DECISÃO
Por relatório, vez que não obrigatório, limito-me a mencionar que se trata de ação civil
pública por improbidade administrativa proposta pelo Ministério Público atuante
perante esta Comarca contra:
1. ANTONIO NAZARÉ ELIAS CORREA, prefeito do Município;
2. RAIMUNDO ANTÔNIO TAVARES LIMA, atual Secretário de Finanças e exmembro da Comissão de Licitação do Município de Nova Timboteua;
3. FRANCISCO CARLOS ALVES PEREIRA, membro da Comissão de Licitação do
Município;
4. EDILENE DOS SANTOS SOUZA, membro da Comissão de Licitação do
Município;
5. RAIMUNDA DE SOUZA CARVALHO, membro da Comissão de Licitação do
Município;
6. FRANCISCO CARLOS MENDONÇA E SILVA, presidente da Comissão de
Licitação do Município no ano de 2009;
7. SENIR CRISÓSTOMO FERNANDES, membro da Comissão de Licitação do
Município;
8. FRANCINEY RICARDO LIMA DOS SANTOS, pregoeiro;
9. MARIA HELENA SILVA DOS ANJOS, membro da Comissão de Licitação do
Município;
10. MARIA SUELY SOUZA DANTAS, membro da Comissão de Licitação do
Município , ;
11. VINÍCIUS NAZARENO GARCIA DE LIMA, ex contador e pregoeiro da
Prefeitura Municipal de Nova Timboteua;
12. CONSTRUTORA CIVIL E TERRAPLANAGEM MAGALHÃES LTDA.,
pessoa jurídica de direito privado, qualificada na inicial;
13. JADILON GONÇALVES MAGALHÃES, sócio da empresa Construtora Civil de
Terraplanagem Magalhães Ltda.;
14. JADILON GONÇALVES MAGALHÃES JÚNIOR, sócio da empresa
Construtora Civil de Terraplanagem Magalhães Ltda.;
15. CÉSAR AUGUSTO ASSAD FILHO, ex advogado da Prefeitura de Nova
Timboteua;
16. CONSTRUTORA FALCÃO LTDA., pessoa jurídica de direito privado,
qualificada nos autos;
17. JOSÉ DÁRIO DAMASCENO LIMA, sócio da empresa Construtora Falcão
Ltda.;
18. ANTÔNIA MARIZETE BRAGA GOUVEA, sócia da empresa Construtora
Falcão Ltda.;
19. MARINALDO BRAGA GOUVEA, sócio da empresa Construtora Falcão Ltda.;
20. COMERCIAL ALINUTRI LTDA., pessoa jurídica de direito privado qualificada
nos autos;
21. JOÃO ALVES GOUVEA, sócio da empresa Comercial Alinutri Ltda.; e
22. CARLOS EDUARDO MONTEIRO LOUREIRO, sócio da empresa Comercial
Alinutri Ltda. e da empresa Construtora Falcão Ltda;
Em resumo, alega o Ministério Público que as provas trazidas aos autos, isto é, os autos
de vários processos licitatórios, indicam que as licitações realizadas no Município de
Nova Timboteua de 2005 a 2011 foram sempre vencidas por três empresas:
CONSTRUTORA
FALCÃO
LTDA.,
CONSTRUTORA
CIVIL
DE
TERRAPLANAGEM MAGALHÃES LTDA. e COMERCIAL ALINUTRI LTDA.,
todas com alguma ligação com o prefeito, além do que, inúmeras irregularidades nos
processos licitatórios indicariam claramente o direcionamento de todos os certames, de
modo
que
uma
dessas
empresas
fosse
sempre
a
vencedora.
Informa que a busca e apreensão ordenada por este juízo restou infrutífera quanto aos
anos de 2005 a 2007, vez que encontrados apenas os autos de um processo licitatório já
objeto de outra ação civil pública. Todavia, informa que dos autos encontrados, em
oitenta por cento dos casos a vencedora era uma das empresas investigadas, num total
de
trinta
e
um
certames
analisados.
