OS SISTEMAS DE GESTÃO DA MANUTENÇÃO DO MATERIAL CIRCULANTE 1. REFERÊNCIAS [1] - Bases Gerais para a Implementação de Sistemas de Gestão da Manutenção de Material Circulante, Instrução Técnica 5, INCFA 2011; [2] - Funções do Pessoal da Revisão do Material Circulante, Instrução de Exploração 19, INCFA 2011. [3] - Identificação e Inscrições no Material Circulante, Instrução de Exploração 14, INCFA 2011 [4] - Estudo da Reforma e do Modelo Institucional para o Sector Ferroviário, Decreto Presidencial nº 195/10 de 2 de Setembro, Diário da República I Série Nº 167 [5] - Identificação e Inscrições no Material Circulante, Instrução de Exploração 14, INCFA 2011 2. TERMINOLOGIA Entre os termos associados à manutenção do material circulante ferroviário, destacamos os seguintes para o âmbito desta comunicação (uma terminologia mais alargada, relacionada com a manutenção de material circulante ferroviário, pode ser encontrada no documento referenciado com [1]): «Manutenção»: conjunto de operações destinadas a manter uma unidade funcional, ou a repô-la num estado em que possa desempenhar a função requerida, garantindo uma integridade continuada dos sistemas de segurança e a conformidade com normas e referenciais de manutenção aplicáveis. «Manual de Manutenção»: documento que descreve a forma como o sistema de gestão da manutenção se aplica às diversas séries de material circulante, sendo estas definidas de acordo com [3]. «Material Circulante»: compreende veículos 1 / 10 − Dotados de tracção própria; − Rebocados, para o transporte de passageiros e para o de mercadorias; − Veículos especiais ferroviários para a construção e/ou manutenção de vias e sinalização ferroviária; «Níveis de Manutenção»: são considerados cinco níveis, cabendo: − No primeiro, acções de verificação e monitorização efectuadas antes da partida ou em trajecto. − No segundo, operações de curta duração entre duas intervenções programadas, realizadas em intervalos nas rotações de serviço do material, destinadas a manutenção correctiva ou preventiva e trocas não programadas de componentes substituíveis. − No terceiro, intervenções de manutenção correctiva ou preventiva e trocas programadas de componentes que, por exigirem um tempo de paragem superior ao do segundo nível, levam a considerar o veículo como “não disponível para serviço”. − No quarto, intervenções de manutenção importantes, geralmente chamadas “grandes reparações”, destinadas a restabelecerem condições do veículo semelhantes às de origem. − No quinto, operações mais profundas que as quarto nível, compreendendo as designadas “renovações” e “readaptações”. «Plano de Manutenção»: documento que especifica os procedimentos e recursos associados, a aplicar, por quem e quando, na realização da manutenção. É parte integrante do manual de manutenção «Processo»: conjunto de actividades inter-relacionadas e inter-actuantes que transformam “entradas” em “saídas” (ver [1]). «Rastreabilidade»: capacidade de seguir a história, a aplicação ou localização de veículos ou equipamentos de material circulante. «Referencial para a manutenção»: conjunto de elementos escritos necessários para a gestão e realização da manutenção de uma série de material circulante, incluindo os seus equipamentos e sistemas, garantindo uma exploração fiável e segura. 2 / 10 Os referenciais para a manutenção devem ser estabelecidos a partir da documentação elaborada pelos fabricantes. Contudo, após terem sido elaborados, devem ser considerados dinâmicos, passíveis de alterações. Os responsáveis pela manutenção deverão ter em conta a sua melhoria contínua adequando-os à evolução tecnológica, às condições reais de operação e às necessidades de resolução de problemas de funcionamento que surjam com frequência indesejável durante a exploração. Os referenciais para a manutenção devem ser constituídos, pelo menos, por: • Manual de manutenção contendo: − O Plano de Manutenção; − A indicação dos processos e a explicação como interagem entre si [1]; − Referência de documentos chave para a manutenção como catálogos de equipamentos, de ferramentas, de sobressalentes e listas de consumíveis; − Referência de documentos técnicos de apoio necessários para as intervenções previstas no ciclo, como instruções, desenhos, diagramas, valores de funcionamento; − Referência às oficinas de manutenção intervenientes nas operações integrantes do ciclo de manutenção e da parte do ciclo que é nelas efectuado; − Às entidades externas prestadoras de serviços de manutenção; • Plano de manutenção, contendo, designadamente, informação sobre: − O ciclo de manutenção; − As actividades de manutenção a realizar em cada uma das acções do ciclo, com relevo para as actividades relevantes para a segurança da circulação; − Os ensaios a realizar nas intervenções previstas no ciclo; − Os equipamentos rastreáveis relevantes para a segurança, indicando o seu referencial de manutenção específico e as entidades que realizam a sua manutenção. 