UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO CARLOS ALBERTO DE SOUZA CABELLO RELAÇÕES INSTITUCIONAIS PARA O ENSINO DA NOÇÃO DE JUROS NA TRANSIÇÃO ENSINO MÉDIO E ENSINO SUPERIOR SÃO PAULO 2010 CARLOS ALBERTO DE SOUZA CABELLO MESTRADO ACADÊMICO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA RELAÇÕES INSTITUCIONAIS PARA O ENSINO DA NOÇÃO DE JUROS NA TRANSIÇÃO ENSINO MÉDIO E ENSINO SUPERIOR Dissertação submetida à Banca Examinadora da Universidade Bandeirante de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação Matemática. Orientador: Prof. Dra. TÂNIA MARIA MENDONÇA CAMPOS e Coorientadora Prof.ª Dra. MARLENE ALVES DIAS. SÃO PAULO 2010 Cabello, Carlos Alberto de Souza Relações Institucionais para o Ensino da Noção de Juros na Transição Ensino Médio e Ensino Superior. / Carlos Alberto de Souza Cabello. São Paulo: [s.n.], 2010. 163f. Il. ; 30 cm. Dissertação de Mestrado para a obtenção do título de Mestre em Educação Matemática. Programa de Pós Graduação em Educação Matemática da Universidade Bandeirante de São Paulo. Orientadora: Prof. Dra. Tânia Maria Mendonça Campos e Coorientadora Prof.ª Dra Marlene Alves Dias. À minha amada família, MARIÂNGELA, RAFAELA e MARIA EDUARDA. Em todas as minhas realizações, sempre presentes. AGRADECIMENTOS A DEUS, por ter me concedido mais uma oportunidade na vida. À PROFESSORA DOUTORA TÂNIA MARIA MENDONÇA CAMPOS e à PROFESSORA DOUTORA MARLENE ALVES DIAS, pelo carinho, dedicação e paciência com os quais orientou esta pesquisa. Fica muito difícil encontrar palavras que demonstrem meus agradecimentos a vocês. Ao PROFESSOR DOUTOR HERMÍNIO BORGES NETO, que participou da minha qualificação dando sugestões que permitiram melhorar o trabalho. Às queridas “professoras da Linha de Pesquisa Ensino e Aprendizagem”, PROFESSORA DOUTORA LULU, PROFESSOR DOUTOR ALESSANDRO e PROFESSORA DOUTORA VERA, pelos conhecimentos transmitidos de forma tão cuidadosa e comprometida ao longo de todo o programa. Não posso deixar de registrar meu carinhoso agradecimento. A todos os colegas do programa de Pós-Graduação em Educação Matemática da Universidade Bandeirante de São Paulo, companheiros de caminhada com quem muito aprendi. Agradeço, em especial, à minha esposa e às minhas filhas, por entenderem a minha falta em alguns momentos na preparação deste trabalho. A todos os professores do programa de Pós-Graduação em Educação Matemática da Universidade Bandeirantes de São Paulo, por todo o aprendizado e experiência que proporcionaram. RESUMO CABELLO, Carlos Alberto de Souza. Relações Institucionais para o ensino da noção de juros na transição Ensino Médio e Ensino Superior. 2010. 197f. Dissertação de Mestrado – Programa de Pós Graduação em Educação Matemática. Universidade Bandeirante de São Paulo, São Paulo. O objetivo deste trabalho é apresentar as possíveis relações institucionais para o ensino da noção de juros na transição Ensino Médio e Ensino Superior por meio de documentos oficiais, análise de livros didáticos e de alguns planos de ensino de universidades federais e particulares. Para o desenvolvimento da pesquisa escolheu-se como referencial central a abordagem antropológica de Chevallard e Bosch (1999), tendo como referenciais teóricos de apoio os trabalhos de Robert (1997), sobre os três níveis de conhecimentos esperados dos estudantes, e de Douady (1984; 1992), sobre articulações de domínios de quadros. Iniciamos a investigação a partir do trabalho de Bosch e Chevallard (1999), com intuito de fundamentar uma análise dos Parâmetros Curriculares do Estado de São Paulo, de três livros didáticos do Ensino Médio, dois do Ensino Superior e alguns planos de ensino de universidades federais e particulares. Analisamos o “topos” esperado do professor e do estudante. Elaboramos uma grade de análise para auxiliar a identificação dos ostensivos e não ostensivos nas tarefas apresentadas nos livros didáticos e planos de ensino. Essa grade de análise também propiciou condições de identificarmos os quadros numérico, algébrico e geométrico encontrados nas tarefas resolvidas e propostas. Na conclusão dessas análises identificamos pouca relação entre o conhecimento esperado do estudante diante das relações institucionais e livros didáticos, ou seja, os estudantes, por alguma razão, não apropriaram conhecimentos, tais como progressão aritmética, função afim, ao manipularem tarefas com juros simples e função exponencial, e noções de logaritmos, ao resolverem tarefas com o uso de conceitos de juros compostos. Percebemos que existe pouca coerência entre o que os estudantes trazem do Ensino Médio e o que é pedido e ensinado no Ensino Superior. Com poucas articulações entre os conhecimentos esperados e trazidos do Ensino Médio, não conseguem articular o aprendido na etapa escolar anterior para apropriar do novo conhecimento. Palavras-chave: Noções de juros, ostensivos e não ostensivos níveis de conhecimentos, domínio ou quadros. ABSTRACT CABELLO, Carlos Alberto de Souza. Institutional Relations for Teaching Concept of Interest in Transition School and Higher Education. 2010. 197f. Master Thesis – Graduate Program in Mathematics Education. Bandeirantes University of São Paulo, São Paulo. The aim of this paper is to present the possible institutional relationships to the teaching of the concept of interest in the transition and Higher Secondary Education by official documents, analysis of textbooks and teaching plans for some federal and private universities. To develop the research was chosen as a central reference anthropological approach Bosch and Chevallard (1999), having as theoretical support the work of Robert (1997) on the three levels of knowledge expected of students and Douady (1984, 1992 ) on areas of joint frames. We began this research from the work of Bosch and Chevallard (1999), in order to justify an analysis of the Curriculum of the State of Sao Paulo, three high school textbooks, two of Higher Education and some private education in federal and individuals. We analyze the "Topos” expected of the teacher and student. We developed a grid analysis to help identify the overt and not ostentatious in the tasks presented in textbooks and teaching plans. This grid of analysis also provided conditions for identifying the frames numerical, algebraic and geometric found and solved the tasks proposed. At the conclusion of this analysis we identified little relationship between knowledge expected of the student in the face of institutional relations and textbooks, or students for any reason not appropriated knowledge such as arithmetic progression, function in order to handle tasks with simple interest and exponential function and notions of logarithms to solve tasks using the concepts of compound interest. We realize there is little consistency between what students bring to school and what is required and taught in higher education with few links between the expected knowledge and brought high school. They can not articulate what they learned in school prior to step ownership of new knowledge. Keywords: Concepts of interest, and not ostentatious ostentatious, levels of knowledge, domain, or frames. LISTA DE TABELAS TABELA 1: TAREFAS ANALISADAS ....................................................................... 98 TABELA 2: OBRAS ANALISADAS NA PESQUISA .................................................. 110 TABELA 3: TAREFAS RESOLVIDAS E PROPOSTAS NA OBRA DE DANTE, 2008................................................................................................................... 122 TABELA 4: TAREFAS RESOLVIDAS E PROPOSTAS NA OBRA DE GIOVANNI E BONJORNO, 2005. ........................................................................................... 127 TABELA 5: TAREFAS RESOLVIDAS E PROPOSTAS NA OBRA DE XAVIER & BARRETO, 2005. .............................................................................................. 131 TABELA 6: TAREFAS RESOLVIDAS E PROPOSTAS NA OBRA DE SOBRINHO, 2000................................................................................................................... 136 TABELA 7: TAREFAS RESOLVIDAS E PROPOSTAS NA OBRA DE PUCCINI, 2008...................................................................................................................ERRO! INDICADO . SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 12 1 PROBLEMÁTICA, OBJETIVO E METODOLOGIA DA PESQUISA........................ 18 1.1 CONTEXTO DA PESQUISA ............................................................................. 18 1.2 PROBLEMÁTICA DA PESQUISA ..................................................................... 21 1.3 OBJETIVOS DA PESQUISA ............................................................................. 23 1.4 METODOLOGIA DA PESQUISA ...................................................................... 24 ABORDAGEM ANTROPOLÓGICA NA ANÁLISE DAS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS PARA O ENSINO DA NOÇÃO DE JUROS NA TRANSIÇÃO ENSINO MÉDIO E ENSINO SUPERIOR................................................................... 27 2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................ 27 2.2 REFERENCIAL TEÓRICO CENTRAL ............................................................... 29 2.3 AS NOÇÕES DE QUADRO E MUDANÇA DE QUADRO CONFORME DEFINIÇÃO DE DOUADY (1984, 1992) ........................................................... 41 2.4 OS TRÊS NÍVEIS DE CONHECIMENTO ESPERADOS DOS ESTUDANTES CONFORME DEFINIÇÃO DE ROBERT (1997, 1998)...................................... 42 2.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 44 O “TOPOS” DO ESTUDANTE E DO PROFESSOR NOS DOCUMENTOS OFICIAIS ......................................................................................................................... 45 3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................ 45 3.2 OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO MÉDIO (PCNEM) ........................................................................................................... 48 3.3 OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO MÉDIO (PCN+)............................................................................................................... 59 3.4 OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO MÉDIO (PCN+) – PROPOSTAS PARA ENSINO DE MATEMÁTICA FINANCEIRA ..... 59 3.5 A NOVA PROPOSTA CURRICULAR DO ESTADO DE SÃO PAULO.............. 62 3.6 ESTUDOS DE QUATRO PLANOS DE ENSINO DE UNIVERSIDADES PÚBLICAS E PRIVADAS .................................................................................. 68 3.7 ANÁLISE DO PLANO DE ENSINO DE DUAS UNIVERSIDADES FEDERAIS E DUAS UNIVERSIDADES PRIVADAS ............................................................ 69 2 3 3.7.1 ANÁLISE DO PLANO DE ENSINO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS (UFAM) ....................................................................... 70 3.7.2 Diretrizes curriculares do curso de Administração de Empresas .......... 70 3.7.3 Plano de ensino da Universidade Federal do Amazonas ...................... 71 3.7.4 Comentários e análises ......................................................................... 73 3.8 ANÁLISE DO PLANO DE ENSINO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL – INSTITUTO DE MATEMÁTICA – DEPARTAMENTO DE MATEMÁTICA PURA E APLICADA .................................................................. 74 3.8.1 4 5 Comentários e análises ......................................................................... 75 3.9 ANÁLISE DO PLANO DE ENSINO DAS FACULDADES DAS AMÉRICAS ..... 75 3.9.1 Comentários e análise .............................................................................. 77 3.10 PLANO DE ENSINO DA FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS – SÃO PAULO..... 77 3.10.1 Comentários e análises .......................................................................... 80 3.11 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 80 OS TIPOS DE TAREFAS SOBRE JUROS SIMPLES E COMPOSTOS QUE SUSTENTAM AS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS DO ENSINO MÉDIO E SUPERIOR ................................................................................................................ 82 4.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................ 82 4.2 AS FERRAMENTAS DE ANÁLISE UTILIZADAS NA CONSTRUÇÃO DA GRADE .............................................................................................................. 82 4.3 AS TAREFAS USUAIS SOBRE AS NOÇÕES DE JUROS SIMPLES E COMPOSTOS QUE ALIMENTAM AS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS TANTO PARA O ENSINO MÉDIO COMO PARA O ENSINO SUPERIOR .................... 97 4.4 A GRADE DE ANÁLISE .................................................................................... 98 4.5 FUNCIONAMENTOS DA GRADE: EXEMPLOS:............................................... 99 4.6 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 106 AS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS EXISTENTES PARA INTRODUÇÃO E DESENVOLVIMENTO DAS NOÇÕES DE JUROS SIMPLES E COMPOSTOS NA TRANSIÇÃO ENSINO MÉDIO E ENSINO SUPERIOR ..................................... 108 5.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................ 108 5.2 ANÁLISE DA OBRA DE DANTE ET AL. (2008) ................................................ 112 5.2.1 Comentários e análise .............................................................................. 112 5.2.2 O “topos” do professor e do estudante .................................................. 118 5.3 ANÁLISE DA OBRA DE GIOVANNI & BONJORNO ET AL. (2005).................. 124 5.3.1 Comentários e análise .............................................................................. 123 5.3.2 O “topos” do professor e do estudante .................................................. 125 5.4 ANÁLISE DA OBRA DE XAVIER E BARRETO ET AL. (2005) ........................ 127 5.4.1 5.5 O “topos” do professor e do estudante .................................................. 130 ANÁLISE DA OBRA DE SOBRINHO ET AL. (2000) ........................................ 131 5.5.1 Comentários e análise ........................................................................... 131 5.5.2 O “topos” do professor e do estudante .................................................... 135 5.6 ANÁLISE DA OBRA DE PUCCINI ET AL. (2008) ............................................. 138 5.6.1 Comentários e análise .............................................................................. 138 5.6.2 O “topos” do professor e do estudante .................................................. 143 5.7 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 145 CONSIDERAÇÕES FINAIS E PERSPECTIVAS FUTURAS.......................................... 148 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................ 152 ANEXOS ANEXO 1: DIRETRIZES CURRICULARES DO CURSO DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS ............................................................................................................... 157 ANEXO 2: PLANO DE AULAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS (UFAM) ...................................................................................................................... 159 ANEXO 3: PLANO DE AULAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL (UFRGS) ............................................................................................................ 160 ANEXO 3 (CONT.)............................................................................................................ 161 ANEXO 4: PLANO DE AULAS DA FACULDADE DAS AMÉRICAS ................................ 162 ANEXO 5: PLANO DE AULAS DA FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS DE SÃO PAULO (FGV-SP) ................................................................................................................... 163 12 INTRODUÇÃO Em nossa prática, trabalhando com o Ensino Superior observamos que, em geral, alguns estudantes não se apropriam de certos conhecimentos desenvolvidos no Ensino Médio, o que é necessário para o desenvolvimento adequado do processo de ensino e aprendizagem. Quando consideramos, mais especificamente, a Matemática Financeira e, em particular, as noções de juros simples e compostos, temos a sensação que nada foi trabalhado sobre essas noções nas etapas anteriores da escolaridade. Nas propostas institucionais as noções de juros simples e compostos são abordadas no Ensino Fundamental e revisitadas no Ensino Médio. Além disso, em nosso país, considerando as taxas de juros, as correções mensais de contas a pagar e impostos, os cheques especiais e as vendas a prazo, entre outros exemplos, parece-nos importante para os estudantes que terminam o Ensino Médio dispor das ferramentas matemáticas necessárias para efetuar esses cálculos e assim exercerem adequadamente a cidadania. Dessa forma, nesta pesquisa nosso objetivo é estudar as possíveis relações institucionais trabalhadas no Ensino Médio, quando se consideram as noções de juros simples e compostos, de modo a identificar os conhecimentos prévios que podem ser pelo menos mobilizados pelos estudantes que iniciam o curso de Administração no Ensino Superior. Ou seja, o que se desenvolve no Ensino Médio sobre a noção de juros simples e compostos pode servir de apoio para o desenvolvimento da disciplina de Matemática Financeira nos cursos universitários de Administração de Empresa. Iniciamos este estudo a partir do seguinte questionamento: 13 1. Quais os conhecimentos prévios sobre a noção de juros simples e compostos são desenvolvidos no Ensino Médio? 2. Quais as articulações entre esses conhecimentos e os conhecimentos matemáticos necessários para o controle e justificativa das técnicas associadas às noções de juros simples e compostos? 3. Qual o papel esperado do professor no trabalho com essas noções? 4. Qual o papel esperado dos estudantes no trabalho com essas noções? 5. Quais as indicações das Diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de graduação em Administração para o ensino da noção de juros simples e compostos para o curso de Administração? 6. Existe uma coerência entre o que é proposto para o Ensino Médio e Superior, isto é, os conhecimentos prévios supostos disponíveis são trabalhados no Ensino Médio conforme a expectativa do Ensino Superior? O referencial teórico central escolhido para sustentar as análises propostas e responder as questões acima são a Teoria Antropológica do Didático de Chevallard (1992), Chevallard (1994) e Bosch e Chevallard (1999), que estuda, mais especificamente, as relações institucionais que sobrevivem atualmente quando se trabalha com as noções de juros e simples e compostos tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior. Por outro lado, para melhor compreender as organizações matemáticas e didáticas encontradas, recorremos ainda às noções de quadros e mudanças de quadros segundo definição de Douady (1984, 1992) e níveis de conhecimento esperados dos estudantes, conforme definição de Robert (1997). Escolhido o referencial teórico, dividimos o trabalho de coleta dos dados em três fases que correspondem à construção da ferramenta de análise dos livros didáticos, o estudo das relações institucionais esperadas e existentes para o trabalho com as noções de juros simples e compostos no Ensino Médio e na 14 sequência realizamos o mesmo estudo para o Ensino Superior, conforme descrição das fases apresentadas abaixo. Na primeira fase, construímos uma grade de análise, inspirada naquela desenvolvida por Dias (1998) em sua tese, que estuda os problemas da articulação de pontos de vista cartesiano e paramétrico no ensino de Álgebra Linear e que serviu de ferramenta para a análise dos livros didáticos tanto de Ensino Médio como do Ensino Superior. Na segunda fase, analisamos as relações institucionais esperadas e existentes, isto é, quais as organizações matemáticas e didáticas a que, em geral, os estudantes se submetem quando se trabalha com as noções de juros simples e compostos no Ensino Médio? Esse conceito é articulado com outras noções matemáticas desenvolvidas nesta mesma etapa da escolaridade. Essas análises, quando se considera o Ensino Médio, foram desenvolvidas por meio do estudo dos documentos oficiais, em que são apresentadas as expectativas institucionais ou relações institucionais esperadas para o desenvolvimento das noções matemáticas a serem trabalhadas no Ensino Médio, e de alguns livros didáticos indicados pelo Programa Nacional do Livro Didático do Ensino Médio (PNLEM, 2009), e que, para efeito de análise, consideramos relações institucionais existentes, isto é, as organizações matemáticas e didáticas a que, em geral, os estudantes se submetem atualmente quando passam por essa etapa escolar. Na terceira fase, analisamos as relações institucionais esperadas e existentes para o trabalho com a noção de juros simples e compostos nos cursos de Administração no Ensino Superior. Essas análises foram realizadas via planos de ensino de duas universidades públicas e duas faculdades privadas para as relações institucionais esperadas e livros didáticos indicados na bibliografia básica dos mesmos cursos para as relações institucionais existentes, ou seja, o mesmo tipo de análise foi conduzido para 15 identificar algumas das organizações matemáticas e didáticas que sobrevivem atualmente tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior. Numa quarta fase realizamos a construção de uma grade de análise, inspirada na grade de Dias (1998), para o exame das relações institucionais existentes. Observamos que a grade de análise permite identificar as tarefas usuais que sobrevivem atualmente no processo de ensino e aprendizagem e estudar as práticas institucionais privilegiadas nesse processo. Em uma quinta fase fizemos um estudo das relações institucionais existentes por meio da grade de análise construída com esse objetivo, via livros didáticos indicados acima, tanto para o Ensino Médio como para o Ensino Superior. E em uma última fase elaboramos uma análise das similaridades e diferenças entre os resultados encontrados nos itens 3 e 4, ou seja, nos estudos das relações institucionais esperadas e existentes tanto para o Ensino Médio como para o Ensino Superior. Os resultados deste estudo são aqui apresentados da seguinte forma. No capítulo 1 caracterizamos nosso trabalho apresentando o contexto da pesquisa, sua problemática e a metodologia específica empregada para o seu desenvolvimento. No capítulo 2 apresentamos o referencial teórico da pesquisa explicitando as noções que servem de ferramenta de análise quando da construção da grade de análise. O capítulo 3 utilizou a noção de “Topos” do estudante e do professor introduzida por Chevallard (1997) para examinar os documentos oficiais que correspondem às relações institucionais que se espera sejam trabalhadas por professores e estudantes do Ensino Médio e do Ensino Superior. Os documentos analisados são: os Parâmetros Curriculares Nacionais, a Nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo quando se consideram o Ensino 16 Médio, as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação de Administração, os planos de ensino de duas universidades públicas e duas faculdades privadas para o Ensino Superior. No capítulo 4, apresentamos a grade de análise construída para identificar os tipos de tarefas e as respectivas técnicas que constituem a prática atual para o desenvolvimento da noção de juros simples e compostos tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior. No capítulo 5 apresentamos os resultados das análises sobre as diferentes propostas de trabalho com a noção de juros simples e compostos tanto para o Ensino Médio como para o Ensino Superior. Essas análises se apoiam na grade apresentada no capítulo 4, e, além de permitir qual o trabalho privilegiado quando se introduz a noção de juros simples e compostos no Ensino Médio e Superior, possibilita a comparação entre as relações institucionais esperadas e existentes para uma mesma etapa escolar e a identificação dos conhecimentos prévios que podem ser considerados pelo menos mobilizável para os estudantes que ingressam no Ensino Superior. Nas considerações finais constatamos que existe uma preocupação institucional em propor mudanças tanto para “topos” do professor como para o “topos” dos estudantes, em que o primeiro deve desenvolver seu trabalho como orientador de tarefas que permitam aos estudantes encontrar suas próprias soluções, a partir de seus conhecimentos prévios e procurando novas situações que lhes deem autonomia para controlar a aprendizagem, sendo essa uma competência importante para sua atuação na sociedade e no mundo do trabalho. Mas essa nova relação institucional não é simples de alcançar e conduz a necessidade de pesquisas e propostas de cursos que auxiliem os professores a desenvolver diferentes tipos de atividades, em particular, as situações contextualizadas, como propõem os documentos oficiais para motivar esse trabalho. 