UNIVERSIDADE FEDERAL VALE DO SÃO FRANCISCO
CURSO DE GRADUAÇÃO EM MEDICINA VETERINÁRIA
Grace Barbosa dos Santos
DETECÇÃO DE Ehrlichia canis e Anaplasma platys EM CÃES
TROMBOCITOPÊNICOS DOMICILIADOS NA CIDADE DE RECIFE-PE
Petrolina - PE
2011
UNIVERSIDADE FEDERAL DO VALE DO SÃO FRANCISCO
CURSO DE GRADUAÇÃO EM MEDICINA VETERINÁRIA
Grace Barbosa dos Santos
DETECÇÃO DE Ehrlichia canis e Anaplasma platys EM CÃES
TROMBOCITOPÊNICOS DOMICILIADOS NA CIDADE DE RECIFE-PE
Trabalho apresentado a Universidade Federal do
Vale do São Francisco – UNIVASF, Campus
Ciências Agrárias, como requisito do título de
médico veterinário.
Orientador: Prof.º Dr. Mateus Matiuzzi da Costa
Co-orientador: Prof°. Dr. Maurício Claúdio Horta
Petrolina, PE
2011
Santos, Grace Barbosa dos
S237d
Detecção de Ehrlichia canis e Anaplasma platys em cães
trombocitopênicos domiciliados na cidade de Recife-PE / Grace Barbosa
dos Santos. -- Petrolina, PE, 2011.
57 f.: il.
Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Medicina Veterinária)
- Universidade Federal do Vale do São Francisco, Campus de Ciências
Agrárias, Petrolina, PE, 2011.
Orientador: Prof. Dr. Mateus Matiuzzi da Costa.
Co-orientador: Prof. Dr. Maurício Claúdio Horta
1. Cão - Doença. 2. Erliquioses Caninas. 3. Anaplasma - Imunização Cão. I. Título. II. Universidade Federal do Vale do São Francisco.
CDD 636.708 96
Ficha Catalográfica elaborada pelo Sistema Integrado de Biblioteca
SIBI/UNIVASF
Bibliotecário: Lucídio Lopes de Alencar
Dedico...
... principalmente à minha
querida mãe, ao meu
esposo, aos meus amados
irmãos,
aos
amigos,
professores e colegas e
as minhas meninas (Sofia,
Pucca, Nanda e Cherry)
que são sinônimos de
grande felicidade e que
encantam a minha vida...
AGRADECIMENTOS
Acima de todas as coisas, agradeço ao meu Deus, pelo grande amor com que
sempre me amparou, ainda que eu não mereça.
A minha mãe Ana Rita, não existem palavras que possam expressar, tudo
que faço é por ti, aos meus irmãos Bruno, Laila, Meire, Juliana, Jussara e Daiane, a
minha querida vó Nevinha e a toda a minha família.
Ao meu amado marido Luís Fernando, obrigada pela paciência e incentivo,
grande felicidade é ter você ao meu lado.
Ao Prof.º Mateus Matiuzzi, pela amizade, confiança e orientação.
Aos amigos Gilmária, Juciêne, Duilson, Gilga Mirelly, Carol, Alice, Aninha,
Lídio, Auricléia (in memoriam) e a toda a minha turma da faculdade, jamais vos
esquecerei.
A todos do Laboratório de Microbiologia e Imunologia Animal, especialmente
a Gisele, Carina, Ceiça, Welighton, Chirles, Luciana, Keidy e Milka que me ajudaram
diretamente.
Ao Prof.º Marcelo Teixeira pela oportunidade concedida e a todos do Hospital
Veterinário Harmonia pelo grande apoio e carinho. Aos veterinários: Drª. Cíntia,
Elaine, Pâmela, Lorena, Juliana, Marco Granja, Thaygo, Ricardo, Bruno, Edson,
Magno. A todos os funcionários e estagiários que dividiram comigo esta experiência.
A todos do LABORVET (Paola, Marcelinho e Maria), obrigada por me
agüentar perturbando vocês o tempo todo.
Ao
pessoal
do
Laboratório
de
Doenças
Parasitárias
da
UFRPE,
especialmente ao professor Léucio e a Rafael pela grande colaboração.
Aos professores: Durval, Catarina, Flaviane, Aldrin, Salviano, Ana Amélia,
Fernando Zocche, João Alves, Adriana, Seldon, e demais professores que de
alguma forma colaboraram com o meu aprendizado.
Ao professor Maurício Claúdio Horta, pela contribuição prestada no
desenvolvimento deste trabalho, pelos primers cedidos e pela orientação.
A Auxiliadora e a Joelma, obrigada por tudo que sempre fizeram por mim.
A UNIVASF, pela oportunidade de realizar um sonho.
“Se eu puder ver adiante, será por estar sobre os ombros de gigantes”
Isaac Newton
“Nós seres humanos estamos na
natureza
para
auxiliar
o
progresso dos animais, na mesma
proporção que os anjos estão
para nos auxiliar. Portanto,
quem chuta ou maltrata um
animal
é
alguém
que
não
aprendeu a amar”
Chico Xavier
Santos, G. B. Detecção de Ehrlichia canis e Anaplasma platys em cães
trombocitopênicos domiciliados na cidade de Recife-PE. 2011. 57f. Monografia
(Trabalho de conclusão de curso em Medicina Veterinária) – Colegiado de Medicina
Veterinária, Universidade Federal do Vale do São Francisco, Petrolina, 2011.
RESUMO
As erliquioses caninas estão entre as mais graves doenças infecciosas que
acometem os cães, cuja prevalência tem aumentado significativamente em várias
regiões do Brasil. São causadas por bactérias gram negativas estritamente
intracelulares, pertencentes à Ordem Rickettsiales, Família Anaplasmataceae,
Gêneros Ehrlichia e Anaplasma, transmitidas pelo carrapato Riphicephalus
sanguineus e consideradas potencialmente fatais. Os sinais clínicos observados são
conseqüências da resposta imunológica frente à infecção. O sucesso do tratamento
depende da precocidade do diagnóstico, realizado através de esfregaços
sanguíneos, testes sorológicos, Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) e cultivo
celular. Várias drogas são utilizadas no tratamento da erliquiose sendo que a
doxiciclina é o antibiótico de escolha no tratamento desta infecção. O presente
trabalho teve como objetivo determinar a freqüência da infecção por Ehrlichia canis e
Anaplasma platys em cães com trombocitopenia atendidos em um hospital
veterinário da cidade de Recife-PE, através do diagnóstico direto como também por
meio da PCR. Durante o período de março a abril de 2011 foram avaliados 70 cães
trombocitopênicos. A erliquiose foi diagnosticada através da pesquisa de mórulas de
Ehrlichia canis e Anaplasma platys em esfregaços de sangue total, onde foi possível
verificar que 6% (04/70) dos animais foram positivos para E. canis e 24% para A.
platys (17/70). Dentre os sinais clínicos observados nos animais com infecção,
apatia, inapetência, febre e vômito, foram os que ocorreram com maior freqüência e
dentre as alterações hematológicas foi possível evidenciar a presença
principalmente de anemia, leucocitose por neutrofilia e linfopenia. Foram
selecionadas 45 amostras sanguíneas dos animais que apresentavam
trombocitopenia mais acentuada para extração de DNA visando à amplificação do
gene dsb característico do gênero Ehrlichia através da PCR, a qual confirmou a
infecção em 29% dos animais avaliados (13/45) mostrando-se mais sensível quando
comparada ao diagnóstico direto. Foi possível concluir que as alterações clínicas e
hematológicas observadas nos cães com erliquiose são bastante inespecíficas,
como também que a trombocitopenia é um achado característico, mas não exclusivo
da doença, indicando a importância dos testes laboratoriais no diagnóstico desta
enfermidade.
Palavras chave: Erliquiose, anaplasmose, veterinária, PCR.
Santos, G. B. Detection of Ehrlichia canis and Anaplasma platys in
thrombocytopenic dogs domiciled in Recife-PE. 2011. 57f. Monograph (Working
completion in Veterinary Medicine) - College of Veterinary Medicine, University of
Vale do Sao Francisco, Petrolina, 2011.
ABSTRACT
The canine ehrlichiosis are among the most serious infectious diseases that affect
dogs and its prevalence has increased significantly in several regions of Brazil.
These diseases are caused by strictly intracellular Gram negative bacteria belonging
to the Order Rickettsiales, Anaplasmataceae family, genera Ehrlichia and
Anaplasma, transmitted by ticks Riphicephalus sanguineus and considered life
threatening. Clinical signs observed are consequences of the immune response to
infection. Successful treatment depends on early diagnosis, performed by blood
smears, serologic methods, molecular biology approaches and cell culture. Several
drugs are used in the treatment of ehrlichiosis but doxycycline is considered the
antibiotic of choice to this infection. This study aimed to determine the frequency of
Ehrlichia canis and Anaplasma platys infection in dogs with thrombocytopenia treated
at a veterinary hospital in Recife-PE. During the period from March to April, 2011 70
thrombocytopenic dogs were evaluated. Canine ehrlichiosis were diagnosed by the
presence of Ehrlichia canis and Anaplasma platys morulae in blood smears and it
was found that 6% (4/70) of the animals were positive to E. canis and 24% (17/70) to
A. platys. Among the clinical signs observed in infected animals, apathy, poor
appetite, fever and vomiting occurred more frequently and among hematological
changes it was possible to demonstrate mainly the presence of anemia, leukocytosis,
neutrophilia and lymphopenia. 45 blood samples from animals with thrombocytopenia
more pronoucend were submitted to DNA extraction and the amplification of dsb
gene, characteristic for Ehrlichia genera, was done by PCR. PCR reaction confirmed
the infection in 29% (13/45) of the animals evaluated, becoming more sensitive than
direct diagnosis. It was concluded that clinical and hematological findings in dogs
with ehrlichiosis are rather nonspecific, but also that thrombocytopenia is a
characteristic finding, but not exclusive of the disease, indicating the importance of
laboratory tests in the diagnosis of this disease.
Key-words: Ehrlichiosis, anaplasmosis, veterinary, PCR.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO........................................................................................................................ 01
2. REVISÃO DE LITERATURA
ERLIQUIOSE EM CÃES............................................................................................................. 03
2.1 Principais Erliquioses em Cães
2.1.1 Erliquiose Monocítica Canina (EMC)................................................................................. 03
2.1.2 Erliquiose Granulocítica Canina (EGC)............................................................................
03
2.1.3 Erliquiose Trombocítica Canina (ETC).............................................................................
04
2.2 Etiologia...............................................................................................................................
05
2.3 Epidemiologia......................................................................................................................
07
2.4 Infecção e Doença...............................................................................................................
08
2.5 Patogenia.............................................................................................................................
10
2.6 Sinais Clínicos.....................................................................................................................
11
2.7 Diagnóstico..........................................................................................................................
15
2.7.1 Hemograma e contagem de plaquetas.............................................................................. 16
2.7.2 Identificação Direta do Parasito........................................................................................
20
2.7.3 Diagnóstico Indireto........................................................................................................... 22
2.7.4 Reação em Cadeia da Polimerase (PCR)......................................................................... 23
2.7.5 Cultivo Celular................................................................................................................... 25
2.8 Diagnóstico Diferencial........................................................................................................
27
2.9 Tratamento............................................................................................................................ 27
2.10 Prevenção........................................................................................................................... 30
2.11 Aspectos Zoonóticos.......................................................................................................... 31
3. MATERIAL E MÉTODOS....................................................................................................... 32
3.1 Local e Período...................................................................................................................... 32
3.2 Análises Clínicas................................................................................................................... 32
3.3 Avaliação Hematológica........................................................................................................ 48
3.4 Diagnóstico Direto.................................................................................................................. 48
3.5 Extração de DNA................................................................................................................... 49
3.6 Reação em Cadeia da Polimerase........................................................................................ 49
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO.............................................................................................. 50
5. CONCLUSÕES....................................................................................................................... 57
6. REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 58
1
1- INTRODUÇÃO
Diversas doenças transmitidas por carrapato têm assumido importância tanto
em saúde pública, quanto animal. A erliquiose canina é uma doença causada por
micro-organismos estritamente intracelulares, dentre estes a Ehrlichia canis e o
Anaplasma platys são os organismos riquetsiais mais importantes. A E. canis tem
tropismo por monócitos e neutrófilos e o A. platys por plaquetas, existindo a
possibilidade de infecções concomitantes tendo inclusive o mesmo vetor, o
carrapato Rhipicephalus sanguineus que é o principal responsável pela transmissão
da infecção.