3 / 10 «Sistema de Gestão da Manutenção do Material Circulante»: parte de um sistema global de gestão da empresa, destinado à gestão da manutenção do material circulante. O Sistema de Gestão da Manutenção compreende a estrutura operacional, as actividades de planeamento, as responsabilidades, as práticas, os processos, os procedimentos e os recursos para desenvolver, implementar, tornar efectiva, rever e manter a política de manutenção da empresa com vista à segurança, fiabilidade e disponibilidade do material circulante. Após o fornecimento do material circulante, a empresa deverá, através do seu sistema, assumir não só a responsabilidade da realização das operações de manutenção em instalações suas e/ou a gestão da realização de operações subcontratadas. 3. OS SISTEMAS DE GESTÃO DA MANUTENÇÃO E A SUA MELHORIA CONTÍNUA. A Lei [4] atribui às empresas ferroviárias a responsabilidade da manutenção do material circulante, incluindo a planificação e a definição da tipologia das intervenções de manutenção a realizar bem como a existência de competências e condições necessárias à exploração segura do material circulante. Nesse sentido, é apontada [1] a necessidade do desenvolvimento e implementação de Sistemas de Gestão da Manutenção do Material Circulante seguindo práticas de organização preconizadas para outros sistemas de gestão internacionalmente divulgados na indústria e nos serviços - como os Sistemas de Gestão da Qualidade (normas ISO 9001: 2000) e da Segurança (norma OHSAS 18001) - as quais abrangem conjuntos amplos de actividades, os “processos”, os quais atravessam as divisões criadas pelas estruturas de enquadramento de pessoal (oficinas, secções, brigadas, etc.), criando um campo de acção funcionalmente mais adequado à gestão da manutenção, e que pode abranger vários níveis de manutenção (por exemplo, o “Processo Projecto” e o “Processo Encomenda” geralmente abrangem todos os níveis/oficinas). Ao mesmo tempo que se aponta para a gestão da manutenção do material circulante sob o paradigma dos “processos”, incentiva-se o compromisso da gestão de topo na consolidação do uso de informação operacional (através do estabelecimento de indicadores) para obtenção de ensinamentos que 4 / 10 conduzam à melhoria contínua dos sistemas de Gestão da Manutenção, da fiabilidade e da segurança do material circulante ([1], “Principio do aperfeiçoamento contínuo”). Uma metodologia correntemente usada no trabalho com a informação operacional é o conhecido “Ciclo de Deming” ou “Ciclo PDCA”, o qual constitui uma boa prática para a melhoria dos Sistemas de Gestão da Manutenção do Material Circulante e para a procura de melhor fiabilidade para as séries. 4. A MONITORIZAÇÃO DA FIABILIDADE DO MATERIAL CIRCULANTE E O CICLO DE DEMING NA SUA MELHORIA. A fiabilidade do material circulante é o reflexo do Sistema de Gestão da Manutenção adoptado, do desempenho da manutenção nele concebida e por ele controlada. A fiabilidade deve, por isso, ser objecto de constante acompanhamento e medição de que resulte, por aplicação de critérios para o efeito definidos, registos e relatórios das falhas que pelas consequências na disponibilidade e/ou segurança, devem ser objecto de medidas correctivas. Um particular cuidado deve ser tido na análise da fiabilidade de equipamentos ou sistemas relevantes para a segurança, como rodados ou sistemas de freio, sendo fortemente recomendado o rastreio de tais equipamentos e sistemas, das suas falhas, da frequência das mesmas e o registo das acções de manutenção correctiva tomadas para as remediar. Quando o número de falhas se apresenta inaceitável (quer pelos riscos para a segurança quer pela indisponibilidade de material que provoca) as entidades internas responsáveis pelos “Processo Realização” e “Processo Projecto”, nas várias oficinas que realizam a manutenção, devem ser incentivadas a procurar soluções em conjunto. A aplicação da metodologia do Ciclo de Deming constitui então uma boa contribuição na procura dessas soluções, sistematizando o estudo do problema, a experimentação/acompanhamento de uma solução, registo e análise dos resultados e, finalmente, a escolha da melhor solução e a tomada de decisão quanto à sua implementação. 