COMUNICA NA ESCOLA: LABORATÓRIO DE PRODUÇÃO TEXTUAL Gabriel Augusto Scheffer1, Marina Ferreira2 (bolsistas de graduação, UFFS) [email protected], [email protected] Dra. Angela Derlise Stübe3 e Me. Luciano Melo de Paula (professores orientadores – UFFS)4 [email protected], [email protected] Me. Diogo Oliveira Ramires Pinheiro (professor - UFFS) [email protected] 5 1. Introdução O “Comunica na Escola” é um projeto de extensão idealizado na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), Campus de Chapecó/SC, inserido em um Programa de extensão multicampi, iniciado em 2010, cujo título é “Comunica: laboratório de produção textual”. A equipe do “Comunica na escola” é composta por dois professores orientadores e dois bolsistas, com parceria da Escola de Educação Básica Tancredo de Almeida Neves, localizada no bairro Efapi, região mais populosa da cidade. O objetivo deste projeto é desenvolver as capacidades textuais dos alunos do primeiro ano do ensino médio de tempo integral. A partir do tema “Lugar onde vivo”, a meta é a produção de textos que mostrem o cotidiano da comunidade através de gêneros que compõem o jornal, nos quais os alunos mostram suas habilidades investigativas e participativas para o desempenho dessa tarefa. Os textos produzidos nas oficinas são postados no blog do Projeto (http://comunicauffs.blogspot.com) e compõe o jornal da turma, intitulado “Tancredo News”. Do ponto vista teórico-metodológico, o projeto proporciona o desenvolvimento das competências comunicativas por meaio de situações reais de uso da linguagem, permitindo a superação da artificialidade presente em várias práticas pedagógicas. Além disso, possibilita que os estudantes se sintam reconhecidos pelos textos publicados nos veículos de divulgação 1 Gabriel Scheffer é acadêmico da 5ª fase do curso de Graduação em Letras Português e Espanhol – Licenciatura, da UFFS, campus Chapecó/SC. 2 Marina Ferrei é acadêmica da 4ª fase do curso de Graduação em História – Licenciatura, da UFFS, campus Chapecó/SC. 3 Angela D. Stübe é doutora em Linguística Aplicada e professora do Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos e do Curso de Graduação em Letras da UFFS – Campus Chapecó/SC 4 Luciano M. Paula é mestre em Literatura e professor do Curso de Graduação em Letras da UFFS – Campus Chapecó/SC. 5 O professor Diogo Oliveira Ramires Pinheiro integrou a equipe de elaboração do projeto inicial do Comunica, orientou o projeto-piloto Comunica na escola, em 2011, e participou na redação deste texto. dos textos (blog do projeto, jornal da turma e mural na UFFS) e motivados a migrarem para textos mais complexos. O encaminhamento das oficinas é pautado nas produções feitas pelos alunos, para posterior postagem no Blog. Até o momento, o trabalho tem sido importante, pois nos possibilitou conhecer e observar o dia-a-dia da sala de aula e do espaço escolar. Para os acadêmicos de licenciatura, esta prática vem contribuindo para enriquecer a experiência docente, além de facilitar o trabalho em outras práticas de ensino e aprendizagem e também na própria universidade, ajudando assim na desenvoltura, para por em prática o que aprendem na área de conhecimento do curso. Ao contribuir para a inserção dos alunos da Educação Básica em uma sociedade letrada e possibilitar a prática docente e a experiência em sala de aula aos bolsistas, o projeto ajuda a UFFS a cumprir sua função social e reforça sua inegável vocação extensionista. 2. Fundamentação teórica. O aporte da linguística na epistemologia contemporânea é hoje percebido como fundamental. Desde as inferências habermasianas de uma “guinada linguística” na teoria do conhecimento que supera relações do tipo sujeito-objeto com o binômio objeto-linguagem, até a questão dos “jogos de linguagem” que esvaziam a língua de sentidos fixos, as reflexões hodiernas garantem o protagonismo aos saberes sobre a linguagem, dentre os quais se destaca, pela especificidade, a linguística. No próprio recorte de seus objetos, também esta última tem sofrido algumas alterações, se tomarmos em conta seu paradigma “instaurador”, o