UNIVERSIDADE FEDERAL DO VALE DO SÃO FRANCISCO Colegiado de Arqueologia e Preservação Patrimonial TRATAMENTO DE ARTEFATOS ARQUEOLÓGICOS EM FERRO(Fe): RECUPERAÇÃO, CONSERVAÇÃO E RESTAURO PROF. DR. LEANDRO SURYA PETROLINA 2012 UNIVERSIDADE FEDERAL DO VALE DO SÃO FRANCISCO Colegiado de Arqueologia e Preservação Patrimonial TRATAMENTO DE ARTEFATOS ARQUEOLÓGICOS EM FERRO(Fe): RECUPERAÇÃO, CONSERVAÇÃO E RESTAURO Projeto de pesquisa apresentado à Fundação de Amparo a Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (FACEPE), Edital FACEPE 02/2012(PIBIC/FACEPE) como pré-requisito à obtenção da bolsa de iniciação científica. Área de conhecimento: Ciências Humanas e Sociais Aplicadas Proponente: Prof. Dr. Leandro Surya C de O Silva PETROLINA 2012 1. OBJETIVOS 1.1 Objetivo Geral Analisar e aplicar os métodos e as técnicas relacionadas a recuperação, conservação e restauro de artefatos produzidos em Ferro de coleções de sítios arqueológicos do estado de Pernambuco. 1.2 Objetivos Específicos Verificar e avaliar a efiência dos métodos e técnicas relacionados a limpeza galvânica e redução eletrolítica de baixa e alta amperagem para o tratamento de concreções e oxidações em amostras de artefatos coletados em ambiente não aquoso de sítios arqueológicos do tipo a céu aberto; Verificar e avaliar a efiência dos métodos e técnicas relacionados a limpeza galvânica e redução eletrolítica de baixa e alta amperagem para o tratamento de concreções e oxidações em amostras de artefatos coletados em ambiente aquoso de sítios arqueológicos do tipo marítimo; Identificar e desenvolver técnicas adequadas ao transporte e guarda de artefatos em ferro coletadas em ambiente aquoso salino; Contribuir para o incremento de métodos e técnicas ligados a gestão de coleções de materiais arqueológicos no Brasil; Servir como fonte de pesquisa para profissionais em áreas correlatas; 2. INTRODUÇÃO Este projeto de pesquisa tem como intuito analisar e aplicar os métodos e as técnicas relacionadas a recuperação, conservação e restauro de artefatos arqueológicos. O ferro (Fe) é o mais popular e o mais funcional dos metais utilizados pelo homem (RODGERS:2004). O ferro pode ser produzido basicamente por três técnicas: ferro gusa, ferro fundido e ferro forjado. O ferro gusa possui as técnicas mais rudimentares e seu fabrico se popularizou na Europa do século XIV. É produzido por minério de ferro adicionado de carvão e calcário. Normalmente possui até 5% de carbono o que o torna quebradiço, além de fósforo e enxofre que facilitam a oxidação. Por conta destas propriedades ele não é muito utilizado para a produção de ferramentas ou artefatos, sendo empregado, por exemplo, como lastro de embarcações, principalmente os navios de guerra (GOODWIN:1997). O ferro fundido é uma versão refinada do gusa. Ele contém uma alta concentração de carbono que varia entre 2% a 6%. É quebradiço, mas seu uso aparece em partes de máquinas, panelas, potes, tubulações, fogões, entre outros. A chave para se compreender a corrosão do ferro fundido numa perspectiva de conservação arqueológica é que o metal ao esfriar forma uma matriz de carbono, dando-lhe uma estrutura cristalina. Durante o processo de corrosão o ferro migra a partir desta estrutura, mantendo a forma do artefato. No entanto, pode restar do artefato apenas uma camada muito macia de grafite, significando, esta espécie de molde a única forma recuperá-lo. O ferro forjado ou ferro batido é a mais refinada versão do ferro, possui uma pequena quantidade de carbono até 0,15%. Dentre suas propriedades apresenta resistência, maleabilidade e ductibilidade. Em sua forma mais artesanal pode ser aquecido em forja para em seguida ser martelado em uma bigorna até atingir a forma pretendida (BEALER:1995). O ferro forjado, assim como o aço não aparece de forma abundante no registro arqueológico até Henry Court desenvolver técnicas associadas ao refino de grandes quantidades do metal no início de 1748 (RODGERS:2004). Artefatos feitos em aço podem ser