CRISE EUROPEIA Hollande, o desejado "Roosevelt da Europa" toma hoje posse O novo Presidente francês é olhado com interesse e esperança por boa parte dos europeus, ansiosos por uma mudança na política de austeridade a qualquer preço. Na Grécia, sobretudo Clara Barata de manhã, François Hollande toma posse como Presidente de França, com toda a pompa que o momento exige. À tarde, já legítimo representante do seu país, e também portador das esperanças de uma Grécia que se vê à beira da exclusão da moeda única, tem uma tarefa de Hércules: vai à Alemanha jantar com a senhora cujo nome muitos europeus pronunciam franzindo o cenho: Angela Merkel. A missão do Presidente "normal" da França é convencer a chanceler alemã a reabrir negociações sobre o tratado de disciplina orçamental, para aliviar a austeridade e incluir Hoje medidas de incentivo ao crescimento. Essa foi uma das promessas primordiais da sua campanha, e foi aquela que fez com que a esquerda europeia olhasse para Hollande como uma lufada de ar fresco que poderia inverter o discurso e a prática da austeridade como resposta à crise da dívida na Europa. Durante a campanha, Merkel recusou-se a receber Hollande. Quando ele foi eleito Presidente, disse que o receberia "de braços abertos", para renovar a relação franco-alemã, o eixo em que assenta a União Europeia. Mas foi deixando vários rotundos neins quanto a mudanças de rumo. Mesmo após a pesada derrota da sua CDU, no domingo, no estado-federado da Renânia do Norte-Vestfália: "Não afecta o trabalho que temos a fazer na Europa", garantiu Merkel. Sobre o encontro de hoje, Hollan- gar a um bom compromisso". A Grécia, onde os partidos continuavam a discutir as (im)possíveis geometrias de coligações para formar um governo que aceite continuar a pôr em prática as dolorosas medidas da troika e evitar novas eleições em Junho, enlouqueceu ontem os mercados, com políticos, financeiros e académicos a falarem, de forma cada vez mais descarada, da possibilidade de a Grécia sair do curo. Richard Parker, um economista de Harvard e conselheiro do exsocialista grego primeiro-ministro George Papandreou, declarou mesmo que a Grécia já tinha considerado seriamente sair do curo. Mas os gregos têm as esperanças concentradas em Hollande. O diário Ta Nea repescou para título uma frase do economista Thomas Piketty, François Hollande, o "Roosevelt da Europa", para sublinhar a necessidade de um NewDeal para a UE, para relançar o crescimento. Alteração de forças "Depois das eleições, François Hollande representa a grande esperança de uma alteração na relação de forças e uma revisão na política europeia", disse à AFP o politólogo Georges Séfertzis. Prova disso é que Alexis Tsipras, o líder da coli- gação de esquerda radical Syriza, o segundo partido mais votado nas legislativas de 6 de Maio, tentou encontrar-se com Hollande na semana passada. A Syriza quer permanecer no curo e na UE, mas recusa as condições da troika. Se houver eleições pode bem ser o vencedor. O Presidente cuja palavra de ordem foi "a mudança é agora" terá um início de mandato que é uma sucessão de provas de fogo. O encontro com Merkel servirá de preparação para uma cimeira informal em Bruxelas no dia 23 e permitirá à chanceler conhecer o seu novo parceiro francês, e perceber até que ponto está empenhado em aliviar as cordas da austeridade para incluir o crescimento na agenda europeia. Se a UE discute uma espécie de Plano Marshall neutro em termos de dívida pública o que permitiria aos estados injectar dinheiro na economia, financiando grandes projectos, sem incorrer nas penalizações por agravar a dívida -, o mesmo economista que falou em Hollande como o "Roosevelt europeu" sublinha que esta estratégia não tem futuro a longo prazo. A mutualização das dívidas públicas é o passo a dar, escreveu, no Liberation. Sexta-feira, Hollande estará nos EUA, onde se encontra com Barack Obama, e no fim-de-semana tem uma cimeira do em Camp David cimeira da NAe uma importante TO onde irá dizer que quer tirar a França do Afeganistão um ano mais cedo. - - G - 8 de falava cautelosamente ontem à tarde: "Seremos francos, diremos o que pensamos, não um sobre o outro, mas sobre o futuro da Europa... Não concordamos em tudo. Vamos falar sobre isso para podermos che- De regresso a França reunir-secom o conselho de ministros. Hollande tem mantido um silêncio