estruturalismo saussuriano e seus avatares. Se “guinada” houve, tal também se deu pelo abandono do sistemático e certa “contaminação” por uma exterioridade sempre-já-aí de qualquer manifestação linguageira. Se tomarmos, então, esse corte, é mister que se aproxime a multiplicidade desses discursos ao entendimento contemporâneo da instituição escolar e, depois, para as particularidades do texto produzido na escola (POSSENTI, 1988). Como aponta Meserani (1995), a escola é a instância própria da consagração e, em seu interior, o ensino se faz mediado por uma via específica: a língua em sua forma padrão. Assim, ao entrarmos no universo escolar, automaticamente somos convidados a penetrar uma escala axiológica que distingue escritura e diferença, ciência e mito, coloquial e gramatical. Enquanto instituição de transmissão, o sistema de ensino formal sempre partirá de uma escolha, responsável por seus pressupostos e sua forma de exercer o poder. Esse caráter de locus dos discursos oficiais traz consigo uma consequência: a língua de que se fala na instituição é uma língua parafrástica, modelo a ser repetido incondicionalmente e catalisador das relações verticais de poder e interlocução, pelo qual ao aluno só resta o silêncio e a cópia e, para os docentes, um saber a ser transmitido e jamais questionado. A produção textual dos estudantes daí emergiria: espaço de transgressão a priori interdita. Dessa perspectiva, as correntes linguísticas mencionadas aparecem dando novo fôlego a relação determinante e redutora da escola, inferida sobretudo de sua aura de aparelho ideológico estatal. Se, atualmente, é possível se vociferar pelo papel do sujeito agente, tal deve ser pensado a partir de condições de produção intradiscursivas particulares, inquiridoras das sistematicidades binaristas e dos exercícios de combinatória e reprodução. De maneira tímida no caso brasileiro, as metamorfoses só apareceram no início da década de noventa, com a “descoberta” tardia dos analistas do discurso franceses, com a leitura de Bakhtin- Voloshinov, com a adesão ao neopositivismo wittgeinsteiniano e seus pares. Podemos relacionar ainda a abertura às soluções dos Parâmetros Curriculares Nacionais em sua opção pelo trabalho com gêneros discursivos e sua ênfase nas teorias do próprio Bakhtin e por sua negação de uma metalinguagem gramatical redentora no ensino de Língua. Ademais, é oportuno lembrarmos das discussões acerca da textualidade, discutidas por Val (1999) a partir da classificação de Beaugrande e Dressler, cujos critérios de definição são tanto lógico-formais (coerência e coesão) quanto pragmáticos (intencionalidade, aceitabilidade, situacionalidade, informatividade e intertextualidade). De sua conjugação – e somente dessa forma – é que apareceriam textos. Aproximando linguístico de extralinguístico, as gramáticas textuais trouxeram novas discussões à produção de textos, tendo seus critérios pragmáticos radicalizados tanto pela Análise de Discurso quanto pela pragmática. Essa ampliação só foi exequível porque os paradigmas de transparência e de comunicação da língua estavam cindidos: não havia mais adequação simples entre língua e pensamento; não era mais possível decodificar informações de forma binária, desconsiderando as condições de produção da interlocução. Na modificação desses entendimentos – gramaticais ou idealistas – as relações têm importância axial: relação entre textos e de textos com o campo cultural, social e histórico. Nesse moto-contínuo, a própria linguagem passa a ser entendida como discurso sobre diversas linguagens, marcado no espaço-tempo e sem referencial definitivo. Nesse instante de transformações linguísticas pretensamente libertárias, a tentativa é de aproximação entre educação formal pública básica e a Universidade. Se, então, a escola é agenciadora de certas práticas de leitura e escrita, é importante que os alunos possam se tornar proficientes nessas modalidades, nesses gêneros do discurso. Assim, o Comunica permitiria uma reflexão contínua entre textualização e leitura e, mais profundamente, seria uma