Aponta irregularidades em vários procedimentos nos processos licitatórios e vícios que
permitiriam facilmente a “regularização” posterior dos processos, como folhas não
numeradas, não descrição dos bens objeto do certame, ao mesmo passo que as proposta
para a locação dos bens descritos unicamente como “veículos automotores leves” são
todas muito próximas; existência de parecer jurídico ou análise posterior de processo em
que há várias recomendações de correções de vícios nos processos, entre outras.
Além dos vícios nos processos licitatórios enumerados na inicial, aponta violação de
vários
princípios
da
administração
pública.
Pede o afastamento dos respectivos cargos dos demandados ANTÔNIO NAZARÉ
ELIAS CORRÊA, RAIMUNDO ANTÔNIO TAVARES LIMA, FRANCISCO
CARLOS ALVES PEREIRA, EDILENE DOS SANTOS SOUZA, RAIMUNDA DE
SOUZA CARVALHO, FRANCISCO CARLOS MENDONÇA E SILVA, SENIR
CRISÓSTOMO FERNANDES, FRANCINEY RICARDO LIMA DOS SANTOS,
MARIA HELENA SILVA DOS ANJOS, MARIA SUELY SOUZA DANTAS e
VINÍCIUS
NAZARENO
GARCIA
DE
LIMA.
Aponta como justificativa para os pedidos de afastamento o fato de que, caso
permaneçam ocupando os atuais cargos, continuarão a desviar recursos do erário
público, bem como continuarão a impedir a ação fiscalizadora e inibidora da justiça,
fato ilustrado com a circunstância de que, no cumprimento da Busca e Apreensão
determinada por este Juízo, vários processos licitatórios simplesmente sumiram e não se
sabe atualmente onde possam estar. Ressalta, ainda, o fato de ter sido encontrado dentro
dos processos licitatórios pareceres ensinando a administração a “regularizar” licitações
já ocorridas. Porém tais processos a que se refeririam os pareceres, simplesmente não
foram
encontrados.
Diante de tais fatos, entende o Ministério Público que, se os demandados continuarem a
exercer suas funções, é concreta a possibilidade de perda ou alteração de provas a serem
coletadas para a instrução processual, tanto que a busca não foi totalmente cumprida,
pelo
fato
de
vários
documentos
não
terem
sido
encontrados.
Além disso, pediu liminarmente a quebra do sigilo bancário e fiscal dos demandados; a
apresentação, em vinte e quatro horas, da relação dos veículos que são do acervo
patrimonial da Prefeitura, com os respectivos documentos, bem como a relação de
carros, motos e tratores com os respectivos documentos; e seja determinado ao Tribunal
de Contas dos Municípios que apresente, em quinze dias, informações detalhadas no
período de 2005/2011 acerca dos valores efetivamente pagos às empresas demandadas
na
presente
ação.
Juntou o Ministério Público documentos que formam outros nove volumes, além de ter
juntado
meio
digital
(DVD).
É
o
que
basta
relatar.
Decido.
FUNDAMENTOS
Antes de discutir sobre o objeto da medida liminar, devo ressaltar a inaplicabilidade do
art. 2° da Lei 8.347/92 ao presente caso. Tal inaplicabilidade decorre de que a regra está
prevista para o caso de ser ré na ação civil pública pessoa jurídica de direito público, em
razão do que foi estabelecida a prerrogativa, de modo a melhor preservar o interesse
público. Evidentemente, se a ação civil pública não é proposta contra pessoa jurídica de
direito público, não há que se falar em aplicação daquela regra.
1. Do fumus boni juris ou vestígios da existência do direito alegado.
Como primeiro requisito de quaisquer medidas de caráter cautelar, como as requeridas
pelo Ministério Público, cumpre-me analisar a plausibilidade do direito a tal medida.
No caso em questão, há que se verificar indícios de veracidade dos fatos narrados na
inicial para que se cumpra esse requisito. É o que passo a fazer.
