UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL
PROGRAMA DE EDUCAÇÃO PARA DIVERSIDADE
ESPECIALIZAÇÃO EM GESTÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS COM
FOCO EM RAÇA E GÊNERO
PÓLO CONSELHEIRO LAFAIETE
A efetividade da Política de Cotas para as Mulheres nos
Partidos Políticos: uma revisão teórica.
Walmyr Jorge Freitas Silva
Belo Horizonte
2012
Walmyr Jorge Freitas Silva
A efetividade da Política de Cotas para as Mulheres nos Partidos
Políticos: uma revisão teórica.
Monografia apresentada ao Programa de PósGraduação em Educação para a Diversidade da
Universidade Federal de Ouro Preto, como requisito
parcial à obtenção do grau de Especialista em
Gestão de Políticas Públicas.
Área de concentração: Gênero
Orientador: Prof. Otacílio de Oliveira Júnior
Universidade Federal de Ouro Preto
Belo Horizonte
2012
Agradecimentos
À Deus e Nossa Senhora por tantas bênçãos
Ao Prof. Otacílio de Oliveira Júnior, pela imensurável colaboração e
atenção que me dispensou como orientador.
Aos profissionais e amigos do Pólo Conselheiro Lafaiete-MG, os quais me
receberam com muito carinho.
Aos colegas Bernadet dos Santos Andrade, Helena Mara Dias Pedro e
Lucas Stefane Varela Pinto pela imensa colaboração e atenção.
Aos companheiros de curso e empreitada Ana Paula Silva Ferreira e
Gênesis Feliciano dos Santos, pelo incentivo e companhia nessa jornada.
Aos meus familiares pelo amor e dedicação; e a Poliana por seu
companheirismo em todos os momentos.
Maria, Maria
É um dom, uma certa magia
Uma força que nos alerta
Uma mulher que merece
Viver e amar
Como outra qualquer
Do planeta
Maria, Maria
É o som, é a cor, é o suor
É a dose mais forte e lenta
De uma gente que rí
Quando deve chorar
E não vive, apenas agüenta
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria
Mistura a dor e a alegria
Mas é preciso ter manha
É preciso ter graça
É preciso ter sonho sempre
Quem traz na pele essa marca
Possui a estranha mania
De ter fé na vida....
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria
Mistura a dor e a alegria...
Milton Nascimento – Maria, Maria.
Resumo
O Presente trabalho tem o objetivo de avaliar a efetividade da Lei
Federal n.º 9.504/1997, nas eleições de mulheres para a Câmara Federal
até o ano de 2006. Nosso trabalho consiste em percorrer desde a
conquista feminina ao direito do voto no Brasil, passando pela
implementação das ações afirmativas e a legitimação da Lei de Cotas em
nosso país, ao final, iremos analisar dados das eleições colhidos através
de pesquisas, antes e após a implementação da lei.
Palavras-chave: Ações afirmativas, Lei de Cotas, representação
feminina, Câmara dos Deputados, sistema eleitoral, voto.
Lista de Abreviaturas e Siglas
UFOP – Universidade Federal de Ouro Preto
FBPF - Federação Brasileira para o Progresso Feminino
ONU – Organização das Nações Unidas
DOU – Diário Oficial da União
TSE – Tribunal Superior Eleitoral
CFEMEA – Centro Feminista de Estudos e Assessoria
CNDM – Conselho Nacional dos Direitos da Mulher
FBPF – Federação Brasileira pelo Progresso Feminino
MDB – Movimento Democrático Brasileiro
ONU – Organização das Nações Unidas
PUC – Pontifícia Universidade Católica
SBPC – Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
PAN - Partido dos Aposentados da Nação
PC do B - Partido Comunista do Brasil
PCB - Partido Comunista Brasileiro
PCO – Partido da Causa Operária
PDT- Partido Democrático Trabalhista
PFL – Partido da Frente Liberal
PHS – Partido Humanista da Solidariedade
PL – Partido Liberal
PMDB - Partido do Movimento Democrático Brasileiro
PMN - Partido da Mobilização Nacional
PP - Partido Progressista
PPS – Partido Popular Socialista
PRB – Partido Republicano Brasileiro
PRONA - Partido de Reedificação da Ordem Nacional
PRP - Partido Republicano Brasileiro
PRTB - Partido Renovador Trabalhista Brasileiro
PSB - Partido Socialista Brasileiro
PSC - Partido Social Cristão
PSDC - Partido Social Democrata Cristão
PSL – Partido Social Liberal
PSOL - Partido Socialismo e Liberdade
PSTU - Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado
PT – Partido dos Trabalhadores
PT do B – Partido Trabalhista do Brasil
PTB – Partido Trabalhista Brasileiro
PTC – Partido Trabalhista Cristão
PTN – Partido Trabalhista Nacional
PV – Partido Verde
Sumário
ELEMENTOS PRÉ-TEXTUAIS
Folha de rosto..........................................................................................01
Agradecimentos......................................................................................02
Epígrafe ...................................................................................................03
Resumo ...................................................................................................04
Lista de Abreviaturas e Siglas...............................................................05
Sumário ...................................................................................................07
Introdução ...............................................................................................08
ELEMENTOS TEXTUAIS
CAPÍTULO I
A conquista da mulher ao direito ao voto no Brasil ...........................11
CAPÍTULO II
Ações Afirmativas...................................................................................16
CAPÍTULO III
A Conquista das Cotas...........................................................................20
CAPÍTULO IV
O Desempenho das Cotas no Brasil......................................................30
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................38
Introdução
Este trabalho, uma das exigências para conclusão do Curso de
Especialização em Políticas Públicas de Raça e Gênero da Universidade
Federal de Ouro Preto – UFOP, tem por objetivo avaliar a efetividade da
Lei Federal n.º 9.504/1997, que assegura um percentual mínimo de 30% e
máximo de 70% para cada sexo na lista dos partidos políticos que
lançarem candidatos no âmbito municipal, representado pela Câmara de
Vereadores, estadual nas Assembléias Legislativas e federal pela Câmara
dos Deputados. O foco do estudo recai sobre a incidência de mulheres na
Câmara dos Deputados, após a implementação de tal normativa legal até
o pleito de 2006.
Tal tema se justifica conforme o atual momento político e histórico
de nosso país. Diante de um processo de longa duração histórica de lutas
e reivindicações das mulheres contra a situação de opressão e
invisibilidade em que eram condicionadas e com os resultados de
transformação da condição social nas últimas décadas, a conquista de
espaços na representação pública e política no Brasil, onde o triunfo
inicial para o nosso objeto de pesquisa foi a conquista do direito ao voto
no ano de 1932 até chegarmos nas ações afirmativas, que defendem nas
eleições cotas de 30% para cada sexo. Atravessamos um momento
histórico, onde pela primeira vez na história desse país uma mulher ocupa
o cargo de Presidente da República, representado por Dilma Rousseff, ela
que em seu discurso de posse diz ter como meta “honrar as mulheres
brasileiras, para que este fato, até hoje inédito, se transforme num evento
natural” nos remete a indagar se o fato de termos uma mulher na
instância máxima do poder político no Brasil minimiza a baixa
representatividade do gênero feminino nas demais esferas.
As disparidades entre homens e mulheres decorrentes desde os
nossos primórdios, resultaram na condição marginalizada feminina em
muitos aspectos, não obstante as transformações que as relações
humanas vêm alavancando no sentido da igualdade entre os gêneros.
9
Se a distinção sexual faz parte de nossas características essenciais
como espécie animal, os papéis sociais dos gêneros fazem parte da
estrutura desigual de poder. O rótulo de que o âmbito público é para os
homens enquanto as mulheres pertencem à esfera privada deu
embasamento histórico à exclusão das mulheres do cenário político. Esta
teoria foi reforçada por visões tradicionais sobre a mulher na política que
ressaltaram a hipótese de sua apatia, introjetando no inconsciente coletivo
a tese de que as mulheres não se interessavam pela carreira política.