oportunidade de diminuir o "artificialismo" das práticas escolares (GERALDI, 1999), justamente por permitir que os sujeitos "falem de si" e de seu entorno - escolar, político e cultural. Nessa perspectiva, o texto, conforme Geraldi (1997), deve ser o conteúdo principal do ensino de língua. Para além das regras normatizantes, deve-se compreender o texto como uma prática social, capaz de incluir socialmente o sujeito falante/escrevente (ROJO, 2009). Por muito tempo, como lembra Koch (2002), produziu-se na escola textos voltados para a própria escola, mais precisamente para serem avaliados e não para serem lidos por um determinado público. O Projeto Comunica visa, ao contrário, possibilitar a alunos do Ensino Médio e acadêmicos da UFFS a produção de textos reais, historicamente situados, em que haja um interlocutor real, com expectativas a serem atendidas. O Comunica visa, também, propor um diálogo entre Universidade e Escola, buscando subverter o “artificialismo” do ensino de língua através de contribuições teóricas e pedagógicas baseadas nos gêneros textuais (BRONCKART, 1999; SCHNEUWLY & DOLZ, 2004), especificamente gêneros da esfera jornalística, associadas à experiência dos docentes da Educação Básica. Hoje, a linguagem adotada na mídia impressa e falada é variedade linguística de prestígio social, sem ser demasiada formal a ponto de cultivar arcaísmos, nem ser informal, oferecendo-se, assim, como um novo padrão da língua portuguesa (PERINI, 1993). A opção por textos da esfera jornalística se dá, portanto, por ser uma possibilidade de aperfeiçoamento de leitura e escrita dos alunos, os quais têm contato diário com as mídias impressas e, também, porque poderão produzir seus textos e publicá-los. A esfera jornalística também é pródiga em gêneros textuais, ofertando a possibilidade de se produzir textos informativos e argumentativos (FARIA, 1996), como notícias, reportagens, artigos de opinião, ensaios, crônicas etc. Além disso, a linguagem jornalística possui características próprias que a aproximam de outros textos técnicos (LAGE, 2001), como o acadêmico, e dominá-lo pode significar um “trampolim” para o domínio de gêneros científicos. A relevância do domínio técnico das produções textuais será associada, ainda, ao desenvolvimento da capacidade crítica dos envolvidos no projeto. A leitura da realidade e de diferentes textos, e a interação com o contexto de atuação serão enfocadas, a fim de se buscar a superação do senso comum, especialmente da visão pouco crítica e até ingênua em relação aos grandes meios de comunicação brasileiros (ABRAMO, 2003). Ao partirmos desse olhar sobre o texto, precisamos ter presente, na produção textual, que o aluno é, ao mesmo tempo, sujeito do texto que lê e que escreve. O texto torna-se um espaço de interação, interlocução, embate de ideias e de discursos, pois toda produção linguística é dialógica e complexa, nela se imprimem marcas históricas, choques e contradições. Nessa direção, todo o texto é produção coletiva, no qual os seus sentidos dependem da relação entre sujeitos, ou seja, constroem-se na produção e na interpretação dos textos. O dialogismo define o texto como “um tecido de muitas vozes” que se entrecruzam, se completam, respondem umas às outras ou polemizam entre si no interior do texto. Eduardo Guimarães (2007) propõe que o texto seja considerado uma operação enunciativa, e que o essencial para a sua textualidade é a operação que conduz construir como unidade o que é disperso. A textualidade, então, diz respeito ao modo como o sujeito-autor se posiciona ao assumir a palavra. As operações próprias da textualidade e os procedimentos que funcionam para estas operações, são processos de coesão (relações que reenviam à interpretação de uma forma à outra, numa sequência do texto) e de consistência (relações que reenviam à interpretação de uma forma de acontecimento enunciativo) que possibilitam diferentes interpretações ao leitor. Entendemos, então, que interpretar é buscar sentidos, não atribuí-los. Dessa maneira, é que podemos afirmar que o sentido é do sujeito ideológico e