Analisando os Arranjos Produtivos Locais sob a Perspectiva de Gilberto Freyre e Roberto DaMatta: A Dualidade entre a Casa e a Rua Autoria: Luiz Henrique Rodrigues da Silva, Fabio dos Santos Cardoso, Maria Gabriela Monteiro Resumo Este trabalho objetiva utilizar os estudos de Gilberto Freyre e Roberto da DaMatta para a análise do desenvolvimento dos Arranjos Produtivos Locais (APL) e a implementação das políticas que visem apoiá-los. Para tanto, aplicou-se o método de estudo de múltiplos casos a três APLs de moda, no estado do Rio de Janeiro, e às políticas públicas voltadas ao seu fomento. Utiliza-se na análise as categorias sociológicas propostas por Freyre e DaMatta, aplicadas aos diversos atores que integram o contexto desses Arranjos Produtivos Locais. As categorias propostas apresentam grande aderência com a pesquisa empírica, entre as quais se destacam a mediação, a dualidade e o conflito entre o indivíduo e a pessoa. Busca-se com isso, desenvolver propostas de novas formas de atuação para o Estado brasileiro no contexto dos APLs. 1. Introdução A formação da sociedade e as suas características atuais são importantes conceitos para se entender a formulação e a implementação de uma política pública, pois terão influência marcante na formação das capacidades cognitivas de seus responsáveis e daqueles que por essa política forem atingidos, proporcionando a percepção dos resultados alcançados. Como salienta Subirats (1989), os problemas, para os quais se destina uma política pública, não têm vida própria separados dos grupos que os definem. A própria probabilidade de sucesso da política depende da forma como a percebem formuladores, implementadores e aqueles que por ela serão afetados, pois sobre essas diferentes percepções se desenvolverão diferentes forças que atuarão entrando em conflito ou formando alianças contra ou a favor das ações desenvolvidas pela política. Por isso, Gilberto Freyre e Roberto DaMatta prestam uma grande contribuição ao entendimento das características da sociedade brasileira e à formulação e implementação de políticas públicas que a ela se dirigem. Essas características, ao serem elevadas à categoria estética a ser valorizada, podem levar a uma cegueira social ou insensibilidade civil, sendo capturada e domesticada até se tornar “o lado light da naturalização sociológica das mazelas e sofrimentos admitidos – quando não produzidos – pelo sistema” (GEIGER; VELHO, 2000). Nesse trabalho, os estudos desses autores são utilizados para a análise do desenvolvimento dos Arranjos Produtivos Locais (APL) e a implementação das políticas que visa apoiá-lo. A contribuição de Peter Evans reside, nesse trabalho, em mostrar como o Estado pode participar do desenvolvimento regional por meio dos Arranjos Produtivos Locais e permitir uma análise inicial dos problemas detectados na pretensa postura desenvolvimentista brasileira. Em seguida, por meio do estudo dos casos de três APL no estado do Rio de Janeiro, procura-se analisar seus desenvolvimentos, buscando identificar como se aplicam as categorias desenvolvidas por Freyre e DaMatta e como pode ser a atuação do Estado para que verdadeiramente contribua para o desenvolvimento. 2. Entre a casa, a senzala e a rua: A dualidade e a mediação A obra de Gilberto Freyre é um dos marcos na construção da identidade nacional e ponto de referência, senão de partida, obrigatório para aqueles que se propõem a entender o Brasil. O objeto principal de seu trabalho pode ser apresentado como descrever as relações 1 familiares, hábitos, costumes, ritos e crenças e a vida íntima da família na colônia, raízes fundamentais das características que a estrutura da sociedade brasileira apresenta ainda hoje. Na busca das razões que conduziram a família brasileira nascente a ter as características que seu estudo identificou, parece tomar, por teoria subjacente, a da causação circular, cuja idéia elementar é a de que, em dadas circunstâncias, tudo pode vir a ser a causa de qualquer coisa, não havendo nenhuma causa suficiente de nada (RIBEIRO, 2002, p. 25). Por isso, suas explanações sobre as possíveis causas percorrem diferentes áreas, desde o ambiente, clima, vegetação, solo, indo aos tipos humanos, saúde, atividades econômicas, origens, passando por seu modo de vida íntimo, familiar e doméstico da gente que se ocupou. Nesse seu estudo algumas categorias assumem papel importante. A principal é a da dualidade que se materializa em sua obra, a começar por seu título. A casa-grande & a senzala definem o campo teórico de produção simbólica que irá receber as influências de inúmeros fatores, que contribuirão para que, de acordo com Gilberto Freyre, ocorra a formação da família brasileira, matriz básica das relações sociais no Brasil, uma árvore cujos frutos para a sociedade se materializarão em categorias como a mediação, o patriarcalismo, o mandonismo, o patrimonialismo, o paternalismo e o bacharelismo. Suas dualidades se refletem também, ainda de maneira insipiente, ao ilustrar as diferenças de comportamento que se usava dentro da casa-grande e fora dela, na convivência em sociedade, onde Freyre (2002) mostra a tentativa de levar a ostentação para o ambiente da rua, local do indivíduo para Roberto DaMatta (1997), a fim de ser encarado como pessoa. Ainda de forma não tão objetiva, quanto Roberto DaMatta, Freyre mostra essa dualidade por diversas vezes, como quando fala do Direito Romano que governa a rua, igualando a todos como súditos do rei, e quando escreve das culturas moura e semita e da cultura trazida pela Igreja Católica, que, para ele, irão formar a base do complexo sistema de influências no interior da casa. Na formação desse sistema, da Igreja Católica viria a visão distorcida das leis em benefício próprio, por meio da ação mediadora entre a lei e o interesse e o sistema educacional. Do mouro, ou africano, a mediação africana, a aceitação do mandonismo, a forma de tratar o escravo. Freyre ressalta que a relação entre o português e o mouro, que representa as próprias relações hierárquicas das sociedades tradicionais, teria se reforçado, após a vitória cristã, quando os últimos tornaram-se escravos. Daí sua influência maior na casa. Uma espécie de aceitação da cultura no reservado, no particular, mas vergonha, ou medo, de assumi-la na rua, o que só ocorreria em público, caso adviesse vantagens. A mediação seria uma forma própria desse comportamento dual, ao se tentar encontrar o caminho menos atribulado. Do judeu ou semita, a convivência teria trazido o pensamento “racional”, calculista e astuto, para buscar, diante de situação adversa ou favorável, a solução de melhor resultado ou mais rentável para si. Viria também o dualismo da ética comercial, visível no tratamento diferenciado dos correligionários e dos estranhos, o que se aproxima do que DaMatta fala ao tratar do “aos amigos, tudo, aos inimigos, a lei”, e que são a base do patronismo e do clientelismo. Como sua herança também coloca o bacharelismo, a aristocratização por meio dos estudos, o legalismo, o misticismo jurídico e o próprio anel no dedo, uma necessidade de demonstrar não ser um simples indivíduo, mas uma pessoa. Uma crítica importante de Darcy Ribeiro (2002) foi ao comportamento conservador de Freyre, provavelmente uma