Revisão Histerectomia vaginal sem prolapso com sistema de selamento de vasos de baixo custo Vaginal hysterectomy in nonprolapsed uterus using economic vessel sealer system José Carlos Macedo Monteiro1 Narjara Celi Oliveira Pereira2 Alan de Melo Santos3 Paulo Roberto Tavares Gomes Filho4 Palavras-chave Histerectomia vaginal Hemostasia cirúrgica Cirurgia Keywords Vaginal hysterectomy Surgical hemostasis Surgery Resumo A cirurgia ginecológica teve um avanço muito significativo nos últimos anos, sobretudo com o surgimento de novas técnicas cirúrgicas minimamente invasivas. A histerectomia vaginal sem prolapso com sistema de selamento de vasos de baixo custo baseia-se na técnica descrita por Heaney, modificada com a utilização de um clamp autoclavável (Marclamp®) conectado a um sistema gerador de energia bipolar de selamento de vasos (Maxium® – KLS Martin). As vantagens da histerectomia vaginal com sistema de selamento de vasos de baixo custo são: menor tempo cirúrgico, pós-operatório menos doloroso, menor tempo de internação e retorno mais rápido às atividades habituais. A histerectomia vaginal pode ser realizada em regime ambulatorial. Abstract The gynecological surgery had a very significant advance in recent years, over all with the new minimally invasive surgical techniques. The vaginal hysterectomy in nonprolapsed uterus using economic vessel sealer system is based on Heaney modified technique using the Marclamp® connected to Maxium® (Martin’s bipolar vessel sealing system). The advantages of the vaginal hysterectomy with economic vessel sealer system are: less operative time, less post-operative pain, lesser time of internment and faster return to the habitual activities. The vaginal hysterectomy can be realized in ambulatorial hospital care. Professor da Escola Baiana de Medicina e Saúde Pública (EBMSP) e da Universidade Federal da Bahia (UFBA) – Salvador (BA), Brasil; Preceptor responsável pela disciplina de Uroginecologia e Cirurgia Vaginal da Residência Médica de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Geral Roberto Santos – Salvador (BA), Brasil 2 Cirurgiã geral, mastologista; Membro do Instituto Baiano de Ginecologia Minimamente Invasiva – Salvador (BA), Brasil 3 Ginecologista, obstetra; Membro do Instituto Baiano de Ginecologia Minimamente Invasiva – Salvador (BA), Brasil 4 Coordenador da Residência Médica de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Geral Roberto Santos – Salvador (BA); Membro do Instituto Baiano de Ginecologia Minimamente Invasiva – Salvador (BA), Brasil 1 Monteiro JCM, Pereira NCO, Santos AM, Gomes Filho PRT Introdução A histerectomia é um dos procedimentos cirúrgicos mais realizados no mundo e é a segunda operação de grande porte mais realizada nos Estados Unidos.1 Esta consiste na retirada do útero geralmente acometido por patologias, principalmente os miomas. A cirurgia ginecológica teve um avanço muito significativo nos últimos anos, principalmente no que se refere à utilização da tecnologia dos equipamentos, bem como o surgimento de novas técnicas cirúrgicas minimamente invasivas, que exigem habilidades cirúrgicas, técnicas operatórias delicadas e material específico com a finalidade de solucionar as patologias cirúrgicas com menor morbidade e menores índices de complicações. A histerectomia vaginal (HTV) sem prolapso é considerada a técnica gold-standard para realização de histerectomia.2 Atualmente a redução de custos com os tratamentos hospitalares, associada à busca por alternativas minimamente invasivas para os procedimentos cirúrgicos, tem sido uma preocupação constante. A HTV sem prolapso com sistema de selamento de vasos de baixo custo baseia-se na técnica descrita por Heaney3 em 1940, modificada com a utilização de um clamp autoclavável (Marclamp®) conectada a um sistema gerador de energia bipolar de selamento de vasos (Maxium® – KLS Martin) (Figura 1). O sistema de selamento de vasos A característica tecidual que determina a dificuldade de passagem da energia elétrica chama-se impedância. A energia Figura 1 - Maxium® KLS Martin 210 FEMINA | Abril 2009 | vol 37 | nº 4 ideal seria aquela capaz de realizar uma hemostasia com o mínimo de dano tecidual.4 A eletrocirurgia através da energia seladora de vasos passou a ocupar, nos últimos anos, um lugar de destaque nos procedimentos cirúrgicos, sobretudo em laparoscopia e cirurgia ginecológica uma vez que reúne essas características.5 O Maxium® é um sistema gerador de energia bipolar que aliando pressão na extremidade da pinça (Marclamp®), leitura da impedância tecidual, baixa voltagem e alta amperagem promove hemostasia tecidual com a quantidade de energia adequada e invidualizada para cada tecido promovendo selamento de vasos de até 7 mm (Figura 2). O mecanismo de hemostasia do sistema de selamento de vasos ocorre por desnaturação da elastina e colágeno, criando um selo permanente no tecido e não necrose ou trombo, como outras correntes.6 O Marclamp® é uma pinça bipolar forte utilizada para HTVcom hastes protegidas para evitar a disperção de calor lateral. A HTV com sistema de selamento de vasos As indicações da HTV sem prolapso com sistema de selamento de vasos são as mesmas para HTV convencional. Vale lembrar que os cuidados pré-operatórios na seleção das pacientes, tais como avaliação da amplitude de vagina, da mobilidade uterina, do tamanho do útero, da arquitetura óssea da pelve são obrigatórios para prevenção de dificuldades na cirurgia.7 As contraindicações são em pacientes que foram submetidas à histeropexia