17 Observamos aqui que, mesmo considerando importante esse tipo de trabalho a ser desenvolvido pelo professor, os documentos oficiais pouco ajudam, pois não trazem orientações mais específicas sobre como desenvolver esse trabalho. Finalmente, ressaltamos que os livros didáticos podem auxiliar professores na proposta de novas tarefas e na articulação de diferentes conhecimentos e os estudantes na organização de seus estudos. Ressaltamos a importância e interesse do caderno da Nova Proposta do Estado de São Paulo por ter sido construído sob a óptica de apresentar exemplos de situações contextualizadas, o qual pode ser de grande valia para os professores. Entretanto, vale observar que neles os conhecimentos prévios esperados, como disponíveis são os conceitos de função afim e progressão aritmética para solucionar tarefas que envolvem juros simples e função exponencial e progressão geométrica, para resolver tarefas que envolvem juros compostos. Tais conhecimentos supostos pelo menos mobilizáveis devem ser identificados enquanto tal, pois podem dificultar o trabalho dos professores quando isso não ocorrer, ou seja, os materiais didáticos analisados são ferramentas importantes que precisam ser avaliadas e trabalhadas por professores e estudantes em um mesmo compasso, para que as expectativas institucionais possam se realizar. 18 Capítulo 1 PROBLEMÁTICA, OBJETIVO E METODOLOGIA DA PESQUISA 1.1 CONTEXTO DA PESQUISA Após me formar em Administração de Empresas com ênfase em Análises de Sistemas, trabalhei em um Banco Comercial atuando como Analista de Suporte a Sistemas Financeiros, e nessa profissão senti que as necessidades da Matemática eram grandes, mas o conhecimento desenvolvido na escola pouco me auxiliavam no desenvolvimento de minhas tarefas profissionais. Em função das necessidades do Banco, fui convidado a envolver-me em Sistemas Financeiros e Sistemas Informatizados. Para melhorar meu desempenho fiz uma Especialização Pedagógica com ênfase em Matemática. A partir de 1992, iniciei minha carreira como professor em uma Escola Técnica, na qual ministrava aulas de Matemática e Administração Comercial. Nesse contexto, algumas inquietações foram surgindo em minha prática. Esse novo tipo de trabalho me levou ao curso de especialização em Psicopedagogia, pois procurava entender as razões das dificuldades dos estudantes e como poderia amenizá-las. Nessa época, tive a oportunidade de ingressar na Docência do Ensino Superior, tendo a tarefa de trabalhar com Matemática Financeira no Curso de Administração. Reflexo da crise que as Instituições Financeiras enfrentavam naquela época, acabei por ficar somente na carreira docente. Em 2008, iniciei o mestrado em Educação Matemática, e, em função do meu trabalho no curso de Administração com a disciplina de Matemática Financeira, propus um projeto que pudesse me auxiliar a compreender as dificuldades encontradas pelos estudantes do curso de Administração em relação às noções de juros simples e compostos. 19 Como não trabalho essa disciplina no Ensino Médio, consideramos interessante a possibilidade de inserir essa proposta no projeto Capes – Cofecub que vem sendo desenvolvido por professores da Uniban, mais especificamente as questões da transição entre o Ensino Médio e o Ensino Superior. Nesse projeto, as questões associadas à transição entre o Ensino Médio e Superior referem-se preferencialmente à Matemática que se trabalha nos primeiros anos dos cursos de Bacharelado e Licenciatura em Matemática, o que difere em relação ao trabalho a ser desenvolvido com os estudantes dos cursos de Administração de Empresas, em que a Matemática funciona como ferramenta explícita para desenvolver e explicar questões financeiras. Outros estudos vêm sendo realizados por pesquisadores internacionais, destacamos os trabalhos franceses de Artigue (2004) e Gueudet (2008), que são pesquisadores com os quais estamos desenvolvemos o projeto de transição. Em seu artigo de 2004, Artigue afirma que para as carreiras científicas existem muitos desafios que indicam a necessidade da atenção dos pesquisadores de Educação Matemática: massificação do ensino, defasagem em relação às mudanças que se efetuaram no secundário e que não ocorre no universitário e a evolução das novas tecnologias que afetam tanto as práticas matemáticas como a ação didática. Observamos aqui que, mesmo não se tratando de uma carreira científica, o curso de Administração de Empresas enfrenta esse mesmo problema, e a questão da inserção das novas tecnologias é uma das necessidades dos estudantes, uma vez que no mercado profissional elas são dominantes, em particular, as calculadoras financeiras e as planilhas tipo Excel. Além disso, em Artigue (2004) notamos que a autora, ao estudar os trabalhos sobre a aprendizagem de Matemática no nível universitário, mostra a evolução dos mesmos e considera que eles colocam em evidência as questões sobre a articulação de conhecimentos e representações, da flexibilidade na aprendizagem, 20 da crescente consideração das abordagens antropológicas e socioculturais e do desenvolvimento de pesquisas sobre novos domínios ou setores de formação. Essas novas questões são importantes para a nossa pesquisa, pois nela tentamos compreender quais as propostas institucionais desenvolvidas no Ensino Médio e Superior para diferentes tipos de instituições e verificar como esse trabalho pode auxiliar professores e estudantes dessas duas etapas escolares a melhor compreender e utilizar seus conhecimentos sobre as noções de juros simples e compostos. Observamos ainda que Gueudet (2008) considera que é possível analisar as questões ligadas à transição entre o Ensino Médio e Superior de diferentes formas, a saber: sobre os modos de pensar, sobre as organizações de conhecimentos, sobre as linguagens de modos de comunicação e sobre as instituições. No nosso trabalho nos centramos particularmente no estudo dos modos de comunicação e nas matemáticas praticadas nas instituições. Ou seja, tratamos a questão da comunicação observando as diferenças entre os sinais e os discursos utilizados no Ensino Médio e o que se espera no Ensino Superior, e como as novas regras de comunicação impõem um trabalho que ultrapassa a simples determinação do resultado, mas é preciso discuti-lo e justificar seu impacto. No que se refere às práticas das instituições, escolhemos o estudo das propostas institucionais via documentos oficiais e livros didáticos para o Ensino Médio e Superior. Acreditamos que o estudo comparado das propostas institucionais para o Ensino Médio e Superior, que corresponde às relações institucionais esperadas, e a análise dos livros didáticos indicados para essas duas etapas escolares podem auxiliar a compreender tanto as novas regras de comunicação como as diferenças que se impõem quando da transição entre o Ensino Médio e Superior, ou seja, escolhemos a Teoria Antropológica do Didático como central para a realização desse trabalho. Observamos ainda que ao iniciar nosso trabalho, fizemos uma pesquisa das dissertações e teses dos últimos dez anos e encontramos apenas o trabalho de Nascimento (2004), cujo objetivo é identificar o que sabem os 21 estudantes e o que pensam os professores do Ensino Médio a respeito da Matemática Financeira nessa etapa da escolaridade. Isso mostra que existem poucos estudos sobre as questões associadas à Matemática Financeira, em particular, quando se considera a transição entre o Ensino Médio e Superior e mais especificamente para um domínio diferente da Matemática, ou seja, o curso de Administração de Empresas, no qual a Matemática serve de ferramenta explícita para o cálculo dos resultados associados ao mercado financeiro. Apresentado o contexto da pesquisa, passamos à descrição da problemática. 1.2 PROBLEMÁTICA DA PESQUISA Nesta pesquisa procura-se identificar, por meio do estudo documental das relações institucionais esperadas e existentes, como estão sendo trabalhadas as noções de juros simples e compostos na transição entre o Ensino Médio e Superior. Observamos que este estudo pode auxiliar na proposição de novas formas de comunicação e linguagem, assim como de novos tipos de tarefas e técnicas, que poderão auxiliar professores e estudantes, tanto do Ensino Médio como do Ensino Superior, a melhor desenvolver seu papel ao trabalharem com a noção de juros simples e compostos. Ressaltamos que é importante para os estudantes dos cursos de Administração de Empresas que eles tenham um discurso coerente que explique e justifique os resultados encontrados. Portanto, é preciso que os estudantes de Administração de Empresas, ao terminarem o curso universitário, sejam capazes de utilizar seus conhecimentos sobre as questões de Matemática Financeira em que as noções de juros simples e compostos, em particular de juros compostos, serão objetos de reflexão diária para a tomada de decisões. Ressaltamos ainda que, embora em proporção menor, o mesmo ocorre com os estudantes do Ensino Médio, que precisam da noção de juros compostos para ao 22 menos exercerem a cidadania, uma vez que o cotidiano exige o domínio desse conhecimento para a tomada de decisão, pelo menos, para seus gastos pessoais. Dessa forma, consideramos que é importante o trabalho com as diferentes ferramentas matemáticas que possibilitam compreender as noções de juros simples e compostos no Ensino Médio, e que é preciso saber que conhecimentos sobre essas noções foram desenvolvidos nessa etapa escolar e, ainda, se os mesmos podem servir de apoio para o estudo de Matemática Financeira no Ensino Superior, isto é se desejamos trabalhar de forma articulada precisamos identificar as ferramentas que temos a nossa disposição. Para isso, partimos da questão enunciada abaixo, que possibilitou uma primeira reflexão e o questionamento mais específico em função do desenvolvimento da pesquisa. O estudo das práticas institucionais esperadas e existentes para o trabalho com a noção de juros simples e compostos na transição entre o Ensino Médio e Superior permite identificar uma tendência que permita dar significado à sua aprendizagem? Entendam-se aqui por práticas institucionais esperadas e existentes as propostas institucionais em relação aos diferentes tipos de tarefas e técnicas que são consideradas como conhecimentos a serem desenvolvidos nas instituições tanto de Ensino Médio como de Ensino Superior visando à aprendizagem e aplicação das noções de juros simples e compostos. A partir desse questionamento consideramos que o trabalho desenvolvido no Ensino Médio pode servir de apoio para a introdução da Matemática Financeira nos cursos de Administração de Empresas e que em função disso no Ensino Superior é preciso mostrar a relação entre o que foi desenvolvido no Ensino Médio, o que pode ser utilizado da mesma forma e os novos modos de funcionamento em que se consideram os novos modos de pensar, as novas linguagens, as novas formas de comunicação e as novas expectativas institucionais que estão associadas às novas práticas com a introdução das novas tecnologias. 23 Dessa forma, nesta pesquisa procuramos compreender como os conhecimentos associados às noções de juros simples e compostos desenvolvidos no Ensino Médio podem ser considerados pelo menos como mobilizáveis quando se fazem necessários na disciplina de Matemática Financeira para os cursos de Administração de Empresas no Ensino Superior. Delineada a problemática da pesquisa, descrevemos abaixo o objetivo da mesma. 1.3 OBJETIVOS DA PESQUISA O objetivo desta pesquisa é identificar por meio da análise documental as expectativas institucionais para o trabalho com as noções de juros simples e compostos na transição entre o Ensino Médio e Superior quando se considera a disciplina de Matemática Financeira para os cursos de Administração de Empresas. Em função desse objetivo, os objetivos específicos são: 1. A identificação das relações institucionais esperadas do ponto de vista das organizações matemáticas, didáticas e pedagógicas propostas tanto para o Ensino Médio como para o Ensino Superior. 2. A identificação das relações institucionais existentes, ou seja, das propostas de trabalho com as noções de juros simples e compostos que sobrevivem atualmente, tanto para o Ensino Médio como para o Ensino Superior. 3. Verificar se existe coerência entre as relações institucionais esperadas e existentes e qual a possibilidade do trabalho a ser efetuado na disciplina de Matemática Financeira dos cursos de Administração de Empresas do Ensino Superior se apoiar nos conhecimentos que se supõem tenham sido trabalhados e fazem parte da estrutura cognitiva dos estudantes que ingressam no Ensino Superior. Apresentados os objetivos da pesquisa passamos à metodologia utilizada para executá-la. 24 1.4 METODOLOGIA DA PESQUISA Escolhemos o método da pesquisa documental para desenvolver esta pesquisa, uma vez que nosso objetivo é identificar as expectativas institucionais para o trabalho com as noções de juros simples e compostos, tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior, e verificar a possibilidade de utilizar os conhecimentos desenvolvidos no Ensino Médio pelo menos como conhecimentos prévios mobilizáveis quando da introdução da disciplina de Matemática Financeira nos cursos de Administração de Empresas no Ensino Superior. Para isso, utilizamos os documentos oficiais para o Ensino Médio: Diretrizes Curriculares para o Ensino Médio (1998), Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (2000, 2002) e Nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo (2008). Para o Ensino Superior pesquisamos as Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Administração de Empresas (Resolução n.º 04, de 13.07.2005) e planos de ensino de quatro universidades, sendo dois de universidades federais: Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Analisamos também o plano de ensino da Fundação Getúlio Vargas (FGVSP) – Escola de Administração de Empresas de São Paulo e Faculdade das Américas. Esses documentos permitem a análise das relações institucionais esperadas. As relações institucionais existentes foram analisadas por meio de livros didáticos indicados no Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio (PNLEM – 2009), e as obras escolhidas para análise foram: Matemática, volume único, de Luiz Roberto Dante (2008) avaliado e novamente aprovado pelo Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio (PNLEM, 2009), que, segundo os avaliadores, traz uma abordagem inovadora dos conteúdos a serem trabalhados no Ensino Médio. 25 Com o mesmo critério escolhemos a segunda obra, Matemática aula por aula, de Claudio Xavier da Silva e Benigno Barreto Filho, et al. (2005), terceiro ano, também reavaliada e aprovada pelo PNLEM (2009) e que trata explicitamente o desenvolvimento histórico da matemática financeira. Ainda em relação ao Ensino Médio, selecionamos a obra Matemática completa, de José Ruy Giovanni e José Roberto Bonjorno, et al. (2005), primeiro ano, que também compõe a lista dos livros analisados e aprovados pelo PNLEM (2009) e que propõe exemplos de situações contextualizadas. Para a análise no Ensino Superior, as obras selecionadas referem-se às sugeridas nos Planos de Ensino, aos quais tivemos acesso. A primeira obra escolhida é Matemática financeira, de José Dutra Vieira Sobrinho, et al. (2000), em que percebemos que na abordagem proposta existe pouca preocupação de justificar as técnicas desenvolvidas por meio de tecnologias que mostram a possibilidade para o cálculo das diferentes aplicações financeiras, em particular, quando se trabalha com a noção de juros compostos. A segunda obra, Matemática financeira, de Abelardo de Lima Puccini, et al. (2008). O estudo foi desenvolvido em seis fases: 1. Estudo dos trabalhos de pesquisa existentes, no contexto brasileiro, francês e outros, sobre a problemática em questão, ou seja, a transição entre o Ensino Médio e Superior, em particular, quando se considera o domínio da Matemática Financeira e mais especificamente às noções de juros simples e compostos. 2. Escolha e estudo do referencial teórico adotado como ferramenta de análise para a pesquisa. 3. Estudo das relações institucionais esperadas para a introdução das noções de juros simples e compostos, por meio da ferramenta didática “topos” do professor e do estudante, via documentos oficiais tanto para o Ensino Médio como para o Ensino Superior. 26 4. Construção de uma grade de análise, inspirada na grade de Dias (1998), par análise das relações institucionais existentes. Observamos que a grade de análise permite identificar as tarefas usuais que sobrevivem atualmente no processo de ensino e aprendizagem e estudar as práticas institucionais privilegiadas nesse processo. 5. Estudo das relações institucionais existentes por meio da grade de análise construída com esse objetivo via livros didáticos indicados acima, tanto para o Ensino Médio como para o Ensino Superior. 6. Análise das similaridades e diferenças entre os resultados encontrados nos itens 3 e 4, ou seja, nos estudos das relações institucionais esperadas e existentes tanto para o Ensino Médio como para o Ensino Superior. Apresentados o contexto, a problemática, o objetivo e a metodologia da pesquisa, relatamos no próximo capítulo o referencial teórico que sustenta as análises propostas. 27 Capítulo 2 ABORDAGEM ANTROPOLÓGICA NA ANÁLISE DAS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS PARA O ENSINO DA NOÇÃO DE JUROS NA TRANSIÇÃO ENSINO MÉDIO E ENSINO SUPERIOR 2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS Sendo o objetivo deste trabalho estudar as possíveis relações institucionais tratadas no Ensino Médio, quando se reputam as noções de juros simples e compostos, de forma a identificar os conhecimentos prévios que podem ser pelo menos mobilizados pelos estudantes do curso de Administração que iniciam o Ensino Superior, escolhemos como referencial teórico central a Teoria Antropológica do Didático de Chevallard (1992, 1994, 1996) e Bosch e Chevallard (1999). Essa teoria permite identificar as diferentes organizações para a introdução e o desenvolvimento de um conceito matemático, no nosso caso, a noção de juros simples e compostos quando se considera a transição entre o Ensino Médio e Superior, em particular, quando se trabalha com essa noção nos cursos de Administração. Partimos assim da identificação das relações institucionais, e, como já anunciado na introdução, distinguimos as relações institucionais esperadas, que aqui são analisadas via documentos oficiais, em que observamos as diferentes abordagens propostas para o trabalho com a noção de juros simples e compostos, tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior, e as relações institucionais existentes, para as quais utilizamos os livros didáticos indicados pelo Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio PNLEM (2009), caderno do aluno e do professor (2008), quando se considera mais especificamente a Nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo, 1 livros didáticos indicados na bibliografia básica para os cursos de Administração dos planos de ensino de duas universidades federais (Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Instituto de Matemática – 1 Nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo: um conjunto de documentos dirigidos aos professores da Rede Pública do Estado de São Paulo. 28 Departamento de Matemática Pura e Aplicada) e Universidade Federal do Amazonas – Departamento de Administração) e duas Faculdades Privadas de São Paulo (Faculdade das Américas – Curso Administração de Empresas) e Fundação Getulio Vargas. (IMQ – Departamento de Informática e de Métodos Quantitativos aplicados à Administração – FGV-EAESP). As universidades escolhidas correspondem àquelas em que tivemos acesso aos planos de ensino. Como já anunciamos acima, essas análises estão fundamentadas na Teoria Antropológica do Didático (TAD), de Chevallard (1992, 1994, 1996) e de Bosch e Chevallard (1999). Portanto, na sequência apresentamos uma breve discussão sobre a Teoria Antropológica do Didático e sua evolução. Chevallard (1992) posiciona o ensino no campo da antropologia do conhecimento ou antropologia do ensino da matemática, que corresponde ao subcampo antropologia da matemática, ou seja, o estudo do homem em confronto com a matemática. Esse posicionamento conduz a uma expansão do quadro escolar, uma vez que a didática está densa em toda a matemática ou ainda toda atividade matemática supõe uma atividade de estudo. Isso conduz a conceber a didática da matemática como a ciência do estudo e da ajuda ao estudo das questões de matemática. Para isso, Chevallard (1992) parte do princípio de “que tudo é objeto”, distinguindo dois tipos de objeto específicos: as instituições (I), as pessoas (X) e suas posições nas instituições. Dessa forma, ele considera que as pessoas contribuem para a existência das instituições, e o conhecimento e o saber podem ser vistos como uma forma de organização. Isso lhe permite conceber a noção de relação entre o que ele chama de elementos primitivos da Teoria Antropológica do Didático: instituição (I), objeto do saber (O) e as pessoas (X), conforme CHEVALLARD, 1992, p. 86-87, apud COSTA, 2008, p. 8. No caso particular do nosso estudo, as pessoas são os professores e os estudantes que compõem as instituições de Ensino Médio e Superior, em particular aqueles que contribuem para a existência dessas instituições e que participam do processo de transição entre elas. O objeto do saber é a noção de juros simples e compostos, e procuramos identificar qual a relação das pessoas e instituições com esse objeto do saber. 29 Lembramos que Chevallard (1992) considera a relação entre o objeto do saber (O) e os outros elementos de sua teoria, isto é, instituição (I) e as pessoas (X). Isso lhe permite introduzir as instituições, os objetos do saber e as pessoas como elementos primitivos que compõem a Teoria Antropológica do Didático (TAD), e a partir deles considerar a questão das relações existentes entre esses elementos por meio de uma forma que ele mesmo considera como quase axiomática. Sem ser exaustivo, na sequência fazemos uma breve descrição dos principais elementos da teoria antropológica do didático que servem de ferramenta para a nossa pesquisa e que dessa forma são considerados como parte do que denominamos referencial teórico central. 2.2 REFERENCIAL TEÓRICO CENTRAL No desenvolvimento deste estudo, utilizamos como fonte para o nosso referencial teórico central o trabalho desenvolvido por Bosch e Chevallard (1999) sob o título A sensibilidade das atividades matemáticas aos ostensivos – objeto de estudo e problemática, que trata das atividades matemáticas, de sua composição enquanto materiais manipuláveis usados nas atividades matemáticas e em termos de conceitos, ideias e representações. Iniciamos com as noções de tarefas, técnicas, tecnologias e teorias que nos permitem identificar as diferentes organizações do saber, denominadas por Bosch e Chevallard (1999) de organizações praxeológicas, ou seja, as organizações que permitem modelar as práticas sociais, seus componentes, sua evolução e seu produto. Segundo os autores, a palavra praxeologia salienta a estrutura da organização tarefa (T), técnica ( ), tecnologia ( ) e teoria ( ). Essa palavra composta da palavra grega práxis, que significa “prática” e que envia ao bloco prático técnico [tarefa (T), técnica ( )], e da palavra grega logos, que significa “discurso fundamentado” e que envia ao bloco tecnológico-teórico [tecnologia ( ) e teoria ( )]. Os autores consideram ainda que o bloco [tarefa (T), técnica ( )] está associado ao saber-fazer e o bloco [tecnologia ( ) e teoria ( )], ao saber. 