sepulcral sobre as suas escolhas, mas o nome do primeiro-ministro será conhecido hoje, e o resto do governo na quarta-feira. Fala-se insistentemente de JeanMarc Ayrault, o chefe do grupo parlamentar e presidente da Câmara de Nantes, como o mais forte candidato a primeiro-ministro, pela sua proximidade com Hollande, e por ser conhecedor da língua e cultura á 'François Hollande representa a esperança de uma uma revisão na política europeia", diz o politõlogo grego Séfertzis alemãs. A sua posição enfraquece por ter sido condenado, há 15 anos, pela elaboração do boletim municipal sem concurso público. A líder do PS, Martine Aubry, também está na corrida, mas as suas relações com Hollande são más, e é mais à seria esquerda que o Presidente como ter um governo de coabitação, dizem os analistas. Hollande poderá escolher alguém menos óbvio. Falase, entre outros, de Manuel Valls, da sua o estratega de comunicação - campanha. A última oportunidade Comentário Jorge Almeida Fernandes que François Hollande e Angela Merkel se vão encontrar hoje em situações inversas. Hollande, crítico da austeridade, beneficia da sua fresca eleição e de algum capital de simpatia em vários países europeus. E terá pela frente uma Merkel enfraquecida pela derrota eleitoral do fim-desemana, sob cerrada crítica da e em oposição social-democrata risco de isolamento na Europa. Berlim teria começado a ceder terreno. O ministro das Finanças, Dir-se-á Wolfgang Schãuble, reassegura que crescimento e saneamento orçamental não são contraditórios. Acontece que, no encontro de hoje, as vantagens tácticas serão pouco relevantes. A situação é de emergência. A Grécia somou à crise económica uma quase insanável de Angela Merkel crise política, ameaçando de novo toda a zona curo e augurando um dramático regresso à dracma. Mudou o clima, crescendo na opinião pública o descrédito de uma abordagem da crise apenas assente na austeridade. A ascensão eleitoral da extrema-direita, em na França, e da extrema-esquerda, Grécia, fizeram soar os alarmes. E se Berlim corre o risco de isolamento, a situação económica francesa não é brilhante e está sob vigilância das praças financeiras. "Merkel e Hollande estão sob alta pressão para se entenderem", resume, em declarações à AFP, o alemão Martin Koopmann, director da Fundação Genshagen. O diário Suddeutsche Zeitung, de Munique, acrescenta outra perspectiva: Hollande será "a nova oportunidade de Merkel". Porquê? Sarkozy e a chanceler pertenciam à mesma família política. Com Hollande é diferente. O anterior eixo liberal-conservador cede o lugar ao binómio esquerda-direita. "Se encontrarem compromissos em política económica e financeira, dificilmente serão atacados em matéria de política europeia. E ambos se reforçarão internamente Alemanha: "austeridade Maria João Guimarães chanceler alemã, Angela Merkel, reconheceu ontem a derrota que o seu partido sofreu domingo nas eleida ções no estado-federado Renânia do Norte-Vestfália, o mais populoso da Alemanha: foi "uma derrota dolorosa e amarga". A A eleição deu pistas sobre o que poderá acontecer nos próximos tempos e também nas próximas legislativas, previstas para o Outono de 2013. Para já, os sociais-democratas reencontraram alguma força. O SPD vinha a fazer uma travessia no deserto com dificuldade em obter A vitória da popular Hannelore Kraft no domingo parece inverter esta tendência. De tal modo que a candidata reconheceu ter bons resultados. perante as respectivas oposições." Não se trata de trocar o "Merkozy" por um "Merkollande" Evaporou-se a ilusão do "condomínio". A carta aberta de David Cameron, Mário Monti e Mariano Rajoy, assinada por mais nove chefes de Governo da UE, apelando a uma política de crescimento, assinalou em Fevereiro o fim desse modelo de gestão da crise. Hegemonia alemã? entendimento franco-alemão continuará a ser um instrumento indispensável para gerir as crises europeias. O que se tornou patente é que o eixo ParisBerlim só funciona se obtiver o consenso de outras capitais. Roma e Madrid, mas também Londres e Varsóvia, são parceiros É sintomática "incontornáveis". a posição italiana. Esquerda e direita aplaudiram discretamente a eleição de Hollande: se atribuem a Merkel o pecado da "teimosia", não perdoam a Sarkozy o da "arrogância" no exercício do imaginário "condomínio". O saneamento do clima político europeu