O Império da Incoerência: 167. 305 médicos “de dentro” x 5000 médicos
“de fora”
Por Ricardo Pontes - DSC- UFC
I - Dados publicados pelo Conselho Federal de Medicina*, tendo como fonte seus
registros e dos Conselhos Regionais de Medicina, mostram que de um total de
371.788 (ou 371.068) médicos brasileiros em atividade, 55% são caracterizados
como “especialistas”**, de acordo com a Regulação** das sociedades de
especialistas e dos Programas de Residência Médica (na maioria públicos,
regulados teoricamente pelo MEC, através da Comissão Nacional de Residência
Médica);
II – Em contrapartida, a partir dos mesmos dados publicados, 45% dos médicos
em atividade no país possuem tão somente o Diploma de Graduação em Medicina,
considerados para efeito do estudo citado* como “médicos generalistas”***, ou
seja, aqueles sem Residência Médica ou não portadores de qualquer Título de
Especialista conferido pelas associações médicas correspondentes a um campo
de atuação especializado, totalizando aproximadamente 167.305 (ou 166.568, de
acordo com dados discrepantes do mesmo estudo) profissionais médicos, todos
em pleno exercício de suas atividades junto á população, unicamente com o grau e
a
formação
de
graduado
em
medicina.
III – De acordo dados do Ministério da Saúde, a demanda observada no programa
“Mais Médicos” para os municípios brasileiros mais carentes mostrou a
inexistência de profissionais brasileiros interessados em se fixar nesses locais;
IV – Como parte da estratégia de suprir a carência de médicos para localidades
totalmente privadas desse profissional, o Programa “Mais Médicos” selecionou
cerca de 1000 estrangeiros, através de Edital Público, e 4000 médicos cubanos,
através de acordos internacionais, com a interveniência da Organização
Panamericana
da
Saúde
e
do
Governo
de
Cuba.
V – Causa estranheza, para dizer o mínimo - pela forma prepotente, agressiva,
hostil, pouco civilizada e com argumentos politicamente equivocados ou
preconceituosos assumidos por parte de entidades e profissionais médicos - a falta
de proporção, razoabilidade ou coerência entre o posicionamento público das
entidades médicas relativas à suposta pouca qualidade dos 5000 médicos “de
fora”, particularmente os médicos cubanos (4000), frente ao silêncio, e mesmo
omissão, quanto aos 167 305 médicos atuando legalmente no país com diploma
de medicina expedidos por faculdades em sua maioria privadas*, muitas de
duvidosa qualidade, segundo o mesmo CFM*, com registros nos CRM, habilitados
para a prática médica sem qualquer restrição junto á população brasileira: para
esses não caberia também o (RE)VALIDA, até por coerência? Ou não seria mais
justo e eficaz então universalizar a Residência Médica, oferecendo a todos os
graduados em medicina a oportunidade de especialização com financiamento
público e portanto nos serviços públicos do SUS?
NOTAS:
* Conselho Federal de Medicina, Demografia Médica, 2011 –
[in: http://www.cremesp.org.br/pdfs/demografia_2_dezembro.pdf ]
** Pediatria; Ginecologia e Obstetrícia; Anestesiologia; Cirurgia Geral; Clínica
Médica; Ortopedia e Traumatologia; Oftalmologia; Medicina do Trabalho;
Cardiologia; Radiologia e Diagnóstico por Imagem; Psiquiatria; Dermatologia;
Otorrinolaringologia;
Cirurgia
Plástica;
Urologia;
Medicina
de
Família
e
Comunidade; Neurologia; Endocrinologia e Metabologia; Medicina Intensiva;
Nefrologia; Gastroenterologia; Neurocirurgia; Infectologia; Pneumologia; Cirurgia
Vascular; Medicina de Tráfego; Acupuntura; Homeopatia; Patologia; Cancerologia;
Hematologia
e
Hemoterapia;
Reumatologia;
Patologia
Clínica/
Medicina
Laboratorial; Cirurgia Cardiovascular; Cirurgia do Aparelho Digestivo; Endoscopia;
Medicina Preventiva e Social; Cirurgia Pediátrica ; Coloproctologia ; Alergia e
Imunologia; Geriatria; Nutrologia; Mastologia; Medicina Física e Reabilitação;
Medicina Nuclear; Cirurgia Torácica; Radioterapia; Medicina Esportiva; Cirurgia de
Cabeça e Pescoço; Medicina Legal e Perícia Médica; Angiologia; Cirurgia da Mão;
Genética
Médica
[
in: http://www.cremesp.org.br/pdfs/demografia_2_dezembro.pdf ]
*** Regulação das Especialidades Médicas: Em 11 de abril de 2002, o Conselho
Federal de Medicina (CFM), a Associação Médica Brasileira (AMB) e a Comissão
Nacional de Residência Médica (CNRM) criaram a Comissão Mista de
Especialidades (CME), que estabelece os critérios para o reconhecimento e