herança apreendida da antropologia de Boas, coerente com a própria origem aristocrática de Freyre e com a dúvida exposta no parágrafo anterior, que se reflete na manutenção do argumento comum a toda uma antropologia colonialista, que não se presta a “dar qualquer contribuição útil para vitalizar um valor real, afirmativo das culturas oprimidas; e muito menos despertar na gente que as detém uma consciência crítica ou uma postura rebelde contra a ordem social que as explora e oprime” (RIBEIRO, 2002). Outra obra de interpretação do Brasil é a de Roberto DaMatta, que, convicto da esperança de que vale a pena correr o risco de cometer erros ao tentar interpretar o Brasil, se 2 propõe a, por meio de comparações e do estudo das dramatizações contidos nos ritos, contribuir para a formação da identidade do brasileiro. Como DaMatta (1988, p. 206) define suas raízes acadêmicas, “a antropologia (e talvez a filosofia) encontra-se do lado firme, porém ‘conservador’, da ‘estrutura’, enquanto a história, a ciência política e a sociologia ficam do outro lado do rio, de onde se vê a correnteza rápida e a fluidez das margens sempre em mutação”. Nesta passagem, inicia o descortinamento da teoria do conflito que irá marcar toda a sua obra. Desta forma, pôde vislumbrar o conflito entre a pessoa, que representa o tradicional, a estrutura, e o indivíduo, que possui em sua essência a modernidade, a mudança. Como em um estudo gilbertiano, usando o adjetivo de Darcy Ribeiro, o social forma um plano próprio que está além do estímulo material, mas igualmente aquém de uma resposta automática a todos esses elementos. O social é, pois, para DaMatta, uma espécie de miolo entre o estímulo e a resposta, entre a natureza e o grupo, entre o grupo e a pessoa. É o plano em que ocorre uma tomada de consciência, quando um elemento ganha em qualidade, podendo tornar-se veículo de toda uma elaboração grupal, mas é também o plano da liberdade, das escolhas, do futuro e da esperança. É nesse contexto entre consciência e liberdade que o social se realiza e pode promover e alimentar aquilo a que se denomina cultura, estilo ou forma social. Ao tentar encontrar a resposta para como isso se realiza, DaMatta encaminha o pensamento para a problemática do estudo dos ritos e do que são os rituais. Para ele o rito é o elemento de tomada de consciência do mundo, pelo qual o natural se transforma em social, sendo necessário para isso, uma forma qualquer de dramatização. É pela dramatização que o grupo individualiza algum fenômeno, podendo, assim, transformá-lo em instrumento capaz de individualizar a coletividade como um todo, dando-lhe identidade e singularidade. O modo básico de realizar essa dupla individualização é o que é chamado de ritual, tendo como traço distintivo a dramatização, isto é a condensação de algum aspecto, elemento ou relação, colocando-o em foco, como ocorre nos desfiles carnavalescos e nas procissões, onde certas figuras são individualizadas e assim adquirem uma nova semântica, insuspeitada anteriormente, quando eram apenas partes de situações, relações e contextos do cotidiano. Por meio desse instante privilegiado, busca-se transformar o particular em universal, o regional em nacional, o individual em coletivo; ou ao inverso, quando, diante de um problema universal, procura se mostrar a maneira individual de se resolvê-lo, pela apropriação dele sob certo ângulo e marcação com um determinado estilo (DAMATTA, 1997). Por isso, para DaMatta (1997), “o ritual é um dos elementos mais importantes não só para transmitir e reproduzir valores, mas como instrumento de parto e acabamento desses valores, do que é prova a tremenda associação – ainda não devidamente estudada – entre ritual e poder”. Mas para ele, o mais importante a ser observado no rito não é o que se repete ou qualquer substância que o individualiza e reifica, mas os contrastes expostos entre o ritual que o caracteriza e o mundo cotidiano. É essa característica que permite colocar o estudo dos rituais no mesmo nível de importância do estudo dos movimentos de mudança social, as revoltas populares e os atos que visam a libertar o homem do jugo de regras ou homens. Por isso, DaMatta mostra dois modos de estudar os rituais. Um seria tomá-lo como resposta a fatores concretos, numa relação direta com eles. Outro modo seria focar o ritual incluindo o que vem antes e depois; o ritual em sua trajetória completa, observando o conjunto de dramatizações que tornam o rito atraente e interessante, mais do que todo o aparato necessário para sua realização. O autor escolhe estudar o ritual como uma dramatização de certos elementos, valores, ideologias e relações de uma sociedade, e toma por objeto de estudo alguns rituais básicos da sociedade brasileira, a fim de apreender se, como querem alguns observadores da cena brasileira, são fatos banais, superficiais da cena brasileira ou se efetivamente ajudam a fazer “o brasil, Brasil”. Como em qualquer trabalho de interpretação, 3 DaMatta tem a consciência de que trará apenas aproximações, com muitos erros e alguns poucos acertos, mas que pela importância do assunto, considera valer a pena correr o risco. Outra importante característica do trabalho de DaMatta, segundo Oliveira (2000), é o uso da comparação, sob a inspiração de autores como Lévi-Strauss, Dumont, Leach e Turner, referenciais indispensáveis ao seu trabalho por possuírem um grande lastro teórico comum a respeito dessa modalidade de análise praticada por eles, apesar das diferenças existentes entre si. Entretanto, procura não submeter o seu pensamento a eles, ficando ao seu lado, permanecendo criativo sem alienar o contexto de que é herdeiro. O uso que faz da comparação dos elementos extraídos dos rituais, confessamente central em suas análises, circunscreve-se ao domínio do que se poderia chamar de oposições sócio-lógicas: oposições estruturadas que formam a base das relações sociais, como natureza/cultura, tempo histórico/tempo cósmico, tradicional/moderno, casa/rua, pessoa/indivíduo. Dessas comparações entre elementos surgidas principalmente do estudo do ritual do carnaval e da parada militar, surge a primeira grande categoria importante ao seu trabalho que é a dualidade, que para ele é fundamental ao entendimento da sociedade brasileira, herança da antropologia estruturalista de Lévi-Strauss. Mas para DaMatta, a dualidade não se resume à oposição estrutural entre esses elementos, mas coisifica o conflito dialético do qual se encontra encharcada a sociedade brasileira, dividida entre uma sociedade tradicional, representada pela casa e as relações personalistas que a caracterizam, e uma sociedade moderna em construção, que se inspira em modelos externos e tenta implantar, por meio das leis e da reprodução, a igualdade e a individualização; a rua com suas regras próprias. De sua passagem pelos Estados Unidos, “DaMatta conta que ficou bem impressionado com o igualitarismo americano” (AMERICANO, 2002), o que influenciou profundamente o seu modo de conceber uma sociedade onde o processo de individualização alcança o seu extremo. A partir do estudo de Dumont, tomou contato com o outro pólo, a sociedade tradicional existente na Índia, onde a personalização extratifica as classes no formato rígido das castas. Com isto