ENSINOS BÁSICOS DA FÉ CRISTÃ Pr. Scyllas de Oliveira Introdução Graça e paz! Este texto que disponibilizamos foi confeccionado para ser usado como material de preparação de irmãos que desejam formalizar-se como membros efetivos da igreja local. Entendendo que a formalização requer compreensão dos ensinos básicos da fé e a aceitação deles, e no anseio de fornecer material simples que apresentasse esses ensinos – embora haja muitos materiais recomendáveis – é que produzimos esse livreto contendo o "básico do básico" da doutrina cristã, apenas aquelas mais primárias, no entanto fundamentais. Como pode ser observado, não é um material muito extenso. Na verdade, é bastante curto e resumido tanto na seleção dos temas quanto na exposição dos mesmos. Isso deve-se, primeiramente, ao fato de que preferimos tratar apenas dos temas mais básicos e comuns da fé cristã sem abordar qualquer questão mais específica de qualquer denominação evangélica. Mesmo assim, pode ser que algumas pessoas sintam falta de outros assuntos. A elas, pedimos desculpas e compreensão; mas, como foi dito, tratamos apenas do "básico do básico". Além disso, embora esse material possa ser utilizado para leitura individual, ele na verdade foi elaborado para ser usado em estudos dirigidos nos quais um orientador dialogará com o membro sobre o conteúdo do texto e do ensino bíblico esclarecendo questões, tirando dúvidas e adicionando outras informações que se fizerem úteis ao longo do diálogo. A curta extensão do texto foi estabelecida exatamente para que a dinâmica do encontro de estudos se dê em torno do diálogo e não da leitura do texto. Questões importantes na preparação de novos membros tais como as relacionadas à vida devocional como a leitura diária da Bíblia, a prática da oração, o relacionamento e comunhão com os irmãos da igreja, etc, foram propositadamente deixadas de lado por, as vezes, variarem de abordagem prática de igreja para igreja; assim, cada igreja poderá sentir-se livre para tratar dessas questões conforme forem direcionadas, sempre, porém, zelando pela biblicidade do ensino e da prática adotada. Bom, além do que foi dito, é importante observar que o uso desse material não está restrito à preparação de novos membros, mas também pode ser usado em grupos de estudos domésticos ou de afinidades, como um material de apresentação e discussão com não-evangélicos sobre as bases da fé cristã, etc. Sejam criativos e usem-no conforme a oportunidade que Deus der. Fiquem à vontade. Finalmente, ficaremos felizes se recebermos sugestões que possam somar ao propósito e conteúdo desse material. Toda boa contribuição será bem-vinda. No desejo de que Deus seja glorificado e que esse material sirva para edificação e consolidação da fé no coração de muitos irmãos, dispomos esse texto. Deus abençoe a todos! 1 Uma tragédia chamada pecado Sei que começar nossa conversa falando sobre um assunto tão sem atrativos e cheio de incômodos como o pecado não é nada convidativo; pois, à princípio, ninguém está disposto a assumir sua condição de pecador. Mas se o pecado não houvesse ocorrido, a história da humanidade seria inteiramente diferente. Saber o que seja pecado e sua capacidade de interferência em nossas vidas é fundamental para compreendermos a nós mesmos e toda a história da salvação (os atos de Deus ao longo da história para promover o livramento do homem da condenação do pecado), história essa que, dentre outros aspectos, nos revela afinal quem é Deus e seu propósito para conosco. Que é “pecado” Nas línguas em que a Bíblia foi originalmente escrita há muitas palavras que foram traduzidas por “pecado” e cada uma delas contém uma idéia ou ênfase específica. Há idéias como “errar o alvo, perder o rumo” “fracassar”, “ir além dos limites”, “causar dano ou tristeza”, “ser mau”, “prende-ser numa armadilha, num laço”, “dar passos em falso, cair no caminho”, etc. Todas elas, como podemos ver, indicam alguma impossibilidade decorrente de fracasso ou erro em nossas ações, palavras e/ou motivações. Com tantos aspectos possíveis a considerar, pecado é essencialmente definido como “qualquer falta de conformidade com a lei de Deus, ou qualquer transgressão dessa lei” 1 – entendendo-se “lei” como muito mais que uma série de regras, mas sim tudo aquilo que se refere aos propósitos de Deus para nossa vida espiritual, moral e física. Todas as vezes que, voluntária ou involuntariamente, não cumprimos qualquer dos propósitos de Deus, pecamos. Como se dá o pecado Pecado é todo e qualquer rompimento da vontade de Deus, e, basicamente cometemos esses rompimentos de duas maneiras: fazendo o que não deveríamos fazer (os chamados pecados por comissão), ou não fazendo o que deveríamos fazer (os chamados pecados por omissão). Pecado, então, não acontece só quando fazemos algo que é errado (como muitas pessoas pensam), mas acontece também quando não fazemos o que é certo. Assim, quando fazemos algo que Deus não recomenda, ou não fazemos algo que Ele recomenda, cometemos pecado. Omitir-se de fazer o bem é tão grave quanto praticar o mal. 2 A universalidade do pecado Entendendo pecado como toda e qualquer quebra, violação ou descumprimento dos propósitos de Deus, por “menores” que sejam esses propósitos, e que pecamos por comissão ou omissão, uma questão importante surge: “Quem pode viver sem pecar?”. A resposta é: “ninguém”. Não há qualquer ser humano que haja sido, seja ou venha a ser isento de pecado. A Bíblia é categórica ao afirmar que toda pessoa é pecadora (veja Romanos 3.9-18, por exemplo). Somos nivelados todos por essa triste verdade espiritual. O mais intelectual dos seres humanos e o mais desinformado deles, o mais rico e o paupérrimo, o mais honesto e também o mais delinqüente, o mais religioso e o mais desprovido de senso da divindade, sim, todos são pecadores, pois o pecado não respeita raça, credo, capacidade intelectual ou condição social: todos pecaram; absolutamente, todos. A dimensão do pecado no homem O pecado não só invadiu toda a humanidade, mas também o homem em sua totalidade. Isso significa que o ser humano foi afetado pelo pecado em todas as áreas da existência, ou seja, afetiva, moral, física e espiritualmente. Não há uma só dimensão do viver humano que não haja sido corrompida pelo poder do pecado; é por isso que “não há um justo sequer”. Pensamentos, ações, disposições... tudo no homem foi danificado pelo poder do pecado. No entanto, isso não quer dizer que a raça humana esteja desprovida de qualquer noção do bem ou capacidade de produzir coisas boas, mas sim que por mais que o senso do bem esteja ainda presente e que o ser humano possa praticar atitudes dignas, uteis, belas e edificantes – e deve sim fazê-las –, está, contudo impossibilitado de dispor tudo isso para eximi-lo da culpa do pecado. Aliás, o conhecimento do bem, mas a incapacidade de produzilo de forma perfeita e contínua na verdade contribui para atestar a culpa humana. E nossas boas ações? Como ficam? As boas ações são recomendadas na Bíblia e todo ser humano, com senso religioso ou não, tem condições de praticá-las. Elas constroem nosso caráter e minimizam socialmente as conseqüências do pecado. No entanto, nenhuma ação humana poderá livrar efetivamente da condenação do pecado, do mesmo modo que ainda que alguém auxilie entidades beneficentes, promova a educação dos pobres, doe remédios para pessoas que estejam enfermas, e realize outras ações dignas, jamais será isenta de condenação se vier a 3 cometer um assassinato. Quanto a isso, o apóstolo Tiago escreveu o seguinte: “Qualquer que guarda toda a lei, mas tropeça em um só ponto, se torna culpado de todos” (Tiago 2.10). Por melhores que sejam nossas ações e intenções (que a Bíblia às vezes chama de “obras”), tendo elas caráter religioso ou social, jamais poderão inocentar-nos ou pagar os custos dos nossos pecados. Somos pecadores e estamos