passa por um O esclarecimento de fundo. Que quer a Alemanha? Berlim foi empurrada para a liderança da crise do curo forte, porque é economicamente a França está economicamente debilitada e a Grã-Bretanha não faz parte do clube. O "condomínio" serviu para disfarçar esta realidade e acabou, paradoxalmente, por criar a ideia de uma "hegemonia alemã", o que ajuda a isolar Berlim e agrava as divisões políticas na Europa. A Alemanha foi incapaz de liderar a procura de "saídas para a crise": limitou-se a defender os seus interesses e o seu modelo. A Alemanha tem poderio para liderar economicamente, mas não tem meios políticos para uma hegemonia que continua a repugnar aos alemães. "A Alemanha tornou-se mais poderosa do que nunca dentro da UE, mas está longe de ser hegemónica - e não sopeia sua "relutância" em comandar, mas porque não é capaz mi não quer fazer os sacrifícios que tal hegemonia implica", resume o analista alemão Hans Kundnani. Enquanto se aguardam as ideias de Hollande, há uma pergunta em suspenso: que está Berlim disposta a fazer para salvaguardar o curo? sim, mas não no meu quintal" para ser candidata a chanceler em 2013, mas recusou: "O meu trabalho é aqui", concluiu da Renânia do a ministra-presidente sido cortejada Norte-Vestfália. O candidato derrotado da CDU era o ministro do Ambiente Norbert Rõttgen, protegido de Merkel e visto como um potencial sucessor da chanceler. Esta derrota parece ter posto um grande travão a esta ambição. Rõttgen ficou numa posição frágil ao admitir que não seria líder da oposição no estado em caso de derrota, e irritou todos no partido ao sugerir que a eleição era um referendo à política de austeridade de Merkel na Europa. E esta política tem, segundo uma sondagem de há duas semanas, o apoio de 61% dos alemães. Um responsável de uma empresa de sondagens citado pelo Guardian explicava a aparente contradição entre apoio e rejeição dessa receita política: "austeridade sim, mas não no meu quintal". A curto prazo, o resultado do SPD pode deixar o partido com mais vontade de desafiar a chanceler na crise do curo. Os sociais-democratas têm insistido na necessidade de incluir mais medidas de promoção do crescimento no pacto orçamental que Merkel ainda tem de fazer aprovar no Parlamento, precisando de uma maioria de dois terços e, assim, do apoio do SPD. Mas o partido ainda não explicou ainda exactamente o que quer. "Não é claro como é que o SPD se vai posicionar em relação à crise do curo", diz a revista Der Spiegel. Rejeitar o tratado orçamental não - é uma opção: seriam vistos como irresponsáveis com o dinheiro dos contribuintes alemães. O mistério deverá ser de pouca dura: hoje, os líderes sociais-democratas Sigmar Gabriel, Peer Steinbrúck e FrankWalter Steinmeier vão esclarecer as suas exigências, numa conferência de imprensa horas antes da chegada - - Hollande a Berlim. Finalmente, o bom resultado dos de François liberais do FDP, que nas duas últimas eleições estaduais inverteram a onda de derrotas é, ironicamente, uma má notícia para a coligação no Governo de Berlim. Os liberais parecem ganhar mais votos quando se opõem a Merkel, o que faz prever uma con- tinuação dos conflitos internos na coligação. Há analistas que defendem, no entanto, que isto poderia até ser bom para Merkel: um conflito poderia levar ao fim da coligação e a eleições antecipadas. A CDU sairia vencedora e governaria em "grande coligação" com o SPD. Zona curo afirma vontade "inabalável" de manter a Grécia na moeda única Ministros das Finanças dos Dezassete recordam que cumprimento dos acordos é condição para a permanência no curo e para a continuação da assistência financeira Isabel Arriagae Cunha, Bruxelas ministros das finanças da zona curo exprimiram ontem uma "vontade inabalável" de que a Grécia permaneça no curo, embora avisando que, em contrapartida, Atenas terá de prosseguir as reformas acordadas em troca de uma ajuda de 240 mil milhões de euros. "Temos uma vontade inabalável de manter a Grécia na zona curo e faremos todos os possíveis para isso", afirmou Jean-Claude Juncker, ministro das finanças do Luxemburgo e presidente do eurogrupo, no final de uma longa reunião dos seus pares da zona curo. O cenário de uma saída da Grécia do curo não foi discutido e "absolutamente ninguém defendeu essa posição", garantiu. "Sou completamente contra", acrescentou. Falar