identificamos outras duas categorias fundamentais no estudo de DaMatta, O indivíduo e a pessoa. Por meio das idéias de Mauss e Dumont, DaMatta parte da noção de indivíduo empírico como “realidade concreta, natural, inevitável, independente das ideologias ou representações coletivas e individuais” (1997, p. 221) para a idéia do “eu individual”, onde sentimentos e emoções o levam a pretender a igualdade e a liberdade, e o poder de optar por um deles, sendo dever da sociedade estar a seu serviço, garantindo-lhe esses direitos fundamentais. Outra vertente para qual também se encaminha o indivíduo empírico, é o eu social. Aqui a vertente não é mais a da igualdade paralela de todos, mas da complementaridade de cada um para formar uma totalidade que só pode ser constituída quando se têm todas as partes. É esse eixo que corresponde à noção de pessoa. A noção de indivíduo como unidade isolada e auto-contida desenvolvida no Ocidente, ao passo que, no Oriente e suas sociedades holísticas, hierarquizantes e tradicionais, a noção de pessoa é a dominante. Na sociedade brasileira, do encontro desses “eus” e da indecisão, surgem conflitos que a marcam, pois apesar de se compreender que o caminho do desenvolvimento social e econômico encontra-se associado ao eu individual, há o medo das incertezas que essas mudanças possam trazer ou a sedução de ser uma pessoa, mesmo que isso traga uma paralisia, ou mesmo um retrocesso, nas relações sociais. Segundo DaMatta (1988) a idéia do indivíduo no Brasil é quase sempre usada com um sentido negativo. Ser um indivíduo representa não possuir relações ou não pertencer a instituições que definam alguém que alcançou a plenitude. Normalmente, o prestígio e o sucesso de um brasileiro advêm não apenas de suas realizações, mas também da capacidade de se relacionar com pessoas importantes e tê-las como aliadas. Não cultivar relações é ser cortado do mundo social, o que pode ser uma condição muito séria. Ser um indivíduo representa também estar à mercê das regras impessoais e universais que regem a nação. 4 Assim como a pessoa e o indivíduo, a “casa” e a “rua” são categorias que, como já havia sido percebido por Gilberto Freyre, dão a nítida percepção dos complexos sociais que representam e que, no Brasil, mantêm-se em constante guerra, a imanente dialética entre um Brasil tradicional, autoritário e hierárquico, ligado à família e à pessoa (a “casa”), e o também Brasil, nação moderna, legalista, igualitária, onde todos são iguais perante a lei, que tem como elemento base o indivíduo (a “rua”). Essa dialética, segundo DaMatta, convive na sociedade brasileira, por meio de um instrumento social que representa outra importante categoria de seus estudos que é a mediação. Assim, como no estudo de Gilberto Freyre, a ação mediadora terá papel fundamental na ação de evitar o conflito, buscando o caminho mais fácil de aglutinar e justapor interesses, contornar, tratar como sem importância ou deixar a solução do problema ao acaso. Entretanto, para Gilberto Freyre, o conflito estava basicamente nas relações entre indivíduos. DaMatta consegue extrapolar os níveis de análise ao generalizar o conflito, permitindo percebê-lo na sociedade. Outro aspecto importante do estudo de DaMatta (1988) é o estudo de como se realiza a mudança social diante da dialética da casa e da rua. O “Brasil da casa” e o “Brasil da rua”, vistos isoladamente, conduzem o analista a pensar o fenômeno da mudança de maneiras diametralmente opostas. O “Brasil da casa”, a sociedade de pessoas distribuídas em estruturas hierárquicas tradicionais de poder e mando, é imune à mudança, enquanto o “Brasil da rua”, a nação dos direitos iguais e dos indivíduos regidos legalmente, leva a crer que as mudanças são tão rápidas, que basta uma lei para que a mudança se processe. Ele propõe que se teçam teorias que contemplem os aspectos modernos e os tradicionais, buscando uma maior consciência da interação entre a nação e a sociedade. Como ilustra DaMatta (1988, p. 213): “Os regulamentos burocráticos são normalmente vistos como irreconciliáveis com os modos pessoais e carismáticos de impor ordem e governar a sociedade. Tudo isto faz parte de uma teoria muito arraigada da mudança, fundada numa teoria muito estrita do conflito. Segundo esta teoria a ambigüidade e a indecisão pressionam para levar à escolha e ao conflito, e o conflito conduz à mudança”. O que se esquece neste momento, segundo o autor, é que, em sociedades como a brasileira, o conflito é atraente à sociedade, apesar de intolerável para a nação. Por isso, ao se procurar compreender coletividades como a brasileira, assim como seus fenômenos sociais, entre eles a mudança, é necessário executar uma tarefa triangular: Primeiro estudar a sociedade; segundo, a nação; e por último, e fundamentalmente, como as duas se relacionam. Como Geiger e Velho (2000) argumentam ao tratarem da contribuição de DaMatta, “a lógica ou a razão brasileira não deve ser substantivada – considerada nosso patrimônio, a ser preservado de desautenticações e ‘americanizações’”. No quadro 1, são descritas algumas características encontradas neste estudo dos trabalhos de Freyre (2002) e DaMatta (1988; 1997) ao interpretarem o Brasil, e que trazem importantes contribuições para que se entenda o desenvolvimento das políticas públicas na sociedade brasileira. Dessa forma, a sociedade brasileira está envolta em dualidades, cuja principal via de solução tem sido a mediação, o que, para DaMatta, não é suficiente, muitas vezes, para resolver o conflito, mas sim, como uma forma de acomodação entre a casa e a rua, o que reduz as oportunidades de mudanças significativas que sirvam ao desenvolvimento. No caso das relações que se dão na sociedade, essas características dificultam a ação comunitária, geram uma carência de capital social das classes menos favorecidas e dificultam a implantação da modernidade. Já nas relações entre o Estado brasileiro e a sociedade civil, agravam-se as demandas por verdadeiras ações que superem os conflitos e que não se reduzam a meras mediações entre interesses. O Estado que simplesmente exerce a mediação, procurando manter-se neutro, acaba ficando preso pela necessidade de encontrar soluções conciliadoras, que evitem a deflagração do conflito e satisfazendo aos interesses daqueles que se beneficiam com a manutenção do status quo. Suas ações acabam se tornando inócuas e 5 suas legislações letras mortas, pois não conseguem individualizar as pessoas, implantar a modernidade e permitir ao Estado uma atuação autônoma das influências dos grupos de interesse, mas inserida no contexto social e capaz de perceber como construir o desenvolvimento junto com a sociedade. Quadro 1 – Trabalhos de Interpretação de Freyre (2002) e DaMatta (1988; 1997) Interpretações da Sociedade Brasileira Raízes acadêmicas Teorias subjacentes aos estudos analisados Objeto de estudo Principais categorias Relação entre Dualidades e conflito Mediação e conflito Principais dualidades GILBERTO FREYRE Antropologia de Boas Causação circular e antropologia de matiz conservador e colonialista Relações familiares, hábitos, costumes, ritos e crenças e a vida íntima da família na colônia Dualidade Mediação Cultura do interior da casa com base nas culturas moura, semita