ANAIS MODELO DE ANÁLISE DA CAPACIDADE DOS PORTAIS ELETRÔNICOS DE CÂMARAS MUNICIPAIS EM CONSTRUIR CONDIÇÕES PARA A ACCOUNTABILITY FABIANO MAURY RAUPP ( [email protected] , [email protected] ) UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA - UDESC Resumo O objetivo do artigo consistiu em propor um modelo de análise da capacidade dos portais eletrônicos de câmaras municipais em construir condições para a accountability. Trata-se de um estudo avaliativo e exploratório, realizado por meio de estudo de casos, com abordagem qualitativa. A partir dos indicadores de prestação de contas, transparência e participação, identificados em trabalhos de diversos autores (AKUTSU, 2002; AKUTSU; PINHO, 2002; DINIZ, 2000; MORAES, 2004; PRADO, 2004), bem como nos portais das câmaras municipais localizadas nas 10 capitais brasileiras com o maior número de habitantes, estruturou-se um modelo de análise considerando diferentes níveis de capacidade. Palavras-chave: modelo de análise; portais eletrônicos; câmaras municipais; accountability. 1 Considerações Iniciais O termo accountability tem sido um dos mais citados na agenda política de diferentes países. Coloca-se em discussão o desenvolvimento de formas não eleitorais de accountability; as falhas e os acertos da accountability democrática; maneiras de amenizar as falhas e de aperfeiçoar os acertos; bem como a inserção do conceito na sociedade em termos culturais (MAINWARING, 2003). Mesmo a accountability representando um processo em construção na sociedade brasileira, não dando para esperar mudanças radicais nos processos e nas formas políticas, já povoa artigos sobre a construção democrática no Brasil (PINHO, 2006). O desenvolvimento democrático requer instrumentos que possam aproximar cidadãos e governantes. Entende-se que a internet pode oportunizar essa aproximação na medida em que a exclusão digital seja reduzida sensivelmente. Borges (2005) entende que a internet representa um contexto de múltiplas oportunidades, porém essa é uma realidade que ainda não está disponível para todos. Cunha e Santos (2005) destacam que itens da agenda da sociedade da informação estão entrando na pauta do debate legislativo. A emergência de temas como a Lei de Responsabilidade Fiscal, mesmo na esfera local, confirma o legislativo municipal como particularmente interessante a pesquisar. Ao avançarem as câmaras municipais no uso dos meios eletrônicos, cabe verificar se o relacionamento entre executivo e legislativo se amplia, bem como se o potencial dos meios eletrônicos para a participação do cidadão no trabalho do legislador ainda está por ser descoberto, ou se a participação do cidadão não é uma característica do trabalho do legislador. A investigação de sites governamentais torna-se importante para o entendimento do foco das políticas de governo eletrônico e do estágio de evolução em que se encontram os governos. A eficácia das ações propostas em programas de governo eletrônico fica 1/16 ANAIS evidentemente demonstrada pelos resultados obtidos na observação dos sites governamentais em cada país (DINIZ, BARBOSA, 2004). Dependendo dos objetivos e da forma com que são implementados, os portais eletrônicos podem contribuir para a construção da accountability. Evidentemente, corre-se o risco, quando da criação de um portal eletrônico, de que não haja transparência, prestação de contas e participação com os cidadãos, dimensões da accountability analisadas no estudo, e que o mesmo possa servir apenas de mural eletrônico. O objetivo do artigo consiste em propor um modelo de análise da capacidade dos portais eletrônicos de câmaras municipais em construir condições para a accountability. Inicialmente fez-se uma breve incursão teórica nos corpos teóricos entendidos como necessários para o enquadramento do objeto empírico. Em seguida apresenta-se o método de pesquisa. Na sequência procede-se à descrição do modelo construído. Por fim, são inferidas as considerações finais. 2 Fundamentos Teóricos 2.1 Municípios brasileiros Para o entendimento do atual contexto dos municípios brasileiros, denota-se a importância da sua inserção em uma análise histórica dos diferentes textos constitucionais brasileiros que se sucederam. Recorremos, para tanto, à obra de Victor Nunes Leal para realizar esse breve retrospecto. No período colonial, pela falta de uma clara definição na separação dos poderes, era comum a união do executivo, legislativo e judiciário sob a mesma responsabilidade. Com a Constituição de 1824 houve a separação entre as funções administrativas e judiciais do Estado. Se por um lado essa medida importava num melhor arranjo organizacional para o serviço público em geral, para os municípios significou uma perda de autonomia, pois a Constituição deixou claro seu caráter meramente administrativo. A proclamação da República, ao contrário das expectativas e intenções, na prática pouco alterou a autonomia e atribuições municipais com a Constituição de 1891. Já a Constituição de 1934 adotou, pelo menos na letra, uma postura mais favorável à autonomia e atribuições municipais. O município continuou tendo sua autonomia submetida à vontade das Constituições estaduais, mas pela primeira vez uma constituição buscou garantir a eletividade do prefeito. Os parcos e inoperantes ganhos dos municípios na Constituição de 1934 pouco duraram. Com o golpe do Estado Novo, a Constituição de 1937 tratou de impor aos municípios um controle mais amplo e rígido, perdendo a autonomia de elegerem os prefeitos. Com a Constituição de 1946 a autonomia dos municípios foi garantida: pela eleição do