sujeitos à aplicação da punição divina que diz que “o salário do pecado é a morte” (Romanos 6.23). Relacionamentos afetados pelo pecado Talvez um dos mais conhecidos trechos da Bíblia seja o dos “10 mandamentos” (leiaos na sua Bíblia), aquela série de normas encontradas em Êxodo 20.1-19. Se olharmos atentamente, perceberemos que elas podem ser divididas em duas “categorias”: normas quanto ao relacionamento com Deus, e normas quanto ao relacionamento com o próximo. Quando pecamos, algumas vezes pecamos contra o próximo, mas sempre pecamos contra Deus visto que descumprimos uma norma dele para nós, e isso nos torna condenáveis ante seus olhos. A gravidade do pecado Por que o pecado é tão grave diante de Deus? Quanto a esta pergunta, há muitas questões que devem ser consideradas; mas nós vamos abordá-las aqui rapidamente. Basicamente podemos apresentar três razões: Primeiro, o pecado é grave porque ele estabelece uma separação entre nós e Deus (Isaías 59.1-8). Deus é Santo e glorioso (veja, por exemplo, Isaías 6.1-3), e o padrão para alguém ser plenamente aceito diante dele é a santidade (I Pedro 1.16). O pecado é ofensivo à santidade de Deus e interpõe-se entre nós e Ele de modo que torna-nos indignos ante sua presença. É importante, porém, notar que esta separação causada pecado não é temporária – como se ela fosse determinada pela circunstancialidade do pecado -, mas definitiva – porque ela é determinada pela natureza do pecado: ele nos torna inaceitáveis diante do Senhor. Segundo, o pecado é grave porque nos torna condenáveis diante de Deus. Uma vez que o pecado constitui-se ofensa a Deus (é, na realidade, uma atitude de rebelião – veja Isaías 1.2), ele nos torna condenáveis diante do Senhor porque todos nós pecamos e não podemos ser isentos de culpa (veja Romanos 3.23, 6.23, e 5.12). Essa condenação é o que a Bíblia chama de morte espiritual, ou seja, a impossibilidade de uma comunhão natural entre 4 os homens e Deus, sujeitando-nos a uma separação definitiva em relação a Ele nesta vida e na existência eterna. Ainda: o pecado é grave porque suas consequências espirituais são irreversíveis para o ser humano. “O salário do pecado é a morte” (Romanos 3.23). A consequência natural do pecado é a morte – manifestada de diversas formas: a morte natural (separação entre corpo e alma), a morte espiritual (separação entre nós e Deus), e a morte eterna (separação definitiva e irreversível entre nós e o Criador). O poder do pecado é tão grande que suas consequências não podem ser remediadas eficientemente por nenhuma das iniciativas humanas. Nada do que possamos fazer eliminará seus males causados a nós ou anular eficientemente sua condenação. O pecado lança, portanto, uma situação extremamente pesada sobre nós – na verdade, insolúvel: uma vez que o ser humano está espiritualmente morto diante de Deus, não há como, por seus próprios recursos, eliminar a condenação eterna sobre si. Está perdido, visto que um morto não tem capacidade de ação ou reação. Mas a história bíblica nos diz que Deus interferiu nessa situação trazendo, por sua providência, a possibilidade de solução para quem a quiser. O texto de Romanos 6.23, já mencionado aqui, nos dá o indício disto e este será nosso próximo assunto. _________________________________________ 1 – Catecismo Maior 5 Um favor imerecido (o dilema de Deus) Vimos que o pecado estabeleceu-se na vida humana afetando o relacionamento do homem consigo mesmo, com o próximo, com o mundo, e principalmente com Deus, e que a realização do livramento da condenação do pecado e a restauração do relacionamento com Deus estão fora de toda a possibilidade humana – a Bíblia define a condição espiritual do homem como ”morto” por causa de seus pecados, portanto impossibilitado de, por si mesmo, fazer algo que efetivamente resolva essa questão. No entanto esse quadro estarrecedor não é a palavra final para a relação pecado/ homem/Deus. A Bíblia dá uma surpreendente informação: há solução para a questão da condenação do pecado. É isso que vamos abordar nesse ponto do nosso estudo. “Salvação”, que é isso? A Bíblia registra que uma solução foi providenciada para a questão da condenação do pecado; essa solução é definida pela expressão “salvação”. Assim como acontece com a palavra “pecado”, nas línguas em que foi escrita a Bíblia há muitas palavras que foram traduzidas por “salvação” e cada uma delas com ênfases específicas. Por exemplo, há palavras que significam “preservar do mal”, “livrar de um perigo”, “libertar de uma prisão física ou emocional”, “soltar”, “resgatar da escravidão”, “curar de uma doença”, etc, – é claro que cada um desses significados aplicados à vida espiritual. Salvação é, portanto, definida como o livramento do homem em relação à condenação do pecado e a restauração de seu relacionamento com Deus. Vamos ver algumas questões interessantes relativas à salvação. Por que precisamos de salvação Fomos criados para ter relacionamento contínuo e eterno com Deus, mas o pecado fez separação entre nós e Deus. Todos pecaram contra Deus e, em conseqüência disto, estão naturalmente condenados a uma existência eterna irreversivelmente separada de Deus e em meio a sofrimentos como retribuição justa por haverem recusado a Deus e se rebelado contra Ele. Aqui encontramos o princípio da justiça de Deus. Se Deus não punisse o pecado seria injusto, pois o erro requer punição. A questão maior, porém, a ser considerada é que uma vez que estamos mortos por causa de nossos pecados nada podemos fazer para salvar-nos; logo, precisamos de salvação porque temos necessidade de 6 relacionar-nos livre e prazerosamente com Deus, mas não conseguimos produzi-la por nós mesmos. A alternativa proposta Em sua providência de salvação, Deus, requerendo sua santidade e justiça, estabeleceu a Lei (sua vontade revelada e registrada) para os homens com a garantia (o compromisso, a aliança) de que àquele que conseguisse cumpri-la plena e justamente, sem desvios internos ou externos, receberia a aceitação de Deus na eternidade. Esse compromisso (ou pacto) estabelecido por Deus é chamado de pacto da lei. A grande questão, no entanto, é que ninguém conseguiu cumprir a lei sem a ocorrência do pecado pessoal. Ninguém, portanto, é salvo pelo cumprimento da lei, ninguém é salvo pelo que faz, ou seja, ninguém é salvo pelas obras. Mas Deus ama ao ser humano e deseja sua salvação, e esse amor lançou-o em um dilema. Um dilema para Deus Dilema é uma palavra utilizada para definir uma situação na qual só existem duas possibilidades para a solução de um problema, mas que cada uma traz em si uma impossibilidade de solução plena e perfeita. O dilema de Deus deve-se à sua natureza perfeita. Ele é amoroso, mas também é justo. O dilema de Deus poderia ser apresentado da seguinte forma: como, por amor, salvar aos homens sem quebrar sua justiça que exige a punição do pecado com a morte? Se Ele fosse amor, perdoando os pecados, não seria justo, pois não puniria o pecado; se justo, não poderia aplicar seu amor que resgata. A solução para o dilema Um texto muito importante para se compreender a solução estabelecida por Deus para esse dilema é Romanos 8.3,4: “Porquanto o que fora impossível à lei, no que estava enferma pela carne, isso fez Deus enviando o seu próprio Filho em semelhança de carne pecaminosa e no tocante ao pecado; e, com efeito, condenou Deus, na carne, o pecado, a fim de que o preceito da lei se cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito”. Ou seja: o cumprimento da Lei não pode nos salvar porque não conseguimos nãopecar; o nosso pecado anula toda a prática da Lei. Então, Deus enviou Jesus Cristo para conquistar nossa salvação em dois aspectos específicos: ele cumpriu plenamente a lei, pois 7 viveu sem pecar (Hebreus 4.15); ele deu voluntariamente sua vida lá na cruz, morrendo no lugar dos pecadores (II Coríntios. 