30 Sendo assim, essas organizações auxiliam a compreender as diferentes propostas para o ensino e aprendizagem de uma determinada noção matemática, no nosso caso a noção de juros simples e compostos, isto é, qual o papel do saberfazer e nas práticas sociais existentes. Para justificar nossas escolhas e melhor compreender a proposta de Bosch e Chevallard (1999), apresentamos a seguir um breve histórico sobre a evolução da didática da matemática e da teoria antropológica do didático, segundo esses autores. Eles utilizam duas definições de “didática da matemática” apresentada por Brousseau em dois momentos diferentes para mostrar que a didática evolui do estudo das atividades de ensino, conforme Brousseau (1984), para o estudo das condições de difusão dos saberes matemáticos úteis para as sociedades e para as instituições da humanidade, segundo Brousseau (1994, 1995), isto é, o objeto de estudo da didática da matemática se estende para além das práticas matemáticas escolares, o que justifica seu estudo em termos de organizações praxeológicas, segundo BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 79, apud COSTA, 2008, p. 8. Esse avanço da didática da matemática permite que busquemos diferentes contextos elementos que auxiliem a composição de organizações praxeológicas que levem em conta as necessidades do indivíduo para seu desenvolvimento pessoal e profissional, uma vez que a didática da matemática ultrapassa o estudo restrito ao quadro escolar, passando a considerar toda atividade matemática que supõe uma atividade de estudo. Dessa forma, o estudo dos diferentes tipos de tarefas relacionadas à noção de juros simples e compostos e as necessidades matemáticas para o seu desenvolvimento podem auxiliar na identificação das práticas existentes úteis para a humanidade e até mesmo na construção de novas práticas que cumpram essa nova função da didática da matemática. Para exemplificar como a didática da matemática passa a considerar como objeto de estudo toda atividade matemática, Bosch e Chevallard (1999) se refere à 31 noção de situação fundamental, introduzida por Brousseau (1994), cuja função é caracterizar os conhecimentos matemáticos, isto é, um conhecimento é descrito por meio de uma situação, conforme BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 80-81, apud COSTA, 2008, p. 9. Após ressaltarem que o conhecimento matemático pode ser descrito por meio de uma situação, ainda referindo-se à teoria das situações de Brousseau (1994), Bosch e Chevallard (1999) observam que a teoria das situações fornece uma nova ruptura epistemológica, pois, segundo essa teoria, podemos aprender os conhecimentos matemáticos por meio de atividades e problemas que esses conhecimentos permitem realizar e resolver, conforme BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 81-82, apud COSTA, 2008, p. 10. Isso conduz Bosch e Chevallard (1999) a considerar que as matemáticas como uma atividade estruturada, que no caso da teoria das situações pode ser desenvolvida em diferentes fases, que se realizam em situações e contra um meio. Após mostrar que a teoria das situações já considera que se podem aprender os conhecimentos matemáticos por meio de atividades e problemas que eles permitem resolver, Bosch e Chevallard (1999) atentam para o fato de que é a noção de transposição didática que possibilita o desenvolvimento da dupla ruptura epistemológica provocada pela teoria das situações, isto é, a primeira ruptura que consiste em reputar a matemática como a essência dos fenômenos didáticos e a segunda que consiste em elaborar uma ciência do estudo desses fenômenos, o que implica explicitar os modelos utilizados e submetê-los à prova, sujeitando-os às leis da epistemologia experimental, que possibilita tratar a questão da especificidade matemática da didática. Segundo os autores, a transposição didática mostra que o saber matemático é a origem de toda a problemática didática, podendo ser questionado. Isso os conduz a considerar que as pesquisas em didática da matemática estão condicionadas ao tipo de modelagem da matemática que utilizamos. O texto abaixo deixa evidentes as afirmações acima, permitindo uma melhor compreensão das relações entre a teoria das situações didáticas de Brousseau e a 32 noção de transposição didática de Chevallard, ou seja, como essas duas teorias se complementam. Nesse sentido, a noção de transposição didática deve ser interpretada como a possibilidade de desenvolver a dupla ruptura epistemológica provocada pela teoria das situações. Porque sua principal contribuição não é somente colocar em evidência a distância que separa o saber sábio do saber ensinado, e, portanto as transformações necessárias a que deve ser submetido todo objeto matemático para poder ser ensinado. O que mostra a noção de transposição didática é que o saber matemático (seja “sábio”, “ensinado” ou “a ensinar”) é a origem de toda problemática didática. Segue, então, que esse saber não pode ser tomado como um dado inquestionável e que as pesquisas em didática das matemáticas são condicionadas pelo tipo de modelagens da matemática a que recorremos [...] (BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 82, apud COSTA, 2008, p. 12). A importância do questionamento do saber matemático e a possibilidade de aprender os conhecimentos matemáticos por meio de situações e problemas nos conduziram ao estudo das relações institucionais esperadas e existentes no processo de ensino e aprendizagem da noção de juros simples e compostos, pois esse estudo nos permite identificar os diferentes tipos de tarefas propostas pela comunidade educativa, as técnicas disponíveis, a possibilidade de criar e difundir novas técnicas e as tecnologias e teorias que justificam e explicitam essas técnicas e os tipos de tarefas a elas associados. Para isso nos referimos, mais especificamente, ao trabalho de Chevallard (1992), que por meio de uma exposição quase axiomática introduz os primeiros elementos da Teoria Antropológica do Didático, ou seja, as noções de instituição (I), objeto do saber (O) e pessoas (X) e suas posições nas instituições para considerar a noção de relação institucional e relação pessoal com o objeto do saber. Bosch e Chevallard (1999) consideram o saber matemático como uma forma particular de conhecimento que possibilita algumas práticas institucionais que necessitam de um método para a sua análise. Para eles, esse método deve permitir a descrição das diferentes práticas e o estudo das condições para que elas possam se realizar. 33 O texto abaixo coloca em evidência o que leva Bosch e Chevallard a introduzir as noções de tipos de tarefas, técnicas, tecnologias e teorias como elementos de um método de análise das práticas sociais das matemáticas. Esses elementos constituem as organizações praxeológicas já definidas acima: O saber matemático, enquanto forma particular de conhecimento é, portanto, fruto da ação humana institucional: é qualquer coisa que se produz se utiliza se ensina ou, mais genericamente, se transpõe nas instituições. Mas, a matemática, é, ainda, um termo primitivo, substância de algumas práticas institucionais – as práticas sociais das matemáticas. O que falta é a elaboração de um método de análise das práticas institucionais que permitem a descrição e o estudo das condições de realização (BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 83, apud COSTA, 2008, p. 13). Bosch e Chevallard (1999) associam os primeiros termos da teoria antropológica à noção de organização praxeológica justificando que são essas noções que permitem modelar as atividades matemáticas, pois toda prática institucional pode ser analisada por meio de um sistema de tarefas que se dividem no fluxo da prática, conforme BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 84, apud COSTA, 2008, p. 14. No nosso caso, analisamos o sistema de tarefas que constituem a introdução e o desenvolvimento da noção de juros simples e compostos na transição entre o Ensino Médio e Superior, observando quais os conhecimentos matemáticos que sustentam o desenvolvimento das técnicas utilizadas. Dando continuidade à explicitação desse novo método de análise das práticas institucionais existentes para a modelagem das atividades matemáticas, Bosch e Chevallard (1999) observam que a delimitação das tarefas depende do ponto de vista adotado para essas análises. No nosso caso, utilizamos documentos oficiais, livros didáticos e planos de ensino de algumas instituições de Ensino Superior, pois nosso objetivo é identificar os conhecimentos prévios desenvolvidos no Ensino Médio que podem ser pelo menos mobilizados pelos estudantes do Ensino Superior. A delimitação das diferentes tarefas em uma determinada prática institucional, na sequência explicitam o que eles consideram como a noção de tarefa e que para eles a existência de uma 34 tarefa está associada à operacionalização de uma técnica, isso os conduz a considerar diversos exemplos como podemos observar no texto abaixo. Tudo, portanto, não é tarefa, existe em toda instituição atividade não analisada tipo de tarefa, e cuja menção por meio de verbos de ação de acepção mais ampla (por exemplo, “calcular”, “demonstrar”, etc.) deixa o conteúdo mal definido – falamos então de gênero de tarefa. A noção de tarefa vai se tornar restrita, com efeito, pelo segundo postulado, que supõe que o cumprimento de toda tarefa resulta da operacionalização de uma técnica. Aqui, ainda, pode-se entender o termo técnica no sentido amplo, como uma “maneira particular de fazer”, e não segundo a acepção comum de procedimento estruturado e metódico, mesmo algorítmico – que é um caso particular da técnica. Existe, com efeito, técnicas para resolver equações do segundo e do terceiro grau, mas também para fazer demonstrações por recorrência, para abrir portas, para se procurar uma informação por telefone (ou na Internet), para ler um jornal, para escrever um artigo de pesquisa, para rever sua lição, para fazer ficarem quietos os alunos no início das aulas, etc. Colocamos assim em execução, cotidianamente, um grande número de técnicas, com maior ou menor frequência. Pois toda técnica tem uma extensão limitada, uma vez que ela nos permite agir em certos casos e não em outros (tal equação não pode ser fatorada, a maçaneta desta porta é ao contrário, hoje os alunos estão muito falantes, etc.) (BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 84, apud COSTA, 2008, p. 16). Bosch e Chevallard (1999) ressaltam ainda que existem formas institucionalizadas para cumprir determinadas tarefas, o que tende à identificação do tipo de tarefa à técnica normalmente utilizada. Após considerar que a vida institucional é constituída de um amplo conjunto de tarefas para as quais existem técnicas institucionalizadas, Bosch e Chevallard (1999) mostram como esses novos conceitos se articulam com as noções primitivas da teoria antropológica, esclarecendo o que eles entendem por relação institucional a um objeto do saber e como essa relação faz emergir a relação pessoal de cada indivíduo com o objeto do saber. Isso conduz a considerar que a relação pessoal a um objeto do saber está associada à instituição em que o sujeito se encontra num determinado momento ou às instituições a que ele se submete durante sua vida, isto é, podem ocorrer distintas relações desse mesmo sujeito com um mesmo objeto. Aqui observamos também a importância desse tipo de análise quando se considera a transição Ensino Médio e Superior, momento em que os indivíduos já dispõem de determinadas relações 35 pessoais associadas ao objeto do nosso estudo, ou seja, a noção de juros simples e compostos. Além de colocar em evidência a possibilidade de existência de diversas relações institucionais e pessoais para um mesmo objeto do saber, Bosch e Chevallard (1999) consideram ainda o fato de existirem tarefas e técnicas que se tornam rotineiras, não provocando qualquer dificuldade em fazer uso delas, mas que podem também existir tarefas problemáticas em que as técnicas desenvolvidas e que já são rotineiras não são suficientes para resolvê-las. Isso conduz à geração de uma nova técnica ou à adaptação de uma determinada técnica, o que caracteriza certa evolução diante de uma necessidade nova. Nesse momento, Bosch e Chevallard (1999) alertam que é comum o abandono de uma tarefa problemática quando esta é desafiadora e as técnicas existentes não permitem resolvê-las. Essa dificuldade está associada à necessidade de produzir uma nova técnica, como se pode observar no texto abaixo, em que os autores consideram alguns exemplos para justificar a necessidade de um estudo que permita produzir novas técnicas. [...] Partimos assim de um tipo de tarefas problemáticas – por exemplo, ”Como resolver uma equação do segundo grau?”, “Como medir o tempo?”, ”Como contar o número de pessoas em uma multidão?”, “Como introduzir a noção de número decimal?”. Se isto ocorrer, chegamos, após um processo de estudo mais ou menos longo, a produzir as técnicas que permitem fornecer as respostas às questões inicialmente colocadas. Um novo “saber-fazer” é construído, que devemos ainda organizar para lhe assegurar um funcionamento regular nas instituições (BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 85, apud COSTA, 2008, p. 17). Após esclarecer o que eles consideram como tipos de tarefas e as técnicas que lhes podem ser associadas, Bosch e Chevallard (1999) apresentam o terceiro postulado antropológico que concerne à ecologia das tarefas e técnicas, isto é, às condições que possibilitam o uso nas instituições das novas técnicas produzidas para resolver as tarefas problemáticas. Isto os conduz a reputar a necessidade de um discurso descritivo e justificativo, denominado por eles de discurso tecnológico ou tecnologia da técnica. 36 Essas tecnologias também necessitam de uma justificativa, o que conduz Bosch e Chevallard (1999) a considerar como teoria da técnica o discurso que justificar tecnologia da mesma técnica. Os autores observam ainda que essa distinção tem caráter funcional e está associada ao tipo de tarefa a que nos referimos. Para melhor explicitar o que eles denominam técnica, tecnologia e teoria, Bosch e Chevallard (1999) consideram o exemplo abaixo. Assim, a determinação do sinal do discriminante de uma equação do segundo grau pode ser um elemento de uma técnica de resolução deste tipo de equações, mas pode também ser considerado como um ingrediente tecnológico visando explicar e justificar um tipo de técnica mais elementar fundamentada na escrita e fatoração de uma diferença de dois quadrados. Inversamente, o que, num dado momento ou numa dada instituição, aparece como a justificação de certa técnica, pode também ser considerado, em outro momento, como uma tarefa (a tarefa consistindo em justificar uma técnica), que supõe execução de uma técnica particular e a elaboração de um ambiente tecnológico-teórico conveniente (BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 86, apud COSTA, 2008, p.18). Dessa forma, Bosch e Chevallard (1999) demonstraram como a abordagem antropológica pode modelar o saber matemático em termos de objetos e suas relações por meio da identificação dos diferentes tipos de tarefas, das técnicas que lhes são associadas, das tecnologias e das teorias que as justificam. Na sequência, Bosch e Chevallard (1999) salientam que a distinção entre tipos de tarefas, técnicas, tecnologias e teorias cria uma diferenciação na organização do conhecimento matemático, mas não determina a natureza deste. Para isso, Bosch e Chevallard (1999) partem do seguinte questionamento: Quais os ingredientes que compõem uma técnica, uma tecnologia, uma teoria? Como podemos descrever a utilização de uma técnica? Segundo que critérios podemos constatar essa utilização em uma situação particular? Como distinguir uma técnica da outra? Existiriam invariantes transinstitucionais? Para Bosch e Chevallard (1999) esse questionamento, apresentado por seu aspecto teórico, mas que não esconde sua versão metodológica coincide com a problemática que a didática se propõe a estudar, isto é, as condições de 37 desenvolvimento da atividade matemática e as restrições que regem seu ensino e aprendizagem. Observamos aqui a pertinência de nossa escolha em estudar as relações institucionais esperadas e existentes por meio das atividades propostas aos estudantes quando se considera a transição entre o Ensino Médio e Superior, pois nossas análises permitem identificar as condições e as restrições do processo de ensino e aprendizagem. Esclarecida a forma de análise das possíveis organizações do conhecimento matemático, Bosch e Chevallard (1999), ao questionar os critérios para a análise das diferentes técnicas, de suas tecnologias e teorias, são conduzidos a considerar que na cultura ocidental as práticas humanas são estruturadas entre atividades “manuais” e “intelectuais”, em que se privilegiam as atividades intelectuais. Para o caso da matemática, Bosch e Chevallard (1999) mostram que seguimos essa mesma estrutura, isto é, em matemática trabalhamos “com a cabeça” e utilizamos instrumentos materiais como lápis, régua, compasso, computador, etc., e não materiais, porém sensíveis como escritas, formalismos, discurso, etc. que, mesmo tendo certas especificidades, só intervêm na atividade matemática como sinais dos objetos que eles representam. Após observar que na cultura ocidental o trabalho em matemática é efetuado principalmente “com a cabeça” por meio de noções, raciocínios, ideias, intuições, e que os instrumentos materiais e as representações são apenas suportes que não fazem parte da atividade, Bosch e Chevallard (1999) questionam se é apenas a ausência de um conceito que bloqueia a evolução do pensamento matemático. Para eles, as ferramentas materiais e sensíveis podem modificar de maneira catastrófica o desenvolvimento da atividade matemática. Isso lhes conduz a considerar essa dimensão como parte da atividade, como se pode constatar no texto a seguir: Sabemos que a ausência de um conceito pode bloquear a evolução do “pensamento” matemático, tanto no nível histórico de uma 38 comunidade como no nível individual do pesquisador ou do aluno. [...] Acreditamos que a análise didática do desenvolvimento do saber matemático – capturado no tempo histórico, na história de vida de uma pessoa, ou na vida de uma classe – não pode considerar como secundária esta dimensão da atividade, lhe atribuindo apenas uma função instrumental na construção dos conceitos (BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 90, apud COSTA, 2008, p. 23). Após considerarem o problema da natureza dos objetos matemáticos e de sua função na atividade matemática, Bosch e Chevallard (1999) são conduzidos a estabelecer uma dicotomia fundamental entre esses objetos distinguindo-os em dois tipos: os objetos ostensivos e os objetos não ostensivos. Para Bosch e Chevalllard (1999) os objetos ostensivos são aqueles que adquirem para o sujeito humano uma forma material, sensível. Como exemplos de objetos materiais eles consideram uma caneta, um compasso, etc., e como objetos sensíveis, os gestos (ostensivos gestuais), as palavras, o discurso (ostensivos discursivos), os esquemas, os desenhos, os grafismos (ostensivos gráficos), as escritas e os formalismos (ostensivos escriturais). Eles observam ainda que a característica dos ostensivos é que eles podem ser manipulados, e isso vale tanto para os ostensivos materiais como para os ostensivos sensíveis. Além disso, o não ostensivos só podem ser evocados por meio da manipulação dos ostensivos que lhe são associados. Após definirem objetos ostensivos e não ostensivos, Bosch e Chevallard (1999) explicitam a função deles na atividade matemática e que se trata de objetos institucionais cuja existência, em geral, não depende de uma única pessoa. Além disso, toda técnica supõe a ativação de um conjunto de ostensivos e não ostensivos, e a manipulação dos ostensivos são regrados pelos não ostensivos que são evocados com a ajuda dos ostensivos. Isso conduz à existência de uma dialética necessária entre ostensivos e não ostensivos, como podemos observar no seguinte texto: [...] os objetos ostensivos e os objetos não ostensivos estão unidos por uma dialética que considera os segundos como os emergentes da manipulação dos primeiros e, ao mesmo tempo, como meios de guiar e controlar esta manipulação (BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 90-91, apud COSTA, 2008, p. 24). 39 O exemplo abaixo permite compreender como funcionam ostensivos e não ostensivos na atividade matemática: É pelo fato de poderem ser concretamente manipulados que os objetos ostensivos se distinguem dos não ostensivos. A notação logo e a palavra “logaritmo” são objetos ostensivos. Ao contrário, a noção de logaritmo é um objeto não ostensivo que não é possível manipular no sentido precedente. Podemos somente “tornar presente” representá-la – pela manipulação de certos objetos ostensivos associados, como a notação logo por exemplo. Na maioria dos casos, os objetos institucionais se veem associados a um objeto ostensivo privilegiado, seu nome, que permitirá uma evocação mínima. “Observamos, aqui, o jogo metafórico pelo qual os atores são frequentemente conduzidos a utilizar como se os objetos não ostensivos se mostrassem e pudessem ser efetivamente manipulados” (BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 90, apud COSTA, 2008, p. 26). Quando consideramos nossa prática diária no trabalho com Matemática Financeira no curso de Administração de Empresas no Ensino Superior, destacamos que, ao desenvolvermos atividades sobre o regime de capitalização exponencial, necessitamos identificar o ostensivo capital, prazo de uma aplicação, taxa capital resgatado e logaritmo, pois é o não ostensivo logaritmo que deverá ser manipulado de forma a obter o prazo da referida aplicação. Os pesquisadores atentam para o fato que toda atividade humana se descreve, aparentemente, por meio da manipulação de objetos ostensivos, porém o ser humano só é capaz de efetuar esta manipulação por meio dos objetos não ostensivos que não aparecem como elementos principais da atividade desenvolvida. Depois de explicitada a existência de uma dialética entre objetos ostensivos e não ostensivos, não apenas no ambiente escolar, Bosch e Chevallard (1999) mostram a importância dos ostensivos e não ostensivos no desenvolvimento das atividades matemáticas em todos os seus níveis, isto é, técnico, tecnológico e teórico. São eles que permitem executar as atividades, assim como compreendê-las e controlá-las, conforme BOSCH E CHEVALLARD, 1999, p. 93, apud COSTA, 2008, p. 29. Isso conduz Bosch e Chevallard a enfatizar que na análise de uma determinada atividade matemática, se consideramos os ostensivos apenas como 40 sinal dos não ostensivos que constituem seu significado, faz prevalecer à dimensão não ostensiva da atividade, considerando sua dimensão ostensiva como secundária. Mas para Bosch e Chevallard (1999), se considerarmos a dimensão ostensiva como constituintes fundamentais das organizações praxeológicas, não podemos separar sua função semiótica de sua função instrumental, isto é, o ostensivo é fundamental tanto na produção de sentido como na manipulação das técnicas, tecnologias e teorias. A importância dos objetos ostensivos e não ostensivos para o desenvolvimento das atividades matemáticas e sua valorização cultural dependem, segundo Bosch e Chevallard (1999), de certo “desmatematização” da atividade matemática. Como exemplo, os autores citam o caso do formalismo algébrico presente no processo de algebrização das organizações matemáticas. Consideramos assim que analisar as propostas de desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem das noções de juros simples e compostos e as necessidades em termos de ostensivos e não ostensivos matemáticos necessários para a execução dessas propostas pode tornar esse trabalho mais eficaz, pois podemos identificar conhecimentos prévios tanto do ponto de vista das noções (não ostensivos) como de suas representações (ostensivos), e utilizá-los como conhecimentos disponíveis para a introdução de novos conhecimentos. Sendo nossas análises efetuadas por meio de uma grade de análise, para a construção consideramos as tarefas habitualmente encontradas no Ensino Médio e Superior e exame dos livros didáticos para a identificação das organizações matemáticas existentes tanto no Ensino Médio como no Superior, de forma a compreender quais as possibilidades de que serão encontrados meios para auxiliar os estudantes a ultrapassar os obstáculos presentes na transição entre o Ensino Médio e Superior. Para tal foi necessário introduzir ainda como referenciais teóricos de apoio a noção de quadro e mudança de quadros conforme definição de Douady (1984, 1992) e a noção de níveis de conhecimento esperados dos estudantes, segundo definição de Robert (1997, 1998). 41 Iniciamos com uma breve descrição das noções de quadro e mudança de quadro introduzido por Douady (1984) em sua tese. 2.3 AS NOÇÕES DE QUADRO E MUDANÇA DE QUADRO CONFORME DEFINIÇÃO DE DOUADY (1984, 1992) Sob uma perspectiva de teorização didática, Douady (1984, 1992) introduz a noção de quadro em sua tese. Fundamentada em uma análise epistemológica da forma de trabalho do matemático profissional, Douady (1984) considera que os conceitos matemáticos funcionam como ferramentas explicitam antes de adquirirem o status de objeto e serem trabalhados como tal. Isso conduz Douady a definir as noções de ferramentas implícitas e explícitas como: Ferramenta implícita e explícita: Uma ferramenta implícita corresponde a um conceito em elaboração, e isto pode durar vários anos. Uma ferramenta explícita corresponde a uma utilização intencional de um objeto para resolver um problema (DOUADY, 1992, p. 134, apud ANDRADE, 2006, p. 12). Segundo Douady, a noção de objeto é a seguinte: Por objeto, entendemos o objeto cultural tendo seu lugar em um edifício mais amplo que é o saber das matemáticas, num dado momento, reconhecido socialmente. O objeto é matematicamente definido, independentemente de sua utilização. (DOUADY, 1992, p. 134, apud ANDRADE, 2006, p. 12). Para exemplificar as definições de ferramenta implícita e explícita e objeto, considerando as definições de Douady, escolhemos as situações abaixo que correspondem ao nosso objeto matemático de pesquisa, ou seja, a noção de juros simples e compostos. Quando se introduz a noção de juros simples e compostos no Ensino Médio, em geral, consideram-se exemplos do tipo: Uma pessoa aplicou $ 10.000,00 a juro composto de 1,8% ao mês. Após quanto tempo terá um total de $ 11.543,00? 42 Nesse caso o estudante pode calcular juros sobre juros que corresponde a aplicar a ferramenta implícita até encontrar o valor dado e assim determinar o tempo. Após esse trabalho pode-se explicitar a ferramenta utilizada e escrever a fórmula que corresponde à forma algébrica para o calculo de juros compostos. Isso conduz a considerar que o objeto matemático segundo a definição de Douady (1992) se situa em uma teoria bem definida, sendo assim um elemento do domínio do trabalho matemático que Douady (1992) denomina quadro. No exemplo anterior observamos que o trabalho matemático é desenvolvido no quadro numérico e ao se deduzir a fórmula que permite calcular juros compostos é preciso traduzir o problema para o quadro algébrico. Segundo Douady(1992)”um quadro é constituído dos objetos de um ramo das matemáticas. Considerando o trabalho do matemático, Douady (1992) define mudança de quadros, que consiste na passagem de um quadro a outro e no retorno quando necessário. O exemplo acima mostra possibilidade de passagem do quadro numérico para o quadro algébrico. A didática de Douady(1992) define na realidade ao transpor as características do trabalho dos matemáticos para os jogos de quadros e dialética ferramenta-objeto. Os jogos de quadros são transposições didáticas das mudanças de quadros organizados pelos professores O exemplo apresentado acima deixa evidente a dialética ferramenta objeto que funciona na passagem de um quadro para o outro. Após essa breve descrição das noções de quadro e mudança de quadros e de suas possibilidades para a análise didática, realizamos uma sucinta exposição dos três níveis de conhecimentos esperados dos estudantes segundo definição de Robert (1997 1999). 