dessa eventualidade, "é um disparate, é propaganda", afirmou ainda, insurgindo-se contra os que querem dar "conselhos" aos gregos a propósito das eleições 1 de 6 de Maio que resultaram num impasse para a formação de um novo governo. "A Grécia votou e temos de ter em conta os resultados. Esperamos que um governo seja formado nos próximos dias ou semana e depois lidaremos com esse governo", sublinhou Juncker, insistindo: "não temos de dar lições à Grécia". Os Olli Rehn, comissário europeu responsável pelos assuntos económicos e monetários, frisou no entanto que a continuação da assistência financeira europeia está dependente do cumprimento do programa de ajus- tamento económico e financeiro acordado por Atenas, que pressupõe reduções drásticas das despesas públicas e duras reformas estruturais. "Sem o compromisso grego, a solidariedade [europeia] não funcionará", afirmou, frisando que "o futuro da Grécia depende do cumprimento por parte dos políticos gregos da sua parte do pacto de solidariedade". A Grécia, que há dois anos espoletou a crise da dívida, volta a pôr a zona curo perante uma escolha draconiana, entre manter a ajuda flexibilizando os termos do acordo, ou estancá-la, provocando a falência do país e a sua saída inevitável do curo. Esta perspectiva, que está a assustar os investidores, ameaça contagiar a Espanha devido às dificuldades gigantescas do sector bancário e de redução do défice orçamental. No caso da Grécia, a preocupação dos Dezassete tem sido de assumir uma postura capaz de reforçar a posição dos dois partidos tradicionais (socialistas e conservadores) favoráveis ao cumprimento do programa de ajuda, que não conseguiram obter uma maioria parlamentar. Juncker foi o único a admitir, durante o fim-de-semana a possibilidade de uma flexibilização do programa com a concessão de um ano suplementar para os gregos cumprirem as metas fixadas ao abrigo da necessidade de encontrar "soluções inteligentes". Ontem o presidente do eurogrupo limitou-se a deixar implícito que será preciso esperar pela formação de um governo para que essa eventualidade possa ser discutida. Rehn afirmou por seu lado que as metas orçamentais não foram abordadas. Grande parte dos outros países re- cusou admitir qualquer tipo de flexibilidade, porventura por temerem reforçar os argumentos dos partidos contrários ao acordo. "Não vejo o que é que poderíamos fazer mais em termos de negociações" com a Grécia, afirmou o ministro alemão, Wolfgand Scháuble à chegada a Bruxelas. "É inevitável que o povo grego tenha de sofrer as consequências de décadas de negligência. Não há uma saída fácil para a Grécia qualquer que seja o resultado". Jan Kees de Jager, o ministro holandês, disse igualmente que "não há margem para flexibilizar o acordo". Mesmo se recusam oficialmente que a Grécia saia do curo, vários responsáveis invocam essa eventualidade com cada vez maior tranquilidade, convictos de que as consequências sobre os restantes países são "geríveis". "Trabalhámos muito no último meio ano para reduzir os riscos de uma possível problema nos outros países" resultante da saída da Grécia, afirmou o ministro holandês. Durante o fim-de-semana, Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia, já tinha afirmado, comparando a zona curo a "um clube", que "toda a gente tem de respeitar os acordos". Jean-Claude Juncker presidente do eurogrupo, foi o único a admitir uma flexibilização do programa de ajuda a Atenas Tensões no mercado financeiro Rosa Soares mercados financeiros europeus voltaram ontem a viver um dia negativo: as bolsas encerraram com perdas elevadas, o curo caiu face ao dólar e subiram os juros das dívidas soberanas dos países da zona curo com maiores dificuldades financeiras. Depois de um curto período de tréguas, a Espanha e a Itália voltaram a pagar juros mais elevados nas emissões de dívida que realizaram ontem. Este resumo, igual a tantos outros no passado recente, não traduz as elevadas tensões que se vivem nos mercados financeiros, em especial nos europeus. Para o banco espanhol BBVA, estas tensões são superiores às da queda do banco norteamericano Lehman Brothers, no pico da crise financeira de 2008. Citado pelo Expansion.com, o BB- Os VA refere num relatório que "a conexão entre as preocupações da dívida soberana na União Europeia e a preocupação pela saúde do sistema financeiro