MARIA LUÍSA BARCA GAZETTA
DAS MULHERES DE PRETO AO COLORIDO
DAS MULHERES. O QUE SERÁ O AMANHÃ?
FRANCA
2006
MARIA LUÍSA BARCA GAZETTA
DAS MULHERES DE PRETO AO COLORIDO
DAS MULHERES. O QUE SERÁ O AMANHÃ?
Tese apresentada ao Programa de PósGraduação em Serviço Social da Faculdade de
História, Direito e Serviço Social da Universidade
Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho",
Campus de Franca, para a obtenção do título de
Doutor em Serviço Social Área de ConcentraçãoTrabalho e Sociedade. Orientadora: Prof. Draa.
Noemia Pereira Neves.
FRANCA
2006
Gazetta, Maria Luisa Barca
Das mulheres de preto ao colorido das mulheres. O que
será o amanhã? / Maria Luisa Barca Gazetta. – Franca:
UNESP, 2006
Tese - Doutorado - Serviço Social - Faculdade de
História, Direito e Serviço Social - UNESP.
1. Envelhecimento. 2. Mulheres viúvas. 3. Mulher - Participação social. 4. Relações de gênero.
CDC – 362.6
MARIA LUÍSA BARCA GAZETTA
DAS MULHERES DE PRETO AO COLORIDO
DAS MULHERES, O QUE SERÁ O AMANHÃ?
COMISSÃO EXAMINADORA
TESE PARA OBTENÇÃO DO TITULO DE DOUTOR
Profª Drª Noemia Pereira Neves .....................................................
Presidente Orientador(a)
Profª Drª Íris Fenner Bertani ..............................................................
Profª Drª Maria Zita Figueredo Gera ..................................................
Profª Drª Maria Aparecida Motta .........................................................
Profª Drª Cláudia Regina R. de Lemos ................................................
Franca, 17 de março de 2006.
Dedicatória
Agradecer... e eu me pergunto, como expressar à Profª Drª. Noemia Neves
o que me vem à alma, quando revejo o caminho percorrido por nós e
reconheço os frutos recolhidos ao longo dele: o respeito, a amizade, o apoio,
a compreensão, o estímulo, o diálogo e a reflexão... que resultaram por um
lado na organização e sistematização de minhas idéias, concretizadas
nesse estudo e por outro em meu enriquecimento pessoal. Dificilmente
existirão palavras, talvez o gesto de dedicar-lhe o meu trabalho possa
palidamente lhe dizer dos meus sentimentos.
A. Mamis" meu referencial de pessoa, profissional e intetectual que
por todos esses anos pacientemente tem colaborado com minha evolução..
Ao Marcos, companheiro de aprendizado e jornada, com carinho,
por expressar por meio da compreensão das inquietações de minha mente
seu afeto e respeito por mim.
Ao Bruno, filho amado, com quem aprendo todos os dias a ser mãe e
uma pessoa melhor.
Aos meus familiares acompanhantes desse processo de crescimento,
compartilho a vitória por chegar ao final de mais uma etapa. Ao meu pai,
a saudade e o reconhecimento de que graças a sua visão de mundo, sentime motivada a buscar as pessoas, o conhecimento, a mim mesma.
Em especial "nona Luiza" com seus 94 anos de vida e 65 de viuvez foi
a primeira mulher viúva a me intrigar, minha admiração pela fibra em
superar obstáculos e determinação em passar para o grupo colorido das
mulheres.
As mulheres idosas viúvas que possibilitaram a realização desse
trabalho pela confiança e generosidade de compartilharem suas
experiências de vida.
Agradecimentos
Como todo processo em construção, a elaboração deste estudo não
seria possível sem o apoio, amizade, colaboração, paciência,
encorajamento, respeito e amor de várias pessoas. Momentos conturbados
e de dúvidas não faltaram e saibam, foram muitos. A cada uma delas,
deixo aqui meus profundos agradecimentos.
Às pessoas que estiveram comigo, mesmo que por minutos, porque
esses contatos me auxiliaram a construir o que sou.
Às amigas e irmãs de estrada, Elaine, Maria, Nazira e Claúdia com
as quais partilhei as idas e vindas de São Paulo a Franca, as dúvidas,
reflexões, sentimentos, emoções, o cansaço e a convivência de dois anos,
que nos tornaram mais fortes e moldaram nosso saber.
A Cidinha, irmã da espiritualidade, que em vários momentos me fez
ver as luzes da estrada.
Aos professores do curso de Pós-graduação pela receptividade,
estímulo, por seus ricos ensinamentos e por acreditarem no meu trabalho.
À Ângela, Cláudia Cosac, Graça, Marta, Maria José, Mariângela,
Sara e Guaraciaba amigas da maturidade mineira, cuja convivência tem
sido
uma
experiência
enriquecedora.
Exemplos de
sabedoria,
generosidade, dignidade, competência e atuação profissional são mulheres
dedicadas a construção de um mundo melhor, crentes das possibilidades
que há em todo ser humanao. Minha admiração e afeto.
Aos integrantes do "Coral Velho Encanto” e, em particular, á Lurdes,
à Antonieta e ao maestro Wandereley Garieri Júnior que, ao permitirem
estar com o grupo, me possibilitaram manhãs de elevação espiritual,
conhecimento e convívio com pessoas tão singulares.
Às companheiras e ao companheiro da "burocracia" do programa de
pós-graduação: Gigi, Luciene, Maisa e Alan, a quem devo, além do
atendimento exemplar, a amizade que conforta e estimula.
A assistente social Claúdia Stockeler e aos funcionários da
Prefeitura Municipal de Passos pela acolhida e colaboração para o
levantamento de dados.
Ao Sr. Nicássio, Sr. Augusto e Sra. Vitória que colaboraram para a
realização dessa pesquisa participando com informações e apresentando
as viúvas idosas do Club Bem Viver de Passos.
À Profª. Drª. Linamara Rizzo Batistela e a amiga Arlete Camargo
de Melo Salimene pelo incentivo ao meu crescimento profissional e apoio
em momentos decisivos de minha vida.
Aos colegas do Serviço Social do Hospital das Clínicas e em especial
da Divisão de Medicina de Reabilitação do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo com quem
compartilhei anos de aprendizado e companheirismo.
Ao Paulo terapeuta das horas difíceis e alegres dos últimos tempos,
suas palavras colaboraram para reencontrar o meu caminho..
E, aos médicos Parisi, Carone e Auro pela generosidade,
compreensão e respeito ao utilizarem o dom que receberam, os meus
sinceros e eternos agradecimentos.
Resumo
GAZETTA, Maria Luísa Barca. Das mulheres de preto ao colorido das mulheres. O que
será o amanhã? 2006. 186 p. Tese (Doutorado em Serviço Social) - Faculdade de
História, Direito e Serviço Social, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita
Filho", Franca.
RESUMO
Os estudos sobre envelhecimento efetuados nas últimas décadas têm desvelado
diferentes aspectos desse ciclo de vida, dentre eles, a prevalência da sobrevida das
mulheres e a condição de estar só. A viuvez é apontada como uma das principais causas
dessa condição, portanto a idosa viúva é, e será parcela significativa da população
envelhecida das próximas décadas. Conhecer como a mulher no processo de
envelhecimento após tomar-se viúva desenvolveu sua sociabilidade foi o objetivo dessa
pesquisa, realizada com 8 viúvas acima de sessenta anos que freqüentavam programas
de Terceira Idade da cidade mineira de Passos. A viuvez, ao longo da história, tem sido
um fator adicional de restrições à mulher, favorecendo práticas sociais excludentes,
ampliando as desigualdades de gênero existente nas diferentes sociedades. Por meio
das entrevistas semi-estruturadas e posterior análise de conteúdo, percebeu-se que as
mulheres sujeitos desse estudo foram influenciadas pelas mudanças de comportamento
e mentalidades do século XX, no entanto ainda vivenciam preconceitos sociais referentes
a condição de viúva. Essas idosas na reorganização do seu cotidiano, após o período de
"luto" que determinaram para si, sentem-se "livres" para praticar suas escolhas,
intensificar a participação social, por meio de atividades religiosas e sociais
diversificadas, assumindo ou ampliando papéis, independentemente da qualidade da
relação conjugal, familiar e social anteriormente existente. Há valorização das relações
familiares interpessoais, afetivas e expectativa de equidade nas relações gênero.
Palavras-chaves: Envelhecimento, Gênero, Viuvez, Participação Social.
Abstract
GAZETTA, Maria Luísa Barca. Of the women of black to the colored of the women. What
will be the tomorrow? 2006. 186 p. Tese (Doutorado em Serviço Social) - Faculdade de
História, Direito e Serviço Social, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita
Filho", Franca.
ABSTRACT
The studies on aging made in the last decades have been revealing different
aspects of that life cycle, among them, the prevalence of the women’s survival and the
condition of being alone. The widowhood is pointed as one of the main causes of that
condition, therefore the aged widow is, and will be, the significant parcel of the aged
population of next decades. To know as the woman in the aging process after turning
widow developed her sociability was the objective of that research, accomplished with 8
widows above sixty years that frequented programs of Third Age of Passos’ mining city.
The widowhood along the history has been an additional factor of restrictions to the
woman, favoring excluding social practices, enlarging the inequalities of gender existent
in the different societies. Through the semi-structured interviews and subsequent content
analysis, it was noticed that the women subject of that study were influenced by the
changes of behavior and mentalities of the century XX, however they still live social
prejudices regarding widow's condition. Those elderly ones in the reorganization of her
everyday, after the "mourning" period that determined for itself, feel "free" to practice their
choices, to intensify the social participation, through religious and social activities
diversified, assuming or enlarging papers, independently of the quality of the relationship
matrimonial, family and social previously existent. There are valorization of the
interpersonal family, affective relationships and expectation of justness in the gender
relationships.
Key words: Aging, Gender, Widowhood, Social Participation.
Resumen
GAZETTA, Maria Luísa Barca. De Ias mujeres de negro al colorado de Ias mujeres.
¿Qué será el mañana? 2006. 186 p. Tese (Doutorado em Serviço Social) – Faculdade
de História, Direito e Serviço Social, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita
Filho", Franca.
RESUMEN
Los estudios sobre envejecimiento hechos en Ias últimas décadas ha revelado es
aspectos diferentes de ese ciclo de vida, entre ellos, el predominio de Ia supervivencia de
Ias mujeres y Ia condición de estar sola. La viudez es apuntada como una de Ias causas
principales de esa condición, por consiguiente Ia viuda vieja es, y será, la parcela
significante de Ia población vieja de Ias próximas décadas. Conocer como Ia mujer en el
proceso de envejecimiento después de volverse a Ia viuda desarrollaron su sociabilidad
fue el objetivo de esa investigación, realizada con 8 viudas acima de sesenta anos que
frecuentaron programas de Tercera Edad de Ia ciudad minería de Passos. La viudez al
largo de Ia historia ha sido un factor adicional de restricciones a Ia mujer, favoreciendo
Ias prácticas sociales de exclusión, ampliando Ias desigualdades de género existente en
Ias diferentes sociedades. A de Ias entrevistas semi-estructuradas y el análisis de
contenido subsecuente, se noto que Ias mujeres, sujetos de ese estudio, se influenciaron
por los cambios de conducta y mentalidades del siglo XX, sin embargo ellas, todavía,
viven los prejuicios sociales con respecto a Ia condición de viuda. Esas ancianas en Ia
reorganización de su cotidiano, después del período del luto que determinaron para si
mismo, siéntense libres para practicar sus opciones, intensificar Ia participación social, a
través de Ias actividades religiosos y sociales diversificadas, mientras asumiendo o
ampliando los papeles, independientemente de Ia calidad de Ia relación matrimonial,
familiar y social previamente existe nte. Hay valorización de Ias relaciones familiares
interpersonales, afectivas y expectativa de justicia en Ias relaciones del género.
Palabras claves: Envejecimiento, Género, Viudez, Participación Social.
Oração ao Tempo
(Caetano Veloso)
És um senhor tão Bonito quanto a cara do meu filho
Tempo Tempo Tempo Tempo, vou te fazer um pedido
Compositor de destinos, tambor de todos os ritmos
Tempo Tempo Tempo Tempo entro num acordo contigo
Por seres tão inventivo e pareceres contínuo
Tempo Tempo Tempo Tempo és um dos deuses mais lindos
Que sejas ainda mais vivo no som do meu estribilho
Tempo Tempo Tempo Tempo ouve bem o que te digo
Peço-te o prazer legítimo e o movimento preciso
Tempo Tempo Tempo Tempo quando o tempo for propício
De modo que o meu espírito ganhe um brilho definido
Tempo Tempo Tempo Tempo e eu espalhe benefícios
O que usaremos pra isso fica guardado em sigilo
Tempo Tempo Tempo Tempo apenas contigo e migo
E quando eu tiver saído para fora do círculo
Tempo Tempo Tempo Tempo não serei nem terás sido
Ainda assim acredito ser possível reunirmo-nos
Tempo Tempo Tempo Tempo num outro níve l de vínculo
Portanto peço-te aquilo e te ofereço elogios
Tempo Tempo Tempo Tempo nas rimas do meu estilo
Sumário
Introdução....................................................................................................................... 11
Capítulo I – Envelhecer em um mundo de mudanças....................................................
23
Capítulo II – Viver o cotidiano, tecer a história. A mulher do século XX ........................
56
Capítulo III – Mulher e Viúva. O que será o amanhã? ...................................................
71
Capítulo IV – A construção da Pesquisa........................................................................
86
4.1 Opção Metodológica..................................................................................................
87
4.2 O Cenário................................................................................................................... 92
4.3 As “autoras” da história..............................................................................................
96
4.4 Procedimentos de coleta e análise de dados............................................................
100
Capítulo V – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados.....................
104
5.1 Casamento e família..................................................................................................
107
5.2 Tornar-se viúva. Meu tempo de luto, a espiritualidade..............................................
117
5.3 Reorganizar a Vida: viuvez – passado-presente-futuro.............................................
124
Considerações Finais....................................................................................................
128
Referências Bibliográficas............................................................................................
132
Anexos............................................................................................................................
143
INTRODUÇÃO
Tete-Dune-Femme-Lis
Picasso
Introdução
O
12
tema dessa pesquisa despertou minha curiosidade quando
observei o contraste entre as histórias e lembranças referentes ao modo de viver das
mulheres viúvas de minha infância e juventude, com a realidade verificada no
cotidiano profissional com grupos de Terceira Idade e de convivência.
Eram mulheres, que a partir da morte de seus companheiros, cobriam-se de
preto; mulheres para quem a exuberância das cores estaria proibida, pelo resto da
vida ou por um período mínimo de um ano, de acordo com as convicções próprias
ou regras estabelecidas por seu grupo social.
Mulheres de preto, que deveriam ser recatadas, discretas, isoladas e
sofredoras, em qualquer tempo e idade, com uma reputação pessoal e familiar a
zelar. Se mais idosas, a discrição, as rezas, os crochês, tricôs, o esperar pela visita
dos familiares e quem sabe um trabalho "caridoso" a realizar. Se mais jovens, Ah!
Uma vida para se vigiar, a fim de não se desvirtuar e há sempre um familiar para
acompanhar.
Mulheres para quem a dependência ou liberdade econômica, implicaram em
emoções não vividas, sentimentos reprimidos. Mulheres, muitas, cujo projeto de vida
foi trabalhar no que lhes permitiram ou sabiam, educar seus filhos e orgulhosas em
um momento de suas vidas dizerem: "sozinha, fui mãe e pai para meus filhos, com
luta e sofrimento consegui criá-los como pessoas do bem" .
Introdução
13
Mulheres, que embora, em casulos enclausuradas, teceram os fios de sua
metamorfose, gradativamente, renovadas, aos poucos...
e hoje,
surgem
em
renovadas, como libertas e coloridas borboletas.
E... surpreendidos, meio pasmos perguntamos: "Mulheres de preto onde
estão vocês? Olhamos pelas janelas, supermercados, cinemas, ruas em todos os
lugares e o que enxergamos?
Ah! Mulheres Coloridas, inúmeras, em grupo ou sozinhas, em todos os
espaços e lugares, buscando a alegria, felicidade, usando sua liberdade construindo
uma realidade. Tecem um papel, que pode conter saudades, preconceitos e muitas
dificuldades, mas que recebe as cores de suas escolhas e possibilidades.
E nós que conhecemos as mulheres de preto do passado tão recente, não
percebemos essa metamorfose, tão silenciosa e veloz como outras tantas que
vivenciamos nesses anos que se foram. E só agora perguntamos: quem são vocês?
E primeiro da curiosidade, depois da convivência profissional e sim, da
admiração por aquelas que estão fazendo a história veio o processo de investigação,
cujo objetivo foi: Conhecer como a mulher no processo de envelhecimento após
tornar-se viúva desenvolveu sua sociabilidade, realizada com 8 viúvas acima de
sessenta anos que freqüentavam programas de Terceira Idade da cidade mineira de
Passos, que permitiu refletir e conhecer uma face da intrincada questão de gênero
na existência da humanidade.
As personagens dessa pesquisa possuem em comum a vivência num tempo
de transformações e rupturas como jamais visto no percurso humano.
Introdução
14
Fazem parte das estatísticas: integram o maior contingente idoso que se têm
notícias e sobreviveram a seus maridos.
O envelhecimento é mundial, resulta do declínio da fertilidade, avanço da
expectativa de vida, diminuição da mortalidade, melhoria das condições de
saneamento básico e saúde púb lica, avanços biotecnológicos e do conhecimento
médico. A viuvez, para as que chegam e ultrapassam os sessenta anos, configurase como uma das principais causas da mulher estar só, isso porque se recasam
menos.
Os dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) estimam que, em 2050, a
população mundial será de 2 bilhões de pessoas. A Divisão Populacional da
Organização das Nações Unidas (ONU) em seu relatório informou que atualmente
mais da metade da população de mulheres idosas vive nos países em
desenvolvimento somando um total de 198 milhões e nos países desenvolvidos são
135 milhões.
No mundo a expectativa média de vida das mulheres supera a dos homens
em até uma década. Chamam a atenção que à medida que se avança para idades
mais avançadas a sobrevida feminina é maior de 5:1 entre os nonagenários e
centenários.
Essa realidade agrega ao envelhecimento o universo feminino e foi
denominada pelos demógrafos como feminização do envelhecimento, exigindo
respostas sociais que considerem as questões de gênero quando de ações
orientadas para esse segmento populacional.
O envelhecimento no Brasil ocorreu dentro das desigualdades sociais
Introdução
15
existentes no país, de acordo com dados do Censo 2000 publicados pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): entre as famílias que ganham até três
salários mínimos a proporção de mulheres morando sós é de 25%; as mulheres
idosas tem menor instrução, 43% com mais de 70 anos eram analfabetas e dentre
as mais educadas a maioria não completou o antigo curso primário (4 anos de
escola).
Entre as mulheres com 65 anos ou mais somente 8% trabalham, destas 12%
tem vínculo empregatício e proteção previdenciária. A maioria dos domicílios
chefiados por mulheres idosas tem renda proveniente de atividades de ambulantes e
faxineiras, ou de aposentadoria própria, ou pensão deixada pelo marido ou
companheiro.
A família brasileira mudou de tamanho e função, com isso as idosas são
requisitadas pelos filhos a colaborar nos cuidados das gerações mais novas e
tampouco podem contar integralmente com a possibilidade de dispor das filhas ou
noras para cuidadoras caso necessite, normalmente são as idosas que estão
cuidando dos que necessitam.
A realidade, vista somente por meio dos números, é assustadora. O processo
de envelhecimento, sendo diferenciai para indivíduos e populações, toma-se mais
acentuado, no Brasil, em face das desigualdades existentes entre regiões, gênero e
etnias.
No entanto, quer cuidando dos netos ou após essa fase, as mulheres idosas
gradativamente começaram a procurar os programas municipais, estaduais ou
federais para a Terceira Idade, que a partir de meados da década de 80 do século
passado foram criados objetivando preparar o idoso para um envelhecimento
Introdução
16
saudável, com autonomia e independência durante o maior tempo possível de vida.
Do período de 1986 a 1991 como Diretora do Serviço Social do Instituto do
Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo, por meio do Serviço de Cardiologia Social acompanhei a implantação do
Programa de Atendimento Global ao Idoso no Hospital das Clínicas e a partir de
1991 na condição de Assistente Social Chefe da Divisão de Medicina de
Reabilitação do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo – DMR HCFMUSP, passei a trabalhar com os idosos integrantes do
Programa para a Terceira Idade de caráter preventivo oferecido pela Divisão de
Medicina a idosos da comunidade.
Os grupos, marcadamente femininos, registravam a busca destas mulheres
por ampliar o espaço e suas relações sociais, como se algumas colocassem
”rodinhas nos pés", apresentando questionamentos próprios de quem se percebe
envelhecer e estar num contexto constantemente em mudanças, que apresenta
diariamente o confronto entre valores e a dicotomia velho versus novo , passado
versus presente/futuro.
Verificamos que a despeito do que os textos registravam sobre as condições
de
envelhecimento
da
população,
mesmo
pertencentes
às
classes
mais
empobrecidas elas se diferenciavam, não se enquadravam, eram participantes e
ativas socialmente, com projetos e vontades.
Ao mesmo tempo, esta realidade e a dualidade do processo de
envelhecimento se faziam presentes em minha vida pessoal, por meio dos grupos
sociais de pertencimento e da convivência com familiares, passando a compartilhar
com eles
as
possibilidades,
limites,
conflitos
e
desdobramentos
de
um
Introdução
17
envelhecimento com e sem saúde.
Este conjunto de vivências foi dando contornos às questões que me levaram
a construir o projeto de pesquisa, cujos sujeitos seriam as idosas que freqüe ntavam
os Grupos de Atendimento Global da Terceira Idade da DMR HCFMUSP.
Em novembro de 2004, com a chegada da aposentadoria e o sentimento do
dever cumprido, elegi um outro grupo para pesquisa, pertencente às oficinas da
Secretaria Cultura do Estado de São Paulo, para a Terceira Idade Foi dessa forma
que o Coral Velho Encanto adentrou em minha vida. Totalmente feminino, a exceção
do maestro, conta va com 90% de viúvas. A presença masculina não é vetada,
decorre da falta de adesão.
Assim, durante os meses de novembro e dezembro de 2004 observei os
ensaios e me aproximei do grupo buscando conhecê-las. Mas novamente a vida me
levou para outro lugar. Mudei para a cidade de Passos-MG e em função da
distância, efetuei nova mudança quanto ao grupo de pesquisa. Escolhi estudar as
idosas integrantes do Programa de Convivência da Terceira Idade da Cidade de
Passos.
Essa experiência foi extraordinária, porque pude observar que tanto em São
Paulo, quanto em Minas Gerais, as idosas viúvas apresentam comportamentos e
movimentos semelhantes para chegarem aos grupos de Terceira Idade.
Ao ouvi-las contando suas experiências, o que fizeram, de que forma
organizaram as atividades diárias, como ocorreram os relacionamentos e estão
reorganizando suas vidas, percebi a importância do papel destas mulheres e de
tantas outras, na estruturação da vida cotidiana.
Introdução
18
São elas no passado, e parte delas no presente, que organizaram, estruturam
e comandaram o cotidiano familiar de uma geração ou mais. De diferentes maneiras
reproduziram a ideologia vigente, tecendo o jeito feminino e masculino de ser, com
todos os conflitos e limitações de seus recursos internos para as situações.
Mas em todas há um sentimento de liberdade "saudosa" após a viuvez.
Saudosa porque ninguém passa em nossa vida sem deixar algo ou levar algo de
nós. De um casamento, principalmente longo como esses das entrevistadas, não há
como sair sem marcas, sem estigmas. Talvez aí resida a razão e a força dos
preconceitos, a fonte de comparações e inveja.
Saudosa, também, porque embora a viuvez possa dar autonomia e liberdade,
na maioria dos casos ela produz penalidades sociais e econômicas que variaram na
história.
Conhecer as atribuições do papel de viúva ao longo da história humana é
inteirar-se de uma face das relações de poder entre gêneros que o homem não
conseguiu equalizar. A viuvez está vinculada aos sistemas de casamento, rituais de
morte, leis e proteção social da sociedade.
Buscar situar a figura da mulher viúva na trajetória humana em diferentes
culturas e tradições religiosas é sair das rotas principais da história e entrar no
caminho da marginalidade trilhado por diferentes grupos humanos. As sociedades
têm destinado às vi úvas, aos órfãos, mulheres solteiras e celibatárias, como seus
companheiros de viagem, porque compreendem que integram o mesmo grupo que
deve trafegar pela estrada denominada: "fragilidade social, risco social".
E é na largura do caminho que residem às dificuldades nas últimas décadas.
Introdução
19
São tantos os que integram essa via que as divisas começam a desaparecer, é a
interpretação que faço das redemarcações de espaço social que estão sendo
realizadas.
As negociações são longas, o projeto chama-se inclusão social, mas o meio
entre os caminhos está repleto de pontes, pedras, pedrinhas, pedrões, paredões e
tantos ões, que para remover alguns é necessário implodi-los e muita conversação.
E a estrada a cada dia recebe mais ocupante... e estes se questionam: o que será o
amanhã?
As viúvas até hoje, sofrem diversas restrições e controle do grupo social.
Conforme a época histórica elas são enquadradas em leis específicas para sua
condição civil. Há sociedades, por exemplo, que não permitiam o recasamento e
outras como na Índia, até o início do século XX, em que as viúvas (sati) das classes
superiores se ofereciam para serem imoladas, queimadas na pira fúnebre com o
marido.
Era considerada a maior prova de fidelidade, reconfirmação de união, e de
modelo virtude para outras mulheres. Os autores questionam se esta não seria uma
alternativa melhor do que a morte social destinada pela sociedade indiana àquelas
que permaneciam vivas (BREMMER, 1995).
Tornar-se viúva é o início de um lento processo de mudança que leva a
mulher a ser outra coisa que não mais a esposa. Militão e Militão (2000), ao
trabalhar as questões que envolve m o processo de mudança, referem que mudar é
"des-envolver (se)" dos pré-conceitos, ou seja, quebrar paradigmas concebidos ao
longo do tempo, permitindo-lhe desaprender, buscando recursos para solucionar
problemas ou dificuldades, com e através das experiências vivenciadas.
Introdução
20
A mudança tem na temporalidade uma aliada, porque as ações humanas para
se materializarem necessitam do tempo para que isso ocorra. Transformar um
momento ou um fato significa sair de uma situação de conforto, de segurança, de
domínio, para uma situação nova, desconhecida. Isto pode ocasionar insegurança
ou medo do que esta por vir, abalando as estruturas dos indivíduos, gerando
dúvidas, confrontando valores e atitudes (CAMPOS, 2004).
Oliveira (2004, p. 3) pergunta "o que é o tempo! O tempo é como um moinho
que mói; como uma mó, que tritura, e fura, fura... como uma dor que dói, dói e nunca
nos sentimos suficientemente preparados para lidar com perdas, com a corrosão.
A idosa viúva terá que enfrentar seu processo de mudança, isto é, a transição
do papel de esposa para o de viúva, considerando a temporalidade: um tempo para
si, tempo de pesar (luto) sendo que sua principal tarefa é construir uma outra
identidade: a de mulher só. Uma identidade, nova, que exige tempo para se
desenvolver.
A viuvez situa -se num estado de ambigüidades, cheio de práticas de luto,
tristeza, lamentações, isolamento e repressão sexual. O estereótipo da mulher viúva
disponível e com a sexualidade a "flor da pele" ainda persiste sendo somado aos
que já existem para a mulher.
Em determinadas culturas após a morte do marido a vida da mulher é
devassada. O uso da roupa preta era sinônimo de respeito e pudor; as mulheres não
poderiam desejar as coisas ditas mundanas, só aguardar a sua própria morte, uma
vez que a religião não lhes permitia por fim a própria vida.
Como pontua Rubem Alves é um preparatio mortis,
Introdução
21
Em certas regiões da Península Ibérica e da Itália, as mulheres velhas e
viúvas [...] se cobrem de negro da cabeça aos pés, lúgubre imitação das
vestimentas dos padres e dos urubus, especialistas em cadáveres. Com
suas roupas negras, elas estão proclamando. Deixei a vida! Abandonei o
amor! Que nenhum homem se atreva a me desejar! (2004, p. 84).
Hoje a morte social em nosso meio não é mais exigida, morre quem quer. À
medida que as mentalidades foram se modificando, o capital financeiro expande
fronteiras, a biotecnologia e o conhecimento médico avançam a globalização vai se
concretizando e o homem, como diz Áries (1990, p. 613), "inverte o lugar da morte".
Ela deixa de ser um acontecimento social – a perda de um membro da
comunidade – sai do ambiente doméstico da casa, do público, para ocorrer em outro
local. Assim, da mesma forma que as mudanças nos rituais de morte vão ocorrendo
lentamente, a mulher peça fundamental na representação desse ritual também
passa a ser liberada de vestir a cor preta do luto, do prantear, do isolamento, da
fidelidade eterna.
No Brasil a produção científica com objetivos de compreender esse momento
é incipiente direcionada à área jurídica, psicológica e de história. As literaturas
científicas norte-americana, inglesa e canadense apresentam maior produção.
A construção deste estudo terá a seguinte trajetória: Envelhecer em um
mundo de mudanças – constitui o primeiro capítulo desta tese, onde buscamos tecer
um panorama amplo sobre envelhecimento no Mundo, no Brasil e o fenômeno da
feminização.
No segundo capítulo - Viver o cotidiano, tecer a história. A mulher do século
XX - o foco para o seu desenvolvimento foi situar historicamente as mudanças
ocorridas.
Introdução
22
Com o terceiro capítulo – Mulher e Viúva. O que será o amanhã? Buscou-se
resgatar a imagem e o papel de viúva que historicamente foi sendo construído,
sincronizado aos padrões morais e sociais de cada época e como essa condição
social trouxe acréscimos restritivos aqueles já existentes para a mulher favorecendo
práticas sociais excludentes.
A construção da Pesquisa é o quarto capítulo, que apontará o caminho
metodológico percorrido, para a realização deste trabalho, delimitando o sujeito de
análise. O quinto capítulo - Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os
resultados – apresenta a discussão e a análise das categorias encontradas a partir
dos depoimentos das entrevistadas, buscando depreender a vivência que estão
tendo enquanto idosa, mulher e viúva . E, finalizando apresentaremos as nossas
Considerações Finais.
CAPÍTULO 1
ENVELHECER
NUM
MUNDO
EM
MUDANÇAS
Envelhecimento
ONU
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
24
... porque a vida é mutirão de todos
por todos remexida e temperada.
Guimarães Rosa
O
século XXI começou com a certeza de que seus atores não são
tão jovens quanto se projetava. Recebe de seu antecessor uma conquista
irreversível, e ambígua: o envelhecimento da população mundial e o aumento
vertiginoso de sua longevidade, em especial no Terceiro Mundo.
A sociedade que produziu esse fenômeno caracterizou-se, entre outros
aspectos, por um intenso e contínuo processo de mudanças tecnológicas,
organizacionais, de valores e comportamentos com conseqüências nos diversos
setores da vida pública e privada, notadamente na estrutura da família e na dinâmica
de sua constituição.
Globalização é a expressão utilizada para sintetizar esse processo de
transformações velozes, desenvolvimento telemático que na década de 80, com a
queda do comunismo soviético, permitiu ao capitalismo e suas conseqüentes
implicações ampliar-se pelo mundo, aumentando o fluxo de comércio, de
informações e de expansão das empresas multinacionais para mercados fechados.
Freire (1998, p. 1) afirma que "as transformações históricas e culturais na vida
social se operam por evoluções, revoluções e mutações", classifica àquelas
ocorridas nos últimos cinqüenta anos como mutações no comportamento político,
cultural e mental da humanidade.
As conseqüências das guerras de 1918 e 1945 impulsionaram a humanidade
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
25
a alterações de comportamento social, bem como por dispor pela primeira vez de
conhecimentos e artefatos bélicos capazes de destruir a espécie.