Com essa idéia, a política se estruturou como um reduto masculino,
concepção divergente dos ideais da democracia, que defende uma
distribuição mais igualitária dos recursos políticos entre os cidadãos.
Um avanço para a busca de igualdade entre homens e mulheres no
Brasil foi a Constituição de 1988 ter considerado a busca da equidade
material como um princípio, e não apenas formal entre os gêneros,
abrindo caminhos para alterações legislativas, com intuito de tentar
eliminar as disparidades entre gêneros.
Em 30 de setembro de 1997 foi aprovada a primeira lei que
reservava cotas por gênero nas candidaturas dos partidos políticos para
as eleições proporcionais em todo país, era a lei n.º 9.504, foco do nosso
trabalho. Após reformulações, foi instituída a lei 12.034/2009, que realizou
alterações em seu texto, obrigando os partidos a preencherem as vagas.
O impacto dessa política de cotas sobre a representação feminina
da Câmara dos Deputados desde a sua implantação até as eleições de
2006 interessa como objeto de estudo do presente trabalho, visando
contribuir para a compreensão do desempenho das medidas afirmativas
no parlamento brasileiro. Quais os impactos gerados na elegibilidade
feminina através da atual política de cotas? Entendemos que esse
questionamento é importante para compreendermos a dinâmica do
processo de cotas na política brasileira.
Para fins de exposição da análise aqui proposta, esse trabalho foi
estruturado em 4 capítulos.
No primeiro capítulo, A Conquista da mulher ao direito ao voto no
10
Brasil, realizaremos um percurso histórico do caminho trilhado pelos
movimentos sociais e feministas, desde o início dos questionamentos no
século XIX quanto ao direito ao voto, até chegarmos a conquista desse
triunfo.
O Segundo capítulo, Ações Afirmativas, buscamos entender o
conceito dessas ações, o surgimento no Brasil e no mundo, e por fim
algumas experiências.
Em um terceiro capítulo, abordaremos A Conquista das Cotas,
onde daremos destaque para os fatores que contribuíram para essa
façanha e sua aplicabilidade legal.
E por fim, em um quarto e último capítulo, O Desempenho das
Cotas no Brasil, analisaremos através de dados a efetividade dessa
política.
11
Capítulo 1
A Conquista da mulher ao direito ao voto no Brasil
Iniciamos nosso trabalho nos remetendo à um passado recente,
que remete à luta das mulheres para conquistar o direito de escolherem
seus representantes, ou seja o direito ao voto. É sabido que muitas outras
lutas contribuíram para que o direito ao voto se concretizasse, porém não
é nossa pretensão neste momento, maiores discussões sobre as demais
conquistas femininas. Sendo assim, iremos nos ater às conquistas
relacionadas aos direitos políticos.
A luta pelo voto feminino no Brasil foi longa e não teve as
características de movimento de massas. Começaram a eclodir
questionamentos de mulheres no século XIX quanto ao direito ao voto,
contestando à mentalidade vigente na sociedade naquele período, a qual
entendia que a natureza feminina era incompatível com as atividades
políticas. Afrontando a sociedade, algumas mulheres começaram a
reclamar seus direitos, dentre eles a mudança na educação oferecida à
elas,
as
quais
eram
em
sua
maioria
analfabetas
e
voltadas
exclusivamente para as atividades domésticas. “A instrução feminina era
tida como desnecessária” Saffioti (1976). Na fala do autor podemos
identificar a situação de menosprezo as quais as mulheres eram
submetidas, se eram privadas ao acesso à educação básica, como
poderiam avançar nas reivindicações em poder opinar suas escolhas
políticas?
O desuso do cérebro a que a sociedade condena a mulher,
negando-se a instruí-la, seria o responsável pela menor
evolução verificada das capacidades mentais femininas. Ora,
se a desigualdade de capacidades intelectuais entre os sexos
se devia a fatores de caráter histórico, a mulher não estava
condenada a persistir na ignorância e, portanto, na inferioridade
mental e social. A solução encontrava-se na educação
12
feminina, capaz de permitir uma recuperação do atraso a que
esteve sujeita [...] (SAFFIOTI, 1976, p. 206)
A educação de qualidade para as mulheres passou a se tornar um
fator importante para que elas buscassem o seu direito a participação
política.
Em 1879 veio a conquista das mulheres ao ingresso no ensino
superior, porém já existiam mulheres brasileiras que diplomaram fora do
país. Mesmo com esse direito, o preconceito e a reprovação por parte da
sociedade dificultaram o acesso feminino nas instituições de ensino
superior. Já no século XIX, apareceram os primeiros periódicos escritos
por mulheres, sendo os jornais o meio de divulgação predominante. O
primeiro periódico foi O Jornal das Senhoras que começou a ser circulado
em 1852, posteriormente O Belo Sexo em 1862 no Rio de Janeiro e em
1873 foi publicado em Minas Gerais O Sexo Feminino, dentre outros.
(HAHNER, 2003, p. 91)
Em São Paulo, foi lançado em 1888 um jornal que representava a
luta feminina na conquista do direito ao voto, denominado de A Família de
Josefina Álvares de Azevedo. Na impulsão de debates sobre a nova
Constituição
e a implantação da
República,
representantes
dos
movimentos feminista acreditaram que os direitos políticos das mulheres
seriam enfim sancionados, porém a Assembléia Constituinte de 1890 não
reconheceu esses direitos, com argumentação dos opositores do voto
feminino de que as mulheres eram inferiores mentalmente e fragilizadas
de natureza, não sustentando as lutas encadeadas fora do âmbito
doméstico. (HAHNER, 2003, p. 167).
Mesmo com as negativas, as mulheres permaneceram engajadas
na luta pelo direito ao voto. De acordo com Alves (1980), a advogada
Myrthes de Campos, primeira mulher a ingressar na Ordem dos
Advogados do Brasil, requereu seu alistamento eleitoral, argumentando
que a Constituição não negava à mulher este direito, pois apenas
enumerava os impedimentos:
13
Art. 79...eleitores os cidadãos maiores de 21 anos que se
alistaram na forma da lei.
§ 1º Não podem alistar-se eleitores, para as eleições federais
ou para os Estados: 1º Os mendigos; 2º os analfabetos; 3º as
praças de pré, excetuando os alunos das escolas militares de
ensino superior; 4º os religiosos de ordens monásticas,
companhias, congregações ou comunidades de qualquer
denominação, sujeitos ao voto de obediência, regra ou estatuto
que importe em renúncia da liberdade individual. (ALVES,1980,
p. 95)
O pedido foi negado, mas a Dra. Myrthes perdurou com a luta pelo
direito de escolher seus representantes políticos participando no
Congresso Jurídico em solenidade ao centenário da Independência
realizado no Rio de Janeiro.
Em 1910 foi implementado no Brasil de forma organizada a
concepção de “Sufrágio Feminino” pela Professora Leolinda Daltro, a qual
fundou o Partido Republicano Feminino naquele mesmo ano. Leolinda
solicitou seu alistamento, em petição baseada no mesmo argumento da
constitucionalidade do voto, mas teve seu pedido indeferido. Após 7 anos,
Professora Leolinda surpreendeu a população carioca em uma passeata
com 84 mulheres. O então deputado naquele ano, Maurício de Lacerda,
apresentou na Câmara Federal um projeto de lei instituindo o sufrágio
feminino, justificando seu projeto à comprovada capacidade da mulher,
que já inserida em todos os ramos de atividade, demonstrava ser tão
capaz quanto o homem. Posteriormente, em 1919, um projeto semelhante
foi apresentado pelo senador Justo Chermont, onde na justificativa
destacava a “missão primordial feminina” (ALVES, 1980).