Da análise de toda a documentação apresentada com a inicial, consistente em sua grande
maioria em autos de processos licitatórios apreendidos na Prefeitura Municipal, pode-se
elaborar, de forma semelhante ao que elaborou o Ministério Público em sua inicial, o
seguinte quadro:
Proc.
Modalidade Objeto
Licitatório
003/2007
002/2005
002/2007
005/2008
001/2008
006/2008
007/2008
008/2008
001/2009
003/2009
007/2009
004/2009
001/2010SMAS
001/2010-
Pregão
contratação de transporte escolar
Vencedor
Cons.
Falcão
T. de Preços Aluguel de caminhão e maq. pesadas Cons.
Magalhães
Pregão
Idem
Cons.
Magalhães
Convite
Terraplanagem,
piçarramento, Com.
tubulação, compactação do solo e Alinutri
pav. asfáltica
Convite
Locação de veículos automotores
Com.
Alinutri
Convite
Serviços
de
recuperação, Com.
piçarramento, tubulação e aterro
Alinutri
Convite
Aterro
com
piçarramento
e Com.
nivelamento
Alinutri
Convite
Construção de três pontes de madeira Cons.
no Ramal da Vila Santa
Falcão
Convite
Locação de Veículos Leves
Com.
Alinutri
Pregão
Locação de Transporte Escolar
Cosnt.
Falcão
Convite
Locação de Veículos automotores Com.
leves
Alinutri
Convite
Locação de Veículos automotores Com.
leves
Alinutri
Convite
Locação de 03 Veículos automotores Com.
leves
Alinutri
Convite
Locação de Veículos automotores Com.
Valor
do
Contrato (+
prorrogações)
R$ 689.040,00
R$ 480.000,00
R$ 540.000,00
R$ 146.000,00
R$ 63.000,00
R$ 149.000,00
R$ 49.000,00
R$ 48.000,00
R$ 63.000,00
R$ 427.200,00
R$ 63.000,00
R$ 84.000,00
R$ 63.000,00
R$ 84.000,00
SMS
001/2010- Convite
SME
009/2010-02 Pregão
001/2010Fundeb
002/2010Fundeb
001/2010FMS
Convite
003/2010FMS
013/2010
Convite
003/2011
Convite
002/2011
Convite
004/2011
Convite
Convite
Convite
Convite
leves
Alinutri
Locação de Veículos automotores Com.
leves
Alinutri
Locação de Transporte Escolar
Com.
Alinutri
Construção de uma escola
Cons.
Magalhães
Reforma de Escola
Cons.
Magalhães
Higienização e manutenção de poços Cons.
artesianos, suas bombas e sistemas Magalhães
hidráulicos e elétricos
Reforma e ampliação do laboratório Cons.
médico da UBS de Nova Timboteua Magalhães
Reforma da Casa do Atleta
Cons.
Magalhães
Locação de 03 veículos leves
Com.
Alinutri
Locação de 03 veículos leves
Com.
Alinutri
Locação de 03 veículos leves
Com.
Alinutri
R$ 84.000,00
R$ 535.034,40
R$ 38.000,00
R$ 40.955,83
R$ 78.000,00
R$ 21.000,00
R$ 47.302,61
R$ 75.600,00
R$ 75.600,00
R$ 75.600,00
TOTAL
R$4.019.332,84
Se o só fato de ao longo de quase oito anos apenas três empresas ganharem a
esmagadora maioria das licitações em Nova Timboteua já não fosse altamente
questionável e indicativo de direcionamento das licitações, esse é apenas um dos
indícios e nem é o mais contundente deles, como se verá a seguir.
1.1. Indício de produção de documentos numa mesma impressora e/ou a partir do
mesmo
arquivo
digital.
Há fortes indícios de que os documentos e propostas apresentados nas licitações sejam
provenientes de uma fonte comum. Como exemplo, cito os documentos de fls. 177 a
193, que são integrantes do Processo Licitatório 003/2007 e consistem no Anexo I do
edital da licitação, a proposta feita por Construtora Magalhães Ltda. e a proposta feita
por
Construtora
Falcão
Ltda.