O gênero Ehrlichia atualmente compreende cinco espécies válidas: Ehrlichia
canis, E. chaffeensis, E. ewingii, E. muris e E. ruminantium. No Brasil, a espécie
descrita com maior freqüência é E. canis, responsável pela erliquiose monocítica
canina, doença considerada endêmica principalmente nas áreas urbanas, onde
abundam populações do carrapato Rhipicephalus sanguineus. O agente A. platys,
pertencente ao gênero Anaplasma, é responsável pela transmissão da erliquiose
trombocítica canina (anaplasmose trombocitica canina) causando um quadro clínico
denominado de trombocitopenia infecciosa cíclica canina, que caracteriza-se pela
parasitemia cíclica das plaquetas seguida por trombocitopenia e generalizada
linfadenomegalia.
A erliquiose compreende três fases: aguda, subclínica e crônica, e a depender
da fase em que o animal se encontra, este pode vir a apresentar manifestações
clínicas tais como: apatia, anorexia, febre, palidez de mucosas, sinais de distúrbio de
coagulação como epistaxe, petéquias, sufusões, melena, hematúria, hifema, dentre
outros. As principais alterações hematológicas incluem: a anemia que pode ser
regenerativa na fase aguda da doença ou arregenerativa na fase crônica devido à
supressão da medula óssea; trombocitopenia, neutropenia, monocitose, linfocitose,
como também pode ocorrer pancitopenia. A trombocitopenia é um achado
consistente com todas as fases da infecção, e dentre as alterações apresentadas,
esta é a que ocorre com maior freqüência, de modo que a plaquetometria é utilizada
como um teste de triagem em cães clinicamente suspeitos de erliquiose canina.
2
O método de diagnóstico laboratorial de rotina é feito normalmente pela
demonstração microscópica direta de inclusões intracitoplasmáticas em preparações
coradas de esfregaço sanguíneo ou papa leucocitária. Melhorias nas técnicas de
biologia molecular levaram ao desenvolvimento da detecção de DNA de E. canis e
A. platys por PCR (reação em cadeia da polimerase), que tem proporcionado um
diagnóstico sensível, específico e confiável, permitindo também a detecção precoce
da infecção.
O tratamento para esta enfermidade consiste na administração de antibióticos.
As tetraciclinas são utilizadas como primeira opção, sendo a doxiciclina o fármaco
de eleição.
A erliquiose tem sido motivo de grande interesse tanto para pesquisas em
medicina veterinária quanto para saúde pública, em decorrência das recentes
descobertas de infecção em humanos. Portanto, diante da importância desta
enfermidade na rotina clínica veterinária, da alta casuística da doença em hospitais
veterinários e na população canina, o presente trabalho teve o propósito de verificar
a ocorrência da infecção por E. canis e A. platys em cães domiciliados na cidade de
Recife-PE.
3
2- REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
2.1- PRINCIPAIS ERLIQUIOSES EM CÃES
2.1.1- ERLIQUIOSE MONOCÍTICA CANINA (EMC)
A erliquiose é uma hemoparasitose infecto-contagiosa, causada pela Ehrlichia
canis, parasitas intracelulares obrigatórios de células hematopoiéticas maduras ou
imaturas, que formam agrupamentos intracelulares chamados mórulas (MENDONÇA
et al., 2005). O carrapato marrom do cão, Rhipicephalus sanguineus, é o principal
vetor transmissor da Ehrlichia canis, o qual é de grande importância pela sua
distribuição cosmopolita e pelo fato da sua presença ter relação direta com a
incidência da doença (MARSÍLIO et al., 2006).
A infecção do cão sadio se dá após o repasto do carrapato contendo E. canis
nos hemócitos e na glândula salivar, o qual inocula o agente no hospedeiro através
da picada durante a alimentação (ETTINGER e FELDMAN, 2004, RODRIGUEZVIVAS et al., 2005). De acordo com Ettinger e Feldman (2004), a infecção pode
ocorrer também através da transfusão sanguínea a partir de cães cronicamente
infectados, o que ocorre especialmente em regiões endêmicas.
2.1.2- ERLIQUIOSE GRANULOCÍTICA CANINA (EGC)
A E. ewingii é o principal agente erliquial que infecta os granulócitos de cães
(neutrófilos e eosinófilos), possui como possíveis vetores o carrapato Amblyomma
americanum e o Otobius megnini. Ela causa doença moderada a grave, com
claudicação, trombocitopenia e edema articular. Além da E. ewingii, a E. equi
(Anaplasma phagocytophilum) também causa erliquiose granulocítica canina, seus
hospedeiros naturais incluem o cão, o homem, eqüinos e lhamas e dentre os
hospedeiros experimentais, incluem-se os muares, ovinos, caprinos, gatos e
primatas não humanos. O vetor conhecido é o carrapato Ixodes ricinus. No cão pode
também ser transmitida pelo R. sanguineus, causando doença clínica moderada
com trombocitopenia (DAGNONE; MORAIS; VIDOTTO, 2001).
4
A E. ewingii através da análise da seqüência do gene 16S rRNA, apresenta
grande semelhança genética com o agente da erliquiose granulocítica humana
(EGH) (Anaplasma phagocytophilum) (CHEN et al., 1994), porém a semelhança é
maior com a E. chaffeensis. O agente da erliquiose granulocítica humana (EGH),
tem como hospedeiros naturais os cães, seres humanos, equinos e ratos do pé
branco e experimentais ratos e cervos. O principal vetor conhecido é o Ixodes
scapularis.
A distribuição do A. phagocytophilum é definida pela amplitude de distribuição
do carrapato Ixodes, sendo mais comumente encontrada na Califórnia, Wisconsin,
Minnesota e nos estados da região nordeste dos Estados Unidos, como também em
outros lugares do mundo com esse gênero de carrapato, incluindo Europa, Ásia e
África. A disseminação de carrapatos infectados é facilitada através de aves,
apresentando estas também um papel importante como reservatórios. A infecção
por A. phagocytophilum parece ser essencialmente uma doença aguda em cães,
apresentando sinais inespecíficos como febre, letargia e inapetência mais
frequentemente,
porém
rigidez
e
claudicação
compatíveis
com
dor
musculoesquelética também são comuns de ocorrer, sendo este agente associado à
poliartrite. Comumente é detectado em neutrófilos, sendo o hemograma importante
no diagnóstico, encontrando-se normalmente linfopenia e trombocitopenia, com
contagem de neutrófilos em valores normais. Diversos antibióticos são eficazes no
tratamento desta enfermidade, sendo a doxiciclina o mais recomendado. A.
phagocytophilum infecta pessoas, bem como cães, sendo também considerado um
agente zoonótico (NELSON; COUTO, 2010).
2.1.3- ERLIQUIOSE TROMBOCÍTICA CANINA (ETC)
Anaplasma platys, anteriormente Ehrlichia platys, é uma bactéria que infecta
apenas plaquetas de cães induzindo a trombocitopenia cíclica. O agente é
visualizado como inclusões basofílicas em esfregaços corados com corante Giemsa
ou Panótico. O vetor carrapato conhecido é o Riphicephalus sanguineus, entretanto,
tentativas de transmitir o agente experimentalmente falharam (INOKUMA et al.,
2000; SOUZA et al., 2004).
5
A evolução da anaplasmose trombocítica canina varia de leve a severa no cão
(DUMLER et al., 1995; FERREIRA et al., 2008). É caracterizada por trombocitopenia
cíclica com parasitemia inicial onde um grande número de plaquetas são
parasitadas. Alguns dias após a infecção há diminuição brusca no número de
plaquetas e o agente causal desaparece da circulação. A contagem plaquetária
retorna a valores próximos aos de referência em aproximadamente quatro dias
(INOKUMA et al., 2000; GASPARNI et al., 2008).
A doença também é conhecida como trombocitopenia cíclica canina, uma vez
que a parasitemia e trombocitopenia subseqüentes tendem a ocorrer periodicamente
em intervalos de uma a duas semanas. Com a diminuição do número de plaquetas
infectadas, a trombocitopenia pode continuar severa ou diminuir de intensidade.
Após um período de incubação de oito a quinze dias, os sinais clínicos começam a
ocorrer com alguns sinais digestivos (vômito e/ou diarréia), anorexia e distúrbios
hemostáticos (HARVEY, 2006; GASPARNI et al., 2008).
2.2- ETIOLOGIA
As erliquioses clínicas em caninos podem ser causadas por infecção de uma
variedade de agentes erliquiais. As espécies em caninos infectados naturalmente
compreendem a E. canis, Neorickettsia risticii, E. chaffeensis, E. ewingii, Anaplasma
platys e Anaplasma phagocytophilum (LAPPIN, 2006). O gênero Ehrlichia
atualmente compreende cinco espécies válidas: E. canis, E. chaffeensis, E. ewingii,
E. muris e E. ruminantium (DUMLER, et al., 2001). São bactérias pleomórficas gramnegativas, parasitas intracelulares obrigatórias, que infectam leucócitos circulantes
de várias espécies de animais domésticos e silvestres inclusive o homem (COHN,
2003).
São microrganismos encontrados em áreas temperadas quentes e tropicais
mundialmente, e são transmitidos entre cães susceptíveis através de vetores
artrópodes (WOODY; HOSKINS, 1991). No Brasil, a única espécie descrita em cães
até o momento é Ehrlichia canis, responsável pela erliquiose monocítica canina,
doença considerada endêmica principalmente nas áreas urbanas, onde abundam
populações do carrapato vetor Rhipicephalus sanguineus (LABRUNA; PEREIRA,
6
2001), também conhecido como carrapato castanho, carrapato marrom ou carrapato
vermelho do cão.
O parasito E. canis recebeu inicialmente o nome de Rickettsia canis
(HUXSOLL, 1976). Em 1945, a nomenclatura foi retificada para E. canis, em
homenagem a Paul Ehrlich, bacteriologista alemão (McDADE, 1990). Uma
classificação mais objetiva tem utilizado a seqüência homóloga do RNA ribossômico
(RNAr) em genes, para determinar o parentesco genético de vários organismos, que
têm sido reclassificados e dirigidos para outros grupos genéricos e distribuídos
dentro das famílias Anaplasmataceae e Ricketisiaceae (DUMLER et al., 2001).
A única espécie conhecida da família Ehrlichieae que infectava humanos
naquela época, era a Neorickettsia (Ehrlichia) sennetsu, agente causal da febre do
Sennetsu, doença descrita pela primeira vez no Japão em 1954. Inicialmente
denominada de Rickettsia sennetsu, foi renomeada para E. sennetsu, pois
apresentava inúmeras semelhanças com a E. canis, mas atualmente está incluída
no gênero Neorickettsia (DUMLER et al., 2001).
A infecção por espécies do gênero Ehrlichia era anteriormente considerada
hospedeiro-específica, de forma que se acreditava que E. canis infectava apenas
cães e E. chaffeensis infectava humanos e veados (BREITSCHWERDT, 1995). Na
Venezuela há um relato recente de pelo menos seis casos clínicos de erliquiose
humana causada por Ehrlichia canis, indicando que este agente pode causar
infecções zoonóticas (AGUIAR et al., 2007).
Recentemente houve uma reorganização de todos os gêneros nas famílias
Rickettsiaceae e Anaplasmataceae e todos os membros dos grupos Ehrlichieae e
Wolbachieae foram transferidos para a família Anaplasmataceae, na qual constam
os três gêneros Ehrlichia, Anaplasma e Neorickettsia (DUMLER et al., 2001). Com
base na semelhança entre as seqüências do RNA ribossômico 16S três grupos
distintos do gênero Ehrlichia foram identificados. São eles: a) genogrupo Ehrlichia
canis, incluindo o patógeno humano Ehrlichia chaffeensis, os patógenos caninos E.
canis e E. ewingii, esta última que também infecta humanos; o patógeno murino
Ehrlichia muris, e Ehrlichia (Cowdria) ruminantium, espécie causadora de
hidropericárdio em ruminantes; b) genogrupo Ehrlichia phagocytophilum, que foi
denominada Anaplasma, incluindo A. phagocytophilum, A. platys, e também A.
7
marginale; c) genogrupo Ehrlichia sennetsu, que foi denominada Neorickettsia,
incluindo N. sennetsu, N. risticci e N. helminthoteca (ALLSOPP; ALLSOPP, 2001;
COHN, 2003).