distinguidos por sua coloração escura (próxima ao preto), sua dureza e peso. Tanto o ferro como o aço possuem propriedades magnéticas e conduzem corrente elétrica. Um dos efeitos mais comuns que o ferro apresenta é a corrosão, caracterizado pelo desprendimento de uma espécie de pó alaranjado [FeO(OH)] que se espalha facilmente onde esteja depositado. Em solos úmidos aerados este tipo de concreção torna-se uma massa amorfa de coloração marrom agregando areia e cascalhos. Esta concreção geralmente apresenta semelhança com a forma do artefato. Já para o ambiente subaquático este tipo de concreção é um pouco mais complexa e resulta no objeto completamente envolto por uma camada de carbonato de cálcio e com forma distinta do objeto, dificultando, desta forma, o seu reconhecimento. O ferro é mais instável em sua forma natural como um óxido. Quando transformado em algo próximo ao metal puro o ferro irá corroer na tentativa de retornar a sua forma original de óxido. Este fenômeno pode ser descrito a partir da seguinte reação: 4Fe0 + 2H2O + 3O2 → 4FeO(OH) Todavia, por observação durante séculos constatou-se (por exemplo, na substituição das cavilhas de embarcações feitas de cobre por outras feitas de metal) que existia uma taxa de corrosão muito alta para o ferro quando exposto a ambientes diversos. Com o entendimento destes processos percebeu os efeitos de acoplamento galvânico (com o contato de dois metais), do diferencial de corrosão por aeração – que a corrosão do metal para acontecer necessariamente não precisa ser de exposição a água e oxigênio, e do efeito deletério do ânion-cloreto nos metais. Resultando a compreensão que a corrosão passa por dois processos: A oxidação é o movimento dos elétrons tanto dentro quanto entre o metal e o íons livres do metal (suas partículas carregadas). A redução é o ajuntamento dos elétrons. Algo como se o metal se torna-se uma bateria com polos negativos e positivos. No lado positivo da batéria (+) (ou anodo) a reação poderia ser descrita pela seguinte reação: Anodo + 4e0 → Fe+2 + 2e02 + 4e- + 2H2O + Fe+2 → 2FeO(OH) + 2H+ Enquanto no polo negativo (-) (ou cátodo) seria descrito desta maneira: Cátodo O2 + 2H2O + 4e- → 4OH- 3. METODOLOGIA Atualmente existem diversas perspectivas teóricas em relação as formas de se abordar a recuperação e o restauro de artefatos arqueológicos. Nesta proposta optou-se por adotar uma perspectiva de “intervenção mínima e não tóxica” para a estabilização e controle das alterações causadas por concreções de óxidos em artefatos arqueológicos de ferro. Os artefatos arqueológicos que irão passar por tratamento de conservação fazem parte de diferentes coleções e estão sob a guarda da Universidade Federal do Vale do São Francisco – amostras de artefatos coletados em ambiente não aquoso de sítios arqueológicos do tipo a céu aberto; e da Universidade Federal de Pernambuco – amostras de artefatos coletados em ambiente aquoso de sítios arqueológicos do tipo marítimo. Existem basicamente três condições de intervenção em um artefato de ferro: a) Limpeza Galvânica – para artefatos pequenos (<=30 cm longitudinais) e que não apresentem concreções. b) Limpeza por redução eletrolítica de baixa amperagem c) Limpeza por redução eletrolítica de alta amperagem Os seguintes passos são necessários previamente a intervenção: 1. Identificar a amostrar e classificar de acordo com: i. Amostras pequenas sem a presença de concreções ou corrosão. ii. mostras armazenadas em água. iii. Amostras com concreções e processos avançados de corrosão. 2. Para as amostras do tipo i: a) Limpeza galvânica. b) Limpeza em água destilada. c) Desidratação. d) Aplicação de ácido tânico. e) Aplicação de proteção em cera. 3. Para as amostras do tipo ii: a) Limpeza em água destilada. b) Desidratação. c) Aplicação de ácido tânico. d) Aplicação de proteção em cera. 4. Para as amostras do tipo iii: a) Análise da concreção. b) Remoção da concreção por redução eletrolítica. c) Teste de clorídico. d) Limpeza em água destilada. e) Desidratação. f) Aplicação de ácido tânico. g) Aplicação de proteção em cera. 4.METAS E FASES DO DESENVOLVIMENTO DO PROJETO COM CRONOGRAMA Este projeto é divido em três fases: 1. Seleção de amostras – que irá tratar da escolha de artefatos em condições de conservação diferenciadas. Esta seleção pretende separar as amostras em quatro grupos baseados no estado do avanço da deteriorização do objeto, sendo dividido em uma escala de 0%, 25%, 50%, 75% e 100%. 