Esses documentos revelam fortíssimos indícios, mesmo aos olhos de um leigo, de que
foram impressos a partir do mesmo arquivo digital e pela mesma impressora, apenas
com modificações de cabeçalhos e rodapés e mudança no formato de caracteres (fonte).
Isso fica evidente pelo fato de que os três documentos apresentam as mesmas
características
de
desalinho
e
entupimento
dos
jatos
de
tinta.
Ainda que se queira argumentar a possibilidade de três impressoras diferentes terem
produzidos os documentos e as três apresentarem problema, tal hipótese é remotíssima,
para não dizer inteiramente descartada. É que se não bastasse ser nítido que a impressão
se deu em impressora jato de tinta a base de água, com desalinhos em sua cabeça de
impressão e alguns entupimentos, tanto que as falhas na formação dos caracteres são
nítidas nos três documentos, chama especial atenção o desalinho presente na palavra
“sessenta” entre parênteses nas propostas das duas construtoras. No último parêntese
que guarnece a palavra “sessenta”, nas duas propostas, surge um borrão típico de
desalinho de impressoras jatos de tinta, a demonstrar com clareza que a impressão se
deu no mesmo aparelho, mesmo aos olhos de um leigo, pois, sabidamente, a
probabilidade de um borrão semelhante por desalinho se revelar na mesma palavra e no
mesmo caractere em duas impressoras diferentes é praticamente impossível. Até mesmo
numa mesma impressora já se torna difícil, por conta da mudança de estilo de fonte e
mudança na posição das palavras. Mas, por descuido ou infelicidade dos demandados,
em uma das palavras, o desalinho se repete da mesma natureza. Naturalmente, uma
perícia poderá confirmar esta impressão obtida a olho nu, mas nem por isso irrelevante.
Embora este magistrado não possa fazer as vezes de perito, apesar da experiência na
área de informática antes do ingresso na magistratura, não se pode olvidar o que dispõe
o art. 138 do CPC: “O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e
circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes [grifei]; mas
deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento.”
Um juiz é juiz de seu tempo e trás consigo suas vivências e conhecimentos além
daqueles que constituem o senso comum de sua época. E é com base nesses
conhecimentos, devidamente instrumentalizados por sua formação jurídica, que forma
suas
convicções.
Assim, embora não caiba a este juízo atestar e dar certeza científica de que os
documentos foram produzidos na mesma impressora, como se perito fosse, não poderá
fingir-se de cego e dizer que não vê tal possibilidade, que se verifica muitíssimo
provável, por sinal, conforme argumentos já apresentados. Posteriormente, perícia
poderá
confirmar
ou
não
tal
impressão.
Prosseguindo, os mesmos indícios de que documentos abrangendo propostas e o próprio
contrato firmado entre a Administração e “vencedoras” da licitação foram impressos na
mesma impressora ou a partir de mesmo arquivo digital são encontrados em
praticamente todos os processos licitatórios trazidos com inicial, a exemplo do que salta
aos olhos às fls. 284 e 305, em que as peculiaridades dos caracteres indicam claramente
que os documentos foram produzidos na mesma impressora com jatos de tinta
desalinhados.
Os mesmos indícios se repetem nos documentos de fls. 340 e 343, correspondentes a
propostas de diferentes empresas, mas que nitidamente foram produzidos a partir do
mesmo arquivo digital, pois encontramos dois parágrafos com o mesmo desalinho na
tabulação
e
começando
pela
mesma
palavra
“informamos”.
Coisa semelhante ocorre com as propostas de fls. 479 e 481 em que, inclusive, o local
da assinatura é indicado como sendo Santa Maria e indica o endereço de seu escritório
naquela cidade, sendo que esse mesmo endereço é informado nos autos como sendo o
da empresa Alinutri, enquanto a Construtora Falcão teria endereço, na realidade, na
cidade de Novo Repartimento. Afinal, como é que empresas concorrentes num processo
licitatório indicam o mesmo endereço? Como se erra o próprio endereço e se indica o do
concorrente? Seria possível um ato falho dessa magnitude? Tenho que não.