europeu se intensificou, e as tensões financeiras na Europa alcançaram níveis, em muitos aspectos, superiores aos presentes depois de queda do Lehman Brothers, em Outubro de 2008". No Relatório, enviado à SEC (a entidade supervisora da bolsa norteamericana), no âmbito das contas anuais, e escrito antes do agudizar da crise política na Grécia e do novo plano para recapitalizar a banca Situação em Espanha voltou a dar sinais preocupantes para o governo deMariano Rajoy eíuuropeu i espanhola, o BBVA destacava que "as tensões financeiras na Europa incrementaram o custo de financiamento dos governos e das instituições financeiras que, em alguns casos, perderam o acesso ao crédito internacional". do o relatório Curiosamente, BBVA foi notícia no dia em que o prémio de risco de Espanha, face alemãs, que servem para o mercado, atingiu novo máximo histórico desde a entrada no curo, nos 491 pontos. Os juros implícitos das obrigações a 10 anos voltaram a quebrar a barreira dos 6%, chegando a atingir os às obrigações de referência 6,33% A comprovar as tensões nos mercados está o facto do tesouro espanhol ter sido obrigado a pagar juros mais elevados, apesar de ter optado estrategicamente por emissões de curto prazo. No leilão de ontem, a Espanha emitiu 2192 milhões em títulos de dívida a 12 meses, pagando um juro de 3,09%, acima dos 2,74% da operação anterior (a 17 de Abril) e 711 milhões em títulos a 18 meses, com juros que subiram de 3,20% para 3,40%. Também a Itália viu os juros a subir, na emissão que realizou no mercado primário, mas também no secundários (onde se revendem títulos de dívida). Os títulos de dívida de Portugal foram igualmente penalizados, com os juros implícitos das obrigações a 10 anos a quebrar a barreira dos 10%. superiores a Outubro de 2008 Para além da situação dos bancos que renova as dúvidas quanto à segurança dos testes de stress, o andamento dos mercados foi muito prejudicada pela instabi- espanhóis, lidade política na Grécia, que pode acelerar uma eventual saída do curo. E é sobre as consequências dessa saída para os restantes países da zona curo que se colocaram inúmeras dúvidas, A agência de notação financeira Fitch entende que uma eventual saída da Grécia da zona curo teria um impacto especialmente concentrado em Portugal, Espanha e Itália, podendo contagiar outros países caso a saída viesse a acontecer de forma desordenada. Ainda de acordo com a agência, uma eventual saída da moeda única poderá trazer problemas a muitas empresas por toda a Europa, dependendo a dimensão do impacto da saída ser feita de forma ordenada ou desordenada. Os mercados bolsistas revelaram forte preocupação com a situação política da Grécia, onde continua a não haver consenso quanto à constituição de um Governo de coligação. Quedas elevadas na bolsa espanho- la, que perdeu 2,74%, para mínimo do ano e com forte queda do sector bancário, e na praça de de Paris, que perdeu 2,29%. O principal índice da bolsa de Lisboa encerrou a perder 1,94%, o mesmo que perdeu o DAX alemão e o FTSE IOO de Londres. Na bolsa portuguesa, os bancos fecharam com quedas entre 2% e 4,5%. Governo de personalidades na Grécia? Ainda não é claro se sim e com o apoio de quem Maria João Guimarães media gregos fervilhavam de especulação sobre que Governo poderia sair de mais um dia de converpelo sações patrocinadas Presidente para tentar chegar a um acordo político para um Governo no país. Segundo esta especulação, tratar-se-ia de um Governo de "personalidades". Mas estava longe de ser certo o apoio político necessário a este executivo. Na reunião de hoje com o Presidente, Karolos Papoulias, estarão presentes todos os partidos com assento parlamentar excepto o neonazi Aurora Dourada; uma alteração relevante em relação ao dia de ontem, em que as negociações decorreram sem a presença do Syriza (Coligação de Esquerda Radical). No entanto, o Syriza já veio dizer que não apoiará qualquer executivo que ponha em prática o memorando, mesmo que se trate de um governo de tecnocratas. Também presente nas conversações de hoje vai estar o líder do partido Gregos Independentes, um partido-protesto saído de uma cisão do Nova Democracia. Esta presença era tida como um sinal tímido de possível apoio, ainda que muito improvável, deste partido. Até agora o líder dos Gregos Independentes, Panos Kammenos, tem negado qualquer "colaboração