São criados organismos internacionais ou reafirmados os já existentes para
proteção da vida humana frente à tecnologia científica, assistência, preservação de
princípios e valores em busca de soluções aos problemas emergentes, privilegiandose a vida, a dignidade humana e o equilíbrio entre autoridade e liberdade – Direitos
Humanos.
Novos contratos sociais começam a ser esboçados entre sociedade e
governo e entre governos. Sob uma visão ampla o mundo é dividido em dois blocos,
tendo como senhores Americanos de um lado e Russos de outro. Uma Guerra, dita
Fria, se instala, e é no campo econômico que ocorrem o ardor e as conseqüências
das batalhas. A morte e destruição chegam por vias mais sutis.
Uma forma diferenciada de acumulação de capital passa a se estruturar.
Chesnais diz que a mundialização – expressão francesa para o processo de
globalização -, estabelece “um novo funcionamento sistêmico do capitalismo mundial
[...] de ‘regime mundializado sob a égide financeira’” (CHESNAIS, 1997, p. 4).
Concomitante, ao florescer dessa nova ordem, nascem e se mantêm vivas um
número cada vez maior de crianças, que se beneficiaram com o desenvolvimento
biotecnológico instaurado a partir do término da Segunda Guerra Mundial. Os
demógrafos “batizaram” esse grupo populacional de “baby boom”.
É público que o número de descobertas e inventos efetuados pelos cientistas
e pesquisadores entre 1945 até o final dos anos 60 é maior do que as realizadas
pelo homem de seu aparecimento até 1945.
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
26
Freire atribui a:
[...] própria lógica do regime capitalista ocidental em seu conjunto que
acabou levando ao paroxismo na década de 60. Sua idéia de que o
sucesso es tava fundado na produção levou a tornar os meios como
fins: produzir e ainda produzir, o que implica o dever de consumir tão
intensamente, não importa de que maneira estimulante (sistema de
crédito, publicidade, etc). [...] (FREIRE, 1998, p. 1).
A partir de então a vida social, a maneira de pensar, o cotidiano das pessoas
tudo se transforma, conduzindo a alterações na estrutura mental. A revolução da
comunicação em massa conquista territórios. Carlos Heitor Cony a esse respeito diz:
“Nos anos 40, ninguém sabia, mas a família preparava-se para sofrer um golpe
mortal com o advento da TV. Ela trouxe um estranho para casa: o mundo. De início,
um hóspede cordial e divertido. Mais tarde, um dono cruel e chato" (1998, p. 2).
Esse novo membro deixa evidente o que se repetira com os seus
descendentes: terão destinados para si espaços de honra, monopolizarão atenções,
darão homogeneidade aos pensamentos, viabilizarão ao planeta tornar-se a "Aldeia
Global” como predisse Marshall MacLuhan, na década de 60.
O desenvolvimento dos meios de comunicação foi permitindo que cada vez
mais mensagens simplificadas, "traduzidas" pudessem ser levadas a todo o planeta,
para todos os lugares, fornecendo elementos para o contexto atual.
Por meio do "american way of life" os Estados Unidos buscavam influenciar o
mundo
ocidental.
Das
contradições
e
mudanças
decorrentes
surge
um
questionamento global dos valores culturais e espirituais do ocidente. As gerações
mais velhas, em maioria, reagem com o seu engajamento a sociedade tecnológica
proposta.
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
27
No entanto, as gerações mais jovens rejeitaram o ideário proposto,
questionando-o; e essa juventude se rebela na década de 60, com movimentos de
caráter agressivos ou pacifistas. As idéias estão em ebulição procurando
compreender o homem e o mundo com base em parâmetros e referenciais que
pudessem resultar em uma sociedade fundada sobre a libertação das instituições
repressivas, valorização das raízes populares, do nacional.
O hinduismo, as drogas, a guerra do Vietnã, as lutas do terceiro mundo:
Cuba, Che Guevara, Martin Luther King, o feminismo, os movimentos pacifista,
ecológico, estudantil brasileiro, a queda do muro de Berlin, as legiões de
desempregados e subempregados, multidões que saíram as ruas reivindicando
melhores salários, menores jornadas de trabalho, creches para os filhos, justiça
social, igualdade de gênero, de raça, liberdade de expressão, política entre outras
tantas solicitações.
Um século escrito por multidões, segundo Araújo (2005), e que pelas
previsões continuará sendo, pelo menos pelo número de pessoas a caminho da
Terceira Idade.
A alta tecnologia impõe e permite um estar no mundo, que encurta espaços,
ultrapassa fronteiras, desterritorializa o espaço geográfico. As dimensões territoriais
ampliaram-se para o espaço por meio dos satélites e veículos interplanetários.
E, no entanto, o homem, de acordo com Freire não faz outra coisa que
“sobreviver, sua vida real esta resumida a apenas um espetáculo" (1998, p. 3).
O
viver está resumido numa representação, não apenas na troca de mercadorias, mas
em todas as relações humanas. Cada vez mais a sociedade moderna nos afasta da
emancipação.
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
28
Apesar das conquistas significativas obtidas pelo homem no século passado,
o sonho da eterna juventude ainda não se concretizou, mas o afã por consegui-la
revela-se intenso no fazer científico, depositário de suas demandas, intenções e
esperanças.
As ações dos sanitaristas e infectologistas nas primeiras décadas do século
XX, aliadas ao desenvolvimento de medicamentos e tecnologias na área da saúde,
possibilitaram aos cientistas nas três ultimas décadas dedicarem-se a tornar o último
treco de vida do homem mais longo, melhor e produtivo.
O crescimento da população idosa teve início no final do século XIX em
alguns países da Europa Ocidental estendendo-se pelo resto do Primeiro Mundo.
Nos anos setenta o fenômeno começa a ser observado no Terceiro Mundo, inclusive
no Brasil.
O processo ocorreu de forma lenta, gradativa, nos países desenvolvidos em
um período histórico que lhes possibilitou elaborar um planejamento e fazer frente
aos investimentos necessários. Criou-se a infra-estrutura adequada para atender os
idosos e para a sociedade se adaptar às transformações requeridas por esta
população. Como resultado as ações implementadas possibilitaram minimizar o
impacto socioeconômico para estas sociedades.
No processo brasileiro o aumento da expectativa de vida, aconteceu num
cenário de pobreza, disparidades econômicas e sociais presentes tanto na
distribuição geográfica da população, quanto nas estruturas de serviços oferecidos,
dificultando o atendimento às necessidades desse grupo.
São fatores gerados com o processo de industrialização e urbanização
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
29
ocorridas no Brasil, principalmente a partir da década de 30, que modificaram a
forma de produção e distribuição espacial da população.
O processo migratório brasileiro, ocorrido nos últimos quarenta anos do
século passado, propiciou uma concentração populacional urbana, que desenhou a
realidade atual, isto é, o jovem migrante envelheceu ou está envelhecendo,
compondo as parcelas da população idosa nas grandes cidades.
Veras e Alves (1999) observaram que os idosos estão mais concentrados nas
grandes cidades e nos bairros com maiores recursos, onde reside a população com
maior poder aquisitivo, porém isto não significa que estejam a ela integrados e sim,
que são no momento os menos pobres no conjunto da sociedade. Os autores
afirmam que esta situação tende a mudanças e apesar dos aspectos apontados a
população idosa cresce velozmente.
Vivendo mais e com a perspectiva de poder viver muito mais no futuro, o ser
idoso ganha visibilidade social. O envelhecimento deixa o ostracismo da esfera
privada e passa a ser foco de atenção e preocupação da sociedade em suas
diferentes instâncias.
Isso ocorre não só pelo significado do peso numérico dessa população no
mundo, por suas demandas particulares, representatividade econômica, mas
também, porque novos conhecimentos, conceitos e paradigmas foram formulados e
disseminados pelas disciplinas do envelhecimento - Geriatria e Geronto logia. São
produzidas revistas especializadas, livros, pesquisas, teses, filmes, documentários,
entre outras tantos.
O saber gerado passa a nortear a prática de profissionais de diversas áreas e
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
30
a elaboração de políticas governamentais. Procura-se dissociar do imaginário
coletivo a identificação do processo de envelhecer a decrepitude, perdas,
improdutividade, solidão, doenças e inatividade.
No Brasil, na década de 90, emerge o cidadão idoso. Até agosto de 1998
foram promulgadas, de acordo com levantamento realizado pelo Ministério da
Justiça, 129 leis municipais, estaduais e federais, assegurando direitos para a
população acima de sessenta anos, segundo Campos (1998).
Para Debert como conseqüência dessa tentativa de se igualar às
representações da velhice e sua transformação em um problema social, é criada:
uma nova categoria social, a da pessoa idosa, definida por ela como: "um conjunto
autônomo e coerente que impõe outro recorte a geografia social, autorizando a
colocação em prática de modos específicos de gestão" (DEBERT, 1996, p. 35).
Essa concepção paulatinamente vai sendo assumida por profissionais
brasileiros em particular dos grandes centros urbanos, pois não há como ignorar as
demandas dos idosos e suas especificidades que passam a alterar principalmente o
fazer dos profissionais da saúde e a paisagem urbana.
A realidade de uma cidade não projetada para a diversidade de sua
população emerge, expondo as barreiras visíveis e invisíveis a serem enfrentadas,
entre muitas, como exemplo, os degraus altos das escadas dos ônibus que
dificultam a entrada e saída dos idosos.
Assim forma, os profissionais e técnicos imbuídos dessa nova concepção a
passam a trabalhar com o intuito de instrumentalizar e mobilizar os idosos, os
grupos sociais e comunidades para que atribuam novos significados ao processo de
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
31
envelhecimento, adquirindo a visão propagada.
Trabalha -se para que exista um convívio produtivo e continuidade de
participação social. Incentiva-se o idoso a realizar atividades de acordo com os seus
objetivos pessoais e atendendo as necessidades da comunidade por meio de
trabalhos voluntários.
Simone de Beauvoir há mais de trinta anos, corroborava com esse
pensamento ao escrever que: a "velhice deveria ser apenas uma fase da existência,
diferente da juventude e da maturidade, mas dotada de um equilíbrio próprio, e que
deixasse aberta ao indivíduo uma ampla gama de possibilidades" (1999, p. 56).
A jornalista brasileira Cecília Prada, refere que observamos a prática do
pensamento de Beauvoir na vivência dos idosos na ilha de Bali, Malásia, contando:
[...] os mais velhos [...] escapam à senilidade e desempenham papéis
importantes, zelando pela saúde dos mais jovens, contando-lhes histórias,
ensinando-lhes arte e poesia, ou ainda na direção da aldeia e no exercício de
funções religiosas. Para eles e para numerosos outros anciões que são
encontrados principalmente nas zonas rurais, em todo o mundo, ninguém
disse um dia que deveriam parar. [...] o que é mais importante, não foram
afastados das suas atividades habituais, nem do núcleo familiar. "Estão mais
inseridos numa programação normal do ser humano, ligada ao ritmo da
natureza" (PRADA, 2002, p. 8).
Manter-se participativo, otimizar seu potencial, viabilizar novas experiências,
realizar projetos feitos no passado ou elaborados para essa fase, estabelecer novos
relacionamento intergeracionais, entre tantas outras possibilidades, tornam o
envelhecimento, mesmo com dependência, uma experiência sentida, percebida
como sendo sucedida tanto para o indivíduo quanto para a coletividade.
Mas, para que essas possibilidades se concretizem é necessário que o idoso
conte com um sistema de proteção social, possa usufruir de condições financeira e
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
32
social que lhe permita ocupar-se de suas proposições.
Há mitos e preconceitos que marcam as pessoas que envelhecem como se
elas fossem incapazes de evoluir. Os diferentes meios de comunicação abriram alas
à Terceira Idade, colocando-a no ar.
No entanto, há muito que se discutir sobre a dubiedade das imagens
divulgadas. Ora a da vovó no estilo Dona Benta – Sítio do Pica-Pau Amarelo de
Monteiro Lobato, a "Velha Surda" do programa a Praça e Nossa do canal Sistema
Brasileiro de Televisão - SBT, ora a moderna que também brinca na Internet, anda
de jet-ski, faz exercícios na praia, academia e outras tantas práticas que vão
surgindo.
Como diz o saber popular "bem ou mal, mas falem de mim", embora ocorram
distorções como as mencionadas acima, há produções que têm colaborado para que
esses atores permaneçam em cena. Afinal, não representam um potencial de
consumo e eleitoral hoje e amanhã?
O poder da representatividade numérica desse segmento já é sentido nos
países desenvolvidos de tal forma, que estão sendo chamados de "poder cinza", ou
“peste cinzenta", de acordo com Prada (2002, p. 8,11). Ao finalizar seu artigo essa
autora recomenda aos idosos brasileiros "[...] organizar-se de maneira independente,
apartidária, para agir no cenário político, pode e deve ser uma opção válida no seu
programa de atividades retomadas".
Alertas, informações, discussões e apoio estão sendo proporcionados e
oferecidos, de maneiras diversificadas, atendendo às expectativas do próprio ser
idoso, para que se construa uma sociedade inclusiva. O indivíduo que entra nessa
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
33
etapa de vida precisa desejar fazer e se realizar, tanto quanto nas demais.
A contemporaneidade produz um cotidiano permeado de valores opostos, de
movimentos contraditórios, do "morde e assopra", das existências desiguais, do
individualismo. A nova imagem da velhice nesse contexto é uma proposta de
transgressão, de rompimento com o cotidiano estabelecido, é o inusitado, o desafio.
É nesse sentido, que o filósofo e editor alemão Schirrmacher (2005, p. 1) em
seu livro, A Revolução dos Idosos: o que muda no mundo com o aumento da
população mais velha, convoca seus e
l itores a participarem de uma guerra
argumentando: "Temos de agir agora,
um tempo muito curto nos separa da
estigmação".
Acredita que se não for iniciada uma mudança cultural que consiga
transformar a imagem do idoso, organizar uma sociedade inclusiva, onde a
solidariedade e a intergeracionalidade sedimentem ações governamentais, da
coletividade e dos indivíduos, não teremos chances de sobreviver. O filósofo
argumenta:
[...] temos de aprender a envelhecer nos próximos 30 anos de uma maneira
nova ou, então, cada e todo indivíduo da sociedade será punido financeira,
social e emocionalmente. Em jogo está a libertação daquele ser triste e
oprimido que reprimimos que hoje ainda existe. É nosso futuro ego que
está em jogo (SCHIRRMACHER, 2005, p. 4).
Essa realidade incômoda e perversa certamente contará com obstáculos das
condições sociais, econômicas, políticas e culturais desiguais entre as nações e
dentro delas. Exigirá também que as pessoas resignifiquem suas vidas e a de sua
geração.
Hoje já são evidentes os resultados de uma sociedade que não projetou
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
34
espaço para seus idosos: constata-se a institucionalização desnecessária de muitos
deles, por falta de espaço, cuidador familiar ou condições econômicas da família
para contratar um cuidador informal.
É recordar que as pessoas se constroem no dia a dia, com as escolhas e
caminhos que podem efetuar ou vislumbrar para si. Subjacente a uma ação existe
um valor moral como guia, tecendo a rede das relações sociais. O envelhecer é
conseqüência
de
um
projeto
de
longo
prazo
e
de
várias
mãos,
com
responsabilidades coletivas e individuais.
Entretanto, não basta saber que envelhecer faz parte do percurso da vida. O
desconhecido, o novo sempre causou medo nos seres humanos. "Assim, é com a
velhice, uma nova fase na vida, que devemos primeiro conhecer, para depois
aprendemos a lidar com ela da melhor maneira possível", de acordo com a Ângela
K. Marigny (apud JEUNON, 2005).
Mas, há que se diferenciar o envelhecimento individual e o de populações
humanas, pois como define Thomas (1979, p. 3):
[...] envelhecimento individual põe em destaque etapas irreversíveis do
ciclo de vida, cuja compreensão depende do conhecimento dos processos
biológicos, sociológicos e psicológicos associados ao crescimento,
amadurecimento e possível declínio do organismo humano, no contexto de
ambientes físico, psicológico e social. Já o envelhecimento de populações
humanas constitui um fenômeno mais complexo, [...] põe em destaque o
incremento proporcional do número de pessoas mais velhas dentro de
dada população.
A relevância e consciência desse duplo olhar sobre o envelhecimento é que
humano, é que permite compreende-lo como um processo distinto tanto do
organismo quanto entre indivíduos, acrescido da reflexão de que cada grupo etário
nasce, se desenvolve, amadurece em ambientes e contextos históricos, sociais,
econômicos e culturais diferentes.
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
35
Foi a percepção dessa singularidade, que permitiu ao Buda, afirmar a séculos
atrás, “que cada um trás em si o velho que será". Para Néri (1995, p. 7), existe uma
“variedade individual e social em relação à época em que as pessoas parecem, se
declaram ou se comportam como velhas" dificultando fixar uma faixa limite de idade
para o envelhecimento.
“A vida das pessoas idosas não pode ser ditada pelo calendário", essa
mensagem do mais velho astronauta americano, John Glenn, aos 77 anos, quando
retornou de sua ultima missão espacial, ilustra pela prática os conceitos
referendados acima.
No entanto, apesar dos exemplos, a sociedade ocidental contemporânea
cultua, valoriza a juventude, o novo, o belo; faz com que as pessoas sintam-se
velhas cada vez mais cedo independentemente da realidade e da idade demarcada
para se tornar idosa.
As mulheres são as maiores presas da tirania das aparências, que nas duas
últimas décadas começa a ser estendida ao homem. Desde épocas imemoriáveis a
aparência é um fantasma que assombra as mulheres em todas as fases de sua vida,
pois é um dos atributos femininos mais valorizado socialmente com variações de
acordo com o contexto cultural e período histórico.
Deixar ou não que o corpo retrate a história vivida por nós, é uma reflexão
que suscita o redimensionar dos propósitos de vida e um enfrentamento dos
estereótipos e valores vigentes na sociedade.
De qualquer maneira geralmente ao nos defrontarmos com os primeiros
cabelos brancos, gordurinhas ou rugas, uma grande parcela já pensou seriamente
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
36
em procurar Mefistófeles 1 e outras tantas já o encontraram. A ciência, os salões de
beleza e toda parafernália moderna indicam o caminho.
A noção de tempo compõe o envelhecer. Ela integra, é subjacente, a
existência humana, aos ciclos da vida, ao universo. Tempo e vida se confundem,
pois é referendado no tempo que o homem
se orienta,
organiza,
regula
e
dimensiona sua vida cotidiana.
Featherstone afirma que a ciência moderna, com sua sistematização e
classificação de dados, elaboração de estatísticas permitiu que "possuíssemos uma
formação cronológica do curso da vida, embutida de modo muito forte em nossa
percepção” (1998, p. 12).
É uma das primeiras noções apreendidas pelo ser humano para dar conta e
sentido às transformações que observa no mundo, vinculadas a passagem do
tempo. Como auxiliar nessa tarefa foram criados os calendários, relógios e outros
instrumentos demarcadores e representantes do tempo.
Datas marcam o cotidiano, os acontecimentos aos quais são atribuídos
significados subjetivos e sociais, sinalizando para as pessoas em qual momento da
vida se encontram. Comemora-se o início de um namoro, de um trabalho, a data de
casamento, o dia dos mortos, a passagem dos anos, o dia das mães, o próprio
nascimento, estrutura-se o fazer diário.
Construímos sociedades graduadas por idades, na qual as pessoas sabem o
que devem fazer em determinados momentos da vida. Cada fase é utilizada como
1
Mefistófeles – nome dado ao diabo no drama Fausto de cinco atos com música de Charles Gounod
(1818-1893), e libreto de Jules Barbier y Michel Carré. Estreiou no Théatre Lyrique de Paris em 19
de março de 1859, baseado na obra de Goethe. Sobre o tema ver também a obra de Oscar Wikje –
O Retrato de Dorian Gray.
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
37
referencial, como um parâmetro de julgamento da maturidade social do indivíduo.
Determinamos a idade de ir à escola ou sair dela, votar, começar a trabalhar, casar,
aposentar, etc. assumindo e desempenhando papéis, conforme as expectativas
sociais vigentes.
Sobre a relação tempo e envelhecimento Rubem Alves, em 2002 ao conceder
entrevista à Revista A terceira Idade disse:
[...] acho que a grande questão é dar-se conta do tempo em que se vive.
Lição das Sagradas Escrituras: Ensina-me a contar os meus dias de forma
a ter um coração sábio [...]. É preciso perceber que o tempo é curto.
Quando percebemos que o tempo é curto ficamos libertos das
mesquinharias que frequentemente tomam conta de nós (ALVES, 2004, p.
82).
Em sua entrevista o filósofo instiga o leitor a refletir sobre como gerenciando o
tempo de sua vida, em quais valores está embasando suas escolhas, de que
maneira emprega o tempo hoje para propiciar a sua qualidade de vida. Favorecer o
desenvolvimento do homem sábio, que vive com simplicidade e é capaz de ser
criativo.
Ao proceder dessa forma, na maturidade, as pessoas estarão conosco porque
somos interessantes, sábios e não porque somos velhos. Os resultados de nossa
interação com o mundo no presente, passado e das expectativas com relação ao
futuro, permanecerão impressas, no corpo, registrando o visível da história pessoal
de cada um de nós.
Cecília Meireles em seu poema Retrato nos diz: "Eu não dei por esta
mudança, tão simples, tão certa, tão fácil: — Em que espelho ficou perdida a minha
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
38
face? 2" (Anexo A)
A poetisa de forma singela aponta a nossa relação alienada com o
envelhecer, com as alterações que percebemos, porém negamos. Os fatos e
circunstâncias cotidianas como a morte de amigos, a saída dos filhos de casa, a
aposentadoria, nos sintonizam com a realidade. Alguns desses acontecimentos se
configuram como rupturas exigindo rearranjos no fazer cotidiano. A viuvez é uma
delas.
Vivemos em um tempo que aumentou a margem de escolha pessoal dos
indivíduos. O peso das tradições que costumavam reger e ditar a vida de cada um é
menor. A sociedade já não se apresenta como um dado, no qual os indivíduos se
devam encaixar, atendendo a perfis pré-estabelecidos.
Existe a possibilidade de construção de um percurso individual, no qual os
padrões
e
modelos
tradicionais
são
substituídos
por
escolhas
pessoais,
reinterpretações e inovações. No cerne desse processo de reinvenção das relações
sociais, impõe-se uma constatação: na vida real das sociedades já não existe um
tipo único de família.
O envelhecimento também é a manifestação de eventos biopsicosociais que
ocorrem ao longo de um período. Tempo, ciclos de vida, adolescência,
envelhecimento são construções sociais elaboradas pelo homem dentro de um dado
contexto histórico e estipuladas a partir dos conhecimentos científicos, ambientais e
sócio-culturais acumulados.
Dessa forma, em consonância com os paradigmas vigentes no mundo, no
2
MEIRELES, Cecília. Viagem: poesia, 1929/1937. Lisboa: Império/Ocidente, 1939. Disponível
em: <http://www.geocities.com/fedrasp/cecilia-meireles.html>. Acesso em: 21 jan. 2006.
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
39
ano de 1982 os participantes da Organização das Nações Unidas (ONU), durante a
Assembléia Mundial dedicada a Terceira Idade, objetivando um consenso e formular
diretrizes, propuseram a utilização de um critério biológico, a idade, como ponto de
“coorte” para delimitar o início dessa fase.
Pautados na média de idade fixada pela maioria dos países no mundo para a
concessão da aposentadoria estabeleceram que nos países desenvolvidos fossem
considerados idosos(a) as pessoas com idade a partir dos sessenta e cinco anos e
com sessenta anos, para aquelas dos países em desenvolvimento, nos quais a
expectativa média de vida é menor.
O envelhecimento pode ser definido a partir de um:
1. critério biológico, a exemplo de Hoffmann (2005, p. 1) que o considera
como as “alterações graduais irreversíveis na estrutura e funcionamento de um
organismo que ocorrem como resultado da passagem do tempo";
2. critério social, como Nahoum (1982, p. 13), que o compreende como um
“processo social que vai se constituindo nas relações entre a imagem que a
sociedade faz do idoso e a imagem que ele projeta. A representação do velho na
sociedade determina a atitude para com ele mesmo".
A expressão Terceira Idade também tem sido adotada para designar essa
categoria etária. No entanto, qualquer que seja o critério que se utilize para definir o
processo de envelhecimento, uma verdade é soberana: ele é um caminho natural e
democrático. Podemos retardar sua marcha por meio dos avanços biotecnológicos e
recursos financeiros disponíveis, mas ainda não é possível interrompê-lo. É uma
fase no desenvolvimento humano.
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
40
Numa licença poética diríamos que para os ciclos da vida não há definições
perfeitas, mas como ocorre com o amor e a beleza, a maioria das pessoas são
capazes de reconhecê-los quando sentem ou vêm.
Dentre as ações coletivas a promoção da saúde no envelhecimento é uma
prioridade. Para o Dr. Luiz Ramos, médico, chefe da disciplina de geriatria da
Faculdade Paulista de Medicina da UNIFESP, os idosos de hoje, nascidos no pósguerra, terão problemas de saúde que causarão incapacidades, em função de maus
hábitos adquiridos em sua vida, como o hábito de fumar.
Atualmente, de acordo com o médico, 80% dos que têm mais de 60 anos
apresentam alguma doença crônica, 10% estão debilitados e 50% dos idosos
brasileiros recebem ajuda, seja familiar ou clínica.
Apesar da urgência alardeada, no Brasil o processo de adesão e estruturação
da sociedade para esse "boom" do envelhecimento caminha sem pressa.
Serviços foram e estão sendo estruturados oferecendo um espaço para
convivência, lazer, aprendizado e assistência, objetivando propiciar e manter o idoso
independente, autônomo, saudável e ativo.
Esse grupo de pessoas, que estão cursando uma velhice saudável presente
em nosso cotidiano, busca, segundo Berquó (1999), alternativas de participação
social, autodesenvolvimento e investem contra a própria exclusão, a despeito dos
preconceitos e realidade social construída pelo sistema capitalista.
Os avanços biotecnológicos obtidos a partir da década de 50 foram sendo
incorporados ao fazer das pessoas gerando significativas transformações tanto no
cotidiano como no modo de ser dos indivíduos, de forma tão veloz que se perde a
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
41
real dimensão do tempo em que ocorreram.
Os maiores de de cinquenta anos sobreviveram em sua infância sem Mac
Donald’s, vídeo game, xerox, computador, televisão, entre outros bens e serviços, mas
quem se lembra? Provavelmente eles em conversas que se iniciam, "bom! mas no
meu tempo...
O filósofo Mário Sérgio Cortella em 1988, ao proferir palestra para um grupo de
idosos no Serviço Social do Comercío de São Paulo - SESC/SP pontuou motivos que
sob sua ótica tornam o envelhecer nas últimas décadas complexo e difícil entre eles:
1. inexistência da idéia de geração e a coexistência de diferentes grupos,
”gerações" com seus respectivos estilos de vida: Punk, Funk, Patricinhas,
Mauricinhos, Barba e Bolsa, Dark, etc.;
2. mudança de valores e da compreensão da organização das pessoas;
3. relação com a tecnologia. A velocidade das relações implementadas por
meio dela, a cada dia acelera mais todo o fazer cotidiano humano,
gerando um conjunto de alterações nos diferentes setores da vida. Essa
realidade impõe um ritmo e a aquisição de habilidades diversas
dominadas pêlos que estão em processo de envelhecimento;
4. mudança nas relações interpessoais e sociais, que segundo Cortella
(1998, p. 11) desencadeiam duas situações: a "exaltação egonarcisista",
onde a pessoa se fecha no próprio mundo e nas próprias coisas ou a
precariedade das relações.
É a coexistência do novo com o antigo, marcando a contradição da sociedade
contemporânea. Contradição expressa por um dos membros da União de Mulheres
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
42
de São Paulo, que diz:
A velhice ocorre para cada um de nós de forma diferente, conforme a
classe social, o sexo, a raça, a estrutura da sociedade e o tipo de cultura.
Numa sociedade capitalista como a nossa, o ser humano é importante
quando se integra ao sistema produtivo e contribui para a expansão do
capital. Quando excluídos do mercado de trabalho, os indivíduos passam a
ser improdutivos, o que significa marginalização. (SÃO PAULO, 1997, p.
48).
Neste contexto, o significado da velhice reflete a perspectiva do ser
improdutivo, sem sentimentos ou incapaz de amar e participar, gerando a tentativa
de ocultar, reprimir e negar essa etapa, evidenciando a lógica do envelhecer num
mundo globalizado, que traz em seu bojo a contradição entre o ter e o ser, o ideal e
o real.
Essa visão tende a afastar o idoso do convívio social, trazendo-lhe isolamento
e solidão, que pode ter inicio no período de aposentadoria, quando a pessoa sente a
falta dos colegas e do local de trabalho, ou quando há alteração ou perdas de papéis
sociais. Segundo Kaufmann (1985), pode também desencadear no idoso o
desinteresse por acompanhar novos acontecimentos, de buscar informações,
atualizar-se e participar.
Em contrapartida, há aqueles que assumem outras posturas frente à
sociedade e à vida: quebram preconceitos vinculados ao envelhecimento, mantém
sua vitalidade, participação social e autonomia. Estabelecem outros parâmetros,
colaborando na transformação da visão social sobre a pessoa e o processo de
envelhecer.
Nesse sentido, Trindade e Ramos (1999, p. 41) citam o escritor Mário
Quintana, falecido aos 87 anos, em 1994, que tão bem registrou essa condição ao
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
43
escrever: *O Tempo é um ponto de vista: velho é quem tem um dia a mais do que
eu”. Tudo muda inclusive a velhice.
Como ele, uma parcela da população idosa, hoje, empenha-se em
restabelecer a função social do idoso e preparar-se para saber administrar o medo
de envelhecer, o medo da morte. Da obra de Cícero, De Senectude, Patrícia Inês
Bastidas, comenta:
Los que en si mismos no tienen ningún recurso para vivir tranquila y
felizmente, juzgan incómoda toda edad; pêro los que encuentran todos los
bienes dentro de si mismos, nada de Io que acontece por necesidad de Ia
naturaleza lês puede parecer maio. En este género de acontecimientos,
ocupa et primer lugar Ia vejez (2006).
Néri (1993, p. 46) ressalta que "a busca de condições e variantes de um
envelhecimento bem-sucedido, com boa qualidade física, psicológica e social, é
mais que um desafio ou ideal pessoal e social", para a autora constitui-se em uma
questão de toda a sociedade.
Atividades em Centros de Convivência, Universidades Abertas, trabalhos
voluntários, informática, música, arte e outros desafios, estão sendo oferecidos, por
instituições públicas ou privadas, passando a integrar o cotidiano dessa população
que almeja conservar e manter sua participação e inserção social de alguma forma.
Para Dallarí (1991), a participação do idoso é a possibilidade da pessoa em
manter sua condição de ser humano consciente, e que o transcorrer do tempo não
anula essa condição ou a destitui dela.
Participar é a palavra-chave. Participar conscientemente de todos os atos,
movimentos reflexões e discussões de nossa vida diária. Registros de inúmeras
queixas por parte de idosos em relação à saúde, à violência, a maus-tratos, ao
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
44
relacionamento familiar, entre outras, alertam-nos para as mudanças essenciais que
podem ocorrer nesse período da vida.
As causas são diversas: a síndrome do ninho vazio - com a saída dos filhos
de casa, a aposentadoria sem preparo, a separação do cônjuge, a viuvez, o
aparecimento de alguma doença grave ou a invalidez.
As manifestações psicossociais, geradas pelas causas citadas e aliadas à
proximidade da finitude da vida, podem significar perda de auto-estima, sentimento
de angústia, solidão e até depressão. Ao dizer "antes prevenir do que remediar",
estamos
falando
de
ações
fundamentadas
numa
previsão
de
possíveis
conseqüências.