2.4 OS TRÊS NÍVEIS DE CONHECIMENTO ESPERADOS DOS ESTUDANTES CONFORME DEFINIÇÃO DE ROBERT (1997, 1998) A abordagem teórica dos três níveis de conhecimento esperados dos estudantes, segundo definição de A. Robert (1997, 1999), é a seguinte: 43 O nível técnico corresponde a um trabalho isolado, local e concreto. Está relacionado principalmente às ferramentas e definições utilizadas em uma determinada tarefa. Para nossa pesquisa, sobre juros simples e compostos identificamos as tarefas abaixo como correspondentes à aplicação direta da fórmula para o cálculo de juros simples e montante. Uma pessoa aplicou $ 3.000,00 à taxa de 2% ao mês durante 5 meses. a) Quanto receberá de juros se o regime for de juros simples? b) Que montante terá ao fim dessa aplicação? O nível mobilizável corresponde a um início de justaposição de saberes de um certo domínio, podendo até equivaler a uma organização. Vários métodos podem ser mobilizados. O caráter ferramenta e objeto do conceito está em jogo, mas o que se questiona é explicitamente pedido. Um saber é considerado mobilizado quando o estudante o utiliza corretamente. Exemplos: Determine o prazo em que duplica um capital aplicado à taxa de juro simples de 4% ao mês. b) Calcule o juro composto que será obtido na aplicação de $ 25.000,00 a 25% ao ano, durante 72 meses. Nessas tarefas é pedido explicitamente o cálculo dos juros simples e composto, sendo necessário apenas mobilizar as fórmulas que permitem desenvolver esses cálculos. O nível disponível corresponde, a saber, responder corretamente o que é proposto sem indicações, de poder, por exemplo, dar contraexemplos (encontrar ou criar), mudar de quadro (fazer relações), aplicar métodos não previstos. Esse nível de conhecimento está associado à familiaridade, ao conhecimento de situações de referências variadas, de ser capaz de questionar, de dispor de uma organização. Exemplo: Se uma mercadoria cujo preço é de $ 200,00 for paga em 6 meses, com taxa de 20% ao ano, quanto será pago de juros, no regime de capitalização linear? 2.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Após essa breve descrição do referencial teórico utilizado na pesquisa, passamos ao próximo capítulo, em que analisamos algumas das relações institucionais esperadas dos professores e estudantes do Ensino Médio e Superior. 44 Essas análises levam em conta tanto o trabalho a ser realizado por cada qual desses atores do processo de ensino e aprendizagem como a parte do conteúdo a ser desenvolvido que lhes é proposta, isto é, qual o papel que professor e estudante devem desempenhar para garantir o sucesso do processo de ensino e aprendizagem. Para isso, utilizamos a noção de “topos” do professor e do estudante, e com essa ferramenta analisamos qual o papel esperado destes por meio de documentos oficiais introduzidos a partir da Lei de Diretrizes e Bases de 1999 (L 9.394, de 20.12.1996). 45 Capítulo 3 O “TOPOS” DO ESTUDANTE E DO PROFESSOR NOS DOCUMENTOS OFICIAIS 3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS Consideramos neste capítulo a análise das relações institucionais esperadas dos estudantes e dos professores tanto do Ensino Médio como do Ensino Superior. Para o Ensino Médio essas análises são feitas à luz dos Parâmetros Curriculares Nacionais e da Nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo, e para o Ensino Superior utilizamos as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação de Administração e alguns planos de ensino de universidades públicas e privadas. A escolha desses documentos e dos planos de ensino se deve ao fato que eles representam propostas de diferentes formas de tratamento do conteúdo de juros simples e compostos para as duas etapas escolares consideradas nessa pesquisa. Com o objetivo de melhor compreender o que é esperado do professor e do estudante, propomos estudar o “topos”, 2 que, conforme definição de Chevallard e Grenier (1997) corresponde ao momento em que o estudante desempenha com certa autonomia o seu papel na execução de uma tarefa didática que, em geral, lhe é proposta pelo professor, cujo papel é de organizador do trabalho a ser realizado pelo estudante e mediador, quando necessário. Sendo assim, quando se introduz a noção de juros simples e compostos, objeto de estudo desta pesquisa, podemos considerar que o papel do professor é de organizar o estudo dessa noção reconhecendo os diferentes tipos de tarefas que correspondem a esse tema. Isso se realiza com a ajuda das propostas institucionais, dos livros didáticos e de outros documentos. Ao organizar essas tarefas, cabe ao professor escolher as técnicas e tecnologias adequadas, ou seja, o papel central do 2 Topos: palavra grega que significa “lugar”. O “topos” do aluno é o lugar onde ele opera com relativa autonomia em relação ao professor o papel que lhe é próprio na realização de uma tarefa didática. Este trabalho que reúne professor e aluno exige uma ação orquestrada, em que ambos são chamados a desempenhar seu papel em fases cooperativas (CHEVALLARD e GRENIER, 1997, p. 186, apud COSTA, 2000, p. 39). 46 professor é organizar o trabalho do estudante, enquanto ao estudante cabe aceitar o professor como uma ajuda ao estudo. No entanto, o professor deve aos poucos ir se desligando para o estudante se tornar responsável pelo seu próprio desenvolvimento, adquirindo assim autonomia para realizar seu percurso de estudo. Em resumo, o “topos” do professor está associado à organização matemática e à didática de situações que permitam o desenvolvimento dos estudantes, de modo que os mesmos sejam capazes de utilizar seus conhecimentos de forma autônoma tanto para resolver problemas escolares como os que serão confrontados no seu cotidiano, ou seja, o “topos” dos estudantes corresponde à possibilidade de construir seu próprio percurso de estudo. Para identificar o que se espera tanto do professor como do estudante do Ensino Médio em relação aos seus “topos”, utilizamos os PCNEM e PCN+, a Nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo e as Diretrizes Curriculares, pois estes documentos possibilitam identificar propostas que contribuem com o professor em sua prática diária. Este pode realizar, por meio desses documentos, as escolhas mais adequadas às características dos estudantes de uma determinada etapa escolar, articulando ainda com as possíveis aplicações em seu ambiente de trabalho. Sendo assim, numa primeira fase, analisamos a relação institucional esperada para o trabalho com a noção de juros simples e juros compostos no Ensino Médio e sua articulação com os conceitos matemáticos desenvolvidos nesta etapa da escolaridade, identificando a função do professor e do estudante no processo de ensino e aprendizagem respectivamente. Essas análises foram desenvolvidas por meio do estudo dos documentos oficiais, quando se considera a relação institucional esperada. Examinamos inicialmente os Parâmetros Curriculares Nacionais privilegiando a identificação dos conhecimentos prévios esperados dos estudantes quando se introduz a noção de juros. Similar procedimento foi adotado para a verificação da nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo, ou seja, destacando a “expectativa” da noosfera quanto ao papel a ser desempenhado tanto pelo estudante como pelo professor, levando em conta nas propostas os conhecimentos prévios do estudante e do professor. Finalizamos as análises associando as nossas indagações em função das relações institucionais esperadas para o Ensino Médio, tecendo um comentário sobre as regularidade e diferenças 47 existentes nestes documentos. Analisamos ainda sob a mesma óptica qual o papel a ser desempenhado por estudantes e professores dos cursos de graduação em Administração via Diretrizes Curriculares dos cursos de Administração e planos de ensino de duas universidades públicas, Universidade Federal do Amazonas e Universidade Federal do Rio Grande do Sul e duas Universidades Privadas, Fundação Getulio Vargas e Faculdade das Américas, em função da disponibilidade de seus planos de ensino. Terminamos nosso estudo comparando o que é esperado do professor e estudante nas duas etapas escolares examinadas e verificando se existe uma coerência nessas duas propostas. Iniciamos assim pela análise da proposta nacional, ou seja, os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM), em que identificamos que nesses documentos a proposta é a de que os professores (topos do professor) não se preocupem apenas em aprofundar os conhecimentos adquiridos no Ensino Fundamental, mas que eles preparem seus estudantes para agirem como cidadãos preparados para o mundo do trabalho. Isto corresponde a considerar uma formação que os prepare para atuar de forma autônoma e ética em relação à compreensão e desenvolvimento dos processos produtivos, ou seja, observamos a proposta de formação de um estudante cujo “topos” é realizar seu trabalho escolar de forma autônoma e responsável a fim de se desligar do professor e se tornar responsável pelo seu próprio desenvolvimento escolar e profissional. No caso do nosso objeto de estudo, essa autonomia é importante, pois o estudante deve estar preparado para aplicar seus conhecimentos na sua vida profissional, em que não contará com o professor para auxiliá-lo nos momentos de dificuldade. O texto abaixo deixa evidente essa proposta do que se deseja do trabalho de professores e estudantes do Ensino Médio, ou seja, do “topos” social 3 esperado dos estudantes do Ensino Médio: [...] dentre as finalidades do Ensino Médio não constam apenas a consolidação e aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no Ensino Fundamental, com objetivo de ser uma continuidade, mas também de preparar para o trabalho e o exercício da cidadania, o 3 “Topos” social: consideramos aqui como “topos” social as expectativas quanto o papel que professores e estudantes devem desempenhar no contexto social em que estão inseridos. 48 desenvolvimento da autonomia intelectual, a formação ética e a compreensão de como ocorrem os processos produtivos. (BRASIL, 1998, p. 69). Essa reformulação do Ensino Médio é importante, pois leva em conta, além dos conteúdos matemáticos, a inserção do indivíduo na sociedade por meio de sua cultura. Entretanto, os professores podem encontrar dificuldades para desenvolver essas orientações, pois elas não vêm acompanhadas de sugestões sobre as formas de tratamento pedagógico que podem ser utilizadas para desenvolver esse tipo de trabalho, nem de indicações mais precisas sobre novas abordagens didáticas que auxiliem a construção de novas organizações didáticas, ou seja, não existe preocupação de, pelo menos, citar trabalhos de Educação Matemática, os quais poderiam ajudar os professores a encontrar novos caminhos para suas práticas habituais. Após essa rápida apresentação da ferramenta utilizada para as análises e da forma como essa será conduzida, dos objetivos e finalidades do novo Ensino Médio, e observando que as análises propostas na sequência possibilitam compreender o enfoque relativo à ampliação do debate sobre o ensino da Matemática e a socialização dos conhecimentos nela desenvolvidos, passamos ao estudo mais específico do “topos” do professor e do estudante nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. 3.2 OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO MÉDIO (PCNEM) A proposta do novo Ensino Médio, em termos da lei que a regulamenta, deixa evidente que esta etapa escolar não deve preparar apenas para a inserção no Ensino Superior ou no ensino profissionalizante, mas deve contribuir para completar a Educação Básica e preparar o indivíduo para a cidadania. As mudanças propostas nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio – PCNEM (BRASIL, 2002) refletem a necessidade de preparar os estudantes para a vida, propiciando condições para que sejam cidadãos autônomos capazes de exigir e exercer a cidadania por meio da procura constante de novos desafios e de suas próprias condições para resolvê-los. 49 Acreditamos, assim, que é preciso estar constantemente em contato com as novas estratégias e possibilidades de tratamento das ciências, em particular da Matemática no desenvolvimento das diferentes formas de tratamento dos desafios cotidianos que podem surgir quando da necessidade de encontrar solução para as diferentes atividades cotidianas, especialmente aquelas que estão associadas ao conhecimento científico. Nos PCNEM observamos que são inicialmente explicitadas as condições gerais do processo de ensino e aprendizagem, isto é, se explica como efetuar a escolha de conteúdos; algumas formas de trabalhar com os conteúdos escolhidos, a importância da construção de um projeto pedagógico específico para os diferentes grupos de estudantes, em que se levam em conta seus conhecimentos prévios em função do novo conhecimento que se deseja introduzir e exemplos de organização curricular que articulam conteúdos a serem trabalhados, formas de tratamentos destes e projeto pedagógico. Ao apontar que para a escolha dos conteúdos é preciso refletir sobre os propósitos da formação matemática pretendida, destaca-se que se espera que os estudantes, ao final do Ensino Médio, saibam usar a Matemática para solucionar problemas da vida prática e articular soluções com outras áreas do conhecimento. Nesse documento se ressalta ainda a importância de compreender a Matemática na sua forma intrínseca, trabalhada por meio de teoremas e suas demonstrações, que esse conhecimento é social e historicamente construído e, portanto permite o avanço das ciências, sendo assim um instrumento essencial para o desenvolvimento tecnológico e científico. Aqui podemos dizer que o “topos” do professor é mostrar a importância da Matemática como ferramenta para o desenvolvimento da sociedade, e fica a cargo do estudante procurar na escola e na sociedade exemplos que possam ampliar os conhecimentos trabalhados no grupo ao qual ele pertence, tornando-se assim autônomo e capaz de conduzir sua própria aprendizagem, enxergando o professor como um orientador nesse processo, o que corresponde a uma das expectativas institucionais propostas para o novo Ensino Médio. Nos PCNEM observamos ainda que existem orientações sobre a forma de desenvolver determinados conteúdos em que se enfatiza o desenvolvimento de valores formativos articulados com o desenvolvimento dos conteúdos matemáticos. Ou seja, espera-se que o professor seja capaz de criar situações que valorizem o 50 desenvolvimento do raciocínio lógico matemático que ele os estudantes a formular novas questões, criar seus próprios modelos, desenvolver procedimentos lógicodedutivos. Para isso, a proposta considera que o professor pode mostrar a importância das propriedades matemáticas por meio de um discurso justificativo que articule a fórmula com os teoremas e propriedades que as sustentam e permitem resolver diferentes tipos de tarefas, incluindo as de aplicação da Matemática em situações cotidianas e nas outras ciências. Ou seja, espera-se que o professor disponha de um conjunto de tipos de tarefas cujas técnicas possam ser justificadas por meio de tecnologias adequadas tanto no nível técnico tecnológico como no nível tecnológico teórico, isto é, mesmo não utilizando esse termo, o que se propõe é que o professor disponha de uma organização praxeológica 4 adequada ao grupo de estudantes que participam do processo de ensino e aprendizagem. Trata-se de uma proposta corrente, mas que necessita de um estudo mais aprofundado que auxilie o professor a desenvolver o seu papel. Vemos aqui um caminho que poderia ser trabalhado na formação de professores, pois, segundo Boero (2008), cabe a noosfera: O termo “noosfera” é utilizado por Chevallard para designar o sistema de instituições e pessoas que administram as relações entre a matemática dos matemáticos e a matemática do sistema de ensino. Os processos realizados na noosfera são sensíveis a influências externas (provenientes de política, cultura, etc.), mas eles se desenvolvem com relativa autonomia e inércia. Apesar dessa autonomia e inércia, os membros da noosfera têm responsabilidades especiais na preparação dos professores e no desenvolvimento curricular (em particular, os pesquisadores em educação matemática), agindo frequentemente sob a luz das teorias epistemológicas e psicológicas, acarretando na identificação sobre o que é matemática e como os estudantes aprendem. (BOERO, 2008, p. 3). Apesar de alertar os professores sobre a necessidade de articulação dos novos conteúdos e aqueles já trabalhados no Ensino Fundamental e nos três anos do Ensino Médio, de levar em conta os conhecimentos prévios dos estudantes e de 4 Organização Praxeológica: Uma organização praxeológica ou praxeologia é composta de um certo tipo de tarefa que deve ser realizada por meio de uma certa técnica, que deve ser justificada por meio de uma tecnologia que permite ao mesmo tempo pensá-la e produzi-la, devendo ainda ser justificada mediante uma teoria. A palavra praxeologia ressalta a estrutura da organização [tarefa/técnica/tecnologia/teoria], pois a palavra grega práxis, que significa “prática”, envia ao bloco prático-técnico, e a palavra grega logos, que significa “razão”, envia ao bloco tecnológico-teórico, conforme definição apresentada em Chevallard (2002). 51 revisitá-los sempre que possível propondo situações de maior complexidade, uma vez que se espera que os estudantes tenham mais maturidade, não existe nenhuma orientação a respeito de como realizar esse trabalho. Tanto a articulação de conhecimentos como o trabalho considerando os conhecimentos prévios dos estudantes são objetos de pesquisa que poderão auxiliar professores e estudantes a compreender melhor o papel da Matemática tanto no âmbito escolar como no profissional. É importante destacar que o documento, ao enfatizar o desenvolvimento do valor formativo, coloca em evidência que é preciso abandonar as práticas de memorização de um conjunto de regras, de utilização direta de fórmulas, de resolução de exercícios repetitivos não acompanhados de explicações e explicitações que, utilizando os termos de Chevallard, correspondem às tecnologias das técnicas empregadas. Aqui observamos que cabe ao professor encontrar meios para justificar a utilização das regras e fórmulas propondo tarefas que despertem o interesse dos estudantes.Observamos ainda que, mesmo fazendo parte do “topos” do professor, não existem orientações sobre como realizar esse trabalho, o que é compreensível, pois se trata de uma questão que vem sendo pesquisada em Educação Matemática e que precisa ser trabalhada intensamente na formação de professores. Quando se considera, mais especificamente, o tema Números e Operações, que corresponde ao conteúdo associado aos conhecimentos prévios essenciais para a introdução e desenvolvimento da noção de juros simples e compostos, o documento enfatiza a necessidade de o professor criar situações que desenvolvam a capacidade de solucionar problemas rotineiros sobre as noções de números inteiros e decimais, destacando para esse último a importância de reputar suas diferentes representações. Além disso, o documento ressalta a importância da articulação desse conteúdo com as noções de porcentagem, proporcionalidade direta e inversa, observando a relevância do cálculo mental e do uso de calculadoras e a necessidade de levar em conta as representações por meio de tabelas e gráficos na resolução de problemas envolvendo essas noções. Nesse caso, o documento apresenta uma sugestão de situação cotidiana que corresponde à leitura e interpretação de faturas, mais especificamente das contas de água e luz. Apesar de justificar a utilização desses documentos no desenvolvimento 52 do trabalho matemático, observamos que se trata de uma forma de mostrar a importância desse trabalho na formação do cidadão, mas que pouco auxilia o trabalho do professor, que, mesmo tendo como justificar a importância da noção matemática na vida cotidiana, pode não dispor das ferramentas matemáticas essenciais para institucionalizar o conhecimento matemático em jogo de modo que este possa ser utilizado em diferentes situações que nem sempre estão diretamente relacionadas com as necessidades diárias dos estudantes. Além disso, muitas dessas situações são trabalhadas de forma teórica, pois são adaptadas ao conteúdo e não correspondem à realidade. Temos aqui mais uma tarefa que faz parte do “topos” do professor, que necessita de formação específica para ser desenvolvida de forma eficaz, pois o exemplo discutido no documento não é tipicamente matemático, pois pode ser resolvido mentalmente sem a utilização das representações mais específicas do conteúdo a que foi associado, no caso ao estudo de funções.É importante observar que o documento corresponde a uma proposta de trabalho em que não se levam em conta as diferentes conjunturas sociais, culturais e educacionais que possam ser encontradas pelo professor, o que justifica o fato de este enfatizar que o professor deve privilegiar a qualidade em detrimento da quantidade de conteúdos a serem desenvolvidos no Ensino Médio, proporcionando a possibilidade de criação de diversas organizações praxeológicas, que, mesmo sendo adequadas a certo número de estudantes, podem no futuro ser consideradas fontes de dificuldades. As escolhas dessas organizações ficam assim totalmente a cargo do professor, que precisa estar bem preparado para não cometer enganos que possam prejudicar o desenvolvimento de seus estudantes. Observamos ainda que o documento ofereça orientações sobre a necessidade de revisitar conteúdos, tais como as propriedades com números reais e as regras de sinais para os números inteiros, mas também nesse caso apenas se salienta a maturidade dos estudantes e nenhuma orientação mais específica é dada sobre como se poderia realizar esse trabalho. Aqui, poderiam ser indicados trabalhos de pesquisa em Educação Matemática para auxiliar o professor a encontrar novas formas para o desenvolvimento dos conteúdos do Ensino Médio, em que se pudessem articular conhecimentos da própria Matemática e das outras Ciências e revisitar conhecimentos prévios supostos disponíveis, de modo que esses últimos se tornem mais ricos, mais elaborados e mais diferenciados, e que tanto eles como os 53 novos conhecimentos adquiram significado para o aprendiz, tornado-se assim mais estável, conforme afirmação de Moreira (2005), para caracterizar aprendizagem significativa. Quando se consideram mais especificamente as orientações sobre o conteúdo funções, observamos que essa noção deve ser tratada do ponto de vista de suas aplicações em outras ciências, em particular como modelo de resolução de problemas de movimento em física e de rendimentos financeiros associados às aplicações financeiras que possam ser encontradas no cotidiano.Para isso, propõese que se dê ênfase ao estudo do gráfico de uma função e sua interpretação por meio de exemplos e situações contextualizadas que possam motivar os estudantes à procura de novas situações cuja solução possa ser planejada e executada mediante a utilização da noção de função e que as propriedades das funções possam servir como ferramentas de justificativa e controle dos resultados encontrados, ou seja, a noção de função é usada como uma tecnologia para justificar as técnicas associadas aos modelos construídos para a resolução das tarefas propostas aos estudantes. Como exemplo, é apresentado o caso da função quadrática que pode ser desenvolvida por meio de situações contextualizadas e que permite revisitar conceitos como o de gráfico de uma função, identificação da função por meio de seu gráfico, estudo dos zeros de uma função e sua representação no sistema cartesiano ortogonal, estudo do crescimento e do decrescimento por meio do gráfico, relação entre o sinal dos coeficientes de uma função quadrática e as propriedades do gráfico dessa função e estudo dos máximos e mínimos dessa função. No documento é destacada a necessidade de tratar essas propriedades das funções quadráticas por intermédio de situações que permitem compreendê-las, evitando assim a memorização de regras, ou seja, dá-se destaque à discussão das técnicas utilizadas para justificar as tarefas propostas pelo professor, o que supõe que este disponha de uma tecnologia adequada. Nesse momento, observamos mais uma vez que é papel do professor encontrar situações apropriadas para o desenvolvimento do trabalho proposto, julgando que ele tenha sido preparado para conceber esse tipo de tarefa. As propriedades das funções quadráticas podem ser destacadas mediante a escolha de uma tarefa que necessite dessas propriedades, que devem ser explicitadas pela tecnologia da técnica, como podemos observar no exemplo abaixo. Todas essas propriedades das funções quadráticas possibilitam explorar problemas como o apresentado abaixo. 54 Fonte: HAZZAN E BUSSAB, 2003, p. 83. Para resolver a parte (a) dessa questão basta multiplicar a função demanda por x que representa o preço do produto. Obtém-se assim uma função quadrática de x que representa a função receita. Determinando a abscissa do vértice da parábola que representa a variação dessa função, e substituindo na função demanda, encontra-se o preço que maximiza essa função. Sendo a função lucro definida como função receita menos função custo, para a solução da parte (b) obtém-se novamente uma função quadrática, e para determinar o preço que maximiza o lucro basta estabelecer o valor da abscissa do vértice da parábola que representa a função lucro e substituir na função demanda. Se construirmos o gráfico da parábola que representa a função lucro podemos determinar o intervalo em que o lucro é positivo. A discussão apresentada acima mostra a necessidade de um discurso tecnológico para descrever, explicar e justificar as técnicas empregadas na solução da tarefa. Voltando ao documento e considerando ainda as noções de funções, encontramos orientações sobre a organização matemática dos conteúdos associados a essas noções e observamos que se propõe que se revisite a trigonometria no triângulo retângulo e suas relações antes de abordar as noções função seno e cosseno, mas ainda aqui não existem indicações para auxiliar o professor a desenvolver esse trabalho. Outro exemplo está diretamente associado ao nosso objeto de estudo, ou seja, às aplicações de Matemática Financeira, que são propostas como motivadoras de situações que possibilitam a articulação das noções matemáticas de função afim com a noção de juros simples e funções exponencial, inversa e logarítmica com situações contextualizadas sobre juros compostos. 