INTRODUÇÃO O futuro perfil da humanidade é algo demasiado importante para ser desenhado apenas pelos diversos governos nacionais e pelos mecanismos oficiais de concertação mundial hoje existentes. Representando 1.300 Organizações Não Governamentais (ONGs) com atuação em 108 países, 3.180 cidadãos engajados no enfrentamento da crise ecológica que ameaça o planeta, e da crise social que condena à miséria a maioria das mulheres e dos homens, aceitaram, portanto, o desafio de imaginar e propor alternativas à iniqüidade de um modo de vida global em que, por exemplo, 20% da população, habitante do Hemisfério Norte, consome 80% dos recursos planetários e agradece com a emissão de 75% da poluição ambiental. Inscritos no Fórum Internacional de ONGs e Movimentos Sociais, realizado no Rio de Janeiro, em junho de 1992, estes poucos milhares de ativistas podem hoje submeter à apreciação pública os produtos do maior consenso jamais alcançado pela sociedade civil planetária, traduzido em 36 planos de ação aprovados e reunidos em quatro grupos principais. q q q q Tratados de cooperação: tomada de decisões, relatórios e monitoramento, partilha de recursos, código de conduta; Tratados econômicos: as estratégias econômicas alternativas, o comércio, a dívida , a corrupção; Tratados sobre o meio ambiente: as florestas, as biodiversidades, o clima, a agricultura sustentável. Tratados sobre os movimentos sociais: as mulheres, os jovens, os povos indígenas. Oficialmente representadas na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD) – convocada em 1989 e realizada em junho de 1992, também no Rio – as ONGs, reunidas no Fórum Internacional, parecem ter descoberto melhores caminhos e, apesar de aprofundarem o reconhecimento de preocupações regionais diferenciadas, não permitiram que estas inviabilizassem compromissos amplamente consensuais, em aberto contraste com os acordos e convenções assinadas pelos governos, que podem ser considerados tímidos quando cotejados com os desafios ambientais e sociais vistos em escala mundial. Este êxito relativo pode ser visto como um prenúncio de sucesso futuro na construções de um forte movimento mundial de ONGs, movimentos sociais, entidades de base e organizações similares empenhadas na criação e no desenvolvimento de novos padrões de eqüidade, participação e desenvolvimento sustentável para o planeta. Na química da futura cooperação, serão ingredientes essenciais a amizade e a confiança desenvolvidas nas reuniões de negociação; a tolerância que ensejou novas percepções e as confessadas mudanças de posições por parte de diversas ONGs na compreensão dos mecanismos de integração entre o meio ambiente e o processo de desenvolvimento. A saudável desconfiança, tradicional na comunidade de ONGs, quanto à centralização do poder e do processo de tomada de decisões, não constituiu obstáculo para o atendimento e o reconhecimento da necessidade da ação comum como condição de eficácia nas intervenções globais. A realização do Fórum Internacional consagra, por si só, os méritos e as possibilidades deste trabalho conjunto. Maior evento do Fórum Global, o encontro das entidades representativas da sociedade civil planetária ficou mais próximo de acontecer 11 meses antes, em Genebra, Suíça, com a criação de um Grupo de Trabalho Internacional, durante o 3º Encontro Preparatório da CNUMAD. Peter Padbury do Conselho Canadense de Cooperação Internacional, Maximo Kallaw do Fórum Verde das Filipinas e Liszt Vieira do Fórum Brasileiro de ONGs foram escolhidos para conduzir os trabalhos de uma coordenação compostas por 16 representantes de diferentes regiões do mundo. Durante o 4º Encontro Preparatório para a CNUMAD, 1400 ONGs se encontraram em Nova York, EUA, e já puderam antever as possibilidades abertas, dentro e fora das instituições por ações articuladas globalmente. No suporte desta ação política internacional alternativa, destaca-se o Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais, criando em maio de 1990 e voltado para o envolvimento das sociedade brasileira no processo preparatório da Eco 92. Em junho de 1992, após realizar oito encontros nacionais, o Fórum Brasileiro reunia cerca de 1200 entidades ambientalistas, de desenvolvimento, de ação social e cultural, movimentos sociais e associações profissionais. Co-responsável pela organização do Fórum Global realizado no Parque do Flamengo, Rio, é difícil imaginar a realização do Fórum Internacional sem a sua participação. Em contrapartidade, ganhou a sociedade civil brasileira com a melhor articulação de suas entidades, engajadas agora em um movimento social com dimensões que justificam plenamente a presente publicação dos tratados em língua portuguesa. Melhor organizados no plano internacional, cabe agora às ONGs e aos Movimentos Sociais manterem viva e tornarem eficaz a letra dos tratados aprovados, posto que a sua ação, junto com os grupos comunitários e os cidadãos de todos os países, constitui agora a melhor esperança de um futuro sustentável.