REPORTAGEM Projeto Som na Praça a revolução cultural está com força total A terceira edição do projeto realizado em Vitória da Conquista, no sudoeste da Bahia, consolida proposta de democratização musical e levanta a bandeira contra o “jabá” Danielle Kiffer [email protected] D A idéia do projeto Som na Praça surgiu um tanto quanto despretensiosa, no ano de 2006, quando a organização de uma das principais feiras de agronegócio da Bahia convidou o empresário Nozinho Quadros para montar um pequeno palco para entreter o público do evento com apresentações de artistas locais. Diante da situação precária na qual se encontravam os músicos pela falta de emprego, Nozinho viu ali uma forma de abrir um espaço e mostrar a importância e a qualidade existentes na música de cada um. “Deixar de incentivar a cultura no geral é matar toda Foto: Marcelo Guedes / Divulgação esde a sua criação, o Som na Praça, movimento pelo fim do “jabá” e democratização da música brasileira, vem ganhando força significativa. Além de mostrar a grande diversidade musical existente na Bahia, mais precisamente em Vitória da Conquista, onde o movimento nasceu, o Som na Praça trouxe mais vida à música para os artistas locais. Neste ano, na terceira edição da apresentação do projeto, a TVLocal36, uma emissora da Internet e a rede de TV Net Conquista transmitiram os shows. Além do grande público que prestigiou o evento pessoalmente, a audiência na web aumentou em 20%. 94 www.backstage.com.br REPORTAGEM uma cadeia de indústrias, lojas, representantes, estúdios, gravadoras, rádio e TV. Dentro do projeto, descobri que muitos dos músicos da minha cidade não se conheciam e um dos motivos era que muitos já haviam desistido dos seus sonhos, pois não tinham onde tocar”, lamenta o empresário. Os músicos abraçaram a idéia, abrindo mão do cachê em troca dos CDs e DVDs e da divulgação, e o projeto tomou corpo desde então. O sucesso de público aumentou e o número de atrações também. “A partir deste princípio, vimos que precisávamos tomar outras atitudes e, já em 2007, fechamos uma parceria com a TVLocal36 (afiliada da Rede NGT) e passamos a transmitir ao vivo os shows e gravar os DVDs durante os nove dias de evento. Chegamos a fazer cinco DVDs em um único dia, um trabalho muito cansativo, mas o resultado foi proveitoso”, afirma Nozinho. DIVERSIDADE MUSICAL Em 2008 a estrutura dobrou e uma das grandes características do Som na Praça foi a diversidade musical. O evento contou com a participação de artistas conceituados como o Trio Sotaque, grupo pernambucano de Nozinho Quadros música instrumental, por exemplo. Foram 25 shows apresentados durante nove dias, incluindo rock, sertanejo, música instrumental e até músicas lusitanas em concertos de acordeons. O forrozeiro e deputado federal Edigar Mão Branca (PV-BA), que também se apresentou, acredita que o projeto precisa ser divulgado e seguido: “É necessário que as pessoas tomem consciência e abracem essa iniciativa e outras dessa mesma natureza”. A terceira edição manteve o formato dentro da programação da exposição agropecuária oferecendo aos artistas a gravação de CD e DVD individuais, além da coletânea oficial do evento. As novidades ficaram por conta das transmissões em tempo real via Internet e na televisão por meio da Rede NGT, que superou as expectativas de audiência, de acordo com o responsável geral pela TVLocal36, Eduardo Rodrigues. Uma amostra dos efeitos desta investida pela democratização da música foi dada durante os shows do Som na Praça, que mais uma vez atraiu um público cada vez mais interessado em música de qualidade, abrindo portas para jovens artistas como a cantora Mariana Macedo, que canta música regional e o grupo Brincando de Cordas, cujo estilo musical