As questões negativas e positivas do envelhecimento estão intimamente
ligadas ao tipo de atenção que o indivíduo dispensa a si mesmo. Ao deparar com um
idoso alegre, bem-humorado e sorridente, podemos afirmar que ele constantemente
é assim.
O idoso, ao considerar as chances de continuar a "ser", percebe o processo
de envelhecimento como um fato dinâmico e progressivo, que envolve crescimento e
evolução, apesar das perdas e mudanças. Os diversos movimentos de grupos de
idosos, surgidos em nossa sociedade, ganharam nesta última década uma
dimensão política e reinvidicatória. Hoje, eles já sabem que são uma grande força
política, no panorama nacional. As pessoas idosas têm percebido a importância de
refletir sobre suas próprias vidas, de reanimar interesses e expectativas, e ainda de
redimensionar sua participação social.
Cortella (1999, p. 76) corrobora com este pensamento ao afirmar que
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
45
“humanos nascem não-prontos e vão se fazendo", somos a cada tempo uma nova
versão, ampliada e revisada de nós mesmos,
por isto não somos totalmente
originais, mantendo muito do que somos.
A Política Nacional de Saúde do Idoso, promulgada pelo Ministério da Saúde,
em 1998, incorpora o conceito de que saúde é a capacidade funcional do indivíduo,
isto é, o idoso deve ter capacidade de manter-se independente e autônomo a maior
parte do tempo possível, de assumir, com independência e tenacidade, um rol de
afazeres no dia a dia, convivendo ou não com uma doença crônica.
Para Ramos (1999), fatores genéticos, alimentação saudável e tratamentos
preventivos representam a chance de se ter um envelhecimento salutar. As ações
devem estimular o combate à tendência ao imobilismo. Há sempre uma estratégia
adequada para cada indivíduo, em cada situação.
A inclusão em programas de prevenção, com estimulação funcional e
terapêutica é uma das formas para se obter mudanças comportamentais e combater
o imobilismo, possibilitando ao idoso descobrir seu potencial e planejar sua vida
nesta fase.
Viorst (1988) considera que há diferentes "modos" e atitudes que podem ser
assumidas pelas pessoas no envelhecer, avaliando que a vivência deste processo é
facilitada e com resultados individuais mais satisfatórios quando a pessoa se
responsabiliza por este ciclo de sua vida, por suas escolhas, mantendo-se
interessada por pessoas, projetos, trabalhando-se quanto as perdas "imutáveis".
A concepção do homem como um ser em evolução, em desenvolvimento, traz
a possibilidade de que possa mudar na velhice, pois a maturidade, a cada estágio da
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
46
vida de uma pessoa, pode gerar forças e aptidões para empreender mudanças,
apesar de sua história pessoal.
Refere-se ainda, a autora (1988, p. 309), que nesta fase "podemos adquirir
maior sabedoria sobre a vida, maior liberdade, perspectiva e força. Podemos ser
mais amorosos com os outros, ter maior honestidade para corusco" e, portanto,
buscarmos novos caminhos pessoais de estar e ser no mundo e para com as
pessoas. Reflete que se soubermos elaborar as perdas advindas com o
envelhecimento, elas podem nos libertar a criatividade para o desenvolvimento,
prazer e nos capacitar para abraçar a vida.
Pais (2003, p. 29) afirma que "as rotas do quotidiano são caminhos
denunciadores dos múltiplos meandros da vida social [...] que a vida quotidiana é um
tecido de maneiras de ser e estar e que 'as maneiras de fazer1 quotidianas são tão
significantes quanto os resultados das práticas quotidianas".
E, aqui, vale recordar que se desejamos mudar a imagem do idoso,
desaprender valores para deixar de agir de forma preconceituosa é necessário que
as condições de saúde, socioeconômica e cultural lhe permitam uma estabilidade
física e social, que o tempo disponível possa ser aplicado no "ócio criativo",
produtivo para ele e à coletividade.
Poeticamente, Rubem Alves divaga sobre a velhice comparando-a ao
crepúsculo.
O crepúsculo é o dia chegando ao fim. O tempo se acelera: como se
transformam rápidas as cores das nuvens, no seu mergulho na norte! E,
paradoxalmente, o tempo fica imóvel, paralisado num momento eterno. Por
isso que o crepúsculo é um momento sagrado, de oração, quando o eterno
se oferece a nós numa taça efêmera. Por isso cessa o trabalho. É o
momento de oração: angelus. Somente os sentidos atentos em
contemplação [...] (ALVES, 2004, p. 27).
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
47
Mas, o envelhecimento tem seus números ou devemos apresentar os
números do envelhecer. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU) a Era
do Envelhecimento iniciada em 1975, deve se estender por mais cinco décadas.
Prevê que no ano de 2050, 22% dos habitantes do globo terão mais de 60 anos
totalizando de 8 a 11 bilhões de pessoas na terceira idade, contra os 610 milhões
atuais.
O relatório dessa organização Perspectivas da População Mundial (ONU,
2003) estima que metade do crescimento da população mundial até 2050 ocorrerá
em apenas cinco países asiáticos e um africano: índia, China, Paquistão, Nigéria,
Bangladesh e Indonésia.
Como conseqüência 88%, ou 8,2 bilhões de pessoas, viverão nos países em
desenvolvimento, contra os 80% (4,9 bilhões de pessoas) de hoje, com
probabilidade de ocorrer um aumento na pobreza existente.
De acordo com as Nações Unidas (2003) hoje a população idosa distribui-se
pelos cinco continentes da seguinte forma: 1. Ásia com 53%; 2. Europa 24%; 3.
América do Norte 8%; América Latina e Caribe 7% e África com 7%. No mundo, em
cada dez pessoas, uma tem mais de 60 anos. São 11 milhões a mais a cada ano.
O Japão superou a Suécia como nação com a maior expectativa de vida do
mundo, tornando-se, em 1998, símbolo da longevidade do novo milênio, por possuir
uma população de dez mil centenários. A expectativa de vida média no Japão é de
80 anos – 76,9 anos para os homens e 82,9 para as mulheres, conferi ndo-lhes 5
anos a mais de vida.
Daqui a trinta anos, o grupo de idosos chegará a 40% da população da
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
48
Alemanha, Japão e Itália.
Quadro 1 - Estrutura da população mundial por faixa etária em 2004.
Estrutura etária da população mundial - 2004
0 – 14 anos
28,2%
925.276.767
875.567.830
15-64 anos
64,5%
1.083.789.165
2.033.226.759
65 anos e mais
7,2%
203.286.504
257.705.851
Fonte: IBGE, 2006
Schirmacher (2005) alerta para a dimensão do que denominou ‘terremoto
demográfico”. Sinaliza que, em 2005, na maioria dos países ocidentais, tem início o
fenômeno denominado pêlos demógrafos de "papy-boom", ou seja, a passagem dos
“baby-boom” – integrantes da geração nascida entre 1950 e 1964 – para a condição
de aposentados.
As projeções contidas no relatório Perspectivas da População Mundial (ONU2003) no tocante a tendência do envelhecimento mundial para os primeiros 50 anos
do século XXI apontam que os maiores impactos ocorrerão nos países mais ricos,
provocando:
• escassez de mão-de-obra;
• elevação dos custos da saúde e das aposentadorias na Europa e Japão;
• reavaliação da idade e das condições de aposentadoria;
• reavaliação dos orçamentos de saúde e política imigratória;
• desaceleração econômica e uma elevação dos gastos sociais nos países
• amplas reformas para mudança do sistema de previdência social, serviços
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
49
financeiros, leis trabalhistas, de imigração e política familiar. Indicada pela
Comissão de Envelhecimento Global em relatório publicado após os três
dias de reunião na capital japonesa - Tokyo.
Paul Hewitt, diretor do Centro de Estratégia e Estudos Internacionais (CSIS),
conclui:
A maior crise social do século 21 será resultado do subproduto da falta de
trabalho. Sociedades envelhecidas terão que se tornar muito eficientes
para evitar recessões causadas pelo envelhecimento. [...] que ameaça a
sustentação do tradicional sistema de previdência, no qual os funcionários
atuais pagam pêlos benefícios de trabalhadores aposentados (HEWITT
apud SCHIRRMACHER, 2005, p. 8).
Schirrmacher (2005), Veras e Caldas (2004) e Prada (2002) concordam com
a declaração de Hewitt. Reconhecem a possibilidade de sobrecarga do sistema
previdenciário, causando um delicado equilíbrio entre gerações, isto é, a falta de
mais jovens/trabalhadores da ativa que mantenham o sistema para sustentar os
mais velhos/aposentados.
Marcelo Leite (2000, p. 2), jornalista do Jornal Folha de São Paulo, no ano de
2000, ao escrever um artigo especial sobre Longevidade no Brasil e no mundo, já
apontava para a questão financeiro-social do envelhecimento.
Registrou: "o
envelhecimento da população mundial é a dor de cabeça de quem está pensando
em saúde e previdência com horizontes mais largos do que o ajuste fiscal exigido
pelo FMI".
Nos últimos cinco anos, não só estudiosos do assunto como também
governantes e organismos internacionais como a Organização Pan-Americana de
Saúde – OPAS, têm refletido sobre como deverão ser organizadas as estruturas
previdenciárias de recolhimento e manutenção dos benefícios para que possam dar
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
50
conta da realidade que se delineia.
No Brasil, algumas ações vêm sendo realizadas pelo governo federal no
intuito de introduzir e ampliar modificações no sistema previdenciário vigente,
gerando polêmica e não aceitação, pois a questão não foi lançada à discussão para
uma decisão dos envolvidos.
Os dados censitários em 2000 apontaram que a população idosa brasileira
contava com 14,5 milhões de pessoas representando 9,1% do total. Ao
compararmos os dados atuais, com os dados de 1991 constatamos um crescimento
de 35,5%.
Se confirmadas as projeções estatísticas do IBGE, da OMS e da ONU em
2025 o país somará 32 milhões de idosos, conferindo-lhe o posto de sexto país mais
velho do planeta. Nesse ano as idosas brasileiras serão em número igual ao total da
população do estado do Rio de Janeiro hoje. Dos idosos com mais de 80 anos dois
terços serão mulheres.
Segundo o IBGE (2003) e Prada (2002), no início do século XX somente 25%
dos brasileiros ultrapassavam a barreira dos 60 anos. De 1910 a 1990 a expectativa
de vida para os homens cresceu 31 anos e para as mulheres 34,5. Em média,
significa viver até 68,5 anos, porém com uma diferença entre os sexos 75,2 anos
para as mulheres e 67,6 anos para os homens, estabelecendo-se uma diferença de
7,6 anos entre ambos.
Em cada grupo de 1.000 brasileiros há 501 mulheres e 499 homens. Esses
dados representam média estabelecida para o país.
No entanto, são constatadas disparidades e fases divergentes dessa
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
51
transição ao analisarmos as diferentes regiões e estratos sociais no Brasil, conforme
apontam estudiosos como Veras e Caldas (2004) e demógrafos do IBGE (2003,
2001), destacando-se:
• a média de vida dos brasileiros mais ricos é cerca de 70 anos enquanto dos
mais pobres é aproximadamente 50 anos;
• a esperança ou expectativa de vida na Região Sul é de 69 anos; e na legião
Nordeste é de 64 anos;
• a taxa de fecundidade da Região Nordeste de 4,0% é quase o dobro da
taxa da região Sul 2,3%;
• os idosos da Região Sudeste são 8,0% da população, contra apenas 5,4%
na região Norte;
• na região Sudeste 57,3% do contingente de idosos era formado por
mulheres, constituindo-se no maior percentual do país, ficando o menor com
o Centro-Oeste (51,6%);
• a maior proporção de mulheres chefiando a casa ocorre na região Nordeste,
com 25,9%, seguida da Sudeste, com 25,6%;
• a distribuição de renda entre os idosos é: 69,4% vivem com até dois salários
mínimos; 19,4% com dois a cinco salários mínimos e 11,2% tem renda
acima de cinco mínimos;
• os municípios que têm mais idosos no país são Colinas e Santa Tereza, no
Rio Grande do Sul, com 15,60% e 15,21% respectivamente.
Essa
"heterogeneidade"
demográfica
demonstra
a
importância
da
versatilidade ao se elaborar programas e políticas para o Brasil. O envelhecimento
brasileiro trás consigo suas origens: ocorreu num cenário de pobreza, com
desigualdades econômicas e sociais presentes tanto na distribuição geográfica da
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
52
população, quanto nas estruturas de serviços oferecidos, dificultando atender às
demandas desse grupo.
Paschoal analisando as expectativas de vida ao nascer e aos 60, 70, 80 anos
comparativamente entre os sexos e países, conclui que, "em todos os países,
situações e momentos examinados, a expectativa de vida das mulheres é maior que
a dos homens, aplicados para os dois índices examinados" (1996, p. 35).
Afirma que há uma superioridade feminina no tocante ao número de anos por
viver, em todos os grupos etários e épocas consideradas de 1900 a 1991. Os dados,
da população na Rússia, são um bom exemplo onde a esperança de vida média é
de 64,8 anos, chegando os homens até os 58 anos e as mulheres 71,5 anos,
representando 13,5 anos de diferença.
A denominação "feminização do envelhecimento" foi utilizada pela demógrafa
Elza Berquó (1999) ao analisar dados sobre a população idosa em
1999,
destacando, também, a existência de maior concentração de idosas nas áreas
urbanas em todas as grandes regiões do país:
• 71% das mulheres que moram sozinhas têm mais de 50 anos;
• 13% das mulheres de 60 a 74 anos vivem sozinhas;
• 21% das mulheres de 75 anos ou mais também não dispõem de
companhia em casa;
• das 11,2 milhões de mulheres responsáveis por suas casas, 3,4 milhões
têm mais de 60 anos;
• nas regiões Sul e Sudeste as mulheres que moram sozinhas com mais de
50 anos respondem por 72,1% e 73,2%, das casas respectivamente;
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
53
• no Nordeste, merecem destaque os Estados de Alagoas, com 81,5%, e da
Paraíba, com 80,8%;
• o número de homens que moram sozinhos com idade superior a 50 anos é
de apenas 42,4%. Entre os mais velhos, de 60 a 75 anos é de 8,6%.
As diferenças entre os sexos refletem uma realidade que pode ser explicada
não só pela maior expectativa de vida das mulheres, mas também como produto de
forças culturais, sociais, de valores pessoais que foram internalizados.
A antropóloga Miriam Goldenberg sintetiza e justifica com seu depoimento,
baseado em pesquisas que vem realizando, os dados computados pelo Censo de
2000. Ela declara que:
[...] é justamente a partir dos 50 anos que os homens começam a casar
novamente e, normalmente, com mulheres mais jovens. É cultural, eles são
ensinados que a mulher mais jovem é mais atraente, se têm chance de
escolher por que ficariam com uma mulher da idade deles, que é
desvalorizada no mercado afetivo sexual? [...] A menor tolerância à solidão
explica a diferença (GOLDENBERG apud LAGE, 2005).
Essas considerações da autora assemelham-se a de estudiosos como Tamai
(1997), Bakschi e Miller (1999). Os últimos, com pesquisas efetuadas junto à
população idosa norte americana, registraram dados aproximados aos de nossa
realidade.
Mas, como outros advertem, existirá uma diminuição entre os índices hoje
observados em razão das mulheres terem aumentado comportamentos prejudiciais
e não porque os homens modificaram o seu positivamente.
Para Goldenberg há mulheres com idade acima de 50 anos que optam por
morar sozinhas por que associam essa situação a liberdade. Estiveram casadas,
dedicaram-se aos cuidados com a família e agora "experimentam uma liberdade e
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
54
uma forma de viver que não estão mais tão associados a uma vida sexual ativa,
podem ter um tipo de sociabilidade feminina grande, com idas ao teatro, ao cinema,
viagens” (GOLDENBERG apud LAGE, 2005, p. 2).
As transformações sócio-culturais ocorridas ou em marcha no mundo
contemporâneo vêm alterando valores, normas, atitudes e comportamentos que
modificam o papel da mulher na sociedade, refletindo em sua participação no
mercado de trabalho e na família.
Fenômenos como a feminização do envelhecimento, da pobreza e a elevação
do número de famílias monoparentais, notadamente com chefia feminina, apontam
necessidades
e
exigências
que
devem
ser
enfrentadas
pela
sociedade,
principalmente pelos programas de proteção social.
O fato de o envelhecimento ter uma preponderância feminina impõe
condições à deliberação de políticas para esse segmento, que deverão considerar
as peculiaridades de gênero e as condições objetivas de vida das mulheres idosas.
Uma questão de gênero a ser equalizada é a postura frente à aposentadoria e
o envelhecimento. Rubem Alves (2004) tece considerações sobre a diferença de
atitude do homem nessa questão. Ele aponta como fator das mulheres
envelhecerem melhor que os homens o fato de estarem vinculadas a casa.
A casa é seu espaço. São as donas da casa. Ali é o seu domínio, [...] Mas
os homens viveram a vida toda fora da casa. Aquele não é o seu espaço.
São intrusos. Lembro-me, da minha infância, as mulheres em Minas
expulsando seus maridos da casa nas manhãs de sábado com as palavras:
"Lugar de homem é na rua". Aí, o que acontece? O homem morre, por não
ter um espaço seu. Sem um espaço que seja seu resta-lhe jogar dominó,
ver televisão e morrer. A aposentadoria pode ser letal (ALVES, 2004, p.
86).
Esses comportamentos são reflexos dos papéis socioculturais engendrados
Capítulo 1 – Envelhecer em um mundo em mudanças
55
pela sociedade para os gêneros, onde as diferenças existentes são apresentadas
como naturais e inquestionáveis, que a chegada da maturidade exige repensar o
que foi estipulado socialmente.
No caminhar do envelhecimento desse grupo populacional, em que as
mulheres, a cada dia, passam a representar maior número, às questões de gênero
se acrescenta mais um fator de descriminação e preconceito, ou seja, a velhice;
compondo a dupla discriminação à qual a mulher estará sujeita e deverá enfrentar.
A terceira Idade, particularmente para a mulher, pode se configurar como um
período de incertezas e talvez, por isso mesmo, faça cumprir o pensamento que diz:
“a lei da morte é a inércia, a lei da vida é a mudança".
De qualquer maneira, este pode ser o tempo da grande virada, onde homem
e mulher construam espaços sociais equitativos para si, num sentido libertário.
Mas, hoje, em todo o mundo a feminização do envelhecimento é real e se
impõe.
57
Capítulo 2 – Viver o Cotidiano, Tecer a história. A mulher do século XX.
O passado é história,
O futuro é mistério,
O agora é uma caixa de surpresas.
Por isso, nós o chamamos de presente.
Provérbio do ciberespaço
Paulo Coelho.
D
e Ataulfo Alves, com Amélia (1941), a Erasmo Carlos,
com Mulher sexo frágil ( 1981) (Anexo B), distanciam-se os anos que comprovam
ser a vida um processo constante de relacionamentos, movimento, contradições e
transformação.
Os versos cantados por diferentes gerações, principalmente aquelas que
passaram dos sessenta anos, registram e legitimam concepções sobre a condição
de ser mulher, as resistências e contradições que surgem frente ao novo e por fim o
gradativo e contraditório reconhecimento de seu espaço.
Nas linhas e entrelinhas da música Amélia,
identificamos um modelo
masculino de sociedade, patriarcal e autoritária, que demarcou as relações,
notadamente as de gênero, desde a colonização do Brasil, solidificando estruturas
próprias, como o machismo brasileiro, disseminador da violência contra a mulher.
Em contrapartida, na música Mulher, consideramos que há uma disposição na
sociedade em reconhecer a capacidade, diversidade e complementaridade entre os
indivíduos, pois segundo o historiador Rodrigo Elias Caetano Gomes, seu mestre o
Prof. Ilmar Rohloff de Mattos, ensinava que: "a mudança no vocabulário indica
mudança na sociedade" (GOMES, 2005, p. 1).
58
Capítulo 2 – Viver o Cotidiano, Tecer a história. A mulher do século XX.
Gomes ressalta que aparentemente ao chamar a atenção para o óbvio o Prof.
Ilmar, desejava ressaltar a importância de se pensar sobre a historicidade do objeto,
de inscrevê-lo em um espaço e tempo e também como é complicado enquadrar
realidades em "esquemas ou conceitos que a elas são externos" (2005, p. 1).
Assim, refletindo sobre a história construída pela mulher durante o século XX,
constatamos que, apesar das conquistas efetuadas em diferentes campos, de
identificarmos mudanças quanto a sua função social e sua contribuição à
manutenção da família lhe atribua o papel de co-responsável na chefia da casa, as
relações sociais, interpessoais de gênero, ainda são marcadas por resquícios da
sociedade patriarcal, autoritária, que tem na violência um meio de legitimação
presente em nossa sociedade.
E, novamente, a música fornece o exemplo, uma vez que as diferentes formas
de expressão artística falam das questões, sentimentos e situações presentes na
vida cotidiana das pessoas, dos grupos, citamos as do movimento Funk, que tem
levado inúmeras pessoas a repetir, engolir, sem refletir "um tapinha não dói [...] só
as cachorras [...] as preparadas [...]".
São letras que escamoteiam a violência contra a mulher, onde a agressão é
interpretada como intrínseca às relações entre os sexos. São musicas de sucesso,
com ampla aceitação social. Não suscitam indignação, protesto ou surpresa do
público. Ao contrario, com o ritmo, o balanço, trazem diversão, fazem o público
dançar.
No entanto, na inocente aparência a mensagem subliminar pode estimular,
legitimar e perpetuar entre as pessoas a pratica da violência e os valores que a
embassam.
59
Capítulo 2 – Viver o Cotidiano, Tecer a história. A mulher do século XX.
O jornalista
Luciano
Trigo
(2001)
em
seu texto
Um tapinha não dói
argumenta:
[...] pode não doer, mas o que ele representa é doloroso, pelo menos para
alguém do século passado [...] após anos de luta feminista contra a
opressão do macho observamos diversas conquistas serem desprezadas,
irem para a lata de lixo da historia [...] as feministas devem estar vendo,
consternadas, suas filhas embarcarem no bonde do Tigrão (TRIGO, 2001).
Poderiam também exclamar: Ah! Contradições da condição feminina! Ah!
Dificuldade de nos enxergamos como sujeitos. Ah! Cultura... que utiliza desses
mecanismos desde sempre. E para recordar lançamos mão da também inocente
cantiga de roda O cravo e a Rosa, lembram-se? "O cravo brigou com a rosa.
Debaixo de uma sacada. O cravo saiu ferido. E a rosa despedaçada. O cravo ficou
doente. A rosa foi visitar. O cravo teve um desmaio. A rosa pôs-se a chorar". E nós
a repensar.
As representações que estigmatizam, inferiorizam, restringem a mulher ou a
segregam, pode ser verificada em outros exemplos como o da linguagem onde, de
acordo com as normas gramaticais, deve-se utilizar palavras masculinas nas
referências a coletivos de ambos os sexos.
Chauí (1989) explicita que a sociedade brasileira é autoritária,
porque
conheceu a cidadania por meio da imagem do senhor - cidadão que perdura como
privilégio de classe. É uma sociedade onde as diferenças sociais e pessoais são
convertidas em desigualdades, que se transformam em relações hierarquizadas de
mando e obediência presentes na esfera pública e privada, atravessando a cultura e
as relações interpessoais.
O patriarcado configura-se como o mais antigo sistema de dominação-
60
Capítulo 2 – Viver o Cotidiano, Tecer a história. A mulher do século XX.
exploração. Os cientistas sociais acreditam que o homem tenha estabelecido seu
domínio sobre a mulher há cerca de seis milênios, tendo a família ocidental moderna
desenvolvido seu modelo pautada nos hebreus antigos, cujo padrão de estrutura
familiar era a patriarcal.
Enquanto sistema sociopolítico interfere tanto na produção material quanto na
produção (ou reprodução) de seres humanos, que devem ser compreendidos como
uma unidade, uma vez que a divisão da população em classes sociais é, para
Staffioti (1987, p. 145),
[...] outra fonte de dominação, concebida como legítima quer por aqueles
que detêm poder ou não. [...] o sistema de classes não se realiza
exclusivamente no plano econômico, é uma realidade multifacética, onde
tem lugar outros tipos de dominação: social, cultural, política, ideológica,
além da econômica.
As mulheres também comprovam esse domínio quando desempenham
funções do patriarca disciplinando filhos, e outras crianças e adolescentes, segundo
as regras masculinas, colaborando para alimentar o sistema vigente. Porque se o
poder constituído era do homem, cabendo-lhe a supervisão geral e a administração
dos bens, à mulher estava destinada a formação dos filhos, a administração da casa,
ser guardiã da moral, dos bons costumes e do afeto da família.
Pinsky e Pedro (2003) esclarecem que recebemos de herança do Iluminismo
o receio do poder e influência das mulheres na política, na cultura e na vida social,
decorrente das ações de rainhas, cortesãs e nobres dentro e fora das cortes. A
consideração maléfica das influências femininas foi generalizada.
Conforme as autoras a atuação femi nina em áreas como cultura e política
consideradas masculinas foi rejeitada em favor da mulher doméstica, que opta pela
61
Capítulo 2 – Viver o Cotidiano, Tecer a história. A mulher do século XX.
família como centro de sua vida.
O desligamento das mulheres dos negócios da família acontece a medida que
o capitalismo se desenvolve na sociedade industrial gerando um aumento da riqueza
das nações e o crescimento das classes médias nas áreas urbanas. Com isso as
mulheres passam a utilizar o tempo disponível com atividades de lazer, religiosas,
cuidados da casa, da família e outros considerados de "bom tom".
É nesse momento, segundo Pinsky e Pedro( 2003), que o fato das mulheres
deixarem de trabalhar tanto fora do lar como dentro dele, contratando empregados
para os serviços domésticos, sinaliza status, porque passa a ser identificado com o
sucesso econômico do marido como provedor e administrador.
Os ideais denominados de tradicionais do perfil feminino e masculino têm
possibilidade de se expandir e popularizar no século XIX e XX. O homem deveria
segundo Pinsky e Pedro ser:
[...] alguém racional, agressivo, corajoso, capaz de tomar decisões lúcidas,
empreendedor e dominador, apto à vida pública, enquanto a mulher
deveria ser sentimental, passiva, casta, vulnerável, dependente e destinada
ao lar. [...] intensifica-se também o peso do lar - tido como um refúgio
precioso das obrigações do mundo "masculino" dos negócios e da política,
local de aconchego e moralidade [...] a maternidade em desenvolvimento
(mães devotadas, que amamentam, educam seus filhos, nos primeiros
anos de vida e administram a formação das moças) exigia por sua vez
mais tempo e energia (PINSKY; PEDRO, 2003, p. 271).
A difusão desses ideais possibilitarão criar estereótipos sobre a natural
capacidade masculina para o uso do poder e a incapacidade da mulher para o
mesmo, como também a visão de incompatibilidade entre trabalho e maternidade,
principalmente para as mulheres de "boa família".
As mulheres pertencentes às classes mais empobrecidas - trabalhadoras e
62
Capítulo 2 – Viver o Cotidiano, Tecer a história. A mulher do século XX.
camponesas - não tinham como seguir o ideal da domesticidade, levando-as a
realizar adaptações, como a conciliação do exercício de ocupações dentro do lar.
No campo, o trabalho de produzir os víveres fundamentais para a
sobrevivência da família é responsabilidade dos homens, em particular do pai. As
tarefas realizadas pelas mulheres e filhos são consideradas como ajuda. À mulher
compete, além das tarefas domésticas, as atividades que são desenvolvidas em seu
espaço como produção de doces, pães, artesanatos, entre tantos, não sendo
considerados como trabalho.
Ao rapaz é permitido sair mais, ir mais longe enquanto as moças devem sair
com a família e permanecer com ela, não só porque colabora nos serviços
domésticos, mas para ser vigiada para que não "caia na vida".
A atuação feminina, em searas masculinas, era interpretada como evidência
de desordem e corrupção. Evidenciam-se as diferenças socialmente construídas,
fazendo-se distinção entre a "mulher respeitável" e a "não respeitável".
Nesse contexto as discriminações e desigualdades, ganham guarida, mas a
realidade estimula as reivindicações femininas, o surgimento do feminismo e o
engajamento da mulher nos diferentes movimentos sociais que se formavam.
Dessa maneira, um sim ao marido poderia esconder muitos senões, porém a
prole continuou a ser educada para desempenhar os papéis socialmente esperados.
Whitaker pontua que a família,
[...] enquanto 'agência' educadora funciona como correia de transmissão do
sistema social, na medida em que é, inicialmente, a responsável pela
construção dos modelos de meninos e meninas. Exerce uma ação
domesticadora sobre ambos os sexos, mas não indistintamente, posto que
[...] o modelo feminino é muito mais artificial, envolvendo maior grau de
repressão e subordinação. Sob a aparente indíferenciação entre as
63
Capítulo 2 – Viver o Cotidiano, Tecer a história. A mulher do século XX.
crianças, ocorre um processo de socialização diferenciada (WHfTAKER,
1989, p. 25).
Em todos os aspectos da vida cotidiana essa verdade é presente, pois as
relações de gênero perpassam todos os espaços sociais e em todos os momentos
da existência humana.
Agnes Heller nos ensina que se o cotidiano familiar internaliza o aprendizado,
modelos, hábitos, padrões de comportamento é também nesse espaço micro-social
que podem ocorrer transformações, é mudando as relações dentro da família que
poderão ser alteradas as da sociedade.
Para feministas e historiadores como Pinsky e Pedro o século XX pelos
avanços e conquistas femininas é considerado o “século das mulheres [...] mas não
podemos, ainda, considerar que o século XX tenha fornecido às mulheres a plena
cidadania (2003, p. 293).
Viver sob a custódia masculina representou à mulher o ónus de ter que
adentrar para o mercado de trabalho por meio de profissões extensivas aos papéis
domésticos, no setor primário da economia, diferenciando-se por escolaridade e
classe social.
As mulheres analfabetas ou com pouca escolarização foram trabalhar como
domésticas, costureiras, cozinheiras, auxiliares de enfermagem entre outras e
aquelas com melhores posições sociais e escolarização nas atividades de nível
médio, no ensino, nas áreas administrativas e comércio.
A possibilidade das famílias passarem a usufruir de um padrão econômico
melhor permitiu que um número maior de mulheres pudessem deixar de trabalhar
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Capítulo 2 – Viver o Cotidiano, Tecer a história. A mulher do século XX.
durante uma parte de suas vidas ou somente por meio período, o que foi
interpretado como no rmal após o casamento.
O casamento como via de inserção e posição social da mulher é real em
nossa história. Bruno tecendo considerações sobre os estudos de Erik Olin Wright
sobre a posição social da mulher casada na década de 80 assinala que “as mulheres
não se inseririam só a partir de seu trabalho na sociedade, mas também a partir da
inserção dos demais membros da família e vice-versa” (1992, p. 118).
No entanto, essa face da realidade não impossibilita o avanço da participação
das mulheres, que vão adentrando aos diferentes níveis de divisão do trabalho e de
suas relações de classe.
O desenvolvimento industrial chama a força masculina para a ind ústria e abre
as portas para as mulheres em atividades de escritório. Com a ampliação de
espaços, desde os anos 70, a mulher engrossa a parcela da população
economicamente ativa e com emprego assalariado, em todos os países ocidentais,
dentre eles o Brasil.
Se, por um lado, a mulher ao entrar para o mercado de trabalho ampliou o
poder feminino por outro também não deixou de responder pelo domínio do lar,
acarretando-lhe as duplas ou triplas jornadas de trabalhos, que lhes desgastam
física e emocionalmente.