2.3- EPIDEMIOLOGIA
No Brasil, a EMC é de ampla ocorrência, principalmente em áreas urbanas,
devido à alta prevalência do Rhipicephalus sanguineus (AGUIAR et al., 2007). Em
Belo Horizonte, Costa et al. (1973) relataram pela primeira vez a doença no Brasil,
posteriormente, foi relatada acometendo aproximadamente 20% dos cães atendidos
em hospitais e clínicas veterinárias de estados das regiões Nordeste, Sudeste, Sul e
Centro-Oeste (MOREIRA et al., 2003).
A maior prevalência ocorre na região Nordeste (43%) e a menor na região Sul
do país (1,70%) (BRITO, 2006). A incidência da doença é maior nos meses mais
quentes onde há um maior desenvolvimento do carrapato, podendo ser
diagnosticada todo o ano, além disso, não existe uma predileção etária para a
erliquiose.
Fatores
epidemiológicos
relacionados
às
condições
climáticas,
distribuição do vetor, população sob estudo, comportamento animal e habitat, assim
como a metodologia empregada na investigação do agente podem afetar os níveis
de prevalência da erliquiose canina no Brasil (DAGNONE et al., 2001).
Com relação ao parasito A. platys, este foi descrito primeiramente por Harvey
et al., em 1978, na Flórida, em plaquetas de um cão trombocitopênico. São poucos
os estudos epidemiológicos direcionados a este, mas acredita-se que sua
distribuição geográfica se assemelhe a de outras espécies de riquétsias. A. platys já
foi descrito nos EUA, na Grécia, França, Itália, Israel, China, Japão, Tailândia e
Venezuela. A infecção por este microorganismo vem sendo descrita em cães de
várias regiões do Brasil, havendo a possibilidade de infecção concomitante com E.
canis e B. canis, podendo o Rhipicephalus sanguineus ser o vetor destas três
espécies. O DNA de A. platys já foi detectado também em carrapatos das espécies
Ixodes ovatus e Haemophysalis flava. Devido à possibilidade da transmissão de
vários hemoparasitas por carrapatos, a presença de diferentes espécies infectando o
mesmo animal é freqüente. Dessa forma, infecções simultâneas podem ocorrer
8
como resultado da transmissão de múltiplos organismos pelo mesmo carrapato ou
como resultado de transmissões independentes em tempos diferentes, por
carrapatos diferentes, de modo que já foi relatado infecção simultânea por A. platys,
E. canis e Babesia sp. em um mesmo animal. Também já foram observadas
inclusões sugestivas de A. platys em um gato no Brasil, porém não se obteve
sucesso numa tentativa de infecção experimental em gato (VELHO, 2007).
2.4- INFECÇÃO E DOENÇA
A Erlichia canis, micro-organismo intracelular obrigatório, pode ser encontrado
isolado em colônias compactas ou formando mórulas em leucócitos mononucleares
(BULLA et al., 2004). Seu desenvolvimento possui três estágios sendo: corpúsculo
elementar, corpúsculo inicial e mórula. Individualmente a Ehrlichia é denominada
corpúsculo elementar, com aspectos cocóide ou elipsóide não móveis, porém o
pleomorfismo é notado com freqüência (ALMOSNY, 1998; MCDADE, 1990). O
número de corpúsculos elementares em cada vacúolo é variável, de 2 a 40
corpúsculos elementares, os quais se multiplicam por fissão binária (HILDEBRANDT
et al., 1973).
A primeira fase do ciclo é caracterizada pela penetração de corpúsculos
elementares em células mononucleares (DAVOUST et al. 1993). Após ocorre a
multiplicação da rickéttsia dentro do fagossomo de células mononucleares, onde se
desenvolve em mais dois estágios, corpúsculo inicial e mórula (MCDADE, 1990). De
acordo com Nyindo et al. (1971) os corpúsculos elementares aumentam em número
e se agrupam formando os corpúsculos iniciais.
Nos sete a doze dias posteriores ocorre a multiplicação dos corpúsculos e
formação de mórulas. As mórulas são estruturas com coloração semelhante a dos
corpúsculos iniciais e são constituídas por um a três vacúolos contendo de um a
quarenta corpúsculos elementares, que podem estar compactos ou difusos em seu
interior (DAVOUST, 1993; BEAUFILS et al., 1997). Após 12 a 18 dias de incubação,
as mórulas se dissociam do citoplasma e podem liberar corpúsculos iniciais ao se
romperem, que irão infectar outras células sanguíneas (NYINDO et al., 1971). O
parasito se localiza nas células reticuloendoteliais do fígado, baço, e nódulos
9
linfáticos, onde ocorre a replicação primária em macrófagos mononucleares e
linfócitos (SWANGO et al., 1989).
Entre animais, o principal mecanismo de transmissão da infecção natural
ocorre pela picada do R. sanguineus em qualquer estágio. A infecção dos
hospedeiros ocorre quando os carrapatos contaminados se alimentam e sua
secreção salivar é inoculada no local da picada (ALMOSNY, 2002). A transmissão
da rickéttsia entre carrapatos ocorre de forma transestadial sem que haja passagem
transovariana. A multiplicação de E. canis ocorre nas glândulas salivares e nas
células intestinais do R. sanguineus, mas não foi encontrado nenhuma evidência ou
estrutura de E. canis nos ovários do carrapato (GROVES et al., 1975).
A passagem de E. canis para o carrapato ocorre duas a três semanas após o
cão ser inoculado com a bactéria, em casos crônicos é pouco provável a
transmissão do agente para o seu vetor biológico (WOODY & HOSKINS, 1991). Os
fatores que podem afetar a severidade clínica e a progressão da doença nos cães
podem estar ligados a raça, diferenças individuais na resposta imune, carga
infectante e a patogenicidade da linhagem (RIKIHISA et al., 1991). Além disso, deve
se levar em consideração a idade e a possibilidade de doença concomitante
(WOODY & HOSKINS, 1991). O quadro clínico do animal pode ser agravado com
co-infecções, que podem ocorrer com Anaplasma platys, Babesia canis, Hepatozoon
canis (MATTHEWMAN et al., 1993).
O agente A. platys pode aparecer isolado, em pares ou em grupos, dentro de
vacúolos. Através da realização de fissões binárias sucessivas formam inclusões
compactas denominadas mórulas. Podem medir de 350 a 1250 nm de diâmetro e as
plaquetas infectadas podem ter de um a três vacúolos contendo de um a oito
microorganismos cada. Ainda não se conhece o mecanismo de penetração e saída
do parasito, mas provavelmente a entrada na plaqueta ocorre por meio de
endocitose, devido à propriedade fagocítica da mesma, sendo a membrana do
vacúolo proveniente da membrana externa dessa célula (HARVEY, 1990).
10
2.5- PATOGENIA
A patogenia da EMC envolve um período de incubação de oito a vinte dias,
seguido por uma fase aguda, subclínica e muitas vezes crônica (COUTO, 2003). A
fase aguda da doença inicia-se de uma a três semanas após a infecção e é variável
quanto à duração (duas a quatro semanas) e a severidade (suave a severa).
Durante
este
período,
o
microrganismo
multiplica-se
dentro
das
células
mononucleares circulantes e dos tecidos fagocitários mononucleares (fígado, baço e
linfonodos). Isso leva à linfadenomegalia e à hiperplasia linforreticular do fígado e do
baço. As células infectadas são transportadas pelo sangue para outros órgãos do
corpo, especialmente pulmões, rins e meninges, e aderem-se ao endotélio vascular,
induzindo vasculite e infecção tecidual subendotelial.
O consumo, o seqüestro e a destruição das plaquetas parecem contribuir para
a trombocitopenia durante a fase aguda. As contagens de leucócitos são variáveis, e
a anemia regenerativa, relacionada à supressão da produção de eritrócitos e à
destruição acelerada dessas células, desenvolve-se progressivamente durante a
fase aguda (ALMOSNY, 2002; ETTINGER e FELDMAN, 2004).
Após seis a nove semanas de incubação segue-se a fase subclínica
caracterizando-se pela persistência da trombocitopenia, leucopenia variável, e
anemia na ausência de sinais clínicos (BREITSCHWERDT, 1995). A forma
subclínica persiste por até cinco anos em cães naturalmente infectados. Apesar de
alguns cães eliminarem o microrganismo durante a fase subclínica, ele persiste de
forma intracelular na maioria das vezes, resultando na fase crônica da infecção
(LAPPIN, 2006). A fase crônica ocorre quando o sistema imune é ineficaz e não
consegue eliminar o organismo. O resultado é uma enfermidade vaga e crônica,
perda de peso e disfunção da medula óssea (COUTO, 2003). Muitas das alterações
clínicas e patológicas que se desenvolvem durante esta fase originam-se das
reações imunes contra o microrganismo intracelular (LAPPIN, 2006). A principal
característica da fase crônica é o aparecimento de hipoplasia medular levando a
anemia aplástica, monocitose, linfocitose e leucopenia (GREGORY et al., 1990).
Quanto a ETC, o período de incubação da doença varia de oito a quinze dias.
Durante a fase aguda da infecção há uma alta porcentagem de plaquetas infectadas
11
no sangue circulante, de modo que em alguns dias ocorre um decréscimo do
número de plaquetas circulantes e a contagem pode chegar a valores como 20.000
plaquetas/µL ou menos, tornando-se mínimas as chances de visualização do
parasita nesse momento. A plaquetometria volta ao normal em três ou quatro dias
após o desaparecimento do microorganismo, e em sete a quatorze dias após o
primeiro episódio ocorre outra parasitemia na qual, o número de plaquetas decresce
novamente. Com o tempo e juntamente com o processo de cronificação da doença,
a natureza cíclica das trombocitopenias e das parasitemias tende a diminuir,
resultando em esporádicas aparições do parasito e trombocitopenias moderadas.
Pode-se supor que o mecanismo inicial da trombocitopenia esteja relacionado à
proliferação
do
parasito
e
que
as
trombocitopenias
subseqüentes
sejam
determinadas por mecanismos de remoção imunomediados. A presença de
inclusões em megacariócitos ou qualquer outra célula precursora na medula óssea,
não foi evidenciada durante a parasitemia (VELHO, 2007).
2.6- SINAIS CLÍNICOS
A doença clínica resultante da infecção erliquial pode ocorrer em qualquer
cão, mas a gravidade varia de acordo com o organismo, fatores imunológicos do
hospedeiro e presença de co-infecção. De forma que acredita-se que a virulência
varie de acordo com as diferentes cepas de E. canis. Cães que apresentam
depressão da imunidade celular desenvolvem a doença grave, no entanto, cães
jovens
experimentalmente
infectados
por
E.
canis
não
desenvolvem
imunossupressão nos primeiros meses da infecção (HESS et al., 2006).
As manifestações clínicas nos cães infectados com E. canis variam de acordo
com a evolução da infecção, a qual ocorre em três estágios, identificando-se três
fases clínicas (Tabela 01). Após a picada do carrapato, isto é, o período de
incubação, a doença pode apresentar-se de forma assintomática, subclínica a
formas graves como, por exemplo, a pancitopenia tropical canina, ocorrendo à
disseminação do patógeno pelo sangue, caracterizando a fase aguda ou de
disseminação, quando o microorganismo se multiplica dentro dos monócitos
circulantes e no sistema monocítico fagocitário do baço, fígado e linfonodos,
12
causando linfadenomegalia e hepatoesplenomegalia, durando aproximadamente de
duas a quatro semanas, consistindo de sinais clínicos moderados a graves
(BREITSCHWERDT, 1995).
Dentre os sinais clínicos e os achados do exame físico incluem-se anorexia,
pirexia, depressão, perda de peso, vômitos, petéquias, sufusões, epistaxe,
linfadenomegalia e esplenomegalia hiperplásicas, dispnéia ou intolerância ao
exercício (GLAUS; JAGGY, 1992), edema de membros, hidrocele, além de sinais do
sistema nervoso central (SNC) que podem ser atribuídos a hemorragias, vasculite e
extensa
infiltração
plasmocítica
das
meninges
(BREITSCHWERDT,
1995;
ACCETTA, 2008). Várias estruturas oculares podem estar comprometidas, petéquias
e equimoses conjuntivais ou na íris podem ocorrer, além de uveíte anterior,
panuveíte,
ceratite,
hifema,
glaucoma
secundário,
hemorragia
retiniana
e
descolamento de retina (ACCETTA, 2008).