2. Recuperação, conservação e restauro – as amostras receberão o tratamento adequado baseado seção anterior seguindo a metodologia apresentada anteriormente. 3. Acondicionamento e guarda – após o tratamento das amostras será preciso avaliar a maneira mais adequada de acondicionamento dos artefatos, principalmente no caso daqueles coletados em contexto subaquático, pois os mesmos por diversas vezes apresentam condições que exigem serem mantidos em meio aquoso. Dentre as metas do projeto pode-se destacar: A valorização da memória histórica por meio do estudo da cultura-material do estado de Pernambuco; O incentivo a educação patrimonial relacionada ao treinamento e a divulgação dos métodos e técnicas envolvidos no processo de recuperação, conservação e restauro; A manutenção e conservação do conjunto patrimonial de coleções arqueológicas relacionadas aos artefatos feitos em ferro; A formação de multiplicadores do saber técnico inerente aos elementos patrimoniais. O cronograma do projeto: Mês/ano Revisão de literatura Seleção das Processo Avaliação e Elaboração Elaboração Envio para de amostras a recuperaçã serem o, elaboração de ão em estudadas conservaçã referentes evento oe aos métos cientÍfico restauro e técnias da área dos empregado artefatos s X Set/2012 X X Out/2012 X X Nov/2012 X X X Dez/2012 X X X Jan/2013 X X X Fev/2013 X X X Mar/2013 X X X Abr/2013 X X Mai/2013 X X Jul/2013 X de artigo publicação comunicaç cientÍfico sugestões Ago/2012 Jun/2013 de e para revista participaçã da área o em eventos X X X X X 5. RELEVÂNCIA E IMPACTO DESENVOLVIMENTO CIENTÍFICO PERNAMBUCO DO PROJETO NO E TECNOLÓGICO DE A relevância deste projeto esta agregada a um conjunto maior que faz parte das responsabilidades das universidades ao garantir a guarda de coleções de materiais arqueológicos. Esta responsabilidade vai além de simplesmente “estocar” em reservas técnicas artefatos, vestígios, estruturas e ecofatos; ela esta conectada ao mantenimento e o estudo de um conjunto documental essencial para o entendimento histórico e cultural do povo brasileiro. Desta maneira, é preciso garantir as condições de preservação e conservação destes materiais. Neste intuito, o projeto visa contribuir diretamente por meio de duas frentes com diferentes impactos no desenvolvimento científico e tecnológico. A primeira destas frentes é a vertente material propriamente dita, os materiais recebem um tratamento relacionado a sua preservação patrimonial. O impacto é imediato no que envolve a garantia da existência desta cultura-material. Já do ponto de vista técnico-científico o impacto estará justamente na escolha de uma metodologia consagrada aplicada a um ambiente específico próprio dos nossos sítios arqueológicos. A segunda frente está no ensino crítico característico da iniciação científica que não apenas treina o estudante, mas também permite transformá-lo num multiplicador do saber técnico, científico e patrimonial. Nesta perspectiva o presente projeto teria impactos a curto, médio e longo prazo. A curto e médio prazo podemos associar estes impactos diretamente à formação dos estudantes, por meio de um entendimento maior das técnicas e uma aproximação com a literatura que disserta sobre o tema. Posteriormente, teríamos a contribuição para a comunidade acadêmica através da publicação de resultados deste trabalho. O impacto a longo prazo estaria associado à frutos mais profundos e fundamentais para a continuidade da ciência. 