e católica Patriarcalismo, mandonismo, patrimonialismo, paternalismo e o bacharelismo Cultura da rua com base no Direito Romano Submissão à lei (com um sentido pejorativo) Elementos em Dualidade podem conviver sem necessariamente gerar conflitos Mediação supera o conflito Superação do conflito, justapondo situações ou levando para a rua as relações que se dão na casa: parentesco, conhecimento, títulos Casa-grande x senzala Comportamentos: dentro da casa x fora da casa Cultura da casa x cultura da rua Regras legais x Patriarcalismo, mandonismo, patrimonialismo, paternalismo e o bacharelismo ROBERTO DAMATTA História e Antropologia marcada por LéviStrauss, Dumont, Leach e Turner Materialismo histórico e estruturalismo antropológico Rituais como dramatizações de valores que continuamente se reificam Dualidade Mediação Pessoa A casa Indivíduo A rua Elementos em dualidade geram conflitos Mediação não é suficiente para superar o conflito Conflito é importante por trazer Oportunidade de mudanças significativas Pessoa x indivíduo Casa x rua Tradição x modernidade Estrutura x mudança Previsibilidade x incerteza Natureza x cultura Eu individual x eu social 2.1 Evans e o Estado Imbricado: O desenvolvimento do espaço da rua Tomando por base os estudos de Evans (2004), a participação do Estado no desenvolvimento de Arranjos Produtivos Locais pode ser encarada como uma forma de política pública social e, principalmente, econômica, pois à medida que se desenvolvem novas potencialidades regionais e locais, permite-se que se alterem as desigualdades regionais e se possibilita, por meio da transformação econômica, que se modifique a própria inserção do país na divisão internacional do trabalho. A divisão internacional do trabalho pode ser vista como uma perspectiva de melhoria do bem-estar, pela qual se cada um se preocupasse em produzir aquilo que possui de melhor, todos poderiam prosperar, ao passo que tentar produzir o que outros países já produzem, diminuiria o bem-estar para todos. Outra forma de vê-la é de que serviria como uma hierarquia entre as nações, pois o posicionamento nessa divisão não seria apenas conseqüência do desenvolvimento dos países, mas também causa, pela acomodação em um determinado estágio de desenvolvimento. Utilizando conceitos de Krugman e Hirschman (apud EVANS, 2004, p. 32), Evans mostra que o desenvolvimento não é mais apenas uma trajetória local de transformação, mas uma estrutura estruturante globalizada, pois os países “desenvolvidos” são aqueles que preenchem os nichos setoriais mais dinâmicos e lucrativos e que reservam para si outros em formação, por meio de investimentos em inovação, pesquisa e infra-estrutura. Os nichos 6 menos recompensadores e dinâmicos ou a manutenção de vínculos menos desejáveis de uma cadeia produtiva são destinados aos países que ocupam uma posição menos privilegiada na hierarquia contida na divisão internacional do trabalho. Entretanto, para Evans, a construção de vantagens comparativas é tão plausível quanto o aproveitamento do potencial natural. Fazendo uso de diversos exemplos extraídos da literatura acadêmica sobre o desenvolvimento, o autor argumenta que a emergência dessas vantagens depende de um complexo processo envolvendo competição, vínculos de cooperação entre as empresas locais, políticas governamentais e de um conjunto de instituições e arranjos sociais e políticos. Para ele, as instituições políticas e sociais presentes na sociedade são fundamentais para o entendimento de como se constroem as vantagens competitivas, não se podendo ficar limitado à simples disponibilidade de recursos naturais ou à relativa escassez de diferentes fatores de produção. Assim, o envolvimento do Estado ganha relevo como uma das determinantes sociopolíticas da capacidade do país de mudar sua posição na divisão internacional do trabalho. O Estado não participa desses processos buscando apenas “gerar localmente setores com maiores taxas de lucros, mas estão também querendo gerar estruturas ocupacionais e sociais” que se associem a indústrias de maior valor agregado, esperando assim desenvolver um processo sinérgico multidimensional, um círculo virtuoso, a favor do desenvolvimento. Não obstante, Evans salienta que construir essas vantagens, apesar de possível, é muito difícil, sendo usualmente ineficazes as tentativas de se mover dentro da hierarquia global, quando a necessária capacidade estatal não é encontrada, podendo levar à destruição das bases das vantagens competitivas já existentes. Por isso, diferentemente de muitos autores que se preocupam com o grau de distanciamento entre o Estado e o mercado, Evans parte da concepção de que a intervenção do Estado no mercado é um fato e de que essa discussão, quanto a intervir ou não, confunde a questão básica quanto ao tipo de intervenção necessária para o desenvolvimento. Em seu estudo, Evans estabelece um continuum de desenvolvimento para a classificação dos Estados, com o intuito de estabelecer uma conexão entre o impacto do desenvolvimento e as características estruturais do Estado – sua organização interna e suas relações com a sociedade. Em seus pólos são dispostos dois tipos historicamente idealizados: os Estados predadores e os desenvolvimentistas. Esses tipos ideais de Estado possuem diferenças estruturais bem definidas. Os Estados predadores conseguem travar o processo de desenvolvimento, mesmo em sua dimensão mais estreita de acumulação de capital, pois não têm como impedir que os ocupantes de altos cargos busquem realizar seus próprios objetivos em detrimento dos da sociedade, tendo nas relações pessoais seu único elo de coesão social. As relações com a sociedade são relações entre indivíduos em cargos de poder e não de conexões entre o povo e o Estado como organização. Em síntese, os Estados predatórios são caracterizados por uma carência de burocracia. Já os Estados desenvolvimentistas, não apenas tem participação direta sobre a transformação industrial, direcionando-a, mas também, são em grande parte responsáveis pelo desenvolvimento. A organização interna desses Estados assemelha-se mais à burocracia weberiana que cria uma situação de compromisso e um sentido de coerência corporativa, dando um certo tipo de “autonomia”, pois ao contrário do tipo idealizado por Weber, eles não estão isolados da sociedade. A burocracia desse tipo ideal de Estado está inserida em um conjunto concreto de alianças sociais que o ligam à sociedade e provêm canais institucionalizados para negociação contínua de objetivos e planos de ação. Para Evans, nem autonomia, nem inserção iriam funcionar isoladamente. Um Estado inteiramente autônomo não seria capaz de implementar suas políticas de forma descentralizada e privada. Por outro lado, a existência de redes muito densas de interesse, ao se confrontarem com um Estado com estrutura interna frágil e enfraquecida, tornam-no incapaz de resolver problemas de “ação 7 coletiva” e de transcender aos interesses individuais de suas contrapartes privadas. Como enfatiza Evans (2004, p. 38), somente quando o Estado combina a incorporação de interesses coletivos e a autonomia é que pode ser chamado de desenvolvimentista, sendo imprescindíveis tanto a autonomia quanto a parceria. A partir do estudo da indústria ligada