Entre lágrimas e risos, as mulheres vão às ruas. Com suas ações, valores,
crenças e impressões alteram e influenciam o cotidiano e as relações, respondendo
também pelas mudanças nas mentalidades desse século. A explicitação da
categoria Gênero é construída pelas feministas e o universo feminino começa a ser
65
Capítulo 2 – Viver o Cotidiano, Tecer a história. A mulher do século XX.
esquadrinhado. Gênero, enquanto construção social,
[...] vincula-se à elaboração de ideias sobre espaços, posições, situações e
comportamentos socialmente requeridos ou atribuídos. Em cada momento
histórico espec ífico, um processo de socialização, efetivado por indivíduos
e/ou instituições, responde pela intemalização, nos sujeitos sociais dos
traços constituintes da sociedade em que se inserem. [...] Em sendo as
relações de género transversais, perpassam todos os espaços sociais,
todas as instâncias da existência humana; se podem ser observadas no
universo doméstico e no profissional, também fazem-se presentes nas
elaborações simbólicas, nas representações sociais (VANNUCHI, 2005).
Na prática, o gênero está presente desde que homens e mulheres surgiram
na face do mundo, uma pessoa pode viver situações concomitantes em mais de uma
matriz de gênero. Por exemplo, a mulher ao cuidar de seus filhos é uma mãe
afetuosa e zelosa; com o marido, é "frágil" e amorosa; no trabalho, assume a postura
de profissional competitiva, autoritária, típica "postura" do género masculino. Essa
contradição detectada é iniciada com o estabelecimento da ordem patriarcal.
Análises formuladas pela Profª. Drª. Heleieth Saffioti, em aulas ministradas no
período entre 15 e 16/04/2003, na DMR HCFMUSP, referem que o processo de
socialização pelo qual todos nós passamos atribui diferenças "naturais" entre os
sexos com nítida divisão sexual do trabalho. Neste processo, são desenvolvidas
capacidades e habilidades diferentes nos homens e mulheres.
A mulher que envelheceu nesses anos foi a que conquistou reivindicações
pontuais como o direito de votar e receber votos; direito a exercer profissões liberais;
direito a a salário igual; direito à instrução; direito ao divórcio, aumentou sua
participacão social a partir de 1970, tanto nos movimentos sociais (com grande
participação de mulheres das camadas médias da população), como nos
movimentos populares, especialmente os das periferias urbanas.
Segundo Alambert (1997), essa realidade pode ser veríficada, por meio dos
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Capítulo 2 – Viver o Cotidiano, Tecer a história. A mulher do século XX.
diversos movimentos populares entre eles os de donas de casa, os de mães e os de
lutas pelas creches; e, por outro, nas lutas das feministas, entendendo-se feminismo
nos termos de que Saffioti emprega, ou seja, "em uma perspectiva político-científica
que tem por objetivo criar mecanismos políticos para a construção da igualdade
social entre homens e mulheres, além de colaborar para ampliar o acervo de
saberes" (1999, p. 160).
Essa mulher também descobriu as especificidades femininas: o corpo, a
sexualidade, os direitos reprodutivos, a complementaridade no trabalho, a ausência
do tempo extraordinário para si, a maternidade como função social; e, o que foi mais
importante, a ideia da construção cultural dos géneros masculinos e feminino de que
nunca seremos iguais se nossas "diferenças" não forem preservadas.
O mercado de trabalho definiu e define condições para a participação
feminina de acordo com suas potencialidades de inserção. Nesse sentido várias
características pessoais tais como condição marital, número de filhos, escolaridade,
idade, entre outras podem facilitar ou dificultar seu ingresso no sistema produtivo,
gerando alterações significativas no cotidiano feminino.
Lutar por seus direitos humanos e sociais, entrar para o espaço masculino feito por eles e para eles - implicou em buscar parâmetros para seguir e também
jogar com as mesmas regras, o que determinou, segundo Furlan (2004) e Ander-Egg
(1973), que a mulher se espelhasse no modelo de poder que conhecia: o masculino.
Essa atitude, segundo os autores e feministas como a indiana Shi va, fez com
radicalizassem os comportamentos adotados tornando-se
mais
autoritárias,
centralizadoras e hostis do que os homens, não desenvolvendo um modelo feminino
de identificação.
67
Capítulo 2 – Viver o Cotidiano, Tecer a história. A mulher do século XX.
Para Furlan (2004), esses acontecimentos geraram uma dificuldade de
comunicação homens e mulheres, prejudicando a possibilidade de construírem uma
éncia pacífica, de complementaridade e trocas. Ela pergunta:
Quem saiu perdendo com isso? Novamente a mulher, que é muito mais
vulnerável à falta de comunicação e afeto. Na busca pela merecida
liberdade, ela acabou escravizada. Mas, dessa vez, suas algemas são uma
sensação permanente de solidão, um enorme vazio interior e uma
constante insatisfação, extravasada na competição invejosa e maléfica com
o mesmo sexo. [...] Isso ocorre porque agir, pensar e viver como homem
fragiliza demais a mulher, inclusive fisicamente (FURLAN, 2004, p. 43).
Da década de 1960 para os nossos dias, ocorreram alterações na legislação
brasileira que possibilitaram à mulher adquirir gradativamente, espaço, autonomia e
direitos, porém só o Novo Código Civil, promulgado em 2002, é que efetivamente
contribui para a existência de equidade entre os sexos na sociedade brasileira.
De acordo com o Ministério das Relações Exteriores do Brasil a Constituição
de 1988 favoreceu "avançar a situação jurídica das mulheres no Brasil. Essas
conquistas foram incorporadas e realçadas nas constituições dos estados, em 1989,
e nas leis orgânicas dos municípios, em 1990".
A nova legislação reconheceu a igualdade entre homens e mulheres. Mesmo
assim, as mulheres, que representam pouco mais da metade da população (50,1%,
em 1990), ainda encontram dificuldades para participar plenamente de todos os
aspectos da vida econômica e política. As reformas legislativas contribuíram para
diminuir a discriminação contra as mulheres, mas continua a haver dificuldades para
transformar essas inovações jur ídicas em práticas de rotina.
Nesse sentido, o jurista e Prof. Dr. Eduardo de Oliveira Leite (1997, p. 28) ao
68
Capítulo 2 – Viver o Cotidiano, Tecer a história. A mulher do século XX.
discorrer sobre a concepção de família, seus modelos e arranjos contemporâneos,
sob a ótica dessas modificações legais, considera que a evolução registrada, pelo
legislador, dá visibilidade não só a situações e fatos novos, mas "também a moral
implícita com a qual eles são considerados".
Essa legalização revela que, de diversas formas e instâncias, a mulher
brasileira tem trabalhado em seu cotidiano procurando decompor os estereótipos
vinculados à condição feminina, buscando viabilizar para si equidade social.
Na
família,
identificam-se
alterações
em
sua
concepção,
relações,
comportamentos e papéis sociais. Como consequência, os dados estatísticos
constatam tanto no Brasil como em outros países do mundo, uma diminuição no
número de seus componentes, identifica-se a existência de um "embaralhamento"
de papéis e que os novos arranjos, dificultam realizar uma definição única para
caracterizá -la.
Ao abordar essa questão, Todo (2001, p. 3) afirma:
Se há algum tempo a família - com país (heterossexuais!) e filhos (somente
deste casamento!) - expressava a realidade da maioria dos núcleos, ela
passa a ser cada vez menos frequente no quadro atua) [...] Se, há pouco
tempo, os comportamentos familiares eram guiados pêlos "hábitos da
família de classe média", e todas as demais formas de viver eram
consideradas "erradas", aos poucos, como em todos os movimentos
sociais e comportamentais, o padrão foi se modificando e se pluralizando.
Os meios de comunicação, o processo de globalização e os movimentos
de imigraç ão, típicos desta segunda metade de século, contribuíram para
que o modelo familiar se diversificasse.
São legitimados outros modelos de famílias o que leva ao rompimento do
paradigma do modelo familiar tradicional, cujo conceito legal de família era
reconhecido a partir da relação decorrente do casamento.
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Capítulo 2 – Viver o Cotidiano, Tecer a história. A mulher do século XX.
É necessário registrar que conviveram, com a família "nuclear", outras formas
de família frente as circunstâncias vivenciadas pelas pessoas. São grupos que
incluem componentes não pertencentes a ele como avós e avôs viúvos, órfãos e
mães solteiras, filhos casados o que leva a coexistência na mesma casa de três ou
quatro gerações.
A natureza entre as relações dentro da família se transformou ao longo do
tempo. A maior dificuldade dessa evolução está, sem dúvida alguma, ligada ao
questionamento da posição económica das mulheres dentro da família, inclusive da
distribuição dos papéis, especificamente, masculinos ou femininos.
Com essas e outras questões em sua história, são as mulheres que, ao
envelhecer, buscam novamente caminhos para vivenciar essa nova fase de sua vida
com as contingências históricas na qual estão inseridas. Os grupos de terceira Idade
e os de convivência comunitária vão oferecer os espaços por elas demandados.
Goldemberg (apud LAGE, 2005, p. 4) afirma que as características da
brasileira
[...] contribuem para tomar essa forma de viver mais feliz, com a
participaç ão em clubes, igrejas e rodas de amigos. Em países como o
Japão, a antropóloga cita casos de pessoas que "alugam parentes" para
não passarem pelo constrangimento de não ter ninguém ao lado. É uma
sociedade despreparada para a solidão.
Hoje, as mulheres com mais de 60 anos, acompanharam e viveram de forma
ao mesmo tempo singular e diferenciada as transformações socioculturais e políticas
do século XX, que geraram uma convivência cotidiana com um legado de valores
tradicionais e modernos, bem como com suas resultantes. Pertencem a grupos
sociais heterogêneos, que teceram, ao longo do tempo, o jeito de ser mascuino e
70
Capítulo 2 – Viver o Cotidiano, Tecer a história. A mulher do século XX.
feminino, implicando em construções e delimitações de espaços e relações.
Para refletirmos sobre a trajetória das mulheres utilizo a síntese efetuada por
Pinsky e Pedro no capítulo Igualdade e Especificidade, do livro História da Cidadania
que nos diz:
De simples "costela de Adão" à conquista da cidadania plena, é uma longa
trajetória ainda não completada pelas mulheres. Mesmo no Ocidente, onde
o avanço é maior e a subordinação social das mulheres tem se reduzido
sensivelmente, elas ainda sofrem com a violência, salários menores,
preconceitos de diferentes tipos. Que dirá em países africanos ou islâmicos
em que são vistas como apêndice do homem, na melhor das hipóteses?
Contudo [...], avançamos. Que as várias vitórias obtidas sirvam-nos de
inspiração para as lutas futuras (PINSKY; PEDRO, 2003, p. 304).
E acrescentamos que são necessárias duas pessoas para dançar um tango!
Isto é, relacionamentos envolvem sempre mais do que uma pessoa, e o sucesso do
que almejamos depende do bom entendimento das afinidades e diferenças.
CAPÍTULO 3
Viúva Brasileira
década de 90 séc. XX
MULHER
VIÚVA.
O QUE
SERÁ
O
AMANHÃ ?
Viúva Alemã
Inicio séc. XX
Título de Viuvez
Capítulo 3 – Mulher Viúva. O que será o amanhã?
72
Morreu meu marido
No meio das flores;
Acabou-se a alegria,
Acabaram os amores.
Coberta de luto,
De luto fechado,
Semanas inteiras
Eu tenho chorado.
Ai, ai, eu vou,
Eu vou morrer
Em teus lindos braços
Eu vou falecer
POBRE VIÚVA
Cantigas de Roda, Folclore Brasileiro.
obre Viúva, Viúva Alegre, Viúva Regateira, Viúva Negra, Viúva Bruxa,
Viúva Nova, Viúva Ardente, Viúva, porém Honesta, Viúva Branca 3, Viúva Órfã 4 e
outros tantos adjetivos têm sido utilizados para qualificar ou desqualificar o estado
civil da mulher cujo companheiro morreu.
Entre realidade, mitos e fantasias a imagem e o papel de viúva vem sendo
historicamente construído, sincronizado aos padrões morais e sociais vigentes. Pode
significar acréscimo de restrições ao papel de mulher e favorecer práticas sociais
excludentes, ampliando as desigualdades de gênero existente nas diferentes
sociedades. Aos homens as limitações impostas, quando existentes, são menores
ou inexistentes.
Mas... podemos nos questionar O que é uma viúva? As pessoas mais
brincalhonas responderiam: - é a única mulher que sabe onde o marido está; Aurélio
3
Mulher que enviuvou sem ter conhecido sexualmente o marido. Cf. FERREIRA, Aurélio Buarque de
Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Nova
Fronteira. 1994. p. 2070.
4
Tipográfico Linha quebrada. Cf. FERREIRA, 1994, p. 2070.
Capítulo 3 – Mulher Viúva. O que será o amanhã?
73
Buarque lexicógrafo brasileiro define como: "Mulher a quem morreu o marido e que
não voltou a casar-se" (FERREIRA, 1994, p. 2070); - Um índio da tribo tupi a
designaria de "kunhã-mene'õ", "mulher-viúva do marido morto", nessa língua o
possuído vem imediatamente antes do possuidor, um hindu da casta brâmane diria
que é sutt’ism ou viúva ardente.
Na Assíria uma mulher só seria reconhecida como viúva se o marido e sogro
tivessem morrido e ela não tivesse nenhum filho, portanto o termo era reservado
para mulheres que não dispusessem de um homem para protegê-las e nem meios
de suporte financeiro, precisando dessa maneira de proteção legal.
O vocábulo viúva vem do latim "vidua" que, segundo o Dicionário Escolar
Latino-Português 5 é um adjetivo.: 1. privado de, que tem falta de, despojado; II que não tem mulher, separada do marido ou do amante, que não tem marido, III –
que não é casada, ligada a.....
No Latim e no Grego não há uma forma masculina para designar o termo
“viúva", enquanto que na língua anglo-saxônica a forma masculina só apareceu mais
tarde no século XIV. Aparentemente, na maioria das sociedades, a viuvez afeta a
identidade do homem muito menos extensamente do que para as mulheres.
Fonte de inspiração para as diversas artes humanas, a figura da mulher viúva,
retrata na maioria das obras a dualidade entre a "concepção social de fragilidade,
inaptidão e suscetibilidade para o sexo atribuídas a mulher" versus "a capacidade de
estruturar, organizar e desenvolver sua vida e a de seus dependentes com
autonomia".
5
Cf. FARIA, Ernesto. Dicionário Escolar Latino-Português. 6. ed. Rio de Janeiro: MEC/FENAME,
1982.
Capítulo 3 – Mulher Viúva. O que será o amanhã?
74
O tema da viúva explorada que logo fez por se consolar e se casar de novo
em rápidas núpcias, é largamente difundido desde a Antiguidade, a exemplo no
Satiricon, de Petrónio, que relata a história de uma matrona em Éfeso; La Fontaine
voltará a tratar do mesmo assunto numa das suas fábulas (VI, 21); Voltaire,
inspirado num conto chinês, no Zadig (cap. II: «O nariz»), Gautier Le Long, e outros.
Outra imagem recorrente é a da viúva pressionada pela família a realizar novo
matrimonio como forma de manter-se sob proteção e controle social. Artur de
Azevedo, em seu conto A viúva de Estanislau6 ilustra essa situação. Abaixo citamos
a fala do pai de Adelaide a viúva:
Minha filha, numa terra de maldizentes como este Rio de Janeiro, a
reputação de uma viúva moça e bonita corre tantos perigos, que a melhor
resolução que tens a tomar, para fazer respeitar a memória honrada do teu
Estanislau, é casares-te em segundas núpcias. Uma única dificuldade
haveria para isso: o marido; mas neste particular, minha filha, foste de uma
fortuna fenomenal. O Miranda caiu-te do céu! Olha, eu, se tivesse que
escolher um genro, não escolheria outro -, e tu, se te casares com ele,
darás muito prazer a tua mãe, e tornarás feliz a minha velhice (Azevedo,
2005).
Bremmer (1995), antropólogo norte-americano, coordenou a publicação de
um conjunto de estudos sobre tradições religiosas, aspectos jurídicos e normas
socais existentes para o papel de viúva no mundo, até a década de 70, concluindo
que é difícil definir um papel "típico de viúva".
Ele justifica argumentando que a diversidade cultural e religiosa existente
produz uma experiência feminina diferenciada, em função dos períodos históricos e
regiões, dos estados legais reconhecidos socialmente e pelas condições
econômicas existentes.
6
Ver o conto completo no Anexo D.
Capítulo 3 – Mulher Viúva. O que será o amanhã?
75
Em comum, esses estudos verificaram a condição econômica e social das
viúvas e constataram a existência de uma variedade de controle e restrições
aplicadas a elas. Para os homens, tais aspectos são menores ou inexistentes.
Frequentemente as viúvas vestem roupas consideradas pelo grupo social
como apropriadas em cor e estilo, um tipo de cabelo, véu sobre o rosto. São
determinados padrões de comportamentos como dedicarem-se a oração, a caridade,
aos netos, a família, apresentar-se com aspecto entristecido, viver isoladas,
casarem-se com o sogro ou outro parente do marido, entre outros.
Entre os católicos até meados do século XX era comum que a mulher após
enviuvar assumisse a vida religiosa. Harvey (2003), ao comentar sobre as
vestimentas e hábitos relacionados aos ritos de morte na Inglaterra do século XIX,
descreve-os com riqueza de detalhes fornecendo elementos para refletirmos sobre o
significado atribuído a esse momento, que demarca a ruptura com o cotidiano
anterior para a família e principalmente para a mulher. O autor conta:
Havia muitas mortes na vida das cidades vitorianas - tornadas ainda mais
visíveis porque os corpos eram velados nas casas. [...] houve uma
elaboração pêlos vitorianos de uma espécie de teatro formai da morte. Sem
dúvida houve um aumento no uso do negro em funerais, com plumas
negras no carro funerário, plumas nos cavalos, bastões e varas cobertas
de negro, e bandejas de penas negras que eram carregadas pêlos agentes
funerários. Havia também a decoração funerária nas casas, ornamentos
negros para a mobília, gaiolas de pássaros negras,e até roupas de baixo
femininas para a ocasião. Se a escuridão social era encontrada
principalmente entre os pobres, o negro fúnebre e o prolongado período de
luto - e, em seguida, de meio-futo - eram mais comuns quanto mais se
subia na escala social (2003, p. 223).
O elevado índice de mortes é uma das conseqüências do desenvolvimento
industrial em marcha, que acelerou o processo de urbanização, provocado pelo
Capítulo 3 – Mulher Viúva. O que será o amanhã?
76
êxodo rural dos camponeses às cidades, despreparadas para recebê-los, havia falta
de saneamento básico, de habitações condizentes que levaram a criação de
inúmeros cortiços acarretando epidemias por doenças infecto -contagiosas e outros
males que se propagam e desconhecem os limites de classes sociais, atingindo as
pessoas de forma igualitária.
Por seu poderio econômico e pioneirismo no desenvolvimento capitalista a
Inglaterra passa a ser modelo para os demais países, desta forma, chegando ao
mundo a moralidade vitoriana, vigilante da moral, dos bons costumes, rígida, que
transforma em virtude a severidade que empregava. Os corretivos na educação, no
exército, na família, nas prisões como forma de disciplinamento e controle.
Harvey (2003, p. 236) ao discorrer sobre o uso da cor negra nesse contexto
afirma:
[...] o negro é a única cor a ser escolhida por uma moralidade que é
sustentada pelo temor. [...] Mesmo que o Cristo não baseie seus
ensinamentos morais no medo, o medo, seja do purgatório seja da
danação, tem lugar importante no cristianismo mais recente.
O papel de viúva emerge nos preparativos da cerimônia fúnebre, com a morte
do papel de esposa, ambos são moralizados e normatizados de forma a subordinar
a mulher, porém o de viúva tende a tolher ainda mais a mulher. Agora ela não dispõe
de um homem que evite fazer bobagens.
As cores preta e branca se fazem presentes, uma em cada ocasião e seu
significado, no casamento o branco que denota a virtude e o preto no funeral que
contará do seu pesar e sofrimento. Na moral vitoriana não há espaço para o prazer
ou a leveza do espírito.
Capítulo 3 – Mulher Viúva. O que será o amanhã?
77
No Brasil as regras foram adaptadas a nossa realidade considerando a
defasagem de desenvolvimento existente, éramos um país agrícola.
A industrialização/urbanização brasileira acontece em outro momento
histórico, concomitante à chegada dos imigrantes, que trazem consigo seus rituais
da morte, permitindo um sincretismo que vai gerar, para a maioria da população,
padrões comuns que guardam em muito dos rituais descritos, em função de nossa
herança cultural.
Se as regras até o momento descritas parecem muitas, encontramos outras
mais que deixam transparecer as diferenças de exigências para homens e mulheres.
Harvey (2003) afirma que, até a primeira metade do século XIX, somente os
homens compareciam aos enterros, as mulheres permaneciam e observavam o luto
em casa. Mas esclarece que tanto em casa quanto depois, na época em que passa
a comparecer aos enterros, deveriam vestir-se elaboradamente de preto.
Uma viúva devia usar crepe negro durante doze meses; em seguida, seis
meses usando uma seda dita de viúva e, depois, mais três meses num
preto mais variado, com franjas. A seguir seguiam-se mais seis meses de
meio-luto, quando cores como cinza, alfazema, lilás e violeta podiam ser
usadas junto com o preto (HARVEY, 2003, p. 224).
Com tantas determinações e luxo o resultado observado é que os retratos de
mulheres viúvas, nessa época, chamam a atenção por reproduzir os extremos
sociais tão evidentes: aquelas muito pobres ou as generosamente ricas,
desconsiderando a realidade de encontrarmos viúvas em todos os estratos sociais.
Observa-se a criação de um elaborado cerimonial de morte, uma
Capítulo 3 – Mulher Viúva. O que será o amanhã?
78
materialidade associada a ele, distingui-se um comércio pelas quantidades de
tecidos, objetos e outras formas de manifestações criadas, como também uma
indicação do prestígio social tanto do morto quanto daqueles que comparecem ao
enterro. E, novamente, é o corpo da mulher que é utilizado como vitrine do status do
marido, que mantém a condição de ser por meio do outro, que não está mais
presente para lhe fazer o contraponto.
Ao revermos essa fase da história verificamos o quanto de pompa e
circunstância existe em vários cerimoniais de morte principalmente de pessoas
célebres e como muitas mulheres passaram quase toda a vida de preto. A rainha
Vitória é um bom exemplo de ambos vestiu luto por quarenta anos e, em seu próprio
funeral que seguiu as regras, todos os participantes da procissão usavam preto.
O ideário existente apresenta as viúvas de forma mais descritiva do que
prescritiva como, por exemplo, a figura das madrastas nos contos de fadas, a viúvabruxa ou a mudança da imagem da viúva de luto na sociedade alemã, com suas
roupas pretas. Van Os (apud BREMMER, 1995) aponta a dubiedade dessa
vestimenta que expressa a dignidade por um lado, mas poderia também ter uma
conotação erótica. Por quê? Porque o negro na mulher é a cor do mistério, das
fantasias, da sedução, da magia, da transgressão.
Bremmer (1995) afirma que as viúvas são, em geral, mais envolvidas em
atividades religiosas do que os viúvos ou mulheres casadas, como as que auxiliaram
São Vicente de Paula no cuidado aos órfãos mantendo sua obra por meio dos
Vicentinos ou cuidados com os locais e objetos religiosos.
Esse aspecto do papel de viúva tem sido esmiuçado pelos escritores,
colaborando para a construção de um estereótipo da mulher amarga, beata,
Capítulo 3 – Mulher Viúva. O que será o amanhã?
79
controladora da vida do grupo social, reprimida sexualmente . A personagem
Perpétua criada por Jorge Amado no romance Tieta do Agreste, 1977, é um exemplo
nacional, ou a "amante do padre", que reforçam traços negativos já existentes no
imaginário coletivo. Não deixamos de reconhecer que há mulheres desempenhando,
realmente, esse papel.
Verifica-se que há um grande número de viúvas entre os primeiros seguidores
de Jesus e a evidência dessa personagem em suas lições e milagres, em função do
desprestígio e destino à prostituição que lhes eram imputados, quando não
dispunham de proteção familiar ou condições financeiras para manterem-se. Nesse
sentido uma estória ilustrativa é a de Maria Madalena (Anexo C).
Segundo Bremmer (1995) e Van Os (apud BREMMER, 1995), no início das
comunidades cristãs, uma das questões discutidas era se as viúvas deveriam casarse novamente, não havendo registro de consensos. Mas, se algumas religiões como
a católica as acolhia, em outras eram excluídas até das cerimônias religiosas, como
as viúvas brâmanes na índia.
Há informações sobre as limitadas opções ocupacionais de muitas viúvas no
século XVIII na Inglaterra e na França, le vando a situações de dependência,
isolamento e pobreza.
Leite (1997), no final da década de 90 do século XX, encontrou dados
semelhantes aos apresentados no livro de Bremmer no tocante às possibilidades de
ocupação para as viúvas. Sinaliza que o maior problema delas decorre da sua
inaptidão para o trabalho, o que as mantém fora do mercado de trabalho ou com
difícil acesso. A vulnerabilidade que atribui a esse contingente populacional vinculase ao baixo rendimento garantido pelas pensões estatais ou pecúlios de natureza
Capítulo 3 – Mulher Viúva. O que será o amanhã?
80
particular.
Essa questão nos remete a concepção vigente nas sociedades quanto a
educação formal das mulheres e seu preparo para a participação no mercado de
trabalho. Mesmo quando de sua inclusão as ocupações a ela destinadas e a
remuneração oferecida não lhes assegura uma condição de sustentar-se e a sua
prole se ainda a tiver.
Para aquelas que usufruíam de situação financeira estável e posição social
diferenciada, embora tivessem possibilidade de participação e inserção social não
desfrutavam de poder na sociedade, isto é, necessitavam sempre de ter a tutela
masculina para a realização de assuntos da esfera pública.
Ao longo dos séculos, parece que a humanidade, em função do papel
submisso imposto às mulheres, compreendeu a sua condição de viuvez como de
vulnerabilidade, de risco social, dela e da prole, para quem deveriam ser
direcionados os serviços organizados de proteção social.
Jó, personagem bíblico, proclamava que dava livremente alimentos para o
pobre, a viúva e o órfão. Similarmente, nas leis do reino anglo -saxônico, Aethelred, o
clérigo, foi instruído "para não molestar as viúvas e os órfãos, mas para alegrá-los
avidamente".
Algumas viúvas alemãs dos séculos 17 e 18 recebiam certos benefícios como
o direito à pensão de viuvez, herança e tutela das crianças, porque eram
enquadradas pelas autoridades da época na categoria chamada personae
miserabiles (pessoas miseráveis), um status que compartilhavam com os órfãos,
com os doentes crônicos e outras "pessoas infelizes".
Capítulo 3 – Mulher Viúva. O que será o amanhã?
81
Chequer (2006) refere que, em Minas Gerais no século XVIII, após a morte do
pai, o filho menor era entregue a uma pessoa idônea, que seria responsável por sua
educação, sustento e administração dos bens herdados.
A viúva, para ser tutora, precisava comprovar algumas virtudes e deixaria de
exercer a tutoria caso contraísse novo matrimonio. Ao Juiz de Órfãos cabia a
decisão final. Caso a herança fosse superior a 60$000 réis, a lei determinava ser
preciso pedir provisão ao rei. No entanto, para os homens a tutoria era concedida de
pronto.
Para a Igreja e o Estado português as mulheres deveriam somente ser
submissas ao homem. Essa visão gerou uma dependência que realçou as diretrizes
patriarcais para a família colonial.
Essas referências sugerem a imagem da viúva como uma mulher
incapacitada, necessitada de ajuda, reforçando a idéia de vulnerabilidade. Numa
visão global das sociedades do Oriente Médio e do judaísmo, por exemplo, viúvas e
órfãos eram considerados protótipos de uma sub-privilegiada sociedade: falar de
“uma pobre viúva" era considerado um pleonasmo.
De fato, nos exemplos e estudos de Bremmer (1995), as viúvas viviam em
circunstâncias de extrema pobreza. As viúvas anglo-saxônicas e suas crianças
poderiam ser conduzidas à escravidão quando incapazes de pagar suas contas.
Muitas viúvas, na França e na Inglaterra do século 18, possuíam fichas criminais nos
arquivos judiciais como ladras e prostitutas.
No entanto, as viúvas em algumas regiões da África rejeitam o amparo da
comunidade, assumem a chefia de suas famílias e são por si só independentes, pois
Capítulo 3 – Mulher Viúva. O que será o amanhã?
82
objetivam serem amparadas por seus filhos na velhice.
Observamos que nas leis, nos textos, estórias, contos e na literatura, a viúva
está incluída na mesma categoria dos órfãos, por um lado; e com virgens, freiras,
solteiras e ascéticas, por outro.
As virgens-freiras, as solteiras e as viúvas são consideradas da mesma forma
em diversas sociedades porque fazem parte do grupo adulto fecundo da
comunidade. No entanto, ao homem não são imputados barreiras podendo a
qualquer tempo reproduzir, enquanto para a mulher existem duas condições que se
configuram como impedimentos sociais para gerar filhos, uma social enquanto
virgem e a outra biológica pós-menopausa.
Essa discussão encerra o universo das pessoas sexualmente ativas e a
regulação dessa condição, estando em jogo como manter a castidade da mulher que
apresenta condições de reprodução.
Por muitos séculos, isto significou controlar o comportamento feminino com
regras rígidas para garantir a origem dos filhos aos homens, às famílias. Até o
advento da pílula e dos exames de DNA a paternidade era uma decisão pessoal ou
de honra familiar, inúmeras vezes "lavada com sangue".
Com relação ao controle social da sexualidade feminina e, no caso das
viúvas, a historiadora Profª. Drª. Eni de Mesquita Sâmara nos conta que:
[...] os filhos ilegítimos, quando declarados e reconhecidos, apareciam
sempre nos casos de separação, celibato e viuvez, embora fosse esperado
das viúvas um comportamento exemplar [...]. Note-se que honradez e
probidade comprovada eram atributos essenciais às mulheres e
principalmente as viúvas deveriam zelar por esses valores morais. Apesar
Capítulo 3 – Mulher Viúva. O que será o amanhã?
83
das pressões sociais e familiares existentes algumas declararam em
testamento, que por "fragilidade humana" tiveram cópula ilícita [...] assim
uma mulher casada declarava que tinha três filhos legítimos e sete
ilegítimos, dois nascidos durante o casamento e cinco já na viuvez (1986,
p. 64).
De uma forma ou de outra, o que se observa é a existência de transgressões,
de rupturas que legitimavam a tutela, embora os comprometimentos sociais desta
falta de controle e proteção do homem variem para cada categoria, isto é, solteiras,
viúvas e celibatárias.
Bremmer (1995) refere que, em relação a viúvas e órfãos, dois conceitos são
evidenciados: a condição socioeconômica e a sua sexualidade.
Entende-se que, frente às outras categorias de comparação, a mulher viúva
potencial de desejo sexual ligado ao conhecimento e vivência durante o casamento,
o que o autor diz ser uma fonte de ansiedade cultural, uma ameaça ao poder.
A ansiedade cultural que uma viúva pode causar está ligada ao fato de que
sobrevivendo a seu marido ela desafia a autoridade masculina existente.
Sobrevivendo a ele, ela de uma maneira qualquer o desafia. Viúvas podem dispor de
liberdade e poder em diferentes momentos históricos, o que elas não tiveram como
esposas. Corazon Aquino é o exemplo de viúva que substituiu seu marido em
posição de poder político. As mulheres frequentemente surpreendem sua família e
amigos revelando-se, elas mesmas, como pessoas bastante fortes provando ser
capazes de cuidar de si próprias e de seus filhos.
Em outras palavras, o poder que essas viúvas possuem de facto (real) não é
um direito pleno delas, mas pertence de jure (judicial) ao homem. No entanto, à
medida que as sociedades tendem a equilibrar o poder entre os gêneros o
Capítulo 3 – Mulher Viúva. O que será o amanhã?
84
simbolismo vinculado à viuvez vai perdendo seu significado.
Com o desaparecimento gradativo das vestes de luto em diferentes países do
mundo, a cor preta vai sendo associada ao poder e a padrões masculinos de
autoridade.