denominação de especialidades médicas e áreas de atuação na Medicina. As
entidades também decidem conjuntamente a forma de concessão e os registros de
títulos de especialista. A relação das especialidades médicas e áreas de atuação
(que não são tratadas no presente estudo) é renovada e republicada
periodicamente. A última relação foi aprovada ela Resolução CFM 1973/2011 e
reconhece 53 especialidades e 53 áreas de atuação. A CME só analisa propostas
de criação de ovas especialidades e áreas de atuação mediante solicitação da
sociedade de especialidade, via Associação Médica Brasileira (AMB). A AMB (que
congrega as sociedades nacionais de especialidades médicas) emite apenas
títulos e certificados que atendam às determinações da CME. Os Conselhos
Regionais de Medicina registram apenas informação de títulos de especialidade e
certificados de áreas de atuação reconhecidos pela CME. Segundo o novo Código
de Ética Médica (Art. 115), é vedado ao médico anunciar título sem comprovar a
especialidade e sem registrá-lo no CRM 34. O médico só pode fazer divulgação e
anúncio de até duas especialidades e duas áreas de atuação. Os profissionais
podem responder a processos éticos perante o CRM caso exerçam especialidades
para as quais não tenham formação e habilidade, chegando a causar, por isso,
prejuízo ao paciente. O Código de Ética Médica exige que o profissional só atue
numa área que domine e prevê punição a atos caracterizados como negligência,
imperícia e imprudência. Instituída em 1977 pelo Decreto Federal nº 80.281, a
Residência Médica, cuja conclusão dá o título de especialista, constitui uma
modalidade de ensino de pós-graduação destinada a médicos, sob a forma de
curso de capacitação, funcionando em instituições de saúde, sob a orientação de
profissionais médicos de elevada qualificação ética e profissional, sendo
considerada um dos melhores instrumentos para a especialização médica. Além
de complementar a graduação, a Residência especializa e insere o profissional na
prática médica36. Em 2010 funcionavam no país 3.500 programas de Residência
Médica reconhecidos pelo MEC, que ofereciam aproximadamente 28.500 vagas
totais (em 111 denominações e em seis níveis diferentes, de R1 a R6), a maioria
em instituições públicas). A Associação Médica Brasileira engloba 53 sociedades
brasileiras de especialidades médicas, que realizam concursos de títulos
periodicamente.
[in:
idem]
**** Não há consenso entre as entidades médicas brasileiras sobre o significado do
termo “médico generalista”, nomenclatura também empregada de forma distinta
por programas governamentais. Mesmo na literatura internacional existem
diferenças significativas na definição de “generalista”, que varia conforme a
concepção dos cursos de Medicina, a organização dos sistemas de saúde dos
países e a prática da profissão médica. Em alguns países generalista é todo
especialista formado em qualquer das especialidades básicas, em outros é
sinônimo do médico de família e assim por diante. Para o presente estudo
generalista é o médico sem título de especialista. Como parâmetro recorreu-se à
Resolução CNE nº 4, de 7/11/2001, que institui as Diretrizes Curriculares
Nacionais do Curso de Graduação em Medicina que afirma, em seu art. 3º, que o
curso de Medicina “tem como perfil do formando egresso/profissional o médico
com formação generalista” . Também foi levada em conta a Classificação
Brasileira de Ocupações - CBO, do Ministério do Trabalho e Emprego, que não
atribui nenhuma especialidade ao médico generalista (Código 2251-70). No estudo
Demografia Médica, portanto, o termo generalista não se refere ao especialista em
clínica médica, esta uma especialidade reconhecida pela CME, cujo detentor do
título é denominado “especialista em clínica médica”, popularizado também como
“clínico geral” ou simplesmente “clínico”37. Tampouco o generalista aqui se refere
ao especialista em Medicina da Família e Comunidade ou ao especialista em
Medicina Preventiva e Social, especialidades igualmente reconhecidas pela CME.
No Brasil, a Clínica Médica e a Medicina da família e Comunidade reivindicam para
si o uso do termo generalista, mas tal nomenclatura não é oficializada para esse
fim pela CME. [in:http://www.cremesp.org.br/pdfs/demografia_2_dezembro.pdf ]
Prof. Ricardo Pontes - DSC-UFC
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