Em 1919, Bertha Lutz, filha do cientista brasileiro Adolpho Lutz e de
mãe inglesa, educada no Brasil e na Europa, convocou as mulheres para
formar a Liga para Emancipação Intelectual da Mulher, com objetivo de
lutar por seus direitos. Todavia, deixou transparente sua discordância
referente a alguns comportamentos das sufragistas de outros países: ela
14
não propõe “uma associação de ‘sufragettes’ para quebrarem as vidraças
da Avenida”. Tinha a concepção de que as feministas não eram mulheres
de cabelos curtos, trajes semimasculinos, andar pesado, gestos
desprovidos de graça alguma. (ALVES, 1980)
Bertha Lutz tinha duas condições específicas que definiram sua
trajetória; pertencia a duas elites ao mesmo tempo, sendo elas a
econômica e intelectual. Viajou para os Estados Unidos representando o
Brasil no Conselho Feminino da Organização Internacional do Trabalho e
na I Conferência Pan-Americana da Mulher nos Estados Unidos. Após
retornar ao Brasil em 1922, organizou o I Congresso Internacional
Feminista no Rio de Janeiro, nascendo então a FBPF (Federação
Brasileira para o Progresso Feminino), a mais importante e conhecida
organização em defesa dos direitos da mulher no período, a qual tinha
como luta central o direito ao voto pelas mulheres. A FBPF conseguiu um
forte aliado, Juvenal Lamartine, Senador e posteriormente Governador do
estado do Rio Grande do Norte, responsável pela lei estadual que
concedeu pela primeira vez o direito de voto às mulheres brasileiras no
ano de 1927. (Pinto, Céli Regina Jardim, 2003).
A partir deste acontecimento, muitas mulheres começaram a
requisitar seu alistamento eleitoral em outros Estados e de acordo com a
decisão de cada juiz, os pedidos eram deferidos ou não. No ano de 1928,
foi eleita a primeira prefeita do Brasil no município de Lages, no Rio
Grande do Norte, Alzira Teixeira Soriano, pelo Partido Republicano. Ao
lado das filhas ela declara a imprensa: “A mulher pode ser mãe e esposa
amantíssima e oferecer ao mesmo tempo à pátria uma boa parcela das
suas energias cívicas e morais”. (ALVES, 1980, p. 119).
Veementes campanhas continuaram com intuito de eliminar as
distinções de sexo no que tange o direito ao voto. Em 1930, ano da
Revolução, Getúlio Vargas em seu governo provisório encarregou uma
comissão para estudar o assunto. No ano seguinte, o governo Vargas
atendeu as pretensões eleitorais das mulheres homologadas no II
Congresso Internacional Feminista, promovido pela F.B.P.F. no Rio de
15
Janeiro. Embora não ser um profundo apreciador das aspirações
feministas, Vargas proclamou, mesmo que restritamente, em 24 de
fevereiro de 1932 o Decreto nº 21.076, onde aprovara o voto secreto e o
voto feminino às mulheres casadas, essas somente com autorização dos
maridos e a algumas solteiras ou viúvas condicionadas a renda própria.
Tal feito, fez com que o Brasil tornar-se o quarto país no continente
americano a garantir direito de voto às mulheres. Caminho importante
para chegarmos até a atual política de cotas para as mulheres, foco do
nosso trabalho.
16
Capítulo 2
Ações Afirmativas
Nesse capítulo buscaremos entender sobre “ações afirmativas” e a
origem do termo. As ações afirmativas são providências tomadas com
intuito
de
combater
a
discriminação
e
desigualdades
sociais
historicamente acumuladas através de medidas compensatórias, visando
garantir a equidade de oportunidades e tratamento do sujeito. Essa
concepção surgiu a partir de uma necessidade de elevação de
determinados grupos de indivíduos em desvantagem socioeconômica, a
fim de garantir o empoderamento social desses grupos, permitindo o
acesso
à
um
patamar
social
o
qual
estavam
marginalizados.
(MOEHLECKE, 2002).
Na definição de Bernardino:
Ações afirmativas são entendidas como políticas públicas que
pretendem
corrigir
desigualdades
socioeconômicas
procedentes de discriminação, atual ou histórica, sofrida por
algum grupo de pessoas. Para tanto, concedem-se vantagens
competitivas para membros de certos grupos que vivenciam
uma situação de inferioridade a fim de que, num futuro
estipulado, esta situação seja revertida. Assim, as políticas de
ação
afirmativa
buscam,
por
meio
de
um
tratamento
temporariamente diferenciado, promover a eqüidade entre os
grupos que compõem a sociedade. (Revista Estudos AfroAsiáticos Ano 24, nº 2, 2002, pp. 247-273 Joaze Bernardino)
A expressão surgiu nos Estados Unidos na década de 1960,
período em que o país atravessava internamente um período de
reivindicações democráticas, com foco principal na luta pelo direito de
igualdade e oportunidades a todos, mesma época em que começaram a
17
serem abolidas as leis segregacionistas vigentes no país, tendo como
uma das forças ativas predominantes o movimento negro com suporte de
liberais e progressistas brancos, juntos em defesa dos direitos. Foi nessa
conjuntura que se desenvolveu a concepção de uma ação afirmativa,
demandando do Estado uma posição mais ativa, visando a emancipação
social da população negra. (Sabrina Moehlecke, 2002)
Práticas semelhantes de ações afirmativas ocorreram em vários
países. No continente Europeu no ano de 1976 surgiram as primeiras
orientações nesse sentido empregando o termo “ação ou discriminação
positiva”. Já no ano de 1982 a “discriminação positiva” foi incorporada no
primeiro “Programa de Ação para a Igualdade de Oportunidades” da
Comunidade Econômica Européia (Centro Feminista de Estudos e
Assessoria, 1995, Estudos Feministas, 1996).
O conceito “ação afirmativa” se estendeu para vários campos
como: “ações voluntárias, de caráter obrigatório, ou uma estratégia mista;
programas governamentais ou privados; leis e orientações a partir de
decisões jurídicas ou agências de fomento e regulação”. (Sabrina
Moehlecke, 2002)
Barbara Bergmann entende, de maneira ampla, que:
Ação afirmativa é planejar e atuar no sentido de promover a
representação de certos tipos de pessoas . aquelas
pertencentes a grupos que têm sido subordinados ou excluídos
. em determinados empregos ou escolas. É uma companhia de
seguros tomando decisões para romper com sua tradição de
promover a posições executivas unicamente homens brancos.
É a comissão de admissão da Universidade da Califórnia em
Berkeley buscando elevar o número de negros nas classes
iniciais [...]. Ações Afirmativas podem ser um programa formal e
escrito, um plano envolvendo múltiplas partes e com
funcionários dele encarregados, ou pode ser a atividade de um
empresário que consultou sua consciência e decidiu fazer as
coisas de uma maneira diferente. (1996, p. 7)
O foco de atuação era diversificado e em conformidade com as
demandas do público existente, variados entre grupos como minorias
étnicas, raciais e mulheres. As ações afirmativas interviam no campo do
18
mercado de trabalho com a contratação, qualificação e promoção de
funcionários, na área de educação a atuação era mais voltada ao ensino
superior e enfim na linha de nossa pesquisa, a representação política.
Nesse campo a atuação mais conhecida é o sistema de cotas, que busca
garantir um percentual de vagas para gêneros de forma proporcional.
No Brasil, o primeiro indício de ação afirmativa ocorreu no ano de
1968, onde técnicos do Ministério do Trabalho e do Tribunal Superior do
Trabalho manifestaram-se condizentes à implantação de uma lei que
assegurasse um percentual de vagas para empregados de cor nas
empresas privadas (Santos, 1999, p.222). Porém, a lei não chegou a ser
escrita.