que a interpretação vai procurar colocar em relação o campo da língua e o campo da sociedade (história e ideologia, que remetem o discurso à sua exterioridade). Logo, o texto se constitui pela memória discursiva, abarcando outros dizeres historicamente construídos e que o sujeito reatualiza em seu discurso. Compreender o texto sob essa perspectiva nos leva a priorizar o diálogo suscitado pelas práticas de produção textual, o que, pedagogicamente, implica criar condições reais de produção aos alunos, que permitam a circulação de seus textos. Possibilita, também, o senso crítico ao aluno, a relação discursiva entre autor e leitor, em que ambos exercem a função de sujeito sem sujeitar-se. 3. Apresentação do Projeto “Comunica na escola”: metodologia e análise de resultados parciais Instituída há pouco mais de dois anos, a Política Nacional de Formação de Professores se propõe a “organizar (...) a formação inicial e continuada dos profissionais do magistério para as redes públicas da educação básica”, conforme o Decreto No 6.755, de 29 de janeiro de 2009. O atendimento às diretrizes dessa Política constitui o terceiro princípio norteador do Projeto Pedagógico Institucional (PPI) UFFS, a saber: “atendimento às diretrizes da Política Nacional de Formação de Professores do Ministério da Educação, (…) cujo principal objetivo é coordenar os esforços de todos os entes federados no sentido de assegurar a formação de docentes para a educação básica em número suficiente e com qualidade adequada” (www.uffs.edu.br). O presente projeto se justifica, portanto, na medida em que se propõe a suprir algumas das demandas apontadas pela Política Nacional de Formação de Professores e pelo PPI da UFFS, por meio da inserção de acadêmicos de cursos de Licenciatura da UFFS em práticas de sala de aula e pelo oferecimento de oficinas de produção textual a alunos da Educação Básica. O comprometimento com a qualificação e formação continuada na Educação Básica não se dá, contudo, desvinculado da adesão a determinadas perspectivas teóricas e da adoção de modelos de ensino específicos. A despeito da profusão de estudos e ensaios acadêmicos, bem como das orientações contidas em documentos oficiais como os PCNs e PCN+, algumas pesquisas mostram que a realidade do ensino de língua portuguesa tem mudado bem mais lentamente do que deveria (SANTOS; NUNES, 2004; BARBOSA, 2002). Esse aparente paradoxo tem explicação. Para Santos e Nunes, falta aos professores orientação e informação. Barbosa (2009, p. 150), por seu turno, aprofunda a discussão, localizando o que parece ser o cerne do problema: Nenhum dos documentos oficiais colocados como referências curriculares (PCNs e demais propostas curriculares de estados e municípios) pode ser transposto diretamente para a sala de aula [...]. Dessa forma, são necessários outros níveis de concretização, conforme apontado pelo próprio documento introdutório aos PCNs, tais como a reelaboração das propostas curriculares no âmbito dos municípios e estados; a elaboração do projeto educativo de cada escola e a elaboração da programação de cada professor a ser desenvolvida em sala de aula, que deve estar respaldada por e integrada com os níveis anteriores. Na sequência, a autora defende que essas tarefas “dependem também da implementação de políticas de formação de educadores, visto que as elaborações acima citadas não são tarefas prontamente factíveis na maioria das escolas públicas brasileiras”. É precisamente essa necessidade que abre um espaço a ser ocupado pelo projeto “Comunica na escola”: trata-se de promover a aproximação entre Universidade e Escola, e a articulação entre teoria e prática. Em suma, este projeto se justifica, também, diante da necessidade de construir pontes para a implantação efetiva, no cotidiano escolar, de um modelo de ensino de produção textual alinhado com as descobertas e orientações oficiais mais recentes da área. O atual projeto Comunica na escola integra o Programa Comunica, institucionalizado na UFFS em agosto de 2010 como um projeto multicampi e, a partir de 2011 como Programa de extensão. O