Nos últimos duzentos anos, as modificações nas relações sociais,
principalmente de gênero, foram sendo estabelecidas e a cor negra assume uma
proximidade cada vez maior com o poder. As pessoas tornaram-se mais práticas,
individualistas, velozes, sem tempo e valores que sustentem rituais longos e
pomposos que não encontram espaços na rotina diária das pessoas. As virtudes são
outras.
A viuvez é uma situação que se impõe, é o inusitado acontecendo no
cotidiano, é a ruptura, a mudança. Para as mulheres que estão na terceira idade é
um momento de enfrentar o duplo tabu do século XX: a realidade de estar
envelhecendo e a existência da morte.
Envelhecer e morrer são fatos que assustam as pessoas cada dia mais.
Maranhão, em 1985, já escrevia que:
[...] numa sociedade como a nossa, completamente dirigida para a
produtividade e o progresso, não se pensa na morte e fala-se dela o menos
possível. Os novos costumes exigem que a morte seja o objeto ausente
das conversas educadas. [...] Atualmente as pessoas são destituídas do
direito outrora fundamental. Não se morria sem antes se ter tido tempo
para saber que se ia morrer (1985, p. 11).
Ele nos fala da mudança do lugar da morte gerada pêlos avanços
biotecnológicos que produziram a longevidade, o amenizar das dores, a busca da
juventude, fazendo com que passássemos a negar a nossa finitude. A morte não
Capítulo 3 – Mulher Viúva. O que será o amanhã?
85
pode ser admitida, porque é incompatível com os valores da economia vigente. E, se
assim é, seus rituais também deixam de ter espaços.
Somando os porquês, olhamos para as mulheres que se coloriram e outra
pergunta nos salta o que será do amanhã?
Capítulo 4 – A Construção da Pesquisa
87
À primeira vista, a vida quotidiana saltita diante dos nossos olhos como
uma bola de bilhar: redondinha, perfeita, polida e, o mais importante,
compacta, elástica, capaz de vibrar inteira e rodar no verde do pano da
nossa mesa de trabalho a uma qualquer bem dada tacada epistemológica.
Contudo, todas estas primeiras impressões se desvanecem quando nos
lançamos no estudo da vida quotidiana.
Pais, 2003,p.14
4.1 Opção Metodológica
Pesquisar é um verbo que nós humanos conjugamos desde a mais tenra
idade, como decorrência de nossas inquietações e curiosidade em conhecer o
mundo. Inicialmente sem consciência do ato, do método vamos incorporando o
resultado de nossas "investigações", aprendendo e acumulando parcela importante
do conhecimento necessário para sobreviver e fazer parte de nosso meio.
Agnes Heller (1987) afirma que é por meio desses processos interativos, com
o mundo e pessoas, que vamos nos apropriando de um conhecimento existente e
produzido no cotidiano ele nos instrumentaliza para viver em nosso meio social.
Hannah Arendt (1985) complementa dizendo que também integra nossa condição de
ser.
Investigamos para tudo, tanto para comprar um automóvel quanto para
conhecer as condições de vida de uma população. O que torna uma pesquisa
científica é ter sido realizada de modo sistemático, com um método e técnica
específicos, garantindo sua principal propriedade a reprodutibilidade, e sua
finalidade a de concorrer para o progresso da sociedade, desenvolvimento
intelectual do homem e a produção de ciência.
Capítulo 4 – A Construção da Pesquisa
88
Bagno explica que pesquisa
[...] é uma palavra que nos veio do espanhol. Este por sua vez herdou-a do
latim. Havia em latim o verbo perquiro, que significava "procurar buscar
com cuidado; procurar por toda parte; informar-se; inquirir; perguntar;
indagar bem, aprofundar na busca". O particípio passado desse verbo
latino era perquisitum. Por alguma lei da fonética histórica, o primeiro R se
transformou em S na passagem do latim para o espanhol, dando o verbo
pesquisar que conhecemos hoje (2000, p. 1 T).
Dessa forma, em sua origem, a palavra pesquisa contém e conduz o homem,
o pesquisador às primeiras etapas do processo de construção de um conhecimento,
significando procurar a verdade, as respostas para suas inquietações intelectuais.
Pode significar também o surgimento de novas questões, demandando outras
investigações, lembrando-nos que a espiral do conhecimento é ascendente e infinita.
Seabra (2001, p. 11) tem uma forma peculiar de definir pesquisa, para ele "é
espionar, observar paciente e atentamente durante dias e horas a fio, como se
aguarda de tocaia o momento do ataque. A investigação exige olhos atentos e mãos
prontas para fazer anotações".
Pais (2003, p. 32) afirma que "a revelação do social - seguindo as rotas do
quotidiano - não obedece a uma lógica de demonstração, mas antes a uma lógica de
descoberta na qual a realidade social se insinua, conjectura, indicia".
Para o filósofo, o cotidiano é "uma rota de conhecimento", constituindo-se em
uma das maneiras de contextualização do social. O pesquisador é o "maquinista" no
encaminhamento do conhecimento, toda pergunta é uma busca e o método deve
passar pela realidade, permitindo ver o que acontece ou não na mesma, a fim de
que ocorra um "acercamento" da realidade.
Ao nos reportarmos à vida cotidiana, a compreendemos como sendo aquela
Capítulo 4 – A Construção da Pesquisa
89
que acontece todos os dias, com suas rotinas, ritmos, cujo conteúdo contém um
saber e que Heller define como:
[...] a vida do homem inteiro, ou seja, o homem participa na vida cotidiana
com todos os aspectos de sua individualidade, de sua personalidade. Nela.
colocam-se "em funcionamento" todos os sentidos, todas as suas
capacidades intelectuais, suas habilidades manipulativas, seus
sentimentos, paixões, idéias, ideologias (HELLER, 1885, p. 17).
Essa pensadora centraliza o estudo da vida cotidiana no indivíduo e na rotina,
como forma de apreensão da realidade social, pois é na reprodução do fazer diário
das atividades produtoras e das relações sociais, que são percebidas as mudanças
sociais que podem ocorrer por modificações progressivas ou inesperadas, a tomada
de consciência, onde as lutas de classes ocorrem.
A vida cotidiana contém uma unidade imediata de pensamento e ação –
pensamento volta-se para a ação, o que torna a vida cotidiana pragmática, porque
não alcança o plano da teoria, o pensamento apresenta-se fragmentado. É
espontânea e ocorre no plano das aparências e não na essência das relações
sociais. Na cotidianidade, o correto e o verdadeiro não são problematizados.
O pensamento cotidiano e a ação são acompanhados por uma certa fé e
confiança particular do indivíduo que, ao embasarem juízos provisórios, no entender
de Heller (1985) são pré-juizos ou preconceitos pertencentes a categoria da
ultrageneralização.
Para Heller (1985), a ultrageneralização são juízos provisórios que na prática
cotidiana são confirmados, ou pelo menos, não contestados enquanto o indivíduo o
toma por base. É nesse sentido que a pensadora situa a questão da fé – que tem
base no indivíduo – particular e da confiança – que é um afeto do indivíduo inteiro,
portanto mais próximo da experiência, da moral e da teoria.
Capítulo 4 – A Construção da Pesquisa
90
Os juízos de valor e o pensamento expressam os interesses de uma camada
ou classe social à medida que somos socializados, via de regra, pelas gerações que
nos precederam ou instituições escolhidas por ela. O mundo nos últimos sessenta
anos tem proporcionado às pessoas diferentes fontes de conhecimento, que por sua
vez nem sempre são compartilhados com as gerações anteriores, podendo gerar o
distanciamento entre gerações, a perda ou a descaracterização do saber do grupo
social ou a prevalência de um saber dominante.
A cristalização do preconceito pode ocorrer por meio da analogia responsável
por propiciar ao homem a aquisição do conhecimento cotidiano necessário para sua
orientação. Fundamentado em algum saber anteriormente assimilado o homem
realiza por analogia uma classificação do novo e posteriormente na prática ele irá
avaliar o que esta frente a ele. Se essa ação não ocorre, a analogia pode
transformar-se em preconceito.
Utilizamos o precedente para orientar nosso comportamento, atitudes e a
imitação para a assimilação dos costumes, é assim que tanto o trabalho quanto a
interação social podem acontecer. Por imitação aprendemos a fazer.
No entanto, não podemos limitar o cotidiano a apenas um espaço de
realizações de atividades repetitivas, monótonas e banais, é também, segundo Pais
(2003, p. 78) "um lugar de inovação. [...] A própria recusa do quotidiano (a festa, as
viagens, as férias [...]) é sua reorganização e transformação", com lugar para o
excepcional, o imprevisto, o casual, o ingovernável.
Dessa forma, ao pesquisador cabe alcançar tanto o comum quanto o
extraordinário desse cotidiano. Ao ser tomado como fio condutor para o
conhecimento da realidade, desvela por meio da vivência do homem no seu dia a
Capítulo 4 – A Construção da Pesquisa
91
dia, o relacionamento que mantém com a totalidade social e com a sua construção.
Pais (2003, p. 115) sinaliza que a vida cotidiana “pede um complemento
circunstancial. Vida quotidiana de quem? Em que situação? Em que contexto?
Realizar esse estudo teve como intuito sair do conhecimento empírico do
fazer diário profissional para assimilar e compreender esse cotidiano numa
perspectiva científica.
Então, com olhos atentos, computador a mão, idéias na mente iniciamos a
trajetória desse caminho por meio da pesquisa bibliográfica. Do primeiro ao último
momento desse estudo não se deixou de lado a busca por material bibliográfico,
operacionalizada por meio de um levantamento de bases de dados Medine,
consultas a livros e artigos de revistas de autores nacionais e estrangeiros O
material obtido foi utilizado para desenvolver e embasar teoricamente a orgaiização
do texto.
Esse processo foi significativo, pois permitiu constatar a existência da escassa
literatura científica brasileira sobre o tema; e maior a produção popular (piadas, sites,
sites eróticos, curiosidades, músicas), no anexo D encontra-se de tudo um pouco.
As publicações científicas divulgadas pertencem as áreas de história, direito,
antropologia e psicologia, com temas específicos da mesma como: direito de
herança, luto, condição de vida no Brasil colônia, século XVIII, entre outros.
Encontramos produção científica sobre a viuvez em sites de universidades e
algumas revistas americanas, inglesas e canadenses nas áreas de economia,
história, antropologia e psicologia. Há vários estudos relacionados à seguridade
social, depressão, saúde, programas de prevenção a doenças e manutenção das
condições de autonomia e independência.
Capítulo 4 – A Construção da Pesquisa
92
O processo metodológico adotado incidiu sobre a pesquisa qualitativa, por
acreditarmos que sua natureza facultaria o acercamento e apreensão da realidade,
necessários à compreensão de nosso objeto de estudo.
A pesquisa qualitativa busca uma interpretação de resultados dentro de um
contexto histórico, não sendo considerada vazia, mas sim coerente, lógica,
localizada e consistente, aprofundando tanto quanto possível a análise dos fatos
(TRIVIÑOS, 1987).
Martins e Borgus (2004, p. 48) complementam a idéia do autor ao
argumentarem que "os métodos qualitativos produzem explicações contextuais para
um pequeno número de casos, com ênfase no significado - mais que na freqüência do fenômeno".
4.2 O Cenário
Antes de iniciarmos a apresentação do local da pesquisa é necessário
registrar um esclarecimento. Inicialmente o local e sujeitos dessa pesquisa eram
respectivamente a Divisão de Medicina de Reabilitação – DMR HCFMUSP, onde
trabalhava como Assistente Social, e as idosas viúvas participantes dos Grupos de
Atendimento Global ao Idoso da DMR HCFMUSP. No entanto, em função de minha
aposentadoria e transferência para a cidade de Passos, em Minas Gerais, optei por
realizar o estudo nesta cidade.
A cidade de Passos/MG, lócus dessa pesquisa, localiza-se no Sudoeste de
Minas Gerais, está a 739 m do nível do mar e a 345 km da capital Beto Horizonte
pela rodovia MG 050. Com uma área de 1338 km2 abriga uma população de
Capítulo 4 – A Construção da Pesquisa
93
105. 098 habitantes, destes 96.690 residem na área urbana e 8.408 na zona rural.
É o município com maior população do sudoeste mineiro, e o quarto do sul de
Minas. Com uma população, miscigenada por muitos descendentes portugueses,
espanhóis, italianos, libaneses e brasileiros, a cidade de Passos evidencia-se na
região pelo seu desenvolvimento econômico e social.
Destaca-se nas atividades de agricultura, suinocultura, cafeicultura, pecuária
leiteira, agroindústria canavieira, e mais recentemente, as indústrias confeccionista e
moveleira.
Nos seus 147 anos de emancipação política a cidade configura-se como um
dos pólos de desenvolvimento do interior mineiro, possuindo uma infra-estrutura de
serviços que a qualificaram para ser nomeada como Microregião do Médio Rio
Grande para a prestação de serviços públicos não só para seus habitantes como
aos moradores de 25 municípios vizinhos.
O município é rico em recursos hídricos, situado na bacia do médio Rio
Grande composta pelos rios São João, Ribeirão Conquistinha e o Ribeirão Bocaina.
Tem solos férteis, originários de rochas pré-cambrianas, cuja análise química
detectou riqueza em minerais primários, com altos teores de potássio razão de sua
abundância.
Como toda cidade brasileira, apresenta problemas sejam eles de ordem
política, econômica ou social. Segundo dados do Censo 2000, a alteração na
pirâmide etária acontece qualquer que seja a situação de domicílio da população
mineira: seja nas áreas urbanas ou nas rurais o fenômeno do envelhecimento da
população se repete.
Capítulo 4 – A Construção da Pesquisa
94
Abaixo apresentamos uma síntese dos dados da cidade dísponibilizada em
meio eletrônico pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Económico e Social, que
foi acessado em dezembro de 2005.
Quadro 1 - Passos-MG: Municípios em Dados.
DADOS BÁSICOS
Área Territorial: 1.339,20 km2
Ano
de
Instalaç ão:
Micro-região:
Região:
Estado: Minas Gerais (853 municípios)
1848
Passos
Sudeste
POPULAÇÃO
Urbana
92%
Taxa média de crescimento da população: 1,57%
Taxa de mortalidade infantil: 34,5 p/mil
Esperança de vida ao nascer: 72,1 anos
EDUCACÃO - Analfabetos com mais de 15 anos
MUnicípio
Estado
Brasil
9,04%
11,96%
13,63%
SITUA ÇÃO DOS DOMICÍLIOS URBANOS
Com água:
Com esgoto sanitário:
Com coleta de lixo:
99,3%
98,7%
98,9%
Município
IDH
Estado
Brasil
1991
2000
2000
2000
Renda
0,719
0,687
0,797
0,731
0,766
0,711
0,757
0,720
Longevidade
0,684
0,785
0,736
0,710
Educação
Rank no Brasil
0,786
-
0,875
624°
0,850
11°
0,830
-
Rank no Estado
-
47°
-
-
Total
ECONOMIA
Valor doPIB:
Agroopecuária:
Indústria:
Servços:
Município
Estado
Brasil
365,34 milhões 68,43 bilhões 694,97 bilhões
16,3%
43,8%
39,9%
PIB per Capita:
R$3.979,42
R$4.104,19
R$4.958,85
Finanças Públicas
Receita Orçamentaria: R$ 37,2 milhões
Receitas Correntes: R$ 36,8 milhões
Receita Tritutárias:R$ 6,1 milhões
Transferências: R$ 27,2 milhões
Outras Receitas: R$ 3,5 milhões
Receitas de Capital: R$ 366,3 mil
Exportação:
R$
237.176,00
Instituições financeiras: 6 agências
Continua
Capítulo 4 – A Construção da
Pesquisa
95
Continuação
Firmas Formais
Trabalhadores:
N úmero:
% Estado
Emprego
Formal
0 -4
5 -19
20 - 99
500+ Trabalhadores: 0 -4
1.833 460
76
14
0,74% 0,70% 0,52% 0,50% 0 , 6 3 %
3 N úmero: %
Estado:
5-19
2560 4.019 3.041 3.003 2.564
0,70% 0,70% 0.54% 0.52% O32%
Principais Setores de Atividade (Agropecuária e Indústria)
Por Firma
Cod.
Descri ç ão do Setor
01503 Produ ç ão mista: lavoura e pecu ária
18000 Confec ç ão de artigos do vestuário e
a c e s s órios
36100
Artigos do mobili ário
N °. de
Firmas
404
113
31
Por Emprego
C ód.
18000
D e s c r iç ão do Setor
N* de Empregos
Confec ç ão de artigos do vestu ário
1136
e acess órios
17400
01503
Artefatos t êxteis incluindo
tece lagem
Produ ç ã o mista: lavoura e p e c uária
807
798
Fonte: Banco Federativo Banco Nacional do Desenvolvimento Económico e Social.
Quadro 2 – Distribuição dos Munícipes Residentes na cidade por Faixa Etária
0 a 3 anos
4 anos
5 e 6 anos
7 a 9 anos
10 a 14 anos
15 a 17 anos
18 a 19 anos
20 a 24 anos
25 a 29 anos
30 a 39 anos
40 a 49 anos
50 a 59 anos
60 a 64 anos
65 a 69 anos
70 a 74 anos
75 a 79 anos
80 anos e mais
6.448 habitantes
1.837 habitantes
3.473 habitantes
5.234 habitantes
9.027 habitantes
5.753 habitantes
3.567 habitantes
8.721 habitantes
7.860 habitantes
15.378 habitantes
12.543 habitantes
8.204 habitantes
2.852 habitantes
2.375 habitantes
1.709 habitantes
1.112 habitantes
1.118 habitantes
Fonte: IBGE, Resultados da Amostra do Censo Demográfico, 2000.
NOTA: Informações de acordo com a Divisão Territorial vigente em 01.01.2001.
Os dados acima e os que se encontram no Anexo E falam por si. A cidade de
Passos tem se desenvolvido a números vistos e as modificações impostas pelo
Capítulo 4 – A Construção da Pesquisa
96
desenvolvimento apresentam sinais. Um deles é o aumento de idosos da cidade que
atestam a longevidade de seus habitantes.
4.3 As "autoras" da história
Passamos a descrever os passos que possibilitaram construir esse trabalho.
A primeira etapa dessa fase da pesquisa se constituiu em realizar um levantamento
do número de idosas viúvas que freqüentavam os Programas municipais para a
Terceira Idade nomeados de Grupos Conviver, Club Bem Viver e Coral da Terceira
Idade para delimitarmos o universo da pesquisa.
A Secretaria Municipal de Assistência Social por meio do Departamento de
Assistência Social mantêm os Centros de Convivência Conviver para Idosos que
consistem no fortalecimento de atividades associativas, produtivas e promocionais,
contribuindo para autonomia, envelhecimento ativo e saudável, prevenção do
isolamento social, socialização e aumento de renda própria. É o espaço destinado à
freqüência dos idosos e de seus familiares, onde são desenvolvidas, planejadas e
sistematizadas ações de atenção ao idoso, de forma a elevar a qualidade de vida,
promover a participação, a convivência social, a cidadania e a integração
intergeracional.
O público alvo são os idosos de ambos os sexos independentes e seus
familiares. A capacidade de atendimento é de 350 idosos. Os bairros foram
agregados por proximidade e as atividades são desenvolvidas por uma assistente
social e uma professora de educação física em locais fixados pela prefeitura
municipal constituindo-se em 5 sedes. Os dias e horários foram distribuídos pela
Capítulo 4 – A Construção da Pesquisa
97
semana, sendo estipulado um período de 4 horas/dia. Cabe ressaltar que por
solicitação médica há munícipes com idade a partir de 45 anos que estão
freqüentando os Grupos Conviver.
O Bem Viver é um local para dançar, criado pela prefeitura, sendo que parte
das despesas é de sua responsabilidade e a outra é coberta pela administração do
Bem Viver, a fim de oferecer lazer aos idosos. Funciona a semelhança de um clube
aos sábados e domingos. Nas terças-feiras a tarde o Coral da Terceira Idade
formado por idosas, que também participam dos demais grupos, utiliza as
dependências do clube para seus ensaios. A freqüência é livre, não existindo
obrigatoriedade na associação.
Assim, mantivemos contato com os responsáveis pelos programas para ter
acesso às informações necessárias, explicando a intenção da pesquisa. Contamos
com a colaboração destes para nos aproximarmos das idosas, sendo apresentada
por eles as participantes.
Os dados demográficos básicos (Nome, Idade, Procedência, forma de contato
número de telefone ou endereço), o tempo de viuvez e outras atividades ou grupos
da comunidade nos quais participava foram obtidos por meio de um formulário,
preenchido pela pesquisadora a partir das fichas de inscrição dos idosos existentes
nos respectivos locais.
O dado não disponível, tempo de viuvez, foi perguntado às idosas após
prestarmos esclarecimentos do objetivo da pesquisa, contando com receptividade
delas. Essa etapa foi realizada no mês de julho de 2005.
.
O Clube Bem Viver contava com um total de 271 associados, 178 (65.7%)
Capítulo 4 – A Construção da Pesquisa
98
mulheres e 93 (34.3%) homens. Das mulheres 87 (50.6%) eram viúvas. Desse total
obtivemos os dados, que pretendíamos, de 58 mulheres. A idade média atual é de
62 anos, tendo em média 14 anos de viuvez. A distribuição pelos bairros é eqüitativa
destacando-se o Centro com 17%. A justificativa que podemos pensar para o maior
número de freqüentadoras serem do Centro é por residirem nas proximidades do
Clube.
Os Grupos Conviver na ocasião possuíam 249 participantes, 154 (62%)
mulheres e 95 (38%) homens. Do total de mulheres, 60 viúvas eram freqüentes, 20
delas já haviam sido cadastradas no Club BemViver e foram excluídas. A média de
idade está em torno de 69 anos e possuem 10 anos em média de viuvez. Em média
cada grupo conta com 9 idosas viúvas.
A partir destes dados pudemos determinar critérios para eleger os sujeitos a
serem entrevistados, com vistas a alcançar o objetivo de estudo proposto frente as
particularidades encontradas. Foram eles:
1. Critério biológico: idade igual ou superior a sessenta anos - que segundo a
ONU demarca o início do envelhecimento nos países em desenvolvimento
como o nosso.
2. Critério biológico e social: ter ficado viúva durante o processo de
envelhecimento, com idade igual ou acima de 50 anos. A determinação
desse critério ocorreu em função da delimitação do objeto de estudo, isto
é, estudar a viuvez e a sociabilidade desenvolvida após sua ocorrência
com mulheres pertencentes ao contingente de idosos.
3. Critério Social: idosas viúvas que participassem em diferentes grupos de
atividades, oferecidos pela prefeitura e cadastradas para a pesquisa.
Capítulo 4 – A Construção da Pesquisa
99
Aplicados os critérios obtivemos um total de 31 idosas que foram distribuídas
por bairro de moradia, idade de viuvez e idade atual obedecendo-se uma escala
crescente. Martins e Borgus esclarecem dizendo que:
[...] na abordagem qualitativa de pesquisa, as amostras são propositais
(purposeful sampling), já que se busca apreender e entender certos casos
selecionados sem necessidade de generalizações para todos os casos
possíveis. [...] será composta diferentemente, de acordo com os objetivos e
o propósito do estudo (2004, p. 49).
Minayo (1994) alerta que alguns cuidados devem ser tomados na escolha dos
sujeitos, sendo eles: 1 - dar voz aos sujeitos que são significativos no grupo - detêm
as informações, conhecimentos e experiências - que estamos buscando; 2 - ter um
número suficiente de sujeitos para a reincidência das informações ou como fala o
esgotamento do dado; 3 - que o grupo de sujeitos escolhidos permita por meio das
falas apreendermos as semelhanças e diferenças existentes
Assim, para a escolha dos sujeitos seguimos as orientações mencionadas e
por meio de sorteio os sujeitos foram escolhidos: uma idosa de cada grupo do
ConViver - 5 idosas; uma do grupo de Coral da Terceira Idade e duas do BemViver,
considerando o total de idosas viúvas que freqüentam o Clube. Assim, o total de
sujeitos entrevistados foram 8 7, apresentadas no Quadro 3, a seguir.
7
Foram escolhidos nomes fictícios para resguardar a identidade das entrevistadas.
Capítulo 4 – A Construção da Pesquisa
100
Quadro 3 - Alguns dados demográficos das viúvas entrevistadas.
Nome
Idade
Idade
Tempo
Escolaridade
atual
viuvez
de viuvez
Tulipa
61
55
6
Ensino Superior
Violeta
77
70
7
Ensino Fundamental (2ª)
Amarilys
71
64
7
Ensino Fundamental Inc. (4ª)
Margarida
74
57
17
Normal
Líria
81
70
11
Ensino Fundamental Inc. (4ª)
Rosa
75
58
17
Ensino Fundamental Inc. (7ª)
Angélica
60
56
4
Ensino Fundamental Inc. (4ª)
Hortência
66
58
8
Ensino Fundamental Inc. (6ª)
Fonte: Dados coletados pela autora.
Cabe ressaltar que, em função das idosas serem pessoas ativas na
comunidade e de fácil identificação, não apresentaremos um perfil socioeconômico
descritivo das mesmas objetivando resguardá-las. É importante mencionar que
possuem condições socioeconômicas diversificadas, a menor renda familiar é de 1
SM para 4 pessoas, até 10 SM só para a idosa; 50% moram com filhos e seus
familiares e 50% residem só. Todas possuem em casa própria e professam a religião
católica, 75% trabalharam durante o período de casamento em atividades vinculadas
a área de prestação de serviços.
4.4 Procedimentos de coleta e análise de dados
A pesquisa qualitativa busca uma compreensão particular daquilo que estuda
e não para explicações, assim a escolha da técnica de coleta de dados tem a
finalidade de descortinar as variadas versões de mundo dos sujeitos, partindo do
Capítulo 4 – A Construção da Pesquisa
101
conhecimento da construção coletiva, ou seja, da construção da realidade.
Para tanto escolhemos um instrumental técnico, que permitiu esta
aproximação dos sujeitos e apreensão da realidade contextual de análise do nosso
objeto de investigação. Nossa opção recaiu sobre a entrevista semi-estruturada,
uma vez que permite o acesso de forma abrangente às informações de interesse do
pesquisador.
A entrevista propicia uma prática dialogada e discursiva com produção de
sentidos e construção de versões de realidade, sendo considerada uma técnica de
interação social.
Pais (2003), ao discorrer sobre o instrumental para apreensão do cotidiano,
refere que as fontes orais são aquelas que permitem maior aproximação de
aspectos do cotidiano vinculados aos eventos da vida diária como a realidade dos
grupos sociais.
A pesquisadora conduziu as entrevistas por meio de um roteiro cuja finalidade
foi orientar a coleta de dados pertinentes à construção dos objetivos do nosso
trabalho, que contém os dados pessoais das idosas viúvas e informações sobre a
viuvez, período de enlutamento, mudanças ocasionadas no cotidiano, papel da
família, dificuldades, preconceitos, expectativa para o futuro e reorganização da vida
pessoal após a viuvez (Anexo F).
Para as entrevistas mantivemos contato telefônico, resguardando os preceitos
éticos
para
pesquisa.
Os
horários
e
datas
foram
agendados
conforme
disponibilidade das entrevistadas, onde retornamos a explicar o intuito da pesquisa e
a liberdade de participação, do livre espaço de tempo disponível para suas falas.
Capítulo 4 – A Construção da Pesquisa
102
Obtivemos receptividade, com aceite das oito mulheres, sendo agendando dia e
horário para as entrevistas com as mesmas.
Durante o mês de novembro/2005 ocorreram as entrevistas, 06 realizadas nas
casas das idosas e duas em sala do Grupo ConViver. Antes de iniciar as entrevistas,
as idosas foram novamente esclarecidas sobre os objetivos propostos para este
estudo e informadas de que seus depoimentos não causariam qualquer prejuízo
físico ou moral, garantindo sigilo e anonimato de suas identidades, além do direito de
desistir de participar do processo.
Com o consentimento expresso das idosas e através da assinatura de um
termo de Consentimento Pós-lnformação (Anexo G), iniciamos a coleta dos dados
procedendo â gravação das entrevistas.
As entrevistas ocorridas nos domicílios das idosas propiciaram vivências
interessantes; três idosas aguardavam a pesquisadora com porta retratos da época
do casamento, álbuns de fotografias de diferentes fases do grupo familiar, fizeram
questão que conhecêssemos a casa, os trabalhos que atualmente realizam,
compartilhando lembranças passadas e presentes. Outras manifestaram seu
acolhimento de maneiras diferentes, mas a receptividade e amistosidade foram
observadas em todas.
Acreditamos que a curiosidade despertada pelo trabalho que estamos
realizando tanto por parte das idosas quanto de seus familiares, possibilitou eliminar
dúvidas quanto ao caráter do que estávamos realizando e do sigilo das informações
prestadas. Em respeito aos preceitos éticos e ao anonimato dos sujeitos, optamos
por identificá-las com nomes fictícios.
Capítulo 4 – A Construção da Pesquisa
103
É necessário pontuar que o número de pesquisas acadêmicas desenvolvidas
com a população de Passos ainda é restrita, portanto é compreensível causar um
certo estranhamento às idosas.
As entrevistas foram gravadas em fitas cassete e duraram em média 50
minutos. Posteriormente, ouvidas e transcritas integralmente.
Procedemos à sistematização dos dados coletados agrupando-os por
recortes, verificando suas relações, para que pudessem ser construídas, a partir dos
temas emergentes, os critérios semânticos para a categorização e análise de
conteúdo com base em Bardin. Esta autora define a análise de conteúdo como:
[...] um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter,
através de procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do
conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam
inferir conhecimentos relativos às condições de produção/recepção
(variáveis inferidas) dessas mensagens (BARDIN apud RICHAROSON,
1989, p. 176).
Nessa mesma perspectiva, Chizzotti (2001) ressalta que a análise de
conteúdo busca compreender criticamente o sentido das comunicações, no seu
conteúdo manifesto ou latente e nas significações explícitas ou ocultas.
Da análise dos depoimentos emergiram categorias temáticas elucidativas,
sendo elas:
1. Casamento e família;
2. Tornar-se viúva. Meu tempo de luto, a espiritualidade;
3. Reorganizar a vida: viuvez - passado-presente-futuro.
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
105
Você não pode escolher como vai morrer ou quando.
Você só pode decidir como vai viver agora.
Joan Baez
o presente capítulo, iremos discorrer e discutir as falas mais
significativas dos sujeitos desta pesquisadas mulheres com idade acima de sessenta
anos que se tornaram viúvas no processo de envelhecimento, isto é, a partir dos
cinqüenta anos, delineando o contexto social das mudanças por elas vivenciadas em
seus cotidianos, tendo como foco o advento da viuvez.
Ouvi-las, mais do que resultados de uma pesquisa, proporcionou inúmeras
reflexões pessoais. Pensar sobre a vida, a finitude - envelhecimento, morte, perdas e
vulnerabilidade e trabalhar com essas questões, é um desafio sem par. Nos remete
a uma viagem interna a considerar e revê-las em nosso próprio universo.
Percebemos pela maneira como fomos acolhidas no dia das entrevistas que
as lembranças haviam saído do baú, muito antes de nossa chegada. Faz considerar
a intensa verdade das palavras de Mosquera que nos diz:
Seria interessante observar que na medida em que o adulto se pergunta
pelo significado da sua vida, implicitamente, está perguntando qual o
sentido profundo da história. Pois somente, o homem é capaz de fazer
história e a história é verdadeira na medida em que existem homens para
narrá-la (1978, p. 178).
E essas mulheres contaram suas histórias. As falas gravadas expressam
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
106
idéias, sentimentos, emoções e vivências carregadas do jeito mineiro de ser.