5 / 10 Ao ser encerrada uma acção de melhoria, seja a nível da organização seja a nível dos equipamentos e/ou sistemas do material, a mesma deve ficar exaustivamente descrita e devidamente arquivada nos elementos dos veículos/equipamentos, para consultas futuras. A figura exemplifica a aplicação do Ciclo PDCA a um problema de fiabilidade. A solução poderá ser uma alteração no referencial de manutenção (realizar a manutenção sistemática ou antecipar uma intervenção sistemática), uma modificação técnica num sistema ou num equipamento, a substituição de um equipamento por outro de modelo diferente, a alteração na forma de realizar uma operação de manutenção, etc. O PDCA, versátil e de fácil utilização, é indutor de soluções de melhoria num ou mais processos do Sistema de Gestão da Manutenção. A simplicidade, faz dele uma boa prática inicial para induzir nas estruturas da manutenção a atitude proactiva para a autoformação, o desenvolvimento individual e a capacidade para o trabalho em equipa, competências indispensáveis nos grupos responsáveis pela manutenção. A P P - Plan (Planear) A - Act (Actuar) 7 - Tomar decisões: adoptar e generalizar uma solução, ou melhorar a solução, ou procurar outra solução 7 1 - Identificar o problema 2 - Definir e planear uma solução 1 2 3 6 - Analisar os resultados 6 4 5 C Aplicação do Ciclo PDCA ou Ciclo de Deming 3 - Ensinar para aplicar a solução 4 – Aplicar a solução experimentalmente 5 - Investigar, registar resultados da solução D D - Do (Fazer) C - Check (Verificar) 6 / 10 5. O PAPEL DA GESTÃO DE TOPO NA MELHORIA CONTÍNUA DA MANUTENÇÃO DO MATERIAL CIRCULANTE A equipa de gestão de topo das empresas ferroviárias (considerada como “pessoa ou grupo de pessoas que dirige e controla a empresa” [1]) constitui a entidade com maior responsabilidade na aplicação, na empresa, de boas práticas na manutenção do material circulante. Alguns princípios para a gestão das empresas, por serem relevantes para a segurança da circulação do material circulante e sua fiabilidade, devem considerar-se no conjunto das boas práticas aplicáveis aos processos da manutenção do material circulante e são referidos em [1]. A gestão de topo, ao definir a organização da manutenção mais adequada às necessidades que se apresentam à empresa, deve conceber o organograma empresarial definindo rigorosamente as funções de cada uma das suas figuras, delegando responsabilidades no pessoal e proporcionando as condições necessárias para que as funções sejam realizadas e as responsabilidades assumidas de acordo com o pretendido. Os organogramas, as funções, as responsabilidades, etc., devem encontrar-se explicitados em documentos da empresa. Deve por outro lado, impulsionar na empresa o desenvolvimento de indicadores de desempenho das frotas de material circulante e da realização da sua manutenção, de forma a detectar ineficiências na disponibilidade do material, na sua fiabilidade e na execução da manutenção sistemática (ou periódica) relativamente ao definido nos referenciais de manutenção. Indicadores de avarias, de disponibilidade de material, de contadores de manutenção (quilómetros, horas, etc.), e programas mensais/semanais/diários com datas programadas para entrada e/ou saída das oficinas, constituem elementos de controlo relevantes para a tomada de decisões antes que situações indesejáveis tenham lugar. A gestão de topo deve implementar medidas para que indicadores, programas e outras informações sejam divulgados no seio da empresa e proporcionados, 7 / 10 com uma frequência certa, a todos os responsáveis pelos processos de manutenção. 6. A INFORMÁTICA NO APOIO DOS SISTEMAS DE GESTÃO DA MANUTENÇÃO DO MATERIAL CIRCULANTE A produção e utilização de indicadores de desempenho, como referido anteriormente, constituem medidas proactivas fundamentais na gestão dos activos das empresas. As tecnologias de informação oferecem hoje uma diversidade de produtos que permitem inventários rigorosos, históricos pormenorizados da operação incluindo os relacionados com avarias verificadas e taxas de incidência das mesmas, proporcionando formas para obtenção dos indicadores. Recomenda-se a opção por produtos que permitam, de forma integrada, gerir os activos, como referido no parágrafo anterior, mas também os armazéns e a mão-de-obra, proporcionando o apuramento