Estes sinais duram de dois dias a três semanas e podem ser acompanhados
de pancitopenia. Geralmente a trombocitopenia na fase aguda não é grave o
suficiente para causar sangramento espontâneo; logo, este pode ocorrer
principalmente devido à vasculite e à diminuição da função plaquetária (NELSON;
COUTO, 2010).
A fase subclínica está associada com persistência do antígeno ocorrendo
após a fase de disseminação, inicia-se seis a nove semanas após a inoculação e
ocorre trombocitopenia persistente, leucopenia variável, mas geralmente os animais
são assintomáticos, podendo durar meses ou anos e antes do desenvolvimento da
fase crônica, o cão imunocompetente ainda consegue eliminar o parasita
(BREITSCHWERDT, 1995).
Caracteriza-se laboratorialmente por hiperplasia linforreticular, citopenias e
hiperglobulinemia. Na ausência de sinais clínicos, trombocitopenia, leucopenia
variável e anemia podem persistir. Os sinais começam um a quatro meses após a
inoculação, são variáveis em gravidade e incluem perda de peso, palidez, evidência
de defeitos hemostáticos primários, linfoadenomegalia generalizada, esplenomegalia
hiperplásica
com
hematopoiese
extramedular,
alterações
oculares
como
coriorretinite, uveíte anterior, hifema, hemorragias retinianas, opacidade de córnea
devido à deposição de precipitados celulares e/ou edema (WOODY; HOSKINS,
13
1991), edema dos membros e eventualmente manifestações nervosas como ataxia,
paraparesia, déficits dos nervos cranianos e convulsões (MEINKOTH; HOOVER;
COWELL,
1989).
As
hemorragias
oculares
têm
sido
associadas
com
trombocitopenia, mas também com elevação da pressão oncótica, vasculite e
disfunção plaquetária, tudo isso devido à hiperglobulinemia, que leva a distúrbios da
coagulação e à síndrome da hiperviscosidade (HARRUS et al., 1998).
Tabela 01. Anormalidades clínicas associadas à infecção por Ehrlichia canis.
Estágio da infecção
Aguda
Manifestações clínicas
Febre
Corrimento oculonasal seroso ou purulento
Anorexia
Perda de peso
Dispnéia
Linfadenomegalia
Subclínica
Geralmente sem anormalidades clínicas
Crônica
Depressão
Perda de peso
Mucosas pálidas
Dor abdominal
Evidência de hemorragia: epistaxes, petéquias, etc
Linfadenomegalia
Esplenomegalia
Dispnéia, creptação úmida
Ocular: retinite perivascular, hifema, descolamento de retina, uveíte
anterior, ceratite
Sistema nervoso central: meningite, paresia, convulsões
Hepatomegalia
Arritmias
Rigidez e inchaço, dor articular
Fonte: adaptado NELSON; COUTO, 2010.
14
Ao ingressarem na fase subclínica os animais apresentam-se clinicamente
saudáveis, entretanto, os valores hematológicos permanecem em níveis abaixo dos
normais. Durante esta fase o peso do cão se normaliza, a febre desaparece, embora
as anormalidades laboratoriais como trombocitopenia moderada e hiperglobulinemia
persistam e os títulos de anticorpos continuem crescendo (ACCETTA, 2008).
A fase crônica corresponde ao estágio final da erliquiose, podendo estar
associada com manifestações moderadas ou graves. São considerados indicadores
de erliquiose crônica sinais clínicos inespecíficos, tais como fraqueza, depressão,
anorexia, perda crônica de peso, mucosas pálidas, febre e edema periférico
(RISTIC; HOLLAND, 1993), além de tendências hemorrágicas, linfadenomegalia,
esplenomegalia, sinais oculares e alterações secundárias como pneumonia,
glomerulonefrite e artrite (GREENE, 1995).
As
manifestações
graves
da
doença
podem
resultar
de
anemia
arregenerativa, trombocitopenia, diátese hemorrágica, poliartrite (COWELL et al.,
1988), desordens neurológicas, doença renal e problemas reprodutivos, tais como
sangramento estral prolongado, incapacidade de concepção, abortos e mortes
neonatais (HOSKINS, 1991).
Entre diferentes regiões geográficas ou ainda dentro da mesma região, pode
ocorrer uma grande variação dos sinais clínicos da erliquiose. A variação da cepa
infectante,
dose
do
microorganismo
inoculado,
raça
e
idade
do
cão,
imunocompetência do hospedeiro, doenças concomitantes ou infecção por outros
parasitos transmitidos por carrapatos são fatores que aparentemente afetam a
gravidade da sintomatologia e a evolução da doença (ACCETTA, 2008).
No que se refere à anaplasmose trombocítica canina, como já citado
anteriormente, esta é responsável pelo aparecimento de um quadro clínico
denominado trombocitopenia cíclica. Freqüentemente os animais infectados
naturalmente por A. platys não apresentam evidências de doença clínica, no
entanto, dentre os sinais clínicos mais comuns podemos citar anorexia, letargia,
perda de peso, depressão e manifestações hemorrágicas em decorrência de severa
trombocitopenia. Ainda pode-se observar diminuição na contagem total de leucócitos
e volume globular com discreta hipoalbuminemia e hiperglobulinemia em alguns
casos. Durante a infecção crônica as plaquetas parasitadas e a trombocitopenia
15
diminuem, resultando em raras plaquetas parasitadas no esfregaço sangüíneo
(MACHADO, DAGNONE, SILVA, 2010).
Em estudos experimentais, durante a parasitemia inicial pode-se observar
uma discreta hipertermia como também hematoquezia em pacientes com
trombocitopenia. No entanto, há relatos de animais que apresentaram anorexia,
letargia,
depressão,
perda
de
peso,
descarga
nasal
mucopurulenta,
linfadenomegalia, mucosas pálidas e febre. Nos casos em que ocorre associação de
A. platys a outros hemoparasitas, a doença clínica é potencializada, o que dificulta o
diagnóstico e o manejo terapêutico dos cães doentes (VELHO, 2007).
Em Israel, um caso foi descrito no qual uma cadela apresentava anorexia,
apatia, febre e achados laboratoriais que eram sugestivos de infecção por E. canis
como anemia, leucopenia e trombocitopenia. Definiu-se o diagnóstico através da
pesquisa em esfregaço sangüíneo, pois foram encontradas apenas mórulas em
plaquetas. O animal apresentava sorologia positiva para A. platys e negativa para E.
canis, mas a possibilidade de infecção conjunta não foi completamente descartada
pelo autor (WANER, 1993).
2.7- DIAGNÓSTICO
A erliquiose é uma “zoonose emergente”, cujo reconhecimento precoce é
importante. As técnicas de diagnóstico utilizadas são as mesmas para todas as
espécies conhecidas até o momento. Com base na história clínica e no exame físico
de um paciente pode-se suspeitar de erliquiose (GREENE; HARVEY, 1984). No
entanto, quanto aos aspectos clínicos, torna-se muito difícil diferenciar a fase inicial
ou de disseminação, da fase crônica da doença, já que durante estas fases a
apresentação clínica e os achados laboratoriais podem ser semelhantes (WADDLE;
LITTMAN, 1988).
Pode-se confirmar a suspeita clínica da doença através da identificação do
microrganismo nos esfregaços de sangue periférico ou capa leucocitária e nas
amostras citológicas de linfonodos, baço ou medula óssea; por métodos sorológicos,
como a Reação de Imunofluorescência Indireta (RIFI) e kits comerciais (SNAP 4DX);
16
através de técnicas de biologia molecular, como a Reação em Cadeia da Polimerase
(PCR) e através do cultivo celular.
2.7.1 Hemograma e contagem de plaquetas
Na investigação laboratorial, o primeiro exame a ser solicitado é o
hemograma, o qual deve ser sempre acompanhado da contagem de reticulócitos,
para definir se a anemia é secundária à diminuição de produção ou aumento de
destruição dos glóbulos vermelhos. Dentre as suas utilizações, este pode ser
empregado para monitorar a resposta à terapia, para avaliar a gravidade de uma
doença, ou como um ponto de partida para formular uma lista de diagnósticos
diferenciais. Sua interpretação pode ser dividida em três seções: avaliação dos
eritrócitos, leucócitos e plaquetas. Cada um destes parâmetros pode ser interpretado
individualmente; entretanto, para fechar um diagnóstico mais preciso é importante a
integração desses dados (BARGER, 2003).
A espécie de Ehrlichia, a gravidade da síndrome e a duração da infecção irão
determinar as alterações hematológicas, que consistem em anemia, leucopenia e
trombocitopenia, como também aumento da sedimentação eritrocitária, associada
com hipoalbuminemia e hipergamaglobulinemia.
A anemia, caracterizada ao exame laboratorial por redução do número de
eritrócitos e/ou concentração de hemoglobina, pode ser classificada segundo
critérios morfológicos (aspecto dos eritrócitos), grau ou intensidade e aspectos
etiopatológicos (base fisiopatológica) (SPORRI; STUNZI, 1977). O conceito mais
atual considera especialmente a atividade da medula óssea em resposta ao estado
anêmico, classificando as anemias em regenerativas e não regenerativas (BATISTAFILHO, 2008).
A classificação morfológica leva em consideração o diâmetro das hemácias
(macrocítica, microcítica e normocítica) e sua concentração em hemoglobina das
células (hipocrômica e normocrômica). O tamanho das células é refletido no volume
corpuscular médio (VCM): se as células forem menores que o normal, é dito que a
anemia é microcítica; se elas têm tamanho normal, normocítica; se são maiores que
o tamanho normal, é macrocítica. Quanto aos mecanismos etiopatológicos
17
(etiopatogênicos), a anemia está relacionada à perda de sangue (hemorrágica
aguda ou crônica), ao excesso de destruição de eritrócitos (hemolítica) e às
deficiências de produção de eritrócitos na medula óssea (hipoproliferativa) primária
(carencial e aplástica) ou secundária (CARVALHO; BARACAT; SGARBIERI, 2006).
A classificação funcional de anemia concebida a partir da contagem dos
reticulócitos e a morfologia dos glóbulos vermelhos pode ser usada como um guia
de leitura dos resultados de determinações clínicas. A presença de reticulócitos em
quantidades reduzidas ou normais indica anemia hipoproliferativa ou alteração na
maturação dos glóbulos vermelhos, sugerindo um quadro arregenerativo. Se a
produção de reticulócitos estiver elevada, o mais provável é hemólise, com
conseqüente processo regenerativo (BATISTA-FILHO, 2008).
Em cães com erliquiose a diminuição dos componentes sanguíneos celulares
começa a ocorrer durante a fase de incubação e progride até a fase febril. Anemia
normocítica normocrômica é considerada uma alteração comum na erliquiose
canina, observando-se quadros anêmicos geralmente arregenerativos durante a fase
crônica da doença, com diminuição da resposta medular diante dos estímulos
eritropoiéticos, provavelmente em decorrência do comprometimento orgânico
importante, com diminuição acentuada da resposta medular. A anemia poderá ser
regenerativa
nos
quadros
agudos
da
doença,
quando
houver
babesiose
concomitante ou ocorrer hemorragia intensa (ACCETTA, 2008).
Nelson e Couto (2010) relatam que trombocitopatias provenientes da
hiperglobulinemia potencializam o sangramento em alguns cães com erliquiose
crônica que é classicamente associada com a pancitopenia, mas pode ocorrer
qualquer combinação de neutropenia, trombocitopenia e anemia. Alterações nas
linhagens celulares da medula óssea relacionadas à erliquiose variam de
hipercelularidade (fase aguda) a hipocelularidade (fase crônica). Plasmocitose de
medula óssea é comum em cães na fase subclínica e crônica da erliquiose e a
doença pode ser confundida com mieloma múltiplo, particularmente em cães com
gamopatias monoclonais.
A hipoalbuminemia na fase aguda é provavelmente causada pelo seqüestro
de albumina nos tecidos devido à vasculite, ao passo que na fase crônica da doença
é causada pela perda glomerular decorrente da deposição de imunocomplexos ou
18
da imunoestimulação crônica (gamopatia monoclonal ou policlonal). Azotemia prérenal pode ocorrer nas fases aguda ou crônica da erliquiose, azotemia renal se
desenvolve em alguns cães com grave glomerulonefrite decorrente da cronicidade
da doença. A combinação de hiperglobulinemia e hipoalbuminemia é compatível
com a erliquiose subclínica ou crônica. É mais comum a ocorrência de gamopatias
policlonais, mas também podem ocorrer as gamopatias monoclonais (p. ex.,
imunoglobulina G) (NELSON; COUTO, 2010).