com os traidores", como chama aos políticos que assina- Os ram o acordo com a troika. Ilustrando a situação dramática do país, com eleições inconclusivas no topo de uma crise económica, o diário Ta Nea pôs na primeira página a imagem de um homem dando um tiro na cabeça o desenho feito pelos estilhaços de sangue era o mapa da Grécia. Muitos gregos temem que a crise política acabe por ditar o fim do país na moeda única. A defesa de uma saída da Grécia do Euro fazia, aliás, a capa da revista alemã DerSpiegel. As eleições de 6 de Maio na Grécia terminaram com um impasse entre dois campos, um que defende que o memorando com a troika (Comissão Europeia, FMI e Banco Mundial) seja respeitado (ainda que renegociado), e outro que defende que o acordo seja revisto ou mesmo renegado. No centro do impasse está Alexis Tsipras, o líder do Syriza, que defende uma rejeição do memorando sem que isso implique a saída da Grécia do Euro. Líder europeu após líder europeu têm expressado, nos últimos dias, variações da mesma ideia: o desrespeito dos compromissos do acordo significa o final do empréstimo à Grécia. As verbas nos cofres do país durarão até ao final de Junho sendo que até uma parte da última tranche entregue ficou suspensa, a aguardar uma definição política. Se não houver um entendimento para um governo até esta 5. a feira, - - haverá novas eleições. Caso essa votação fosse hoje, segundo as sondagens, o vencedor seria o Syriza. Os líderes dos partidos puseram a tónica numa palavra: "responsabilidade". "Participarei no encontro com um sentido de responsabilidade", disse o líder do Esquerda Democrática, Fotis Kouvelis. "Todos têm de assumir a responsabilidade", afirmou o líder do Nova Democracia, Antonis Samaras. O Syriza, pelo seu e a dilado, exigiu "transparência" vulgação dos conteúdos das reuniões políticas de ontem. Com um entendimento a parecer improvável, capítulos as cenas dos próximos prosseguem hoje. "Adoraria ser mãe. Mas não posso sequer pensar nisso" Dos 5,64 milhões de desempregados espanhóis, muitos são jovens. A geração mais bem preparada de sempre tem medo do futuro. Alguns estiveram sábado nas Portas do Sol Reportagem Sofia Drena Villaumbrales, basca de 26 anos a viver em Madrid, foi despedida em Janeiro e está no último mês do subsídio de Leire desemprego. "Édesesperante. Muitas vezes pondero voltar ao País Basco e viver outra vez em casa dos meus pais". Quando terminou o curso de Psicologia, em 2008, Leire não imaginava que a sua entrada no mercado de trabalho se faria com tantos trambolhões. Em 2009, encontrou o primeiro emprego, no ano seguinte terminou a pósgraduação em Psicoterapia. Tem dois anos e meio de experiência: "Não chega para competir por um lugar como psicóloga e impede-me de pedir uma bolsa numa empresa; para concorrer é obrigatório ser recém-licenciada, e isso também já não sou". A recessão voltou a bater à porta de Espanha, pela segunda vez em três anos, e o desemprego disparou nos primeiros meses de 2012. Leire foi apenas uma das 365.900 pessoas que ficaram sem trabalho entre Janeiro e Março. No fim desse mês, os espanhóis desempregados eram já 5,64 milhões. A taxa de desemprego era então de 24,44%, um recorde nos países industrializados. Se ainda tivesse 25 anos, Leire estaria também no grupo mais afectado: pela primeira vez, são mais os jovens que querem trabalhar e estão no desemprego (921 mil) do que aqueles que têm emprego (850 mil). A taxa de desemprego entre os menores de 25 chegou aos 52%. Se olharmos para um gráfico do desemprego em Espanha, a curva de 2008, ano em que Leire se licenciou, é sempre a pique seguem-se dois anos e meio de altos (mais) e baixos (menos), período em que os desempregados passaram de 4 para 5 milhões. As quebras acabam no último trimestre de 2011 e, desde então, a curva voltou a apontar ao céu como se não houvesse limites. Nas imagens da Irlanda ou da Grécia que nos chegam desde o início da crise há muitas vezes centros de emprego a transbordar, com filas que se estendem pela rua. Em Espanha, essas imagens não se repetem desde 2008. Nesse ano, o aumento brutal no desemprego paralisou os serviços e obrigou a uma mudança. Os desempregados continuam a ter de assinar uma declaração de três em três meses enquanto durar o subsídio, mas agora podem fazê-lo através da Internet. As mães É isso que explica que o centro