predominante é o chorinho. “Agradeço pelo espaço proporcionado pelo projeto Som na Praça, que representa oportunidade e respeito. Todo artista tem o desejo de mostrar seu trabalho e eu me sinto satisfeita Equipamentos de áudio Sistema de PA: Line Array Staner LA-900 Subwoofers - BL 18 House Mix: Console Behringer DDX 3216 GA 32112 Monitores de Palco: Monitor Ativo BL AUDIO Sistema Eartech BL AUDIO Palco: Amplificador de guitarra e baixo Meteoro Microfones: Shure Beta e Super Lux Sistema de Gravação: Firewire M-AUDIO 1814 Nuendo 3 Ely Pinto, artista que fez muito sucesso com o cover de Raul Seixas no evento www.backstage.com.br 95 REPORTAGEM por poder apresentar a minha música”, revela a cantora. De acordo com o bandolinista do grupo Brincando de Cordas, Rafael Barreto, há grande importância em participar deste movimento. “Tocar aqui é muito bom para o grupo, pois representa uma vitrine muito grande, somos vistos por muita gente de fora, além da possibilidade da produção de DVD que também é muito importante”. ÁUDIO E ILUMINAÇÃO A empresa responsável pela sonorização do evento foi a K Sonorização. De acordo com o técnico responsável, o Naelson Brito “Katinguerin”, não houve muita dificuldade em fazer a sonorização. “O principal empecilho em fazer a sonorização foi a cobertura da feira com toldos muito baixos, tornando necessário colocar malhas embaixo de todos os toldos a fim de se obter um som homogêneo. Uma das características do projeto Som na Praça é não fazer correções em estúdio do que foi gravado, portanto é preciso haver um grande sincronismo entre toda a equipe”, revela o técnico. Para a sonorização, foi utilizado um sistema de PA Line Array da Staner LA-900, mesa digital DDX 3216 da Behringer, amplificadores de guitarra e baixo da Meteoro e sistema de gravação Firewire M-AUDIO 1814 Nuendo 3, entre outros equipamentos. Para a iluminação, o profissional Itamar Rocha, da Itamar Iluminações, buscou um bom aproveitamento de luz no espaço disponível no palco. 24 PAR 64, 12 MAC 250, 16 PAR 36 e 24 canais de dimmer foram alguns dos aparatos que ajudaram a dar mais brilho ao evento. “Agradeço especialmente à empresa Browmaster, do técnico de áudio Edilton ‘Irmão’, que gentilmente cedeu alguns equipamentos de áudio e vídeo para a realização do evento”, revela Nozinho. A UNIÃO FAZ A FORÇA A adesão ao JABÁSTA, movimento pelo fim do “jabá” liderado por artistas como BNegão, foi outra inovação que reforçou o caráter democrático do projeto, incentivando a união dos músicos contra esta prática de privatização cultural. Para Luciano 96 www.backstage.com.br Magno, guitarrista do Trio Sotaque, o Som na Praça é um exemplo. “Este projeto oferece, de forma democrática, uma maneira interessante de levar música de qualidade ao público que não teria acesso ao que é produzido por artistas independentes pelas vias convencionais de comunicação. O ‘jabá’ pode ser combatido a partir da inclusão de manifestos deste tipo em todas as cidades possíveis”. Segundo Nozinho, a mobilização nacional está apenas começando: “Eu mandei o nosso projeto para o movimento e em breve vamos articular ações mais efetivas em todo o Brasil, porque as ações que estão sendo feitas localmente vão repercutir no país inteiro”, avisa. Após o sucesso de mais uma edição, o Som na Praça segue em sua versão itinerante com apresentações no maior shopping center da região, além de outras ações como a webradio que disponibilizará as músicas dos artistas participantes e o site oficial do projeto. Por enquanto, as coletâneas em CD E DVD e a camiseta do Som na Praça com o selo da campanha JABÁSTA podem ser encontradas no site da Eletroquadros, porque a revolução não pode parar. “Eu quero provar que é possível cuidar do