Os termos típicos regionais, as palavras unidas, que por vezes se tomam
incompreensíveis ao som do gravador, mas que não impedem a apreensão do
conteúdo, o todo que exprime o pertencer a um tempo, um grupo:
O uso do gravador durante a entrevista foi fonte de inibição para duas idosas,
que após o início da entrevista pediram para que não fosse mais gravada, deixando
livre a condição de registro, escrito pela pesquisadora o que foi realizado. Não
acreditamos ter ocorrido prejuízo para a coleta de dados, pois foram depoimentos
sucintos, e em um deles com momentos de muita emoção.
Os resultados obtidos traduzem o continuum de vivências experenciadas
pelos sujeitos desta pesquisa e nossa análise focou o que apreendemos como
singularidades observadas.
Na seqüência apresentamos os depoimentos selecionados 7 e agrupados por
significados, que retrataram o contexto social e as vivências dessas mulheres, de
acordo com as categorias ou blocos temáticos que depreendemos estar contido em
suas falas, ou seja: Casamento e Família; Tomar-se Viúva Meu tempo de luto, a
espiritualidade, Reorganizar a Vida: viuvez - passado-presente-futuro.
Ressaltamos que nossa pretensão foi agrupar didaticamente as categorias,
porém em vários momentos elas estão inter-relacionadas pela proximidade dos
conteúdos apresentados.
7
Os depoimentos das entrevistas serão colocados em itálico e afastados, para diferenciá-los das
citações diretas.
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
107
5.1 Casamento e família
A casa, o lar é o espaço privado circunscrito fisicamente configurando-se
como local onde ocorrem parte significativa das vivências individuais, que compõe
parte representativa da história de vida pessoal.
Representa o espaço do privado, de conforto, intimidade, discrição,
isolamento. Nele e com as pessoas que ali estão, são ou foram construídos sonhos,
projetos, vínculos afetivos. É também um local onde se fazem ou compartilham o
"céu" das alegrias e o "inferno" das tristezas, desilusões e aflições humanas.
O casamento consiste em uma das formas para se estabelecer um lar. Na
sociedade tem uma função específica, é normatizado e com ele outros papéis serão
adquiridos. Insere cada um dos cônjuges em outro grupo social, implicando no
confronto de valores, normas e atitudes. As 8 (100%) viúvas, sujeitos dessa
pesquisa, casaram-se dentro do contrato civil de casamento vigente à época comunhão de bens - e da religião católica.
A vida cotidiana acontece caracterizada pelo que se passa diariamente na
vida das pessoas, marcada pela rotina, conflitos, esperanças, com o conhecimento
que detemos para lidar com as situações. O cotidiano é, também, o lugar do
diferente do novo e das rupturas que acompanham os ciclos de vida do ser humano.
O casamento é um desses eventos. Demarca novos papéis, um novo ciclo,
responsabilidades, vínculos, compromissos e diferentes maneiras de inserção social.
Ato de relevância social, o casamento agrega uma série de interesses
pessoais, familiares, norteado por critérios e valores morais de cada grupo social; a
família decorrente não é mera reprodução, mas uma aliança de grupos e pessoas. É
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
108
um grupo social concreto permeado pelas relações de parentesco que espelha as
escolhas realizadas pelo homem no tocante a forma de nascer, procriar e morrer.
Margarida e Hortência em seus depoimentos revelam as diferentes
necessidades que o casamento e a família representam para cada pessoa/grupo:
afeto, sexualidade, segurança, companheirismo, a transmissão de valores, enquanto
Amarylis refere ao seu despreparo para o relacionamento conjugal ilustrando uma
condição comum, à época em que era considerada virtude o desconhecimento das
questões sexuais por parte das mulheres.
Complementa sua fala acrescentando informação sobre os conflitos com
familiares do marido resultantes de valores de vida divergentes entre eles. Três
idosas falaram sobre os problemas vivenciados durante a vida conjugal, que
geraram sofrimento, desilusão e conflitos.
Traduzem condutas masculinas "admissíveis" decorrentes da visão do
homem em relação a subalternidade feminina. É interesse notar que duas delas
mencionam "ter sido sempre sozinhas", resolvendo "as questões cotidianas
referentes aos filhos, a casa, bem como não contando com a companhia dos
maridos para atividades sociais".
Considero que a vida conjugal dessas mulheres, antes da morte de seus
maridos conferiu-lhes a condição de "viúvas de maridos vivos", o que lhes
proporcionou sentimentos e vivências que percebemos serem mais doloridas do que
as causadas pela viuvez.
Depreende-se também a importância atribuída a indissociabilidade do
casamento, concepção enraizada nos valores religiosos professados, no complexo
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
109
de virgindade-virilidade, segundo Prado (1985), onde ao homem tudo é permitido e à
mulher somente recato e pudor.
A esse respeito, Rubem Alves (2004) diz que a casa é domínio da mulher e o
mundo é do homem, considerando que esse pode ser um dos motivos da diferença
de longevidade entre os sexos. Para ele o homem quando se aposenta fica sem
lugar, sem espaço.
Ballone (2003) esclarece "Em relação ao casamento, todos acreditam que
não dão certo os casamentos dos outros. Dessa forma, quem se casa continua
achando que seu casamento, só o seu, será para sempre".
E, na década de 50 a vida conjugal e familiar era vendida em tons de rosa, o
amerícan way of life encontrava-se no auge e as mulheres casavam-se para sempre.
O que essas mulheres desejavam de fato do casamento é uma questão a ser
explorada. O psiquiatra Ballone, refletindo sobre expectativas matrimoniais e
resultados de satisfação pontua:
Sinal dos tempos ou não, a motivação e os requisitos para que o
casamento dê certo mudou muito. Houve épocas onde as juras de amor
eterno era a motivação quase exclusiva para nutrir as expectativas de
sucesso matrimonial, hoje fala-se em afinidades de personalidade. O antigo
quesito mulher obediente, caricaturizado na figura da mulher Amélia,
passou para sexo satisfatório para ambos. Até os provimentos do lar
sofreram profunda modificação e o outrora marido provedor, orgulhoso e
cumpridor de sua missão, dá lugar à divisão das despesas (2003).
Expectativas e mudanças deveriam andar juntas, mas nem sempre
conseguimos trocar valores. Sobre essa questão recordo uma máxima oriental de
autor desconhecido que diz: "Nós só mudamos quando a dor de mudar for menor do
que a dor de ficar", e uma parcela de mulheres ao longo da história ficou pelas
implicações socioeconômicas, culturais e emocionais que envolvem a mudança. Mas
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
110
retornando as falas dos motivos de casamento ...
[...] Casamos com a intenção de fazer um pé de meia [...] (Margarida).
Casei com amor, afeto, carinho e tudo o mais que se pode imaginar. Eu
sempre fui mãe dedicada, filha e esposa exemplar, eduquei meus filhos
muito bem, na religião. Fui criada muito certinha, minha mãe me criou
muito correia [...] (Hortência).
Casei-me muito boba, inocente, nova, com 17 anos..Minha mãe falou pra
ele que eu não sabia cozinhar. Meu marido era mais maduro, disse que me
ensinava. Tive dificuldades de relacionamento [...]. Eu sofri muito com a
família dele, porque eles eram muito revoltados [...] (Amarylis).
Nas falas de Hortência e Amarylis está oculto o grande tabu do início do
século XX: a sexualidade humana, que gradativamente foi substituído pelo da morte
inexistente nessa época.
Maranhão (1985) discorre, em seu livro, sobre esse processo de substituição
e Ariès (1990) analisa o que denominou de morte invertida, a atitude do homem de
expulsar a morte de seu convívio, escondê-la nos hospitais, asilos e entre outros
locais que lhe permita ao homem ignorar a sua existência.
Observou-se que as viúvas não apresentaram dificuldades para falar das
questões referentes a morte e tampouco recorreram ao uso de eufemismos, porém
em referência a virgindade, ao desejo existente entre o casal, a educação recebida
com relação ao sexo e os problemas de entrosamento sexual eles foram utilizados,
acompanhados de um encabulamento. Ao marido cabia iniciar sexualmente a
mulher. Ela por sua vez deveria contar com a sorte.
Tulipa, Hortência, Angélica, Rosa e Líria mencionaram a satisfação afetivosexual que obtiveram no relacionamento conjugal.
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
111
[...] a afetividade que tive com meu marido me preencheu Fazíamos todas
as coisas juntos, eu colaborava nas atividades dele e ele com os meninos
na casa [...] (Tulipa).
[...] aceitar outro homem na vida não dá certo. Nós tivemos uma vida muito
boa, com carinho, amor, fazia alguma coisa, na mesma hora pedia
desculpas, não nos deixávamos abalar pelo acontecido. Ele era muito forte,
muito dedicado [...] não tenho coragem de me expor para outro homem
(Hortência).
[...] meu marido não era bruto, era educado [..J não saia de casa [...], mas
me deixava sair durante o dia em companhia da filha, não dava palpite em
roupas, era muito bom (Angélica).
[...] meu marido só faltava adivinhar o que eu queria [...J viajávamos,
freqüentávamos festas até o amanhecer na rua. O meu marido foi muito
bom para mim [...] (Rosa).
[...] meu marido era carinhoso, nunca gritou comigo, nos sempre
entendíamos um ao outro. A gente tinha muita atenção um com outro,
fomos grudados até ele morrer. Foi uma vida maravilhosa no geral [...]
(Liria).
É relevante apontar que há uma valorização dos homens por não recorrerem
à violência - verbal, psicológica ou física - no relacionamento estabelecido. É sabido
que a violência, em suas diferentes formas, era comum nos relacionamentos
conjugais das gerações passadas, como nas presentes. Prática decorrente dos
padrões autoritários que delimitavam/delimitam as posições diferentes de homens e
mulheres na organização familiar, como relembram Violeta e Líria.
[...] meu marido era bravo, tinha um génio ruim [...] era muito sistemático,
brigava comigo e com os meninos não unha muita paciência, mandava
tinha que fazer l..] (Violeta).
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
112
[...] o almoço dele tinha que estar pronto às 11 horas. Todos os dias, se
não estivesse ele brigava [...] (Liria).
Os antropólogos nos ensinaram que o fato de ocorrer mudança em um dos
elementos da composição familiar não representa que todos os demais também
mudaram.
A importância de considerar essa perspectiva reside no fato de que a família,
hoje, tem sofrido trans formações como, por exemplo, nas relações entre pais e
filhos, mas não significa que não possam manter o caráter tradicional (SARTI, 1991).
Tal consideração contém um alerta, o de atentarmos às implicações de
generalizar mudanças observadas nas relações fa miliares. As mulheres que
prestaram depoimentos, nascidas no primeiro quarto do século XX (1914 a 1945),
vivenciaram transformações em todas as esferas de suas vidas, como também se
encontravam em fases de vida diversas quando essas mudanças chegaram.
Os relatos da convivência desses casais demonstram que os relacionamentos
foram permeados por comportamentos por vezes até contraditórios. Cada um foi
absorvendo as mudanças que aconteciam fora do lar de acordo com suas próprias
possibilidades de experenciar o público.
O depoimento de Angélica sobre o comportamento de seu marido enquanto
provedor exemplifica as considerações acima.
[...] tudo era ele que comprava. Eu ia de vez em quando com ele no
armazém [...] Ele comprou um carro e me deixava dirigira vontade. Eu ia no
posto abastecia o carro e não via o quanto ficou, ele pagava.. Único
controle que eu tinha era esse, ele comprava o que queria para a casa [...].
Era modeminho até demais, lia muito. Era pra frente com a filha, ele não
achava que tinha que casar. Tanto que a filha não casou. Vive junto há oito
anos [...] Eu é que no começo achei ruim [...] agora não importo mais [...]
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
113
Trabalhar, pensar nos filhos e cuidar da casa tornaram-se rotinas na vida das
mulheres que necessitaram realizar arranjos domésticos para dar conta do montante
de atividades, Amarylis é uma das entrevistadas que conta sobre como organizou a
vida doméstica principalmente quando os filhos eram pequenos.
Aos 18 anos tinha o meu primeiro filho. Tenho 4 homens, o mais velho
ajudava a cuidar dos menores, um ia cuidando do outro. Meu marido não
ajudava por causa do trabalho. Eu criei eles sozinha. Resolvia tudo em
relação às crianças.
Destaco que, das entrevistadas, somente uma permaneceu em casa cuidando
das tarefas domésticas e tendo o marido como provedor e responsável por suprir
todas as necessidades da família, exercendo os papéis ditos como tradicionais para
o casal.
Meu mando era quem comprava tudo, saia do trabalho e trazia o que nós
precisávamos. Eu cuidava dos meninos, da casa, costurava para a família
[...] não tinha as coisa de agora [...] Depois é que foi chegando [...] (Liria).
A identidade social da mulher se elaborava a partir da esfera doméstica e não
da esfera profissional. O trabalho fora do lar era considerado como uma situação
excepcional, mal-vista não só no interior do grupo familiar, como também peta
comunidade circunvizinha.
O trabalho era aceito no período anterior ao casamento ou dentro do
ambiente doméstico, assemelhados aos que realizava no lar – costureiras,
bordadeiras, lavadeiras, outros tantos eiras. Era motivo de orgulho, status e prestígio
masculino a mulher permanecer dentro do lar, condição igualmente percebida pela
mesma.
O grupo de entrevistadas comprova, por suas atividades, as considerações
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
114
acima. Das sete trabalhadoras quatro realizavam atividades de costura dentro do lar,
o que lhes facultava exercer seus demais papéis, organizando-se para o
cumprimento do mesmo nos horários livres.
As interações sociais proporcionadas por meio dessa atividade permitiam
receber informações, discutir as inovações e proceder a assimilação do que chegava
até elas.
Três desenvolveram trabalho fora do lar. Duas em profissões na área da
educação, fazendo uma carreira profissional, o que as insere nos primeiros grupos
de mulheres a ingressar e permanecer no mercado de trabalho após o casamento,
mesmo que tenham passado para outros cargos quando seus filhos já estavam
maiores.
No entanto, devemos recordar que as atividades vinculadas a educação eram
aceitas principalmente por se restringirem a quatro horas de trabalho diários. A outra
entrevistada trabalhou na área de prestação de serviços. Das mulheres que ficaram
em casa, duas exerciam atividade laborativa em empresas deixando-as antes do
casamento, ratificando os padrões tradicionais da época.
Na realidade, também nos contam sobre a realidade econômica da família
que foi sendo alterada ao longo dos tempos. O primordial é que por meio de seu
trabalho no interior das paredes do lar, resguardavam o status masculino de
provedor, a si próprias das tentações mundanas, mantendo o respeito, auxiliavam na
manutenção da família.
Mas deixam entrever o que acredito ser um fator determinante para a postura
de reformulação de vida após a viuvez e conseguirem "levantar sacudir a poeira,
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
115
dando a volta por cima" desde que começaram a trabalhar sentiram-se
independentes, livres, detinham como continuam a deter uma quantia em dinheiro
que lhes permitiu praticar suas escolhas, escolhas para si próprias.
Elas obtiveram no cotidiano o aprendizado necessário, possuíam o conteúdo
do conhecimento cotidiano.
[...] eu tinha o meu dinheiro. Os homens são meio rudes. Costurava só em
casa porque gostava de cuidar das crianças [...] (Amarylis).
[...] trabalhava porque o que o marido ganhava não dava, cuidava dos
filhos e fazia meus trabalhos [...](Violeta).
[...] antes de casar eu combinei com ele só uma coisa, que eu queria
trabalhar. Nunca precisei pedir dinheiro para minhas coisas [...] eu
trabalhava/trabalho até hoje [...](Angélica).
Para essas gerações, havia uma pauta sugerida de vida: ter filhos, cuidar do
marido, dos idosos e ser dona de casa. Esse grupo cumpriu a sugestão e, em sua
maioria, acrescentou outras. Não contaram com o estímulo social ou o
reconhecimento dos familiares e posteriormente de si próprias para adquirir
instrução formal.
O grau de instrução predominante é o ensino fundamental básico.
Angélica traduz essa realidade. Percebe as discrepâncias de atitudes entre a
postura de seus pais para consigo, as de sua filha para consigo própria e dela e da
filha frente ao neto.
Relaciona o valor da instrução para a obtenção de ganhos financeiros, na
educação da filha frente a suas limitações, retirou-se de cena delegou ao marido,
que possuía maior grau de instrução, a tarefa de orientá-la, excluindo-se de
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
116
participar nesse aspecto da vida da filha.
No momento, incentiva e auxilia a filha para que termine o nível superior e
estimula o neto a estudar. Embora manifeste desejo de voltar a educar-se,
desacredita de suas potencialidades, crença que trouxe para o casamento.
[...] Iludi com a cozinha, fiquei em casa mesmo [...] sinto não ter um estudo,
para conseguir uma vida melhor [...] Os pais antigos não se preocupavam
muito com a vida dos filhos [...] Hoje acho que minha cabeça não dá conta
não. Único curso que fiz foi de cabeleireira [...] Meu marido era formado ele
orientava os estudos da filha. Eu nem chegava perto. Tudo era ele que
participava. Eu era desligada. No começo do casamento ele arrumou pra
eu estudar. Eu não quis. Minha filha deixou os estudos, agora voltou, eu
vou ajudá-la com a mensalidade. Vou fazer de tudo para meu neto estudar
(Angélica).
Os laços de parentesco são valorizados até mesmo porque foi por meio deles
que algumas conseguiram se reestruturar, ultrapassando as dificuldades pessoais.
Há uma expectativa que o contrato entre gerações possa se cumprir: "Eu cuidei de
você quando pequeno, agora você cuida de mim que estou velha (o)".
[...] ele era um bom filho e pai. Tanto é que não passei apertada quando ele
ficou doente porque a mãe dele nos ajudou. Eu não vou desentender com
a minha filha. Eu não sei o dia de amanhã. Com ela, se eu tiver 80 anos,
ela é a mesma comigo (Angélica).
/.../ quando meu marido ficou doente, meus filhos me ajudaram [...] tanto
que agora moro com um deles [...] (Liria).
[...] meu grupo é muito bom.
ajudaram muito (Rosa).
Temos uma convivência alegre, eles me
[...] o grupo de vizinhas me ajudou quando meu marido morreu. Nós
moramos muito tempo perto, agente se ajuda sempre (Violeta).
A vida cotidiana que puderam construir com seus parceiros revela o concreto
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
117
das contradições, mudanças que foram possibilitadas pelo século XX. Massi diz que
o trabalho.
[...] que a mulher/mãe faz de unir os filhos, de juntar a família maior, de
contar a história familiar é um trabalho de memória viva. Através de
inúmeros e pequenos gestos cotidianos, ela tenta manter, sua família
coesa.[...] mesmo a mulher moderna, que sai para trabalhar, carrega dentro
de si essa idéia de lar, tem gestos e atos que visam a garantir a existência
do mesmo. (1992, p. 77)
Acredito que essas mulheres praticaram esse conceito de lar, pois por mais
que algumas tenham encontrado ou vivenciado problemas de relacionamento,
buscaram manter seu grupo familiar coeso.
5.2 Tornar-se Viúva. Meu tempo de Luto, a espiritualidade.
A morte de um membro da família, em geral, recai sobre os sobreviventes
como um peso. Gera inúmeros sentimentos: mágoa, desgosto, dor, alívio,
arrependimento, culpa, remorso, solidão, desamparo.
Nos primeiros tempos depois da morte dele parecia que eu estava
sonhando, que aquilo não estava acontecendo comigo. Muitas visitas. As
pessoas ficavam surpresas porque imaginavam que eu ia desmoronar
(Tulipa).
Eu tive que assumir os negócios e foi muito difícil, os filhos vivendo cada
um a sua vida, não podiam me ajudar (Margarida).
Pode tornar-se um peso na alma. A viuvez representa o rompimento de um
vínculo que perdurou nesse grupo em média por 30 anos. Um fio que teceu ou
participou das diferentes tessituras realizadas por essas mulheres.
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
118
Representa o peso de um papel nascido da morte. Ao romper-se, outros
também se desfizeram e como uma teia de aranha, a destruição e a possibilidade de
manter laços com o externo, são ameaçados. Quando é grande a ligação entre duas
pessoas, como pode ocorrer entre marido-mulher, a morte de um deles pode
ocasionar um forte desequilíbrio para o que sobrevive.
Eu conto com os meus filhos e vizinhos. Desde a morte de meu marido não
vejo a família dele (Amarylis).
Eu sinto muita falta de meu marido, muita mesmo [...] ele era carinhoso,
nós conversávamos muito, saia junto com ele, agora é diferente (Liria).
Foi só o marido falecer os sogros se afastaram. Nunca mais os parentes de
meu marido vieram aqui. Nunca brigamos. Só que desligou. Eles não
vieram aqui eu não fui lá (Angélica).
O impacto causado pela viuvez nesse grupo parece estar associado à própria
condição, ou seja, por meio dos depoimentos identificamos um tempo de luto ou
após a convivência com situações até então desconhecidas ou deixadas na
juventude: preconceitos, inveja (da condição de ser viúva por existir uma analogia
entre ser viúva e ter liberdade), o sentimento de morte social, retornar a competir no
mercado afetivo e recasar-se, segundo vimos o eterno dilema proposto às viúvas.
Os depoimentos abaixo falam pó si:
As mulheres chegam e dizem que felicidade a sua em ser viúva. Elas
dizem isso porque com certeza não são felizes no casamento. Eu penso
assim. Não pergunto para elas, eu acho que elas não são felizes, porque
se fossem não desejariam a morte deles (Angélica).
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
119
[...] acho que há muitos preconceitos. Antes me chamavam para ir para
ranchos, agora que fiquei viúva, não chamam mais. Os casais não querem
gente sozinha perto deles (Tulipa).
É terrível ser viúva. Tem-se sempre a impressão de que as mulheres estão
de olho em nós, com medo de tomar seus maridos. Me acautelo, não quero
dar meu direito para ninguém. O preconceito existe. A viúva para uns esta
sempre à cata de homens. É horrível (Margarida).
Essas atitudes são demandadas, quer porque esse é o comportamento
pessoal, ou porque é o esperado. Outra questão apontada é o receio da
concorrência dessas mulheres no mercado afetivo ou matrimonial, pois persiste a
idéia de que precisam ser satisfeitas sexualmente.
O luto é definido por Carbone (2001, p. 20) como um "processo, no qual uma
sucessão de sentimentos e respostas se mesclam e se substituem, diante da morte
do cônjuge, com o qual se estabeleceu um vínculo profundo e duradouro".
Quando ele morreu, eu senti um choque porque ele era companheiro [...] e
faleceu de repente, de madrugada. Ouvi ele roncando, morreu quieto. Pedi
socorro. Eu já estava preocupada, mas não imaginava que fosse partir tão
cedo (Tulipa).
[...] mesmo ele estando mal tinha esperança de que não morresse. Tenho
uma lembrança triste da morte, porque vi meu pai morrer. Essa lembrança
nunca saiu da minha cabeça [...] foi muito difícil (Margarida).
O luto foi sempre considerado como uma manifestação importante nas
sociedades, com regras e normas como pudemos descrever. A oportunidade de
reverenciar o morto e demonstrar em público os sentimentos pessoais à
comunidade, com certeza ratificando o pensamento de Hannah Arendt (1983) de
que tudo o que não é público não é verdadeiro.
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
120
No entanto, a maneira das pessoas lidarem com a finitude e os sentimentos
que desperta, foram encontrando oportunidades de deixar de existir, em nome do
prático, da rapidez, da higiene.
A utilização do preto para anunciar um período de pesar por um ente próximo,
é uma experiência registrada pelas idosas na época de infância e juventude.
Algumas dessas experiências são referendadas como negativas e marcantes,
responsáveis pela atitude da idosa em não externar seus sentimentos por meio de
vestimentas pretas. Mas é a fala de Tulipa que sintetiza e expressa o processo que
vivenciaram e que saltita aos nossos olhos: a mudança de mentalidade.
Eu não usei preto. Eu talvez não usei porque meu marido sofreu quando
sua mãe morreu, porque colocaram nele uma camisa preta e zombaram
dele na escola. Quando meu pai morreu usei preto. Ai perguntei o que é
isso ai (Margarida).
A mudança de mentalidade contribuiu muito para não usar o preto [...]
(Tulipa).
A fala de Tulipa resume as demais. Aries diz que "hoje se consumou uma
inversão completa dos costumes, ou tal parece ter ocorrido, numa geração (1990, p.
613). Em sua análise ele assegura que desde a metade do século XIX mudanças
sutis são identificadas: a dissimulação - ocultar do doente que irá morrer, não
chamar o padre ou outro religioso que impressionasse o doente, levando-o a
suspeitar da possibilidade de morte, supressão da comunicação do doente de suas
últimas vontades e outros.
As entrevistadas referendam a condição de ausência, de estar sem chão, de
não ter idéia do rumo da vida. Atitudes de tutela tomadas pelo marido antes de sua
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
121
morte, são interpretadas pelas viúvas como demonstração de amor, carinho, de
valorização a sua pessoa e aos descendentes.
Na realidade esses maridos adotaram atitude tutelar durante toda a vida em
comum do casal. Duas hipóteses emergem dessa ação: é possível que eles,
antecipando as dificuldades das esposas para começarem a interagir com as
questões da vida prática, procuraram desempenhar o papel tutelar que
compreenderam ser de sua competência? Ou é a forma de controlar até onde é
possível o destino da família? São questões a refletir. Assim, Liria e Angélica contam
suas experiências:
[...] ele deixou tudo certo, antes de morrer. Passou o que podia para meu
filho, vendeu nossa casa e comprou um apartamento, quando ele morreu
fui morar com meu filho e ganho mais o aluguel por mês (Liria)
.
[...] ele sempre foi muito organizado. Ele deixou os papéis do INSS tudo em
ordem, tudo estava até grampeado. Eu só tive o trabalho de levar lá
(Angélica).
O que fazer após o cerimonial? Como tudo na modernidade, ele é "limpo",
rápido, curto e higienizado. O preto não é mais a sua cor oficial, mesmo porque o
preto tingiu as roupas que desfilam nas instâncias do poder de acordo com Harvey
(2003).
Cerimoniais a parte, o luto tem um sentido em nossa vida. E por caber no
âmbito afetivo, percebemos, por meio das falas das idosas, que para cada uma
haverá um tempo de reconciliação e revisão.
Fiquei deprimida, demorei para me recuperar, no coração eu fiquei de luto
por mais de um ano [...] (Liria).
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
122
O que a gente vai fazer [...] o melhor é tocar a vida até quando Deus quiser
[...] (Violeta).
A utilização de roupas pretas não ocorreu, religião e espiritualidade possuem
vínculos desde sempre na alma humana. Frente à finitude, sentimos necessidade de
atribuir significados, de encontrar explicações e alimentar esperanças de
reencontros, se for o desejado.
O termo espiritualidade, em sua acepção, categoriza os conteúdos que
emergiram dos depoimentos das idosas, como também a vivência e participação
ativa dessas mulheres nas ações pastorais e comunitárias da Igreja Católica em
Passos.
Duas idosas são membros ativos desde a juventude. Com o casamento
compartilharam atividades enquanto casal, formaram um círculo de amigos que após
a morte de seus maridos, constitui-se em fonte de apoio e estímulo para se
reorganizarem.
Acreditar na ajuda divina gera sensação de conforto e bem-estar. Esse tema
tem instigado pesquisas na área da saúde que buscam comprovar a relação entre
orações intercessoras e resultados mais satisfatórios em procedimentos invasivos,
em recuperações pós-traumas, entre outras.
Sousa afirma que o fato da religião poder funcionar
[...] como um fator positivo ao manejo (coping) de situações de estresse é
algo bastante encontrado na literatura. A afirmação de que a religiosidade
possa ser uma fonte rica para encontrar propósitos de vida, assim como
para formular orientações cognitivas e avaliações de situações vitais,
evidencia seu potencial como função mental de buscar sentidos para vive.
[...] Há, atualmente, crescente evidência científica de que a atividade
religiosa geralmente associa-se a variados critérios de saúde mental e de
bem-estar subjetivo (SOUSA et ai., 2001/2002, p. 2).
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
123
Essas referências se materializam por meio das faias de algumas idosas.
Designar a fé estimula a mobilização das potencialidades internas dessas idosas no
enfrentamento da solidão, da ausência, do refazer de seu caminho. O envolvimento
com atividades religiosas nesse grupo acontecia antes da viuvez e 70% do grupo
contavam com a companhia do marido, e tais atividades se mantiveram.
A crença no auxilio da oração e do apoio espiritual por meio dela é
comungada pelas mulheres, tanto em praticar orações intercessoras quanto no
sentir-se confortada por saber que a elas também são dirigidas. Identifica-se um
conforto espiritual.
Se não fosse a oração dos católicos, evangélicos, foi o que me ajudou a
dar conta do recado, força e resistência para enfrentar. Fé é uma âncora,
segura na mão de Deus e vai. Não tenho medo de nada [...] (Hortência).
Deus é o meu rochedo. Ele nunca me abandona. Eu rezo e rezei para ele
nunca me abandonar, para ficar sempre comigo, e a cada ano que passava
eu dizia: - se agüentei um ano, agüento mais um, E Deus vai estar comigo.
Ele vai dar ombros fortes para eu agüentar [...] (Tulipa).
5.3 Reorganizar a Vida: viuvez - passado-presente-futuro
Reorganizar a vida implica em esmiuçar o cotidiano, em desaprender hábitos
antigos e escolher novos. Parece ser o momento de não delegar ao outro ou a
situação de viuvez a responsabilidade de ser feliz. Amarylis retraía de forma
contundente esse período, do desapego, das trocas, do desfazer.
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
124
A morte dele não mudou muita coisa. Vivi sempre muito sozinha. Era
independente, mas a hora do almoço era a mais custosa para mim. Todos
os dias as 10 hs eu ia para o fogão, aí eu lembrava que não precisava
fazer o almoço para as 11 hs, como ele exigia. Ai eu ficava sem saber o
que fazer. Os filhos ajudaram, passei a almoçar na casa deles, moramos
todos perto. Faço minhas coisas, estou bem (Amarylis).
Sair buscar velhos e novos caminhos é o que fizeram essas mulheres. De
forma sofrida ou aliviada, sentindo-se só ou com liberdade. Parece que realizaram
uma opção a de reconhecer que elas são responsáveis pela própria felicidade.
Durante um tempo fiquei perdida, chorando, atacando as pessoas, brava.
Ai minha cunhada me convidou para ir no Bem Viver e fui, quando cheguei
lá e vi aquela velharada, eu não queria ficar lá, nunca tinha visto tanto
velho junto daquele jeito. Em casa nos temos gente de todas as idades. Eu
estava acostumada a viver assim. Levei três meses para me ambientar,
mas fiquei e participo de tudo. Tentei namorar, mas não dá certo, aceitar
outro homem na vida. Tenho amigos, passeio e sou feliz (Hortência).
Tanto Hortê ncia quanto as demais trazem as questões do envelhecimento
situando-as no universo feminino. São preocupações com o envelhecimento
saudável, tanto físico, psíquico como emocional. Conscientes da necessidade de
realizarem a sua parte são ativas participantes dos grupos existentes na cidade para
atividades físicas.
Elas
manifestam
preocupação
em
conseguirem
ter
autonomia
e
independência na maior parte da vida futura. Demonstram preocupação com a
possibilidade de acontecer mais tarde a dependência. Citam os familiares como
atenciosos, amorosos, porém com família, são trabalhadoras e inquietas com os
sentimentos ou conflitos que possam existir de ambos os lados frente a essa
dependência. Cogitam lançar mão de outros arranjos: morar com familiares da
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
125
mesma idade, contratar uma cuidadora ou ficar asilada.
Para ficar amargurada eu fico aqui em casa, arrumo uma pessoa para ficar
comigo. O que eu ganho mais a pensão dá para pagar uma pessoa , sem
luxo, mas dá. E se não der mesmo, meus irmãos me chamaram para ficar
com eles. Mas eu não quero, quero viver minha vida só. [...] Agora que sou
livre (Angélica).
Eu tenho meus filhos, mas se eles não puderem cuidar de mim, acho que é
melhor ir para o asilo (Violeta).