de desemprego da rua Evaristo San Miguel, no bairro madrileno de Mondoa, esteja quase vazio em visitas sucessivas. Aliás, só entre as 9h e as 10h30 é que os serviços recebem novos desempregados. É o caso de Belén, 31 anos e dois filhos, despedida da empresa de auditoria financeira em que trabalhava quando regressou da licença de maternidade. "As mães já se sabe, muitas vezes são as primeiras a ir...", diz. "Por agora espero conseguir o subsídio e depois, quem sabe, um trabalhito qualquer." Em princípio, Belén vai receber 70% do seu último salário, que era de 1300 euros (quase tanto como o subsídio máximo em Espanha, 1356 euros). Isto nos primeiros 180 dias; a partir daí, a prestação baixa não para 60%. Se o "trabalhito" aparecer, terá direito a subsídio durante dois anos (o período máximo) porque teve a sorte de pagar segurança social mais de 2160 dias ao longo dos últimos seis anos. A prestação só é calculada com base no ordenado anterior para quem descontou pelo menos durante 360 dias nos seis anos anteriores a ficar sem emprego. Um ano a descontar vale 4 meses de subsídio. Aos espanhóis que não tenham descontado tempo suficiente resta tentar o subsídio de 400 euros inscritos pago aos desempregados há mais de um mês no centro de emprego da sua zona sem terem recusado nenhuma oferta de trabalho considerada adequada. Belén diz fazer parte "dos sortudos". "Pelo menos descontei e o meu marido tem contrato fixo" (há 1,7 milhões de lares em que todos os membros estão Pelo menos, a desempregados). empresa onde trabalhava pagou a sua segurança social. A Eva, de 32 anos, já aconteceu descobrir que não ia ter direito a subsídio. "Quando isso me aconteceu denunciei a empresa. Não foi fácil, mas ganhei", conta, enquanto vai deitando um olho ao mostrador e à senha que tem na mão, para não deixar passar a sua vez. A ajuda dos pais Eva já passou quase tanto tempo no desemprego como a trabalhar. "Este emprego espero que dure", afirma. "Faço o que queria fazer, só me falta a estabilidade, isso nunca consegui." Trabalha há um ano como administrativa numa empresa que oferece assessoria a outras empresas e é por isso que ali está, a tratar de contratos de outros. Apesar do seu ordenado, próximo da média de 1318 euros que ganham os espanhóis dos 18 aos 34 anos (quase 10,5 milhões de pessoas), Eva só consegue manterse "com a ajuda dos pais". Leire também precisa da ajuda dos pais, que vivem no País Basco, e só pôde continuar até aqui em Madrid porque divide casa com outras três jovens. "O que eu queria era exercer Psicologia, dar consultas. Mas como só o sector social contratava sem experiência comecei num centro de acolhimento de menores", conta. "Em Janeiro, despediram toda a equipa porque a associação para a qual trabalhávamos encerrou algumas Apesar Leire diz de nada. das casas que geria". de tudo, aos 26 anos, que ainda não desistiu "De momento estou à procura de qualquer coisa para poder viver e tenho medo de não encontrar, mas os meus sonhos mantêm-se iguais. Gostava de abrir um centro de Psicoterapia", diz. Também aqui Leire está bem acompanhada: os jovens espanhóis são empreendedores, pelo menos nas intenções, e 54% gostariam de criar a sua própria empresa, segundos dados do Eurostat. "A situação actual em Espanha é realmente revoltante, mas tento manter a confiança. Quero ficar e empreender o meu próprio projecto", repete Leire. Tal como a basca põe a possibilidade de voltar à sua região e a casa dos pais, Eva admite sair de Madrid em busca de um trabalho estável. "Para fora não, a língua é um obstáculo. Mas por um bom emprego noutra região espanhola não hesitaria", explica. Os filhos Rafa Aníbal, 28 anos, jornalista no desemprego desde Novembro, já não acredita que valha a pena ficar. E também já recusou trabalhos: 300 euros por um part-time e 500 por um trabalho a tempo inteiro. Para isso, prefere irse embora. Planeia mudar-se para o Chile, onde sabe que poderá ganhar o ordenado máximo que teve em Espanha, 1250 euros. Enquanto arranja coragem e tenta amealhar o dinheiro para o bilhete, Rafa vai alimentando o bloque que começou em Dezembro como escape para "a indignação". Chama-se pepasypepes e recolhe testemunhos de jovens que já apanharam o avião. A entrevista que fez a Tâmara Guirao, jovem da Corunha a viver em França, foi uma das últimas que publicou. Licenciada em Tâmara