prefeito e dos vereadores; pela administração própria, no que concerne ao seu peculiar interesse, salvo as exceções das capitais, estâncias hidrominerais e áreas de excepcional importância para a defesa externa do país. Na Constituição de 1967 uma autonomia aparente é mantida no texto constitucional, garantindo a eleição dos demais prefeitos e câmaras municipais bem como de suas competências básicas. Porém, é a Constituição de 1988 que promove grandes mudanças no que diz respeito à situação dos municípios em termos de autonomia, atribuições e receitas. No campo acadêmico, Celina Souza (1996) faz uma breve retrospectiva sobre o desenvolvimento das municipalidades e afirma que muitos estudos trataram do papel histórico do governo e da política locais, mas poucos consideraram sua posição nos anos recentes. Para Celina Souza, esses estudos podem ser agrupados em três conjuntos. O primeiro grupo enfatiza a hegemonia da política local e dos grupos privados na estrutura de poder do Brasil. Alinham-se, nesse grupo, os trabalhos de Nestor Duarte (1939), Gilberto Freyre (1964), Oliveira Vianna (1949), Maria Isaura Queiroz (1976) e Victor Nunes Leal (1949). O segundo 2/16 ANAIS grupo assume que o governo central sempre desempenhou o papel principal na política brasileira. O maior expoente desse grupo é o trabalho, também clássico, de Raymundo Faoro (1958). Nos anos 80, uma posição intermediária foi assumida por um terceiro grupo, representado pelos trabalhos de Ames (1987), Bursztyn (1985), Medeiros (1986) e Schwartzman (1988), que concluíram uma forte interdependência entre o nível local e central geradora de uma mútua legitimidade. Argumenta-se, todavia, que essa interdependência, apropriadamente identificada pelos estudos que integram o terceiro grupo, deve ser agora relativizada. A relação entre a esfera federal e as subnacionais mudou com a nova correlação de forças promovida pela democratização e pela descentralização. Durante os anos 80, os municípios passaram a desempenhar um papel de destaque na Federação brasileira. A luta dos governos subnacionais pela descentralização tributária iniciou-se no final dos anos 70, com a emergência da crise econômica e com o processo de redemocratização do país. Os principais beneficiários da descentralização tributária foram os municípios, que ampliaram sua participação na receita disponível (consideradas as transferências intergovernamentais) de 9%, em 1980, para 15% em 1994. A evolução da participação da receita própria dos governos municipais no mesmo período (de 3% para 5%) evidencia que a ampliação da sua participação no bolo fiscal decorreu, principalmente, das transferências federais. Em virtude da ampliação da capacidade financeira dos governos subnacionais, aumentou significativamente a sua participação na despesa pública (AFFONSO, 1996). Diante desse novo cenário, os municípios passaram a enfrentar um duplo desafio: precisam assumir políticas antes a cargo da União ou, secundariamente, dos estados, para assegurar condições mínimas de bem-estar social às suas populações (função de Welfare) e para promover o desenvolvimento econômico com base em ações de âmbito local, o que envolve o estabelecimento de um novo tipo de relacionamento com o setor privado (função desenvolvimentista) (ABRUCIO, COUTO, 1996). O federalismo brasileiro é especial no quadro mundial porque, aqui, os municípios são entes federativos, com autonomia política, administrativa e financeira e com competências constitucionais e infraconstitucionais bem estabelecidas, e apresentam, entre si, à semelhança do País como um todo, altíssimos diferenciais de tamanho, de população e de desigualdades socioeconômicas (SILVA e MENDES, 2004). Há, porém, uma visão crítica das possibilidades da descentralização além das reais possibilidades do município se constituir em agente do desenvolvimento econômico e político (PINHO e SANTANA, 2000). Na operacionalização do sistema político, duas características podem ser apontadas. Primeiro, os políticos locais têm escasso controle sobre os destinos da cidade, seja porque são prisioneiros de outras instituições, seja porque a população local é tão pobre que a única política possível é a de prover os eleitores com os meios de sobrevivência. Segundo, a política é vista pela população como pertencendo ao território do estado, mas, ao mesmo tempo, a população espera que os políticos locais resolvam seus problemas de desemprego e pobreza. Essas características reforçam o argumento de que os políticos locais têm poucas chances de atuarem como líderes definidores e implementadores de uma agenda política local própria (SOUZA, 1996). Para Allebrandt (2002), especialmente nos municípios de porte pequeno e médio – no Brasil, no universo de 5.564 municípios, 72% possuem menos de 20 mil habitantes – as exigências pelo atendimento das demandas comunitárias são cobradas mais incessantemente, eis que os cidadãos estão mais próximos dos governantes responsáveis pelas políticas públicas de nível local. Os municípios configurados por uma circunscrição na qual as pessoas mantêm o principal chão das suas relações, conformam o espaço federativo imediato em que se materializam as exigências sociais decorrentes da vida comunitária e, dessa forma, as pressões 3/16 ANAIS do ambiente são sensivelmente incidentes sobre este ente que representa o espaço que primeiro necessita a presença do Estado. Joffre Neto (2003) confirmou alguns desses dados por meio de pesquisa empírica, os quais também evidenciam que o Brasil é um país de pequenos municípios. Se de um lado, apenas 13 municípios acima de um milhão de habitantes, equivalente a 0,2% do total, perfazem mais de um quinto do eleitorado (equivalentes a 20,6%), de outro, 73,1% dos municípios têm, no máximo, 20.000 habitantes, acumulando, de sua vez, 21,2% dos eleitores brasileiros. Mas não é só, os micro- municípios, com até 5.000 habitantes, são quase um quarto do total dos municípios (24,1%). 