A condição de ser viúva ainda é um atributo que leva a discriminação,
preconceitos. De forma geral as mais ativas socialmente percebem atitudes
discriminatórias demandadas por ambos os sexos.
As mulheres sentem-se ameaçadas no campo afetivo e os homens crêem que
viúvas estão com a sexualidade "à flor da pele" e outros que desejam ser mantidos
pelas parceiras, procurando vincular-se às mulheres com melhores condições
econômicas.
Quer por ações sutis ou mais agressivas, também são alvos das mulheres
casadas que invejam a liberdade que desfrutam. O que percebemos é a persistência
da mentalidade antiga com as possibilidades atuais.
Arrumei um namorado. Moramos uns tempos juntos ele veio para minha
casa. Era um companheiro excelente, mas não pagava as contas. Me
causou tantos problemas, muito diferente de meu marido. Ele tinha outras
namoradas enquanto estava comigo (Angélica).
É terrível ser viúva. Tem-se sempre a impressão de que as mulheres estão
de olho em nós, com medo de tomarmos os maridos delas. Me acautelo.
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
126
Não quero dar meu direito a ninguém. O preconceito existe. A mulher viúva
para uns está sempre a cata de homens. Ê horrível eu acho. Hoje eu não
sinto mais, porque tenho meu namorado (Margarida).
Há discriminação sim, se chega lá no clube e tem uma mulher com um
homem você cumprimenta logo a gente vê que ela dá um cutucão nele. [...]
Outro dia subindo a rua encontrei umas amigas que são casadas. Elas
disseram queria ser você que não tem marido. Eu respondi: Ter o nome de
viúva é muito triste. É triste em toda parte. Se você olha para seus filhos,
você diz meus filhos não tem pai. Se vai numa festa não pode conversar
com um casal porque você esta jogando charme no homem, não pode rir
porque é viúva regateira. Ser viúva não é brincadeira não (Hortência).
Antes me chamavam para sair, agora que fiquei viúva não chamam mais.
Os casais não querem gente sozinha perto deles. Penso que eles não
acham graça sem o meu marido estar junto, porque ele era muito alegre.
Mas eu tenho postura, não fico me insinuando (Tulipa).
Sinalizam também uma cruel disputa entre as que estão viúvas que
costumam frequentar atividades de salão, bailes, pois conforme dizem a
partir do momento que uma idosa viúva arranja um namorado ela passa a
desenvolver comportamento segregativo para com as demais, com receio
de perdê-lo (Tulipa).
São mulheres que participam de diferentes formas da vida familiar. Colaboram
com os filhos nos cuidados dos netos eventualmente, por vezes financeiramente ou
deles recebendo auxílio quando necessário.
Tanto ir a Aparecida do Norte quanto a Europa são atividades de lazer que se
encontram na vida dessas mulheres, que realizam ações voluntárias em algumas
obras sociais da cidade. O que constatamos é que a maioria delas ampliou suas
formas de participação social.
Resguardadas as dores as entrevistadas com maior ou menor tempo, passou
a fazer sua escolha, saindo da condição onde se colocou após a morte do marido,
iniciando um movimento de renovação. Refletir sobre a única certeza humana pode
gerar nosso encontro com a vida, com os nossos desejos e vontade. Acredito que
Capítulo 5 – Envelhecimento, mulher e viuvez: analisando os resultados
127
seja isso que torne as mulheres coloridas, porque ele vem da decisão de: Começar
de Novo e contar comigo.....
Considerações finais
A
129
bre-se a porta da gaiola! Assim sintetiza Rubem Alves (2004) o
que, a seus olhos, acontece quando a mulher idosa fica viúva. Acrescento que
algumas calçam rodinhas nos pés. Do privado para o público, a vivência de novos
papéis, inclusive o de viúva é o que deixa entrever a porta aberta. Resta conseguir
passá-la, alçar vôo tal como uma águia 8.
Por que a águia? Porque penso que a analogia é adequada ao processo,
efetuado pelas protagonistas dessas histórias. Apesar da singularidade de cada
relacionamento, todas passaram pelo mesmo dilema de sobrevivência que ocorre
com a águia. Explico.
Essa ave, aos quarenta anos, tem que optar por realizar um processo
doloroso de renovação, está envelhecida e precisa substituir o bico, unhas e penas,
caso deseje manter-se viva. O processo de renovação em isolamento dura cinco
meses. Ao término, está pronta para retomar as campinas e voltar a viver por mais
trinta anos.
"É um vôo diário de vitória, acontece quando o indivíduo está aberto a
mudanças e renovações!! Somente livres do peso do passado, poderemos
aproveitar o valioso resultado de uma... RENOVAÇÃO" (autor desconhecido).
Renovar,
8
mudar,
elaborar
perdas
quaisquer
Texto recebido por meio eletrônico em agosto 2005 de autor anônimo.
que
sejam.
Significou
Considerações finais
130
desaprender o papel de esposa e passar a construir o de viúva. Despojar-se do
passado, para redefinir o presente e futuro. É esse o processo que determinará o
seu luto, o quanto de tempo precisará para reorganizar-se, rever rotinas,
reaprendendo novos fazeres, elaborando um projeto de vida.
Terá que enfrentar o cotidiano impregnado do fazer antigo, da juntidade, do
cuidar, do partilhar, da espera pelo retorno, como caracteriza Agnes Heller (1985) da
“entonação” desse ser que partiu.
Nessa tarefa a rede social assinala a sua importância e a fragilidade de quem
não a possui. Contaram com o apoio de pessoas próximas do circulo de
relacionamento pessoal ou familiar, para retornar a vida social. Há valorização dos
laços familiares, aos grupos de pertencimento e a rede social que estruturou. De
acordo com o seu ritmo interno as mulheres viúvas desse estudo determinaram para
si um tempo de luto, uma vez que essa norma deixou de ser assumida pelos grupos
sociais.
As viúvas dessa história mostraram-se permeáveis ás mudanças. Não se
percebe radicalizações em suas concepções religiosas, pois a utilizam como fonte
de mobilização interna e junto à comunidade na qual se inserem.
Acredito que nossas protagonistas demonstram potencial para realizar mais
uma vez o movimento de síntese e participarem da batalha para a sobrevivência da
Terceira idade proposta por Schirmacher, uma vez que, por meio do cotidiano, elas
estão amealhando bagagem suficiente para colaborar na montagem de estratégias.
Sabem o que é estar envelhecendo, sabem o que ser mulher antes, durante e
após os movimentos feministas e a pílula; sabem o que é perder entes queridos,
Considerações finais
131
sabem o que é trabalhar no anonimato das tarefas domésticas, integrar o mercado
de trabalho, ter dupla jornada, ser submissa, ser companheira.
E diria que são mulheres coloridas porque parecem estar vencendo a cruel
tríade da descriminação: ser mulher, envelhecida e viúva.
São mulheres do agora, preocupadas com uma participação social que traga,
além de seu próprio benefício, também um bem à comunidade. Sentem-se livres
para praticar suas escolhas, assumindo ou ampliando papéis, independentemente
da qualidade da relação conjugal, familiar e social anteriormente existente.
Desejam estabelecer relações que lhes tragam companheirismo, afetividade,
alegria, felicidade. Passear, dançar, viajar de avião, conhecer outras cidades,
bordar... viver, construir a história, tecendo o futuro.
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Anexos
ANEXO A - Poema Retrato de Cecília Meireles
Retrato
Eu não tinha este rosto de hoje, assim calmo, assim triste, assim
magro, nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
- Em que espelho ficou perdida
a minha face?
Cecília Meireles
A Poetisa da Alma Cecília Meirelles
http://www.geocities.com/fedrasp/cecilia-meireles.html
144
Anexos
ANEXO B - Músicas de Ataulfo Alves e Erasmo Carlos
Ai QueSaudadesdaAméta
Ataulfo Alves - Mário Lago
Nunca vi fazer tanta exigência
Nem fazer o que você me faz
Você não sabe o que é consciência
Nem vê que eu sou um pobre rapaz
Você só pensa em luxo e riqueza
Tudo o que você vê, você quer
Ai, meu deus, que saudade da amélia
Aquilo sim é que era mulher
Às vezes passava fome ao meu lado
E achava bonito não ter o que comer
Quando me via contrariado
Dizia: "meu filho, o que se há de fazer!"
Amélia não tinha a menor vaidade
Amélia é que era mulher de verdade
Composição: Erasmocarlos - Narinha
Mulher (Sexo frágil) (Narinha - Erasmo Carlos)
Dizem que a mulher é o sexo frágil Mas que mentira absurda
Eu que faço parte da rotina de uma delas Sei que a força está
com elas Veja como é forte a que eu conheço Sua sapiência
não tem preço Satisfaz meu ego se fingindo submissa Mas no
fundo me enfeitiça
Quando eu chego em casa à noitinha
Quero uma mulher só minha
Mas pra quem deus luz não tem mais jeito
Porque um filho quer seu peito
O outro já reclama sua mão
E o outro quer o amor que ela tiver
Quatro homens dependentes e carentes
Da força da mulher
Mulher, mulher
Do barro de que você foi gerada
Me veio inspiração
Pra decantar você nesta canção
Mulher, mulher
Na escola em que você foi ensinada
Jamais tirei um 10
Sou forte, mas não chego aos seus pés.
145
Anexos
146
ANEXO C - História de Maria Madalena
Maria Madalena
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre
http://pt.wikipedia.org/wiki/Maria_Madalena.
Maria Madalena, que significa, provavelmente, "Maria de Magdala." uma localidade na costa ocidental
do Lago de Tiberíades. é referida nos evangelhos (canónicos e apócrifos) como sendo uma seguidora
de Jesus Cristo. Nada se sabe sobre ela, para além do que aparece nestes evangelhos. É festejada no
dia 22 de Julho.
A tradição, sem qualquer fundamento bíblico, cons idera-a, muitas vezes, como a prostituta que,
vivendo à mercê dos homens, pede perdão pêlos seus pecados a Cristo. Este episódio é
frequentemente identificado com o excerto do Evangelho de Lucas 7:36-50, ainda que af não seja
referido o nome da mulher em causa.
Esposa de Jesus?
Alguns escritores contemporâneos, principalmente os autores do livro de 1982, que em Portugal se
intitulou O Sangue de Cristo e o Santo Graal,(Holy Blood, Ho/y Grail) e Dan Brown no romance O
Código Da Vinci (2003), defendem que:
• Maria Madalena era, de facto, mulher de Jesus Cristo, e que
• esse facto foi escondido por revisionistas cristãos paulinos que teriam alterado os
evangelhos.
Estes escritores basearam-se nos evangelhos, canónicos e apócrifos, além de escrituras gnósticas para
fundamentarem as suas conclusões. Ainda que o Evangelho de Filipe designe Maria Madalena como
"companheira de Cristo", o que parece indicar que fosse especialmente próxima de Jesus, não há
nenhum documento antigo que refira abertamente que ela fosse sua esposa.
Um argumento a favor desta especulação refere-se ao facto de que o celibato era muito raro entre os
judeus homens, da época de Jesus, sendo considerado, mesmo, como uma transgressão ao primeiro
mitzvah (mandamento divino)— "Sede fecundos e multiplicai-vos". Isso seria considerado impensável
para um adulto, ainda mais quando viajava pela Judeia pregando como rabi.
Pode-se, contudo, usar o contra-argumento de que haveria uma grande diversidade de correntes
religiosas dentro do judaísmo, além de que o papel de rabi ainda não estava bem definido. João
Baptista e os essénios eram celibatários. Paulo de Tarso era-o também, quando ainda se julgava que o
cristianismo deveria ser uma religião destinada apenas ao povo judeu. Na verdade, só depois da
destruição do Segundo Templo no ano 70 d. C. que o judaísmo rabínico se tomou a corrente dominante
entre as comunidades judaicas.
Maria de Magdala é, sem dúvida, uma das presenças femininas de maior destaque nos evangelhos. A
sua presença na crucificação de Jesus, ainda que de modo algum conclusiva, é, contudo, consonante
com o papel de esposa em sofrimento e viúva desconsolada, ainda que fosse de esperar que Jesus a
encomendasse a alguém, como fez a sua mãe (contra-argumento que poderá ser posto em causa se
fizermos outra interpretação das palavras de Cristo durante a última ceia). Dada a falta de provas
escritas, dessa época, ainda que muita gente goste de considerar a hipótese ou a defenda
acerrimamente, a maior parte dos académicos não a leva a sério.
Tornou-se célebre, com a divulgação do livro já referido de Dan Brown, o argumento de que n'A Última
Ceia, de Leonardo da Vinci. a personagem que está à sua direita, com traços femininos, seja Maria
Madalena e não João, como outros defendem. O facto de Jesus não envergar nenhum cálice (o
Anexos
147
Graal) poderá levar a interpretações que muitos consideram abusivas, como acreditar que Maria
Madalena é, de facto, o "cálice sagrado" onde repousa o "sangue de Cristo" ou seja, que ela estaria, na
altura, grávida de Jesus.
Do romance ficcional à teologia
Os teólogos católicos consideram inaceitável a pseudo-história narrada no romance de Dan Brown.
Argumentam que qualquer historiador de arte sabe que a representação de Leonardo Da Vinci se funda
no Evangelho de S.João, numa passagem (Jo. 21, 20) em que se fala do discípulo amado (que seria o
próprio João) e não propriamente nas passagens referentes à instituição da eucaristia (Mc 14, 22-25;
Lc 22,14-20; Jo 6,51-59; 1 Cor 11,23-27). Isso explica a inclinação do discípulo ama do e a surpresa
dos restantes apóstolos quando ele pergunta a Jesus: "Senhor, quem é que te vai entregar?". Esther A.
Boeur, ministra luterana, avança ainda mais. Ela considera disparatadas as teses de Dan Brown mas
ressalva com argumentos concretos e verossímeis o chamado discipulado de iguais. Maria Madalena
não foi, nem poderia ser esposa de Jesus. Caso contrário, ele nunca teria legitimidade para dizer aos
discípulos que abandonassem esposa e filhos para o seguirem. No entanto, ela foi uma das discípulas
de Jesus, aquela que anunciou aos seus pares a ressurreição. Além disso, è preciso não esquecer que
a maior parte dos restantes dados hist óricos apresentados no "Código Da Vinci" são totalmente
errados. Um deles refere-se a uma das maiores fraudes históricas, o Priorado de Sião. Pierre Plantard.
responsável por esta instituição, confessou perante a justiça francesa em 1992 ter criado todo um
conjunto de argumentos com a finalidade de justificar que era descendente da dinastia dos reis
merovíngios. cuja origem estaria num filho de Jesus Cristo e Maria Madalena.
MARIA MADALENA, A PROSTITUTA SAGRADA
Rosane Volpatto
http:7/wvw.rosanevolpatto.trd.br/mariamadalena.htm
A maioria dos homens acredita que a maior ofensa para uma mulher é ser chamada de "prostituta". A
partir deste momento você entenderá com a história da Santa Maria Madalena e outras deusas
mitológicas, como esta palavra foi tão depurtada pelo cristianismo.Imagine-se agora, se puder, que
estamos viajando no tempo, por terras estrangeiras, alcançando civilizações muito antigas. Com o
olho de sua mente veja um templo cintilando de luz. Lá dentro há uma bela mulher coberta de véus,
que virá em sua direção dançando. Seus braços são cobertos de braceletes dourados cravados de
pedras preciosas e quando passa por você, sentirá um aroma delicioso de flores. Ela é só amor e
êxtase. Ela è a nossa prostituta sagrada que se entrega à Deusa e aos estranhos cansados de viver
que vão até o templo venerar a deusa do amor.
Esta imagem fenomenal que contemplamos em nossa imaginação, já foi uma realidade em tempos
muito antigos. Inscrições antigas desenterradas de templos, nos contam com mais detalhes destas
cerimónias religiosas que eram celebradas em honra a deusa do amor e da fertilidade. Quem ainda
hoje não se encanta com a beleza da nudez de Afrodite?
Mas, quando a prostituição sagrada existiu, as culturas eram embasadas no sistema matriarcal.
Nestes tempos, natureza e maternidade eram prioridade, pois tinha-se um mundo imenso para
povoar. Entretanto, a natureza sexual dos homens era tida como uma atitude religicsa. Na Babilónia,
todas as virgens, antes de casar, eram iniciadas na feminilidade através da prostituição em templos
sagrados. Matronas romanas, da mais alta aristocracia, iam ao templo Juno Sospita para entrar no
ato de prostituição sagrada quando era necessária uma revelação.
Independentemente de onde vinham, por uma origem real ou comum, por uma noite ou toda a vida,
as prostitutas sagradas eram nesta época, muito numerosas. Todas elas gozavam de "síatus" social e
eram muito cultas, pois passavam por iniciações e muito estudo. A maioria deias, eram política e
legalmente iguais aos homens. No Código de Hmaurábi, uma legislação especial salvaguarda os
Anexos
148
direitos e o bom nome da prostituta sagrada. Ela era protegida contra difamações, assim como seus
filhos. Também por lei, a prostituta sagrada podia herdar propriedades de seu pai e receber renda da
terra trabalhada de seus irmãos. Se insatisfeita, ela podia dispor da propriedade da maneira que
julgasse conveniente.
Avançando alguns passos de tempo à frente já encontramos a imagem da prostituta sagrada
totalmente deturpada. Foi exatamente quando o sistema matriarcal evoluiu para o patriarcal e
patrilinear. Mas este trunfo do patriarcado não foi resultado de uma revolução violenta. Foi com o
surgimento da política, do militarismo e do comércio que gerou-se a estratificação social. A mulher
passou à condição de subordinada porque seus papéis deixaram de ser importantes para os novos
valores. À medida que as conquistas foram acontecendo, um enorme número de povos foram se
mesclando e as divindades de uma foram incorporadas à outra. Imagine a quantidade de deusas e
deuses que eram cultuados. Ficou então resolvido, que o melhor seria criarem somente um Deus
Supremo, para ser adorado. Do ponto de vista patriarcal, ele deveria logicamente ser masculino. Foi
assim, que o homem criou novas doutrinas religiosas, de acordo com suas crenças na supremacia
masculina. Deste modo, os antigos templos do amor, deram lugar à casa do Senhor, deslocando
radicalmente os papéis das mulheres nos ritos religiosos.
Sob à nova tradição, a mulher tomou-se Eva, a encarnação da sedução, a ruína do homem. Sua
simples existência era advertência para os desejos físicos, aos quais era necessário resistir mediante
o medo de punição eterna. As mesmas qualidades pelas quais as mulheres foram outrora
consideradas sagradas, agora são a razão para as degradarem.
Em nome do Senhor o homem começou a destruir todos os vestígios da deusa e de sua defesa da
felicidade sexual. Até o casamento não tinha mais como finalidade o prazer sexual, mas a criação de
novas almas para adorar a Deus. Todo o prazer foi tirado da natureza humana e considerado pecado.
Com estas mudanças, as mulheres deixaram de ser consideradas em pleno gozo de seus direitos. A
lei romana colocava a mulher sob sua tutela e afirmava que ela era imbecil. Na Grécia, as leis de
Sólon não lhes davam direito algum. A lei hebraica condenava a mulher à morte caso não fosse casta
na época de se casar e, se cometesse adultério, era apedrejada até a morte.
Essas novas leis são a antítese das atitudes em relação à mulher e à sua natureza sexual, as quais
prevaleceram durante as eras em que a deusa era venerada.
Pois é neste contexto histórico que surge a nossa Maria Madalena.
QUEM ERA MARIA MADALENA?
Maria Madalena é a prostituta mais conhecida da história. Mas pergunta-se, quem era mesmo Maria
Madalena?
Todas as incertezas a respeito de Maria Madalena deve-se à uma projeção totalmente alterada. Ela
acabou presa entre as incongruências da interjeição moral cristã e a imagem arquetípica da natureza
feminina erótica.
Existem poucas citações diretas sobre ela nos quatro evangelhos, porém ela está nominalmente
presente nas passagens mais marcantes na vida do Cristo, como a Paixão e a Ressurreição. Ela é a
Anexos
149
discípula que ama o mestre acima de tudo e é testemunha da Sua Ressurreição, sendo a portadora
da Boa Nova. Por isso ela pode ser considerada a primeira apóstula. Entretanto, em outras fontes que
não as Escrituras cristãs, já encontramos uma imagem bem diferente de Madalena e sua função. Nos
Evangelhos Gnósticos ela é vista como líder ativa no discipulado de Cristo. Talvez fosse até, uma
professora dos apóstolos. O gnóstico "Evangelho de Felipe" relata "a união do homem e da mulher
como símbolo da cura e paz, e estende-se ao realcionamento de Cristo e Madalena que, diz ele, era
frequentemente beijada por ele". Ele descreve Maria Madalena como "a companhia mais íntima de
Jesus, e símbolo da Sabedoria Divina".
De acordo com o "Diálogo do Salvador", Maria Madalena foi uma dos três discípulos a receber
ensinamentos especiais, e era elogiada acima de Mateus e Tomé. Dizia-se que "ela falava como
mulher que conhecia o Todo".
Mas, a atenção especial que recebia Maria Madalena, acabou gerando rivalidade entre ela e os outros
discípulos. Em "Pists Sophia", há algo a respeito de Pedro irritando-se porque Maria Madalena dominava
a conversa com Jesus. Ela parecia entender tudo o que Cristo falava, enquanto os outros,
não tinham tanto alcance.Pedro em função disso, temia perder sua posição de liderança na nova
comunidade religiosa. Ele exige que Jesus a silencie e é imediatamente censurado. Mais tarde, Maria
admite a Jesus que não ousa falar a ele livremente porque, segundo suas palavras: "Pedro faz-me
hesitar; tenho medo dele porque ele odeia a raça feminina". Jesus responde que quem quer que o
espírito tenha inspirado é divinamente ordenado a falar, seja homem ou mulher.
No "Evangelho de Maria", há uma passagem que os discípulos abatidos com a crucificação, pedem
para Maria Madalena que os animassem, contando-lhes coisas que Jesus dissera e ela em particular.
Ela fala então, de sua visão de Cristo e o que ele tinha revelado a ela. Todos duvidaram e a
rechaçaram.
Nos "Evangelhos Gnósticos", Maria Madalena é considerada uma mulher capaz, ativa, amorosa, com
habilidades de conhecer e falar "o Todo", o que talvez seja uma referência à mais alta Sabedoria,
certa compreensão que o coração recebe e contém. Maria Madalena possuía a habilidade de saber
das coisas inexplicáveis, como sua visão de Cristo. Ela não questionava este seu lado, como os
outros. Ela confiava em sua fonte mais íntima. Ela conseguia ver os emissários divinos e transmitir
suas mensagens aos humanos. Como prostituta sagrada, ela era mediadora entre o mundo divino e o
mundo dos humanos.
Maria Madalena também operava milagres. Conta-se que após ela ver o Cristo ressuscitado, corre
para contar aos outros discípulos. No caminho, encontrou Pôncio Pilatos e falou-lhe sobre a
maravilhosa novidade.
-"Prove-o", disse Pilatos.
Naquele instante, passou ao seu lado uma mulher que carregava uma cesta de ovos, e Maria
Madalena tomou um em suas mãos. Quando ergueu diante de Pilatos, o ovo adquiriu uma cor
vermelho-vivo. Como testemunho desse efeito lendário, na catedral em Jerusalém que porta seu
nome há uma estátua de Maria Madalena segurando um ovo colorido.
Aliás, o ovo é um símbolo muito apropriado para este contexto histórico, porque ele simboliza uma
nova vida. Ovos coloridos ainda hoje são usados com semelhante simbolismo em nossa Páscoa.
Cultuar seus símbolos é uma forma de evocarmos os auspícios de Maria, e meditar sobre eles é uma
forma de penetrar em seus mistérios.
Anexos
150
Desde o início da Idade Média, Santa Maria Madalena tem fervorosa devoção, principalmente na
Europa, de todos os destituídos, prostituídos, pecadores e despossuídos, que estão em busca de um
verdadeiro arrependimento. Várias instituições foram criadas levando o seu nome, para o
acompanhamento e orientação, principalmente, de mulheres vítimas da prostituição.
Diz a lenda, que após a volta do Cristo para junto de Seu Pai, Maria Madalena partiu em busca do
isolamento, passando o resto de sua vida em penitência e adoração ao Cristo, habitando em uma
gruta. Como não se alimentava, anjos vinham constantemente em seu socorro, até que veio a falecer
e sua alma foi levada por um cortejo de anjos, para o céu, junto ao seu Salvador.
Algumas lendas situam esse período de penitência em um deserto na Palestina, outras contam que ela e
outros discípulos, emigraram para Europa. Ela teria ido até Marselha, na França, e depois a
Burgundy, vivendo em uma gruta em Ste, Baume. Lá ela teria vivido até o fim de sua vida, quando foi
assistida em seu leito de morte pelo bispo Maximinus, que lhe deu a extrema unção e a enterrou.
Maria Madalena como vemos, continua sendo uma figura proeminente na tradição cristã por uma
razão psicológica. A dimensão arquetípica da natureza feminina erótica elege uma figura para ser a
portadora de sua projeção. A questão é que os seres humanos, em sua busca espiritual, têm que
encontrar uma imagem do feminino que tenha relação com aspectos eróticos da deusa. Mas a
repressão da sexualidade pelo pai cristão manipulou a imagem de maneira que Maria Madalena fosse
vista como penitente, renunciando â sua sexualidade.
Diferentemente do homem antigo, cujo amor pelo erótico era considerado compatível com a
espiritualidade, esses lideres cristãos negaram exatamente o necessário para a renovação da vida.
Maria Madalena é uma figura feminina com que todas nós mulheres podemos nos relacionar sem
trairmos a nossa essência. Como uma prostituta sagrada, é capaz de encerrar todos os aspectos
dinâmicos e transformadores do feminino: paixão, espiritualidade e prazer A imagem feminina de
Maria Madalena, pode ser portadora de muitos outros significados, quando sua natureza plena for
restaurada dentro da nossa psique.
A imagem da deusa divina que personifica os aspectos risonho, radiante, sábio, independente e
sensual da natureza feminina existe desde que se tem registros históricos. E pode continuar a existir em
nosso tempo se permitirmos que a sua imagem seja restabelecida e que tome seu lugar de direito
na compreensão consciente.
Texto pesquisado e desenvolvido por
http://www.rosanevolpatto.trd.br/mariamadalena.htm
Bibliografia consultada A Prostituta Sagrada Nancy Qualls-Corbett
Anexos
151
ANEXO D - O que dizem das viúvas
Artur de Azevedo
A VIÚVA DO ESTANISLAU
Por ocasi ão da morte do marido, aquele pobre Estanislau, que, depois de uma luta horr ív el, foi afinal
vencido pela tuberculose, Adelaide parecia que ia també m morrer. Dizia-se que ela amava tanto o
marido, que fizera o poss ível para contrair a mol éstia que o matou e acompanh á-lo de perto no
túmulo. Emagreceu a olhos vistos, e toda a gente contava que, mais dia menos dia, Deus lhe fizesse a
vontade; mas o tempo, que tudo suaviza e repara, foi mais forte que a dor, e ano e meio depois de
enviuvar, Adelaide estava rubicunda e linda como n ão estivera jamais.
O Estanislau deixou-a paupérrima. O pobre rapaz não contava arrumar a trouxa tão cedo, ou, por
outra, não teve com que preparar o futuro. Enquanto viveu, nada faltou em casa; depois que ele
morreu, tudo faltou, e Adelaide, que felizmente não tinha filhos, aceitou a hospitalidade que lhe
ofereceram seus pais.
- Vem outra vez para o nosso lado, disseram -lhe os velhos; façamos de conta que te não casaste.
Não tardou muito que aparecesse um namorado à viúva. Era um excelente moço, o Miranda, que
frequentava a casa dos velhos por ser funcionário da mesma secretaria onde o pai de Adelaide era
chefe.
Foi com muita satisfaç ão que este notou a simpatia que o Miranda manifestava pela mo ça, e pulou de
contente quando o rapaz, um dia, na reparti ç ão, se abriu com ele, dizendo-lhe que ser seu genro era o
que mais ambicionava neste mundo.
O velho foi para casa alegre como um passarinho, e disse tudo à mulher.
- Sabes, Henriqueta? O Miranda confessou-me hoje que gosta da Adelaide e quer casar -se com ela.
Estou satisfeitíssimo, porque nossa filha não poderia encontrar melhor marido! Que me dizes?
- Digo que seu Miranda é uma sorte grande, mas duvido que Adelaide aceite.
- Duvidas, por quê?
- Porque ela s ó pensa no Estanislau: é uma vi úva inconsol ável. Engordou, tomou cores, goza saúde,
mas aposto que não admite que lhe falem noutro casamento.
- Deixe-a comigo; vou sondá-la.
O velho sondou-a, efetivamente, e reconheceu que D. Henriqueta calculava bem.
- Não me fale em casamento, papai! Eu considerar -me-ia uma mulher indigna se desse um substituto
ao meu pobre Estanislau!
Mas o velho que não era peco, não se deixou vencer e insistiu, lançando mão de quanto
argumento lhe sugeriu a sua longa experi ência do mundo.
- Minha filha, numa terra de maldizentes como este Rio de Janeiro, a reputaç ão de uma vi úva moça e
bonita cor re tantos perigos, que a melhor resoluç ão que tens a tomar, para fazer respeitar a mem ória
honrada do teu Estanislau, é casares -te em segundas núpcias. Uma única dificuldade haveria para
isso: o marido; mas neste particular, minha filha, foste de uma fortu na fenomenal. O Miranda caiu-te
do c éu! Olha, eu, se tivesse que escolher um genro,
Anexos
152
não escolheria outro -, e tu, se te casares com ele, darás muito prazer a tua mãe, e tomarás feliz a minha
velhice.
Essas palavras, que acabaram molhadas de lágrimas de enternecimento, calaram no ânimo de Adelaide,
e na mesma noite, como a família se achasse reunida na sala de jantar, e o Miranda presente, ela dirigiuse a este nos seguintes termos:
- Meu amigo, sei que o senhor gosta muito de mim e deseja ser meu marido; sei que o nosso casamento
daria muita satisfação a meus pais; mas devo dizer-lhe que ainda amo o Estanislau como se ele
estivesse vivo, e não posso amar dois homens ao mesmo tempo.
Os velhos morderam os beiços; o Miranda remexeu-se na cadeira, sem responder.
- Sei também que o senhor é um perfeito cavalheiro e que nada lhe falta para ser um marido ideal;
aprecio o seu caráter, a sua bondade, a sua inteligência; mas, se nos casarmos, não poderei levar-lhe o
sentimento que todo o homem tem o direito de exigir no coração da sua noiva. Se depois desta
declaração leal e honesta, persiste em querer ser meu esposo, aqui tem a minha mão.
- Aceito-a! respondeu prontamente o Miranda, tomando a mão que lhe estendeu Adelaide. Aceito-a,
porque - perdoe a minha vaidade - tenho alguma confiança no meu merecimento, e espero conquistar o
seu amor!
Casaram-se, e hoje, que estão unidos há um ano, podem gabar-se - ela de ter tido
verdadeiras surpresas fisiológicas, e ele de ser amado como o Estanislau nunca o foi.
- Es então feliz, minha filha?
- Muito feliz, mamãe; o Miranda é tão bom marido, que, lá no outro mundo, o Estanislau, se meteu a mão
na consciência, com certeza me perdoou.
Nelson Rodrigues Viúva,
porém honesta,
'Viúva, porém honesta!" é uma comédia criada em 1957, do jornalista, cronista, romancista e
dramaturgo Nelson Rodrigues, e que narra a história de um poderoso homem da imprensa, o
Dr. J.B. de Albuquerque Guimarães, diretor do jornal "A Marreta", um dos jornais mais influentes
do pais e que não consegue convencer sua filha única, Ivonete, a deixar de velar seu marido morto,
Dorothy Dalton, e por consequência voltar a ter uma vida normal de uma adolescente de 15 anos,
posteriormente casando-se e lhe proporcionando netos que seriam
seus herdeiros no império jornalístico.