Comunica se constitui em um Laboratório que contribui, de um lado, para o desenvolvimento da competência de produção textual dos acadêmicos envolvidos no projeto e, de outro, para o registro da vida institucional da UFFS, da vida cultural da mesorregião e de discussão de temas geradores relevantes à comunidade regional, no caso deste projeto, de temas e práticas relevantes alunos do ensino médio da escola parceira. Em 2010/2, o Projeto comunica envolveu 12 professores e 30 acadêmicos, entre bolsistas e voluntários, dos cinco campi da UFFS. Naquela ocasião, o foco era a produção textual dos graduandos da UFFS, divulgada por meio de um blog próprio e do informativo institucional da Universidade. Em 2011, o Programa ampliou seu escopo de atuação, passando a replicar, nas salas de aula da Educação Básica e com a mediação de professores desse nível de ensino, a metodologia que fora desenvolvida com sucesso no semestre anterior. Essa experiência foi levada a cabo, a título de projeto-piloto, em duas escolas, localizadas nas cidades de Quilombo/SC (sob orientação do professor Diogo Oliveira Ramires Pinheiro, do Campus Chapecó/SC) e Laranjeiras do Sul/PR (sob orientação da professora Marcela Langa Lacerda Bragança, do Campus Laranjeiras do Sul). Com ela, o Projeto passa a ter relação direta, também, com variados componentes curriculares da graduação em Letras - Licenciatura, como Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa, Linguística Aplicada, Linguística Textual e Prática de Ensino e Estágio Supervisionado, além de Leitura e Produção Textual I e II. Em 2012, no campus Chapecó, propusemos o Projeto Comunica na escola, que consiste em uma parceria da UFFS com a Gerência Regional de Educação, no sentido de estender a metodologia já desenvolvida no Comunica a alunos do primeiro ano do ensino médio da Escola Estadual de Educação Básica Tancredo Neves. A opção por essa escola justifica-se por: a) ser escola que desenvolve projeto-piloto de ensino médio em tempo integral. A ampliação da oferta de educação de tempo integral é uma das metas estabelecidas pelo Plano Nacional de desenvolvimento da educação, no que a UFFS pode contribuir efetivamente visto já possuir Programa de Pós-Graduação Lato Sensu em Educação Integral, em sua segunda edição. Tal área vem se consolidando como um campo de pesquisa promissor em nossa IFES e o espaço de atuação do Comunica na escola parceira pode abrir possibilidades de interlocução e de pesquisa bem importantes; b) a escola E.B.Tancredo Neves está localizada no bairro Efapi, uma região carente do município de Chapecó, cuja população, de mais ou menos 60.000 pessoas, é, em número expressivo, trabalhador da agroindústria. Ao optarmos por esse locus de atuação, privilegiamos um público-alvo mais vulnerável econômica e socialmente e nos inscrevemos em um dos princípios norteadores da UFFS, expresso em seu Projeto Político Institucional, qual seja, estabelecer “dispositivos de combate às desigualdades sociais e regionais, incluindo condições de acesso e permanência no ensino superior, especialmente da população mais excluída do campo e da cidade” (www.uffs.edu.br), de forma a produzir um impacto social significativo na região de abrangência da UFFS e reforçar a vocação extensionista dessa universidade. Ao mesmo tempo que atua na educação básica, o Projeto permite reforçar o curso de graduação em Letras da UFFS, atualmente em fase de consolidação, na medida em que se integra diretamente a muitos de seus componentes curriculares, conforme enumerado acima. Além disso, é importante reforçar que, independente da área de formação do sujeito, uma das exigências da contemporaneidade é o desenvolvimento de habilidades e competências relativas à produção textual. Esta se faz necessária, portanto, para além da formação técnica em uma área do conhecimento específica. Para contribuir com essa formação, o Comunica se configura em espaço de promoção de um sujeito crítico capaz de fazer a mediação entre o conhecimento acadêmico/escolar e a comunidade, resolver situações-problema, compreender o seu