Apenas na década de 1980 aconteceu a primeira elaboração de
um projeto de lei nessa diretriz. Abdias Nascimento, então deputado
federal naquele período, entendendo que após séculos de discriminação,
propôs em seu projeto de Lei nº 1.332, de 1983 uma forma de “ação
compensatória” para os negros. O projeto previa resguardar “20% de
vagas para mulheres negras e 20% para homens negros na seleção de
candidatos ao serviço público; bolsas de estudos; incentivos às empresas
do setor privado para a eliminação da prática da discriminação racial;
incorporação da imagem positiva da família afro-brasileira ao sistema de
ensino e à literatura didática e paradidática, bem como introdução da
história das civilizações africanas e do africano no Brasil” (Sabrina
Moehlecke, 2002). A proposta não surtiu efeito e o projeto não foi
aprovado pelo Congresso Nacional, no entanto as reivindicações
permaneceram.
No cenário político as ações afirmativas surgiram de reivindicações
quanto aos limites que eram impostos a certos grupos da sociedade, com
intuito de reverter a pouca representatividade desses grupos, inclusive as
mulheres. “A concepção liberal, na qual cada um é o melhor juiz de seu
próprio interesse, foi usada como argumento quando da luta pela
conquista do voto feminino” (MIGUEL, 2000).
No ano de 1988 foi promulgada a nova Constituição, que abordou
19
em sua redação como parte dos direitos sociais a garantia do mercado de
trabalho para as mulheres e percentual de vagas para deficientes em
órgãos públicos. O Título II - Dos Direitos e Garantias Fundamentais,
capítulo II - Dos Direitos Sociais, artigo 7º, estabelece como direito dos
trabalhadores, a “proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante
incentivos específicos, nos termos da lei”. E o Título III - Da Organização
do Estado, capítulo VII - Da Administração Pública, no seu artigo 37,
estabelece que “a lei reservará percentual dos cargos e empregos
públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios
de sua admissão”. (Sabrina Moehlecke, 2002). Na interpretação de alguns
juristas, os trechos citados da Constituição serviam como comprovação
da legitimidade das ações afirmativas, visto que sinalizavam a admissão
de um conjunto de discriminações, entre elas racial e de gênero. Porém,
de forma superficial, deixando a desejar uma política mais fundamentada,
o que ocorreu apenas na década de 1990 com a primeira política de cotas
adotada nacionalmente, quando veremos no próximo capítulo.
20
Capítulo 3
A Conquista das Cotas
Após anos de lutas das mulheres pelo direito da conquista ao voto
em um processo de democratização longo e duradouro e a ascendência
de políticas de ação afirmativa no mundo, conforme observamos nos
capítulos anteriores, esperava-se um resultado de representatividade
maior por parte do gênero feminino nos cargos eletivos.
Não foi o que sucedeu. No ano de 1988 as mulheres
representavam quase metade da população brasileira e apesar da intensa
participação feminina na Constituinte, apenas 5% dessa população
possuíam cadeiras no Parlamento Federal.
O quadro de exclusão das mulheres desse espaço público é
grave. Apenas 15 países apresentam uma participação de
mulheres na Câmara Baixa, ou Câmara dos Deputados,
superior a 30%. O Brasil encontra-se no grupo de 70 países
com pior desempenho, inferior a 10%. Em âmbito legislativo
estadual e municipal, o percentual de mulheres gira em torno
de 12% e em âmbito executivo é bem abaixo. (RODRIGUES,
2003a, p. 3).
A predominância masculina permaneceu na esfera pública e
demais áreas de poder, ficando na maioria das vezes as mulheres
encarregadas das atividades domésticas, sendo essa uma concepção
essencialista. O discurso da política maternal insula as mulheres nesse
nicho e, desta forma, mantém a divisão do trabalho, uma divisão que,
mais uma vez, destina aos homens as tarefas socialmente mais
valorizadas (MIGUEL, 2000, p. 3).
O Sociólogo francês Pierre Bourdieu expressa com peculiaridade
como o essencialismo interferiu na condução dos papéis dos gêneros.
As aparências biológicas e os efeitos, bem reais, que um longo
trabalho coletivo de socialização do biológico e de biologização
21
do social produziu nos corpos e nas mentes conjugam-se para
inverter a relação entre as causas e os efeitos e fazer ver uma
construção social naturalizada, como o fundamento in natura
da arbitrária divisão que está no princípio não só da realidade.
(BOURDIEU, 1999, p. 9)
As "relações de dominação" eram frequentemente abordadas por
Bourdieu, o qual obteve destaque nesse nicho. Segundo ele: o dominado
tende a adotar, sobre si, o ponto de vista do dominante, por isso, parece
natural que estruturas antigas da divisão entre os gêneros ainda
determinem a direção e a forma das mudanças na sociedade
(BOURDIEU, 1999)
O autor salienta que devido à diferença das obrigações sociais de
cada sexo, o gênero feminino é privado de capital político, desta forma,
não possui o reconhecimento social como apto a realizar uma ação
política legítima e efetiva (BOURDIEU, 1999). Deste modo, em
consequência ao processo de “dominação simbólica”, as mulheres não
possuem prestígio político, são vistas e se vêem como inabilitadas
politicamente.
A
dominação
simbólica
permite
que
(...)
a
ordem
estabelecida, com suas relações de dominação, seus
privilégios e suas injustiças, salvo uns poucos acidentes
históricos, perpetue-se apesar de tudo tão facilmente, e que
condições de existência das mais intoleráveis possam
permanentemente ser vistas como aceitáveis ou até mesmo
como naturais. (BOURDIEU,1999, pp.7-8).
De acordo com Norris e Inglehart (2001), as sociedades que
possuem uma visão conservadora quanto ao papel das mulheres, em sua
maioria não estimulam as candidaturas femininas devido aos valores que
transpassam os partidos políticos e eleitores, dificultando o ingresso das
mulheres na participação política.
22
Várias parlamentares brasileiras denunciam a resistência dos
partidos em apoiar suas candidaturas. Segundo elas, há sutis
resistências ao feminino nesses espaços. Os partidos são
responsáveis por parte significativa das dificuldades que as
mulheres enfrentam quando decidem se candidatar. Os
partidos apresentam práticas patriarcais, antigas e agressivas
contra as mulheres. (GROSSI & MIGUEL, 2001, Depoimentos
de parlamentares no Seminário Mulheres na Política –
Mulheres no Poder, Brasília, 2000).
Outras teorias a respeito da pequena representação feminina foram
surgindo. A concepção de que a presença feminina no campo político
traria uma visão diferenciada, alegando que as mulheres estão
habituadas a cuidar do próximo, possuem um olhar mais voltado para a
família, em consequência do seu papel de mãe, o que é definido como
“política do desvelo” (care politics) ou então “pensamento maternal". A
amplificação da representatividade feminina na política geraria uma
sensibilização do gênio "agressivo" masculino no exercício político e um
enaltecimento da solidariedade e compaixão feminina, acarretando
impactos na "política de interesses" individualista e masculina, em uma
"justiça" fria e imparcial, cedendo lugar a tolerância e sensibilidade
(Diamond e Hartsock, 1981; Corrêa, 1999).
A baixa representação feminina em cargos eletivos se refletia em
diversos países da América Latina, Caribe, Estados Unidos e da África.
Ao identificar essa assimetria de mulheres em relação aos homens
no
âmbito
político,
novos
questionamentos
e
discussões
foram
aparecendo com intuito de preencher essas lacunas. A necessidade de
um equilíbrio maior de gênero nos governos, alavancou incisivamente
propostas de ação afirmativa através de políticas de cotas, acreditando
alcançar resultados significativos na redistribuição da incumbência
pública.
Na América Latina a Argentina foi pioneira em 1991 na implantação
de Cotas de Representação no Legislativo, garantindo 30% de vagas nas
23
candidaturas para as mulheres.
Posteriormente Paraguai, Uruguai, Chile, Colômbia, Venezuela,
Brasil entre outros implantaram leis que garantiriam e estimulavam as
atividades femininas em cargos eletivos.