5.14,15; Romanos 5.6-8). Jesus é a solução de Deus para o problema da condenação do pecado, pois ele cumpriu plenamente a justiça divina e proporcionou aos homens serem alcançados pelo amor salvador de Deus. Agora, todos aqueles que aceitam a Jesus como seu Salvador pessoal recebe sobre si os benefícios da morte substitutiva realizada na cruz: “Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus. Porque a lei do Espírito da vida, em Cristo Jesus, te livrou da lei do pecado e da morte” Romanos 8.1,2. Como o homem pode receber a salvação? É disso que trataremos a seguir. 8 Um favor imerecido II (Cristo: substituto gracioso) Vimos no estudo anterior que Deus, por nos amar e desejar salvar-nos, mas também por ser justo e ter que punir o pecador, viu-se em um dilema: como amar, mas ser justo; como ser justo e ao mesmo tempo aplicar amor? Para este dilema Deus providenciou solução. É sobre isso que vamos estudar nesse encontro. Uma iniciativa divina Ao ver os homens escravizados ao pecado sem poder libertar-se por suas próprias providências, Deus tomou a iniciativa eficaz para salvar o homem ao qual ele ama sem, contudo, deixar de punir o pecado, sendo, portanto, ao mesmo tempo justo e amoroso: enviou Cristo Jesus, seu Filho, para dar sua vida na cruz em favor dos homens. O mais importante a ressaltar, no momento, é que toda a iniciativa para proporcionar a salvação foi tomada por Deus evidenciando, assim, seu amor pelos homens. Há muitos textos na Bíblia que registram essa iniciativa divina. Vamos ver alguns como exemplos: “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” João 3.16. “Mas Deus prova o seu próprio amor para conosco pelo fato de ter Cristo morrido por nós, sendo nós ainda pecadores”, Romanos 5.8. “Porquanto o que fora impossível à lei, no que estava enferma pela carne, isso fez Deus enviando o seu próprio Filho”, Romanos 8.3 (primeira parte). Esses textos mostram claramente que Deus tomou a iniciativa de salvar os homens, uma vez que estes não podiam salvar a si mesmos. Mas, como Deus fez isso? Jesus, nossa justificação Como vimos, o caráter perfeitamente santo de Deus requer santidade perfeita de todos que desejam viver eternamente em sua presença, pois, do contrário, ele seria conivente com o pecado. Então, se o homem quisesse viver na presença de Deus, precisaria ser santo, mas ninguém é santo em sua natureza, pois “todos pecaram” (Romanos 3.23), e, além disso, precisa pagar o preço de seu pecar: a morte (veja Ezequiel 18.4 e Romanos 6.23, por exemplo). Como a justiça de Deus tem de ser cumprida, ele enviou Jesus Cristo. 9 A justiça de Deus foi plenamente cumprida por Cristo em seus dois aspectos essenciais: 1) Jesus viveu sem pecar (II Coríntios 5.21; Hebreus 4.15 I Pedro 2.22, Romanos 5.18,19, por exemplo) cumprindo, portanto, o princípio da lei; e 2) ele morreu pagando o preço do pecado, cumprindo assim a sentença da condenação em lugar do pecador (I Coríntios 15.3; II Coríntios 5.14,15; I Pedro 3.18, por exemplo). Jesus é, portanto, nosso substituto tanto em sua vida (vivendo santamente) quanto em sua morte (morreu em nosso lugar), livrando plenamente os homens de toda conseqüência do pecado sobre eles, não só de forma circunstancial, mas eterna. Quando Deus olha para o salvo, olha-o pela ótica do que Cristo fez por ele (ele é um pecador justificado em Cristo), não pelo que ele é em si (um pecador por natureza). Paulo define esse estado (o de que embora pecadores sermos aceitos diante de Deus pelos méritos de Cristo) como uma adoção (Gálatas 4.5, Efésios 1.5). Jesus, nossa salvação Uma vez que Jesus satisfez plenamente toda a justiça de Deus em nosso favor, ele também é nosso salvador: ele não só nos livrou da condenação do pecado, mas também, por meio dele, somos pacificados eternamente em nosso relacionamento com Deus: “Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus. Porque a lei do Espírito da vida, em Cristo Jesus, te livrou da lei do pecado e da morte” Romanos 8.1. “Justificados, pois, mediante a fé, temos paz com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo” Romanos 5.1. “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” João 3.16. Uma oportunidade oferecida ao homem Já que toda obra eficaz para a salvação foi realizada por Deus em Jesus Cristo, ele, Deus, dispõe a todos os homens a oportunidade de usufruir em seu próprio benefício tudo o que Cristo conquistou para eles diante de si. Agora os homens não precisam submeter-se a qualquer outro recurso para obter a salvação, porque o que Cristo fez é suficiente e eficiente para salvá-los; basta, simplesmente, receberem o que Deus lhes oferece em Jesus. Como receber o que Cristo fez A Bíblia diz que para alguém receber os benefícios de Cristo em seu favor, basta arrepender-se dos pecados e crer em Jesus como único e suficiente salvador. Mas o que isso quer dizer? 10 O genuíno arrependimento de pecados tem os seguintes elementos básicos: • Reconhecimento de que se é um pecador; • Entristecimento pelo estado de pecador diante de Deus; • Declarar a Deus o sincero desejo de redirecionar a vida na direção dele e de não mais viver em pecado; e o quarto elemento (e o essencial) é: • Reconhecer a morte de Cristo na cruz como realizada plena e suficientemente e recebê-la em seu benefício pessoal. Isso é crer em Jesus. Por que o quarto elemento é o essencial? Porque qualquer religioso ou moralista pode realizar os três primeiros passos, mas sem os benefícios da morte de Jesus toda e qualquer pessoa está perdida, mesmo a mais religiosa ou moralista delas (veja I João 5.10-12). Além disso, os três primeiros passos podem produzir apenas um redirecionamento moral e religioso, mas, sem Jesus, não produzem o resultado da salvação. A todos quantos recebem a Jesus como seu salvador pessoal Deus recebe-os como filhos. A isto a Bíblia chama de pacto da graça. Uma dádiva chamada “graça” Uma vez que toda iniciativa e toda execução das ações efetivas para nossa salvação foi realizada por Deus (a parte ofendida) em nosso favor (a parte ofensora) ainda quando éramos inimigos dele (reveja Romanos 5.8), deixando-nos apenas a oportunidade de sermos gratuitamente beneficiados pelo que ele fez, a Bíblia chama a isso de graça; pois Deus não requereu nada previamente ao homem para realizar tudo isso. Portanto, somos salvos graciosamente; somos salvos pela graça de Deus. Sobre esse assunto, continuaremos no próximo encontro. 11 Um Favor Imerecido III (Salvos pela graça) Vimos que uma vez que o ser humano nada podia fazer para obter a salvação por seus próprios recursos, Deus tomou a iniciativa de produzir todos os atos necessários para a salvação realizando-os em Cristo e deixando ao homem apenas a oportunidade de aceitar ou não, em seu benefício, os atos realizados no Senhor Jesus. A essa ação voluntária, eficaz e a nós disponibilizada chamamos ”graça”; e é sobre ela que vamos estudar hoje. Uma palavra com significado interessante A palavra “graça” tem um significado muito importante. Ela, na língua em que foi escrito o Novo Testamento, tem a mesma raiz que a palavra “alegria”. Uma vez que “graça” se refere a atos que Deus realiza misericordiosamente em favor do homem sem, contudo, preestabelecer condições para desenvolvê-los, pode-se entender graça como todos os atos misericordiosos de Deus em favor dos seres humanos e que geram neles alegria. Nesse sentido, há muitas manifestações da graça de Deus em nossas vidas: saúde, capacidade de raciocínio, respiração... a existência, enfim, é graça de Deus; é uma “graça comum”, pois Deus a dá a todo ser humano. Há, no entanto, um sentido especial em que essa palavra é empregada na Bíblia referindo-se à salvação que, por definição, só a tem os que foram redimidos em Cristo Jesus. Assim, os teólogos denominam essa manifestação da graça como “graça especial”, pois só é concedida a alguns (reveja João 