à tecnologia da informação (TI) surgida na Coréia, Brasil e Índia, Evans classifica a Coréia como estando mais próxima do tipo ideal desenvolvimentista, enquanto Brasil e Índia se localizariam em uma posição intermediária, mesclando características de Estado desenvolvimentista e de Estado predador. Exibiriam assim parcialmente e de forma imperfeita aproximações a “autonomia e parceria”, contando com estruturas que não impediriam categoricamente um envolvimento efetivo do Estado com a sociedade, mas que também não garantiriam a sua ocorrência. O estudo de Evans aponta a dificuldade para se estabelecer o recrutamento meritório e os poderes extraordinários para nomeações de cunho político (GEDDES apud EVANS, 2004, p. 95), como primeiros indícios de que a estrutura do Estado brasileiro é inapta para esforços desenvolvimentistas. Pela sua incapacidade de transformar a burocracia como um todo, os líderes políticos tentam criar “bolsões de eficiência” dentro da burocracia, modernizando o aparato do Estado por adição, não por transformação. Dependência dos integrantes desses bolsões em relação à capacidade dos promotores desse esforço por eficiência em protegê-los, seletividade estratégica mais difícil, expansão descoordenada do Estado, da qual emerge uma estrutura cada vez mais irracional, desconexa e ineficiente, são algumas das desvantagens dessa estratégia. Adiciona-se a isso, o caráter intermitente das carreiras dos funcionários, pois se defrontam com carreiras irregulares, pontuadas pelos ritmos nas mudanças na liderança política e pela criação periódica de novas organizações, mudando de agência a cada quatro ou cinco anos. Não há compromisso com os escalões superiores, pois normalmente são preenchidos por funcionários de fora da agência, da mesma forma que se torna difícil estabelecer-se regras de conduta que possam atuar eficientemente para restringir as estratégias orientadas para o ganho pessoal. Para Evans, a eficiência do Estado brasileiro em sua presença no desenvolvimento social e econômico manteve-se dependente da cooperação das oligarquias (URICOECHEA apud EVANS, 2004, p. 97). A simbiose tradicional que conectava as oligarquias tradicionais ao Estado tem sido reforçada por uma perversa “modernização”. O persistente poder político da oligarquia tradicional não apenas distorce as tentativas de transformação, mas também sabota as tentativas de reforma interna. Mesmo durante o regime militar, provou-se ser incapaz de construir um relacionamento do tipo “orientação administrativa” com a elite industrial local por meio de um sistema de vínculos institucionalizados. Em vez disso, os relacionamentos se tornaram individualizados, tomando a forma de “anéis burocráticos” (CARDOSO apud EVANS, 2004, p. 98), isto é, pequenos grupos de empresários individuais conectados com burocratas individuais, vínculos pouco confiáveis e arbitrários em termos de seus resultados. 3. Os Arranjos Produtivos Locais O estudo e o debate acerca de aglomerações e distritos industriais, os clusters, tiveraminício com a obra de Alfred Marshall (1996). Em seu trabalho, o autor americano destacava os ganhos dos distritos industriais ingleses com a especialização na fabricação de determinados produtos. Após essa obra, o tema clusters, perdeu importância no debate acadêmico. A retomada da pesquisa sobre a relevância das pequenas e micro-empresas (PME) para a economia e o desenvolvimento local ocorreu com a publicação do trabalho de Piore e Sibel (1984), aproximadamente oitenta anos depois da obra seminal de Marshall (1900). Esses pesquisadores destacaram o quanto as empresas de micro e pequeno porte são relevantes para a economia de um país e de uma região, mais especificamente no caso dos distritos industriais 8 do norte da Itália. Desde então, o debate sobre clusters retornou a mainstream da pesquisa acadêmica nas áreas de economia, economia industrial e políticas públicas. No Brasil, o debate sobre essa forma específica de atividade econômica e arranjo social teve como marco inicial a criação da REDESIST1, em 1997. Essa organização, com sede na Universidade Federal do Rio de Janeiro, constitui-se em uma rede de instituições de pesquisa e ensino brasileiras, que tem como objetivo a pesquisa sobre Sistemas Inovativos e Produtivos Locais. Coube aos pesquisadores desse grupo desenvolver o termo em português que traduz o conceito de clusters. Esse termo é o Arranjo Produtivo Local (APL), definido como sendo aglomerações territoriais de agentes econômicos, políticos e sociais – com foco em um conjunto específico de atividades econômicas – que apresentam vínculos mesmo que incipientes (Cassiolato e Lastres, 2003). Ainda que, no conjunto de estudos e pesquisas desenvolvidas em todo mundo, representem mais um termo e uma definição sobre pólos e distritos industriais e aglomerações econômicas, nesse trabalho, esse foi o conceito de Arranjos Produtivos Locais (APL) escolhido, por tomar, como premissa básica, a existência de vínculos, mesmo que incipientes, entre os agentes econômicos locais. A literatura a cerca do tema APL é abrangente e enfoca várias temáticas, desde a questão do desenvolvimento sustentável e preservação ambiental até as questões de cooperação e construção de relações de confiança entre empresários integrantes dessas aglomerações. Essa última é de intensa relevância para o presente trabalho, uma vez que a existência ou não de tais relações de confiança e cooperação no âmbito local envolvem diretamente o desenvolvimento do APL. Porém, ao se analisar as relações entre empresas em um mesmo APL, é importante considerarmos que tais empresas estão inseridas no sistema capitalista de mercado, de tal forma que a competição é um fator presente e inseparável de suas atuações. Dessa forma, no estudo dos temas cooperação e associativismo nos casos pesquisados, deve-se destacar que as empresas estão imbuídas de uma lógica capitalista que prima pela concorrência de mercado. Mas essa lógica não impede a constituição de laços cooperativos que ao longo do tempo podem auxiliar no desenvolvimento do APL, já que a cooperação pode resultar em ganhos para todas as empresas, como menor preço na compra conjunta de matéria prima e treinamento de mão-de-obra. Assim sendo, o desenvolvimento de laços cooperativos por parte dessas mesmas empresas, tende a ser um processo não muito simples e nem facilitado. Segundo Amorim (1998), a cooperação pode evoluir da competição, uma vez que, mediante a necessidade de se manterem competitivas, as PMEs necessitam cooperar. A autora também destaca o fato de a cooperação ter como pressuposto a existência da confiança entre os integrantes de um APL, vislumbrando ganhos futuros. Porém, a ausência de uma cultura associativa pode não representar o fracasso e declínio de aglomerados de empresas. Essa consideração é relevante uma vez que o setor estudado, o de moda-vestuário, é extremamente competitivo e suas empresas, as grifes, atuam de forma individualizada, objetivando a captação de clientes por meio de produtos exclusivos de suas respectivas marcas. Por conseguinte, a cooperação e o associativismo serão analisados nesse trabalho com base nas evidências empíricas obtidas na pesquisa de campo. Cabe destacar que essas análises consideram que