Alguns países tiveram resultados significativos no que tange ao
aumento de representantes políticos do sexo feminino, foram o caso das
Argentina e Paraguai. Outros, não geraram impactos positivos, caso do
Panamá, Bolívia, Venezuela e Brasil, conforme veremos. Antes de
adentrarmos na lei de cotas regida atualmente no Brasil, devemos
compreender que existem classificações, formas diferentes de aplicação
dessas ações afirmativas. Em um processo eleitoral a lei de cotas pode
ser empregada em duas fases distintas; desde a garantia de cotas nas
candidaturas através dos partidos políticos antecedendo as eleições, até a
distribuição de cadeiras no parlamento, assegurando um determinado
percentual de vagas para gêneros.
Essas variações de aplicação das ações afirmativas ainda
possuem diversidade na iniciativa, sendo que podem ser de forma
voluntária dos partidos políticos, ou através de legislação formal,
aplicadas através de leis.
O Paraguai iniciou em 1990 as discussões sobre a inclusão de
cotas de gênero nos partidos políticos, e no ano de 1992, em sua
Constituição, incorporado a várias conquistas consolidou obtenção de
igualdade de direitos e obrigações sem demarcação de gênero,
proclamando o fim da discriminação.
No ano de 1993 a Venezuela sancionou a lei de Igualdade de
oportunidades para a mulher, determinando que a atuação das mulheres
deveria ser de maneira homogênea perante as associações civis, partidos
políticos e sindicatos. (MIGUEL, 2000 apud CARACAS, 1994).
No Brasil, os partidos de esquerda foram pioneiros ao estipular
cotas para as mulheres nas direções internas e principalmente para as
candidaturas aos cargos legislativos. O PT (Partido dos Trabalhadores),
foi pioneiro na aplicação de cotas para as mulheres internamente nos
24
órgãos de direção partidária em 1991 (BORBA, 1996). Partido o qual
surgiu com uma base feminista atuante, visando uma construção
partidária com uma essência diferenciada também no que tange às
relações de gênero, conforme parte de um documento do Núcleo de
Mulheres do Partido dos Trabalhadores do Rio de Janeiro com data de
1986:
“[…] queremos um partido que encare a sexualidade como
questão política, um partido que seja uma organização de
poder que demonstre na prática, na forma de organizar e agir,
a transformação das velhas relações de hierarquia patriarcal,
autoritária, machista, que sabemos são reproduzidas por
homens e mulheres de qualquer condição social”.
Apesar das mulheres possuírem um grau de escolaridade maior e
representar quase metade da economia ativa do Brasil, ainda deixavam a
desejar no que tange sua participação no âmbito de representação
política, fato que permaneceu motivando as lutas dos movimentos
feministas para a conquista desses espaços:
“A certeza de que não há verdadeira democracia sem a
participação feminina em todos os espaços de poder e de que
a atuação das parlamentares mulheres tem significado um
avanço na luta pela conquista da cidadania no Brasil”. Ângela
Borba (1998:169)
Em setembro de 1995 a China sediou em Pequim a IV Conferência
Mundial sobre a Mulher, evento o qual foi financiado pela ONU e tinha o
propósito de destacar e incentivar a política de cotas no cenário mundial,
visto as dificuldades e resistência que várias nações ainda apresentavam
quanto ao tema. (BORBA, 1998).
Pela relevância de tal Conferência, cabe destacarmos os principais
objetivos que balizaram as discussões:
25
Objetivo Estratégico G.1. Adotar medidas para garantir à mulher
igualdade de acesso e a plena participação nas estruturas de
poder e de tomada de decisão. 190. Medidas que os governos
devem adotar: (a) comprometer-se a estabelecer a meta de
equilíbrio entre homens e mulheres nos organismos e comitês
governamentais, assim como nas entidades da administração
pública e no judiciário, incluídas entre outras coisas, a fixação
de objetivos específicos e medidas de implementação, a fm de
aumentar substancialmente o número de mulheres com vistas
a alcançar uma representação paritária das mulheres e dos
homens, se necessário mediante ação positiva em favor da
mulher, em todos os postos governamentais e da administração
pública; (b) adotar medidas, inclusive, quando apropriado, nos
sistemas eleitorais que estimulem os partidos políticos a
incorporar as mulheres em postos públicos eletivos e não
eletivos na mesma proporção e nas mesmas categorias que os
homens. (FIOCRUZ, 1996)
Tal evento foi de suma importância para a aplicação e
reconhecimento legal da política de cotas no cenário brasileiro. Após a
Conferência e impulsionada pelas demonstrações de experiências que
obtiveram êxito em outros países, a bancada feminina no Congresso
Nacional colocou em pauta um projeto de lei que assegurasse um
percentual de vagas de cada partido para as candidaturas de mulheres.
Em 1995, a então deputada federal Marta Suplicy, representante do
Partido dos Trabalhadores, apresentou um Projeto de Lei de Cotas para
mulheres através das candidaturas nos partidos políticos, o texto do
projeto previa a reserva de 30% no âmbito nacional de vagas nas
candidaturas aos cargos legislativos em todo o país e tinha como meta
amplificar a representação política feminina. A proposta contou com apoio
em massa da ala congressista feminina, no entanto, o projeto passou por
reformulações e o texto sancionado não contemplou uma reserva nas
candidaturas dos partidos, a alteração previa uma cota complementar
para as mulheres. Logo, o texto final reavaliado na Câmara
Federal
determinou que poderia existir a mais 20% de candidaturas de mulheres.
No senado, a emenda sofreu novamente alterações, essas apresentadas
pela então senadora Júnia Marise (PDT/MG):
Com esta manifestação faço coro aqui a todos os Srs.
26
Senadores que, de uma forma ou de outra defenderam as suas
iniciativas, propuseram o debate e o entendimento e, ao final,
chegamos a um entendimento que viabilizasse a aprovação
dessa emenda, garantindo, portanto, integralmente, que cada
partido ou coligação preserve, para as eleições municipais do
ano que vem, 20% da sua quota para que as mulheres possam
ter direito e acesso às eleições municipais. (Senadora Júnia
Marise – PDT/MG).
Dessa forma, ficou estabelecida a Lei 9.100/95 que estipulava cota
mínima de 20% para candidatura de mulheres nas eleições municipais:
Lei nº 9.100 de 29 de Setembro de 1995
Art. 11. Cada partido ou coligação poderá registrar
candidatos para a Câmara Municipal até cento e vinte por
cento do número de lugares a preencher.
§ 1º Os partidos ou coligações poderão acrescer, ao total
estabelecido no caput, candidatos em proporção que
corresponda ao número de seus Deputados Federais, na forma
seguinte:
I - de zero a vinte Deputados, mais vinte por cento dos lugares
a preencher;
II - de vinte e um a quarenta Deputados, mais quarenta por
cento;
III - de quarenta e um a sessenta Deputados, mais sessenta
por cento;
IV - de sessenta e um a oitenta Deputados, mais oitenta por
cento;
V - acima de oitenta Deputados, mais cem por cento.
§ 2º Para os efeitos do parágrafo anterior, tratando-se de
coligação, serão somados os Deputados Federais dos partidos
que a integram; se desta soma não resultar mudança de faixa,
será garantido à coligação o acréscimo de dez por cento dos
lugares a preencher.
§ 3º Vinte por cento, no mínimo, das vagas de cada partido ou
coligação deverão ser preenchidas por candidaturas de
mulheres.
§ 4º Em todos os cálculos, será sempre desprezada a fração,
se inferior a meio, e igualada a um, se igual ou superior.
