Ministro Cezar Peluso deverá antecipar voto do mensalão
Barbosa revela temor de que, sem a participação do colega, ocorra empate no
processo
Fonte: O Globo
BRASÍLIA e RIO - O ministro Cezar Peluso deverá antecipar o voto dele sobre todos os
37 réus do mensalão logo depois da exposição do revisor do processo, ministro Ricardo
Lewandowski. A expectativa no tribunal é que o voto de Peluso seja dado nesta quintafeira ou na primeira sessão da próxima semana, segunda-feira. Por lei, Peluso terá que
se aposentar até 3 de setembro, quando completa 70 anos. A antecipação servirá para
que ele não tenha de deixar o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) sem votar
até o fim.
Para isso, a ideia de Peluso é apresentar voto integral sobre os 37 réus e não de forma
fatiada, como fez o relator, Joaquim Barbosa, conforme confidenciou ao GLOBO um
interlocutor do ministro. Peluso só não anteciparia o voto integralmente se a ideia não
for bem recebida pelos colegas da Corte. Nesta terça-feira, o relator Joaquim Barbosa
defendeu o direito de Peluso de votar e manifestou preocupação com a possibilidade de
ocorrer um empate no julgamento.
Joaquim Barbosa disse que Peluso está mais do que pronto para votar.
— Você tem que pensar o seguinte: o ministro Peluso participou de tudo neste processo.
Tudo, desde o início. Presidiu inúmeras sessões em que foram decididas questões
cruciais desse processo. Ele está muito habilitado. Enquanto for ministro, ele tem total
legitimidade para participar do julgamento — afirmou o relator. — A única
preocupação é a possibilidade de dar empate, porque nós já tivemos, num passado muito
recente, empates que geraram impasses.
Sobre se a antecipação do voto de Peluso é tecnicamente possível, Barbosa respondeu
em tom de brincadeira:
— Eu não vou emitir opinião. Vocês (jornalistas) vão ficar muito assanhados.
“E aí fica um voto, eu diria, capenga”
O relator preferiu repassar o assunto para o presidente do STF, ministro Ayres Britto:
— Tem um dispositivo que fala que ele (Ayres Britto) pode decidir sobre isso.
Mas Ayres Britto, que participava de sessão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ),
preferiu não responder:
— Não vou responder a essa pergunta. Tudo depende da interpretação do artigo 135 do
regimento interno. Depois a gente vê. Eu não estou vendo isso agora — disse Britto,
negando que já tenha conversado com Peluso sobre isso.
À noite, Ayres Britto disse que a decisão sobre a antecipação de voto cabe ao próprio
Peluso:
— Fica a critério dele. É bom ouvi-lo.
Já o ministro Marco Aurélio Mello criticou a possibilidade:
— Admitamos que ele (Peluso) vote num primeiro grupo. Ele, evidentemente, não vai
poder se pronunciar sobre a dosimetria (dosagem da pena), sobre a qual relator e revisor
ainda não se pronunciaram. E aí fica um voto, eu diria, capenga. Condeno, mas sem
pena? Não há condenação sem pena. Por isso é que, talvez, tenhamos que evoluir, e a
minha tendência seria para completar o julgamento por blocos.
Marco Aurélio disse que surgiria uma perplexidade a partir do cenário da antecipação
do voto de Peluso:
— Alguns acusados julgados por um colegiado de 11 integrantes e outros por um
colegiado de dez integrantes.
Voto do ministro já está pronto
O voto de Peluso está pronto, tem mais de 400 páginas e não é certo que vá endossar
todas as teses embutidas no voto de Barbosa. O ministro tem linha de pensamento
própria e deverá fazer do voto uma síntese de boa parte das ideias que desenvolveu ao
longo de sua carreira de magistrado. Uma de suas características é não se preocupar
com a repercussão política dos votos.
— Se entender que as provas são suficientes, ele vota pela condenação. Se entender que
não, vota pela absolvição. O ministro Peluso não inventará nada — disse ontem um
frequente interlocutor do ministro.
O voto de Peluso tem sido um dos pontos de tensão no embate entre defesa e acusação
desde o início do julgamento. Grupos que defendem a condenação dos réus entendem
que o ministro deveria votar antes de se aposentar. Entre os que trabalham para a
participação de Peluso estão o procurador-geral Roberto Gurgel e Joaquim Barbosa.
Na outra ponta do processo, os advogados dos réus têm se mobilizado para ganhar
tempo, atrasar ao máximo o cronograma e, com isso, deixar Peluso fora do momento
decisivo do processo. Alguns entendem que a tendência do ministro é seguir a mesma
linha traçada até agora por Barbosa e também votar pela condenação da maioria dos
réus. Eles fazem essa interpretação a partir do voto do ministro favorável ao
acolhimento da denúncia.
Marco Aurélio disse acreditar que o revisor da ação, Ricardo Lewandowski, que
começará a dar seu voto sobre o capítulo 3 da denúncia hoje, só consiga terminar de ler
o texto amanhã. Sobre os seus votos, disse que falará de improviso, a partir de tópicos
que levará ao plenário.
Ayres Britto também falou sobre o julgamento fatiado, em que a conduta dos réus do
mensalão está sendo analisada aos poucos, por grupos. É graças ao fatiamento dos votos
que o ministro Peluso poderá, mesmo que não antecipe seu voto, participar do
julgamentos dos primeiros réus. Mas, não havendo antecipação, é quase impossível que
ele tenha tempo para julgar todos os 37 réus.
— É até melhor (o julgamento fatiado) para o princípio da individualização, para o
exame da causa, da eventual pena — afirmou Britto.
É improvável que peluso opine sobre as penas
Na opinião de especialistas da Fundação Getulio Vargas (FGV), mesmo que peça para
antecipar seu voto, a participação de Peluso até o fim do processo é praticamente
impossível. Ele não terá mesmo a oportunidade de opinar sobre a aplicação das penas
dos que forem condenados:
— O relator Joaquim Barbosa gastou dois dias para votar dois itens do processo. Nesse
ritmo, a semana acabaria com o voto do revisor Lewandowski. Mesmo que cada
ministro leve apenas um dia para votar, é improvável que ele participe — disse Tânia
Rangel, professora da FGV.
A preocupação com a participação de Peluso no processo fica ainda maior quando se
observa o prazo final para sua aposentadoria:
— Como ele se aposenta no próximo dia 3, a última sessão do ministro Peluso seria na
quinta-feira da semana que vem, dia 30. Ou seja, ele participará de cinco sessões sobre o
mensalão até se aposentar — lembrou Lucas Albuquerque, professor da FGV: —
Mesmo que o ministro peça para votar antes da ministra Rosa Weber é improvável que
ele participe da cominação (aplicação) das penas que deverão ser imputadas aos
condenados.
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, entende que não cabem recursos a
qualquer decisão dos ministros do Supremo. O procurador falou ao ser questionado
sobre recursos dos quais os possíveis condenados no mensalão possam lançar mão.
Advogados, como Marthius Lobato, que defende Henrique Pizzolato, ex-diretor de
Marketing do BB, já falam em embargos de declaração e embargos infringentes. Para
Gurgel, mesmo que o condenado consiga quatro votos pela absolvição, não há chance
de recurso.
— Não cabe recurso. Não são admissíveis recursos contra decisão do plenário do
Supremo Tribunal Federal. Não há previsão regimental. A decisão (dos ministros) será
definitiva — disse Roberto Gurgel.
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