a cooperação e o associativismo podem ser desenvolvidos por meio de relações de confiança, ou também na ausência dessas mesmas relações. A confiança, nesse trabalho, é baseada em Locke (2001, p. 254-5), que considera duas definições para esse termo. A primeira segue uma abordagem sociológica, na qual a confiança é a resultante de processos históricos de compromissos cívicos e interações associativas extrafamiliares. Na segunda definição, sob a perspectiva econômica, define-se confiança como a busca da maximização do interesse individual de cada autor envolvido, em um dado contexto, por meio dos ganhos obtidos com sua adesão a um determinado grupo com interesses similares aos seus. 9 Ao considerar como necessário o entendimento da constituição da sociedade brasileira para a formulação de políticas públicas, as análises desse trabalho levam em conta as definições de confianças elaboradas por Locke (2001). A questão da confiança permeia o processo de desenvolvimento dos APLs uma vez que a existência ou ausência dela pode determinar o insucesso de políticas públicas de apoio ao desenvolvimento dessas localidades. 4. Metodologia A metodologia utilizada nesse trabalho é o estudo de caso múltiplo (Yinn, 2001). Com sua escolha, objetivou-se realizar análises comparativas entre diferentes realidades, como forma de se obter conclusões quanto à influência de algumas das características da sociedade brasileira, apontadas por Freyre e DaMatta em seus estudos, no desenvolvimento de APLs e nas políticas públicas voltadas para seu fomento. A unidade de análise adotada é o Arranjo Produtivo Local. Essa escolha foi feita com o objetivo de comparar as dinâmicas locais dos arranjos pesquisados, de forma a evidenciar ocorrências de ações que tipificassem a influência de características da sociedade brasileira no desenvolvimento local. Foram pesquisados três APLs de moda do estado do Rio de Janeiro. O segmento de moda foi escolhido por ser um dos que mais cresce no Brasil e de maior competitividade, via internacionalização das empresas brasileiras, fabricantes de moda. Nesse contexto, o presente trabalho analisa como os APLs de moda constituídos por micro e pequenas empresas se adaptam ao cenário de competição e internacionalização do mercado de moda, tendo em conta, a atuação de instituições de apoio para a implantação de políticas públicas de desenvolvimento local. Os três APLs pesquisados foram os seguintes: moda-praia, localizado em Cabo Frio; jeans, localizado em São Gonçalo; e moda feminina, localizado em Niterói. O arranjo de Cabo Frio, teve início na década de 1960, com a formação de confecções informais em casas de famílias de pescadores, nas quais os biquínis eram produzidos. Nos anos 1980, essas confecções passaram a se concentrar em um bairro do município, o bairro da Gamboa, no qual foram construídas lojas e confecções formais. Em 2002, mediante uma ação direta da prefeitura municipal de Cabo Frio, a área na qual as lojas e confecções estavam concentradas sofreu uma significativa reforma em sua infra-estrutura, o que incrementou significativamente o número de visitantes ao local, bem como o número de vendas no varejo. Por sua vez, o arranjo de moda jeans de São Gonçalo teve início com o agravamento do esvaziamento econômico sofrido por aquela cidade entre o final dos anos 1970 e 1980. Com vários trabalhadores sendo demitidos de estaleiros e fábricas da região, as famílias utilizavam o dinheiro proveniente das indenizações trabalhistas para montarem suas confecções informais. Nessas confecções, eram fabricados essencialmente artigos de jeans (calças, jaquetas, bermudas, saias e vestidos). Com a hiperinflação na segunda década dos anos 1980 e o Plano Collor em 1990, várias empresas faliram e o arranjo sofreu significativos encolhimento e redução da atividade produtiva. Somente uma década depois o setor de vestuário-confecção gonçalense apresentou recuperação. Em 2003, algumas empresas da região passaram a buscar apoio de instituições como o Sebrae e o Banco do Brasil para melhorarem os processos de design e de gestão empresarial. Em Niterói, o arranjo produtivo de moda feminina, tal como é hoje resultou das mudanças sofridas por aquela cidade após a fusão dos estados da Guanabara e Rio de Janeiro na década de 1970. Com a perda do status de Capital Estadual e o esvaziamento econômico do centro da cidade, em função da construção da Ponte Rio-Niterói, as empresas de moda, até então localizadas nas principais avenidas do referido centro, se deslocaram para a Zona Sul de Niterói. Esse movimento promoveu a concentração das lojas de moda na Rua Moreira César, no bairro de Icaraí. Além de incrementar a competitividade, esse fenômeno promoveu a 10 integração das empresas de moda locais com as grandes grifes de moda da cidade do Rio de Janeiro. Estilistas e modelistas passaram a atravessar a ponte Rio -Niterói para morar ou fazer negócios com as empresas de moda niteroienses. Esse movimento resultou em ganho de visibilidade das empresas locais, que se tornaram expoentes da moda fluminense em geral a partir da segunda metade da década de 1990. Esses breves históricos sinalizam com um cenário comum para os três APLs pesquisados: crescente competitividade e necessidade de apoio institucional para desenvolvimento e/ou aprimoramento da atividade produtiva de moda nas respectivas localidades. Em face desse cenário, são analisadas a seguir as atuais dinâmicas locais tendo em conta as categorias de Freyre (1988) e DaMatta (2002) e a cerca da sociedade brasileira, considerando seu impacto sobre o desenvolvimento desses APLs. 5. A dinâmica nos Arranjos Produtivos Locais: a Casa X a Rua. Nos três APLs analisados, foi evidenciada a presença intensa de elementos sociais categorizados por DaMatta (1988) e Freyre (2002). Esses elementos foram identificados nas ações e formas de atuar de determinados grupos de atores sociais integrantes da dinâmica local dos APLs. Esses atores sociais são as associações de micro e pequenos empresários, que representam as parcelas produtivas dos três arranjos; as instituições de apoio ao desenvolvimento desses arranjos, tais como Sebrae, Banco do Brasil e Correios; e a representação do poder local, as Prefeituras Municipais, com seus funcionários responsáveis por fornecer suporte aos APLs. Os grupos de atores sociais descritos acima são analisados a seguir, tendo, como categorias iniciais de análise, as propostas por Freyre e DaMatta: a dualidade, a mediação, a casa e a pessoa e o indivíduo e a rua. Essas categorias foram escolhidas por terem sido as que apresentaram maiores evidências no habitus dos atores investigados durante a pesquisa de campo. Serão apresentadas também outras categorias que tenham sido identificadas durante a pesquisa. 