Marta Suplicy comentou as alterações que foram realizadas no
texto inicial do projeto, ressaltando preocupação quanto a diminuição dos
27
impactos das cotas, visto o aumento do número total de candidatos que
poderão ser registrados:
O que foi aprovado no Senado ontem, como eu disse, não é o
que desejávamos; é um pouco melhor do que foi aprovado na
Câmara, o que também não era o ideal. Temos que dizer o que
se passou lá: aproveitaram a demanda das mulheres para
aumentar o número de candidatos que cada partido pode
registrar. A reivindicação das mulheres foi manipulada por
aumentar o número de candidaturas. [...] Entretanto, avaliamos
que ainda assim, é melhor aumentar o número de candidaturas
para 120% e ter as 20% do que manter o que foi aprovado na
Câmara, porque aí realmente representa um degredo absoluto,
um vexame para nós, mulheres a condição proposta pela
Câmara. (Deputada Marta Suplicy – PT/SP).
No ano de 1997, uma nova lei eleitoral foi aprovada, essa com
intuito de garantir cotas para as mulheres também nas candidaturas de
âmbito estadual e federal. A lei também rege o aumento do número de
cotas mínimo de 30% e máximo de 70% para qualquer um dos sexos.
Veja abaixo como ficou o texto:
Lei N.º 9.504, de 30 de setembro de 1997 (DOU 01/10/97)
Artigo 10. Do Registro de Candidatos – “Cada partido poderá
registrar candidatos para a Câmara dos Deputados, Câmara
Legislativa, Assembléias Legislativas e Câmaras Municipais,
até cento e cinqüenta por cento do número de lugares a
preencher. § 1º No caso de coligação para as eleições
proporcionais, independentemente do número de partidos que
a integrarem, poderão ser registrados candidatos até o dobro
do número de lugares a preencher. § 2º Nas unidades da
Federação em que o número de lugares a preencher para a
Câmara dos Deputados não exceder de vinte, cada partido
poderá registrar candidatos a Deputado Federal e a Deputado
Estadual ou Distrital até o dobro do das respectivas vagas;
havendo coligação, estes números poderão ser acrescidos de
até mais cinqüenta por cento. § 3º, Do Registro de
Candidatos – “Do número de vagas resultante das regras
previstas neste artigo, cada partido ou coligação deverá
reservar no mínimo trinta por cento e o máximo de setenta
por cento para candidaturas de cada sexo”. Artigo 80 Das
Disposições Transitórias – “Nas eleições a serem realizadas no
ano de 1998, cada partido ou coligação deverá reservar, para
candidatos de cada sexo, no mínimo vinte e cinco por cento e,
no máximo, setenta e cinco por cento do número de
candidaturas que puder registrar.
28
Porém, a lei ainda possuía brechas, visto que o texto não obrigava
o preenchimento dos percentuais estabelecidos, conforme destacamos
em negrito. Os partidos poderiam lançar as candidaturas mesmo se não
preenchessem as cotas reservadas para as mulheres. Compreenda; "se o
partido tem 20 candidatos ele pode aumentar esse número para 30 e
reservar 6 vagas para as mulheres. Essa medida minimizou o efeito das
cotas, uma vez que aumenta em 50% o número total de candidatos
referentes ao número de vagas". (VAZ, 2008).
Apenas em 29 de setembro de 2009 foi aprovada pelo Congresso
Nacional a lei 12.034, que alterou a Lei dos Partidos Políticos, o Código
Eleitoral de 1965 e a Lei 9.504/97. No novo texto, os partidos passam a
ser obrigados a preencher o mínimo de 30% e o máximo de 70% para
candidaturas de cada sexo, visto que o texto anterior constava apenas a
reserva das vagas. Veja como ficou a atual política de cotas regida em
nosso país:
Lei N.º 12.034, de 29 de setembro de 2009 (DOU 30/09/09)
Do Registro de Candidatos
Art. 10. Cada partido poderá registrar candidatos para a
Câmara dos Deputados, Câmara Legislativa, Assembléias
Legislativas e Câmaras Municipais, até cento e cinqüenta por
cento do número de lugares a preencher.
§ 1º No caso de coligação para as eleições proporcionais,
independentemente do número de partidos que a integrem,
poderão ser registrados candidatos até o dobro do número de
lugares a preencher.
§ 2º Nas unidades da Federação em que o número de lugares
a preencher para a Câmara dos Deputados não exceder de
vinte, cada partido poderá registrar candidatos a Deputado
Federal e a Deputado Estadual ou Distrital até o dobro das
respectivas vagas; havendo coligação, estes números poderão
ser acrescidos de até mais cinqüenta por cento.
§ 3o Do número de vagas resultante das regras previstas
neste artigo, cada partido ou coligação preencherá o
mínimo de 30% (trinta por cento) e o máximo de 70%
(setenta por cento) para candidaturas de cada sexo.
(Redação dada pela Lei nº 12.034, de 2009)
§ 4º Em todos os cálculos, será sempre desprezada a fração,
se inferior a meio, e igualada a um, se igual ou superior.
§ 5º No caso de as convenções para a escolha de candidatos
não indicarem o número máximo de candidatos previsto no
caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo, os órgãos de direção dos
partidos
respectivos
poderão
preencher
as
vagas
remanescentes até sessenta dias antes do pleito.
29
Cabe ressaltarmos as possibilidades que este marco legal,
enquanto um direito positivado poderá trazer para a garantia de maior
participação política da mulher. No entanto, tal perspectiva não poderá se
abster aos marcos legais, pois é necessário construir possibilidades de
efetivação deste direito. Para tanto, a desmistificação da concepção
cultural da incapacidade feminina de representar a população, se faz
necessário em nossa sociedade.
30
Capítulo 4
O Desempenho das Cotas no Brasil
1
A conquista das mulheres brasileiras ao direito de votar e serem
votadas, até a garantia de cotas nas candidaturas através dos partidos
políticos, são fatos notáveis e que fazem parte da construção de um
processo eleitoral democrático na história recente do Brasil.
A partir das eleições do ano de 1998, começou a ser regida em
todo país a Lei n. 9.504, de 1997, que reservava um percentual mínimo de
30% e máximo de 70% para cada sexo na lista dos partidos políticos que
lançarem candidatos no âmbito municipal, representado pela Câmara de
Vereadores, estadual nas Assembléias Legislativas e federal pela Câmara
dos Deputados. Conforme acompanhamos no decorrer do trabalho, a
referida Lei passou por reformulações dando lugar a Lei nº 12.034/2009,
onde a reserva das cotas passou a ser obrigatória.
Como nosso trabalho pretende avaliar a efetividade dessa política
de ação afirmativa no que tange a representação feminina na esfera
federal, ou seja, na Câmara dos Deputados, se faz necessário
recorrermos à alguns dados, para melhor contextualizarmos a realidade a
qual pretendemos discutir.
Quadro nº 1 - Percentual de candidatas para Câmara dos Deputados
1982-2006
Ano
Total de candidatos
Candidatas (F)
% de candidatas em
(M e F) N.A.
N.A.
relação ao total (F/T)
1982
1.585
58
3,65
1986
2.539
166
6,53
1990
3.827
229
5,98
1
(2007)
Parte das informações trabalhadas neste capítulo foi obtida a partir de Martins
31
1994
3.008
185
6,15
1998
3.417
353
10,3
2002
4.289
490
11,4
2006
4.961
630
12,7
Fonte: para os anos de 1982 a 1990 – ÁLVARES (2004); para 1994 a 2006 – TSE
N.A. (Números Absolutos)
% (percentual)
F (feminino)
M (masculino)
T (total)
Quadro n. 2 - Percentual de mulheres eleitas para a Câmara dos
Deputados 1982-2006.
Ano
Total de eleitos
(M e F)
N.A.
Eleitas (F)
N.A.
% de eleitas (F)
1982
479
8
1,67
1986
487
25
5,13
1990
503
30
5,96
1994
513
38
7,40
1998
513
29
5,65
2002
513
42
8,18
2006
513
45
8,77
Fonte: para 1982 a 1994 – PORTO (2000); para 1998 a 2006 – TSE.