Relações Internacionais, lembra "os dez anos" que o Estado espanhol investiu na sua formação, entre a universidade de e as bolsas, um investimento que agora "outro país beneficia". Decidiu partir "quando terminava a enésima bolsa" e estava há dois meses no desemprego. "Surgiu a oferta e a minha mãe disse-me: 'Estudaste para isto, se tens de ir, vai. Aqui não tens nada'." Alfredo, 56 anos, está na fila do centro de emprego à conversa com Belén, mas veio fazer exactamente o contrário: contratar. "Tenho uma empresa na área do meio ambiente, tratamos de questões florestais e trabalhamos para empresas e para administrações públicas", diz, antes de se queixar dos clientes ("cada vez são mais os que deixam de pagar"). A empresa que tem há 22 anos não vai bem, mas o que mais preocupa Alfredo são as filhas, de 26 e 23 anos: "Elas não têm nada facilitado. A mais velha foi para a Inglaterra e lá está bem, numa multinacional de cosméticos. A mais nova está empregada, mas ganha mal e só se aguenta a viver connosco". O fracasso de um pais Fernando Vallespín, analista político, lamenta a fuga da "geração mais bem preparada da história de Espanha". "Muitos vão para a Alemanha, para França, para o Reino Unido. É certo que a maioria ainda se move dentro do espaço europeu e isso já não é tão dramático como antes, muitas vezes ficam a duas horas de voo da família. Mas não deixa de ser um facto de muita transcendência, o fracasso de um país." De acordo com a Comissão Europeia, 68% dos jovens espanhóis estão dispostos a sair de Espanha. Destes, 32% iriam por muito tempo. Villespín fala da "quebra do lembrando pacto intergeracional", que serão "os jovens a pagar as dívidas dos mais velhos" sem terem usufruído dos mesmos benefícios. "Às vezes tenho muito medo. É que nós, os jovens, ainda vamos viver muito tempo, sem perspectivas de que a situação melhore", diz Eva. Soraya, de 31 anos, nunca pensou sair de Espanha. Educadora de infância, esteve sete anos a trabalhar a tempo inteiro para uma associação privada. "Sempre me dediquei a trabalhar com crianças, era o que queria", conta num café de Vallecas, no extremo sul de Madrid. Mas desde o ano passado trabalha "muito poucas horas", numa escola, um trabalho que "acaba a 31 de Maio, depois não sei." O desemprego chegou à vida de Soraya ao mesmo tempo que o movimento Real (15M) nascia Madrid, em Maio "Estive acampada Democracia no centro de do ano passado. o tempo que pude, percebi que era uma nova forma de intervenção social e quis participar. Depois, as coisas viraram-se para os bairros. Metime na associação de Puente Vallecas e dinamizei o grupo de trabalho sobre habitação, que era o que fazia falta. Como tenho tempo livre, mais participo." "Nesta zona há muitos problemas. Muito desemprego, muita gente em risco de perder a casa", diz, à porta de uma delegação do Banesto onde foi entregar um abaixo-assinado a pedir ao banco que não despeje um casal de equatorianos seus vizinhos, pais de uma menina de três anos, que deixaram de conseguir pagar a hipoteca. Redes de apoio Sábado, Soraya voltou às Portas d Sol para o 12M, um dia de protesti global mobilizado pelo 15M e pele Em Occupy norte-americanos. Madrid foram 35 mil espanhóis a manifestar-se, incluindo muitos "Devíamos ser desempregados. muitos mais. Deviam estar aqui os 5 milhões de desempregados", diz Sara, de 26 anos, estudante e trabalhadora precária que foi à manifestação com duas amigas. "Eu vim", dispara Irene, outra educadora de infância, no desemprego desde Dezembro, sentada no chão como Sara, e encostada à parede de uma das saídas de metro da praça. "Há um ano estivemos aqui a pedir uma reforma da lei eleitoral mais representatividade. Em vez disso, ofereceram-nos uma reforma laborai e cortes em todas as áreas importantes, da saúde à educação", defende Sara. "Indignada" e "inconformada". Soraya diz que todo o seu bairro é assim. "Temos muita tradição de luta em Vallecas, mas o 15M ajude a revitalizar essa tradição, que nã era tão presente nos mais novos. Agora criámos redes, ninguém passa pelos problemas sozinhos, estamos aqui uns para os outros.' Soraya ainda consegue pagar a renda da casa onde vive, pelo menos até ao fim do mês. Depois, se não arranjar nada, vai recorrer ao subsídio de desemprego. O resto é que vai sendo adiado: "Adoraria ser mãe. Mas não posse seauer rjensar nisso."