2.2 Especificidade do governo local: executivo forte e legislativo fraco As estruturas governamentais na América Latina apresentam características e tendências importantes: carência de autoridade regional; existência de prefeitos fortes e vereadores fracos; partidarismo; sobreposição de burocracia ao invés da interligação delas; pressões a favor da privatização dos serviços municipais, além da contínua tensão entre a iniciativa privada e o poder público; maior autonomia fiscal; contínua marginalização da participação pública no governo. Apesar dessas características, muitas cidades (a despeito de seu tamanho e localização) estão se esforçando para desenvolver estruturas de governo mais eficazes, responsáveis e democráticas (WARD, 1996). Uma característica comum dos governos locais na maioria das grandes cidades latinoamericanas é o poder do executivo em relação ao legislativo. O prefeito tem a maioria das rédeas do poder (WARD, 1996). O Estado brasileiro compartilha estas características já que o governo municipal brasileiro é constituído por um executivo forte (o prefeito) e um legislativo (câmara municipal, constituída de vereadores), ambos eleitos pelo povo (assim como o viceprefeito). A independência dos dois poderes – o executivo e o legislativo –, torna-os obedientes apenas à lei e à justiça. Outra característica marcante é a ausência de controle prévio dos atos municipais pelas esferas superiores de governo. Os municípios estão sujeitos ao controle interno pela Câmara Municipal (controle dos atos dos prefeitos) e ao controle externo das contas municipais pelos tribunais de contas dos estados (MELLO, 2001). Couto e Abrucio (1995) entendem que, apesar de as condições institucionais do funcionamento do Legislativo terem sido modificadas pela Constituição Federal de 1988, devolvendo aos parlamentares várias prerrogativas que lhes havia sido retiradas pelo regime militar, não foram criados incentivos para que os parlamentares tenham um comportamento propositivo em seu relacionamento com o Executivo. Apesar das inúmeras mudanças na Constituição e da enorme transformação da sociedade brasileira, continuam sendo utilizadas na análise do legislativo municipal as mesmas referências que serviram para contar a história político- institucional do país de décadas anteriores (KERBAUY, 2005). É comum na literatura política brasileira dar relevo às limitações do Poder Legislativo municipal, no que tange às possibilidades de tomada de decisões políticas, principalmente a baixa capacidade de legislar das câmaras municipais, que ficaram amarradas às prerrogativas legais estabelecidas pela Lei Orgânica dos Municípios, impossibilitando o Legislativo municipal de elaborar leis que envolviam gastos, enquanto se garantia ao Executivo a primazia incontestável no processo decisório. Eram mínimas as atribuições legislativas das câmaras, face à possibilidade quase ilimitada do Executivo de comandar o processo decisório. A prerrogativa de legisla r do Executivo, regulamentada por lei, era a evidência mais clara da perda das funções clássicas do órgão Legislativo (Idem, 2005). Apesar de o Legislativo representar um foro de decisões políticas nos interstícios eleitorais – ainda que esta importância seja mais visível na lei do que na concretude do jogo político – os mecanismos de controle e participação social estão majoritariamente voltados 4/16 ANAIS para o Executivo, como atestam os conselhos gestores de políticas públicas e a experiência do orçamento particip ativo (ZANI, 2009). Toda esta realidade acaba se abatendo sobre a pesquisa no campo legislativo. Os poucos estudos realizados sobre o legislativo municipal apontam para a manutenção de suas características seculares, relacionadas à baixa capacidade de legislar e a uma atuação fraca diante de um executivo forte. Vários fatores internos e externos serviriam para explicar esta atuação, que não sofreu alterações apesar de mudanças nos arranjos institucionais locais, no aumento da circulação da informação e na criação de mecanismos de interlocução com a sociedade civil (KERBAUY, 2005). A obtenção de maioria na Câmara é uma condição necessária, porém insuficiente para que o prefeito aprove as medidas que pretende implementar. Se os parlamentares sofrerem uma pressão muito grande de suas bases no sentido de vetar determinada política, dificilmente essa política logrará êxito. Torna-se necessária também a institucionalização de formas de negociação que incorporem diretamente à discussão os setores a serem atingidos pelas políticas municipais, não apenas para que não ocorra o seu veto às políticas de incremento tributário, mas também para incorporar sua contribuição à designação e à formulação das políticas públicas que serão encampadas pelo município (ABRUCIO, COUTO, 1996). Há um alheamento dos legislativos de suas funções constitucionais de legislar e fiscalizar o executivo e uma concordância tácita das câmaras em se subordinarem à Prefeitura. Culturalmente, a população e grande parte dos próprios vereadores consideram o Legislativo como auxiliar do Executivo e, portanto, dispensado de suas funções constitucionais de legislar e fiscalizar (JOFFRE NETO, 2003). Joffre Neto