A alteração hematológica mais comum em todas as fases da erliquiose canina
é a trombocitopenia. A contagem de plaquetas nem sempre está correlacionada
com a extensão ou gravidade do sangramento, e um tempo de coagulação
aumentado pode ser observado devido à inibição da agregação plaquetária
(HARRUS et al., 1996). As plaquetas fazem a hemostasia primária, ou seja, logo que
ocorre a lesão elas formam o tampão ou “plug” provisório, que procura evitar o
agravamento da hemorragia, enquanto a fibrina se forma (GARCIA-NAVARRO,
2005). Para o desempenho de certas atividades fisiológicas relevantes relacionadas
à hemostasia, o número de plaquetas no sangue, a plaquetometria, deve ser
mantido em valores adequados (MEYER et al., 1995).
A trombocitopenia ocorre por distúrbios na produção, na distribuição ou na
destruição de plaquetas. Os defeitos na produção podem ser causados por
hipoplasia das células hematopoéticas primordiais, substituição da medula normal e
trombocitopoese ineficaz. A destruição de plaquetas pode ser aumentada por
distúrbios imunológicos ou ainda doenças não imunológicas. Assim como esses
distúrbios, problemas na distribuição de plaquetas ou decorrentes de uma transfusão
podem ocasionar trombocitopenia (REBAR et al., 2003; THRALL, 2007).
Os
animais
com
trombocitopenia
têm
tendência
a
sangramentos
mucocutâneos, em geral por muitas vênulas ou capilares, que ocasionam pequenas
hemorragias puntiformes em todos os tecidos corporais denominadas petéquias; e
ainda podem apresentar púrpura (coleções de sangue na pele); equimoses (são
características de desordens plaquetárias e representam coleções subcutâneas
maiores, devido à perda sangüínea de vênulas e pequenas arteríolas), e hematomas
(são mais profundos e palpáveis que as equimoses, sendo comuns em pacientes
com defeitos de plaquetas) (REBAR et al., 2003).
19
Na avaliação laboratorial das plaquetas é essencial a análise do hemograma
completo, é preciso estabelecer se a trombocitopenia é um achado isolado ou se
está associada com anemia e leucopenia. Se a trombocitopenia for aparentemente
um achado isolado, deve-se repetir a contagem para a confirmação. O esfregaço de
sangue periférico deve ser avaliado quanto à morfologia das plaquetas, quando
microplaquetas
predominam
sugerem
um
evento
imunomediado
precoce
(trombocitopenia imunomediada), já as macroplaquetas sugerem liberação de
plaquetas
jovens
na
circulação
e
são
frequentemente
observadas
nas
trombocitopenias regenerativas (REBAR et al., 2003).
A causa para a diminuição do número de plaquetas pode estar relacionada à
produção anormal de plaquetas, que normalmente vem acompanhada de outra
citopenia como anemia e/ou neutropenia, e são causadas por etiologias auto-imunes
ou infecciosas (erliquiose), por fármacos ou intoxicações (estrógenos, sulfadiazina e
antiinflamatórios não esteroidais), e reações pós-vacina em cães após a vacina
contra cinomose e parvovirose (FERREIRA NETO et al., 1981).
Outra causa de trombocitopenia é a remoção acelerada de plaquetas, pela
trombocitopenia imunomediada primária, que tem predisposição racial, acomete
mais cães das raças Cocker, Old English Sheepdog, Pastor Alemão e Poodle e está
associada com a presença de anticorpos anti-plaquetários, que causam destruição
acelerada de plaquetas pelos macrófagos do sistema mononuclear fagocitário; e a
trombocitopenia imunomediada secundária, que é a causa mais comum de
trombocitopenia em cães, está associada a condições de base, dentre as quais
doenças auto-imunes sistêmicas como o lúpus eritematoso sistêmico, a anemia
hemolítica imunomediada, a artrite reumatóide e o pênfigo; neoplasias hematógicas
ou metastáticas; doenças infecciosas; infecções por protozoários (leishmaniose e
babesiose); dirofilariose e histoplasmose (FERREIRA NETO et al., 1981).
A trombocitopenia pode ainda ser causada também pelo seqüestro de
plaquetas pelo baço. O baço pode armazenar cerca de 75% das plaquetas
circulantes, e em condições de esplenomegalia, pode ocorrer trombocitopenia
transitória, assim como em casos de stress. A endotoxemia pode causar acúmulo de
plaquetas no baço. (FERREIRA NETO et al., 1981).
20
Segundo Rebar et al. (2003), o estabelecimento do diagnóstico é feito por
exclusão. Deve-se descartar a pseudotrombocitopenia decorrente da agregação
plaquetária, que produz uma falsa contagem baixa de plaquetas. A presença de
esplenomegalia sugere a existência de um processo secundário, já a anemia sugere
a presença de doença concomitante, devem ser ainda consideradas a exposição a
fármacos, infecção, vacinação recente, neoplasias ou transfusão sangüínea.
A inoculação experimental de E. canis não desenvolve sempre a
trombocitopenia. Nenhum dos nove cães inoculados com a cepa brasileira de E.
canis desenvolveu trombocitopenia durante quatorze semanas de observação por
Almosny (1998), considerando que trombocitopenia se desenvolveu em quatro
semanas em quatro cães inoculados com uma cepa brasileira diferente de E. canis
por Castro et al. (2004).
2.7.2 Identificação direta do parasito
A identificação dos microorganismos em preparados citológicos ocorre em
baixa freqüência, e as mórulas ou inclusões intracitoplasmáticas de E. canis (figura
01) aparecem mais comumente na fase aguda ou de disseminação da doença,
sendo encontradas apenas durante as duas primeiras semanas após a infecção, e
algumas vezes, a proporção de células infectadas, chega a ser menor do que 1%.
Pode-se definir o diagnóstico com base no achado de inclusões em células
mononucleares do sangue de animais infectados sendo difícil algumas vezes
demonstrar a forma típica da mórula uma vez que o parasita está presente em
pequeno número no sangue, o que pode levar a resultados falso negativos. A
identificação de mórulas intracelulares documenta a infecção por Ehrlichia, mas não
é comum nas cepas monocitotrópicas, uma vez que o nível de infecção dos
monócitos do sangue é baixo, sendo as espécies de erlíquias que causam a EMC
observadas com menor freqüência (ACCETTA, 2008).
Mais comumente são visualizados os corpúsculos de inclusão do que as
mórulas em cães infectados, na fase febril. Os microrganismos são raramente
encontrados durante a fase de portador, tornando difícil o diagnóstico, se não
impossível. Este também é dificultado devido à semelhança de grânulos
21
citoplasmáticos que geralmente estão presentes em leucócitos não parasitados com
corpúsculos elementares solitários, através da coloração de Giemsa. Logo,
recomenda-se que sejam feitos esfregaços finos, de preferência de sangue capilar
das margens das orelhas, havendo uma maior freqüência de células infectadas na
borda da extensão sanguínea, estando às inclusões geralmente presentes em
monócitos, podendo também ser encontradas em neutrófilos, linfócitos ou
eosinófilos, a depender da cepa envolvida. Uma única célula pode conter múltiplas
mórulas em vários estágios de desenvolvimento, mas dificilmente estas são
encontradas na fase crônica da doença (ACCETTA, 2008).
Normalmente o diagnóstico da infecção de A. platys é realizado pela detecção
de inclusões basofílicas dentro de plaquetas em esfregaços de sangue total (figura
01) ou de papa de leucócitos. Entretanto, maior atenção deve ser dada a este tipo
de diagnóstico, uma vez que corpúsculos de inclusão de E. canis podem ser
observados em plaquetas (DAGNONE et al., 2004; SOUZA et al., 2004). É
importante ressaltar também a ocorrência cíclica de plaquetas parasitadas por A.
platys (CHANG et al., 1996).
B
A
Figura 01.
Esfregaço sanguíneo para diagnóstico de hemoparasitoses. Em (A)
inclusões intracitoplasmáticas de A. platys em plaquetas de um cão; em (B) mórula
de E. canis em linfócito de um cão. Fonte: Laboratório de Doenças Parasitárias da
UFRPE, 2011.
22
2.7.3 Diagnóstico indireto
A infecção por E. canis resulta no desenvolvimento de anticorpos específicos,
e a maior parte dos testes laboratoriais comerciais e kits comerciais para diagnóstico
utiliza reagentes que detectam anticorpos contra E. canis no soro e são usados
geralmente como procedimento de triagem em animais suspeitos de erliquiose.
Quatro métodos de detecção sorológica para diagnóstico de erliquiose canina foram
comparados e determinou-se a Reação de Imunofluorescência Indireta (RIFI) como
o melhor ensaio (BÉLANGER et al., 2002). Desde a sua descrição por Ristic et al.
em 1972, a RIFI tem sido o método sorológico mais amplamente utilizado para o
diagnóstico da erliquiose canina e é considerado o teste padrão ouro, indicando
exposição à Ehrlichia spp. (RISTIC et al., 1972; WANER et al., 2001).
O Grupo de estudos doenças Infecciosas do Colégio Americano de
Veterinários Especializados em Medicina Interna (ACVIM) sugere que títulos de
anticorpos anti-E. canis testados por RIFI que estão entre 1:10 e 1:80 devem ser
retestados em duas a três semanas, uma vez que grande é a chance de o teste ter
fornecido um resultado falso positivo. Caso sejam detectados anticorpos séricos
contra E. canis em um cão apresentado sintomatologia compatível com com
erliquiose, o diagnóstico presuntivo deve ser realizado e o tratamento apropriado
deve ser iniciado. No entanto, o estabelecimento do diagnóstico de infecção erliquial
não deve ser estabelecido somente com base na detecção de anticorpos, uma vez
que
pode
ocorrer reação
cruzada
e
porque
alguns
cães podem
estar
subclinicamente infectados. Os resultados negativos do teste não excluem
completamente a erliquiose da lista dos diagnósticos diferenciais, uma vez que
pode-se detectar a doença clínica antes da soroconversão, como também pelo fato
de que nem todas as Ehrlichia spp. induzem anticorpos que são consistentemente
detectados nos ensaios para pesquisa e E. canis (NELSON; COUTO, 2010).
Apesar de a RIFI ser um teste sensível e específico, não apresentando
reação cruzada com A. platys e R. rickettsii, a reação cruzada com as outras
espécies do gênero Ehrlichia pode representar um sério problema na interpretação
dos resultados, além de não
permitir a diferenciação da espécie de Ehrlichia
infectante, particularmente entre aquelas do mesmo genogrupo (NEER et al., 2002).
23
Cães sadios inoculados experimentalmente com E. canis apresentaram sinais
clínicos, conversão sorológica e presença de antígenos erliquiais 15 a 20 dias após
a inoculação (WANER et al., 1996). Assim como outras técnicas sorológicas, a RIFI
não permite identificar a fase da doença na qual o animal se encontra, de forma que
um título positivo apenas demonstra que o cão foi exposto ao agente em algum
momento (WOODY; HOSKINS, 1991).
Como para E. canis, as técnicas sorológicas são bastante utilizadas para o
diagnóstico da Anaplasmose, entretanto a inabilidade de se distinguir infecção ativa
de infecções anteriores é um dos maiores empecilhos deste tipo de diagnóstico.
Anticorpos séricos podem ser identificados por RIFI, a chance de ocorrer reação
cruzada com E. canis é mínima, mas anticorpos para A. platys podem ser
detectados em ensaios sorológicos para A. phagocytophilum. Em casos agudos, os
resultados dos testes de anticorpos podem ser falsamente negativos e então, pode
ser necessário repetir o teste após duas a três semanas para confirmar a exposição
(NELSON; COUTO, 2010).
Além da RIFI, outras técnicas sorológicas como dot Elisa - Imunocomb, Elisa
utilizando antígeno recombinante e immunoblotting, têm sido desenvolvidas e podem
ser úteis na determinação de imunoglobulinas, no entanto, deve-se ter o cuidado de
realizar uma interpretação adequada (ACCETTA, 2008).
2.7.4 Reação em Cadeia da Polimerase (PCR)
A PCR está facilitando o diagnóstico das doenças erliquiais e tem auxiliado na
classificação taxonômica destes e de outros agentes infecciosos. É um método
eficaz e extremamente sensível para detectar a presença de Ehrlichia spp. em
animais infectados, auxilia na identificação de carrapatos ou outros artrópodes que
podem servir de vetores para as doenças erliquiais (PANCHOLI et al., 1995);
distingue quais pacientes permanecem com infecção persistente, e quais animais
com
altos
títulos
na
imunofluorescência,
foram
tratados
com
sucesso
(BREITSCHWERDT et al., 2004; SUKASAWAT et al., 2000). A PCR também auxilia
na detecção de novas cepas ou variantes de espécies (BAKKEN et al., 1994) e
permite a detecção precoce de infecção.
