Os valores materiais e imateriais da paisagem: os parques nacionais brasileiros patrimônios da humanidade Onilda Gomes Bezerra O presente trabalho busca desenvolver reflexões acerca da compreensão da paisagem com bem patrimonial, enfocando os valores materiais e imateriais que lhe são atribuídos e que servem para avaliar a paisagem como um patrimônio, segundo a abordagem da conservação adotada pela UNESCO. São analisados os parques nacionais brasileiros como exemplares singulares de patrimônio natural e cultural, visto que os valores naturais e culturais, materiais e imateriais devem ser reconhecidos de forma indissociáveis. Ressalta-se a crítica de que a paisagem, segundo o critério de classificação da UNESCO, é avaliada pelo seu valor estéticovisual, considerando a beleza cênica como um valor excepcional que deve ser protegido, portanto reconhecido universalmente. Esse ponto de vista carece de aprofundamento, tendo em vista o amplo espectro do conceito de paisagem, que envolve desde as dimensões físicomateriais às imateriais, naturais e culturais. Metodologicamente, a investigação se utiliza da documentação oficial de reconhecimento dos bens pelos principais órgãos de gestão dos parques nacionais – a avaliação técnico-científica do Comitê do Patrimônio Mundial; as fichas cadastrais do IBAMA/ICMBIO – órgãos de gestão da conservação do patrimônio natural brasileiro –, e os planos de manejos dos parques nacionais brasileiros selecionados. O método adotado é a“análise de conteúdo” aplicada aos documentos específicos. É evidente nos discursos doutrinários e normativos a preocupação com a gestão integrada da conservação patrimonial, ao considerar as distintas dimensões naturais e culturais do bem. Entretanto, os mecanismos operacionais ainda estão em processo de construção. A atual abordagem da gestão do processo de conservação do patrimônio natural e cultural implementada correntemente objetiva, primordialmente, a proteção da significância ou o conjunto de valores atribuídos aos bens, seja natural ou cultural, visto como um todo integrado. O patrimônio natural, em seu sentido estrito, tem sido avaliado pelos valores atribuídos aos processos biológicos e geofísicos, bem como as belezas cênicas naturais. No entanto, observa-se que os valores do patrimônio não podem ser avaliados de forma isolada e sim como um todo sistêmico e integrado, onde o sítio é compreendido em todas as suas dimensões naturais e culturais, materiais e imateriais, dandolhe a significância. Conclui-se que, a despeito da importância dos valores atribuídos à biodiversidade, geodiversidade e à beleza cênica, destaca-se o valor dos processos socioculturais impressos nos sítios naturais, ora identificado pela sua materialidade, ora pela imaterialidade. A significância desse valor reside na relação entre os processos humanos e os processos da natureza, resultando numa intricada teia construída ao longo da história humana sobre a superfície terrestre. Relação indissociável que se estabelece de forma única no tempo e no espaço. Assim, pode-se afirmar que os parques nacionais brasileiros devem ser reconhecidos, não apenas pelos valores que a natureza primitivamente lhe imprimiu, mas também pelas inscrições e memórias humanas neles retidos, o modo de vida e as associações culturais e espirituais ali registrados, o que lhe dá um caráter singular. Nesse sentido, é necessário ampliar o debate sobre o conceito de paisagem enquanto bem patrimonial, contribuindo para dar consistência aos instrumentos de gestão da conservação integrada da paisagem, em suas múltiplas e complexas dimensões. Palavras-chave: Paisagem. Imaterialidade. Patrimônio. Valores. Significância Patrimonial.