5.1 As classes empresariais locais Nos APLs de Cabo Frio, São Gonçalo e Niterói foi evidenciada a existência de categorias em comum aos três e categorias específicas nas classes empresariais locais em cada um dos casos. As categorias identificadas, como presentes nos casos, foram três: a pessoa e a casa, o indivíduo e a rua e a dualidade. As classes empresariais dos três arranjos apresentam dificuldades de interação entre seus pares em cada localidade. Em geral o micro e pequeno empresário integrante desses três APLs se considera uma pessoa, segundo a definição de DaMatta (1988). Uma pessoa detentora de poder sobre um específico grupo de subordinados, seus funcionários, e conta com uma determinada rede de contatos com outras pessoas influentes na localidade, que podem ser vereadores, comerciantes, funcionários públicos com algum poder em repartições locais. Para o empresário, a necessidade de se associar e atuar de forma cooperativa com outros proprietários de empresas é vista como uma dualidade. Há a necessidade econômica de atuar em conjunto para manter a competitividade de seu negócio. Mas a aceitação dessa atuação de forma cooperada implica na perda de parte do poder por parte do empresário. É quando ele se depara com a obrigatoriedade de agir como indivíduo em determinado grupo da localidade onde possui poder, o grupo empresarial local. Nesse momento é percebida a existência de uma intensa dualidade, ocorrendo um conflito, por parte do empresário, entre as duas posturas e os interesses que envolvem. Ou ele opta por interagir em patamar de igualdade com os seus pares nas associações empresariais locais, aceitando as diretrizes e propostas de políticas públicas de desenvolvimento local, ou se mantém isolado e conserva o 11 seu poder. Essa dualidade representa o conflito entre a pessoa, detentora de poder em sua casa, entendida aqui como sua empresa, composta por seus funcionários, e o indivíduo, um integrante de uma coletividade igualado a seus pares, e que participa de um espaço comum, a rua, vista aqui como a associação de empresários locais, ou a entidade de governança do APL. Essa dualidade entre a pessoa e o indivíduo, entre a casa e a rua, não cessa como uma simples escolha por parte do empresário, que poderia optar por uma das categorias para cada situação: ser uma pessoa em sua casa, a empresa, e um indivíduo na rua, a associação de empresas. Em virtude dessa ausência ou indefinição de escolha sobre qual papel adotar, o empresário, muitas vezes, promove situações nas quais manifesta seu interesse em se manter pessoa e tenta levar as características de atuação em sua casa, a empresa, para a rua, a associação, buscando cooptar seus pares para a obtenção de benefícios individuais ou até mesmo prejudicando o movimento da associação local, por considerá-la capaz desconsiderando que possa constituir uma ameaça ao seu poder no arranjo. Como categoria específica foi evidenciado o mandonismo, presente entre os empresários dos APLs de Cabo Frio e Niterói. Em Cabo Frio, o mandonismo se manifesta por meio de algumas lideranças locais compostas por empresários com maior poder econômico. Esse subgrupo, pertencente ao empresariado local, atua de forma a cooptar proprietários de empresas menores, carentes de recursos e com escala de produção reduzida. Em determinados casos, nos quais algumas empresas buscam resistir a essa forma de atuação, sofrem sanções por parte desse subgrupo. Em Niterói, há a presença do mandonismo, manifestado na atuação da organização de governança do APL. O grupo de empresários integrantes da diretoria busca, por meio dos poderes conferidos a eles por instituições de apoio, perpetuar-se na direção do arranjo, praticando o mandonismo junto às demais empresas associadas, ao beneficiarem seus “afilhados” com a participação em feiras de negócios e reportagens sobre o arranjo e limitarem a visibilidade a empresas contrárias a essa prática. A existência das categorias gerais e das específicas é evidência de que a cultura de cooperação entre o empresariado integrante de APLs de moda ainda está distante de uma prática efetiva. Somente no caso de São Gonçalo, foi evidenciada a existência, ainda que incipiente, da busca pela construção de relações de confiança por parte da classe empresarial local. Essa construção de confiança segue a segunda definição de Locke (2001) pela qual a perspectiva econômica define a confiança como sendo a busca da maximização do interesse individual de cada autor envolvido em um dado contexto, por meio dos ganhos obtidos com sua adesão a um determinado grupo com interesses similares aos seus. Nos outros dois casos essa busca com base na perspectiva econômica é suplantada pelos interesses dos empresáriospessoas, na busca de manterem a casa dentro da rua. 5.2 As instituições de apoio Os representantes das instituições de apoio aos APLs estudados apresentam características de atuação social que se enquadram em uma específica categoria proposta por Freyre (2002): o bacharelismo. Sendo esses representantes membros de burocracias, eles são encarados pelos demais integrantes da localidade como os “especialistas”, os doutores em determinado assunto (crédito, exportação, gestão ou marketing). Essa percepção, por parte da classe empresarial local e pelo poder público, reforça a visão desse grupo como sendo o grupo dos “doutores” descrito por Freyre, os possuidores do “anel no dedo”. Em função dessa visão deturpada, muitas vezes, o poder local e a classe empresarial do arranjo vislumbram, na ação desse grupo de representantes de entidades de apoio, a solução quase que instantânea de seus problemas e entraves para o desenvolvimento local. Por sua vez, os grupos de representantes de instituições de apoio, em sua maioria, trabalhando na capital do estado do Rio de Janeiro, se mostram imbuídos quase que exclusivamente de uma cultura da rua (DaMatta, 1988), segundo a qual as leis são soberanas e todos são indivíduos 12 submissos diante delas. Ao entrarem em contato com uma realidade na qual o que prevalece é a casa e a pessoa do empresário, ocorrem impasses nas ações. De um lado, os representantes de instituições como Banco do Brasil, Correios e Sebrae buscam implantar soluções e apresentar alternativas homogeneizadas e lineares para o desenvolvimento da respectiva localidade. De outro lado, está a classe empresarial, com seus subgrupos e o poder local, interessados em soluções específicas que atendam não à rua, à coletividade, mas a cada uma das pessoas, seus interesses particulares e, em alguns casos, coletivos. Esse impasse nas ações é prejudicial para o desenvolvimento dos APLs, pois o não atendimento dos anseios dos empresários e do poder local gera descrédito das instituições junto a estes dois grupos de atores sociais. A reversão desse impasse ocorre somente quando cada instituição apresenta soluções ou serviços específicos, formatados para aquela localidade. Contudo, essa mudança de atuação por parte das instituições de apoio é lenta, em função da necessidade de se alterar algumas regras gerais que a instituição de apoio possui para operar de forma em geral. A criação de serviços que atendam realidades duais, casa-rua, é dificultada pela orientação da respectiva instituição de apoio, orientação essa norteada pela submissão às leis, com base no que governa o ambiente público, a rua que iguala a todos. 