24
Como existem reações cruzadas em exames sorológicos dentro do mesmo
genogrupo e, potencialmente entre genogrupos, a identificação da espécie pode não
ser estabelecida na maioria dos estudos clínicos que utilizem apenas a sorologia. O
teste sorológico também não é capaz de distinguir entre infecção aguda e exposição
prévia. A identificação de espécies através da PCR é importante, porque permite
determinar a espécie presente, bem como a presença de co-infecção por duas ou
mais espécies (SUKASAWAT et al., 2000).
De acordo com um estudo conduzido por Harrus et al. (1998) foi demonstrado
que o DNA extraído de aspirados esplênicos é a melhor fonte para uma amostra
para PCR, afim de diagnosticar o estado portador de E. canis durante a erliquiose
subclínica. Pode-se obter um resultado positivo na PCR a partir de quatro dias pósinfecção (PI), o que indica infecção, ao contrário de um resultado positivo na RIFI,
que apenas indica exposição prévia (NEER et al., 2002). A PCR é um teste
altamente sensível e específico para a detecção de níveis muito baixos de E. canis
(IQBAL; RIKIHISA, 1994), sendo este método mais sensível do que o isolamento em
cultivo celular (McBRIDE et al., 1996).
Um novo isolado de A. platys usando microscopia eletrônica e PCR foi
caracterizado por Mathew et al. (1997) que indicaram em seus resultados que a
PCR pode ser uma ferramenta útil no diagnóstico da infecção por A. platys e ainda
verificaram nas avaliações hematológicas diárias um alto grau de trombocitopenia
imediatamente após o pico da parasitemia. No entanto, os resultados dos testes com
anticorpos e da PCR isoladamente, não podem ser utilizados para comprovação da
doença clínica associada à infecção por A. platys, uma vez que a maior parte dos
cães infectados apresentam infecção subclínica e as síndromes associadas à
infecção possuem diversas outras causas (NELSON; COUTO, 2010).
Os ensaios de PCR estão atualmente disponíveis comercialmente e podem
ser utilizados para detectar o DNA específico do organismo a partir de sangue
periférico, podendo também ser realizados nos fluidos articulares, humor aquoso,
líquor e amostras de tecido. No entanto, semelhante à sorologia não existe ainda
nenhuma padronização entre os laboratórios e o controle de qualidade insuficiente
pode levar a resultados positivos falsos ou negativos falsos, logo, o Grupo de
Estudos de Doenças Infecciosas do ACVIM sugere o uso da PCR em conjunto com
25
a sorologia, e não em substituição da mesma. Resultados negativos na PCR do
sangue podem ocorrer em decorrência de tratamento com antibióticos em um curto
espaço de tempo, dessa forma, as amostras de sangue devem ser retiradas para o
teste antes do tratamento e colocadas em tubos contendo ácido etilenodiamino tetraacético (EDTA) (GAL et al., 2008).
2.7.5 Cultivo celular
As erlíquias de uma forma geral são de difícil cultivo (RIKIHISA et al., 1991).
Ehrlichia canis pode ser cultivada in vitro em linhagem de células monocíticas
oriundas de seus hospedeiros naturais ou em linhagens de células de outros
mamíferos. A partir de células de um cão com histiocitose maligna foi estabelecida a
linhagem contínua de células caninas DH82 (cepa Oklahoma) e é a linhagem
utilizada nos testes de RIFI. Desde o desenvolvimento de um método in vitro para
cultivar Ehrlichia canis, por Nyindo et al. (1971), vários relatos têm sido feitos por
outros autores.
O objetivo do cultivo celular consiste em amplificar o número de corpúsculos
erliquiais em um espaço de tempo relativamente curto. Contudo, na rotina clínica, o
isolamento por cultivo é laborioso e impraticável nos laboratórios de microbiologia
clínica, pois leva de 14 a 34 dias para fornecer resultados, tendo baixa
produtividade, além de requerer ambientes e técnicas de cultivo apropriadas, e
consistir em um procedimento caro. Para que se obtenha sucesso com esta
metodologia torna-se necessário que se leve em consideração alguns requisitos,
como o estágio de infecção em que se encontra o animal, a presença de linhagens
de células específicas ou a necessidade de lavagens peritoniais repetidas, a fim de
se obter as células infectadas. São igualmente susceptíveis a infecção por E. canis.
tanto macrófagos de cães obtidos através de lavagens peritoniais sucessivas quanto
monócitos de sangue periférico, podendo-se detectar as células infectadas 60 horas
após a inoculação, e a replicação se torna evidente dos 12 aos 18 dias (ACCETTA,
2008).
As principais anormalidades laboratoriais observadas em cães com infecção
por E. canis encontram-se resumidas na Tabela 02.
26
Tabela 02. Anormalidades laboratoriais associadas à infecção por Ehrlichia canis.
Estágio da infecção
Anormalidade
Aguda
Trombocitopenia
Leucopenia seguida de leucocitose por neutrofilia e
monocitose
Mórula
Anemia regenerativa ou arregenerativa
Títulos de Ehrlichia variáveis
PCR positivo
Subclínica
Hiperglobulinemia
Trombocitopenia
Neutropenia
Linfocitose
Monocitose
Título positivo de Ehrlichia
PCR positivo
Crônica
Monocitose
Linfocitose
Trombocitopenia
Anemia não regenerativa
Hiperglobulinemia
Hipoceluraridade de medula óssea
Plasmocitose de medula óssea/baço
Hipoalbuminemia
Proteinúria
Gamopatia policlonal ou monoclonal de imuonoglobulina G
Pleocitose de células mononucleares de fluido
cefalorraquidiano
Poliartrite supurativa não séptica
Título positivo de Ehrlichia
PCR positivo
Fonte: adaptado NELSON; COUTO, 2010.
27
2.8- DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
A infecção por E. canis e A. platys desencadeiam sinais clínicos parecidos e
bastante inespecíficos, tais como febre, apatia, anorexia, palidez de mucosas
petéquias e equimoses. Dessa forma, diversas enfermidades podem mimetizar o
quadro comumente observado na erliquiose canina. Logo, deve-se ter o cuidado de
realizar o diagnóstico diferencial de doenças imunomediadas de natureza idiopática,
secundária a drogas (corticóides), infecciosas (cinomose, leishmaniose visceral),
outras hemoparasitoses (babesiose, hepatozoonose, febre maculosa das montanhas
rochosas), neoplasias (mielomas múltiplos), intoxicação por estrógenos, reação
vacinal, dentre outras.
2.9- TRATAMENTO
A localização intracelular de alguns microrganismos é um fator limitante na
eficácia da terapia anti-bacteriana dificultando a erradicação destes patógenos de
hospedeiros infectados Entre as drogas eficazes no tratamento para erliquioses, as
tetraciclinas e as tetraciclinas semi-sintéticas (doxiciclina) estão entre as que têm
maiores probabilidades de eliminar o agente (AMYX et al., 1971; BREITSCHWERDT
et al., 2004) e são utilizadas na terapia tanto de seres humanos como de animais.
A resposta clínica ao tratamento com doxiciclina na fase aguda é rápida.
Assim como outras ciclinas, esta exibe uma atividade bacteriostática se ligando aos
ribossomos bacterianos, danificando a síntese protéica. As bactérias exigem a
proteína com a finalidade de inibir a fusão fagolisossomal dentro dos monócitos
contaminados (BROUQUI; RAOULT, 1991). A atividade bacteriostática depende da
duração em que as concentrações da droga permanecem acima da concentração
inibitória mínima (DAVOUST et al., 2005).
A tetraciclina (22 mg/kg, três vezes ao dia, por 14 dias, via oral) ou doxiciclina
(10 mg/kg por dia, por 14 dias, via oral) representa o tratamento de escolha para
erliquiose (BREITSCHWERDT, 2004), mas alguns autores dizem que esta duração
do tratamento pode não ser suficiente, principalmente na fase crônica, e sugerem
até oito semanas de tratamento (WOODY; HOSKINS, 1991). Em um estudo
28
realizado em cães infectados experimentalmente, os carrapatos conseguiram
adquirir a E. canis ao parasitarem animais previamente tratados com 14 dias de
doxiciclina (SCHAEFER et al., 2007).
O Grupo de Estudos de Doenças Infecciosas do ACVIM atualmente
recomenda o uso da doxiciclina (10mg/kg VO) a cada 24 horas durante pelo menos
28 dias, e o monitoramento da resolução da trombocitopenia e da hiperglobulinemia
como marcadores da eliminação terapêutica do organismo, uma vez que os sinais
clínicos e a trombocitopenia devem ser rapidamente resolvidos.
Se as alterações clínicas não se resolverem em sete dias, outro diagnóstico
diferencial deve ser considerado.
Não se sabe ainda se a infecção erliquial é
totalmente eliminada após o tratamento e quanto à utilização da PCR no
monitoramento do tratamento recomenda-se que sejam tomadas algumas medidas,
dentre elas: duas semanas após o término do tratamento o teste de PCR deve ser
repetido, se o animal ainda estiver positivo, o tratamento deve ser mantido por mais
quatro semanas e o teste deve ser refeito; caso os resultados da PCR ainda estejam
positivos após dois ciclos do tratamento, uma droga alternativa anti-Ehrlichia deve
ser usada; se os resultados da PCR forem negativos, deve-se repetir o teste após
oito semanas e caso permaneçam negativos, provavelmente a terapêutica utilizada
conseguiu eliminar o agente (NELSON; COUTO, 2010).
O dipropionato de imidocarb é eficaz no tratamento da erliquiose,
principalmente em casos de co-infecção de duas ou mais erlíquias em cães ou com
infecção concomitante por Babesia spp (HARRUS et al., 1997). Alguns trabalhos
demonstraram que não há diferença de respostas clínicas entre cães tratados com
doxiciclina (10 mg/kg/dia por 28 dias), ou com imidocarb (5 a 7 mg/kg IM ou SC em
duas injeções com 15 dias de intervalo), ou com ambas as drogas simultaneamente,
apesar das contagens de plaquetas terem levado mais tempo para se normalizarem
nos cães que receberam imidocarb, quando comparados com os tratados com
doxiciclina (SÁINZ et al., 1996). Sousa et al. (2004) concluíram ser desnecessário
utilizar doxiciclina e imidocarb em conjunto para o tratamento da erliquiose canina.
Após a administração do imidocarb alguns pacientes desenvolvem dor no
local de inoculação da injeção, salivação, corrimento oculonasal, diarréia, tremores e
dispnéia. As quinolonas (ex: enrofloxacina, norfloxacina, ciprofloxacina) não são
29
eficazes para o tratamento da infecção por E. canis em cães. Embora as coinfecções possam comumente ocorrer, a presença de agentes como A.
phagocytophilum, A. platys e Leishmania infantum não interferem negativamente na
resposta terapêutica (MYLONAKIS et al., 2004).
Em um estudo conduzido por Breitschwerdt; Hegarty; Hancock (1998), cães
infectados
experimentalmente
e
não
tratados
eliminaram
a
infecção
espontaneamente, ou no mínimo ocorreu uma redução da erliquemia, a ponto do
microrganismo não ser detectado por cultivo celular, PCR ou mesmo em animais
transfundidos com o sangue destes cães.
Um resultado positivo no teste de RIFI exclui o cão de ser doador de sangue e
todos os esforços devem ser feitos a fim de eliminar o estado de portador. Os cães
doadores devem ser soro-negativos em duas amostras, com um mês de intervalo,
repetindo o exame sorológico anualmente (WOODY; HOSKINS, 1991).
O prognóstico de infecções por E. canis é bom para cães com erliquiose
aguda e para aqueles que apresentam erliquiose crônica este é de variável a
reservado, a supressão da medula óssea nesta fase da infecção pode não ser
responsiva por semanas a meses, ou não responder de nenhuma forma. Podem ser
administrados esteróides anabólicos assim como outros estimulantes da medula
óssea (ex: decanoato de nandrolona, oximetolona), no entanto, a probabilidade de
serem eficazes é baixa, pois geralmente há falta de células precursoras. Nos casos
agudos frequentemente a sintomatologia de febre, petéquias, vômito, diarréia,
epistaxe e trombocitopenia se resolve em poucos dias após o inicio da terapia.