55 Nesse caso, podemos mais uma vez lembrar que existem pesquisas em Educação Matemática que podem auxiliar os professores a desenvolver esse trabalho, lembrando que ele não é simples nem imediato e necessita de orientações mais específicas. Apesar disso, podemos dizer que as orientações constituem uma primeira abordagem, pois as indicações podem levar os professores à procura de novos meios para tratar as questões apresentadas no documento. Isso possibilita que o professor encontre uma nova forma de ação que pode influenciar os estudantes e assim ambos serão capazes de cumprir os papéis que lhes são atribuídos nessa nova concepção do Ensino Médio. Focamos aqui as noções associadas à nossa pesquisa, mas o documento apresenta sugestões para o conjunto de conteúdos matemáticos destacados para serem tratados no Ensino Médio. Todos esses conteúdos, quando possível, são associados a aplicações em outras ciências e situações contextualizadas. Podemos resumir a análise acima das propostas do PCNEM que correspondem às expectativas institucionais para o desenvolvimento da Matemática, em particular, das aplicações de Matemática Financeira, utilizando nosso referencial teórico central, isto é, a teoria antropológica do didático associada à noção de “topos” do professor e do estudante da seguinte maneira: Propor tarefas que permitam a contextualização dentro da própria matemática e nas outras ciências (“topos” “do professor”). Trabalhar com os objetos ostensivos (discursivos, visuais, gestuais, gráficos) reconhecendo os não ostensivos que lhes são associados, isto é, interpretar as diversas formas de representação dos objetos matemáticos estudados no Ensino Médio (“topos” do professor e do estudante). Justificar as diferentes etapas do desenvolvimento de uma técnica por meio de um discurso tecnológico, ou seja, evocar os não ostensivos e as propriedades e teoremas que lhe são associados na manipulação dos ostensivos que permitem a solução de um determinado tipo de tarefa que constitui a organização praxeológica para o 56 desenvolvimento de uma determinada noção matemática (“topos” do professor e do estudante). Identificar e construir situações que auxiliem os estudantes a reconhecer os ostensivos e não ostensivos e dessa forma sejam capazes de produzir um discurso tecnológico que os auxilie a ultrapassar as dificuldades e os obstáculos encontrados na solução das tarefas que lhes são propostas (“topos” do professor). Mostrar, por meio de um discurso tecnológico, a diferença entre os ostensivos e sua relação com os não ostensivos e a necessidade de escolhas adequadas que permitem resolver outras situações em diferentes momentos e contextos (“topos” do professor). Encontrar e construir novas tarefas e situações para o seu próprio desenvolvimento, isto é, utilizar conhecimentos matemáticos de forma autônoma para a solução de problemas escolares e nos diferentes contextos que possam ser solicitados (“topos” do professor e do estudante). As expectativas apresentadas no PCNEM nos conduzem a considerar que se espera que os estudantes, ao terminarem o Ensino Médio, sejam capazes de identificar os ostensivos e não ostensivos mais adequados para resolver tarefas escolares, profissionais e cotidianas em que esses conhecimentos representam uma possibilidade de solução. Em relação ao “topos” do professor, ou seja, às expectativas em relação ao trabalho do professor, identificamos a necessidade de encontrar meios para reconhecer os conhecimentos prévios dos estudantes e criar situações que se apoiem nesses conhecimentos para que estes possam auxiliar na construção de novos conhecimentos. Apesar de deixar evidente que cabe ao professor identificar os conhecimentos prévios dos estudantes e encontrar meios de introduzir novos conhecimentos levando em conta a disponibilidade desses conhecimentos, não encontramos nenhuma orientação que possa auxiliar o professor no desenvolvimento desse trabalho. Lembramos aqui que, segundo Moreira (2005), a noção de conhecimento prévio é a variável que mais influencia a 57 aprendizagem. No entanto, observamos que a aprendizagem significativa, ainda conforme Moreira (2005) caracteriza-se pela interação entre o novo conhecimento e o conhecimento prévio. As observações acima deixam evidente que é preciso preparar o professor para que ele seja capaz de reconhecer os conhecimentos prévios de seus estudantes e criar situações adequadas para os diferentes grupos com os quais ele trabalha, ou seja, o professor precisa conhecer diferentes organizações praxeológicas para que possa construir aquelas que mais se adaptam a um determinado grupo de estudantes. Parece-nos interessante que os estudantes sejam capazes de reconhecer seus conhecimentos prévios e aplicá-los em diferentes situações, mas certamente esse trabalho deve ser desenvolvido desde as primeiras séries do Ensino Fundamental para que os estudantes do Ensino Médio sejam capazes de construir seu próprio conhecimento como prevê o texto abaixo: Construir seu conhecimento utilizando seus conhecimentos prévios a partir da solução de situações propostas pelo professor; explicitar seu trabalho e o de seus pares na solução das situações que lhe são propostas; persistir e estimular seus colegas quando dificuldades se apresentarem (BRASIL, 1998, p. 40). A análise do documento mostra que existe uma grande expectativa de que os estudantes ao final do Ensino Médio sejam capazes de construir seus conhecimentos e apresentá-los coerentemente, cooperando com seus pares diante de dificuldades. Mas para isso é preciso que os professores sejam preparados para desenvolver as atividades que correspondem ao seu “topos” e que os estudantes sejam alertados do papel que eles devem desempenhar no processo de ensino e aprendizagem. Devemos considerar ainda as situações adversas encontradas nesse processo tanto por professores como por estudantes, e é preciso encontrar novos meios que facilitem a execução dessa proposta. Na sequência apresentamos a expectativas descritas nos PCN+ para o papel a ser desempenhado pelo professor e estudante do Ensino Médio. 3.3 OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO MÉDIO (PCN+) Inicialmente o PCN+ apresenta seus objetivos e enfatiza que não possui pretensão normativa, tendo apenas a intenção de complementar os PCNEM, 58 oferecendo orientações educacionais, tendo em vista em sua essência o desenvolvimento da escola em sua totalidade, concentrando-se assim nas disciplinas da área de Ciências da Natureza, Matemática e suas tecnologias. Descreve as mudanças do novo Ensino Médio apresentando alterações para que este deixe de ser apenas uma fase preparatória para o Ensino Superior e assuma a responsabilidade de complementar a Educação Básica, preparando os jovens para a vida e também propiciando condições de continuidade na vida acadêmica e/ou de enfrentar um mercado de trabalho extremamente competitivo. No documento se destaca que, mesmo com as propostas de mudanças pelas quais o Ensino Médio passa no Brasil e no mundo, essas novas propostas não menosprezaram as disciplinas das áreas que lhe estão associadas – as Ciências da Natureza e Matemática, Ciências Humanas, Linguagens e Códigos –, mas tentam suscitar a interdisciplinaridade sem diluir e eliminar as disciplinas agregadas a essas áreas. Segundo o documento, a função do Ensino Médio de complementar a formação geral do estudante provoca uma ação articuladora sistêmica no interior de cada área e em sua totalidade, de forma que existe a preocupação de dar sentido ao conhecimento já no Ensino Médio por meio de situações contextualizadas que necessitam da aplicação dos diferentes conhecimentos, por exemplo, relacionando os conteúdos das disciplinas de Matemática e Física de modo que os estudantes possam aplicar seus conhecimentos matemáticos para interpretar fenômenos físicos, que podem ser considerados em situações de introdução de um novo conceito tanto na disciplina de Matemática como na disciplina de Física, evitando o estudo intradisciplinar que se desenvolveu durante um longo tempo. Nas orientações do documento é possível identificar a atenção dada ao fato de que a sociedade atual, que está condicionada a mudanças globais e instantâneas, e na qual a informação tem sido gerada e propagada com uma velocidade cada vez maior, necessita não somente de produzir um grande número de dados, mas é preciso que o cidadão seja capaz de manipular e interpretar esses dados transformando-os em conhecimento e agregando valor. O texto abaixo nos descreve de forma mais detalhada as expectativas em relação às necessidades de formação dos futuros cidadãos, ou seja, do “topos” que o estudante deve desempenhar na escola e na sociedade. 59 O PCN+ aponta as transformações que estão ocorrendo nas escolas posicionando o novo papel que professor e estudante devem desempenhar na sociedade e destaca assim o novo significado da escola que precisa levar em conta as necessidades da sociedade no desenvolvimento dos conhecimentos das diferentes disciplinas que compõem áreas distintas, não restando fechada entre seus muros sem se preocupar com seu entorno. Para isso, no documento podemos identificar que os estudantes precisam assumir seu papel, porém para isso é preciso que eles compreendam qual o papel da escola e do professor, ou seja, necessitamos de estudos que mostrem como professores e estudantes podem se apropriar de seus “topos” da forma como eles são definidos nos documentos oficiais. Trata-se de propostas inovadoras e interessantes, mas que exigem um preparo dos professores e estudantes para que possam ser realmente implementadas, não basta apenas descrevê-las no documento sem indicar como trabalhá-las. A inovação do papel da escola articulada com as orientações contidas nos PCNEM, contemplando elementos que não eram explicitamente abordados, demonstra novas preocupações, em que cada disciplina foca um conjunto de saberes, não se limitando apenas a determinados tópicos, mas articulando competências gerais e habilidades no sentido formativo. Mas, para que esse trabalho tenha resultado, temos ainda que realizar diversas pesquisas e preparar professores e estudantes para essa nova forma de apropriação do conhecimento. Apresentamos a seguir as propostas de Matemática Financeira para o Ensino Médio identificando qual o “topos” esperado do professor e do estudante. 3.4 OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO MÉDIO (PCN+) – PROPOSTAS PARA ENSINO DE MATEMÁTICA FINANCEIRA Entre as inovações sugeridas pelo PCN+ está o envolvimento de cada escola e professores por meio da criação de um projeto pedagógico que possibilite o desenvolvimento das competências almejadas, em que diversos fatores influenciam 60 a constituição desse projeto, e a escolha dos temas ligados às disciplinas tem uma importância definidora. Entre as sugestões encontramos: a exploração dos conteúdos associados aos diferentes temas, à identificação da articulação de diferentes formas do pensamento matemático, a contextualização do conhecimento matemático e a possibilidade de considerar as razões históricas que deram origem e importância a esses conhecimentos, porém se observa a necessidade de escolhas organizadas e coerentes para evitar um trabalho centrado apenas na quantidade de informações. Segundo os PCN+, os temas escolhidos devem apresentar relevância científica e cultural, ou seja, quando se consideram a origem e a importância histórica devemos levar em conta o potencial explicativo do material escolhido de modo que os estudantes possam compreender os princípios estéticos e éticos associados aos fatos mundiais que deram origem e relevância ao fato matemático estudado. Essa forma de tratamento da história pode auxiliar os professores no desenvolvimento das tecnologias associadas às técnicas por eles utilizadas para o desenvolvimento das tarefas possíveis de serem trabalhadas no Ensino Médio, tanto quando se reputam as aplicações na própria Matemática como nas outras ciências. No último caso é preciso que o professor fique atento para o fato de que o estudante deve dispor de conhecimentos associados a esse novo campo de aplicação da noção matemática que se deseja trabalhar. Os temas são agrupados entre grandes eixos, a saber: Álgebra: números e funções; Geometria e medidas e Análise de dados A noção de juros simples e compostos, objeto de estudo desta pesquisa, encontra-se no bloco Álgebra: números e funções. Para essa noção a sugestão é que se revisite a ideia de proporcionalidade e de juros simples e compostos, que já deve ter sido trabalhada no Ensino Fundamental, articulando-a com o conceito de função, ou seja, a noção de juros faz parte do bloco Álgebra: números e funções, sendo articulada ao estudo das funções, que, conforme o PCN+ deve permitir que os estudantes adquiram a linguagem algébrica justificando tratar-se da linguagem das ciências. Em relação a esse citamos Chevallard (1994), que apresenta dois 61 exemplos de técnicas para a noção de proporcionalidade ressaltando que a compreensão de uma noção difere segundo a técnica utilizada. Apresentamos abaixo o exemplo proposto por Chevallard para mostrar duas técnicas que sobrevivem atualmente no tocante à noção de proporcionalidade, ou seja, duas praxeologias distintas para o tratamento dessa noção: Fonte: CHEVALLARD, 1994, p. 6. Além disso, sabemos que a álgebra se mostra bastante adequada para modelar fenômenos intra e extrasmatemáticos e, em geral, seu ostensivo de representação gráfica se mostra o mais adaptado para a interpretação e controle dos resultados encontrados, principalmente para os tipos de tarefas trabalhadas no Ensino Médio. Na sequência das sugestões para o desenvolvimento da noção de função propõe-se abandonar o tratamento tradicional, em que se introduzem o conjunto dos números reais e a noção intuitiva de conjuntos e suas operações e relações, sendo a noção de função um caso particular da noção de relações entre conjuntos, para dar ênfase à descrição de situações de dependência entre duas grandezas, isto é, as situações contextualizadas que podem ser modeladas por meio dos ostensivos de representação algébrica e representação gráfica que devem permitir o planejamento, execução, justificação e controle do modelo desenvolvido. Sugere-se ainda que se evite o tratamento formal excessivo, o que conduz ao abandono das noções de funções injetoras, sobrejetoras e bijetoras, que, sendo utilizadas para tratar problemas em computação e informática, poderiam ser contextualizadas nesse campo, que é atualmente bastante escolhido pelos estudantes que desejam continuar seus estudos, ou seja, parece que existe certa tendência em trabalhar com situações cotidianas deixando à margem as situações contextualizadas em outras ciências. Isso pode se explicar pela necessidade de dispor de conhecimentos prévios associados a essas ciências. Segundo as 62 sugestões dos PCN+, o tratamento dessas propriedades das funções fica totalmente a cargo do Ensino Superior, o que corresponde a uma mudança nas relações institucionais anteriores a esse documento, que ainda precisa ser assimilada. Mesmo não se tratando de um conceito que tem relação direta com a noção desenvolvida na nossa pesquisa, ela se mostra importante para que possamos compreender a importância de estar atento à ecologia dos conhecimentos matemáticos nas diferentes propostas de ensino e aprendizagem. No documento é dada ênfase ao fato de que as funções permitem uma vasta gama de aplicações que podem ser retiradas do cotidiano e das outras ciências. Nele se coloca em evidência que a Matemática Financeira é uma área de conhecimentos que permite a aplicação das funções exponenciais e logarítmicas, a análise da variação entre duas variáveis para as quais a variável independente tem crescimento muito rápido, ou seja, além de sugerir a aplicação dessas funções no estudo da Matemática Financeira, recomenda-se que se interpretem os resultados mostrando como se dá a variação de uma grandeza em relação à outra. Aqui podemos observar a necessidade de uma tecnologia associada à técnica para justificar os resultados encontrados. Apresentamos a seguir as expectativas institucionais que estão sendo implementadas no estado de São Paulo a partir de 2008. 3.5 A NOVA PROPOSTA CURRICULAR DO ESTADO DE SÃO PAULO A nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo foi lançada em 2008 e pretende ser inovadora e ousada, apoiando-se em vários materiais pedagógicos (apostilas, jornais e DVDs) que foram distribuídos a todas as escolas da rede pública do Estado de São Paulo, ou seja, observamos aqui a necessidade de melhor explicitar as propostas anteriores, um papel que pretende desempenhar essa nova proposta a partir de seu lançamento.Inicialmente foi distribuído o Jornal do Aluno (caderno com atividades para que os estudantes revisitem conteúdos trabalhados nas séries anteriores), que corresponde a um dos materiais pedagógicos desenvolvidos nessa Nova Proposta que deveria ser utilizado nos primeiros quarenta dias letivos do ano de 2008. 63 O objetivo desse jornal era oferecer subsídios para professores e estudantes na realização das atividades em sala de aula, para ser trabalhada em um período chamado de recuperação intensiva, que enfatizaria a leitura, a produção de textos pelos alunos e a Matemática. Esse recurso foi apresentado de acordo com as orientações que constam do texto abaixo: O material foi dividido em fundamental e médio, por disciplina/série e apresentava em seu teor o número específico de aulas necessárias para a aplicação de cada conteúdo predeterminado e trouxe de forma detalhada possibilidades de aplicação e de avaliação das atividades propostas para o aluno portador do Jornal (SÃO PAULO, 2008, p. 50). Na sequência da implantação da nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo, após o período de recuperação intensiva com uso do Jornal do Aluno, Revista do Professor e Vídeos Tutoriais, todas as escolas da rede receberam da Secretaria de Estado da Educação o novo material, “Caderno do Professor”, que indicaria os conteúdos e a forma de tratamento destes, que deveriam ser trabalhados por professores e estudantes no início do primeiro bimestre. A introdução desses cadernos está associada à necessidade de garantir pelo menos o trabalho sobre um conteúdo mínimo e uma relação institucional mais uniforme para as diversas escolas do Estado de São Paulo, como podemos observar no texto abaixo: O texto de Apresentação da Cartilha vem assinado pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo Maria Helena Guimarães de Castro que justifica a necessidade de uma Proposta Curricular com a seguinte frase: “A criação da Lei de Diretrizes e Bases (LDB), que deu autonomia às escolas para que definissem seus próprios projetos pedagógicos, foi um passo importante. Ao longo do tempo, porém, essa tática descentralizada mostrou-se ineficiente” (SÃO PAULO, 2008a, SP). A nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo é constituída por: Ciências da Natureza e suas Tecnologias – Biologia, Química e Física – Matemática e Ciências Humanas e suas Tecnologias História, Geografia, Filosofia e Psicologia e Linguagens, Códigos e suas Tecnologias – Língua Portuguesa, Língua Estrangeira Moderna, Arte e Educação Física. 64 Os objetivos essenciais expostos no documento pressupõem oferecer aos estudantes uma formação vinculada com seu tempo, em que a escola assume uma nova postura e uma aprendizagem que dá ênfase à articulação dos conteúdos e que leve em conta o contexto cultural. O documento destaca ainda a importância do saber fazer baseado na leitura e escrita, valorizando a produção de textos e articulação das competências com a aprendizagem e o mundo do trabalho. No texto abaixo identificamos as observações acima e mais uma vez verificamos que existe uma preocupação para que se desenvolva uma relação institucional com uma base comum de conhecimentos e competências nas diversas escolas públicas estaduais de São Paulo. A apresentação da Proposta Curricular do Estado de São Paulo está dividida em dois tópicos: Uma educação à altura dos desafios contemporâneos e Princípios para um currículo comprometido com o seu tempo. (Este segundo tópico apresenta os seguintes itens: I) Uma escola que também aprende; II) O currículo como espaço de cultura; III) As competências como referência; IV) Prioridade para a competência da leitura e da escrita; V) Articulação das competências para aprender e VI) Articulação com o mundo do trabalho. Assegura ainda que esta iniciativa procura “[...] garantir a todos uma base comum de conhecimentos e competências, para que nossas escolas funcionem de fato como uma rede [...]” priorizando a competência de leitura e escrita (SÃO PAULO, 2008a, p.15). Podemos observar que as sugestões apresentadas na proposta ressaltam que o trabalho é uma forma de associar o currículo com a realidade enfrentada pelos estudantes, bem como que o currículo contribui para o entendimento da importância do trabalho. Além disso, observamos a necessidade de que todos os integrantes do processo de ensino e aprendizagem tenham uma participação ativa e comprometida para propiciar aos jovens condições de caminhar em uma nova sociedade, em que alguns fatores vêm sendo alterados e inovados, por exemplo, a necessidade de comprovar as competências aprendidas na escola, cujo papel é oferecer uma educação de qualidade que possibilite a inserção dos indivíduos, em particular, os mais pobres, na sociedade. Atentamos que uma das preocupações da nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo é destacar que existe a necessidade de as escolas públicas proporcionarem condições de aprendizado para que os estudantes se apropriem do conhecimento de forma a se tornarem esclarecidos e 65 saberem utilizar o conhecimento obtido na escola para agregar valores e enfrentar os desafios da sociedade moderna. Adverte que “[...] não há liberdade sem possibilidade de escolhas [...]”, portanto é necessário que os alunos tenham “[...] acesso a um amplo conhecimento dado por uma educação geral, articuladora, que transite entre o local e o mundial [...]” (SÃO PAULO, 2008a, p. 11). A Proposta Curricular ora discutida apresenta como princípios centrais: “[...] a escola que aprende, o currículo como espaço de cultura, as competências como eixo de aprendizagem, a prioridade da competência de leitura e de escrita, a articulação das competências para aprender e a contextualização no mundo do trabalho” (SÃO PAULO, 2008a, p. 11). Tendo um currículo que promove a aprendizagem de competências e habilidades, a atuação do professor, os conteúdos propostos, as metodologias e a aprendizagem dos alunos compõem um sistema comprometido com a formação de crianças e jovens em adultos aptos a exercer suas responsabilidades – trabalhar, constituir uma família e ser autônomo – e com condições de atuar na sociedade de forma produtiva (SÃO PAULO 2008a, p. 13). A principal característica dessa nova Proposta é desenvolver um currículo que favoreça o desenvolvimento de competências e habilidades em que o “topos” do professor e do estudante está centrado na responsabilidade e comprometimento de ambos para que possam executar o projeto pedagógico em uma ação orquestrada em que cada um cumpre seu papel, o que deve conduzir os estudantes à aplicação dos conhecimentos aprendidos na escola de forma autônoma e produtiva no contexto social e cultural que o cerca.Observa-se também que essa nova proposta permite identificar um novo “topos” do professor que deve analisar as necessidades dos diferentes grupos de estudantes e propor um trabalho que leve em conta seus conhecimentos prévios e que permita a inserção de todos evitando as desigualdades. Para isso, supõe-se que o professor encontre meios para estimular os mais frágeis criando uma diversidade de tratamentos, isto é, não se escolhe um tratamento igual para todos, mas procura-se manter pelo menos uma base comum. Certamente cabe ao professor buscar novas estratégias e metodologias para trabalhar essas diversidades. Este currículo amparado no conceito de competências propõe que a escola e o professor indiquem claramente o que o aluno vai aprender, o que é indispensável que este aluno aprenda, garantindo desta forma a todos “[...] igualdade de oportunidades, diversidade de 66 tratamento e unidade de resultados. Quando os pontos de partida são diferentes, é preciso tratar diferentemente os desiguais para garantir a todos uma base comum” (SÃO PAULO, 2008a, p. 15). Os propósitos apresentados na nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo lembram a autonomia concedida às escolas pela Lei de Diretrizes e Bases para que definam seus próprios projetos pedagógicos. Passo importante e inovador diante da heterogeneidade da população estudantil brasileira. O documento oferece subsídios aos profissionais ligados à educação. Notamos que a preocupação central do documento está em realizar um amplo levantamento do acervo documental e técnico pedagógico existente e envolver escolas e professores com o objetivo de sistematizar e compartilhar boas práticas articulando sucessos anteriores e novos para uma significativa contribuição a todos os estudantes. Identificamos princípios para promover uma escola que permita a promoção de competências necessárias aos estudantes para que estes tenham condições de enfrentar os novos desafios sociais e globais. Entre os objetivos da Nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo está o de aproximar conteúdos escolares com o universo da cultura buscando instrumentos que deem aos estudantes condições de enfrentar o mercado de trabalho. Uma das características da nova proposta é manter a Matemática como uma área específica, proposta que sobreviveu a várias sugestões passageiras e que hoje é ponto de partida para atualizações e novas práticas. No Estado de São Paulo, nas propostas curriculares elaboradas a partir de 1986 e em vigor até o presente momento, a Matemática era apresentada como uma área específica. Tais propostas constituíram um esforço expressivo, e em alguns sentidos pioneiro, na busca de uma aproximação entre os conteúdos escolares e o universo da cultura, especialmente no que tange às contextualizações e à busca de uma instrumentação crítica para o mundo do trabalho. Essa rica herança pedagógica sobreviveu a uma avalanche de novidades passageiras e serve agora de ponto de partida para que, incorporadas as necessárias atualizações, novos passos sejam dados para sua efetivação nas práticas escolares. Particularmente no que tange às áreas em que se organiza, a nova proposta inspirouse na anterior, mantendo a área de Matemática como um terreno específico, distinto tanto das Linguagens quanto das Ciências Naturais (SÃO PAULO, 2008, p. 38). 