A mesma “falha”, isto é dois parágrafos iniciados pelas mesmas palavras e com o
mesmo desalinho de tabulação são encontrados nas propostas de Alinutri e Falcão nos
vários processos licitatórios de que participaram. Cansativa e pouco produtiva sua
enumeração, afinal, os indícios de utilização do mesmo arquivo digital com simples
alteração de palavras e frases, formato de fontes e outras coisas, mas deixando passar
coincidências improváveis, como os erros apontados, se repetem ao longo dos vários
“processos
licitatórios”
apreendidos.
E, para finalizar, não por falta dessas improváveis semelhanças e coincidências sempre
presentes nos documentos apresentadas pelas três empresas demandadas, veja-se o
documento de fls. 1002 e o de 1018, correspondentes às declarações de inexistência de
impedimentos da demandada Comercial Alinutri Ltda. e Construtora Civil e
Terraplanagem Magalhães Ltda.: é que após a qualificação das empresas, a declaração
firmada é exatamente a mesma sem tirar nem por uma vírgula sequer, inclusive a frase
de construção incomum “DECLARA sob a pena de Lei” (incomum, porque geralmente
se diz “sob as penas da lei”), com palavras em caixa alta nos mesmos lugares, letras
maiúsculas nos mesmos lugares etc., estão presentes nas declarações das duas empresas
demandadas. Enfim, a única mudança na declaração é a qualificação, local e data de
assinatura. No mais tudo absolutamente igual. O que indica que as três demandadas
agiam em conluio ou são mera fachada para dar aparência de legalidade às licitações
realizadas
pelo
Município
de
Nova
Timboteua.
Na verdade, todas essas improváveis “coincidências” só passariam despercebidas se o
Ministério Público não houvesse tomado a iniciativa de investigar, o que provavelmente
não era esperado, pois grande parte dos indícios aqui apontados seriam facilmente
evitados. Bastou folhear os autos para constatar o aqui já mencionado.
1.2. Indício de criação de pessoas jurídicas para o fim específico de participar das
licitações
em
Nova
Timboteua.
Cabe lembrar que os fatos lembrados quanto às licitações para aluguel de caminhões,
máquinas pesadas e veículos destinados ao transporte escolar e são objeto de outra ação
de improbidade envolvendo as demandadas Construtora Magalhães e Construtora
Falcão, trazem igualmente “coincidências” improváveis que se constituem nos indícios
de direcionamento das licitações e envolvimento dos agentes políticos com as empresas
vencedoras dos certames. Naquela ação, os indícios apontados são:
O primeiro e clássico indício é a criação da requerida CONSTRUTORA CIVIL DE
TERRAPLANAGEM MAGALHÃES LTDA., com suposta sede na cidade de CapitãoPoço, menos de quinze dias antes do anúncio da licitação no Diário Oficial, consoante
documentos de fls. 65 e 71 nos autos 2011.1.000250-2, licitação esta vencida pela
demandada e que deu início à série de vitórias aqui questionada;
O segundo indício constitui-se no fato de que o advogado signatário do contrato social
da empresa, seja o requerido CÉSAR AUGUSTO ASSAD FILHO, segundo aquela
petição inicial, primo do Prefeito ANTONIO NAZARÉ ELIAS CORRÊA, e igualmente
contratado
pelo
Município
desde
o
ano
de
2005.
1.3. Indícios de ligação entre as empresas vencedoras e o Prefeito Municipal Antônio
Nazaré
Elias
Corrêa.
O terceiro indício de direcionamento constitui-se no fato de que uma dos caminhões
pertencentes à empresa AUTOPOSTO TIMBOTEUA LTDA., que tem como sócios um
irmão e uma cunhada do atual gestor, e já teve o próprio gestor municipal como seu
sócio, foi transferido para a empresa demandada CONSTRUTORA MAGALHÃES
LTDA;
Quanto ao contrato para fornecimento de transporte escolar em que a vencedora
igualmente consecutiva foi CONSTRUTORA FALCÃO LTDA., os documentos de fls.