pesquisou vereadores de pequenos municípios (entre 5 e 20 mil habitantes) e identificou que suas atividades predominantes não se concentram na dimensão políticoinstitucional (legislativa; fiscalizadora e de controle; deliberativa; integradora e mobilizadora) mas nos aspectos assistenciais: transporte de doentes para hospitais de cidades maiores, intermediação de consultas médicas, assistência financeira direta, entre outras atividades. Em 112 Municípios das regiões Nordeste e Sudeste, apenas 4,46% dos vereadores consideram a atividade legislativa como a sua principal atividade, enquanto 60,71% dão prioridade ao assistencialismo. A principal razão apontada pelos próprios vereadores foi o anonimato da atividade legislativa, pois esta não rende dividendos políticos. A relação custo / benefício (político) é desfavorável ao vereador dedicado à atividade le gislativa: todo o trabalho de estudo e pesquisa, elaboração do texto legal e persuasão dos pares fica ignorado quando a norma é aprovada (Idem, 2003). O processo decisório no âmbito municipal se configura, nas pequenas e médias cidades, bastante centralizado no Poder Executivo e na conseqüente fraqueza do Legislativo, uma forma de “executivismo” (ultrapresidencialismo), similar ao que ocorre nos governos estaduais. Já nas capitais e grandes cidades, ao mesmo tempo em que não há o ultrapresidencialismo, como no âmbito estadual, o parlamento também não tem um grande poder de veto, diferente do que ocorre no Congresso Nacional (COUTO e ABRUCIO, 1995). A hipertrofia do Executivo não ocorre nas capitais e grandes cidades por três motivos: primeiro, em comparação com as pequenas cidades, em função da maior complexidade social traduzida num aumento dos conflitos de interesses capazes de se articular com maior autonomia perante o poder público; segundo, em comparação com o poder estadual, devido a uma maior visibilidade das políticas municipais frente aos cidadãos, seja porque as competências são mais visíveis e tangíveis para a população; e, terceiro, pelo fato de os vereadores não contarem, tal qual os deputados estaduais, com concorrentes pela destinação de recursos públicos (Idem, 1995). 5/16 ANAIS 2.3 Accountability O conceito de accountability não possui uma expressão equivalente em português que contemple o espectro de significados existentes no termo em inglês. A ausência do conceito de accountability no Brasil decorre da sua pobreza política, uma vez que as pessoas optam por esperar que o Estado defenda e proteja os interesses não organizados, ao invés de atuar na organização para agregação de seus próprios interesses, ou para enfrentamento do poder do Estado (CAMPOS, 1990). Não haverá condição para a accountability enquanto o povo se definir como tutelado e o Estado como tutor, típica característica de uma democracia delegativa. É praticamente um lugar-comum, conforme Miguel (2005), observar que accountability não possui tradução precisa para o português (e para outras línguas neolatinas) e, daí, extrair conjecturas sobre a qualidade de nossas democracias. Ceneviva (2006) faz um balanço teórico das principais discussões acerca desta temática. Primeiramente, a gênese da noção de accountability é bastante discutida. Uma segunda pendência teórica entre os autores que se debruçaram sobre o tema refere-se ao objeto dos mecanismos de accountability. Uma terceira fonte de discordância analítica referese à capacidade de sanção por parte dos mecanismos e agentes de accountability. Uma quarta área de disputa conceitual relaciona-se à discussão da restrição dos mecanismos de accountability àqueles adequados às relações de tipo: agente – principal. Um quinto campo de discussão refere-se a quais atores podem exercer o papel de agentes de accountability. Somente a partir da organização de cidadãos vigilantes e conscientes de seus direitos haverá condição para a accountability. Não haverá tal condição enquanto o povo se definir como tutelado e o Estado como tutor. O alto grau de preocupação com accountability na democracia norte-americana e a virtual ausência desse conceito no Brasil estão relacionados ao elo entre accountability e cidadania organizada; explica-se pela diferença no estágio de desenvolvimento político dos dois países (CAMPOS, 1990). Uma noção restrita de accountability considera somente os mecanismos de controle formalizados e institucionalizados como capazes de exigir a responsabilização dos agentes públicos pelos atos praticados. Neste escopo, mecanismos informais como o controle exercido pela imprensa e pela sociedade civil não são considerados (O’DONNELL, 1998; KENNEY, 2003). Uma noção mais abrangente de accountability considera, além dos mecanismos formais e institucionalizados, mecanismos informais, desde que haja capacidade de sanção dos agentes públicos por parte das relações desenvolvidas a partir dos mecanismos. O exercício da accountability requer capacidade de resposta dos agentes públicos (capacidade de informar sobre os atos) e capacidade de impor sanções e perda de poder para aqueles que violaram os deveres (capacidade de punição) (DUNN, 1999). A noção mais ampla de accountability admite toda e qualquer relação de controle e monitoramento sobre agentes públicos como mecanismos capazes de exigir a responsabilização (DAY, KLEIN, 1987; PAUL, 1991). Accountability significa manter indivíduos e organizações passíveis de serem responsabilizados pelo seu desempenho. A accountability pública se refere ao conjunto de mecanismos usados pelos atores interessados em garantir um nível desejado de desempenho dos serviços públicos (PAUL, 1991). A accountability, em termos sintéticos e aproximativos, pode ser pensada como a transparência, o engajamento dos governantes com a prestação de contas, e também a responsabilização dos governantes pelos seus atos (PINHO e SACRAMENTO, 2008). O conceito de accountability, conforme Akutsu e Pinho (2002, p.731), contempla duas partes: “a primeira delega responsabilidade para que a segunda proceda à gestão dos recursos; ao mesmo tempo, gera a obrigação daquele que administra os recursos de prestar contas de sua gestão, demonstrando o bom uso desses recursos”. 