abdominal, em decorrência da fixação do útero na aponeurose, nos casos de endometriose severa com obliteração do fundo de saco posterior, devido as dificuldades técnicas em pacientes com distúrbios de coagulação ou em uso de Figura 2 - Tela do sistema de selamento de vasos Histerectomia vaginal sem prolapso com sistema de selamento de vasos de baixo custo heparinização por problemas clínicos, devido a possibilidade de falha do selamento. A paciente sob anestesia regional é colocada na posição de litotomia, é feita assepsia e antissepsia da vulva, vagina e coxas e cateterizada com sonda de Foley no 14. Realizamos rotineiramente antibioticoprofilaxia com cefalosporina de primeira geração (cefazolina 2 g intravenosa) na indução anestésica. A cirurgia é iniciada pelo pinçamento e tração do colo uterino com pinça de Lahey. Foi aberto o fundo de saco de Douglas com tesoura e foi colocada uma valva de peso de Auvard com lâmina longa na cavidade. A colpotomia é completada de maneira circular ao redor do colo uterino para descolamento cranial da bexiga de maneira romba com valva de Breisky e tesoura. Nesse tempo deve-se ter cuidado em descolar lateralmente a vagina do colo uterino para que não haja lesões térmicas com uso do sistema de selamento de vasos. Utiliza-se o Marclamp® que é uma pinça bipolar forte com hastes protegidas para evitar a disperção de calor lateral para fazermos a apreensão do complexo ligamentar útero sacro-cardinal esquerdo e ativamos com o pedal o gerador (Figura 3). É fundamental que seja mantida pressão na pinça, pois esta não possui as estrias longitudinais do Z-clamp e podem soltar durante o selamento. Além disso, o mecanismo de selamento exige pressão na ponta da pinça para que o sistema calcule a impedância do tecido e envie a quantidade de energia adequada para criação do selo no tecido apreendido. O sistema de selamento de vasos (Maxium®) emite um sinal sonoro quando o tecido está selado. Nesse momento o cirurgião deverá soltar a pinça e seccionar o tecido com a utilização de uma tesoura. O mesmo procedimento deverá ser repetido do outro lado. O próximo passo é o selamento dos vasos uterinos que deverão ser apreendidos com o Marclamp® da mesma maneira já descrita. O cirurgião normalmente fica preocupado com a possibilidade de lesão ureteral. Contudo, vale lembrar que o ureter dista 2 a 3 cm de distância do nosso local de pinçamento e que nossa pinça possui hastes protegidas com Teflon que impedem a dispersão de calor lateral. Após essas etapas, o fundo uterino deverá ser exteriorizado através da técnica escolhida pelo cirurgião, inclusive com morcelamento se necessário.8 Os pedículos anexiais são pinçados com Z-Clamp e com o Marclamp® ao mesmo tempo, por questões de segurança, pois a artéria ovariana pode retrair-se dificultando seu pinçamento e hemostasia (Figura 4). Novamente é utilizado o selamento de vasos e concluída a histerectomia, e a revisão da hemostasia é imperiosa. O fechamento da cúpula vaginal é realizado através de sutura contínua com fio de poligalactina no 0, incorporando o complexo ligamentar útero sacro-cardinal previamente seccionado. Figura 3 - Selamento do complexo ligamentar cardinal Figura 4 - Selamento do pedículo anexial As vantagens Existem algumas opções disponíveis de geradores de energia bipolar de selamento de vasos, contudo a grande maioria utiliza materiais descartáveis de alto custo.9 O Maxium® utiliza o Marclamp® que é uma pinça bipolar forte para apreensão dos pedículos na HTV com hastes protegidas para evitar a disperção de calor lateral, o que oferece segurança para evitar lesões térmicas em órgão vizinhos como vagina, bexiga e ureter. É uma pinça de uso permanente e autoclavável, reduzindo bastante o custo da cirurgia. Além disso, não é necessário suturas com exceção para o fechamento da cúpula vaginal. As vantagens da HTV com sistema de selamento de vasos de baixo custo são a ausência de cicatriz abdominal, menor tempo cirúrgico, pós-operatório menos doloroso, menor tempo de internação, retorno mais rápido às atividades habituais, menor incidência FEMINA | Abril 2009 | vol 37 | nº 4 211 Monteiro JCM, Pereira NCO, Santos AM, Gomes Filho PRT de complicações e menor custo hospitalar.10 A HTV pode ser realizada em regime ambulatorial. As complicações As principais complicações da HTV sem prolapso com uso do sistema de selamento de vasos são as lesões térmicas em vagina, vulva, lesões do trato urinário e intestinais secundárias ao acionamento do Marclamp® em contato com essas estruturas. A hemorragia intraoperatória e pós-operatória, secundária à falha no selamento, pode ser causada por uso inadequado do equipamento ou por distúrbios da coagulação da paciente não identificado no pré-operatório.11 As demais complicações como as infecções, o tromboembolismo, a granuloma de cúpula, as neuropatias de membro inferior são comuns na técnica de Heaney convencional. Conclusões O sistema de selamento de vasos Maxium® é seguro, eficaz e de baixo custo, podendo ser utilizado para realização de HTV sem prolapso com resultados satisfatórios. Neste serviço um protocolo de estudo randomizado, comparando a HTV sem prolapso com e sem o sistema de selamento de vasos está em desenvolvimento com resultados animadores, e em um momento oportuno esta será apresentada à comunidade científica. Leituras suplementares 1. 2. 3. 4. 5. 212 Monteiro JCM. Histerectomia vaginal na ausência de prolapso. Imagem Real – Avanços da Medicina. 2004;21(209):3. 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