62 daqueles autos fazem ver que um dos veículos usados é de propriedade de
CLÁUDIA DO SOCORRO PINHEIRO NETO, cunhada do Prefeito ANTONIO
NAZARÉ
ELIAS
CORREA.
1.4. Indícios de ausência de efetiva concorrência entre as empresas licitantes.
Primeiramente, na grande maioria dos processos de licitação, na modalidade convite, ao
longo dos anos, as três empresas demandadas são as únicas participantes, sagrando-se
uma
delas,
por
óbvio,
sempre
como
vencedora.
Já que todas têm sede fora do Município, não se vê razão pela qual não se estende o
convite
a
outras
empresas
até
de
municípios
mais
próximos.
Em segundo lugar, não é de estranhar os indícios de que as empresas Alinutri e Falcão
imprimam suas propostas muito provavelmente, como já demonstrado, em uma mesma
impressora e a partir do mesmo arquivo digital, afinal verifica-se uma intersecção das
empresas no que concerne seu quadro societário, onde o próprio documento apreendido
aponta a irregularidade pelo fato de a empresa Comercial Alinutri e Construtora Falcão
Ltda. terem o mesmo sócio diretor, afora outras irregularidades insanáveis.
Não bastasse isso, o demandado JOSÉ DÁRIO DAMASCENO LIMA ex-sócio da
demandada Construtora Falcão é o atual sócio da empresa Alinutri, que, por sua vez,
tem CARLOS EDUARDO MONTEIRO LOUREIRO como sócio, mas era quem
exercia o papel de procurador da demandada CONSTRUTORA FALCÃO LTDA.
A lógica é muito simples. Na modalidade convite, é necessário a participação de pelo
menos três licitantes. Se dois desses licitantes tem a mesma composição societário ou
apenas uma intersecção na pessoa de um dos sócios, especialmente sendo ele o sócio
diretor, é evidente que essas empresas não são concorrentes, mas meras figurantes, de
modo a formar número necessário à formação do número mínimo legal, para gerar a
aparência de legalidade. Se fosse só essa a irregularidade, só ela já geraria a nulidade de
todas as licitações na modalidade convite em que houve a participação de três licitantes,
sendo
duas
delas
a
Comercial
Alinutri
e
Construtora
Falcão.
Mesmo nessa análise perfunctória, já se verifica que somatória dos indícios apontam
claramente para grave situação de direcionamento dos processos licitatórios, e sugerem
mal
uso
e
desvio
de
dinheiro
público.
Diante de tal quadro, o Ministério Público no exercício de seu munus, verificando
indícios de irregularidades na administração da coisa pública, tem o dever de se
posicionar. Igual dever cabendo ao Judiciário, quando da apreciação das ações
propostas. E, diante de indícios de que os atos praticados não estão de acordo com o que
determinada a lei, não pode se eximir de adotar as medidas necessárias a assegurar que
o interesse público seja respeitado, bem como as medidas que importem em imediata
cessação
de
mais
danos
ao
erário.
Os indícios apontados acima, são o fumus boni juris (vestígios do direito à obtenção da
pretensão)
da
medida
pleiteada.
1.5. fracionamento e desrespeito aos limites da modalidade convite.
Basta olhar o quadro acima e se verificará que o valor limite de R$80.000,00 (oitenta
mil
reais)
previsto
no
artigo
23,
II,
'a'
da
Lei
8.666/93.
Além disso, nas licitações de 02/2011, 03/2011 e 04/2011, cujo objetivo era a vaga
“contratação de três veículos leves”, sem detalhamento de características, ou ao menos
dizer se são de duas ou quatro rodas, como ocorreu em todos as outras contratações de
veículos leves em anos anteriores, é evidente a ofensa ao fracionamento, pois, foram
feitos três licitações cada uma para contratar três veículos, cada contrato no valor de
R$75.600,00 (setenta e cinco mil e seiscentos reais). Evidente, pois, o fracionamento, já
que se feita a licitação dos nove veículos, o valor superaria oitenta mil reais e não seria
admissível
a
modalidade
convite.