Devido aos eventos imunomediados que resultam na destruição das hemácias ou de
plaquetas que geralmente ocorrem na erliquiose, recomenda-se a administração de
anti-inflamatórios ou de doses imunossupressoras de glicocorticóides para animais
agudamente afetados. Nesses casos a administração de prednisona (2,2 mg/kg VO
dividida a cada 12 horas durante os primeiros 3 a 4 dias após o diagnóstico) pode
trazer benefícios (NELSON; COUTO, 2010). Mesmo após o tratamento, o título de
anticorpos contra E. canis pode permanecer alto por vários meses e até anos.
Animais tratados com sucesso podem ser susceptíveis a uma nova infecção.
O tratamento da trombocitopenia cíclica segue as mesmas diretrizes do
tratamento para E. canis. A grande maioria dos clínicos recomenda o uso de
30
doxiciclina, administrada em doses de 5-10 mg/Kg VO a cada 12-24 horas durante
pelo menos 10 dias, mas ainda não se sabe da necessidade da administração desta
droga por 28 dias, a não ser nos casos onde houver co-infecção com E. canis. Podese fazer uso das tetraciclinas na dose de 22 mg/kg a cada 8 horas, sendo
recomendado este tratamento por um período de 2 a 3 semanas (NELSON;
COUTO, 2010).
2.10- PREVENÇÃO
A prevenção deve ser feita principalmente através do controle de carrapatos.
Os proprietários devem ser alertados do risco em potencial do parasitismo por
carrapatos, vetores de várias doenças, sendo por isso necessário seu constante
controle. Devido à grande especificidade de hospedeiro, R. sanguineus está
completamente adaptado ao ambiente do cão, sendo freqüentemente encontrado na
casinha do animal e nos orifícios das paredes (DAGNONE; MORAIS; VIDOTTO,
2001).
Como a transmissão do agente para o carrapato não ocorre de forma
transovariana, a eliminação deste nas próximas gerações de carrapatos deve ser
realizada através do controle dos carrapatos no ambiente ou pelo tratamento de
todos os cães. O Rhipicephalus somente pode transmitir a E. canis por
aproximadamente 155 dias, logo, se não for possível a realização de um controle
eficaz sugere-se tratar os cães com tetraciclina (6,6 mg/kg VO diariamente por 200
dias), pois durante este período os cães infectados não infectarão novos carrapatos,
e os carrapatos previamente infectados perderão a habilidade de transmitir o
organismo (NELSON; COUTO, 2010).
Atualmente os cães são mais facilmente tratados através da prevenção pela
aplicação tópica de fipronil, membro de uma classe relativamente nova de
inseticidas que revelou-se um excelente meio de prevenir este tipo de infestação. É
aprovado sob a forma de spray a 0,29% (Frontline Spray®) para utilização em cães e
gatos adultos e filhotes, como também spot-on (Frontline Top Spot®). Outros
produtos tópicos incluem as piretrinas e as permetrinas. Outra opção consiste na
utilização de colares contendo amitraz, clorpirifós, diazinon, metilcarbamato, naled
31
ou tetraclorvinfós. Quanto ao controle do R. sanguineus nas instalações, pode-se
realizar a aplicação de spray com diazinon (BOWMAN et al., 2006).
Encontra-se em progresso o trabalho para produzir vacinas contra carrapatos
que induzem o hospedeiro a produzir anticorpos que ao serem ingeridos pelo
carrapato durante o repasto tem a função de promover a lesão do intestino do
carrapato que se alimenta. Estas vacinas serão mais amplamente utilizadas à
medida que tornarem-se disponíveis para utilização em bovinos, cães e gatos
(WILLADSEN et al., 1995).
2.11- ASPECTOS ZOONÓTICOS
Sabe-se atualmente que a erliquiose é uma zoonose, que caracteriza-se por
febre, cefaléia, mal estar, trombocitopenia, leucopenia e aumento das enzimas
hepáticas. Casos fatais ocorrem em aproximadamente 5% dos pacientes humanos
com erliquiose monocítica (E. chaffeensis) e em 10% daqueles com a erliquiose
granulocítica. O reconhecimento de infecções com diferentes agentes etiológicos
ocorrendo simultaneamente é muito importante, uma vez que podem ter sinais
clínicos diferentes e não responder a terapia da forma esperada. Principalmente nos
casos em que a doença não é diagnosticada precocemente, o que retarda o início
da terapia adequada, a erliquiose pode ser fatal. Quase todas as espécies de
erlíquias podem acometer o homem e causar alguma sintomatologia. Também
podem ocorrer infecções por múltiplos agentes, podendo levar a uma sintomatologia
atípica e de difícil diagnóstico (DAGNONE; MORAIS; VIDOTTO, 2001).
Os cães e os seres humanos são infectados por E. canis, E. ewingii e E.
chaffeensis (BULLER et al., 1999). Além do R. sanguineus, poucas espécies de
carrapatos parasitam o cão no Brasil. Nas regiões endêmicas para a Febre
Maculosa brasileira (Rickettsia rickettsii) o Amblyomma cajennense é a espécie
predominante (DE LEMOS et al., 1997).
Embora não seja habitual, o carrapato R. sanguineus tem sido descrito,
recentemente, parasitando humanos no Uruguai, (VENZAL et al., 2003), Venezuela
(PEREZ et al., 2006), e Brasil (DANTAS-TORRES et al., 2006). Infecções por E.
canis (PEREZ et al., 2006) e o encontro de inclusões plaquetárias semelhantes a A.
32
platys
(TAMI;
TAMI-MAURY,
2004),
é
comum
tanto
em
pessoas
imunocomprometidas, devido à infecção pelo vírus da imunodeficiência humana
(HIV), quanto em indivíduos imunocompetentes. No entanto, quanto à infecção por
Anaplasma platys, Nelson; Couto (2010) relatam que não existe risco conhecido
para a saúde humana.
3- MATERIAL E MÉTODOS
3.1- LOCAL E PERÍODO
Durante o período de março a abril de 2011, foram obtidas amostras de sangue
venoso em EDTA de diversos cães de diferentes raças, ambos os sexos e de
diferentes faixas etárias, mediante solicitação médica, atendidos no Hospital
Veterinário Harmonia (HVH), localizado na cidade de Recife-PE, independentemente
destes apresentarem sinais clínicos sugestivos de hemoparasitoses. As amostras de
sangue foram direcionadas a realização de hemograma com pesquisa de
hematozoários pelo laboratório veterinário LaborVet vinculado HVH. As atividades
tiveram continuidade no Laboratório de Microbiologia e Imunologia Animal do
campus de Ciências Agrárias da UNIVASF.
3.2- ANÁLISES CLÍNICAS
Durante a consulta médica e exame clínico dos animais, estes eram observados
quanto aos sinais clínicos apresentados, como também se havia infestação por
ectoparasitas.
3.3- AVALIAÇÃO HEMATOLÓGICA
No hemograma, foram avaliadas as séries eritrocitárias, leucocitárias e
plaquetárias
de
acordo
com
Mayer
et
al
(1995).
Foram
consinderados
trombocitopênicos os animais que apresentaram valores inferiores a 200.000/µL
plaquetas. Os níveis plasmáticos de proteína total foram determinados por
refratometria.
33
3.4- DIAGNÓSTICO DIRETO
Dos cães encaminhados ao HVH, foram selecionados 70 animais que
apresentaram trombocitopenia. Esfregaços sanguíneos foram confeccionados
através da extensão do sangue total em superfície de lâmina seguida de coloração
por panótico rápido, as quais foram analisadas para o diagnóstico direto de Ehrlichia
canis e Anaplasma platys. As lâminas foram analisadas através de microscopia
óptica utilizando objetiva de imersão para visualização de corpúsculos de inclusão
ou mórulas em leucócitos e/ou plaquetas. A diferenciação das espécies de
hemoparasitos encontradas nas lâminas de esfregaço sanguíneo foi baseada no tipo
de célula parasitada e também na sua morfologia (MAYER et al.,1995).
3.5- EXTRAÇÃO DO DNA
Dentre os animais selecionados (n=70), 45 amostras de sangue foram
submetidas à extração de DNA. Estes animais foram os que apresentaram
trombocitopenia mais acentuada. O DNA foi extraído a partir de alíquotas de 200µL
de sangue total, utilizando o QIAmp DNA Blood Mini Kit (Qiagen ®), de acordo com
as instruções do fabricante. O DNA obtido foi utilizado como molde, visando à
realização do diagnóstico molecular do gênero Ehrlichia através da Reação em
Cadeia da Polimerase.
3.6- REAÇÃO EM CADEIA DA POLIMERASE
A amplificação do gene dsb característico do gênero Ehrlichia, utilizou os
oligonucleotídeos descritos na Tabela 03. As reações foram preparadas em volume
total de 25 μL, contendo 10 mM de Tampão de PCR 10X, 3 mM MgCl2, 0,4 mM de
cada deoxynucleotídeo, 2,5 U Taq DNA polimerase (Fermentas®), 0,6 µM de cada
primer, 40 ηg de DNA-amostra e água ultra-pura qsp para completar o volume final
da reação. O esquema de amplificação obedeceu à seguinte seqüência térmica e de
tempo: 95 °C por 3 minutos, seguido por 35 ciclos de desnaturação a 95 °C por 15
segundos, anelamento a 50 °C por 30 segundos e extensão a 72 °C por 30
34
segundos, com uma etapa de extensão final a 72 °C por 5 minutos. Os produtos
amplificados foram submetidos à eletroforese em gel de agarose a 1,5% corado com
brometo de etídeo e observados sob UV. As imagens das amplificações foram
registradas em aparelho para fotodocumentação (MBS).
Tabela 03. Iniciadores utilizados para detecção do gênero Ehrlichia.
Sequência 5’-3’
Primer
Dsb-330
GATGATGTTTGAAGATATSAAACAAAT
Dsb-720
CTATTTTACTTCTTAAAGTTGATAWATC
Pares de base (pb)
800
4- RESULTADOS E DISCUSSÃO
Dentre os animais avaliados por meio do diagnóstico direto, ou seja, através do
exame de esfregaço sanguíneo, em apenas 6% das amostras (04/70) foram
observadas estruturas compatíveis com corpúsculos iniciais, elementares ou
mórulas de Ehrlichia spp em leucócitos (Figura 02). É importante considerar que a
visualização microscópica de mórula de Ehrlichia spp. no interior de leucócitos
ocorre durante a fase aguda da doença e em aproximadamente 4% dos casos
(WANER E HARRUS, 2000), como também que a detecção de mórula de E. canis é
mais eficiente em esfregaço de sangue periférico (Castro, 1997), o que pode
justificar os resultados obtidos.
Em 24% dos cães (17/70) observou-se mórulas de A. platys em plaquetas, em
1% (01/70) pôde-se evidenciar ainda a presença de merozoítos de B. canis no
interior das hemácias e em 68% dos animais (48/70) não foram encontrados tais
estruturas, não sendo evidenciada infecção concomitante por estes agentes.
35
Figura 02. Percentual de animais positivos para Ehrlichia spp. e Anaplasma spp.
através do diagnóstico direto.
O diagnóstico laboratorial tem sido rotineiramente realizado através da
identificação direta destas estruturas morfologicamente compatíveis com mórulas de
E. canis e A. platys em amostras de sangue periférico associada a exames
hematológicos (NAKAGHI et al., 2008). Apesar da facilidade de execução, baixo
custo e rapidez de resultados (HARRUS et al., 1997), esse método diagnóstico tem
apresentado uma baixa sensibilidade. Recentemente, Mylonakis et al. (2003)
compararam o diagnóstico direto para E. canis a partir de diferentes tecidos, como
sangue periférico, capa leucocitária, aspirados de medula óssea e linfonodo, e
concluíram que o diagnóstico, a partir de sangue periférico, é o que apresenta a
menor sensibilidade quando comparado aos demais tecidos, desestimulando,
portanto, a utilização dessa técnica para diagnóstico. Porém, na rotina clínica em
animais de companhia, o diagnóstico ainda é firmado com base na associação entre
os sinais clínicos e os resultados de exames hematológicos.