6/16 ANAIS Loureiro e Abrucio (2004, p.52) entendem por “accountability ou responsabilização um processo institucionalizado de controle político estendido no tempo (eleição e mandato) e no qual devem participar, de um modo ou de outro, os cidadãos organizados politicamente”. Destacam ainda a necessidade de regras e arenas nas quais a accountability pode ser exercida, bem como práticas de negociação ampliadas entre os atores, a fim de tornar mais públicas e legítimas as decisões tomadas. O conceito de accountability tornou-se parte dos discursos políticos, porém pouco se sabe sobre ele. Faz-se necessário, então, lembrar que, ao atuar na esfera pública de governo, é preciso ter a preocupação com os mecanismos que a sociedade tem disponíveis para a cobrança ou a responsabilização dos agentes na ação estatal, o que se pode chamar de cidadania (BARACCHINI, 2002). Campos (1990) afirma que a accountability começou a ser entendida como questão de democracia, ou seja, quanto mais avançado o estágio democrático, maior o interesse pela accountability. A accountability governamental tende a acompanhar o avanço de valores democráticos, tais como igualdade, dignidade humana, participação, representatividade. A própria perspectiva patrimonialista, que confunde o patrimônio público com o do indivíduo ou de sua família, ou, ainda, de uma visão corporativista, que confunde o patrimônio do Estado com o dos grupos de interesse corporativamente organizados, faz emergir o conceito de accountability (BRESSER PEREIRA, 1997). A accountability não emerge por si só, mas é determinada por uma relação entre o Estado e a sociedade, propiciada pelo desenvolvimento democrático. É resultado de um desenvolvimento político que confere ao cidadão um papel ativo de sujeito, guardião de seus direitos (CAMPOS, 1990). A accountability não é um predicado dos sujeitos, ao contrário, é um atributo do sistema político que se impõe aos agentes públicos, sejam estes governantes ou burocratas (CENEVIVA e FARAH, 2006). O estudo da accountability envolve a análise de diferentes mecanismos institucionais de responsabilização. Para O’Donnell, estes mecanismos (dimensões) são divididos em duas vertentes principais. A primeira é a accountability vertical, tendo nas eleições o instrumento principal, possibilitando a efetivação de mecanismos tradicionais como a premiação e o castigo. A segunda é a accountability horizontal, contemplando o tema da divisão dos poderes e dos controles e equilíbrios entre eles (O’DONNELL, 1998). Na primeira, os cidadãos eleitores podem controlar as ações desempenhadas pelo representante durante seu mandato. Na segunda, os poderes possuem mecanismos capazes de questionar, e eventualmente punir, maneiras impróprias de o ocupante do cargo em questão cumprir suas responsabilidades. Enquanto a accountability vertical pressupõe uma ação entre desiguais (cidadãos e representantes), a accountability horizontal pressupõe uma relação entre iguais (os poderes constituídos) (O’DONNELL, 1991). Tanto do ponto de vista vertical quanto horizontal, o exercício da accountability requer condições para que haja a disponibilidade de informações sobre a atuação do poder público e seus resultados, ou seja, prestação de contas. Contudo, torna-se relevante a existência de instituições que possam contestar as informações veiculadas (PÓ e ABRUCIO, 2006). A prestação de constas como dimensão da accountability, segundo Levy (1999), refere-se não somente à premissa da prestação de contas, mas também à definição dos objetos sobre os quais se prestarão contas. Outro processo capaz de proporcionar maiores condições de confiança entre governantes e governados é a transparência das ações governamentais. A transparência é citada como capaz de contribuir para reduzir a corrupção no espaço público e de tornar as relações entre o Estado e a sociedade civil mais democráticas (PINHO e SACRAMENTO, 2004). A transparência governamental é uma condição sine qua non para o funcionamento 7/16 ANAIS dos mecanismos de responsabilização, já que, de fato, esses mecanismos de controle e fiscalização são extremamente condicionados pela transparência e pela visibilidade das ações do poder público. Sem transparência, fidedignidade e clareza das informações não há como cidadãos apropriarem-se dos dados das avaliações para cobrarem dos agentes públicos (CENEVIVA e FARAH, 2006). A participação/interação dos cidadãos no processo decisório do ente governamental é tão importante quanto a prestação de contas e a transparência. Santos (1993) observa no Brasil uma enorme massa urbanizada, incapaz de participação ou desmotivada para isso, além de uma baixa taxa de demandas, do descrédito tanto nas instituições quanto na eficácia do Estado, bem como uma permanente negação de conflito. Nessa mesma linha, Pinho (2008) considera que o Brasil estaria numa situação de fraca accountability, em que não há participação por parte da sociedade, no sentido de exigir maior transparência do Estado, o qual se comporta de acordo com um modelo histórico de insulamento em relação à sociedade civil. Por sua vez, Abrucio (2005) afirma que é notável o grau de participação dos cidadãos nas políticas sociais. Torna-se necessário ativar esse processo onde ele tem maior incidência, isto é, no plano descentralizado de poder. A questão da participação parece tornar-se central no sentido do aperfeiçoamento da democracia e da accountability. No entanto, não há consenso entre os autores sobre essa questão. Assim, enquanto Santos e Pinho afirmam que não há participação, Abrucio traça um quadro em que a participação tem aumentado. 