67 Na sequência, o texto releva e resgata a posição da Matemática em outras épocas apresentando a posição da Matemática e língua materna que em todas essas propostas têm sido consideradas como eixo fundamental para a formação do cidadão. Tendo afinidade ou não com a Matemática, as crianças estudam essa ciência durante toda a Educação Básica e a utilizam de forma consciente ou não em sua vida cotidiana, pois em nossa sociedade todas as pessoas direta ou indiretamente lidam com números, medidas, gráficos nas mais variadas situações, por exemplo, nas decisões de compra e venda em que os conhecimentos matemáticos os auxiliam nas tomadas de decisões. O texto acima justifica a manutenção de uma área específica para a Matemática e seu papel de ferramenta para resolução de problemas em outras ciências, o que permite tratar exemplos contextualizados, principalmente no Ensino Médio em que podemos articular os conhecimentos matemáticos com os desenvolvidos nas disciplinas de física, química, biologia, desde que os estudantes disponham de conhecimentos básicos sobre essas ciências. Ou seja, quando existe a possibilidade de um trabalho interdisciplinar, que vem sendo incentivado e que pode contribuir para incentivar os estudantes a encontrar as relações entre os conhecimentos desenvolvidos nas diferentes disciplinas, cabe ao professor buscar novas estratégias para favorecer esse trabalho. Observamos ainda que os conteúdos matemáticos estão distribuídos por séries e bimestre e que para as noções de função exponencial e logarítmica supõe-se que sejam desenvolvidas no 3.º bimestre da 1.ª série do Ensino Médio e é nesse momento que podemos trabalhar as noções de juros compostos. Mesmo se esse trabalho não é proposto explicitamente nos documentos e cadernos, lembramos aqui que se trata de uma aplicação muito frequente na vida cotidiana e que pode auxiliar os estudantes a melhor exercer sua cidadania, pois estes são constantemente bombardeados com propagandas que não correspondem à realidade, as quais muitos deles não são capazes de avaliar corretamente. Função exponencial e logarítmica Crescimento exponencial Função exponencial, equações e inequações. Logaritmos 68 Nesse momento, os professores poderiam recorrer a essas propagandas para contextualizar o trabalho com as funções exponenciais e logarítmicas e mostrar sua utilidade, mesmo para aqueles que não desejam continuar seus estudos ou que se interessa por áreas em que não é necessário conhecimento específico desse tipo de função. Considerando as necessidades para o desenvolvimento da disciplina de Matemática Financeira nos cursos de Administração, identificamos, via planos de ensino de duas universidades públicas, Universidade Federal do Amazonas e Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e duas universidades privadas, Fundação Getúlio Vargas – Escola de Administração de Empresas de São Paulo e Faculdade das Américas, que conhecimentos matemáticos trabalhados durante a Educação Básica são supostos disponíveis ou se esses são revisitados durante a introdução de novos conhecimentos de forma a auxiliar os estudantes na solução de tarefas que serão submetidos durante sua vida escolar e profissional. Apresentamos a seguir as análises realizadas nos planos de ensino das quatro universidades citadas acima. 3.6 ESTUDOS DE QUATRO PLANOS DE ENSINO DE UNIVERSIDADES PÚBLICAS E PRIVADAS A análise dos quatro planos de ensino nos auxilia a compreender quais as relações institucionais esperadas dos estudantes do Ensino Superior e se existe uma preocupação em revisitar as noções de juros simples e compostos associandoas aos novos conhecimentos ou se elas são supostas disponíveis e consideradas apenas como parte do “topos” do estudante, que deverá se apropriar desses conhecimentos de forma autônoma. Procuramos assim identificar nesses documentos qual a relação institucional esperada dos estudantes dos cursos de Administração quando se trabalha com Matemática Financeira e como os conhecimentos matemáticos desenvolvidos no Ensino Médio são considerados nessas propostas, ou seja, são supostos disponíveis ou são revisitados por meio de exemplos específicos da disciplina, ou melhor, existe uma preocupação em contextualizar a Matemática que se supõe tenha sido desenvolvida na Educação Básica. 69 Observamos assim qual o “topos” esperado dos professores e estudantes tanto do ponto de vista das noções matemáticas trabalhadas nesses cursos como do trabalho didático que os professores devem realizar ao qual se espera que os estudantes se submetam. Para isso, consideramos nos conteúdos propostos se existem sugestões para o tratamento das noções de juros simples e compostos. Essa análise é levada em conta em função da bibliografia básica e complementar encontrada nesses documentos, ou seja, isso nos permite identificar quais as relações institucionais esperadas para o desenvolvimento das noções de juros simples e composto e como essas noções devem ser reputadas e trabalhadas. Para identificar o “topos” de professores e estudantes quanto ao trabalho didático a ser realizado, foram considerados a metodologia proposta e o processo de avaliação.Os resultados dessas análises são cruzados com os encontrados para o Ensino Médio e assim respondemos a questão: Existe uma coerência entre o que é proposto para o Ensino Médio e Superior? No quadro abaixo, apresentamos as universidades escolhidas, sobre as quais encontramos material na internet ou que professores disponibilizaram esse material. Universidade Federal do Amazonas Universidade Federal do Rio Grande do Sul Fundação Getúlio Vargas – Escola de Administração de Empresas de São Paulo Faculdade das Américas Apresentamos na sequência o estudo do trabalho esperado de professores e estudantes do Ensino Superior via planos de ensino das universidades citadas acima. 3.7 ANÁLISE DO PLANO DE ENSINO DE DUAS UNIVERSIDADES FEDERAIS E DUAS UNIVERSIDADES PRIVADAS Nessa análise identificamos inicialmente se existe coerência entre os planos de ensino, das universidades consideradas e as orientações apresentadas nas Diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de graduação em Administração (anexo 1), quando se considera a noção de juros simples e compostos. 70 Verificamos também, nesses mesmos planos de ensino, qual a proposta para o “topos” do professor e do estudante. Essa análise será fundamentada na metodologia de ensino indicada nesses planos. Outra preocupação foi verificar que conceitos são revisitados e quais os assuntos trabalhados pela primeira vez. Para essa tarefa, identificamos nos conteúdos propostos se existem sugestões para o tratamento das noções de juros simples e compostos ou se essas noções são tratadas como conhecimentos disponíveis.Outro aspecto da análise dos planos de ensino é verificar se o conteúdo programático indicado é coerente com o desenvolvido nos livros didáticos que constituem a bibliografia básica e complementar. Iniciamos pela análise do plano de ensino da Universidade Federal do Amazonas (UFAM). 3.7.1 ANÁLISE DO PLANO DE ENSINO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS (UFAM) Para facilitar o entendimento de nossa análise preparamos dois quadros: o primeiro demonstrando o que é indicado pelas Diretrizes Curriculares do Curso de Graduação em Administração e, em seguida, outro quadro apresentando o plano de ensino da UFAM (anexo 2), finalizando com uma análise centrada na identificação do “topos” do professor e do estudante e na forma como é proposto o trabalho com as noções de juros simples e compostos. 3.7.2 DIRETRIZES CURRICULARES DO CURSO DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS O quadro abaixo demonstra os conteúdos curriculares indicados nas Diretrizes Curriculares para os cursos de Administração de Empresas. Os cursos de graduação em Administração deverão contemplar, em seus projetos pedagógicos e em sua organização curricular, conteúdos que atendam aos seguintes campos interligados de formação: I – Conteúdos de Formação Básica: estudos relacionados com as Ciências Sociais, a Filosofia, a Psicologia, a Ética, a Política, o Comportamento, a Linguagem, a Comunicação e 71 Informação;II – Conteúdos de Formação Profissional, compreendendo Estudos da Teoria da Administração e das Organizações e suas respectivas funções, dos Fenômenos Empresariais, Gerenciais, Organizacionais, Estratégicos e Ambientais, estabelecidas suas inter-relações com a realidade social, objetivando uma visão crítica da validade de suas dimensões, bem como os aspectos legais e contábeis; III – Conteúdos de Formação Complementar, compreendendo Estudos Econômicos, Financeiros e de Mercado, e suas inter-relações com a realidade nacional e internacional, segundo uma perspectiva histórica e contextualizada de sua aplicabilidade no âmbito das organizações e na utilização de novas tecnologias; IV – Conteúdos de Estudos Quantitativos e suas Tecnologias, abrangendo Pesquisa Operacional, Teoria dos Jogos, Modelos Matemáticos e Estatísticos e aplicação de tecnologias que contribuam para a definição e utilização de estratégias e procedimentos inerentes à Administração. Fonte: Diretrizes Curriculares do Curso de Administração. Parecer n. 67 CES/CNE 0146/2002, p. 15. Atentamos que não existe uma preocupação específica em propor conteúdos para as disciplinas dos cursos de Administração e que as orientações dão ênfase à inter-relação entre conteúdos básicos, de formação profissional e complementar, assim como os estudos quantitativos associados às tecnologias, que permitam a utilização de estratégias e procedimentos próprios à Administração. Esse trabalho faz parte do “topos” dos professores que compõem o grupo e que deverão organizar os diferentes conteúdos de forma a integrá-los conforme a proposta acima. Observamos ainda que existe a preocupação em propiciar ao egresso do curso de Administração condições de ser flexível ao tratar situações inesperadas e divergentes em seu campo de atuação. 3.7.3 PLANO DE ENSINO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS Os objetivos do plano de ensino da UFAM: Desenvolver a capacidade de raciocinar em termos financeiros, ou seja, com referência à diferenciação do valor do dinheiro no tempo; Desenvolver a capacidade de manipular fluxos de caixa com vistas a avaliar valores presentes e futuros de entradas e saídas de recursos financeiros em uma empresa; Dominar a metodologia de consulta às Tabelas Financeiras e o manuseio de calculadora financeira. Fonte: Plano de Ensino da Universidade Federal do Amazonas, 2007, p. 1. 72 A metodologia: Aulas expositivas com auxílio do quadro branco, pincéis e retroprojetor. Utilização, pelos alunos, de Tabelas Financeiras e de Calculadora Financeira para dar suporte ao aprendizado dos métodos e técnicas expostos em sala de aula. Realização de trabalhos em grupo na própria classe, para consolidar a compreensão dos conceitos, métodos e técnicas ensinados nas aulas expositivas. Consulta, pelos alunos, da Biblioteca e da Internet. Fonte: Plano de Ensino da Universidade Federal do Amazonas, 2007, p. 1. A análise do plano de ensino da UFAM permite verificar que existe coerência com o sugerido pelas Diretrizes Curriculares do Curso de Administração, sendo muito importante o entendimento da participação da relação do dinheiro no tempo perante as flutuações do mercado financeiro nacional e internacional. O conhecimento da capitalização linear e exponencial, ou seja, juros simples e juros compostos possibilitam uma visão sobre os fatos financeiros e contábeis e suas repercussões na sociedade como um todo, proporcionando ao estudante o exercício de cidadania quando diante de negociações de compra venda e ou financiamentos. Isso permite considerar que o “topos” esperado do estudante de Administração está associado à capacidade de entender os processos gerenciais econômicos financeiros e de produção. Essa competência é privilegiada no plano de ensino da UFAM. Atentamos que as Diretrizes Curriculares sugerem processos para aprendizagem do estudante diante de novas realidades em um mundo organizacional competitivo. Identificamos no plano de ensino da UFAM a preocupação em desenvolver condições para que o estudante seja capaz de pensar financeiramente, articulando a relação do dinheiro no tempo, e entender a necessária importância do papel dos recursos financeiros para a sobrevivência das organizações. Outro aspecto da análise dos planos de ensino é verificar se o conteúdo programático indicado é coerente com o desenvolvido nos livros didáticos, relação dos conhecimentos existentes, que constituem a bibliografia básica e complementar e que permite observar se existe uma preocupação de revisitar as noções de juros simples e compostos desenvolvidos no Ensino Médio. 73 Para isso, identificamos os dois livros apontados na bibliografia básica – Abelardo de Lima Puccini, Matemática financeira objetiva e aplicada, mencionado neste trabalho por livro 1, e José Dutra Vieira Sobrinho, Manual de aplicações financeiras HP-12C, indicado neste trabalho como livro 2. No livro 2, nota-se que ocorre um forte destaque para o uso da Calculadora Financeira HP12C, o que reflete bem as habilidades esperadas pelas empresas dos egressos do curso de administração. Nesse livro, as noções de juros simples e compostos são supostas disponíveis, ficando a cargo de o professor revisitá-las quando necessário ou simplesmente deixar esse trabalho sob a responsabilidade dos estudantes, ou ainda indicar outros meios que os auxiliem a se apropriar desses conhecimentos. No livro 2, a ênfase é dada para a resolução de problemas direcionados ao mercado imobiliário e bancário. Nesse caso, as noções de juros simples e compostos também são supostas disponíveis.As indicações bibliográficas deixam evidente que se espera que os estudantes disponham das ferramentas matemáticas necessárias para o desenvolvimento dos conteúdos de matemática financeira nos diferentes contextos associados à profissão do administrador. 3.7.4 COMENTÁRIOS E ANÁLISES Observamos que existe certa coerência entre as Diretrizes Curriculares e o Plano de Ensino da UFAM e que as noções de juros simples e compostos são supostas disponíveis se considerarmos os livros indicados na bibliografia básica. No entanto, existe a possibilidade de revisitar esses conteúdos, uma vez que no apêndice dessas obras essas noções são consideradas por meio de fórmulas e exemplos, o que indica a necessidade de um trabalho autônomo específico que fica a cargo dos estudantes que não dispõem desses conhecimentos, ou seja, revisitar conhecimentos prévios supostos disponíveis corresponde ao “topos” do estudante. Na bibliografia complementar são sugeridos outros livros de Matemática Financeira aplicada à análise de investimento, o que corresponde à capacidade de transferir conhecimentos da vida e de experiências cotidianas para o campo profissional, como indicam as Diretrizes Curriculares do Curso de Administração. 74 As análises mostram coerência entre as indicações das Diretrizes Curriculares e o plano de ensino da UFAM, deixando evidente que as noções de juros simples e compostos são consideradas como conhecimentos prévios disponíveis, ficando a cargo de o professor revisitá-las, ou deixando esse trabalho para os estudantes, que nessa etapa escolar se supõe tenham autonomia suficiente para identificar suas dificuldades e procurar meios para superá-las. Apresentamos a seguir as análises do plano de ensino da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS (anexo 3). 3.8 ANÁLISE DO PLANO DE ENSINO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL – INSTITUTO DE MATEMÁTICA – DEPARTAMENTO DE MATEMÁTICA PURA E APLICADA Seguindo a mesma organização para a análise, apresentamos apenas um quadro com o plano de ensino da UFRGS e alguns comentários conforme nossa proposta inicial. Os objetivos do plano de ensino da UFRGS: Entender e resolver os problemas de empréstimos financeiros mais usuais do mercado financeiro através dos conceitos da Matemática Financeira. Valer-se tanto de fórmulas quanto de recursos de cálculo pré-programados encontrados em calculadoras financeiras para a solução dos problemas com empréstimos financeiros. Fonte: Plano de Ensino da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2008, p. 1. A metodologia: O principal recurso didático é o de aulas expositivas. O conteúdo enfocará sempre aplicações práticas do mundo dos negócios. As provas de avaliação serão antecedidas por aulas de revisão da matéria. O uso da calculadora financeira será o principal instrumento de apoio. Fonte: Plano de Ensino da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2008, p. 1. 75 A análise das Diretrizes Curriculares do Curso de Administração e do Plano de Ensino da UFRGS permite identificar que o objetivo do Curso de Administração dá ênfase às aplicações voltadas para o mundo dos negócios, o que coincide com indicações das Diretrizes Curriculares. É possível identificar como “topos” do professor a necessidade de revisitar os conteúdos desenvolvidos durante o curso antes das avaliações. Nesse caso, podemos supor que as noções de juros simples e compostos também podem ser revisitadas nas aulas durante o curso. Ao identificar as relações institucionais esperadas em função dos livros didáticos considerados na bibliografia básica, observamos que existe uma preocupação constante em revisitar as noções matemáticas trabalhadas no Ensino Médio de forma contextualizada e, quando possível, utilizando ferramentas de informática que integram o campo profissional, como o Aplicativo Microsoft Excel. 3.8.1 COMENTÁRIOS E ANÁLISES A análise dos objetivos e da metodologia propostos no plano de ensino da UFRGS permite concluir que existe coerência com as indicações das Diretrizes Curriculares do Curso de Administração. Em relação ao conteúdo, cabe também ao professor escolher a melhor maneira de trabalhá-lo, e as noções de juros simples e compostos parecem ser objeto de estudo quando os estudantes encontram dificuldades, pois se considera um momento para revisão dos conteúdos antes das avaliações, e podemos supor que nessas revisões é possível revisitar noções e conceitos matemáticos que apresentam dificuldades para os estudantes.Além disso, podemos mais uma vez considerar que esses estudantes têm autonomia suficiente para procurar outros meios para superar as dificuldades encontradas, principalmente aquelas associadas à falta de conhecimentos prévios supostos disponíveis.Apresentamos a seguir as análises propostas para o Curso de Administração da Faculdade das Américas. 3.9 ANÁLISE DO PLANO DE ENSINO DAS FACULDADES DAS AMÉRICAS Dando continuidade à análise de planos de ensino das universidades escolhidas, consideramos agora a Faculdade das Américas (anexo 4), uma instituição privada de Ensino Superior localizada no interior de São Paulo. 76 Expomos abaixo os objetivos indicados no plano de ensino do Curso de Administração da Faculdade das Américas para verificar se ele é coerente com as Diretrizes Curriculares do curso. Os objetivos do plano de ensino da Faculdade das Américas: Fornecer subsídios para que o estudante seja capaz de agir, refletir, encontrar soluções para situações novas, saber pesquisar, dominar técnicas e conceitos de matemática financeira. Analisar e solucionar problemas que envolvam decisões quanto ao uso de dinheiro no tempo, tanto para as empresas como para os cidadãos. Fonte: Plano de Ensino da Faculdade das Américas, 2009, p. 1. O objetivo do curso é coerente com a proposta das Diretrizes Curriculares do Curso de Administração, deixando claro que o egresso deste curso deve estar preparado para solucionar problemas que envolvam decisões sobre as melhores formas de utilização do dinheiro tanto para a aplicação no desenvolvimento das empresas como para suas próprias escolhas enquanto cidadão. Para isso, cabe ao estudante realizar trabalhos individuais e em grupos para complementar os estudos desenvolvidos em sala de aula com o professor, isto é, o professor desenvolve o conteúdo e propõe trabalhos para que os estudantes ampliem seus conhecimentos, aprendam a trabalhar em grupo e se tornem autônomos, sendo capazes de resolver situações escolares e profissionais para as quais eles deverão apresentar as competências necessárias no final do curso. Observamos também que cabe ao professor identificar os conteúdos que não são disponíveis e revisitá-los de modo que a interação entre conhecimentos prévios e novos conhecimentos tornem os primeiros mais ricos, mais diferenciados, mais elaborados em termos e significados, e os segundos possam adquirir significado para o aprendiz, conforme afirma Moreira (2005).Ressaltamos ainda que a bibliografia básica do curso é composta pelas mesmas obras das universidades públicas aqui analisadas, ou seja, a relação institucional esperada para o desenvolvimento do curso varia em função do trabalho do professor e dos estudantes, ou seja, os livros podem auxiliar tanto professor como estudante no desenvolvimento de uma relação pessoal aos objetos de Matemática Financeira propostos no curso. 77 Ressaltamos ainda que esse curso, assim como os que já foram analisados, considera importante o uso da calculadora financeira, e que esse recurso faz parte do contexto diário das empresas, devendo assim ser reputado como mais uma competência para os estudantes dos Cursos de Administração. 3.9.1 COMENTÁRIOS E ANÁLISE A análise do plano de ensino da Faculdade das Américas permite considerar que cabe ao professor identificar as dificuldades de seus estudantes e utilizar novas estratégias para propor situações e tarefas que permitam que os estudantes adquiram as competências necessárias para utilizar a Matemática Financeira como uma ferramenta de trabalho que possa auxiliá-los na solução de problemas tanto empresariais como cotidianos, bem como escolher a melhor forma de pagamento na compra de uma determinada mercadoria. Certamente esse trabalho não fica somente a cargo do professor; os estudantes também podem propor novas situações que permitam ampliar seus conhecimentos e que os tornem autônomos na análise e decisão do valor do dinheiro no tempo. Apresentamos a seguir uma breve discussão sobre o que se espera do trabalho do professor e do estudante quando se considera a disciplina de Matemática Financeira para o Curso de Administração da Fundação Getulio Vargas – SP, uma das mais renomadas instituições dessa área. 3.10 PLANO DE ENSINO DA FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS – SÃO PAULO Iniciamos com a apresentação da cópia dos objetivos do curso de Matemática Financeira da Fundação Getulio Vargas – SP – FGV-SP (anexo 5). Objetivos do plano de ensino da FGV-SP: Esta disciplina tem por objetivo ensinar o aluno as diversas formas de fazer financiamentos e analisar investimentos como funções do valor do dinheiro no tempo. Ensinar o aluno a utilizar calculadora financeira e algumas funções financeiras do Excel. Instrumentar o aluno com ferramentas básicas para poder entender o valor do dinheiro no tempo e através disso poder avaliar a conveniência de financiamentos e investimentos e encontrar as melhores alternativas para cada caso, tanto do lado do agente financeiro quanto de seu cliente ou parceiro. 