3.16, e também Mateus 20.16, por exemplo). Mas o que torna essa salvação uma graça “especial”? Vamos ver apenas três aspectos disso: • Foi estabelecida por Deus quando nós não nos importávamos com Ele Deus resolveu salvar-nos graciosamente antes mesmo que surgisse em nós qualquer inclinação favorável a Ele (Romanos 5.6-10; Colossenses 1.21,22). Essa é uma extraordinária evidência da grandeza do amor de Deus por nós. • Ela foi marcada pela “representação” (ou substitutividade) de Cristo Um dos aspectos mais fascinantes da graça salvadora é a questão da “representatividade” de Cristo. Isso significa que Cristo foi nosso representante nos atos salvadores de Deus, ou seja, ele assumiu o lugar reservado ao homem no processo da 12 salvação: ele morreu em nosso lugar (I Tessalonicenses 5.9,10). Ora, uma vez que ele nos substituiu morrendo em nosso lugar, e Deus aceitou o que ele fez, nossos pecados foram pagos definitivamente por Cristo e já não somente não seremos mais condenados ao inferno, mas recebemos a capacidade de viver uma vida dedicada a Deus e reconciliada com Ele desde já (Romanos 6.5-10, II Coríntios 5.14,15). • Estabeleceu uma única exigência para sermos salvos A lei determinava que se alguém a cumprisse perfeitamente (sem pecar), esse seria salvo (Romanos 10.5); mas ninguém pôde cumpri-la desse modo. A lei determinava também a morte como a punição pelo pecado (Ezequiel 18.4); todos, portanto, estávamos condenados à morte (Romanos 5.12). Uma vez que Jesus não só cumpriu perfeitamente a exigência lei como também ofereceu o sacrifício perfeito (pleno) pelo pecado da humanidade, basta hoje, para que alguém seja salvo, crer, por meio da fé, em Jesus Cristo como único e suficiente salvador da sua vida (veja, por exemplo, Atos 16.31 e reveja João 3.16). Crer significa confiar em Jesus de todo o coração como salvador pessoal. Esse processo é definido em outros pontos do Novo Testamento como exercitar fé em Jesus (é interessante saber que na língua em que foi escrito o Novo Testamento as palavras crer e fé têm a mesma raiz). Textos como Efésios 2.4-9 e Romanos 5.1,2 afirmam isso muito claramente. Assim, a graça estabelece simplesmente a fé em Cristo como requisito para que alguém receba a salvação. Resumindo podemos dizer o seguinte: somos salvos pela graça (o processo) por meio da fé (o requisito) em Cristo Jesus (o instrumento pelo qual o processo se efetiva). O duplo aspecto da salvação Uma questão importante a considerar é que a salvação assume dois aspectos na vida do cristão: um é o imediato, e o outro é o futuro. Quando aceitamos a Jesus como Salvador das nossas vidas, somos imediatamente perdoados pelos nossos pecados e, portanto, libertos da condenação (João 3.16-18; 5.24, Gálatas 1.13,14). Porém, nossa completa salvação (em toda a sua plenitude, na presença de Deus) se estabelecerá no futuro Reino de Deus, aquele retratado em Apocalipse 21.1-7. Os teólogos denominam esses aspectos como o já e o ainda não: já estamos eficientemente salvos em Cristo, mas ainda não estamos no gozo pleno da salvação em toda a sua dimensão, pois isto está reservado para quando ocorrer a segunda e definitiva vinda do Senhor Jesus, quando os salvos serão reunidos a ele para toda a eternidade. 13 Quem é salvo? Uma última questão que vamos considerar hoje diz respeito a quem é salvo, ou seja, a abrangência da salvação: visto que Jesus morreu por todos, todos serão salvos, ou só alguns? A Bíblia deixa claro que o sacrifício realizado por Cristo lá na cruz é suficiente para salvar todas as pessoas, mas é eficiente somente sobre algumas. O texto de João 3.14-18 e 33, por exemplo, ilustra muito claramente essa verdade: Deus amou ao mundo, mas só os que crerem é que receberão a vida eterna – veja também I João 5.9-13. Essa questão é chamada de expiação limitada, ou seja, só é salvo o que crê; e todos os que crêem – e exclusivamente esses – serão salvos. Quanto a isso é oportuno observar o seguinte: para enviar Jesus e oportunizar por meio dele a salvação, Deus não estabeleceu pré-requisitos ao ser humano para fazê-lo; mas no que se refere à concessão efetiva da salvação ao homem (ao indivíduo), Deus estabelece a exigência da aceitação do que Ele fez em Cristo, e a recepção de Jesus como Salvador pessoal, sendo essa aceitação antecedida pelo reconhecimento e arrependimento dos pecados pessoais. Resumindo A salvação é um ato gracioso de Deus realizado por Cristo Jesus e nele oportunizado a todo homem. No entanto somente os que crêem em Jesus como o Filho de Deus e o recebem como seu Salvador e Senhor pessoal têm o perdão dos pecados e a garantia da salvação eterna. 14 Conhecendo Deus Nos estudos anteriores vimos que Deus tomou a iniciativa de prover meio para nossa salvação e realizou-o em Cristo. Hoje nós vamos abordar um tema bastante interessante: a doutrina da Trindade. O que é “doutrina” A palavra doutrina significa simplesmente “ensino”. As doutrinas bíblicas são, portanto, ensinos extraídos diretamente do texto bíblico ou que podem ser dele inferidos. No entanto, algumas doutrinas são um pouco mais complexas para o nosso entendimento, e dentre estas está a doutrina da Trindade que, basicamente, afirma que Deus é um só, mas que subsiste e se revela em três pessoas; ou ainda, que são três pessoas com uma só natureza. O que diz a doutrina da Trindade A doutrina da Trindade pertence à série de ensinos sobre a natureza de Deus e afirma basicamente o seguinte: Deus é um só, e subsiste e se manifesta em três pessoas distintas entre si: Deus Pai, Deus Filho, e Deus Espírito Santo. Alguns teólogos preferem, por isso, a expressão “triunidade”, e não “trindade”. A questão básica é: como pode um só sêr ser, ao mesmo tempo, três pessoas distintas; ou, inversamente, como podem três serem ao mesmo tempo um só? Questões que precisam ser consideradas Como já vimos, a doutrina da Trindade trata da natureza de Deus, e estudar Deus é um desafio ao qual o homem pode corresponder apenas em parte, pois o finito (o ser humano) não pode conter, mesmo em termos apenas de racionalidade, o infinito (Deus)na sua plenitude. Ou seja, Deus é maior que nossa capacidade de compreensão. Jamais chegaremos ao conhecimento completo de Deus pois Ele estará sempre além do que poderemos compreender total e perfeitamente. O que conhecemos de Deus só conhecemos porque Ele o revelou, e mesmo o que Ele revelou não constitui a totalidade de quem Ele é ou de seus planos para nós; sabemos apenas o que é necessário para crermos nele e recebermos sua salvação. A Bíblia não é um tratado acerca de Deus, mas um dos meios que 15 Ele usou para revelar o suficiente de si mesmo para que o homem o conheça, se conheça, e obtenha a salvação em Cristo. Questões importantes a considerar Ao estudarmos a Trindade, há algumas questões a serem consideradas para o bom entendimento desse assunto: • A natureza de Deus: Deus é um ser espiritual (veja João 4.24), portanto todas as limitações relativas a espaço, como um corpo, por exemplo, não se aplicam a Deus. • Há, em Deus, alguns atributos que são incomunicáveis; dentre estes, há três que são mais conhecidos: a onisciência (Deus sabe todas as coisas), a onipresença (Deus está em todo lugar), e a onipotência (Deus pode fazer tudo que desejar e do modo que desejar fazer – veja Lucas 1.37 e 18.27, como exemplos). • Não há contradições em Deus, portanto as doutrinas da unicidade de Deus e da triunidade (ou trindade) não são excludentes. Nossa percepção limitada é que nos impede de compreender perfeitamente essa questão. A doutrina da trindade nem é irracional (sem racionalidade) nem racional (plenamente explicada pela razão), mas supra-racional (acima da nossa capacidade plena de compreensão). • A doutrina da trindade é revelada mais na Bíblia em textos narrativos que em textos didáticos; portanto devemos buscar suas evidências nas partes