Ao analisarmos a primeira experiência com as cotas, no ano de
1998 - ano de incidência das cotas, podemos constatar que os resultados
apresentados são insignificantes, visto que naquele período a legislação
ainda não obrigava o preenchimento das vagas, apenas reservava
(quadro 1). Dessa forma os partidos políticos usufruíram dessa lacuna,
reservando as vagas, que naquele ano eram de 25%, porém não as
preencheram, o que não alcançou metade do que a lei previa.
Ao analisarmos os dados das representantes eleitas, os números
são desapontadores. O pleito do ano de 1998 em comparação com as
eleições de 1994, de acordo com os números, mostra que houve um
retrocesso na quantidade de mandatárias. (conforme quadro 2).
De acordo com alguns autores, esse efeito pode ser atrelado ao
32
fato de que o aumento do número de mulheres candidatas fez com que o
número de votos tenha sido distribuído entre elas próprias, diminuindo a
oportunidade de eleição (MIGUEL,2000 e ARAÚJO, 1998). Simbolizando
o aumento da competição feminina.
Quadro nº 3 – Candidatas e candidatos (números absolutos e
percentuais) Câmara dos Deputados 1982-2006.
Ano
Total de
candidatos
(M e F) N.A.
% de Candidatos
Candidatas (F) Candidatos % de
N.A.
(M) N.A.
Candidatas
em relação
em relação
ao total (M/T)
ao total (F/T)
1986
2.539
166
1990
3.827
229
1994
3.008
185
1998
3.417
353
2002
4.298
490
2006
4.961
630
Fonte: para 1982 a 1990 – ÁLVARES
2006 – TSE.
2.373
6,53
3.598
5,98
2.822
6,15
3.064
10,3
3.806
11,4
4.331
12,7
(2004); para 1994 a
93,46
94,01
93,81
89,66
88,55
87,30
No quadro 3 podemos avaliar a evolução do número total de
candidatos lançados pelos partidos políticos para concorreram nas
eleições, nota-se a ampliação dessa quantidade no decorrer dos anos.
Essa evolução deve-se ao fato de que a lei permitia o aumento do número
de candidatos, conforme verificamos no decorrer do nosso trabalho, o que
fez com que os partidos conseguissem inserir os candidatos homens na
cota de 70%. Conforme interpretação de Eneida Martins:
Isso demonstra que os partidos foram capazes de acomodar
os candidatos masculinos sem a necessidade de
deslocamentos, já que o universo foi amplo o suficiente para
incluir a todos. Não ocorreu a retirada de nomes masculinos
em favor da inclusão de candidatas mulheres. Assim as
mulheres tiveram que concorrer com todo o contingente
masculino anterior. A análise dos resultados sugere também
33
que os homens tenham sido mais eficientes que as mulheres
em angariar votos. Como conseqüência aconteceu o efeito
inverso que se pretendia com as cotas: a bancada feminina da
Câmara dos Deputados diminuiu. (Martins, 2007)
No que tange ao pleito seguinte, realizado no ano de 2002, o
gênero feminino teve um significativo progresso no desempenho eleitoral.
Voltamos ao quadro 2 e podemos observar que o número de mulheres
eleitas para a Câmara Federal aumentou de 29 para 42 representantes,
um percentual de 2,53% em relação a eleição anterior. Podemos atribuir
esse aumento às cotas, mas não podemos deixar de analisar no quadro
que esse avanço da representação feminina já era uma crescente desde
o pleito de 1982, período que antecedeu a implantação das cotas, exceto
a eleição de 1998 que teve uma queda nos números.
Quadro nº 4 – Percentual de eleitas com relação ao número de
candidatas para Câmara dos Deputados 1982-2006.
Ano
Candidatas (F)
Eleitas (F)
N.A.
N.A.
1982
58
08
1986
166
25
1990
229
30
1994
185
38
1998
353
29
2002
490
42
2006
630
45
Fonte: para 1982 a 1990 – ÁLVARES (2004);
PORTO (2000); para 1994 a 2006 – TSE.
% eleitas com relação ao nº de
candidatas
13,79
15,06
13,10
20,54
8,21
8,57
7,14
para as eleitas entre 1982 a 1994 –
É notório que a aprovação da política de cotas para as mulheres é
uma enorme conquista e pode significar um avanço na representação
feminina. Sobretudo, devemos compreender que esse fato não pode ser
atribuído ao volume de candidatas.
34
O quadro 4 esboça bem essa situação, que apesar do número de
candidaturas femininas ter ganho um expressivo aumento, não podemos
dizer o mesmo em termos finais, ou seja, o percentual dos resultados.
Após a implementação da política de cotas no Brasil, ao
compararmos o percentual de mulheres eleitas em relação ao número de
candidatas, podemos identificar uma redução desse percentual. Dados
que nos levam a refletir que não se deve existir correlação entre, quanto
maior o número de candidatas maior o número de eleitas, pois outros
fatores devem ser analisados.
Quadro nº 5 – Percentual de candidaturas e eleitas, por Estado,
para a Câmara dos Deputados em 2006.
Estado
% Candidaturas (F)
% Eleitas (F)
Acre
15,7
12,5
Alagoas
11,8
0,0
Amapá
14,7
50
Amazonas
12,7
25
Bahia
7,3
10,26
Ceará
8,2
4,55
Distrito Federal
14,9
0,0
Espírito Santo
20,2
40
Goiás
6,8
11,8
Maranhão
11,4
5,6
Mato Grosso
17,7
25
Mato Grosso do Sul
21,6
0,0
Minas Gerais
10,2
5,7
Pará
15,7
11,8
Paraíba
6,7
11,8
Paraná
9,8
0,0
Pernambuco
11,8
4,0
Piauí
4,8
0,0
Rio de Janeiro
13,6
13,4
Rio Grande do Sul
11,4
9,7
Rio Grande do Norte
11,3
25
Rondônia
16,4
12,5
35
Roraima
15,7
25
Santa Catarina
10,5
6,3
São Paulo
14,4
4,3
Sergipe
24,5
0,0
Tocantins
22,2
12,5
Fonte: ARAÚJO (2007)
Na tabela 5, destacamos os Estados que compõem a federação, o
percentual de candidaturas femininas e mulheres eleitas por cada colégio
eleitoral em 2006.
Podemos examinar no referido ano que nenhum dos vinte e sete
Estados preencheram número de vagas superior a 25% do total. Alguns
Estados não obtiveram irrisórios 5% de representação feminina nas
eleições.
Outro fator que nos chama atenção é de que em termos de
representatividade, seis Estados ficaram sem mulheres apoderando-se de
cadeiras da Câmara Federal, são eles: Alagoas, Distrito Federal, Mato
Grosso do Sul, Paraná, Piauí e Sergipe. O Rio de Janeiro aponta como o
que elegeu o melhor percentual de mulheres, 13,4% de parlamentares do
sexo feminino.
Quadro nº 6 – Relação de candidatos por partido e gênero, para
Câmara dos Deputados em 2006.