Feriu-se, portanto a regra contida no §. 5º do art. 23 da Lei de Licitações: “§ 5o É
vedada a utilização da modalidade "convite" ou "tomada de preços", conforme o caso,
para parcelas de uma mesma obra ou serviço, ou ainda para obras e serviços da mesma
natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente ,
sempre que o somatório de seus valores caracterizar o caso de "tomada de preços" ou
"concorrência"[grifei], respectivamente, nos termos deste artigo, exceto para as parcelas
de natureza específica que possam ser executadas por pessoas ou empresas de
especialidade
diversa
daquela
do
executor
da
obra
ou
serviço.”
2. Do perigo na demora das medidas ou
periculum in mora.
2.1. Do pedido de afastamento dos demandados de seus cargos.
Diante de todo o quadro apontado, vislumbra-se uma coordenação de ações dos vários
demandados a possibilitar a criação de documentos, “correção” de erros que possam
evidenciar as ilegalidades praticadas além dos obstáculos opostos para a obtenção de
informações de caráter público, bem como o próprio resultado parcialmente infrutífero
da busca e apreensão dos processos de licitação determinada por este juízo. Resta claro,
o perigo para a instrução, com a criação documentos ou sua destruição pelos
demandados, especialmente porque em tais casos a prova é essencialmente documental.
É muito claro que desde o gestor municipal demandado ao servidor que é membro da
comissão de licitação, todos têm participação na confecção e concatenação dos atos
destinados
a
burlar
as
finalidades
dos
processos
licitatórios.
Exemplificando esse perigo, mas que ainda se confunde também com o vestígio do
direito, está o fato de que própria lista de processos apreendidos evidencia um vazio de
vários deles, por não terem sido encontrados. O fato de vários encontrarem-se com suas
folhas ainda não numeradas e não assinadas, com documentos dizendo o que precisa ser
“corrigido” demonstra que tais processos ainda se encontram em fabricação. Evidenciase, pois, mais uma vez que a permanência dos demandados nas mesmas funções e
cargos são sério risco para a instrução e para a continuação das investigações, que
sequer chegaram a ser totalmente frutíferas. Afinal, não há explicação para a não
apreensão nem a remessa espontânea dos documentos pleiteados pelo Ministério
Público, senão o desejo de interferir negativamente na instrução.
Não bastasse isso, foram igualmente apreendidos três pastas, cada qual com documentos
das três empresas demandadas, indicando possível estoque de documentos
rotineiramente usados nos processos de licitações para a confecção dos novos certames,
corroborando, pois, a impressão de que os processos licitatórios são criados dentro da
própria Administração Municipal, a exemplo dos indícios de que documentos oficiais e
propostas de diferentes empresas são impressos numa mesma máquina em alguns dos
casos.
Entendo, pois, que o pedido de afastamento do Ministério Público deva ser atendido,
tanto quando ao gestor municipal demandado, quando aos demais servidores.
Nesse
mesmo
sentido,
veja-se
o
que
já
decidiu
o
STJ:
“PEDIDO DE SUSPENSÃO DE MEDIDA LIMINAR. AFASTAMENTO DOS
CARGOS DE PREFEITO E VICE-PREFEITO. LESÃO À ORDEM PÚBLICA. A
norma do art. 20, parágrafo único, da Lei nº 8.429, de 1992, que prevê o afastamento
cautelar do agente público durante a apuração dos atos de improbidade administrativa,
só pode ser aplicada em situação excepcional. Hipótese em que a medida foi
fundamentada em elementos concretos a evidenciar que a permanência nos cargos
representa risco efetivo à instrução processual. Pedido de suspensão deferido em parte
para limitar o afastamento dos cargos ao prazo de 180 dias. [grifei]
Agravo regimental não provido.” (AgRg na SLS 1.397/MA, Rel. Ministro ARI
PARGENDLER, CORTE ESPECIAL, julgado em 01/07/2011, DJe 28/09/2011)
2.2.