narrativas da Bíblia mais que em passagens doutrinárias – embora ambas apresentem essa doutrina. Deus há um só Na Bíblia encontramos várias declarações afirmando a unicidade de Deus: Deuteronômio 4.32-35; 6.1-5, e João 17.7, por exemplo. Comparação que pode ajudar Como já foi mencionado, a realidade espiritual descrita pela doutrina da trindade está além da nossa compreensão; mas há algumas comparações freqüentemente usadas para ilustrar o conceito de um mesmo Deus que subsiste em forma de três pessoas distintas que, no entanto, são um só e o mesmo Deus. A mais comum é a água. A água: a água pode ser encontrada em nosso ambiente em três “estados” distintos: líquido, sólido, e gasoso. Embora os “estados” sejam diferentes, a essência é a mesma: h 2o, ou seja, água. 16 Deus, em sua sabedoria e poder, proveu um elemento natural que pode, por analogia, exemplificar a trindade. Ministérios das Pessoas da Trindade Uma pergunta interessante é a seguinte: por quê Ele fez assim? Poderíamos simplesmente dizer que Ele resolveu em sua soberania agir assim. Mas tudo que Deus faz tem um propósito, e, nas pessoas da Trindade, cada uma realiza ministérios específicos. A essas definições de ministérios os teólogos chamam de economia divina (literalmente “normas da casa”). Que ministérios são esses? Vamos ver alguns deles no estudo de hoje. Como Deus, as Pessoas da Trindade têm igual divindade, eternidade, poder, santidade, etc; mas na economia divina (atribuições internas específicas) há atividades reservadas a cada uma dessas Pessoas. Essas atividades específicas são chamadas também de ministérios. • A primeira pessoa da Trindade. A primeira pessoa da Trindade é chamada de “Deus Pai”. Essa designação de “Pai”, foi dada pelo próprio Jesus (veja a oração dominical: Mateus 6.9-13). Vamos ver algumas atribuições do Pai: - Como Pai, Ele é o Criador de todas as coisas, de todo o universo (Mateus 19.4). - Foi quem enviou seu Filho (João 3.16; 20.21); -É aquele de quem, quando recebemos a Cristo como salvador pessoal, nos tornamos também filhos (João 1.10-13). • A segunda pessoa da Trindade. À segunda pessoa da Trindade, nós chamamos de “Deus Filho”. Comumente nos referimos a ele como Jesus Cristo, o Deus encarnado. - É a encarnação de Deus (João 1.14). - Viveu para revelar-nos o amor do Pai e morreu na cruz para nos salvar (Filipenses 2.6-8; Hebreus 7.22-28). - Entregou-se na cruz para reconciliar-nos com o Pai (II Coríntios 5.19). - Ressuscitou ao terceiro dia e está à direita do Pai, nas alturas, intercedendo por nós (Atos 1.3,9; Romanos 8.34), de onde há de voltar para executar a plenitude da salvação e do juízo de Deus (Hebreus 9.28). • A terceira pessoa da Trindade: é o Espírito Santo. - É o Espírito da verdade, prometido por Cristo, o Consolador, que faz de nós sua morada (João 14.16,17); 17 - Aquele que convence o mundo do pecado, da justiça e do juízo (João 17.6-11). - Ele é o selo de garantia da nossa redenção (Efésios 1.13,14; 4.30). Comumente, quanto à obra de salvação, afirmamos que ela foi planejada pelo Pai, executada pelo Filho, e aplicada a nós pelo Espírito Santo. Estes são apena alguns itens sobre as ações das três pessoas da Trindade. Pelo estudo da Bíblia poderemos observar muitas outras obras realizadas pela Trindade divina que não foram mencionadas nesse estudo. Portanto, o essencial é estudarmos a Palavra de Deus escrita, a Bíblia. Ela será o assunto de nosso próximo encontro. 18 A Palavra de Deus Para Nós (a Bíblia) A Bíblia é o livro mais conhecido e mais lido do mundo. Seu conteúdo tem servido como base de muitos pensamentos e conceitos, tais como moralidade, ética, política, história, sociologia, psicologia, etc. Isso evidencia seu caráter singular. No entanto para nós, os cristãos, a Bíblia é muito mais que um livro de referência filosófica, religiosa, ou de qualquer outra coisa: ela é a Palavra de Deus para nós. Hoje, o tema de nossa conversa é a Bíblia. O que significa “bíblia”. A palavra “bíblia” vem de uma palavra grega que significa simplesmente “livros”. Esse nome foi adotado em razão da Bíblia não ser um único livro. Na verdade ela é composta de vários livros, alguns extensos, outros curtos, alguns são mesmo apenas pequenas cartas. A Bíblia cristã evangélica tem um total de 66 livros, distribuídos em duas divisões principais: o Antigo Testamento (AT, com 39 livros), também chamado de Velho Testamento; e o Novo Testamento (NT, com 27 livros). Por quê essa divisão? Essa divisão foi estabelecida em razão da cronologia e da natureza dos livros do AT e do NT. Os livros do AT foram escritos antes da vinda de Jesus e, de uma forma geral, registram a promessa da vinda do Messias. O NT foi escrito após a vinda de Jesus e registra que a promessa foi cumprida: o Messias, Jesus, já veio, e virá uma segunda vez. É claro que o Antigo e o Novo Testamento não apresentam simplesmente os conteúdos acima. Há o registro de muitos outros temas, mas certamente todos eles convergem para estes que foram citados. A Bíblia: uma revelação especial de Deus Na teologia cristã há uma doutrina (ou ensino básico) chamada de doutrina da revelação, que essencialmente trata dos modos como Deus se dá, e deu-se, a conhecer: há a chamada “revelação geral” ou “revelação natural”, que é aquela que Deus dá de si mesmo através da própria criação. Dois textos que ilustram essa revelação natural de Deus são: Salmo 19: 1 (1 a 6), e Romanos 1.20. Esse modo de revelação de Deus, porém, serve simplesmente para atestar sua existência e poder, porém é insuficiente para levar o homem à salvação. 19 Para que o homem pudesse chegar ao conhecimento salvador de Deus, Ele mesmo tomou duas iniciativas principais: o registro da Bíblia, e a encarnação de Jesus Cristo. A esses modos específicos de revelação de Deus os teólogos chamam de revelação especial. A Bíblia como revelação A palavra “revelação” literalmente significa “tirar o véu”, e se refere ao véu antigamente usado sobre o rosto. Somente com a tirada do véu podia-se ver legitimamente o rosto de uma pessoa. Assim, a Bíblia retira o véu de nossa percepção mostrando-nos quem é Deus e o seu propósito salvador para a humanidade. Um livro muito diferente Algumas pessoas podem dizer o seguinte: “Mas, como assim, ´revelação’ de Deus? A Bíblia é de papel, como qualquer outro livro, e papel aceita tudo o que se escreve nele!”. No entanto, há duas coisas que devem ser levadas em consideração: quanto à sua constituição física, a Bíblia é como qualquer outro livro: de papel; mas quanto à natureza de seu conteúdo – aquilo de que trata – ela se distingue de todos os outros livros, pois ela é o registro da revelação que Deus fez de si mesmo aos homens ao longo da história. Só que esse registro não foi feito conforme as impressões ou deduções humanas acerca de Deus, mas foi guiado pelo próprio Deus através da ação do Espírito Santo em homens especialmente movidos por ele para esse fim sem, contudo, alterar a racionalidade de cada escritor em si e suas características pessoais. A essa ação do Espírito Santo movendo homens específicos para o registro fiel da revelação de Deus chamamos de inspiração das Escrituras. Evidências da inspiração da Bíblia Há alguns elementos que são comumente apresentados como evidências da inspiração da Bíblia. Alguns são chamados de evidências externas, e outros de evidências internas. Vamos ver apenas as mais básicas. • Evidências externas. Como evidências externas podem ser citadas: - a transformação do indivíduo: as modificações morais e comportamentais que ocorrem no indivíduo quando este compreende e aceita o conteúdo dela como parte de sua fé pessoal; 20 - formação e preservação: a Bíblia foi escrita ao longo de séculos, e também ao longo do tempo foi preservada de toda destruição intentada contra ela – basta um passeio geral sobre esse assunto ao longo da história e isso poderá ser