2.4 Sociedade da informação e democracia digital A sociedade da informação é hoje a denominação mais usual para indicar o conjunto de impactos e conseqüências sociais das novas tecnologias da informação e da comunicação (SORJ, 2003). A Sociedade da Informação pode ser caracterizada pelo seu estilo sistêmico, tendo como destaque ser: complexa, graças a seu número de interações, articulação e interdependência entre os elementos de um sistema presente em uma situação; hierárquica, já que parte de estruturas mais simples para estruturas mais complexas; e configurada, em virtude de suas dimensões macro e microscópicas (BORGES, 2000). A sociedade da informação já fora há muito anunciada por Bell (1977), no qual a sociedade pós- industrial é uma sociedade de informação, assim como a sociedade industrial é uma sociedade de produção de bens. A sociedade pós- industrial representa o aparecimento de novas estruturas e princípios axiais: uma sociedade produtora de bens transformada em sociedade de informação, ou erudita. A sociedade da informação é engendrada no encontro da tecnologia computacional com a tecnologia das telecomunicações. A velocidade de produção, distribuição e disseminação da informação atinge patamares antes não alcançados (CASTELLS, 2000). Um dos principais indicadores do desenvolvimento da sociedade da informação é a penetrabilidade das tecnologias de informação e comunicação – TICs na vida diária das pessoas e no funcionamento e transformação da sociedade como um todo. Outro indicador fundamental da sociedade da informação, que complementa a penetrabilidade das tecnologias de informação, constitui o nível de operação ubíqua, em um determinado contexto, de recursos, produtos e serviços de informação na internet por parte dos seus usuários, representando indivíduos, governos e as mais diferentes organizações sociais de caráter público ou privado. Esta operação ubíqua representa a consecução de inovações muitas vezes radicais no funcionamento da sociedade atual, especialmente nas atividades e processos que requerem o acesso à informação (MIRANDA, 2000). Dentre as TICs, Castells (2003) afirma que a internet representa um instrumento com grande potencial para promover a democracia. A interatividade torna possível aos cidadãos solicitar informações, expressar opiniões e pedir respostas pessoais a seus representantes. A 8/16 ANAIS idéia de participação da cidadania entendida como ocupação civil da esfera política encontra na internet as possibilidades técnicas e ideológicas da realização de um ideal de condução popular e direta dos negócios públicos (GOMES, 2005). Quase toda a literatura sobre democracia digital reconhece a potencialidade comunicativa das TICs (principalmente a interação em larga escala). Esta possibilidade tecnológica de interação horizontal em massa estaria apta a interferir na relação do cidadão com seu respectivo governo, o que repercutiria em mudanças no modo de operação da política contemporânea (SILVA, 2005). A experiência da internet é vista, ao mesmo tempo, como inspiração para formas de participação política protagonizada pela esfera civil e como demonstração de que há efetivamente formas e meios para a participação popular na vida pública. A “democracia digital” (e outros verbetes concorrentes democracia eletrônica, e-democracy, democracia virtual, ciberdemocracia, dentre outras) é, neste sentido, um expediente semântico empregado para referir-se à experiência da internet e de dispositivos que lhe são compatíveis, todos eles voltados para o incremento das potencialidades de participação civil na condução dos negócios públicos (GOMES, 2005). No contexto da democracia digital, os estudos e reflexões sobre o governo eletrônico têm maior recorrência com o poder executivo. Contudo, o material teórico e empírico pode ser utilizado também em pesquisas com o poder legislativo, resguardadas as especificidades de cada poder. Para Ruediger (2002), o governo eletrônico, apesar de marcado pelo desenvolvimento de sistemas relativos ao provimento de serviços, contempla uma possibilidade de extensão da esfera do Estado propícia a uma maior permeabilidade à cidadania, decorrente do caráter intrínseco na atividade de governo do componente político de sua ação. Em termos gerais, pode-se pensar nas seguintes relações sustentadas pelo governo eletrônico: 1) aplicações web com foco para o segmento governo-fornecedor (G2B – Government to Business); 2) aplicações web voltadas para a relação governo-cidadão (G2C – Government to Costumer); e 3) aplicações web referentes a estratégias governo- governo (G2G – Government to Government). O governo eletrônico, além de promover essas relações em tempo real e de forma eficiente, pode ser potencializador de boas práticas de governança e catalisador de uma mudança profunda nas estruturas de governo, proporcionando mais eficiência, transparência e desenvolvimento. Pinho (2008) enfatiza que o governo eletrônico, representado