Ao perceber que a filha está irredutível na questão da viuvez, Dr. J.B. contrata um time de
técnicos para solucionar o caso, que são: uma ex-cocote, um psicanalista e um
otorrinolaringologista (todos charlatões) para tentar resolver o problema. Em meio a esse desfile
de personagens insólitos surge o Diabo da Fonseca, figura surreal que terá papel
fundamental no desfecho da trama.
O propalado marido de Ivonete de Albuquerque Guimarães é um fugitivo da FEBEM e
homossexual chamado Dorothy Dalton que caiu nas graças da menina quando o J.B. a
mandou escolher um marido na redação do jornal, para justificar uma gravidez indesejada, e
que foi detectada pelo médico da família o Dr. Lambreta, velho esclerosado e maluco (mais
tarde soube-se que a tal gravidez era falsa e inventada pela mente insana do médico).
Como Dorothy Dalton morreu atropelado por uma carrocinha de picolé Chicabom fazendo com
que Ivonete caísse numa viuvez inviolável e como nenhum dos "técnicos" achou uma
solução para o caso, o jeito foi ressuscitar o morto fazendo com que a filha do Dr. J.B. deixasse
de ser viúva. Esse trabalho ficou por conta do Diabo da Fonseca que através de
Anexos
153
uma sessão espírita reaviva o defunto livrando a menina de tal viuvez indesejada. Como prémio o
demónio acaba desposando Ivonete.
'Viúva, porem honesta!" além de tudo o que já foi falado aqui, ainda desfila de um leque de
personagens clássicos da dramaturgia Nelson Rodrigueana como as famosas "tias", os puxasacos, os poderosos, enfim existe na obra uma gama de tipos que caracterizam o estilo do
autor e que o fazem tão ácido e genial na analise da principal célula da sociedade: A família.
Tudo isto reunido numa farsa de 60 minutos.
Sobre o Projeto "Viúva, porém honesta!"
O espetáculo 'Viúva, porém honesta!" é o resultado de uma grande Oficina de Teatro
ofertada pela Secretaria de Estado da Cultura do Estado de São Paulo, onde ao longo de
quatro meses foram desenvolvidos diversos trabalhos referentes às técnicas de interpretação,
além de estudos sobre a história do teatro.
Dos alunos que frequentaram o curso foi selecionado um grupo de 17 pessoas com as quais
foram criadas duas montagens: "Viúva, porém honesta!" e "Senhora dos Afogados", do
grande jornalista, cronista e dramaturgo Nelson Rodrigues.
A peça 'Viúva, porém honesta!", foi escolhida para iniciar os trabalhos no ano de 2002, por
utilizar uma linguagem extremamente dinâmica, alegre e com um ritmo intenso, bem
característico do género farsa, sob o qual a direção delineou o espetáculo.
A escolha também passou pelo critério de adaptação do elenco jovem e com várias
potencialidades, características que também são encontradas no texto.
Esta obra que é datada de 1957, é o único trabalho nitidamente cómico do autor e foi criado a
pedido de sua filha, Dulce Rodrigues, que desejava na época alavancar a sua carreira de
atriz, e que interpretou o papel título ao lado do seu então marido Jece Valadâo, que atuou
como Diabo da Fonseca.
Outro ponto importante no trabalho é a concepção musical, já que Nelson Rodrigues durante boa parte
da sua trajetória como dramaturgo recebeu a pecha de "Escritor Maldito", a direção
do espetáculo reuniu uma série de compositores, na trilha sonora, que também foram conhecidos
como tal, entre eles: Tom Waits, Raul Seixas, Arrigo Barnabé, Itamar Assunção,
Walter Franco, Tom Zé, entre outros (além é claro dos eternos tangos que tão bem se
fundem com a obra Rodrigueana).
Como o texto trabalha com o recurso da metalinguagem, onde a narrativa, não é linear, a direção
resolveu adotar critério semelhante na programação visual do espetáculo (cenários, figurinos, iluminação
e maquiagem), onde elementos da escola surrealistas são encontrados.
Para encerrar esse resumo sobre o projeto é importante salientar que o Grupo de Teatro e
Eventos Culturais Em Cena Ação quer mostrar ao público um outro lado desse grande autor
que é Nelson Rodrigues, pois ele só é conhecido, por grande parte das pessoas interessadas
em teatro, através de suas tragédias e seus dramas, pouco se conhece deste outro lado do
escritor. Aliás, como dito anteriormente, 'Viúva, porém honesta!" é a única obra nitidamente
cómica das dezessete peças escritas pelo dramaturgo.
Importante: 'Viúva, porém honesta!", é uma remontagem do Grupo de Teatro Em Cena Ação, sendo que
a primeira foi realizada no ano de 1997, ganhando prémios em festivais
importantes.
Anexos
154
FILME
Tudo que o céu permite
Um clássico do mestre do melodrama Douglas Sirk, Tudo que o céu
Permite (1955). No filme, uma mulher viúva (Jane Wyman) se apaixona
por um homem mais jovem (Rock Hudson) e começa a viver uma
realidade de preconceitos, fofocas e intrigas. Essa película de Sirk
transcende todos os preconceitos contra o género melodrama e oferece um
cruel e lúcido retrato da família americana da década de 50.
Viúva por um
Ano Livro
Chega ao Brasil mais um comovente drama familiar de John Irving
Neuza Sanches
John Irving ficou conhecido na década de 70, quando lançou o best-seller O
Mundo Segundo Garp. Este ano, ganhou o Oscar pelo roteiro de Regras da Vida,
em que um jovem criado em orfanato embarca numa viagem de
autoconhecimento. A busca interior é marca registrada nos escritos de Irving. Em
Viúva por um Ano (Record, 546 págs., R$ 38), o autor recorre ao mesmo apelo
emocional.
Irving trafega pelo género folhetim com originalidade e estilo. Viúva por um Ano
se vale de uma narrativa comovente, capaz de levar às lágrimas. Desta vez a
protagonista é Ruth, uma garotinha cuja vida será para sempre marcada por uma
tragédia familiar: a morte de seus dois irmãos, antes mesmo de ela nascer. Quando
Ruth tem só 4 anos, o casamento de seus pais se desestrutura, sua mãe desaparece
de casa, atormentada pêlos fantasmas dos garotos mortos.
A trama é cheia de reviravoltas e Irving mantém o suspense mesmo revelando o
desfecho logo de início. Seu segredo é despertar a curiosidade do leitor sobre
como se chegará àquela situação final.
O autor americano é, na verdade, um especialista em romances que contam sagas
de famílias desfeitas, com pais ausentes e filhos problemáticos. Não escreve uma linha sem esbarrar nessa faceta.
Pudera. Ele próprio é um caso representativo: ainda no berço, seu pai abandonou o lar. O jovem foi criado pela
mãe e por um padrasto que o educaram em regime de linha-dura. Viúva por um Ano está longe de ser um
folhetim açucarado. Pelo contrário. É mais um drama familiar muito bem contado.
Anexos
155
CANTIGAS DE RODA
POBRE VIÚVA
— Num rochedo tão alto
Que ninguém pode
alcançar, Sentou-se a
pobre viúva, Sentou-se e
pôs-se a chorar, A chorar,
a chorar.
— Ora diga, senhora
viúva, Com quem quereis
se casar: Se é com o filho
do conde, Ou com senhor
general, General, general.
— Eu não quero nenhum desses
moços Porque não são para mim;
Eu sou uma pobre viúva, Triste,
coitada de mim. Ai de mim, ai de
mim.
— Tingolê, tingolá.
Toca a viola pra nós dançar,
Tingolê, tingolá,
Toca a viola pr a nós dançar.
De todas as cantigas referidas neste livreto, é esta — parece-nos — a mais difundida em terras
brasileiras. Conhecemos versão pernambucana (Pereira da Costa, Folclore pernambucano); mineiras
(Frei Pedro Sinzig, O Brasil cantando, n. 136, e Basílio de Magalhães, "A viuvinha" in Revista de Língua
Portuguesa, II, p. 177); paulista (Afonso a de Freitas, Tradições e reminiscências paulistanas, p. 179):
cariocas (íris Costa Novaes, Diva Diniz Costa e Gedur de F. Pinto, Vamos brincar de roda, p. 118, e
Cecília Meireles, "Infância e folclore", A Manhã, 10/12/1942).
Pelo estudo que faz Cecília Meireles, vê-se que a cantiga de roda cantada aqui no Espirito Santo difere,
em certos pontos, acentuadamente, das versões cariocas ali referidas. Nestas há o enxerto da
"Viuvinha da parte de além" ou "Eu sou viuvinha / das bandas d'além" — o que não ocorre em
nenhuma das variantes capixabas. Esse acréscimo (cantado até com música diferente da Ia parte,
segundo Cecília Meireles) faz parte de outra cantiga de roda, o nosso "Ao passar da barca"(n. 3 deste
caderno). Houve nessas versões cariocas e em outras, evidente contaminação entre as duas cantigas,
resultante, por certo, da referência nelas feitas à mesma "viuvinha" que quer casar-se.
No Vamos brincar de roda não há, na cantiga "Senhora viúva", o enxerto da "Viuvinha das bandas
d'além", mas, logo após o "Eu sou uma pobre viúva / Triste, coitada de mim", se encaixa o seguinte
trecho, muito próximo da variante de Conceição da Barra, que vai transcrita no final destes comentários:
Morreu meu
marido No meio
das flores; Acabouse a alegria,
Acabaram os
amores.
Coberta de luto. De
luto fechado,
Semanas inteiras
Eu tenho chorado.
A melodia fixada em Vamos brincar de roda difere muito da versão musical espirito-santense, sendo
interessante frisar que, iniciando ela com três compassos indecisos, termina a primeira parte com um motivo
Anexos
156
semelhante ao da conhecida ronda "O cravo brigou com a rosa", e a Segunda com outro que lembra o
"Tenho uma linda laranja".
Na cantiga de roda capixaba, a parte final diverge do ar e tom melancólicos da inicial, quer na letra,
quer na música. Aquele inesperado "Tingolê, tingolá", saltitante e alegre — que falta em todas as
demais versões conhecidas — parece até que nem faz parte da ronda. No entanto, pela bonita variante
de Conceição da Barra, transcrita no final deste estudo, — única assim completa, ouvida no Espírito
Santo — vê-se que, após cantar as tristezas da viuvez, a "viuvinha", escolhendo o seu "par", com ele se
casa. Daí a festa de bodas, em que todos dançam, e os "noivos" também, ao som do irrequieto
"Tingolê, tingolá"...
Em variante de Santa Leopoldina, canta-se também, com referência a essa nova boda:
Tingolê, tingolá,
Toca a viola pra nós dançar,
Tingolê, tingolá,
A viúva vai se casar!
Localizamos a "Senhora viúva" em quase todas as cidades e vilas do Estado: Vitória, São Mateus,
Conceição da Barra, Alegre, Santa Lepoldina, Vila Velha, Cariacica, Iconha, Colatina, itaguaçu, Serra,
Domingos Martins, itarana...
Variantes: "Oh que rochedo tão alto" — "Eis um rochedo tão alto" — "Eis que tem um rochedo" — "Olha
um rochedo..." — "Um rochedo tão alto" — "Ai, que rochedo tão alto" — "Tenho um rochedo..." — "Existe
um rochedo..." — "Sob um rochedo..." — "Era um rochedo" — "Era um coqueiro tão alto" — "Tinha um
coqueiro..." — "Existe um coqueiro..."
"Chegou uma pobre viúva / Chegou e pôs-se a chorar" — "Sentou-se a pobre a chorar" — "Triste
de mim a chorar" — "Triste coitada a chorar" — "E pôs-se, então, a chorar, a chorar, a chorar."
"Pergunte à senhora viúva / Com quem ela quer se casar" — "Senhora dona viúva..." — "Ó senhora
Viúva..." — "Me diz a senhora Viúva" — "Me diza, ó senhora Viúva..." — "Diga, senhora Viúva" —
"Agora me diga, senhora Viúva..."
"Tingo-lelê, tingo-lelá..." — "Titingolê, titingolá..."
— "Tindo-lelê, tindo-lalá..." — "Tindo-lê, tindolá..." — "Tindelê, tindolá..." — "Tiro-lê, tirolá..."
— "Tingolei, tingolá..." — "Tinholê, tinholá..."
— "Gingolê, gingolá..."
"Toca a viola pra nós dançar" — "Toca a viola
pra mim dançar" — "Pega a viola pra nós
dançar".
Modo de brincar: Forma-se a roda bem larga. No centro, a "Senhora viúva". Começa o coro a cantar
até "General, general". Responde a "viúva"; "Eu não quero..." até "ai de mim". Então, todas as crianças,
duas a duas, dançam animadamente ao som do festivo e bulhento "Tingolê, tingolá", cantando em
andamento mais rápido que o inicial. Em certas variantes nossas, só a "viúva" dança, no meio da roda,
com o "Par" que ela escolheu, enquanto o coro entoa o "Tingolê", acompanhado de palmas. Veja-se
também a forma de brincar a roda na versão de Conceição da Barra:
As da roda cantam:
Oh, que rochedo tão alto
Que ninguém pode
alcançar; Sentou-se a pobre
viúva, Sentou-se e pôs-se a
chorar.
Oh, senhora viúva, Com
quem quereis se casar: Se
é com o filho do conde, Ou
com o senhor general?
Anexos
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A do centro responde:
Não quero nenhum desses moços, Porque
eles não são par a mim; Eu sou uma
pobre viúva, Triste coitada de mim.
Morreu meu marido No meio
das flores; Acabou-se a alegria,
Acabou-se os amores.
Eu estava de luto, De luto
fechado; Semanas inteiras
Eu tenho chorado.
Ai, ai, eu vou, Eu vou morrer
Em teus lindos braços Eu vou
falecer.
A do centro abraça, então, uma das que formam a roda, e a escolhida ocupará o seu lugar como "viúva".
SIMPATIAS DE INTERSECÇÃO DE SANTO ANTÓNIO
ARRUMAR HOMEM RICO
Material:
01 imagem de Santo António 30cm
Modo de Fazer:
A imagem deve ser ofertada à uma mulher viúva (pode ser conhecida). Peca-lhe como agradecimento um
pãozinho de Santo António ( distribuídos nas igrejas no dia 13 de junho ) que deverá ser guardado até o ano
seguinte, mesmo que alcançada a graça.
FRASES POPULARES
OU DE
PARACHOQUES DE
CAMINHÃO
Enviuvei e casei com a cunhada só para economizar sogra.
Viúva é igual a l enha verde: chora, mas pega fogo!
Fim da banguela é viúva na capela.
Viúva de beira de estrada, nem vi úva, nem casada.
Viúva é barco sem leme.
Vi úva e capão, quanto comem, assim dão.
Vi úva é sobejo de defunto.
Viúva nova e rica casada fica.
Viúva rica, com um olho chora, com o outro repenica.
Viúva rica é noiva.
Viúvo fica é quem morre.
Anexos
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CURIOSIDADES
RD 350 B 1976 - Motocicleta Yamaha
Na década de 70, era sinónimo de velocidade, aceleração, de pilotagem arrojada ! Tanto que
sua arquirival direta era a "paquidérmica" CB 750 K
Para ela "não tinha " CB 500, Suzuki GT 380 ou qualquer outra de cilindrada parecida ! Ela era páreo
"prás" grandonas!!
Esse apelido, 'Viuva Negra" veio do fato de muita gente ter se matado, ou quase, abusando da
grande performance do motor, quando o conjunto de quadro, suspensão e freios (e na maioria das vezes,
o piloto) não estavam adequados a tamanha potência !
Viúva discreta
Zeca vai pescar no pantanal com seu amigo Dinho.
Eles estão viajando na pick-up quando são surpreendidos à noite por uma tempestade que os impede
de seguir adiante.
Eles avistam uma fazenda, e entram para ver se conseguem um lugar para passar à noite.
Quem abre a porta é uma mulher linda, que está visivelmente constrangida:
- Eu fiquei viúva recentemente, e acho que vai ficar muito mal para minha reputação se vocês
dormirem aqui.
- Não se preocupe - diz o Zeca - podemos dormir no celeiro. Nove meses
depois, Zeca recebe uma carta do advogado da viúva. Ele liga para o
Dinho e diz:
- Dinho, você lembra aquela viúva gostosa naquela fazenda onde nós passamos a noite há nove
meses?
- Lembro sim - responde Dinho.
- Você não teria ido no meio da noite para o quarto dela e transado?
- Bem... Tenho que confessar que sim.
- E você não teria por acaso dado o meu nome a ela ao invés do seu?
Dinho fica vermelho de vergonha e responde:
- Bem... é verdade!
Zeca responde:
- Então, muito obrigado! Ela acabou de morrer e deixou tudo para mimü
QUANDO É QUE UM HOMEM PERDE 90% DE SUA INTELIG Ê NCIA ?
Quando fica vi úvo!
E QUANDO É QUE ELE PERDE OS 10% RESTANTES ?
Quando morre o cachorro...
POR QUE AS ARANHAS VIÚVAS -NEGRAS MATAM O MACHO DEPOIS DA C ÓPULA? Para
acabar com o ronco antes que ele comece .
Anexos
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Mulher, mídia e movimentos culturais
Jandira Feghali
Deputada federal pelo PCdoB do Rio de Janeiro e coordenadora da bancada feminina no Congresso
Nacional
O movimento funk tem raízes histórias e conteúdo social, mas transformou-se em atração comercial
de gravadoras e televisões, que exploram e vulgarizam a imagem da mulher e colaboram com a
erotização infantil.
A recente polémica em torno da música funk reacendeu as atenções da sociedade e do movimento
feminista para a imagem da mulher, a repercussão sobre a sua vida cotidiana e, para ser mais concreta, a
erotização precoce das crianças.
Várias opiniões e dúvidas se expressaram nas diversas formas de comunicação, até mesmo os
cientistas sociais se dividem e por vezes trocam acusações de preconceito contra as camadas mais
populares, nas quais o funk criou raízes.
O antropólogo Hermano Vianna foi o primeiro a estudar e publicar opinião sobre o assunto com o seu
livro "O mundo funk carioca", já sensibilizado com as grandes festas do subúrbio carioca e com o
conteúdo das suas manifestações. Em matéria do caderno "Ideias" do Jornal do Brasil, em março deste
ano, a antropóloga Alba Zaluar diz: "O funk provoca uma separação brutal entre os sexos e acentua a
hipertrofia da sexualidade como forma de afirmação masculina". Já Micael Herschmann, professor de
comunicação, historiador e pesquisador do tema opina: "O funk já teve outros momentos de evidência,
assim como o axé e o sertanejo, faz parte de uma dinâmica cultural que tem articulação com o mercado.
Antes mostravam mais os raps das comunidades, hoje dão destaque ao humor com dimensão erótica",
realçando aí o enfoque da mídia.
O funk já teve outros momentos de evidência, assim como o axé e o sertanejo, faz parte de uma
dinâmica cultural que tem articulação com o mercado. Antes mostravam mais os raps das comunidades,
hoje dão destaque ao humor com dimensão erótica", realçando aí o enfoque da mídia.
Com suas origens na década de 30, no sul dos Estados Unidos, a partir da música negra, o funk sofreu
influências do rhvthm and blues, do gospel e do soul de crescente conteúdo reivindicatório. Já na década
de 60, com ritmo marcante e forte, surge com jeito próprio e novas técnicas de mixagem, e seus
representantes vão conformando expressões como o rapper (repentista) e o MC (mestre de cerimónias),
que misturam canto e fala nos bailes realizados em locais públicos e denunciam os problemas dos negros
nos guetos de Nova Iorque.
Surgem as músicas rap, o estilo hip hop e a dança break. No Brasil, nos anos 70 e 80, iniciam-se os
bailes de breve passagem pela zona sul e com instalação rápida e mobilizadora nos bairros do subúrbio e
zona oeste, com participação de milhares de jovens e com produção musical expressiva da realidade de
exclusão, como a música "eu só quero é ser feliz" de Claudinho/Doca, da Cidade de Deus.
Como destaca o relatório da CPI do Funk, da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro,
instalada para averiguar denúncias de violência, esses bailes passaram a representar quase que a única
forma de lazer dessa juventude carente e ainda diz "As ações do poder público, em geral, resumiram-se
à repressão e ao cerceamento de manifestação cultural deste segmento da juventude e da sociedade.
Como, por exemplo, nos anos 70, quando diversos promotores de baile adeptos do movimento black-rio
foram obrigados a prestar depoimentos aos órgãos oficiais de repressão, em virtude do carâterdas
mensagens difundidas nos bailes. Temas como liberdade, orgulho da raça negra, igualdade de
oportunidades para todas as raças ..."
Violência
A violência não pode ser analisada fora do contexto da vida desses jovens que, em favelas ou bairros
carentes, convivem com a violência do tráfico, da polícia e de casa. Dados recentes do índice de
Desenvolvimento Humano da Organização das Nações Unidas e de pesquisas da Secretaria de
Segurança do Rio mostram que hoje a maior causa de mortes entre pessoas de 1 5 a 24 anos é a arma
de fogo. Mas, apesar disso, dizem os estudiosos e frequentadores, a violência não é a marca
predominante das festas.
Modestamente, após a observação atenta de diversas opiniões e a participação em debates, quero
concordar com a legitimidade do funk como movimento cultural e que tem na sua história a expressão
maior da exclusão. Por isso, sim, vítima de preconceito e desprezo do poder público. No entanto, não
podemos retirar de uma análise mais abrangente o papel devastador da lógica de mercado, dos
Anexos
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interesses da mídia e da indústria fonográfica, para explicar as distorções mais recentes. Aí é onde
devemos concentrar nossas preocupações. O sambista Nei Lopes, segundo matéria publicada no "JB" em
março de 2001, considera que a comparação com a repressão sofrida pelo samba vale para o período em
que o funk estava restrito ao gueto e expressava a insatisfação das populações excluídas, gerando o
preconceito das classes dominantes. "Agora os funkeiros são brancos e chegam aos bailes em carro
importado. E como virou modismo de opinião, as gravadoras vão explorar até o bagaço".
Mesmo que não façamos a mesma generalização, este sentimento é gerado pela flagrante expansão do
funk para a classe média da zona sul carioca. Como se deu essa expansão quando a realidade social é
outra? Que tipo de artifícios foi utilizado? Que concessões foram feitas?
Tapinha
O funk cresce e se espalha utilizando uma face desfigurada e abjeta, mercantil, comercial, vulgarmente
erotizada, de massificacão de valores relativos às mulheres que negam e renegam uma história difícil e
corajosa de lutas e conquistas. A promiscuidade passa a ser sinónimo de modernidade, as mulheres
como brindes ou na dança das cadeiras aparentemente irreverentes. Soa natural, como deve soar a
violência contra elas, afinal, "um tapinha não dói". A feminilidade, a sensualidade, a beleza corporal ficam
como que nas prateleiras e restritas a bundas e peitos siliconados, anunciados em termos pejorativos. As
adolescentes são chamadas à vida como "tchutchucas", outras como "popozudas". As que namoram
todos são as "cachorras" e ainda têm as "preparadas e purpurinadas", se é que não me esqueci de mais
algum "adjetivo". As letras são reveladoras e, desculpe-me a ousadia, aqui as divulgo em parte:
A música do chamado Bonde do Tigr ão - A máquina do sexo, diz: "Máquina do sexo, eu transo igual a
animal/A Chatuba da Mesquita do bonde do sexo anal/Chatuba come eu, depois come xereca /
Rança cabaço, é o bonde dos careca ..."
Na música Barraco III: "Me chama de cachorra que eu faço au-au/Me chama de gatinha que eu faço
miau/Goza na cara, goza na boca, goza onde quiser..."e ainda na música Jonathan II, gravada por um
menino de sete anos!: "De segunda a sexta, esporro na escola / Sábado e domingo, eu solto pipa e jogo
bola/Mas já estou crescendo com muita emoção, eu já vou pegar um filé com popozão..." Ai que
saudade do Sítio do Pica-pau Amarelo...
É bem verdade que isso não ocorre apenas com o funk, vide os exemplos da Feiticeira, Tiazinha, É o
Tchan e a Boquinha da Garrafa. Este último, o criador de um exército de repetidores da dança
"sensualizada" entre as crianças, expostas inescrupulosamente em programas "infantis" de televisão no
período da tarde, é claro. É como se fosse uma derrota, acredito que momentânea, da perspectiva
saudável da nossa juventude.
O papel da mídia
O papel da mídia é, sem dúvida, o mais danoso e perigoso. Desconstrói valores, forma outros, influencia
comportamentos e gerações. Principalmente nos programas de TV. Usa o grotesco para identificar a
população na sua realidade e tragédia, ocupando generosos espaços e conquistando grandes
audiências.
No seminário promovido pela Rede Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos para tratar da relação do
movimento feminista com os meios de comunicação, um dos participantes, o professor Bernardo Kucinski,
do Departamento de Jornalismo da Escola de Comunicações e Artes da USP, situou com propriedade o
cretinismo jornalístico. Sem negar o auxílio do jornalismo investigativo, o papel de muitos articulistas,
cronistas, colunistas, da maior competência e seriedade, o humor inteligente e ferino dos chargistas,
interpreto o "cretinismo" como a corrida para ascensão acriteriosa, sensacionalista, que segue a linha
mercadológica, submete a verdadeira informação à compulsiva busca do furo jornalístico, sucumbe às
inverdades, à superficialidade, ao despreparo, à exposição de privacidade, à falta de ética. O erotismo
acompanhado da vulgarização feminina é parte integrante da visão hegemónica da comunicação e das
elites brasileiras.
Depois de assistir aos filmes "Cidadão Kane" e "O Quarto Poder" e ler livros como "Chato", todos os
impactos tornam-se mais compreensíveis, mas não menos indignantes. Homens e mulheres vão sendo
tragados pela mudança na concepção jornalística e não sabem como reverter este quadro. Nesta cena,
onde o espaço para alguns tópicos é garantido, o movimento de mulheres não encontra facilmente seu
espaço. Nossa ofensiva pela informação correta, coerente e esclarecida, não consegue competir com a
máquina das disputas por audiência.
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Um Alerta
Precisaríamos chegar ao ponto de abandonar os princípios que nortearam todas as nossas conquistas por
uma noticia às avessas? Não creio. Aqui vem a importância da coerência. Nem sempre a expressão de
nossas opiniões chega aos ouvidos da sociedade ou mesmo nossas ações conseguem atingir o mundo da
informação. Realizamos na ação política o confronto com as diversas formas de violência contra a mulher
e um imenso esforço para retirar as questões de género do obscurantismo e da marginalidade do debate.
Com esses gestos provocamos, muitas vezes, reações preconceituosas dos que insistem em manter as
questões femininas apenas no âmbito do espaço doméstico ou dos que tentam impedir o deslocamento
das mulheres das páginas dos periódicos dirigidos restritamente aos desejos masculinos, e tentam
perpetuar e lucrar com a imagem utilitária da mulher.
Essa realidade conflitante expõe o resultado ainda parcial das imensuráveis lutas contra a discriminação
e pela igualdade política e social que as mulheres travaram ao longo do século 20. Foram campanhas
com lemas "iguais, porém diferentes", que construíram uma nova imagem da mulher, a protagonista de
sua própria história, de seu papel de cidadã, da sua capacidade intelectual e de trabalho, do exercício de
sua afetividade e sexualidade.
Não podemos deixar que nosso protesto seja rotulado como censura. É um alerta para enfrentarmos
esse debate e não abaixarmos a cabeça à defesa pouco atenta do significado da liberdade de
expressão, que encontra na Constituição brasileira o conceito de liberdade, conjugado com a não
discriminação de género, raça e etnia, respeito aos valores da dignidade humana e dos direitos humanos
contra a violência. Não podemos aceitar que alguns, mesmo que poderosos, agridam o coletivo, sua
história e sua perspectiva futura, que quer negar a barbárie.
Estratégia
Os índices de violência contra a mulher no mundo são alarmantes. No Brasil, uma mulher é agredida,
em casa, a cada quatro minutos. Esta realidade exige ações efetivas que desestimulem e punam os
agressores e não o contrário. Cresce também o número de casos de gravidez na adolescência e
doenças sexualmente transmissíveis em mulheres. Isto exige informa ção, orientação e assistência.
A mulher e sua inserção na mídia devem ser resgatadas. Mas temos de ter uma estratégia. É um
desafio para o movimento feminista estudar a comunicação no mundo contemporâneo, suas
transformações, formular, contribuir para uma nova consciência democrática e de controle social sobre a
mídia impressa e radiodifusão, identificar as questões de género e inseri-las de forma adequada na
informação, enfrentar, em última análise, o monopólio do quarto poder.
O Conselho de Comunicação Social
Um importante instrumento para abrir o debate é o Conselho de Comunicação Social, antiga
reivindicação do Movimento pela Democratização dos Meios de Comunicação já aprovada em lei,
pasmem, desde 1991, ou seja, há dez anos!
Como fórum, ainda consultivo, tem em sua composição representações de governo, empresas de
comunicação e da sociedade civil e tem como uma das finalidades principais trabalhar diretrizes para a
programação do rádio e televisão. Subsidiados pela Carta Magna e por leis infra-constitucionais como o
Estatuto da Criança e do Adolescente, seus integrantes, entre os quais devemos lutar pela
representação do movimento feminista, terão a importante missão de debater o conteúdo da
programação e é essencial que estejam em destaque as questões de género, raça e educacionais.
A instalação desse Conselho faz parte, hoje, de uma luta iniciada com o presidente da Câmara dos
Deputados e do Senado Federal e o movimento de mulheres já vai se integrando para exercer a sua
competente pressão política. Essa conquista, apesar de seus limites, pode ser um importante
instrumento da sociedade.
Queremos valorizar nossa cultura rica e plural, garantir que mulheres e homens sejam respeitados em
seus papéis históricos, reacender nossa esperança de que devemos e podemos transformar.
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ANEXO F - Roteiro para entrevista semi-estruturada
I. Nome
2. Idade
3. Qual o bairro em que mora?
4. Qual foi a idade em que ficou viúva.
5. Fale como foi ter ficado viúva.
6. A senhora usou luto?
7. Fale um pouco de seu casamento.
8. Quais atividades a senhora realiza relacionadas ou não a terceira Idade .
9. No que a religião auxiliou a senhora quando da morte do seu marido.
10. Para a senhora as mulheres que ficam viúvas tem sofrido discriminação.
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ANEXO G - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Termo de Consentimento
Título da Pesquisa: Das mulheres de preto ao colorido das mulheres. O que será
o amanhâ?
Pesquisador responsável: Maria Luísa Barca Gazetta
Local da pesquisa: Domicílio das entrevistadas ou salas do Programa ConViver
Objetivo: Conhecer como a mulher no processo de envelhecimento após tornarse viúva desenvolveu sua sociabilidade
Método: Depoimento Oral
lnstrumento:Entrevista
Duração. Aproximadamente 60 minutos.
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
NOME: ____________________________________________________________
ENDEREÇO: _______________________________________________RG.:
________________________________________________________
Tendo sido devidamente esclarecido sobre todos os aspectos que
envolvem o trabalho de pesquisa acima descrito, venho pelo presente
termo declarar, nos termos que dispõem a Resolução 196/96 do Conselho
Nacional de Saúde, que concordo em participar, voluntariamente, como
sujeito de pesquisa Declaro ainda, estar ciente de que minha participação
será gratuita e de que os resultados serão utilizados e publicados, a critério
exclusivo da pesquisadora, desde que preservada integralmente a
identidade dos sujeitos participantes. Desde já me reservo o direito de a
qualquer momento, durante a realização da pesquisa, tornar sem efeito o
presente consentimento. O presente esta sendo assinado em duas vias de
igual teor.
de
de 2005
Passos,
_______________________________________
Assinatura do participante ou responsável legal
________________________________________________
Assinatura do pesquisador responsável
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Texto - UNESP