78 Acompanhar e decidir sobre a melhor alternativa a cada momento de financiamentos e projetos de investimentos de longo prazo que requerem intervenções pela mudança das situações de mercado verificadas ao início. Desenvolver nos alunos a lógica do raciocínio dedutivo e indutivo próprio dos assuntos relacionados à Matemática Financeira e ampliar o uso desse raciocínio a outras situações de negócios e do dia a dia. Fonte: Plano de Ensino da Fundação Getúlio Vargas – SP, 2009, p. 1. Considerando o plano de ensino apresentado acima, verificamos que, ao descrever que o objetivo é o estudante aprender as diversas formas de financiamentos e investimentos utilizando calculadora financeira e Excel, cabe ao professor propor situações que permitam trabalhar com esse material e supõe-se que os estudantes já disponham das noções de juros simples e compostos e possam utilizá-las nessas situações. Espera-se ainda que os estudantes se tornem autônomos e sejam capazes de aplicar a lógica do raciocínio dedutivo e indutivo em situações de negócios e do cotidiano.Comportamento esperado de professores e estudantes – Compromisso de ética entre professores e estudantes: Respeito do professor a todos os alunos, preparando-se para as aulas, respondendo às dúvidas dos alunos e avaliando-os com isenção e imparcialidade, e procurando ajudá-los no que estiver ao seu alcance. Respeito dos alunos ao professor e aos seus colegas comportando-se nas aulas de maneira a não prejudicar seu andamento normal e enriquecendo sempre que possível com perguntas e dúvidas pertinentes aos assuntos que estão sendo tratados. Preparar-se para as aulas de maneira a aproveitar ao máximo os ensinamentos oferecidos. Realização das provas por parte dos alunos de maneira totalmente individual sem procurar vantagens ilícitas, de modo a representar nas provas o caráter que prevalecerá no exercício de suas profissões e de seu comportamento perante a sociedade. Fonte: Plano de ensino da Fundação Getulio Vargas, 2009, p. 1. No plano de ensino da Fundação Getulio Vargas-SP encontramos a descrição explícita do comportamento esperado dos professores e estudantes, em que é possível identificar que cabe ao professor identificar as dificuldades dos estudantes e encontrar estratégias para auxiliá-los. Mas o estudante também é responsável por sua aprendizagem devendo se preparar para as aulas e mesmo enriquecê-las com perguntas pertinentes, ou seja, o estudante deve ser autônomo e ter responsabilidade por sua aprendizagem não esperando que todo o trabalho fique a cargo do professor e possa ser objeto de 79 estudo somente em sala de aula. Essa explicitação do “topos” do professor e do estudante é importante para a aprendizagem, pois deixa evidente que no processo de ensino e aprendizagem é preciso que todos desenvolvam seu papel e se respeitem. Finalizando a análise de planos de ensino,atentamos que a Fundação Getulio Vargas apresenta algumas peculiaridades e similaridades.Entre as semelhanças com os planos de ensino das outras duas Universidades e da Faculdade analisados, percebemos a preocupação em seguir as sugestões das Diretrizes Curriculares do Curso de Administração, destacando o uso do aplicativo Excel e da calculadora financeira HP 12C, no que se refere a posicionar o estudante diante das inovações tecnológicas, segundo o texto abaixo: Conteúdos de Estudos Quantitativos e suas Tecnologias, abrangendo Pesquisa Operacional, Teoria dos Jogos, Modelos Matemáticos e Estatísticos e aplicação de tecnologias que contribuam para a definição e utilização de estratégias e procedimentos inerentes à Administração (Parecer n. 67 CES/CNE 0146/2002, p. 15). Analisando as associações entre plano de ensino e Diretrizes Curriculares do Curso de Administração verifica-se que um dos destaques é possibilitar aos estudantes a apropriação de avaliação de financiamentos e investimentos, fato esse que não ficou muito explícito nos planos de ensino das outras instituições analisadas. A grande distinção do plano de ensino da Fundação Getulio Vargas com os outros planos aqui examinados está no fato de que o plano da Fundação prevê o comportamento esperado para professores e estudantes por meio do “Compromisso de Ética entre Professores e Estudantes”, que deixa evidente qual o “topo” do professor e do estudante desse curso, pois se trata de um compromisso válido para todas as disciplinas do curso.Isso conduz o estudante a desenvolver uma forma de trabalho, pois lhe é cobrada a responsabilidade pelo seu aprendizado explicitamente por meio desse compromisso. Finalmente, identificamos que, ao analisarmos as relações institucionais esperadas em função dos conteúdos a serem trabalhados e dos livros didáticos indicados na bibliografia básica, existe pouca diferença entre os quatro cursos e que as mesmas estão diretamente associadas ao trabalho de professores e estudantes 80 no desenvolvimento do curso e na responsabilidade individual de cada um, como deixa evidente o termo de compromisso desse curso. 3.10.1 COMENTÁRIOS E ANÁLISES O estudo do Plano de Ensino da Fundação Getulio Vargas – Escola de Administração de Empresas de São Paulo-SP apresenta como diferencial em relação aos três outros analisados acima a introdução do “Compromisso de Ética entre Professores e Estudantes”, que coloca em evidência a existência de um papel para o professor e para o estudante no processo de ensino e aprendizagem, e ambos devem trabalhar de forma orquestrada para não provocar ruídos que prejudiquem o bom desenvolvimento da disciplina em particular e do curso de um modo geral. Na sequência, fazemos algumas considerações sobre o capítulo no qual analisamos o “topos” do professor e dos estudantes nos documentos oficiais, ou seja, qual o papel que eles devem desempenhar segundo as propostas oficiais. 3.11 CONSIDERAÇÕES FINAIS Verificamos que existe uma preocupação institucional em propor mudanças tanto para “topos” do professor como para o “topos” dos estudantes, em que o primeiro deve desenvolver seu trabalho como orientador de tarefas que permitam que os estudantes encontrem suas próprias soluções, utilizando seus conhecimentos prévios e procurando novas situações que os permitam adquirir autonomia para controlar sua aprendizagem, sendo essa uma competência importante para sua atuação na sociedade e no mundo do trabalho.No entanto, essa nova relação institucional não é simples de alcançar e conduz à necessidade de pesquisas e propostas de cursos que auxiliem os professores a desenvolver atividades constituídas de situações contextualizadas como propõem os documentos oficiais, mas que dão poucas orientações sobre como desenvolver esse trabalho. Apesar de os cadernos da Nova Proposta do Estado de São Paulo ter sido construídos sob essa óptica e apresentarem exemplos de situações contextualizadas, observamos que neles os conhecimentos prévios dos estudantes 81 são considerados uniformes e podem dificultar o trabalho dos professores quando isso não ocorrer.Para os planos de ensino analisados verificamos que o principal recurso didático são as aulas expositivas. no tocante ao conteúdo nos quatro planos estudados, ocorre uma ênfase em aplicações práticas do mundo dos negócios. Outro fato que observamos foi o uso da calculadora financeira HP12C; todos os planos examinados induzem ao uso da máquina, e também há forte preocupação de posicionar o estudante diante das relações do dinheiro no tempo.Notamos que de uma forma geral nos planos analisados não existe explicitamente uma preocupação em revisitar conceitos recorrentes, ficando a cargo do professor identificar as dificuldades associadas a esses conceitos e propor estratégias que possibilitem o avanço dos estudantes, que também são responsáveis por seu próprio desenvolvimento e devem ser capazes de identificar dificuldades e procurar meio de superá-las. 82 Capítulo 4 OS TIPOS DE TAREFAS SOBRE JUROS SIMPLES E COMPOSTOS QUE SUSTENTAM AS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS DO ENSINO MÉDIO E SUPERIOR 4.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS Neste capítulo estudamos os tipos de tarefas que alimentam as relações institucionais sobre as noções de juros simples e compostos tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior. Para isso, a partir dos diferentes tipos de tarefas identificadas para essas duas etapas escolares construíram uma grade de análise que permite identificar o tipo de situação exposta no enunciado, os quadros em que a tarefa é enunciada e aqueles que possibilitam sua solução, os ostensivos manipulados na execução das tarefas e os não ostensivos evocados neste trabalho, o nível de conhecimento esperado dos estudantes tanto em relação ao novo conhecimento como aos conhecimentos prévios necessários para o desenvolvimento da tarefa. Essa grade foi construída a partir da grade apresentada por Dias (1998), em sua tese que trata da articulação de pontos de vista cartesiano e paramétrico no ensino de Álgebra Linear.Antes de apresentar os tipos de tarefa com exemplos sobre o funcionamento da grade, consideramos os quadros por nós identificados, os ostensivos e não ostensivos, que são utilizados nas tarefas identificadas e que possibilitam a descrição, interpretação e justificativa das técnicas empregadas, assim como algumas das possíveis técnicas que sobrevivem institucionalmente quando se trabalha com as noções de juros simples e compostos. 4.2 AS FERRAMENTAS DE ANÁLISE UTILIZADAS NA CONSTRUÇÃO DA GRADE Uma das noções que utilizamos como ferramenta para a análise das tarefas sobre as noções de juros simples e compostos, que, em geral, são consideradas no 83 Ensino Médio e Superior, é aquela sobre quadro para a qual distinguimos: quadro numérico, quadro algébrico e quadro geométrico. Para esses quadros apresentamos sua descrição, assim como os conhecimentos esperados, conhecimentos prévios disponíveis e um exemplo de ilustração. Quadro numérico: quando se utilizam apenas dados numéricos para enunciar e resolver a tarefa. Os conhecimentos prévios supostos disponíveis são as noções de números naturais, inteiros, racionais e reais e suas operações e propriedades. O exemplo abaixo corresponde a uma tarefa simples de cálculo de porcentagem. Exemplo: Qual o valor de 45% de 60? Fonte: Dante , 2008, p. 334 Solução: 45% = 0,45 45% de 60 = 0,45 x 60 = 27 27 é o valor que corresponde a 45% de 60. Nessa tarefa espera-se que o estudante transforme a taxa percentual (45%) em decimal (0,45) e então realize o produto para encontrar o valor pedido. Para isso, é preciso dispor de conhecimentos sobre: porcentagem, sua representação decimal e multiplicação com decimais. Quadro algébrico: quando é necessário identificar as variáveis por letras que no caso representam: prazo taxa, valor presente, valor futuro. É necessário dispor de uma fórmula para determinar o que se pede na tarefa. No caso de operações com capitalização linear (juros simples, M = C + j, j = C*i*t, onde M = montante, C=capital, j = juros, i = taxa e t = tempo) e em capitalização exponencial (juros compostos, M=C* (1 + i)t, onde M= montante, C= capital, i= taxa, t=tempo) é preciso associar os dados da tarefa com as variáveis que as representam na fórmula correspondente. 84 Exemplo: Quanto receberá de juros, no fim de um semestre, uma pessoa que investiu, a juros compostos, a quantia de R$ 6.000,00, à taxa de 1% ao mês? Fonte: Dante 2008, p.335 Solução: Primeira técnica: Calcular 1% de 6000 = 0,01. 6000 = 60 1% de 6060 = 60,6 1% de 6120,6= 61,206 1% de 6181, 806 = 61,81806 1% de 6243,6241 = 62,436241 1% de 6306,0603 = 63,060603 Somando: 60 + 60,6 + 61,206 + 61,81806 + 62,436241 + 63,060603 = 369,1209 Logo, a pessoa receberá 369,12 de juros. A partir da primeira técnica podemos deduzir a fórmula: M=C (1 + i)t e utilizar a segunda técnica para resolver a tarefa. Segunda técnica: Identificar os dados da tarefa com as varáveis correspondentes e determinar o que se pede. C = 6000, t = 1 semestre= 6 meses, i = 1% = 0,01 M = 6000(1 + 0,01)6 = 6369,120604 Logo, a pessoa receberá 369,12 de juros. A primeira técnica é bastante adequada para a passagem do quadro numérico para o quadro algébrico, pois podemos resolver pelo menos uma tarefa por meio dessa técnica e, a partir dela, deduzir a fórmula utilizada na segunda técnica, o que permite mostrar que a álgebra torna o trabalho matemático mais econômico. Nos dois casos é interessante utilizar uma calculadora, e, dependendo dessa ferramenta, é necessário um trabalho específico para o seu uso. Observamos ainda que, se a tarefa proposta exige apenas o cálculo de juros simples, podemos associar essa noção com os conceitos de função afim e progressões aritméticas e suas propriedades, enquanto para a noção de juros 85 compostos os conceitos de função exponencial e logarítmica e progressão geométrica podem ser articulados para mostrar que as noções de juros simples e compostos são casos particulares dos conceitos matemáticos considerados. Atualmente no Ensino Médio a articulação considerada acima é indicada nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio e trabalhada nos livros didáticos. Esse trabalho articulado possibilita uma melhor compreensão tanto dos conceitos matemáticos evocados quanto das noções de juros simples e compostos, pois trata-se de uma forma de revisitar conhecimentos prévios de maneira a tornálos mais ricos, mais diferenciados, mais elaborados em termos de significado, adquirindo assim mais estabilidade. Além dessa interação entre novos conhecimentos e conhecimentos prévios, esses últimos podem ser utilizados para o desenvolvimento de situações contextualizadas como a apresentada acima.Consideramos que trabalhar a passagem do quadro numérico para o quadro algébrico pode servir também para mostrar para os estudantes um dos papéis da álgebra que é reduzir os cálculos e facilitar o desenvolvimento do trabalho matemático. Quadro geométrico: corresponde à representação gráfica seja da função afim que possibilita o estudo da noção de juros simples, seja da função exponencial que permite tratar as questões de juros compostos. Na realidade, o quadro geométrico poderia ser considerado apenas como uma conversão entre o registro de representação algébrica de uma função e o registro de representação gráfica se nos referíssemos ao trabalho de Duval (1995), e quando articulamos as noções de juros simples e compostos com as noções de função afim e a função exponencial respectivamente. O exemplo abaixo ilustra a possibilidade de trabalhar no quadro geométrico para o desenvolvimento da tarefa. Exemplo: Supondo um capital de R$ 800,00, aplicado à taxa de 40% ao ano, representar graficamente a relação entre juros (em Reais) e tempo (em anos). Fonte: DANTE 2008, p. 339 86 Solução proposta pelo autor: Fonte: DANTE, 2008, p. 339. Trata-se de uma tarefa que poderia ser resolvida diretamente por meio da fórmula de juros simples (j = C*.i*.t, onde j = juros, C = capital, i = taxa e t = tempo). Como capital e taxa são constantes, o produto Ci também é constante, logo os juros variam com o tempo por meio da função j = f(t) = C*i*t, que representa uma função linear. Isso permite a passagem ao quadro geométrico em que, por meio gráfico, é possível verificar que se trata de uma função crescente, ou seja, os juros aumentam no decorrer do tempo. Certamente esse trabalho só é proposto no Ensino Médio, cujo objetivo é preparar o cidadão e não considerar apenas as aplicações associadas ao mercado de trabalho, o que é enfatizado nos planos de ensino das universidades analisadas no capítulo anterior, observando que estudamos os cursos de Administração de Empresas cujo objetivo é justamente o desenvolvimento profissional. Na realidade, o estudo da função por meio de seu gráfico permite uma melhor visualização, o que pode ser utilizado como recurso para apresentações e principalmente para comparar resultados. A comparação de resultados é muito importante para os Administradores de Empresas, mas o exemplo acima é pouco adequado para o setor financeiro, em que, em geral, se trabalha com aplicações que variam exponencialmente com o tempo, isto é, onde se privilegia a noção de juros compostos. Outra ferramenta por nós utilizada para a distinção dos tipos de tarefas 87 sobre a noção de juros simples e compostos que alimentam as relações institucionais são as noções de não ostensivos e ostensivos que correspondem às representações internas (ou mentais) e às representações externas respectivamente, sendo que o primeiro permite evocar o conceito ou noção que se utiliza e o segundo, a manipulação desse mesmo conceito ou noção, ou seja, existe uma relação dialética entre elas.Indicamos abaixo os não ostensivos e ostensivos que, em geral, são evocados no desenvolvimento das tarefas sobre juros simples e compostos habitualmente desenvolvidas no Ensino Médio e Superior. Não ostensivos e ostensivos - Adição, subtração, multiplicação, porcentagem e decimais. Exemplo 1: Se a taxa de inflação de janeiro é de 6% e a de fevereiro é de 5%, então a taxa de inflação do bimestre janeiro-fevereiro será de? Fonte: DANTE, 2008, p. 335. Solução: Primeira técnica: Como se trata de juros sobre juros podemos calcular 5% de 6% que é igual a 0,05. 0,06 = 0, 003 = 0,3%. Portanto a taxa total é igual 5% + 6% + 0,3% = 11,3% Logo, a taxa de inflação no bimestre é de 11,3%. Segunda técnica: solução do autor f1 = 1+0,06 = 1,06 f2=1+0,05= 1,05 f acumulado = 1,06*1,05 = 1, 113 logo, a taxa de inflação é de 11,3% = 0,113 Fonte: DANTE, 2008, p. 335. Para a primeira técnica é preciso dispor apenas dos ostensivos de representação percentual e decimal e da representação de multiplicação e adição e os não ostensivos porcentagem, números decimais, operações de adição e multiplicação de números inteiros e decimais. Para a segunda técnica é preciso considerar o capital inicial para o cálculo, o que corresponde a somar uma unidade aos juros correspondentes, ou seja, o ostensivo de representação simbólica f = 1 + i. No cálculo dos juros acumulados encontramos o valor final. Para determinar a taxa entre os dois meses considerados é preciso tomar a taxa na representação decimal 88 e transformá-la para a representação percentual. Nesse caso, utilizamos os ostensivos de representação simbólica, de representação percentual e de representação decimal, e os não ostensivos em jogo são as noções de número decimal e porcentagem. Exemplo 2: Fonte: DANTE, 2008, p. 336. Na tarefa acima verificamos que o autor propõe duas técnicas para a sua solução. Na primeira técnica os ostensivos em jogo são a representação percentual, a representação decimal e as operações de multiplicação, adição e divisão de números inteiros e decimais. Os não ostensivos correspondem às noções de porcentagem, número decimal, multiplicação, divisão e adição. Na segunda técnica os ostensivos são os mesmos, e para o cálculo do valor final é utilizada a fórmula 1 + i, onde 1 representa o capital inicial e i, os juros, ou seja, é preciso dispor de conhecimentos sobre o não ostensivo capital inicial e juros para compreender essa nova formulação. Para melhor ilustrar os ostensivos e não ostensivos, separamos as tarefas sobre juros simples e compostos em função das operações e noções que permitem sua solução, como é possível verificar no caso abaixo sobre juros compostos. – Porcentagem, potenciação, logaritmos e regra de três. Exemplo: 89 Fonte: DANTE, 2008, p. 339. Para a tarefa acima é preciso dispor do ostensivo de representação algébrica do montante para juros compostos (M = C * ft) cujo não ostensivo matemático associado é a noção de função exponencial. Como é pedido o tempo em que o capital dobra, necessitamos de uma representação simbólica para o não ostensivo dobro. Após substituir os ostensivos de representação simbólica, onde f = 1 + i e i é transformado em sua representação decimal, utiliza-se o não ostensivo logaritmo e suas propriedades, cujo ostensivo é indicado por log. Finalmente, é preciso transformar 0,64 de ano em meses, o que corresponde ao não ostensivo regra de três cujo ostensivo é a multiplicação em cruz. As noções de juros simples e compostos, como já indicamos acima, podem ser articuladas com as noções de progressões aritméticas e geométricas respectivamente. Apresentamos abaixo exemplos dessa articulação identificando os ostensivos e não ostensivos em jogo. – Progressão aritmética, progressão geométrica e suas propriedades. Exemplo: Progressão Aritmética e Juros Simples: 90 Fonte: DANTE, 2008, p. 152. A primeira técnica utilizada pelo autor corresponde ao cálculo dos juros sobre o capital utilizando apenas os ostensivos de representação percentual e decimal e a multiplicação. O valor encontrado vai ser adicionado sucessivamente utilizando apenas o ostensivo adição. Nesse caso, os não ostensivos em jogo são as noções de porcentagem, número decimal, multiplicação e adição. Para determinar uma fórmula que corresponde à representação simbólica para o cálculo de juros simples, o autor articula a noção de juros simples com a noção de progressão aritmética. Para isso, o autor relaciona o ostensivo de representação simbólica do termo geral de uma progressão aritmética associando seus elementos, isto é, o n-ésimo termo corresponde ao montante (a n = M); o primeiro termo corresponde ao capital inicial acrescido do juro do primeiro mês (a 1 = C + C.i); a razão corresponde aos juros (r = C.i); e o tempo corresponde a calcular (n – 1) quando n = t, ou podemos considerar uma progressão aritmética em que o primeiro termo é a 0 , o que corresponde à M = C + C*i*t, ou seja, M = C*(1 + i*t) . O não ostensivo progressão aritmética é utilizada como meio para deduzir o ostensivo de representação simbólica para a determinação de uma fórmula para o cálculo de juros simples. 91 Exemplo: Progressão Geométrica e Juros Compostos: Quanto receberá de juros, no fim de um semestre, uma pessoa que investiu, a juros compostos, a quantia de R$ 6.000,00 à taxa de 1% ao mês. Primeira técnica: Calculamos os valores relativos aos 6 meses. Mês 0: 6.000,00 Mês 1: 6.000,00 + 6.000,00 x 0,01 = 6.060,00 Mês 2: 6.060,00 + 6.060,00 x 0,01 = 6.120,60 Mês 3: 6.120,60 + 6.120,60 x 0,01 = 6.181,806 Mês 4: 6.181,806 + 6.181,806 x 0,01 = 6.243,6241 Mês 5: 6.243,6241 + 6.243,6241 x 0,01 = 6.306,0603 Mês 6: 6.306,0603 + 6.306,0603 x 0,01 = 6.369,1209 Segunda Técnica: Podemos representar a sequência de valores por uma progressão geométrica usando o termo geral a n como o montante (a n = M) como primeiro termo o capital inicial ou valor principal (a 1 = C + Cj), a razão é igual a 1 + j (q = 1 + j), e o tempo igual ao número de termos (n = t). Assim, fazendo as trocas convenientes em a n = a 1 qn – 1 temos: M = (C + Cj).(1+j)t-1 , considerando uma progressão geométrica onde o primeiro termo é a 0 , temos: M = C(1 + j)t. C= 6000; t= 1 semestre = 6 meses j= 1% (0,01) ao mês M = C * (1+j)t M = 6000*(1+0,01)6 M = 6.369,12 Fonte: DANTE , 2008, p. 338. Observamos que na primeira técnica é preciso calcular a cada mês o juro correspondente ao valor acumulado no mês anterior. Ao identificar a fórmula do montante para juros compostos com a de uma progressão geométrica, observando a diferença quando se considera o primeiro termo a0 ou a1, podemos mostrar para os estudantes a importância desse conceito matemático para justificar a fórmula utilizada e seu papel facilitador dos cálculos, principalmente quando se trabalha com prazos maiores. Na primeira técnica, que corresponde ao cálculo sucessivo dos juros nos meses considerados, utilizamos apenas os ostensivos de representação percentual e decimal e a multiplicação e adição. O valor encontrado para cada mês é tomado como novo capital para o mês seguinte. Nesse caso, os não ostensivos em jogo são as noções de porcentagem, número decimal, multiplicação e adição. 92 Para determinar uma fórmula que corresponde à representação simbólica para o cálculo de juros compostos podemos articular essa noção com o conceito de progressão geométrica. Para isso, é preciso relacionar o ostensivo de representação simbólica do termo geral de uma progressão geométrica associando seus elementos com as noções de montante, capital inicial, taxa e tempo, conforme descrição apresentada acima para a segunda técnica. O não ostensivo progressão geométrica é utilizada como meio para deduzir o ostensivo de representação simbólica para a determinação de uma fórmula para o cálculo de juros compostos. Podemos considerá-lo como o objeto matemático que permite descrever, interpretar e justificar a representação simbólica usualmente usada para o cálculo de juros compostos, ou seja, a teoria da tecnologia que corresponde aos cálculos sucessivos que podem ser representados por uma função exponencial.Na sequência, consideramos as grandezas direta e inversamente proporcionais que correspondem a ostensivos usualmente utilizados em tarefas que envolvem as noções de juros simples e compostos. – Grandezas diretamente e inversamente proporcionais Exemplo: Grandezas Diretamente Proporcionais. Edgar teve um aumento de 8% e passou a receber R$ 1.680,00. Qual era seu salário antes do reajuste? O salário anterior correspondia a 100%. Como houve um aumento de 8%, o novo salário passou a corresponder a 100% + 8% = 108%. Observe que as grandezas são diretamente proporcionais, logo teremos salário antes do reajuste: R$ 1.555,55. Porcentagem 100% 108% Salário X 1680 Fonte: GIOVANNI & BONJORNO , 2005, p. 286. Ao resolver essa tarefa, uma das possíveis formas para tal é o uso de uma regra de três que corresponde a uma das técnicas para o cálculo de grandezas diretamente proporcionais. Nesse caso, a regra de três corresponde a um dos 93 ostensivos para manipular grandezas diretamente proporcionais. Poderíamos também considerar o não ostensivo função linear e associá-lo à noção de grandezas diretamente proporcionais e por meio da manipulação dos ostensivos associados a essa função determinar a solução da tarefa proposta, conforme exemplo abaixo. Considerando 100% = 1, 108% = 1,08, f(1) = x e f(1,08) = 1680. Sendo f linear, temos: f(1,08) = f(1,08 * 1) = 1,08 f(1). Logo, 1680 = 1,08.x, x = 1555,55. Nesse caso, é necessário fazer a passagem do ostensivo de representação percentual para o ostensivo de representação decimal. Ambas as técnicas sobrevivem atualmente, mas no Ensino Médio no Brasil, em geral, privilegia-se a primeira técnica, mesmo se a noção de função linear integrar a proposta curricular dessa etapa escolar. Outra noção muito utilizada nas tarefas sobre porcentagem e juros simples é a noção de equação do primeiro grau. – Equações do primeiro grau. Exemplo 1: A quantia de R$ 1.890,00 foi repartida entre três pessoas da seguinte forma: Marta recebeu 80% da quantia de Luís e Sérgio recebeu 90% da quantia de Marta. Quanto recebeu cada pessoa? Fonte: DANTE , 2008, p. 336. Solução: Luis: x Marta: 0,8 x Sérgio: 0,9x(0,8x) x + 0,8 x+ 0,72x = 1890 2,52x = 1890 x = 750 (Luis) 0,8 x = 0,8.750 = 600 (Marta) 0,72 x = 0,72.750 = 540 (Sérgio) Sérgio recebeu 1890-750-600 = 540. Portanto, Luis recebeu R$ 750,00, Marta recebeu R$ 600,00 e Sérgio recebeu R$ 540,00. Fonte: DANTE , 2008, p. 336. Na tarefa acima, após identificar as diferentes partes efetuando a passagem do ostensivo de representação em língua natural em representação simbólica explícita e modelar a tarefa recaindo em uma equação do primeiro grau, é preciso manter um discurso em língua natural para justificar o trabalho com o não ostensivo equação, que será manipulado por meio das regras e leis do cálculo literal, que correspondem aos não ostensivos em jogo na tarefa. 