observado. • Como evidências internas podem ser citadas: - A unidade na diversidade: Embora a Bíblia tenha sido escrita ao longo de 17 séculos, aproximadamente, por homens em tempos diferentes, lugares diferentes, culturas diferentes, experiências diferentes, muitos deles sem sequer haverem se conhecido pessoalmente um ao outro, há, contudo, uma unidade admirável em todo o seu conjunto. - O cumprimento das profecias: as profecias cumpridas são evidências de que o conteúdo da Bíblia não partiu de elaboração simplesmente humana: Deus estava por “detrás” de sua formação (II Pedro 1.21). - As afirmações dela sobre si mesma: há na Bíblia textos que atestam seu caráter inspirado, como, por exemplo, II Timóteo 3.16, I Pedro 1.10,11, e II Pedro 1.14. Infalibilidade e suficiência da Palavra de Deus Uma vez que a Bíblia foi inspirada por Deus e não procede simplesmente da criatividade ou capacidade imaginativa humana, ela é infalível e suficiente em sua finalidade: é infalível na fidelidade do que nela está escrito, podendo ser crida em todas as suas afirmações; e é suficiente em sua finalidade de nos revelar a existência de Deus, seu poder, sua vontade, e seu propósito de salvação para o homem. É em razão de sua inspiração, infalibilidade e suficiência que nós, cristãos evangélicos, fazemos a histórica declaração: A Bíblia é nossa única regra de fé e prática. Ou seja, nela está estabelecido tudo o que devemos crer acerca de Deus, e como devemos conduzir nossas vidas. Atitudes para com a Bíblia A Bíblia é a revelação inspirada de Deus, e, como tal, é infalível e suficiente para nossa fé. Em razão disso precisamos valorizá-la em nossas vidas através de ações bem simples, como por exemplo: Crer no que nela está escrito para conhecer o caminho da salvação (II Timóteo 3.14,15); 21 Ler a Bíblia devocionalmente – como exercício para nossa vida espiritual, para o alimento prazeroso de nossa alma e prática de vida (Salmo 1.2, Salmo 119.105) Estudar a Bíblia dedicadamente, para conhecer as bases de nossas convicções religiosas e argumentar inteligentemente com aqueles que se opõem à nossa fé (I Pedro 3.15). Que Deus nos dê temor do seu nome e amor à sua Palavra, para que por ela possamos conhecê-lo mais, sua graça e seu propósito, possamos, enfim, crescer na vida de salvação. 22 Testemunhando a Graça de Deus (o Batismo e a Santa Ceia) Em certo momento de seu ministério, Jesus disse o seguinte: “Portanto, todo aquele que me confessar diante dos homens, também eu o confessarei diante de meu Pai, que está nos céus; mas aquele que me negar diante dos homens, também eu o negarei diante de meu Pai, que está nos céus” (Mateus 10.32,33). O apóstolo Paulo também escreveu o seguinte: “Se, com tua boca, confessares Jesus como Senhor e, em teu coração, creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo” (Romanos 10.9). Nesses textos observamos uma exigência, um requerimento feito àqueles que são seguidores de Cristo: evidenciar publicamente sua decisão de seguir a Jesus, de pertencer a ele. Há diversos modos de fazer-se isso, dentre esses está o testemunho informal dado por uma vida de verdadeiro compromisso com os valores do Reino de Deus manifestados no diaa-dia em ações e palavras. Mas há também modos formais, apresentados como ordens dadas por Cristo e que têm a função de, em sua essência, testemunharem a graça de Deus que alcançou nossas vidas. A essas ordenanças chamamos de sacramentos. O que são “sacramentos” A palavra “sacramento” deriva de uma expressão latina cuja idéia básica é a de “sinais do sagrado”. Um sinal (como acontece com o semáforo, por exemplo) tem simplesmente a função de “chamar a atenção para a realidade que está além dele mesmo”; portanto, o sacramento não é um fim em si, mas um meio de destacar as bênçãos espirituais que ele representa. Teologicamente dizemos que os sacramentos são o testemunho externo das bênçãos internas concedidas por Deus, ou seja, através deles fazemos uma declaração pública acerca de bênçãos graciosas que recebemos de Deus em nossas vidas espirituais. O ensino cristão evangélico reconhece apenas dois sacramentos: o batismo, e a Santa Ceia (ou Ceia do Senhor, ou simplesmente Ceia). 23 Os significados do batismo Como os sacramentos são sinais (ou símbolos, ou representações), cada um deles tem significados próprios. O batismo foi ordenado pelo Senhor Jesus (Mateus 28.18-20) e simboliza o compromisso efetivo com o Ele e a obtenção da nova vida nele, ou seja, que, em Cristo, morremos para o mundo (o pecado) e vivemos para Deus. Esta simbologia é encontrada em Romanos 6.1-11. Outra simbologia para o Batismo é que ele ilustra que fomos lavados de nossos pecados pelo Espírito Santo e fomos assim salvos em Jesus (Tito 3.5-7). Em razão desses dois significados, realiza-se o ato do batismo de duas formas básicas: por imersão (mergulhando o crente na água), ou por aspersão (derramando água sobre o crente). Qualquer das duas formas é válida. Os significados da Santa Ceia A Santa Ceia foi estabelecida por Cristo quando ele comemorou a última Páscoa com seus discípulos (Mateus 26.26-30, Marcos 14.22-26, Lucas 22.14-20 e I Coríntios 11.22-25). A Páscoa era a festa israelita que comemorava a saída do Egito depois de séculos de escravidão. Assim também, a Santa Ceia nos lembra a morte substitutiva de Cristo na cruz, morte essa que pagou o preço da nossa redenção. Os elementos utilizados na Ceia cristã são o pão e o vinho. A Santa Ceia simboliza muitos aspectos da graça de Deus sobre nossas vidas: Que nós recebemos os benefícios do pacto (ou aliança) da salvação de Deus realizada por meio do sacrifício de Cristo; Que agora fazemos parte do povo de Deus; Que fomos colocados em comunhão com Cristo e com o seu corpo (a igreja); Que seremos reunidos com o Senhor no Reino de Deus. Todos esses significados podem ser observados nos textos bíblicos nos quais aparecem menções à Ceia; mas, resumindo: na Santa Ceia celebramos a salvação em Cristo, a inserção na família de Deus, a comunhão com o corpo de Cristo, e que temos o Reino eterno preparado para nós. 24 Os sacramentos como meios de graça Quando participamos dos sacramentos somos reavivados em nossa memória sobre o que Deus fez por nós na pessoa de Jesus. Ao sermos relembrados na nossa nova vida, da comunhão com Cristo e seu corpo, e da eternidade que está preparada para nós, somos, também, agraciados espiritualmente, pois nossa percepção da graça dada a nós é intensificada e somos motivados a prosseguir comprometidos com o Senhor e com os valores do seu Reino. Nesse sentido, os sacramentos são meios da graça de Deus sobre nós, não nos elementos em si, mas no reavivamento espiritual que nos trazem. Os sacramentos como testemunho Como já foi dito, os sacramentos são basicamente testemunhos, e um testemunho nada mais é do que a declaração ou confirmação de algo que se viu ou ouviu, ou vivenciou. Quando participamos dos sacramentos afirmamos nossa experiência de vida em Cristo Jesus, e o fazemos em algumas “direções” distintas: Testemunhamos a Deus que somos dele; Testemunhamos para a igreja nossa comunhão (nosso benefício em comum) recebida no Senhor; Testemunhamos ao mundo que somos de Jesus; Testemunhamos à história os atos de Deus realizados no passado em Cristo (salvação e nova vida), e os que serão realizados no futuro pelo Senhor (o Reino eterno vindouro). Participando dos sacramentos Uma vez que os sacramentos são tão importantes, é preciso participar deles de modo correto ou não traremos para nós bênçãos, mas reprimendas da parte de Deus (as exortações de Paulo em I Coríntios 11 deixam isso bastante claro). Como então participar dos sacramentos? Bom, precisamos entender que a participação adequada não se restringe à forma externas, mas requer disposições adequadas do coração (veja I Samuel 16.6,7). Quanto a isso, então, precisamos observar o