Não
Informado
Partido Masculino
(M)
%M/T
Feminino
(F
)
%F/T
(NI)
%NI/T
Total (T)
PAN
80
83.33
16
16.67
0
0.0
96
PC do B
53
75.71
17
24.29
0
0.0
70
PCB
11
78.57
3
21.43
0
0.0
14
PCO
24
82.76
5
17.24
0
0.0
29
PDT
341
89.5
40
10.5
0
0.0
381
36
PFL
200
88.11
27
11.89
0
0.0
227
PHS
132
86.84
20
13.16
0
0.0
152
PL
189
89.57
22
10.43
0
0.0
211
PMDB
303
88.6
39
11.4
0
0.0
342
PMN
135
87.1
20
12.9
0
0.0
155
PP
161
92.0
14
8.0
0
0.0
175
PPS
263
87.38
38
12.63
0
0.0
301
PRB
18
90.0
2
10.0
0
0.0
20
PRONA
99
78.57
27
21.43
0
0.0
126
PRP
100
92.59
8
7.41
0
0.0
108
PRTB
80
86.96
12
13.04
0
0.0
92
PSB
280
86.42
44
13.58
0
0.0
324
PSC
175
86.63
27
13.37
0
0.0
202
PSDB
262
85.07
46
14.94
0
0.0
308
PSDC
115
89.84
13
10.16
0
0.0
128
PSL
94
95.92
4
4.08
0
0.0
98
PSOL
160
84.66
29
15.34
0
0.0
189
PSTU
22
81.48
5
18.52
0
0.0
27
PT
308
87.75
43
12.25
0
0.0
351
PT do B
98
88.29
13
11.71
0
0.0
111
PTB
204
91.48
19
8.52
0
0.0
223
PTC
91
83.49
18
16.51
0
0.0
109
PTN
55
88.71
7
11.29
0
0.0
62
PV
278
84.24
52
15.76
0
0.0
330
TOTAL
4.331
87.3
630
12.7
0
0.0
4.961
Fonte: TSE
O quadro acima (6), destaca a quantidade e percentual de
candidatos dos sexos masculino e feminino nas eleições de 2006. Ao todo
são vinte e nove partidos que lançaram candidatos ao cargo de deputado
federal, sendo que somente três desses grupos apresentavam em suas
listagens mais de 20% de candidatos do sexo feminino e nenhum deles
atingiu 25% do total. Quatro coligações registraram menos de 10% de
mulheres em suas candidaturas.
37
Os dados analisados comprovam que a legislação eleitoral
brasileira em relação a política de cotas não apresenta impactos
significativos.
Segundo pesquisadores com relação às políticas indicativas, é
possível distinguir dois tipos de implementação das cotas entre
os partidos políticos. Uma pode ser chamada de abordagem
minimalista, isto é, não preencher totalmente a cota com
candidatas mulheres, esse é o caso brasileiro. O outro tipo de
implementação é a abordagem maximalista, isto é, cumprir a
cota preenchendo todo o percentual estabelecido para
mulheres na lista. As abordagens estão evidentemente
relacionadas com as posições dos partidos em relação à lei.
Martins (2007 apud DIAZ, 2003).
Concluímos nosso trabalho com a certeza de que faltam ainda um
incentivo para as mulheres no que tange a incentivo político. Os dados
analisados deixam claro que a legislação brasileira não se caracteriza
como ação afirmativa, visto que o conceito de ação afirmativa (conforme
destacamos em nosso trabalho) consiste em realizar medidas
compensatórias, pois demonstra pouca efetividade.
Também é realidade de que não encontraremos explicações para
a baixa efetividade dessa política de cotas analisando apenas os
números. Questões de índole cultural se tornam essenciais para
abrangirmos e destrincharmos tal temática. Norris e Inglehart (2001)
defendem que as circunstâncias, preconceitos e estereótipos as quais
as mulheres são submetidas, são obstáculos que entravam a inclusão
das muheres na política, colocando-as em desvantagens sociais.
Entendemos sim que políticas de ações afirmativas podem
neutralizar os impactos herdados de anos de opressão as mulheres, no
entanto, investimentos em educação seria a melhor forma de tentarmos
reverter esse atual quadro da nossa política.
38
Referências bibliográficas
ÁLVARES, Maria Luzia Miranda. Mulheres na competição eleitoral:
seleção de candidaturas e padrões de carreira política no Brasil. Tese de
Doutorado, IUPERJ - Rio de Janeiro, 2004. 335p.
ALVES, Branca Moreira. Ideologia e Feminismo: a luta da mulher pelo
voto no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1980.
ARAÚJO, Clara. Mulheres e representação política no Brasil: a
experiência das cotas no Brasil. Estudos Feministas. Rio de Janeiro, v. t,
n. 1, p. 71-90. 1996.
BERNARDINO, Joaze, Revista Estudos Afro-Asiáticos Ano 24, nº 2, 2002,
pp. 247-273
BERGMANN, B. In defense of affirmative action. New York: BasicBooks,
1996.
BORBA, Ângela (Org.). Mulher e política: gênero e feminismo no Partido
dos Trabalhadores. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 1998
BOURDIEU, Pierre, 1930. Dominação masculina; tradução de Maria
Helena Kuhner. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1999, 157p.
CENTRO FEMINISTA DE ESTUDOS E ASSESSORIA. Eleições 2002:
cresce o número de deputadas federais e senadoras eleitas. Brasília:
CEFMEA, out., p. 4 -7, 2002.
CONFERÊNCIA MUNDIAL SOBRE A MULHER, 1995, Pequim. Relatório
e plataforma de ação. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 1996. 352 p.
DIAMOND, Irene e HARTSOCK, Nancy. (1981), “Beyond interests in
politics”. American Political Science Review, 75, 3: 717-21.
39
DIAZ, Mercedes Mateo (2002). As cotas fazem diferença? Ações positivas
no parlamento Belga. Opinião Pública; tradução de Pedro Maia Soares.
Campinas, v. 9, n. 1, 2003, pp. 68-97.
GROSSI, Miriam Pillar; MIGUEL, Sônia Malheiros. Transformando a
diferença: as mulheres na política. Revista Estudos Feministas - UFRJ,
Rio de Janeiro, v. 9, n. 1, 2001, pp. 167-206.
HAHNER, June E. Emancipação do sexo feminino. A luta pelos direitos da
mulher no Brasil,1850-1940. Florianópolis: Ed. Mulheres, Santa Cruz do
Sul: EDUNISC, 2003.
INGLEHART, Ronald. Cultural obstacles to equal representation. Journal
of Democracy, v. 12, n. 3, 2001, pp. 126-140.
MARTINS, Eneida Valarini. A política de cotas e a representação feminina
na Câmara dos Deputados [manuscrito] / Eneida Valarini Martins: -- 2007.
58 f.
MIGUEL, Luis Felipe. Teoria política feminista e liberalismo: o caso das
cotas de representação. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v.15, n.44,
pp. 1-17. São Paulo, 2000.
MOEHLECKE, Sabrina. Ação afirmativa: história e debates no Brasil.
Caderno
de
Pesquisas.
2002.
Disponível
em:
http://www.scielo.br/scielo.phpid=S010015742002000300011&script=sci_
arttext> Acesso em: 10 de jul. 2012.
NASCIMENTO, Milton – Maria, Maria, 1978.
NORRIS, Pippa. Gender differences in political participation in Britain:
traditional, radical and revisionist models. Government and Opposition, v.
26, n. 1, 1991, pp. 56-74.
PINTO, Céli Regina Jardim - Uma história do feminismo no Brasil – São
Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2003
40
PORTO, Walter Costa, 1937. Dicionário do voto. Brasília: UnB; São Paulo:
Imprensa Oficial do Estado, 2000. 475 p.
RODRIGUES, Almira. Cidadania das mulheres e igualdade de gênero.
2003a. Disponível em: <http//www.cfemea.org.br/publicações/artigos>
Acesso em: 12 de jul. 2012.
SAFFIOTI, Heleieth Iara Bongiovani. A mulher na sociedade de classes:
mito ou realidade. 2 ed. Petrópolis: Vozes, 1976.
SAFFIOTI, Heleieth Iara Bongiovani. A mulher na sociedade de classes:
mito ou realidade. 2 ed. Petrópolis: Vozes, 1976.
VAZ, Gislene de Almeida. A participação da mulher na política brasileira
[manuscrito] : a lei de cotas / Gislene de Almeida Vaz. -- 2008. 65 f.
______. Lei nº 9.100, de 29 de Setembro de 1995. Estabelece normas
para a realização das eleições municipais de 3 de outubro de 1996, e dá
outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2 out. 1995.
Seção 1, pp. 15333.
______. Lei nº 9.504, de 30 de Setembro de 1997. Estabelece normas
para as eleições. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 1º out. 1997. Seção
1, pp. 21801.
Download

Walmyr Silva - Água, Mulheres e Desenvolvimento