Do
pedido
de
indisponibilidade
de
bens.
Vejo que o periculum in mora (perigo na demora da prestação jurisdicional, se
concedida apenas ao final do processo) está em que o erário público poderá não vir a ser
ressarcido na hipótese de condenação dos demandados, se medidas urgentes não forem
tomadas
desde
logo.
DECISÃO
Diante da exposição de motivos realizada, e já no sentido da jurisprudência do STJ e do
que determina o art. 20 da Lei 8.429/92, demonstrado o risco para a permanência dos
demandados em seus cargos, mas ciente de sua excepcionalidade, inclusive por
acarretar na prática suspensão de mandato eletivo, DEFIRO O PEDIDO DE
AFASTAMENTO DOS DEMANDADOS ANTÔNIO NAZARÉ ELIAS CORRÊA,
RAIMUNDO ANTÔNIO TAVARES LIMA, FRANCISCO CARLOS ALVES
PEREIRA, EDILENE DOS SANTOS SOUZA, RAIMUNDA DE SOUZA
CARVALHO, FRANCISCO CARLOS MENDONÇA E SILVA, SENIR
CRISÓSTOMO FERNANDES, FRANCINEY RICARDO LIMA DOS SANTOS,
MARIA HELENA SILVA DOS ANJOS, MARIA SUELY SOUZA DANTAS e
VINÍCIUS NAZARENO GARCIA DE LIMA, sem prejuízo de seus vencimentos.
Quanto ao gestor municipal, limito o afastamento ao prazo de cento e oitenta dias, prazo
que entendo suficiente à conclusão da instrução, se empecilhos não forem opostos pela
própria defesa dos demandados e não se vislumbre mais risco para a instrução do
processo.
Do mesmo modo, sem necessidade de fixação de prazo, por se tratarem de servidores
públicos não detentores de mandato eletivo, determino o afastamento dos demais
demandados mencionados no parágrafo anterior, até que, igualmente, pela evolução do
processo
não
haja
mais
risco
para
a
instrução
processual.
Decreto a indisponibilidade de todos os bens dos requeridos na presente ação.
Oficie-se à JUCEPA quanto às empresas requeridas, para que averbe a decretação da
indisponibilidade
de
suas
cotas
e
bens.
Oficie-se ao Tribunal de Contas dos Municípios para que remeta a este Juízo, no prazo
de quinze dias informações detalhadas acerca de informações sobre valores
efetivamente pagos às empresas demandadas na presente ação e/ou a seus sócios nos
anos
de
2005
a
2011.
Determino a quebra de sigilo bancário e fiscal dos requeridos, de modo que determino a
requisição de informações sobre movimentações financeiras e declarações de bens às
entidades e órgãos competentes, no período de 2005
a 2011.
Comunique-se desta decisão à Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Pará a
fim de providenciar a ciência às Serventias Judiciais e Extrajudiciais do Estado.
Vez que a determinação de afastamento não depende, para sua eficácia, da ciência dos
demandados, mas sim da comunicação ao ente público de onde se encontram afastados,
determino à comunicação da presente decisão ao Município de Nova Timboteua, na
pessoa de seu representante legal, de acordo com a ordem de substituição, portanto, na
pessoa do VICE-PREFEITO.
NOTIFIQUEM-SE os requeridos para apresentarem sua manifestação por escrito no
prazo de quinze dias, consoante dispõe o art. 17, §7°.
Expeça-se tudo quanto necessário ao cumprimento das medidas deferidas.
Ciência ao Ministério Público.
Decorrido o prazo para manifestação dos requeridos, certifique-se e venham os autos
conclusos.
Ante a natureza das provas nos presentes autos, determino a sua completa digitalização,
por medida de segurança.
Nova Timboteua, 12 de abril de 2012.
Carlos Magno Gomes de Oliveira
Juiz de Direito
Download

DECISÃO Por relatório, vez que não obrigatório, limito