entorno, fazer a leitura de sua realidade social e atuar com desenvoltura em uma sociedade letrada. Possibilita, também, transformar o dia-a-dia da UFFS e da escola em objeto de observação e atualização, permitindo aos estudantes melhor conhecer e tornar conhecidos os agentes do ensino, da pesquisa, da extensão e da administração, os seus métodos, técnicas, limites, possibilidades e motivações. Ao trabalhar com diferentes temas geradores – tais como: cotidiano da UFFS; cotidiano da escola parceira; (re)conhecimento e divulgação de produções artísticas e artistas da mesorregião da fronteira sul; projetos pedagógicos relevantes em execução na educação básica; entre outros –, o projeto permite ao graduando bolsista e/ou voluntário e ao aluno da educação básica uma experiência de pesquisa, de reflexão e de produção que contribui à sua formação. Além disso, o projeto inscreve-se nas políticas de extensão definidas pela I Conferência de Ensino, Pesquisa e Extensão (I COEPE), da UFFS, realizada em 2010. O documento-base, ao definir áreas e linhas prioritárias de Extensão na/da UFFS, coloca a formação de leitura e de produção escrita como uma das ações prioritárias (TREVISOL, 2011). No mesmo documento, está expresso que a política de Extensão da UFFS prioriza “a Extensão como prática acadêmica que interliga a Universidade, nas suas atividades de Ensino e de Pesquisa, com as demandas da região da Fronteira Sul”. O projeto justifica-se, então, institucionalmente, pois alia pesquisas dos alunos sobre temas geradores, discussões com os orientadores, atividades formativas, oficinas, produções textuais que repercutem no processo de ensino e formação dos alunos à divulgação dos resultados desse processo a toda a comunidade regional por meio dos veículos de circulação dos textos dos alunos. Além disso, a comunidade se envolve no processo de formação dos alunos ao contribuir com as pesquisas, entrevistas e coletas de informações que sustentarão a produção textual no projeto. A UFFS tem como prioridade a intervenção social. Para tanto, suas ações estão calcadas na integração entre Pesquisa, Ensino e Extensão – o que é uma condição para uma Universidade que se pretenda socialmente relevante. No caso do Comunica, os três "pilares" do Ensino Superior são contemplados na articulação com a Educação Básica. De um lado, pesquisas recentes na área de ensino de língua portuguesa – muitas delas, é importantíssimo destacar, desenvolvidas pelos docentes da UFFS que integram Programa de Extensão Comunica, no âmbito dos grupos de pesquisas da instituição – subsidiam a metodologia proposta pelo projeto e a elaboração de sequências didáticas a serem desenvolvidas nas oficinas com os alunos da escola parceira. No sentido inverso, o contato com o ambiente escolar durante a realização das ações de Extensão, fundamentalmente, subsidiam e alimentam o desenvolvimento de novas pesquisas ou tópicos de pesquisa. Dessa forma, fica claro que o presente projeto propicia a interpenetração e o reforço recíproco desses dois eixos. O eixo do Ensino, naturalmente, perpassa os outros dois, na medida em que tanto o acesso às pesquisas desenvolvidas (Pesquisa) pelos docentes quanto o conhecimento íntimo da realidade escolar (Extensão) reforçam a formação do graduando. Afinal, no que se refere à formação dos acadêmicos da UFFS, o projeto oferece um contato com o ensino formal (objetivo das licenciaturas) e uma possibilidade de troca direta com professores e alunos que ali atuam. Ademais, essa ida à Escola permite a apropriação devida do sentido de Extensão, já que o Comunica não apenas será o laboratório de textos, baseado na pesquisa atualizada acerca de gêneros, discurso, produção textual e leitura, mas uma oportunidade de analisar com os professores e alunos da escola parceira - alternativas às práticas pedagógicas atuais, entendendo a linguagem como constitutiva das relações entre os sujeitos e os universos culturais de que tomam parte. Desse modo, o projeto “Comunica na Escola” se propõe a contribuir para a melhoria da qualidade da educação pública na região de