do custo dos trabalhos realizados sobre os activos e a consequente contribuição para a determinação de indicadores de custos de exploração e de manutenção com uma ampla versatilidade de situações (por locomotiva, por série de locomotivas, por equipamento, com produtos utilizados, com mão de obra gasta, por tipo de intervenção, por km percorrido, por tonelada transportada, etc.). Sendo, de um modo geral o custo dos sobressalentes para veículos ferroviários de valor elevado, o conhecimento exacto do imobilizado em armazém por série de material circulante e a identificação de sobressalentes sem consumo, representa um aspecto muito importante na gestão financeira das empresas. È igualmente possível, com esses softwares, a gestão de aparelhos de medição relevantes para a qualidade da manutenção e para a segurança da exploração do material circulante, assegurando a sua verificação/calibração em intervalos de tempo determinados. A empresa deve preparar cuidadosamente o uso de softwares aplicados à manutenção através da organização dos processos, da formação específica do pessoal de acordo com a utilização que deles irá fazer, na identificação dos 8 / 10 activos que pretende rastrear, etc. (O documento [5] indica apenas como devem ser codificados os veículos completos; as empresas devem definir códigos para os equipamentos a rastrear, sendo importante não esquecer nenhum de cujo desempenho a segurança se encontre dependente. Uma opção para a codificação de equipamentos ou sistemas consiste na utilização de uma nomenclatura baseada em “classes”, “categorias” e “número de ordem na categoria”). A preparação cuidadosa da organização e dos processos, como se referiu, permitirá que os sistemas informáticos agilizem a gestão da manutenção sendo fundamental, para a sua fácil aceitação pelos utilizadores, que se insiram nos processos de forma a facilitá-los e simplificá-los, não provocando perdas de tempo devido a esperas demoradas para a inserção de dados e na obtenção de informação, as quais devem ser céleres e fiáveis. A análise das falhas em serviço, a monitorização dos históricos dos equipamentos e a optimização da manutenção preventiva, constituem factores que contribuem para a melhoria da disponibilidade, da segurança e dos custos de exploração das frotas de material circulante. Não menos importante é o apoio que tais aplicações permitem à optimização dos recursos existentes (colaboradores, consumíveis, sobressalentes, ferramentas, etc.) racionalizando o custo do imobilizado em armazéns (sugerindo encomendas de acordo com históricos de consumos, evitando níveis excessivos de stock e rupturas inoportunas) e ajustando a carga de trabalho à capacidade de mão-de-obra. A adequação dos custos de exploração aos serviços prestados constitui um objectivo que recomenda a utilização de aplicações informáticas no apoio aos Sistemas de Gestão da Manutenção. 7. CONCLUSÃO Constituindo a manutenção do material circulante um factor vital para a segurança da exploração ferroviária e para a qualidade do serviço oferecido, deve merecer da parte de todos os responsáveis internos das empresas, a 9 / 10 qualquer nível, e do INCFA como Regulador da Segurança, uma atenção constante. A implementação, manutenção e aperfeiçoamento de um Sistema de Gestão da Manutenção do Material Circulante representa um esforço de organização indispensável para a concretização de uma política de satisfação dos compromissos das empresas ferroviárias para com os utilizadores do caminhode-ferro e para com a sua tutela. Tal Sistema deve ser implementado não como um fim em si mesmo mas como meio que permita à empresa manter o material operacional, disponibilizando transporte com veículos em condições adequadas quer no que respeita à segurança de pessoas e bens quer no que se refere ao conforto dos passageiros, a um custo optimizado. As empresas possuem a liberdade de definirem as suas estruturas organizacionais dentro do que se encontra definido na Lei devendo, contudo, fazer reflectir nos seus métodos de trabalho, procedimentos, requisitos e medidas que contribuam para um estado seguro do material circulante a qualquer momento e condições. Os Sistemas de Gestão da Manutenção do Material Circulante, apoiados em softwares criteriosamente escolhidos, constituem meios adequados para a consolidação e para a melhoria da manutenção do material circulante, para a rentabilização do investimento e optimização de recursos empresariais. INCFA, 08 de Novembro de 2011. 10 / 10