pela informatização de suas atividades internas e pela comunicação com o público externo: cidadãos, fornecedores, empresas, ou outros setores do governo e da sociedade, tem sido representado pela construção de portais governamentais, por intermédio dos quais os governos mostram sua identidade, seus propósitos, suas realizações, possibilitam a concentração e disponibilização de serviços e informações, o que facilita a realização de negócios e o acesso à identificação das necessidades dos cidadãos. Um portal pode assumir a configuração de sites púb licos que permitem ao cidadão realizar um conjunto de serviço. A partir do portal, muitos usuários definem seus próximos passos na Web. Os portais representam locais de intensa visitação. Portanto, ser reconhecido como um portal está diretamente relacionado à força com que o site atrai visitantes. Os serviços mais comuns de um portal incluem serviços de e-mail, bate-papo (chat), serviços de busca e serviços de notícias, gratuitos ou não (CUNHA, 2000). Com as mudanças de postura impostas por novos paradigmas administrativos e em especial a emergência da utilização da TIC, que impulsionou o legislativo como agente de accountability, o legislativo brasileiro precisou buscar novas ferramentas que pudessem facilitar e melhorar o bom desempenho de suas atribuições. Não obstante, o legislativo também teve que adotar ferramentas informacionais que o executivo já vinha utilizando, cujo 9/16 ANAIS conjunto configurara o chamado e-gov ou governo eletrônico. No âmbito do Poder Legislativo essa ferramenta foi denominada de e- legisla tivo (ZURRA, CARVALHO, 2008). 3 Métodos e Procedimentos A pesquisa realizada para propor um modelo de análise da capacidade dos portais eletrônicos de câmaras municipais em construir condições para a accountability é de cunho avaliativo e exploratório, realizada por meio de estudo de casos múltiplos, com abordagem predominantemente qualitativa. Optou-se, primeiramente, pela investigação de experiências anteriores de diversos autores e instituições (AKUTSU, 2002; AKUTSU; PINHO, 2002; DINIZ, 2000; MORAES, 2004; PRADO, 2004) que pesquisaram portais eletrônicos. Em seguida, foram analisados os portais eletrônicos das câmaras municipais localizadas nas 10 capitais brasileiras com o maior número de habitantes. Assume-se aqui o pressuposto de que, pelo porte populacional, esses municípios devem ter suas câmaras com maiores condições (financeiras, recursos humanos) de construir portais mais desenvolvidos contemplando inclusive o quesito da accountability. Assume-se também que deve haver nesses municípios maiores, com a existência de uma sociedade mais complexa e plural, a busca de maior cobrança aos poderes instituídos, entre eles o Legislativo municipal, por parte da sociedade civil. As capitais selecionadas, o porte populacional e o endereço eletrônico das câmaras municipais são apresentados no quadro 1. Estado Capitais Brasileiras População Site da Câmara Municipal Bahia Salvador 2.892.625 http://www.cms.ba.gov.br/ Ceará Fortaleza 2.431.415 http://www.cmfor.ce.gov.br/ Goiás Goiânia 1.244.645 http://www.camaragyn.go.gov.br/ Minas Gerais Belo Horizonte 2.412.937 http://www.cmbh.mg.gov.br/ Pará Belém 1.408.847 http://www.cmb.pa.gov.br/portal/index.php Paraná Curitiba 1.797.408 http://www.cmc.pr.gov.br/ Pernambuco Recife 1.533.580 http://www.camara.recife.pe.gov.br/ Rio de Janeiro Rio de Janeiro 6.093.472 http://www.camara.rj.gov.br/ Rio Grande do Sul Porto Alegre 1.420.667 http://www2.camarapoa.rs.gov.br/ São Paulo São Paulo 10.886.518 http://www.camara.sp.gov.br/ Quadro 1: Capitais selecionadas, porte populacional e endereço eletrônico das câmaras Fonte: Elaborado a partir dos dados do IBGE Foi elaborado um Protocolo de Observação para coletar os dados disponíveis nos portais eletrônicos mantidos pelas câmaras municipais. O Protocolo de Observação, segundo Creswell (2007), é utilizado para registrar dados de observações múltiplas durante a realização de um estudo qualitativo. Os acessos aos portais foram feitos nos dias 12, 13 e 15 de novembro de 2010 com o objetivo de identificar indicadores que pudessem refletir a presença de prestação de contas, transparência e possibilidades de participação. 4 O Modelo Construído A partir dos indicadores de prestação de contas, transparência e participação, identificados em experiências anteriores (AKUTSU, 2002; AKUTSU; PINHO, 2002; DINIZ, 2000; MORAES, 2004; PRADO, 2004), bem como nos portais eletrônicos das câmaras municipais localizadas nas 10 capitais brasileiras com o maior número de habitantes, estruturou-se um modelo de análise considerando quatro níveis de capacidade: nula, baixa, média e alta, conforme apresentado no quadro 2. 10/16 ANAIS Prestação de Contas Indicadores Inexistência de qualquer tipo de Relatório e/ou impossibilidade de sua localização Divulgação parcial e/ou após o prazo do conjunto de Relatórios Legais dos gastos incorridos Divulgação do conjunto de Relatórios Legais dos gastos incorridos no prazo Divulgação, além do conjunto de Relatórios Legais no prazo, de Relatórios complementares Alta dos gastos incorridos Transparência Capacidade Indicadores Nula Inexistência de qualquer tipo de indicador de transparência das atividades dos vereadores Detalhamento das seções (ordem do dia, atas das seções) Baixa Notícias da câmara municipal sobre as atividades dos vereadores Disponibilização da legislação Disponibilização de legislação com possibilidade de download Média Vídeos das sessões legislativas Divulgação das matérias nas fases de tramitação Vídeos das sessões