5.3 As Prefeituras Municipais: o poder público local Os representantes eleitos do poder público local nas três cidades onde os APLs estão localizados, Cabo Frio, São Gonçalo e Niterói, apresentam, em sua forma de atuar junto à sociedade, características que evidenciam a presença de uma categoria identificada por DaMatta (1988) e Freyre (2002): a mediação. Os prefeitos, vereadores e secretários, em especial, os de desenvolvimento econômico ou indústria e comércio, desempenham papel de mediadores e apaziguadores dos conflitos que emergem nas dinâmicas dos APLs. A atuação do poder público dessa forma é muito mais uma prerrogativa que uma opção. Pelo fato de necessitarem de uma validação junto ao eleitorado da localidade, os representantes do poder público buscam atuar de forma a não desagradar os interesses dos grupos de empresários locais, ao mesmo tempo em que buscam atrair a participação de instituições de apoio para o desenvolvimento da localidade. Essa busca mútua acarreta em um primeiro momento a satisfação por parte dos empresários locais. Porém, o descontentamento ocorre quando essas mesmas instituições apresentam propostas de ação que colocam em cheque o poder dos empresários na localidade, ou seja, buscam ampliar a presença da rua em relação à casa. Nesse contexto conflituoso, o poder público, que contou com o apoio do empresariado local para chegar ao poder e solicitou a atuação das instituições de desenvolvimento, se encontra em uma posição de mediador, na qual lhe cabe unicamente o papel de conciliador entre interesses duais, que podem ser interesses divergentes entre dois subgrupos de empresários ou entre subgrupos de empresários e instituições de apoio, ou entre instituições de apoio e todo o grupo de empresários da região. Se por um lado, o poder público consegue com essa mediação se manter no poder por mais de um mandato, quatro anos, por outro, não consegue realizar significativas mudanças na localidade que governa. Há uma preservação das lideranças locais, uma manutenção de desigualdades econômicas e uma imobilidade do Estado, representado aqui pela prefeitura municipal. As mudanças são pontuais e de caráter incremental, sendo resultado de ações personificadas por determinados representantes do poder público. As obras de infra-estrutura ou ações de apoio ao APL não são consideradas ações do Estado, mas sim ações do Prefeito A de tal, do vereador B ou do secretário C. Assim, a existência de anéis burocráticos dentro do aparelho estatal, salientada na obra de Evans (2004), se perpetua no âmbito municipal. 6. Conclusão 13 Ao final do presente trabalho é possível realizar algumas conclusões sobre as causas de insucesso de políticas públicas, no âmbito dos arranjos produtivos locais, os APLs. Os referenciais teóricos de DaMatta (1988) e Freyre (2002), apresentam grande aderência com a pesquisa empírica realizada nos APLs de moda fluminense. A nítida presença de práticas mandonistas e bacharelistas, bem como a atuação mediadora do Estado, foram identificadas nas análises dos dados coletados no trabalho de campo. Diante desse contexto local imbricado, com uma densa teia de interações sociais e valores específicos, uma questão emerge quanto às políticas públicas de fomento do desenvolvimento desses APLs: como implementar políticas eficazes e eficientes que respeitem as leis, a rua, mas que consigam promover o desenvolvimento da localidade, repleta de valores existentes na casa? A resposta para essa questão não é simples e demanda uma nova pesquisa para a obtenção de dados capazes de indicarem, mediante análises, quais alternativas são possíveis para que o Estado possa atuar de forma realmente desenvolvimentista no contesto dos APLs. Cabe destacar que a imobilidade do Estado, no âmbito municipal, em função de seu papel mediador, acarreta uma configuração predatória do mesmo, pois, ao deixar de promover o desenvolvimento, ele proporciona o subdesenvolvimento mediante a manutenção do status quo local. Apesar da necessidade de uma nova pesquisa, é possível com base no investigado até aqui, identificar alguns indícios de alternativas para a implementação de políticas públicas eficazes e eficientes no âmbito dos APLs. Uma primeira alternativa passa pela necessidade da reforma estatal. Por não contar com uma agência estadual de desenvolvimento, o estado do Rio de Janeiro apresenta um significativo insulamento entre governos municipais e governo estadual. Em função desse insulamento, os governos municipais contam, na dinâmica interna dos APLs, somente como mediadores. A presença de uma agência estadual de desenvolvimento, exercida no passado pelo Banco do Estado do Rio de Janeiro, possibilitaria ganho de força do governo municipal na localidade em que atua, de tal forma que fosse capaz de promover mudanças necessárias para a expansão da atividade econômica local e incremento do desenvolvimento social. A segunda alternativa seria a mudança do modus operandi da esfera federal do poder público. Desde a criação das instituições de apoio ao desenvolvimento local, Banco do Brasil, Correios e Sebrae, as decisões e implementações de ações com base em políticas públicas vigentes, seguem perspectivas de cima para baixo (top-down), na qual um conjunto de burocratas na administração central, elabora propostas para a criação de serviços destinados a atenderem diversos segmentos do mercado, dentre eles, as pequenas e micro empresas localizadas em APLs. Esse insulamento da burocracia também é responsável pelo insucesso das políticas públicas no âmbito dos APLs, pois as propostas são elaboradas desconectadas das realidades dessas localidades. É planejada a adoção de ações adequadas à rua, em localidades nas quais prevalece a lógica da casa. Ao mudar a forma de agir, o Estado, seguindo uma perspectiva de baixo para cima (down-top), proporcionaria nas suas instituições de apoio a adoção de um novo modus operandi, no qual a formatação de serviços e soluções seria feita mediante consultas prévias a grupos amostrais de determinados segmentos, tais como os APLs. Esse contato com o cliente final do serviço público evitaria o retrabalho de remodelagem dos serviços oferecidos pelas instituições de desenvolvimento local, gerando assim ganhos de escala em todo o território nacional. Contudo, essas mudanças serão possíveis somente com a alteração da forma de atuar do Estado Brasileiro, que cada vez mais se enquadra na perspectiva predatória de Evans (2004), por não promover o desenvolvimento de localidades e manter-se imobilizado no papel de mediador e conseqüentemente de mantenedor do status-quo. Cabe à mesma sociedade brasileira, que padece com essa forma de ação estatal, demandar dos governantes a mudança de seu papel de mediador para promovedor de desenvolvimento econômico e social. 14 Referências BibliográficasAMERICANO, Paula. A antropologia de um Brasil não oficial. Disponível em: <http//cienciahoje.uol.com.br/controlPanel/matéria/view/1615> Acesso em: 21 set. 2005. AMORIM, Mônica. Clusters como estratégia de desenvolvimento industrial no Ceará. Fortaleza: Editora Banco do Nordeste, 1998. CASSIOLATO, José Eduardo. LASTRES, Helena. SZAPIRO, Mariana. Arranjos e Sistemas Produtivos Locais e Proposições de Políticas Públicas de Desenvolvimento Industrial e Tecnológico. Seminário “Local Clusters, Innovation Systems and Sustained Competitiveness”. IE-UFRJ e BNDES. Nota técnica 27. Rio de Janeiro: 2000. ______. O foco em arranjos produtivos e inovativos locais de micro e pequenas empresas. In: Pequena empresa: Cooperação e desenvolvimento local. CASSIOLATO, J. E. LASTRES, H. M. 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