comercial sem ser predador. A meta do Projeto Som na Praça é estimular o músico a continuar sendo músico, a fazer música de qualidade, a não desistir de seus sonhos, pois tentar privatizar a música é o mesmo que tentar represar o mar”, finaliza Nozinho. Para saber mais www.eletroquadros.com.br REPORTAGEM Entrevista Eduardo Rodrigues A TVLocal36 é uma rede de TV na Internet que transmitiu ao vivo e em tempo integral o projeto Som na Praça 2008. Eduardo Rodrigues, responsável geral da emissora, explicou para a Backstage como foi este processo. Revista Backstage – Como e quando começou a TV local? Eduardo Rodrigues – A TVLocal36 surgiu a partir de um sonho que um grupo de pessoas tinha em “democratizar” a informação e da oportunidade que a operadora local de TV por assinatura, a NET, nos proporcionou. Montamos a TV com equipamentos emprestados de amigos: a câmera sem uso de um, vídeo cassete de outro, transmissor que um amigo não usava, muitas idéias na cabeça e transmitimos nosso primeiro evento: a micareta da cidade em 2002. A cidade até então nunca havia experimentado se ver na TV da forma como apresentamos. A partir daí, foi concedido o canal legalmente na operadora de TV por assinatura e então trabalhamos com muita força para realizar o sonho. Já conseguimos, com muito empenho – incluímos aí a parceria com o projeto Som na Praça – comprar todos os equipamentos necessários para a manutenção da TV, que conta com uni- 98 www.backstage.com.br dade de externa ao vivo, steadycam, grua, câmeras profissionais para transmissão ao vivo ou de gravação, microfones de vários modelos, entre outros. Hoje, ainda dentro do cardápio de opções da operadora NET em nossa cidade, temos uma excelente parceria com uma renomada faculdade da cidade, chamada FTC – Faculdade de Tecnologia e Ciência, além de repetirmos o sinal de nossa grande parceira, a Rede NGT de São Paulo, que transmitiu a coletânea do Som na Praça várias vezes em sua grade para o Brasil inteiro, inclusive em canal aberto para várias cidades do país. Os procedimentos técnicos foram muito simples. No mesmo sinal que vai para os assinantes da NET em Vitória da Conquista no canal 36, utilizamos duas câmeras de vídeo com cortes ao vivo e nos “plugamos” direto na mesa de som do evento. Nosso site (www.tvlocal36.com.br) já tem estrutura para transmissões ao vivo, assim, conseguimos enviar áudio e vídeo para o planeta, via Internet, com qualidade muito boa. E o mais interessante é que não precisamos de comunicadores para o trabalho, tão fluente foi a sintonia de nossos profissionais, do caboman ao diretor de imagens. Backstage – Vocês transmitiram o Som na Praça 2008 ao vivo. Foi a primeira vez que a TV fez uma transmissão deste tipo? Quais foram os procedimentos técnicos para garantir o áudio e imagem do evento? Eduardo – A TVLocal36 foi pioneira em transmissões ao vivo via Internet em Vitória da Conquista. Já cobrimos vários eventos, com interação dos internautas e telespectadores. Já o Som na Praça, para a TVLocal36, foi um marco importantíssimo em nossas transmissões, já que o idealizador do evento, Nozinho Quadros, pensa verdadeiramente em difundir a cultura e quebrar o estigma de que, “para aparecer na mídia, tem que pagar”. Backstage - Quantas pessoas tiveram acesso à página na Internet na época? Em quanto aumentou a audiência? Eduardo – Temos uma média, em transmissões de eventos, de 2.500 acessos diários e o Som na Praça, sem divulgação em massa, vale ressaltar, aumentou em mais de 20% esse acesso. Pessoas do mundo inteiro nos assistiram. Backstage – Como fizeram para garantir a qualidade da transmissão, devido ao aumento de acessos na ocasião? Eduardo – Pagamos um servidor de streamer que nos garante acesso ilimitado.