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JORNAL ANJ
Junho / 2011
ENTREVISTA / FERNANDO RODRIGUES
Lei é primeiro passo na
estrada da transparência
Divulgação
“Não tenho conhecimento de uma lei que seja tão
ampla como a proposta para o Brasil”, diz Rodrigues
Sérgio Vilas Boas
de São Paulo
O
jornalista Fernando Rodrigues, da Folha
de S.Paulo, é um dos protagonistas de um
verdadeiro esforço conjunto para que o
Brasil finalmente adote uma lei de acesso a
informações públicas. Presidente da Associação
Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), ele
participou ativamente do lançamento, em 2004,
do Fórum de Direito de Acesso a Informações
Públicas. Seu empenho tem sido tão grande que,
em Brasília, há quem diga em tom de brincadeira
que a lei, ao ser aprovada, deveria levar seu nome.
O Projeto de Lei da Câmara n° 41/2010, que
regulamenta o artigo 5° da Constituição Federal,
não foi sancionado pela presidente Dilma
Rousseff no dia último 3 de maio (Dia Mundial
da Liberdade de Expressão), conforme se
esperava, porque o texto ficou retido na
Comissão de Relações Exteriores, presidida pelo
Como foi a trajetória de elaboração e
aprovação do projeto de lei?
A discussão sobre uma Lei de
Acesso começou no início dos anos
2000. Entidades de jornalistas e de
mídia abordaram o assunto e
passaram a promover o debate. Em
2003, o deputado federal Reginaldo
Lopes (PT-MG) apresentou um
projeto modesto que contemplava
alguns itens necessários a uma
legislação sobre o tema. A partir daí,
foram anos e anos de pressão até que
se chegasse ao estágio atual, com um
texto pronto para ser votado pelo
Senado - aliás, o texto em tramitação
no Senado tem como projeto original
o do deputado Lopes.
Sua participação no processo se deu
em função da Abraji ou foi mesmo
senador Fernando Collor de Mello, que também
freou a tramitação no dia 18 de maio.
Embora a presidente Dilma declaradamente
seja favorável a essa lei, houve resistências do
Ministério da Defesa - a repressão política foi
exercida durante a ditadura por militares em
instalações militares, o que incluiu torturas e
“desaparecimentos”, e do Itamaraty, que estaria
preocupado com a abertura dos arquivos da
Guerra do Paraguai (1864-1870) e do processo
de anexação do estado do Acre em 1903, antes
pertencente à Bolívia.
O jornalista Sérgio Vilas-Boas, freelancer do
Jornal ANJ, conversou com Rodrigues sobre sua
participação no esforço pela aprovação da lei e o
que ela representará para o país e para o
jornalismo brasileiro.A seguir, os trechos
principais da entrevista realizada por telefone.
antes, como jornalista da Folha?
Das duas formas, mas sobretudo por
meio da Abraji. Criada em 2002, a Abraji
é uma entidade sem fins lucrativos nem
filiação político-partidária.Adotou em
seu estatuto, entre outras, a seguinte
missão:“Defesa da democracia, do livre
exercício do jornalismo investigativo e
da liberdade de expressão. Entre suas
prioridades estão a defesa da
transparência nos negócios públicos e a
garantia de livre acesso a informações
dos órgãos públicos”.A primeira
iniciativa orgânica para debater uma Lei
de Acesso foi em 30 de setembro de
2003, quando a Abraji, em conjunto com
a ANJ, realizou o 1º Seminário
Internacional sobre Direito de Acesso a
Informações Públicas, em Brasília.
Nesse encontro, as entidades presentes
decidiram criar uma coalizão a favor de
Fernando Rodrigues preside a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji)
uma Lei de Acesso. Nasceu, então, o
Fórum de Direito de Acesso a
Informações Públicas.
Os novos agentes
políticos entendem a
necessidade de
avanços institucionais
Por que o Brasil demorou tanto
para elaborar e colocar em votação
um projeto de lei dessa natureza?
A demora é relativa. Nos Estados
Unidos, o processo demorou mais de
uma década até que uma lei fosse
aprovada - no final dos anos 1960. O
Brasil ainda é um país atrasado e com
uma democracia muito jovem, de apenas
26 anos. Era natural que outras
demandas ocupassem a agenda nacional
depois do fim da ditadura, em 1985.
Agora, imagino, o país está mais maduro
e buscando formas mais sofisticadas de
aperfeiçoar as suas instituições
democráticas.
O que fez esse processo progredir
rapidamente nos últimos dois anos?
A democracia, assim como tudo
na vida, tem ciclos. Acabou um ciclo
no Brasil com os oito anos do
governo Lula. Agora, imagino, os
novos agentes políticos entendem a
necessidade de haver alguns avanços
institucionais que não foram
possíveis em anos anteriores. Pareceme ser esse o caso da orientação do
Palácio do Planalto em relação à
aprovação de uma Lei de Acesso.
É importante que o Brasil
aprove essa lei rapidamente?
O Brasil é uma das maiores
economias do planeta e uma nação
importante para o equilíbrio
democrático na América do Sul.Ao ter
uma Lei de Acesso, o país emite um sinal
vigoroso em direção a mais liberdade de
informação - o que é vital para os países
sul-americanos.
Quais os benefícios dessa lei
para o jornalismo brasileiro?
A matéria-prima do jornalista é a
informação. Quando o acesso é
dificultado, o jornalismo perde.A lei
tornará mais acessível aos repórteres os
dados necessários para que possam ser
produzidos textos mais completos.
Ganharão todos os leitores
consumidores de notícias.
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