abrangência da Universidade Federal da Fronteira Sul – a Mesorregião da Grande Fronteira do Mercosul e seu entorno. Isso com os propósitos específicos de: (a) fortalecer a formação continuada de professores da rede pública na região de abrangência da UFFS; (b) promover a necessária articulação entre teoria e prática, na medida em que se preveem orientação, supervisão e acompanhamento de atividades práticas desenvolvidas por acadêmicos de cursos de licenciatura junto aos alunos da escola parceira; (c) disseminar uma perspectiva de ensino de língua portuguesa ancorada no texto como unidade básica e comprometida com a missão de facultar ao aluno o domínio de um conjunto de práticas sociais próprias de uma sociedade letrada; (d) discutir com os docentes da escola a possibilidade de uma efetiva operacionalização dessa perspectiva no cotidiano da sala de aula, por meio de projetos didáticos fundamentados na noção de gêneros discursivos; (e) difundir e acompanhar a implantação, em escola da rede pública, de um modelo de ensino de língua portuguesa que permita a superação da artificialidade ainda presente em diversas práticas pedagógicas, oferecendo um espaço para a produção circulação de textos reais; (f) dermitir aos alunos de ensino médio o desenvolvimento de suas habilidades de leitura e produção textual; (g) dossibilitar aos alunos da UFFS, envolvidos no projeto, o contato real com situações de sala de aula, o planejamento e a execução de sequências didáticas e o desenvolvimento de suas habilidades de escrita. Iniciamos o trabalho no mês de abril do ano 2012. Na escola Tancredo de Almeida Neves, três turmas do primeiro ano do ensino médio atualmente estão participando das atividades. Em um primeiro momento, no primeiro semestre, os alunos foram convidados a produzir textos, a partir do tema “o lugar onde vivo”. O objetivo era que eles procurassem conhecer melhor o cotidiano do bairro na qual eles vivem, buscassem curiosidades, pessoas e histórias que, de alguma maneira, os instigassem a escrever sobre esse determinado assunto. Depois, esses textos eram revisados pela equipe e publicados no blog do. Isso contribui também para o ensino e aprendizagem das diferentes estruturas que compõem o estudo da Língua Portuguesa, com ênfase nos gêneros jornalísticos. Já no segundo semestre, a meta foi à produção de um jornal pelos alunos. Cada estudante teve uma função nesse trabalho. Escolhemos desde o editor chefe até as tarefas de escrita que cada estudante escolheu, em um trabalho coletivo, a partir de vários gêneros jornalísticos envolvidos na atividade. Atualmente, o trabalho esta em fase de desenvolvimento. 4. Elucidando a experiência Docente: o olhar do acadêmico Durante o período de cinco meses de atividades desenvolvidas pelo projeto “Comunica na escola”, diversas análises e relatos de experiências já podem ser socializados a partir deste trabalho. Iniciamos no mês de abril, com três turmas do primeiro ano do ensino médio da escola Tancredo de Almeida Neves, município de Chapecó. No que tange ao desenvolvimento do projeto, estão envolvidos como coordenadores os professores Luciano Melo de Paula e Angela Derlise Stübe, docentes da Universidade Federal da Fronteira Sul, e como bolsistas os estudantes Gabriel Augusto Scheffer e Marina Ferreira, também da UFFS. Com predominância do trabalho com textos dos gêneros jornalísticos, realizamos oficinas com as três turmas intercaladamente, com encontros programados para todas as segundas-feiras no período da tarde, com duração de duas horas. Propusemos para as turmas a produção de um texto, especificamente com a utilização do gênero notícia com o tema “o lugar onde vivo”, no qual os estudantes teriam que utilizar de seus instintos investigativos para procurarem informações e curiosidades relevantes para a realização da atividade, além de poderem desbravar um pouco mais do dia-dia do seu bairro. Durante os dias de produção da tarefa, realizamos várias oficinas para auxiliar na construção dos textos. Inclusive com a presença de uma jornalista profissional que esclareceu dúvidas e também