seguinte: Devemos participar dos sacramentos com a experiência real daquilo que eles representam; ou seja, já havendo tido a experiência da conversão e entrega da vida ao Senhor Jesus; 25 Devemos participar dos sacramentos com a consciência real do que eles significam, pois eles apontam para os atos de Deus para conosco; Devemos participar dos sacramentos com a disposição real de viver do modo como devemos viver, pois as realidades que eles representam precisam ser confirmadas em nossas atitudes do dia-a-dia. Quando participamos dignamente dos sacramentos, confessamos a Jesus como Senhor nosso, e somos por ele confirmados diante do Pai. Que toda a nossa vida seja marcada por essas confirmações: as nossas acerca dele, e as dele acerca de nós. Que Deus nos abençoe e nos faça crescer no conhecimento dele, na intimidade com ele, e no testemunho acerca dele e de seus atos em nós! 26 Uma nova família (a Igreja) O discípulo João, já no início de seu evangelho, falando sobre o ministério de Jesus Cristo escreveu o seguinte: “Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, a saber, aos que crêem no seu nome; os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus”. João 1.11-13 Esse texto nos diz que aqueles que creem em Cristo receberam a graça de participar de uma nova família: a família da fé, ou seja, passaram a integrar o grupo daqueles que tiveram a mesma experiência de conversão a Cristo e, agora, pertencem definitiva e eternamente à família que tem a Deus como Pai e aos outros que creem como irmãos – foram feitos seus filhos e filhas. Esse grupo, ou família, é chamado no Novo Testamento de “igreja”. A palavra “igreja” hoje Há muitos sentidos em que a palavra igreja é usada hoje em dia. Alguns são os seguintes: Templo onde pessoas se reúnem para prestar sua adoração a Deus: “A igreja na Rua 23”, por exemplo. Neste conceito, a ênfase está na construção. Uma organização social religiosa, com suas normas e atribuições, que tem como seus membros pessoas que aceitam e se submetem a seus ensinos, costumes e sistemas de governo e administração: “A Igreja Presbiteriana”, por exemplo, ou a “Igreja Batista”, etc. Nesse sentido, “igreja” também é chamada de “denominação”. Este conceito enfatiza a instituição. Grupo de pessoas salvas em Cristo Jesus que se reúnem para adorar a Deus, ouvir a sua mensagem e moldar suas vidas e conceitos segundo os padrões que apreendem da Palavra de Deus, e que convivem relacionalmente sobre a base desses novos conceitos e valores. A ênfase, neste uso da palavra igreja está, portanto, nas pessoas. É nesse sentido que a palavra igreja é mais utilizada na Bíblia. Veja, como exemplos, os seguintes textos: Atos 2.42 a 47 e I Coríntios 1.2. 27 O que é “igreja” A palavra “igreja” é de origem grega e significa “chamados para fora” – nesse caso indicando aqueles que foram “separados à partir do mundo”, ou seja, que deixaram suas vidas de pecado e, arrependidos, voltaram-se para Deus experimentando Seu perdão e salvação, tornando-se Seus filhos e herdeiros da vida eterna em Cristo Jesus. Igreja, no sentido essencial bíblico, é a reunião, união e comunhão daqueles que creem e confessam a Jesus Cristo como Senhor e Salvador pessoal. É importante observar que todos esses conceitos utilizados para “igreja” são importantes, pois precisamos tanto do templo quanto da instituição; mas jamais devemos esquecer que, prioritária e biblicamente, “igreja” é composta por pessoas. Igreja é, portanto, “a comunidade que tem a Cristo como o seu Rei e Cabeça (Efésios 1.22,23), a quem Cristo salvou [Efésios 2.12-18], em quem Ele [pelo Espírito Santo] habita [João 14.23; I Coríntios 6.19], a quem e por meio de quem revela a sua vontade”1, e a qual arrebatará definitivamente e em glória para o reino eterno do seu Pai (I Tessalonicenses 4.15-17). Igreja para quê? Hoje em dia encontramos pessoas que defendem a ideia de que igreja é algo completamente descartável para a vida cristã, pois o crente continuará crente mesmo sem frequentar regularmente um templo ou integrar uma instituição. Certamente que o salvo permanecerá salvo sem a igreja/instituição ou a igreja/templo, mas a igreja/comunidade de forma alguma é descartável, pois sem ela alguns desenvolvimentos espirituais seriam mais lentos – e outros mesmo impossíveis – para o crente, principalmente para o novo convertido. Vamos ver alguns aspectos pelos quais o cristão é beneficiado pela igreja: A igreja fornece a experiência da convivência na família da fé. João diz que aos que creram Deus deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus (João 1.12), passando, estes, a integrar a comunidade dos “filhos de Abraão” (Gálatas 3.7), portanto a igreja é um meio através do qual a identidade pessoal do crente como tal é formada e desenvolvida. A igreja fornece o ambiente no qual o crente é edificado no conhecimento da Palavra de Deus e em como viver na companhia desse Deus. Por meio da igreja o crente conhece e cresce na prática das disciplinas espirituais (estudo e meditação na Palavra, oração, jejum, etc) e desenvolve-se, assim, na comunhão pessoal com Deus. Desse modo cumpre-se nele o que disse o apóstolo Pedro em II Pedro 3.18: II Pedro 3:18: “Antes crescei na graça e conhecimento de nosso Senhor e Salvador, 28 Jesus Cristo. A ele seja dada a glória, assim agora, como no dia da eternidade. Amém”. A igreja fornece o ambiente de adoração e culto a Deus em participação coletiva. Embora a adoração legítima se processe sempre no interior do coração (pois “Deus é espírito; e importa que seus adoradores o adorem em espírito e em verdade” João 4.24), na igreja o adorador encontra ambiente motivador na adoração comum, na qual são compartilhadas as experiências no e com o Senhor e, nessa mutualidade, alegra-se, junto com o restante dos irmãos, em Deus pelo que Ele é e faz, e exalta-o por isso (os Salmos 133 1 134 exemplificam muito bem a importância e o valor da adoração comunitária). A igreja oferece o ambiente favorável para o consolo e o fortalecimento espirituais, emocionais, morais e mesmo físico. Na igreja somos consolados em meio a nossas lutas, encorajados a enfrentar os desafios, motivados à perseverança espiritual e mesmo recebemos auxílio em nossas múltiplas privações. Atos 2.42-47 mostra como viviam os cristãos e o impacto daquele modelo de vida – que devemos seguir também hoje – tanto na igreja como na comunidade local. A igreja é instrumento de proclamação da Palavra e dos valores do Reino de Deus. Seja por meio da pregação ou pelo testemunho pessoal de uma vida transformada, a igreja (pessoas) atua como proclamadora da mensagem do evangelho e como agente da implantação e manutenção dos valores cristãos na sociedade. A igreja tem, portanto, função proclamatória seja na reunião dos irmãos, seja em seus testemunhos pessoais, seja, ainda, numa ação evangelística (missionária) grupal ou individual. A igreja gera ambiente para a modelação pessoal. A própria sociologia reconhece que o homem é um ser social, e que é na convivência que nós, dentre outras coisas, aprendemos a nos conhecer, a construir nossa personalidade, e a viver em sociedade. Se esta é uma verdade científica, o é muito mais na vida espiritual. É na convivência e no trato de uns com os outros, nos nossos encontros e desencontros, acertos e erros que vamos sendo moldados até chegarmos “à estatura da plenitude de Cristo”, à maturidade cristã (Efésios 4.11-16). Por sua natureza, e por seus benefícios, a Igreja não é um elemento de segunda categoria ou descartável para o cristão. É certo que em todos os relacionamentos humanos enfrentamos desafios, mas é em meio a esses desafios que caminhamos para a maturidade moral e espiritual. É preciso sempre ter em mente as exortações bíblicas: “E consideremo-nos uns aos outros, para nos estimularmos ao amor e às boas obras, Não deixando a nossa congregação, como é costume de alguns, antes 29 admoestando-nos uns aos outros; e tanto mais, quanto vedes que se vai aproximando aquele dia”. Hebreus 10:24,25. “Não negligencieis, igualmente, a prática do bem e a mútua cooperação; pois, com tais sacrifícios, Deus se compraz” - Hebreus 13.16. __________________________________________ 1 –Ludgero Braga. Manual dos Catecúmenos, pág. 20, Editora Cultura Cristã, 1989. As partes em colchetes são acréscimos nossos ao texto transcrito. 