Dos cães com infecção, 11 eram machos e 10 eram fêmeas. Com relação à
faixa etária, 02 tinham menos de um ano de idade, 10 entre um a quatro anos, 05
entre quatro a oito anos e 04 tinham idade superior a oito anos (Figura 03). Em um
estudo realizado por Ueno et al. (2009) foi constatado uma maior freqüência de
infecção em cães com idade até 12 meses (65%), justificando-se por um maior risco
dos animais adquirirem a infecção nessa faixa etária e apresentarem o agente
36
circulante, os quais possivelmente apresentavam-se na fase aguda da doença,
sendo acometidos geralmente em decorrência de uma alta contaminação ambiental
por carrapatos ocasionando exposição ao agente ainda nos primeiros meses de
vida. No entanto, Baneth et al. (1996) descreve maior prevalência em cães adultos
e idosos, associando ao fato de maior tempo de exposição destes ao hospedeiro
invertebrado e maior suscetibilidade para os cães idosos, o que realmente deve
ocorrer uma vez que, os resultados obtidos neste experimento corroboram com os
observados pelo autor.
Figura 03. Número de animais positivos para Ehrlichia spp. e Anaplasma spp. de
acordo com a faixa etária.
Os cães selecionados para o experimento foram de diferentes raças. Dentre os
que encontravam-se parasitados o maior número foi representado por 05 cães da
raça Yorkshire (24%), seguidos por 03 animais da raça Pastor Alemão (14%), das
raças Poodle, Rottweiler e Pinscher com 02 representantes cada (10%), seguidos
das raças Pastor Branco, Pastor Belga, Dálmata, Labrador, Basset hound e Boxer
representados por um integrante cada (5%) e um animal sem definição racial (SRD).
Segundo Harrus et al. (1997) os cães da raça Pastor Alemão apresentam maior
gravidade clínica quando infectados, no entanto, não são mais predispostos a
infecção. Os três cães desta raça com erliquiose não apresentaram sinais clínicos
severos. Jiménez – Coelho et al. (2008) ao realizarem um estudo com cães sem
definição racial, sugeriram o desenvolvimento de uma resistência destes animais a
37
infestação por carrapatos, infecção por erlíquia, e outros agentes erliquiais, devido a
menor exposição ao R. sanguineus nas ruas, uma vez que são parasitos bem
adaptados a ambientes internos.
Oito cães (38%) apresentavam infestação por carrapato no momento da
consulta veterinária, e treze (62%) apresentaram essa infestação anteriormente. A
prevalência de E. canis e A. platys é altamente dependente da distribuição do vetor
R. sanguineus, que possui grande ocorrência no Brasil (HOSKINS, 1991; LABRUNA;
PEREIRA, 2001), por ser um país com diversas áreas tropicais onde a condição
ambiental favorece a sobrevivência do vetor (COCCO et al., 2003). O parasitismo
por este agente tem sido apontado como principal fator de risco para a EMC
(TRAPP et al., 2006).
Dentre os principais sinais clínicos observados nos animais que apresentavam
infecção por E. canis e A. platys, verificou-se sinais clínicos inespecíficos, tais como
apatia,
inapetência, hipertermia, vômito e diarréia (Figura 04). Hipertermia é
observada em cães infectados em virtude do aumento na produção de interleucinas
(IL-1 e IL-6) pelas células apresentadoras de antígenos e pelas células B ou pela
presença de pirógenos exógenos produzidos pela bactéria (HARRUS et al., 1998;
CASTRO et al., 2004). Também foram evidentes nos animais mucosas pálidas, que
sugerem anemia, assim como manifestações hemorrágicas (petéquias, equimoses,
sufusões), que ocorrem secundariamente à trombocitopenia, disfunções plaquetárias
e presença de vasculites em múltiplos locais (LAKKAWAR et al., 2003), além de
esplenomegalia, concordando com os descritos por Harrus et al. (1997).
38
Figura 04. Principais sinais clínicos observados nos 21 cães com mórulas de
mórulas de Erhlichia spp. e Anaplasma spp.
Na avaliação hematológica, conforme pode ser verificado na figura 05, anemia
foi observada em 33% dos cães parasitados (07/21), sendo 86% do tipo normocítica
normocrômica (06/07) e 14% do tipo macrocítica normocrômica (01/07). Estes dados
corroboram com a observação de Almosny et al. (2000), de que a anemia
normocítica normocrômica é considerada uma alteração comum na erliquiose
canina, sendo que estes quadros anêmicos tendem a ser arregenerativos, com
diminuição da resposta medular diante dos estímulos eritropoiéticos, o que se deve
à supressão das séries eritróide, mielóide e megacariocítica na medula óssea,
principalmente na fase crônica da erliquiose canina, o que acarretaria baixa ou
nenhuma produção desses tipos celulares (BREITSCHWERDT, 1995).
Observou-se também leucocitose por neutrofilia e linfopenia em 33% das
amostras analisadas (07/21), leucopenia e linfocitose em 14% destas (03/21) e
monocitose em 19% dos animais infectados (04/21). De acordo com Harrus et al.
(1997) e Bulla et al. (2004), tais variações no eritrograma e leucograma ocorrem de
acordo com a fase da doença. Segundo Castro et al. (2004) as alterações
leucocitárias podem não ser bem evidenciadas até a quarta semana de infecção,
quando a leucopenia começa a ser importante, em virtude da supressão medular, e
39
embora a leucopenia tenha sido relatada como uma das alterações mais comuns
nos animais acometidos por Ehrlichia spp. no presente estudo essa alteração não foi
tão significante.
Figura 05. Principais alterações hematológicas evidenciadas nos 21 animais com
mórulas de Erhlichia spp. e Anaplasma spp.
Na análise da concentração protéica dos cães com infecção, observou-se
hiperproteinemia em 12 cães (57%), resultado similar aos observados na literatura,
que
enfatizam
que
a
hiperproteinemia
ocorre
em
função
de
uma
hipergamaglobulinemia, alteração comum na fase subclínica da erliquiose, quando a
titulação de globulinas se encontra elevada. Segundo Gould et al. (2000), esse
aumento da fração gama, induz uma hiperviscosidade sérica e exacerbação
hemorrágica por interferência física com as plaquetas e fatores da coagulação, além
de causar danos ao endotélio vascular e venoestase.
Todos os animais avaliados apresentavam trombocitopenia (plaquetas <
200.000/μL), principal achado hematológico freqüente em todas as fases da EMC
como também em animais que apresentam ETC, corroborando com as pesquisas
desenvolvidas por Moreira et al. (2003) e Gasparne et al. (2008) respectivamente,
sendo citado em muitos trabalhos na literatura que indicam a importância desta
variável hematológica para o diagnóstico presuntivo da doença em áreas endêmicas
(DAGNONE et al., 2003, MACIEIRA et al., 2005; BULLA et al., 2004).
40
A trombocitopenia canina é uma alteração comum nos achados laboratoriais de
cães parasitados por ectoparasitas, estando relacionada principalmente à destruição
de plaquetas por mecanismos auto-imunes, com diminuição da sobrevida e da
capacidade de agregação (MENDONÇA et al., 2005). No entanto, não deve ser
considerada um achado específico para a detecção da infecção por E. canis e/ou A.
platys, e mesmo em uma área geográfica de alta prevalência não pode ser utilizada
como único fator determinante no diagnóstico de erliquiose canina (MACIEIRA et al.,
2005).
Em dois dos cães com infecção por E. canis e em três por A. platys, foi
visualizado a presença de macroplaquetas, condizente com os achados de Harrus
(1997) que avaliou cães com trombocitopenia cíclica, comprovando que apesar da
tendência à trombocitopenia, há uma trombocitopoeise ativa. No entanto, a
preponderância de plaquetas grandes com granulações esparsas sugere aumento
da produção e liberação de plaquetas na circulação, sendo achadas ocasionalmente
em animais normais (JAIN, 1993).
Dos 45 cães avaliados através da PCR, em 13 (29%) foi constatada a presença
de DNA compatível com o gênero Ehrlichia no sangue total. Destes, em apenas 04
amostras houve a observação de mórulas de E. canis no esfregaço sanguíneo
(figura 04), podendo-se observar a maior sensibilidade da PCR em relação ao
exame direto. Em 09 amostras positivas não foi evidenciada a presença de inclusões
intracitoplasmáticas através do esfregaço sanguíneo, o que possibilita confirmar que
a PCR tem demonstrado alta sensibilidade e especificidade em animais infectados,
mesmo em baixas concentrações do micro-organismo na circulação sanguínea
(McBRIDE et al., 1996). Em 03 amostras positivas na PCR havia a presença de
mórulas de A. platys, o que pode significar a infecção concomitante por estes microorganismos. Co-infecções por A. platys e E. canis têm sido relatadas em diferentes
regiões do mundo, como China (HUA et al., 2000), Caribe (YABSLEY et al., 2008),
Venezuela (SUKSAWAT et al., 2001) e Brasil (SANTOS et al., 2009).
A aplicação de técnicas moleculares é importante, pois permite determinar a
espécie presente e co-infecções transmitidas pelos carrapatos (INOKUMA et al.,
2003). Dentre estas técnicas, a PCR (gene dsb) e a nested-PCR (16S rRNA),
realizadas por Labruna et al. (2007) e Nakaghi et al. (2008), demonstraram ser as
41
duas adequadas ao diagnóstico da EMC; no entanto, a nPCR é a única capaz de
diferenciar as espécies de Ehrlichia spp.
A freqüência de cães positivos pela PCR obtida neste estudo pode ter sido
subestimada, uma vez que a amostra analisada (sangue total) não é adequada para
cães que se encontram na fase subclínica da doença, devido à baixa bacteremia. Ao
avaliarem concomitantemente a sensibilidade desta técnica com amostras de
diferentes órgãos, tais como baço, medula óssea e sangue, Harrus et al. (2004)
constataram maior sensibilidade da técnica quando utilizadas amostras esplênicas, o
que pode ser explicado pelo fato de o baço ser o órgão que alberga o parasito antes
de sua eliminação do organismo. Dessa forma, mesmo com uma sensibilidade
reduzida em amostras de sangue total a PCR aumentou consideravelmente a
sensibilidade de detecção de Ehrlichia spp. quando confrontada aos resultados
observados através do diagnóstico direto (Tabela 04), e do ponto de vista prático o
diagnóstico realizado através do sangue apresenta maior praticidade quando
comparada com as amostras dos demais tecidos.
Bulla et al. (2004) confirmaram através da PCR que 84,1% dos cães com
trombocitopenia eram positivos para E. canis, enquanto que Macieira et al. (2005)
encontraram uma freqüência de 32,1% de positividade em cães trombocitopênicos
do Rio de Janeiro, resultado semelhante ao observado neste estudo e ao obtido por
Dagnone et al. (2003), onde apenas 19,7% dos cães com trombocitopenia
apresentaram-se positivos para E. canis através deste método de diagnóstico.
Tabela 04. Correlação entre as provas de detecção em lâmina e na PCR para
diagnóstico de Ehrlichia spp.
PCR
Diagnóstico direto
Total
Total
Positivo
Negativo
Positivo
04
00
04
Negativo
09
32
41
13
32
45
42
M 1 2 3 4 5 6 7
800 pb
Figura 04. Amplificação por PCR do gene dsb em amostras de sangue total obtido
de cães trombocitopênicos atendidos no HVH em Recife-PE. Onde: M: marcador de
massa molecular 100 pares de base (Ludwig biotecnologia); Linha 1: controle
positivo para Ehrlichia spp.; Linha 2-5: cães positivos para Ehrlichia spp.; Linha 6:
cão negativo; Linha 7: controle negativo.
43
5- CONCLUSÕES
Este trabalho permitiu concluir que as alterações clínicas e hematológicas
observadas nos cães com infecção por E. canis e A. platys são bastante
inespecíficas, assim como não há predisposição etária, sexual ou racial.
Manifestações clínicas como apatia, anorexia, letargia e febre devem ser
consideradas na suspeita da erliquiose canina, assim como de outras enfermidades.
Pôde-se observar que a trombocitopenia é um achado freqüente, mas não
exclusivo da doença, podendo aparecer em diversos quadros nosológicos,
indicando, portanto, a necessidade de um exame mais detalhado do paciente.
A realização do diagnóstico direto desses parasitos através de esfregaço
sanguíneo realizado preferencialmente a partir de sangue periférico, deve ser
realizado, mas com bastante critério, devido à possibilidade de confusão com
inclusões intracelulares inespecíficas, mostrando-se menos sensível que a PCR, que
conforme os dados aqui apresentados indicam ser uma importante ferramenta no
diagnóstico da erliquiose.
A presença dos sintomas aliado à avaliação laboratorial pode nos direcionar,
possibilitando um diagnóstico correto da doença e um tratamento eficaz.
44
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