legislativas ao vivo Alta TV Câmara Rádio Câmara Participação/Interação Capacidade Indicadores Nula Inexistência de qualquer tipo de canal para a participação dos cidadãos E-mail da câmara E-mail de setores da câmara Baixa E-mail do vereador Formulário eletrônico Home Page do vereador Twitter Média Vídeo YouTube Monitoramento das ações dos usuários Ouvidoria Alta Indicativo de retorno Quadro 2: Modelo de análise Fonte: Elaboração própria. Capacidade Nula Baixa Média Em relação ao processo de prestação de contas, será considerado com nula capacidade o portal no qual for observada a inexistência de qualquer tipo de Relatório e/ou impossibilidade de sua localização. Caso haja uma divulgação parcial e/ou após o prazo do conjunto de Relatórios Legais dos gastos incorridos, o portal eletrônico apresenta baixa capacidade em prestar contas. A média capacidade do portal será indicada a partir da divulgação do conjunto de Relatórios Legais dos gastos incorridos no prazo. A alta capacidade do portal será identificada se houver divulgação, além do conjunto de Relatórios Legais no prazo, de Relatórios complementares dos gastos incorridos. No tocante à transparência, o portal terá capacidade nula no caso de inexistência de qualquer tipo de indicador de publicização das atividades dos vereadores. A baixa capacidade será definida pela presença de pelo menos um dos seguintes indicadores: detalhamento das seções (ordem do dia, atas das seções); notícias da câmara municipal sobre as atividades dos vereadores; disponibilização da legislação. Já a média capacidade será identificada nos portais que apresentarem, de forma cumulativa, pelo menos um dos indicadores de baixa capacidade e um dos seguintes indicadores: disponibilização de legislação com possibilidade de download, vídeos das sessões legislativas. A alta capacidade será identificada caso o portal apresente, de forma cumulativa, pelo menos um dos indicadores de baixa capacidade, pelo menos um dos indicadores de média capacidade e um dos seguintes indicadores: divulgação 11/16 ANAIS das matérias nas fases de tramitação; vídeos das sessões legislativas ao vivo; TV Câmara; Rádio Câmara. Em se tratando de participação, será considerado com nula capacidade o portal no qual for observada a inexistência de qualquer tipo de canal para a participação dos cidadãos. A baixa capacidade será identificada caso o portal apresente pelo menos um dos seguintes indicadores: E- mail da câmara; E- mail de setores da câmara; E-mail do vereador; Formulário eletrônico. Será considerado com média capacidade o portal que apresentar, de forma cumulativa, pelos menos um dos indicadores de baixa capacidade e um dos seguintes indicadores: Home page do vereador; Twitter; Vídeo YouTube; Monitoramento das ações dos usuários. Para que o portal tenha alta capacidade, deverá apresentar, de forma cumulativa, pelos menos um dos indicadores de baixa capacidade, pelo menos um dos indicadores de média capacidade e um dos seguintes indicadores: ouvidoria; indicativo de retorno. 5 Considerações Finais O portal eletrônico é considerado uma tecnologia capaz de possibilitar condições para a construção da accountability dos atos públicos. A confirmação da utilização do portal eletrônico com esse propósito carece de pesquisas empíricas, particularmente, em relação às câmaras municipais, haja vista que a literatura apresenta pesquisas com o Poder Executivo. Objetivo u-se, portanto, propor um modelo de análise da capacidade dos portais eletrônicos de câmaras municipais em construir condições para a accountability. Evidentemente, corre-se o risco, quando da criação de um portal eletrônico, de que não haja transparência, prestação de contas e participação com os cidadãos, dimensões da accountability analisadas no estudo, e que o mesmo possa servir apenas de mural eletrônico. A partir dos indicadores de prestação de contas, transparência e participação, identificados em trabalhos de diversos autores (AKUTSU, 2002; AKUTSU; PINHO, 2002; DINIZ, 2000; MORAES, 2004; PRADO, 2004), bem como nos portais das câmaras municipais localizadas nas 10 capitais brasileiras com o maior número de habitantes, estruturou-se um modelo de análise considerando diferentes níveis de capacidade (nula, baixa, média e alta). Entende-se que o modelo desenvolvido permite avaliar as condições de construção dos processos de prestação de contas, transparência e participação por meio de portais eletrônicos de câmaras municipais, importantes para alavancar, também, a construção do exercício da accountability. A ausência de indicadores de experiências internacionais justifica-se pela necessidade de construção de um modelo que focasse a realidade brasileira. Para tanto, partiu-se de uma condição considerada ótima (estrutura e conteúdo dos portais das maiores capitais), para, posteriormente, investigar a sua aplicabilidade em portais eletrônicos de câmaras localizadas em municípios de porte menor. Para estudos futuros recomenda-se investigar indicativos de que os portais eletrônicos possam estar migrando do estágio de murais eletrônicos para promotores de incentivos ao exercício da democracia local, o que é um alento dada a importância do poder legislativo, sendo necessário lembrar que este movimento depende também da organização e pressão da sociedade civil, aspecto que este estudo não contemplou, mas que será objeto de investigação futura. Referências ABRUCIO, Fernando Luiz. Reforma do estado no federalismo brasileiro: a situação das administrações públicas estaduais. 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