30 Mantendo a família (a questão dos dízimos e ofertas) No estudo anterior abordamos a importância da igreja (a comunidade dos salvos) para a vida do cristão. Entendemos que a igreja é na realidade uma família cujos interrelacionamentos entre os irmãos e o relacionamento com Deus são construídos de modo a gerar maturidade e equilíbrio na vida espiritual. Nesse nosso último texto, falaremos sobre os modos de manutenção prática dessa família. Tal como qualquer outra família, a família da fé também tem necessidades que precisam ser supridas. Na Bíblia vemos diversos modos de se suprir as necessidades, mas quanto à supressão das necessidades materiais há basicamente dois modos de supressão: os dízimos e as ofertas. No estudo de hoje abordaremos os diversos modos de se suprir as necessidades da comunidade bíblica chamada igreja. Manutenção imaterial As necessidades humanas podem ser classificadas basicamente em duas categorias: as necessidades materiais, e as imateriais. Como uma comunidade formada por pessoas, também a igreja tem suas necessidades materiais e imateriais. Vamos primeiro tratar das necessidades imateriais. A supressão das necessidade imateriais estabelece-se através da prática das chamadas disciplinas espirituais e morais e do apoio emocional e psicológico. As disciplinas espirituais são, por exemplo, a oração (especialmente aquela na qual intercedemos diante de Deus pedindo que Ele sustente a todos na fé e dê à liderança discernimento espiritual para compreender a vontade de Deus e conduzir a Igreja conforme o Seu querer, por exemplo), a convivência em amor, o consolo em meio à dor, a exortação em meio à necessidade de correção, o encorajamento diante de desafios, o emprego dos dons para edificação mútua, etc. Todos esses são modos válidos e bíblicos recomendados para a manutenção da família da fé, promovendo a maturidade espiritual e o equilíbrio psicológico e emocional. Veja Colossenses 3.12-17, por exemplo. A manutenção moral refere-se ao testemunho do crente diante do mundo pela apresentação de uma vida honesta e exemplar honrando, assim, o nome de Cristo e da comunidade dos irmãos e irmãs. Um dos textos que, dentre outros, pode servir de exemplo desta esfera da vida cristã é aquele no qual Paulo trata das qualificações daqueles que almejam ocupar a liderança na igreja, registrado em I Timóteo 3.1-13 (leia-o em sua Bíblia, por favor). 31 Manutenção material A manutenção material é aquela que se dá por contribuição física e/ou financeira. Fisicamente podemos contribuir para a manutenção da família por meio da ação social, oferecendo medicamentos ou trato físico dos enfermos, alimentos aos que estiverem necessitados, por exemplo, ou ajudando alguém da família da fé no conserto de encanamento ou na pintura da casa, etc. A manutenção financeira dá-se através de dois meios: os dízimos e as ofertas. Se bem que as ofertas também possam ser de outra natureza, além da financeira. Que é dízimo? A palavra “dízimo” simplesmente quer dizer “a décima parte” e se refere ao percentual que os israelitas deveriam dar de sua produção aos ofícios religiosos. Foi ordenado por Deus desde o Antigo Testamento para que houvesse a manutenção dos serviços religiosos no Tabernáculo e, posteriormente, no templo. Há muitos textos na Bíblia que falam sobre o dízimo, mas talvez o mais conhecido e utilizado seja Malaquias 3.10: “Trazei todos os dízimos à casa do Tesouro, para que haja mantimento na minha casa; e provai-me nisto, diz o Senhor dos Exércitos, se eu não vos abrir a janela do céu e não derramar sobre vós bênção sem medida”. Este é um texto emblemático e suficiente para algumas considerações úteis sobre os dízimos: Trata-se de uma ordenança: é um mandamento estabelecido por Deus para o seu povo. Tem uma finalidade prática: prover mantimento para a casa de Deus; Embora seja uma prática com fins “administrativos”, trata-se também de um ato de culto, pois envolve ação do crente e resposta de Deus. O próprio Senhor compromete seu nome na promessa de abençoar, desde os céus, aquele que cumprir esta ordenança. Quanto ao dízimo convém ressaltar, ainda, o seguinte: Embora haja promessa de concessão de bênçãos para aquele que for fiel na consagração de seu dízimo, o dízimo não deve ser utilizado como uma “moeda de troca”, como um instrumento de “barganha” com Deus. A consagração do 32 dízimo deve ser um ato puro de culto, praticado mais pelo simples desejo de obedecer a Deus e ter prazer em fazê-lo do que por qualquer outra motivação. As bênçãos virão em decorrência da atitude fiel e sincera do crente, não em decorrência de um jogo de interesses com Deus. O dízimo é requerido dos membros da igreja. Trata-se de responsabilidade e privilégio assumidos por aqueles que se comprometem com a igreja (pessoas e instituição) e devem colaborar para a sua manutenção. Aqueles que não são membros não têm a obrigação da entrega do dízimo. Deve ser consagrado como ato de amor a Deus, mas também aos irmãos. É com o dízimo que são mantidas as assistências e os socorros aos necessitados cristãos e/ou não-cristãos, o sustento financeiro de missionários em suas atividades evangelísticas, as despesas funcionais do templo, etc. Não cumprir a responsabilidade da entrega do dízimo é também penalizar estas outras frentes de atuação da igreja. Dízimo é, acima de tudo, uma questão de fidelidade. Ofertas De modo diferente do dízimo, as ofertas são doações sem qualquer obrigatoriedade tanto no seu valor (se forem em dinheiro) quanto na sua regularidade. Enquanto o dízimo constitui-se em dever, a oferta deve ser fruto da liberalidade cristã. As ofertas são propostas, em geral, visando uma finalidade específica religiosa ou social: a construção de um templo ou o auxílio urgente a pessoas atingidas por calamidades, por exemplo, ou ainda, simplesmente, o desejo de contribuir financeiramente à mais com as atividades religiosas. Elas podem, portanto, destinarem-se a uma causa especial ou simplesmente ser uma contribuição graciosa. Com referência às disposições internas para a contribuição por meio de ofertas – mas não somente em relação a estas, é claro – os padrões bíblicos são: a voluntariedade e a alegria ao fazê-lo (I Crônicas 29.1-9; II Coríntios 9.7). Nesse ponto de nosso estudo é útil, ainda, uma importante observação: a oferta pode ser dada a qualquer instante, mas de forma alguma pode substituir o dízimo, mesmo que seu valor seja superior ao deste; pois, ao contrário do que se possa pensar, e como já dissemos, o dízimo não se trata de uma questão financeira, mas de uma questão de fidelidade. Que Deus ajude-nos a sermos fiéis. 33 Palavra final Com o estudo sobre o dízimo encerramos esse pequeno texto. Esperamos que sua brevidade não haja prejudicado o conteúdo, e que sirva de instrumento para motivar estudos mais aprofundados dessas questões tão importantes. Não se esqueçam que a Bíblia é nossa regra de fé e prática. Estudem-na, pesquisemna, aprendam dela e nela, pratiquem-na, coloquem-na em seus corações. Toda e qualquer referência para o em que se deve crer e para todo o agir está nela. Esta é nossa última recomendação: estudem sempre a Palavra de Deus. “Não cesses de falar desse Livro da Lei; antes, medita nele dia e noite, para que tenhas cuidado de fazer segundo tudo quanto nele está escrito; então, farás prosperar o teu caminho e serás bem-sucedido” - Josué 1.8. Deus lhes abençoe! 34