6. POSSÍVEL CONTRIBUIÇÃO AO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL DE PERNAMBUCO As contribuições sociais deste projeto envolvem o conhecimento da história de Pernambuco e do Brasil, envolvem uma perspectiva diferenciada por tratar-se não de documentos escritos como livros, mas sim da cultura-material e suas derivações diretamente envolvidas como a Educação Patrimonial e a Arqueologia. Uma possível contribuição ao desenvolvimento econômico de Pernambuco ocorrerá somente de maneira indireta. Isso se dará numa perspectiva ampla relacionada ao desenvolvimento de diferentes áreas como o turismo, exposições e musealização de coleções. No domínio acadêmico, esta pesquisa poderá servir de base para a realização de outras pesquisas em multiplas áreas de conhecimento e contribuir tanto tecnicamente como também em sua metodologia para teses de doutorado, dissertações de mestrado e outros trabalhos de iniciação científica. Vale lembrar ainda que estão previstos a elaboração de artigos científicos, abordando a relevância do tema, o que contribui para destaque social de Pernambuco em meio à comunidade de pesquisadores que abordam esta temática. 7. DESCRIÇÃO DE APOIO FINANCEIRO E/OU INSTITUCIONAL QUE ASSEGURE A VIABILIDADE DE EXECUÇÃO DO PROJETO O apoio Institucional que viabilizará a execução do projeto será da Universidade Federal do Vale do São Francisco e contará com as instalações físicas, computadores, impressoras, reagentes e demais materiais de consumo. 8.BIBLIOGRAFIA BEALER, Alex. Ther art of blacksmithing. Castle Books: Edison, NJ, 1995. CASTRO, Ana Sampaio. FONSECA,Júlia. SEBASTIAN,Luís. A componente de conservação cerâmica na intervenção arqueológica no Mosteiro de S.João de Tarouca:1998-2002. REVISTA PORTUGUESA DE Arqueologia.volume 7.número 1.2004. Cronyn, J. M. The Elements of Archaeological Conservation. Routledge, London, 1990 GOODWIN, Peter. The Influence of Iron in Ship Construction: 1660 to 1830. Third International Conference on the Technical Aspects of the Preservation of Historic Vessels. San Francisco Maritime National Historical Park: San Francisco, 1997. Eriksen, E., and S. Thegel. 1966. The Conservation of Iron Recovered from Sea Water. Tojhusmuseets Skrifter 8. Copenhagen. Evans, U. R. 1963. An Introduction to Metallic Corrosion. St. Martin's Press, New York. Farrer, T. W., L. Biek, and F. Wormwell. 1953. The Role of Tannates and Phosphates in the Preservation of Ancient Iron Objects. Journal of Applied Chemistry 80-84. FERNADES, António Pedro Batarda (2004) O Programa de Conservação do Parque Arqueológico do Vale do Côa: Filosofia, objectivos e acções concretas. Revista Portuguesa de Arqueologia, 7 (1). pp. 5-37. ISSN 0874-2782 [Article] Hodges, H. W. M. 1968. Basic Equipment and Processes. The Conservation of Cultural Property. Museum and Monuments 11:80-90. UNESCO, Paris. Katzev, M. L., and F. Van Doorninck. 1966. Replicas of Iron Tools from a Byzantine Shipwreck. Studies in Conservation 11(3):133-142. Montlucon, J. 1986. Electricity: A New Implement Archaeology. Paper delivered at the Annual Conference on Underwater Archaeology, 1986 Meeting, Sacramento, California. _____. 1987. Electricity as a Means of Stripping Archaeological Objects. World Scientist 82-86. Moyer, C. 1988. The Duco Dialogues. The Society for Historical Archaeology Newsletter 21(4):8-10. Muncher, D. A. 1988. Composite Casting of Partially Degraded Iron Artifacts. Studies in Conservation 33:94-96. Noel Hume, I. 1969. Historical Archaeology. Alfred A. Knopf, New York. North, N. A. 1987. Conservation of Metals. In Conservation of Marine Archaeological Objects, edited by C. Pearson, pp. 207-252. Butterworths, London. Pearson, C., ed. 1987. Conservation of Marine Archaeological Objects. Butterworths, London. _____. 1972. The Preservation of Iron Cannon after 200 Years under the Sea. Studies in Conservation 17(3). RODGERS, B. The Archaeologist's Manual for Conservation: A Guide to Non-Toxic, Minimal Intervention Artifact Stabilization. The Kluwer international series on computer supported cooperative work, 2004.