porém em uma subfamília específica (Ponginae);
Os gibões estão na mesma superfamília (Hominoidea), porém, já não são
hominídeos, estão na família dos Hylobatidae. Estou considerando hominídeos os
que pertencem à nossa família.
Tendo em vista que as espécies do gênero Homo e as espécies australopitecíneas
estão em uma mesma subtribo (hominina), conforme entendimento dominante,
penso ser mais adequado chamá-las, em conjunto, de hominíneas e não de
hominídeas, tendo em vista que isso incluiria um conjunto maior de espécies.
Australopithecus e Homo - mesma subtribo: hominina;
Australopithecus, chimpanzés e Homo - mesma tribo: hominini;
Australopithecus, chimpanzés, Homo e gorilas - mesma subfamília: Homininae
Australopithecus, chimpanzés, Homo e orangotangos - mesma família: Hominidae;
Australopithecus, chimpanzés, Homo, orangotangos e gibões - mesma superfamília:
Hominóidea.
APÊNDICE 4. Sugestões de leitura:
A revista Scientific American Brasil publicou no mês de março/2010 uma
interessante matéria sobre a redução dos pelos na espécie humana: "A Verdade
Nua e Crua". Por Nina G. Jablonski. "Descobertas recentes revelam as origens da
ausência de pelos nos seres humanos – e indicam que a pele nua foi fator-chave no
surgimento de outros caracteres humanos."
No mês de julho/2010 a revista (Ano 8, n.º 98) publicou uma reportagem muito boa
sobre as últimas descobertas relacionadas ao Homo neanderthalensis. Segundo
pesquisas conduzidas por João Zilhão, da University of Bristol, o Homo
neanderthalensis era capaz de ter pensamentos simbólicos! Vale a pena dar uma
lida. A matéria tem 4 páginas e uma reconstituição incrível do Neandertal. Além
disso, a mesma edição trouxe um artigo da Kate Wong sobre o Australopithecus
sediba.
A revista Scientific American Brasil já publicou diversas edições especiais sobre
Evolução Humana, além de diversas reportagens. Abaixo, um pequeno apanhado
das edições e reportagens já publicadas:
Edição Especial n.º 2 - Novo Olhar Sobre a Evolução Humana;
Edição Especial n.º 17 - Como nos Tornamos Humanos;
Edição 37 - ano 3 - março de 2005 - Reportagem de capa sobre os Homo
floresiensis;
Edição 56 - ano 5 - janeiro de 2007 - Reportagem de capa sobre Selam (nome que
significa paz, em diversas línguas etíopes), um exemplar de Australopithecus
afarensis;
Edição 84 - ano 7 - maio de 2009 - Reportagem de capa sobre o estudos genéticos
sobre as diferenças entre o homem e os chimpanzés;
Edição 88 - ano 8 - setembro de 2009 - Reportagem de capa sobre o Homo
neanderthalensis.
Edição Especial n.º 37 - A Ascenção do Homem - Com as últimas descobertas,
atualizadas até 2010.
Edição 98 - Ano 8 - Julho 2010 - Reportagem sobre Neandertais e sobre o A. sediba.
Recomendo também a leitura da revista National Geographic Brasil, edição de
agosto de 2011. Esta edição trouxe uma reportagem especial, ricamente ilustrada,
sobre o Australopithecus sediba.
APÊNDICE 5. Sugestões de Livros:
ARSUGA, Juan Luis. O Colar do Neandertal: em busca dos primeiros
pensadores. São Paulo: Globo, 2005.
CAVALLI-SFORZA, Luigi Luca. Genes, Povos e Línguas. São Paulo: Cia. das
Letras, 2003.
FOLEY, Robert. Os Humanos Antes da Humanidade: uma perspectiva
evolucionista. São Paulo: Editora UNESP, 2003.
GOLD, Stephen Jay. Dinossauro no Palheiro: reflexões sobre história natural. São
Paulo: Cia. das Letras, 1997.
KLEIN, Richard G.. (com a colaboração de Blake Edgar). O Despertar da Cultura: a
polêmica teoria sobre a origem da criatividade humana. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editora, 2005.
LEWIN, Roger. Human Evolution: an illustrated introduction. USA: Blakwell
Publish, 2005.
STANFORD, Craig B. Como nos Tornamos Humanos: um estudo da evolução da
espécie humana. Rio de Janeiro: Elsievier, 2004.
WALL, Frans De. Eu, Primata. São Paulo: Cia das Letras, 2005.
WRANGHAM, Richard. Pegando Fogo: Por que cozinhar nos tornou humanos .
São Paulo: Jorge Zahar, 2010. Original de 2009. 232 pg.
APÊNDICE 6. Para conversar com o autor:
e-mail: [email protected]
Orkut: Comunidade: Paleoantropologia (criada em 2009, com cerca de 400
membros sendo vários atuantes, contendo traduções e comentários sobre diversos
livros, revistas, sites, vídeos, etc.). Você será bem-vindo.
Site: www.paleoantropologia.com.br (mantido pelo autor e pelo Dr. Fernando
Bilharinho)
Sobre o autor: Euder Monteiro tem formação em Direito, especializado em Direito
Eleitoral. Atualmente, trabalha na Justiça Eleitoral. Há mais de 25 anos o autor
estuda a Paleoantropologia de forma independente, já tendo participado de
simpósios, palestras e outros eventos sobre o assunto. O autor possui vários livros e
revistas sobre Paleoantropologia e, com freqüência quase diária, mantém
discussões em sua comunidade no Orkut, chamada Paleoantropologia. Seu “site”,
www.paleontropologia.com.br, contém mais textos produzidos pelo autor e pelo
coproprietário do mesmo.
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