orientou os alunos com dicas para contribuir na contextualização das ideias. Durante o desenvolvimento das atividades, notamos certo grau de desequilíbrio com relação ao desempenho dos alunos na realização das tarefas propostas. Alguns estudantes se envolveram mais profundamente, tendo como efeito a produção de ótimos textos. Já outros alunos não corresponderam às expectativas esperadas, pois não participaram ou não demonstraram empenho para obter êxito na tarefa. Entretanto, fazendo-se um balanço geral, acreditamos que até o momento o trabalho vem sendo muito compensatório, pois estamos conseguindo colocar em prática todo o planejamento feito no início do projeto. Claro, para o segundo semestre mudamos um pouco a dinâmica, mas somente para melhorar e aprofundar o ensino e a aprendizagem da Língua portuguesa através de gêneros jornalísticos. A participação no projeto “Comunica na escola” nos proporcionou algumas experiências na prática docente, mesmo que seja pouco o tempo no ambiente escolar. Sendo nossa primeira participação em uma sala de aula, no começo estávamos um pouco tímidos, pouco ambientados. Mas, no decorrer do desenvolvimento do trabalho no projeto, aprendemos práticas e estratégias de como ensinar, portar-se e também transmissões de habilidades que, com o tempo, fomos adquirindo. Com certeza, ainda há muito que fazer. Entretanto, acreditamos que estamos prontos para encararmos não somente os próximos desafios que hão de aparecer no decorrer das atividades do projeto “Comunica na escola”, mas também em outros compromissos que envolvam a prática docente. A participação somente veio a somar com as teorias e demais conhecimentos que adquirimos no âmbito acadêmico. Referências: BARBOSA, J. P. Do professor suposto pelos PCNs ao professor real de Língua Portuguesa: são os PCNS praticáveis? In: A prática de linguagem em sala de aula: praticando os PCNs / org. Roxane Rojo. São Paulo: EDUC; Campinas: Mercado de Letras, 2000. BRONCKART, J. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sóciodiscursivo. Trad. Anna Rachel Machado, Péricles Cunha. São Paulo: EDUC, 1999. DIONÍSIO, Angela P.; MACHADO, Anna R.; BEZERRA, Maria A. (Org.) Gêneros Textuais e Ensino. 2ª ed. Rio de Janeiro:Lucerna, 2003. FARIA, M. A. O jornal na sala de aula. 6. ed. São Paulo: Contexto, 1996. FOLHA DE S. PAULO. Novo manual da redação. Disponível em: GERALDI, J. W. Linguagem e ensino: exercício de militância e divulgação. Campinas, São Paulo: Mercado de Letras: Associação de Leitura do Brasil, 1999. GERALDI, J. W. Portos de Passagem. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997. GUIMARÃES, Eduardo. Texto e argumentação. Campinas : Pontes, 2007. http://www1.folha.uol.com.br/folha/circulo/manual_redacao.htm. Acessado em 27/10/2010. KOCH, I. V. Desvendando os segredos do texto. São Paulo: Cortez, 2002. LAGE, N. Linguagem jornalística. 7. ed. São Paulo: Ática, 2001. MESERANI, S. O intertexto escolar: sobre leitura, aula e redação. São Paulo: Cortez, 1995. MOTTA-ROTH, Désirée; HENDGES, Graciela. Produção textual na universidade. São Paulo : Parábola, 2010. ORLANDI, Eni. Discurso e texto: formulação e circulação dos sentidos. Campinas : Pontes, 2008.ABRAMO, P. Padrões de manipulação na grande imprensa. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2003. PERINI, Mário A. Para uma nova gramática do português. São Paulo: Ática, 1993. POSSENTI, S. Discurso, estilo e subjetividade. São Paulo: Martins Fontes, 1988. ROJO, Roxane. Letramentos múltiplos, escola e inclusão social. São Paulo: Parábola Editorial, 2009. 128 p. SANTOS, Lilian Mara Dal Cin; NUNES, Célia. Práticas Pedagógicas dos professores de Lingua Portuguesa do ensino Médio: Perspectivas de mudança. In: Anais do I Encontro Memorial do ICHS, 2004. SCHNEUWLY, B.; DOLZ, J. Gêneros orais e escritos na escola. Campinas: Mercado de Letras, 2004. TREVISOL, J.; CORDEIRO, M.H.; HASS, M. (org) Construindo agendas e definindo rumos: I Conferência de Ensino, Pesquisa e Extensão, UFFS, 2011. VAL, M. G. C. Redação e textualidade. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.