94 Exemplo 2: Um quadro, cujo preço de custo era R$ 800,00, foi vendido por R$ 980,00. Qual a porcentagem do lucro sobre o preço de custo? Fonte: GIOVANNI & BONJORNO 2005, p. 290 Solução: Fazendo L= lucro; C= preço de custo e V= preço de venda, teremos: V = L+C L= 980 – 800 L= 180. A taxa percentual do lucro sobre o custo é de: L= V – C L 180 = 0,225 C 800 logo L = 22,5%. Fonte: GIOVANNI & BONJORNO, 2005, p. 290. No exemplo 2 é preciso identificar os elementos do enunciado e considerar a equação que relaciona preço de custo, preço de venda e lucro, para em seguida determinar qual a porcentagem de lucro sobre o preço de custo. Na realidade, trata-se de um problema de modelagem que possibilita a aplicação da noção de equação, que necessita de um discurso adequado para seu planejamento, execução e interpretação dos resultados encontrados. Estes supõem ainda a passagem da representação decimal para a representação percentual que é pedida na tarefa. Também, nesse caso, o não ostensivo equação é manipulada por meio das regras e leis do cálculo literal, que correspondem aos não ostensivos em jogo na tarefa. Outro não ostensivo importante para o desenvolvimento da noção de juros simples e compostos é a noção de calendário contábil. – Calendário contábil. Exemplo: mês de trinta dias, ano com trezentos e sessenta dias; Uma aplicação de R$ 50.000,00 pelo prazo de 180 dias obteve um rendimento de R$ 8.250,00. Indaga-se: Qual a taxa anual correspondente a essa aplicação? Fonte: Sobrinho, 2000, p. 22. 95 Solução: P= 50.000,00 J= 8.250,00 N= 180 dias I=? I = J: (C*n) I= 8.250,00: (50.000,00*180) = 0,00091667 ou 0,091667 ao dia. Conforme é solicitado à taxa em anos, teremos Taxa anual = 360* 0,00091667, ou seja, 0,33 ou ainda 33% ao ano. Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 22. Para desenvolver essa tarefa, além de dispor da noção de calendário contábil, observamos que na fórmula I = J: (C*n), o não ostensivo divisão é representada pelo ostensivo dois-pontos e o não ostensivo multiplicação é representado pelo ostensivo * que correspondem às representações utilizadas, em geral, nas calculadoras. É importante utilizar a equivalência de taxas para resolver tarefas sobre variação financeira, ou seja, se a taxa é dada em anos, deve-se transformar o prazo em anos. – Equivalência de taxas (EM, ES) Exemplo: Uma pessoa aplica R$ 15.000,00 num título de renda fixa com vencimento no final de 61 dias, a uma taxa de 72% ao ano. Calcular o seu valor de resgate. Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 43. Primeira Técnica: P= 15.000,00 n= 61 dias = 61/360; I = 72% ao ano S =? S= P* (1+i)n S= 15.000*(1+0,72)61/360 S = 15.000*(1,72) 61/360 S= 16.443,73 Segunda Técnica: P= 15.000,00; N= 61 dias; I = 72% ao ano; S =? Por regra de três simples, temos: 1 ano -------- 360dias n -------S= P* (1+i)n 61 1*61 = 360xn n = 0, 1694 anos S= 15.000*(1+0,72)0,1694 S= 16.443,73 Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 43. Na primeira técnica dividimos o número de dias por 360, que correspondem ao ano contábil e aplicamos a fórmula em que a multiplicação também é representada pelo ostensivo, uma vez que os cálculos precisam ser efetuados em uma calculadora.A diferença entre a primeira técnica e a segunda está na proposição do cálculo da proporção de dias em relação ao ano contábil. Isso permite revisitar a noção de proporcionalidade e assim compreendê-la melhor. Certamente o 96 trabalho proposto pelo autor é adequado para os cursos de Administração, mas ressaltamos que esse mesmo exemplo pode ser utilizado como meio para auxiliar os estudantes do Ensino Médio a articular a noção de calendário contábil e proporcionalidade, que pode ser tratada por meio da técnica denominada “regra de três simples” ou da técnica da função linear. Podemos ainda articular a noção de juros simples com a noção de função linear e interpretar os resultados encontrados por meio do ostensivo de representação gráfica. – Juros simples e representação gráfica (EM, ES) Exemplo: Suponhamos o capital de R$ 800,00 aplicado à taxa de 40% ao ano. Qual seria a representação gráfica quando obtemos os juros em função do tempo de aplicação por meio da equação. J=320*t Essa funçaõ apresenta uma equação do tipo função linear Fonte: DANTE , 2008, p. 339. A representação gráfica dos juros em função do tempo, além de permitir a articulação entre a noção de juros simples e função linear, auxilia a interpretação dos resultados, pois é fácil verificar que a reta é crescente, ou seja, que os juros aumentam proporcionalmente com o tempo. Na sequência, apresentamos a grade de análise construída para identificar os diferentes tipos de tarefas e técnicas que sobrevivem atualmente tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior. Além disso, é mediante essa grade que analisamos no capítulo que segue, por meio de três livros didáticos indicados para o Ensino Médio e de dois livros do Ensino Superior escolhido em função das bibliografias propostas nos planos de ensino 97 analisados, as relações institucionais existentes quando se trabalha a noção de juros simples e compostos nessas duas etapas escolares. 4.3 AS TAREFAS USUAIS SOBRE AS NOÇÕES DE JUROS SIMPLES E COMPOSTOS QUE ALIMENTAM AS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS TANTO PARA O ENSINO MÉDIO COMO PARA O ENSINO SUPERIOR Na tabela abaixo relacionamos as tarefas sobre juros simples e compostos usualmente encontradas tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior. Tarefa 1: Situação matemática para cálculo de acréscimo ou desconto (EM, ES). Tarefa 2: Situação matemática para cálculo de Juros Simples (EM, ES). Tarefa 3: Situação matemática para cálculo de Juros Compostos (EM, articulação entre juros simples e compostos e as noções de função afim, progressão aritmética e função exponencial, progressão geométrica respectivamente, ES sem articulação). Tarefa 4: Situação matemática para cálculo de juros sobre depósito à vista, o Método Hamburguês (ES). Tabela 1: Tarefas analisadas Apresentamos a seguir nossa grade de análise que, como anunciado acima, segue o modelo construído por Dias (1998) em sua tese para a análise dos diferentes tipos de tarefas que permitem a articulação entre os pontos de vista cartesianos e paramétricos no ensino de Álgebra Linear. 4.4 A GRADE DE ANÁLISE Na grade identificamos os tipos de tarefas usualmente encontradas no processo de ensino e aprendizagem das noções de juros simples e compostos tanto para o Ensino Médio como para o Ensino Superior. Para as variáveis das tarefas destacamos os quadros em que a tarefa é enunciada e os possíveis quadros de solução das mesmas. Além disso, destacamos os ostensivos e não ostensivos que permitem a solução das tarefas, destacando os não ostensivos que correspondem 98 aos conhecimentos prévios tanto dos estudantes como dos professores, observando que os professores devem dispor de conhecimentos teóricos que permitem utilizar os ostensivos discursivos necessários para descrever, interpretar e justificar as técnicas escolhidas para desenvolver as diferentes tarefas. Dessa forma, para especificar as tarefas em relação às diferentes técnicas, que segundo Chevallard (1994), possibilitam a compreensão de um conceito, pois este depende da técnica em que é utilizado e a técnica depende de todo o sistema de objetos não ostensivos e ostensivos que ela permite ativar. Escolhemos assim as variáveis de tarefa abaixo que nos parecem importantes para identificar as diferentes relações institucionais associadas às noções de juros simples e compostos, que podem ser trabalhadas tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior. - Situação apresentada no enunciado; - Quadros em que a tarefa é apresentada; - Não ostensivos possíveis para o seu desenvolvimento, destacando quais correspondem aos conhecimentos prévios dos estudantes e do professor; - Ostensivos possíveis para a resolução da tarefa; - Os quadros que podem ser usados na resolução da tarefa; - Níveis de conhecimento esperados dos estudantes para a resolução da tarefa. Apresentamos abaixo alguns exemplos de funcionamento da grade para as quatro tarefas destacadas acima. 4.5 FUNCIONAMENTOS DA GRADE: EXEMPLOS: Com o objetivo de apresentar o funcionamento da grade de análise, consideramos a tarefa em geral seguida de exemplos que permitem melhor compreender as possíveis técnicas que podem ser trabalhadas no Ensino Médio ou no Ensino Superior. – Tarefa 1: Situação matemática para cálculo de acréscimo ou desconto (EM, ES). Exemplo 1: 99 Uma mercadoria que custa R$ 450,00 está sendo vendida com desconto de 8%. Qual o valor do desconto e por quanto a mercadoria será vendida? Fonte: DANTE, 2008, p. 333. Situação apresentada no enunciado Determinar o desconto. Quadro em que a tarefa é apresentada: Numérico. Não ostensivos possíveis para o seu desenvolvimento, destacando quais correspondem aos conhecimentos prévios dos estudantes e do professor: Porcentagem, operações de multiplicação e divisão (“topos” do estuDante e do professor). Ostensivos possíveis para a resolução da tarefa: Discurso oral, representação escrita, representação em língua natural, representação gestual, representação percentual e representação decimal associados aos não ostensivos descritos acima. Os quadros que podem ser usados na resolução da tarefa: Numérico. Níveis de conhecimento esperados dos estudantes para a resolução da tarefa: Destacamos duas técnicas para a solução dessa tarefa, ambas são desenvolvidas no quadro numérico e o nível de conhecimento esperado dos estudantes é o mobilizável, pois o desconto é pedido explicitamente no enunciado. Observamos abaixo quais conhecimentos devem ser disponíveis para a manipulação da técnica. Primeira técnica: Calculamos a diferença 100% - 8% = 92%, que corresponde ao fator decimal 0,92 e multiplicamos pelo valor da mercadoria. Nesse caso, o estuDante deve dispor de conhecimentos sobre porcentagem, passagem da representação percentual (92%) para representação decimal (0,92) e multiplicação de decimais, quando não utiliza uma calculadora. Segunda técnica: Calculamos 8% = 0,08 do valor total da mercadoria e subtraímos o valor encontrado do valor total. Essa técnica exige que os estudantes disponham dos mesmos conhecimentos destacados na técnica anterior. Exemplo 2: Durante a entresafra o preço do café, que era de R$ 30,00 a saca, sofreu aumentos sucessivos de 10%, 5% e 15% nos três primeiros meses. Determinar o preço atual? Fonte: BARRETO & CHAVIER , 2005, p. 28 . Primeira técnica: O preço atual é dado por: P 1 = 30,00*1,1 = 33,00 P 2 = 33,00*1,05 = 34,65 P 3 = 34,65*1,15 = 39,85 P = R$ 39,95 P i = C*(1+j i ). Calcula-se cada P j até obter o resultado final P. 100 A partir dos P j podemos deduzir que P = C* (1+j 1 )* (1+j 2 )* (1+j 3 )*..... *(1+j n ). Segunda técnica: P= 30,00*(1+10:100)* (1+5:100)*(1+15:100) P= 30,00*1,1*1,05*1,15 P = R$ 39,95 A partir dos P j podemos deduzir que P = C*(1+j 1 )* (1+j 2 )* (1+j 3 )*..... *(1+j n ). Fonte: BARRETO & CHAVIER ET AL., 2005, p. 28. Situação apresentada no enunciado: Determinar o acréscimo (no caso, juros sobre juros). Quadro em que a tarefa é apresentada: Numérico. Não ostensivos possíveis para o seu desenvolvimento, destacando quais correspondem aos conhecimentos prévios dos estudantes e do professor: Porcentagem, operações de adição e multiplicação de decimais (“topos” do estuDante e do professor). Ostensivos possíveis para a resolução da tarefa: Discurso oral, representação escrita, representação gestual, representação em linguagem natural, representação percentual e representação decimal. Os quadros que podem ser usados na resolução da tarefa: Numérico. Níveis de conhecimento esperados dos estudantes para a resolução da tarefa: Nível mobilizável em relação à noção de juros sobre juros. A primeira técnica exige apenas que o estuDante disponha de conhecimentos sobre a multiplicação com decimais quando não utiliza uma calculadora. Para utilizar a segunda técnica é preciso dispor de conhecimentos sobre a multiplicação e suas propriedades e da multiplicação de decimais. É preciso dispor da propriedade associativa da multiplicação e de situações de referência em que se deduz a fórmula utilizada na segunda técnica. – Tarefa 2: Situação matemática para cálculo de Juros Simples (EM ES) Exemplo 1: Um capital de R$ 12.000,00 é aplicado à taxa de juros simples de 2% ao mês. Determine o valor do montante após 6 meses. Fonte: BARRETO & CHAVIER 2005, p. 23. 101 Primeira técnica: 2% de R$ 12.000,00 = 2:100 * 12.000,00= R$ 240,00 (Corresponde ao juros em 1 mês); 6 * R$ 240,00 = R$ 1.440,00 (rendimento de juros simples ao final de 6 meses); Montante M= 12.000,00+1.440,00 = R$ 13.440,00 ( Montante após 6 meses). Segunda técnica: Montante= C+J onde J = J= C*i*n M= C +J M = 12000+1440 J= C*i*n J= 12000*0,02*6 = 1.440 M= 13.440,00. Situação apresentada no enunciado Determinar a variação de um capital a juros simples. Quadros em que a tarefa é apresentada: Numérico e algébrico. Não ostensivos possíveis para o seu desenvolvimento, destacando quais correspondem aos conhecimentos prévios dos estudantes e do professor: Porcentagem, operações de adição e multiplicação, porcentagem, equação do primeiro grau (“topos” do estuDante e do professor). Ostensivos possíveis para a resolução da tarefa: Discurso oral, representação gestual, representação escrita, representação em linguagem natural, representação percentual e representação decimal. Os quadros que podem ser usados na resolução da tarefa: Numérico e algébrico. Níveis de conhecimento esperados dos estudantes para a resolução da tarefa: Em relação a noção de juros simples a tarefa exige apenas o nível mobilizável, pois esse é tratado explicitamente no enunciado. Na primeira técnica utiliza-se apenas o quadro numérico, mas é preciso um discurso para justificar o trabalho efetuado. Deve-se dispor de conhecimentos sobre adição e multiplicação de decimais quando não se utiliza uma calculadora. A segunda técnica é desenvlvida no quadro algébrico e se supõe que as fórmulas para o cálculo do juros e do montante sejam disponiveis, além de conhecimentos sobre adição e multiplicação de decimais quando não se utiliza uma calculadora. Exemplo 2: Determine o prazo em que se duplica um capital aplicado à taxa de juro simples de 4% ao mês. Fonte: GIOVANNI & BONJORNO et al., 2005, p. 295 Técnica: Para que um capital duplique temos M=2*C (montante) 102 M=2C I=4% a.m = 0,04 a.m M=C+J M= C+ (C*i*n) 1=0,04n n=1:0,04 2C=C*(1+0,04n) 2=1 +0,04n 2 – 1 = 0,04*n n= 25 (meses) Situação apresentada no enunciado Determinar a variação de um capital a juros simples. Quadros em que a tarefa é apresentada: Numérico e algébrico. Não ostensivos possíveis para o seu desenvolvimento, destacando quais correspondem aos conhecimentos prévios dos estudantes e do professor: Porcentagem, operações de adição e multiplicação, noção de dobro, triplo..., equação do primeiro grau (“topos” do estudante e do professor). Ostensivos possíveis para a resolução da tarefa: Discurso oral, representação escrita, representação gestual representação em linguagem natural, representação algébrica, representação de equação do primeiro grau, representação percentual e representação decimal. Quadro que pode ser usado na resolução da tarefa: Algébrico. Níveis de conhecimento esperados dos estudantes para a resolução da tarefa: Trata-se de uma tarefa que exige apenas que se mobilizem conhecimentos associados à noção de juros simples. A técnica supõe que se disponha de conhecimento sobre a forma algébrica para representar dobro e as regras e leis do cálculo algébrico para resolver uma equação do primeiro grau. – Tarefa 3: Situação matemática para cálculo de Juros Compostos (EM, articulação entre juros simples e compostos progressão aritmética e função e as noções de função afim, exponencial, progressão geométrica, respectivamente, ES sem articulação). Exemplo 1: Qual deve ser o tempo para que a quantia de 30.000,00 gere um montante de 32.781,81, quando aplicado à taxa de 3% ao mês, no sistema de juros compostos. Fonte: DANTE , 2008, p. 338 Técnica: C= 30.000,00 M= 32.781,81 i= 3% ao mês – 0,03 a.m t=? M=C*(1+i)t (1+i)t = M : C (1+0,03)t = 32.781,81 : 30.000,00 103 (1,03)t = 1,092727 t . log1,03 = log1,092727 t = (log 1,092727) : (log 1,03) = 3 Logo, o tempo deverá ser de 3 meses. Fonte: DANTE., 2008, p. 338 Situação apresentada no enunciado: Situação financeira. Quadros em que a tarefa é apresentada: Numérico e algébrico. Não ostensivos possíveis para o seu desenvolvimento, destacando quais correspondem aos conhecimentos prévios dos estudantes e do professor: Porcentagem, números decimais, operações de adição e multiplicação de números reais, equação do primeiro grau, equação exponencial, logaritmos e suas propriedades (“topos” do estuDante e do professor). Ostensivos possíveis para a resolução da tarefa: Discurso oral, representação escrita, representação em linguagem natural, representação algébrica de equações exponenciais e equações do primeiro grau, representação percentual e representação decimal. Os quadros que podem ser usados na resolução da tarefa: Numérico e algébrico. Níveis de conhecimento esperados dos estudantes para a resolução da tarefa: Em relação à noção de juros compostos, é preciso apenas mobilizar conhecimentos sobre a fórmula para cálculo. Para a manipulação da técnica é preciso dispor de conhecimentos sobre equações exponenciais para identificá-la, de logaritmos e suas propriedades e das regras e leis para resolver uma equação do primeiro grau. Observamos que para desenvolver a tarefa é importante supor a possibilidade de utilizar uma calculadora. Exemplo 2: O capital de R$ 2.000,00, aplicado a juros compostos, rendeu após quatro meses juros de R$ 165,00. Qual foi a taxa de juros? Fonte: DANTE , 2008, p. 338. Primeira técnica: C= 2.000,00 J = 165 M= C+J t= 4 meses M=C*(1+i) t (1+i )4 =1,0825 2.165 = 2.000*(1+i ) M= 2.000+165 = 2165 i= ? 4 (1+i )4 = 2.165 : 2.000 ((1+i )4 )1/4 = (1,0825) ¼ (1+i) = 1,020015981 i= 1,020015981 – 1 = 0,020015981 i= 0,020015981 * 100 = 2,0015981% Logo a taxa de juros foi de aproximadamente de 2% ao mês. Segunda técnica: C= 2.000,00 J = 165 M= C+J i= ? t= 4 meses M=C*(1+i)t (1+i )4 =1,0825 2.165 = 2.000*(1+i )4 4*log(1+i) = log1,0825 M= 2.000+165 = 2165 (1+i )4 = 2.165 : 2.000 log(1+i) = (log1,0825):4 104 log(1+i) = 0,008607 (1+i)= 100,008607 1 + i = 1,02001 i = 1,02001 – 1 i = 0,02001 i = 2% Fonte: DANTE , 2008, p. 338 Situação apresentada no enunciado: Situação financeira. Quadros em que a tarefa é apresentada: Numérico e algébrico. Não ostensivos possíveis para o seu desenvolvimento, destacando quais correspondem aos conhecimentos prévios dos estudantes e do professor: Porcentagem, números decimais, operações de adição, multiplicação, potenciação e radiciação, equação do primeiro grau, equação exponencial, logaritmos e suas propriedades (“topos” do estuDante e do professor). Ostensivos possíveis para a resolução da tarefa: Discurso oral, representação escrita, representação em linguagem natural, representação algébrica de equações exponenciais e equações do primeiro grau, representação percentual e representação decimal, representação fracionária, representação de logaritmos. Quadros que podem ser usados na resolução da tarefa: Numérico e algébrico. Níveis de conhecimento esperados dos estudantes para a resolução da tarefa: Em relação à noção de juros compostos é preciso apenas mobilizar conhecimentos sobre a fórmula para cálculo. Para a manipulação da primeira técnica é preciso dispor de conhecimentos sobre equações exponenciais para identificá-la e de potenciação, radiciação e suas propriedades. É preciso dispor também da noção de equação do primeiro grau. Na manipulação da segunda técnica é preciso dispor da noção de equações do primeiro grau e exponencial e da noção de logaritmo. Observamos que para desenvolver a tarefa utilizando a primeira ou a segunda técnica é importante supor a possibilidade de utilizar uma calculadora. – Tarefa 4: Situação matemática para cálculo de juros sobre depósito à vista, o Método Hamburguês (ES). Exemplo 1: Calcular o valor dos juros referentes às aplicações dos capitais R$ 20.000,00, R$ 10.000,00 e R$ 40.000,00, pelos prazos de 65 dias, 72 dias e 20 dias, respectivamente, sabendose que a taxa considerada é de 25,2% ao ano. Fonte: SOBRINHO ET AL., 2000, p. 27 Técnica: P 1 = 20.000,00 P 2 = 10.000,00 P 3 = 40.000,00 105 N 1 = 65 dias N 2 = 72 dias N 3 = 20 dias I = 25,2% a.a I = 25,2% a.a I = 25,2% a.a J 1 =? J 2 =? J 3= ? Como a taxa é anual e os prazos são expressos em número de dias, é preciso considerar a taxa em dias. No caso de juros simples temos: Taxa diária = 0, 252: 360 = 0, 0007 ou 0,07% ao dia. J = C*I*N J T = 20.000*65*0,0007+10.000*72*0,0007+40000*20*0,0007= 1.974,00 Onde J T é o total dos juros dos três capitais. Situação apresentada no enunciado: Situação financeira. Quadros em que a tarefa é apresentada: Numérico e algébrico. Não ostensivos possíveis para o seu desenvolvimento, destacando quais correspondem aos conhecimentos prévios dos estudantes e do professor: Porcentagem, números decimais, operações de adição, multiplicação, equação do primeiro grau, calendário contábil (“topos” do estudante e do professor). Ostensivos possíveis para a resolução da tarefa: Discurso oral, representação escrita, representação em linguagem natural, representação algébrica de equações do primeiro grau, representação percentual e representação decimal Os quadros que podem ser usados na resolução da tarefa: numérico e algébrico. Níveis de conhecimento esperados dos estudantes para a resolução da tarefa: Em relação à noção de juros basta mobilizar conhecimentos sobre cálculo de juros e conversão da taxa anual em taxa diária. É preciso mobilizar ainda o Método Hamburguês que consiste em determinar a soma dos juros obtidos. 4.6 CONSIDERAÇÕES FINAIS A identificação dos diferentes tipos de tarefas sobre a noção de juros simples e compostos que sobrevivem no Ensino Médio e Superior possibilitou verificar que, se tratarmos essas noções apenas do ponto de vista das aplicações financeiras, o trabalho a ser realizado será muito reduzido, mas permitirá a utilização de técnicas diferentes que estão associadas ao conhecimento prévio esperados dos estudantes, principalmente no Ensino Médio. Em geral, as técnicas propostas exigem apenas a utilização dos quadros numéricos e algébricos, sendo esse último privilegiado por facilitar o trabalho matemático em jogo e reduzir os cálculos. As possíveis articulações entre as noções de juros simples e compostos e funções afim e 106 exponencial e progressões aritméticas e geométricas, respectivamente, são importantes, pois permitem revisitar conteúdos que já fazem parte dos conhecimentos prévios dos estudantes do Ensino Médio. Atentamos que pode ser uma forma de auxiliá-los a controlar os resultados encontrados na solução de tarefas tanto escolares como da vida profissional, pois a noção de juros compostos é muito utilizada no mercado financeiro. Observamos finalmente que o nível de conhecimento exigido para a solução de tarefas que envolvem as noções de juros simples e compostos é o mobilizável, mas que é preciso dispor de conhecimentos sobre equações de primeiro grau e equações exponenciais, assim como das regras e leis que permitem manipulá-las. Além disso, é preciso estar atento para o fato de que as tarefas, em geral, exigem cálculos que necessitam que se disponha de uma calculadora científica e que se tenha habilidade para fazê-la funcionar. Para melhor compreender como se desenvolve o trabalho com a noção de juros simples e compostos tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior, estudamos no capítulo que segue as relações institucionais existentes via análise de alguns livros didáticos sugeridos para essas duas etapas escolares. 107 Capítulo 5 AS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS EXISTENTES PARA INTRODUÇÃO E DESENVOLVIMENTO DAS NOÇÕES DE JUROS SIMPLES E COMPOSTOS NA TRANSIÇÃO ENSINO MÉDIO E ENSINO SUPERIOR 5.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS Para o estudo das relações institucionais existentes, quando se consideram a introdução e o desenvolvimento das noções de juros simples e compostos na transição entre o Ensino Médio e Superior, foram pesquisados alguns livros didáticos dessas duas etapas escolares que correspondem a uma das ferramentas didáticas importantes para apoiar o trabalho de professores e estudantes, e que é indicada pelo Ministério da Educação, pois este fornece livros didáticos para o Ensino Médio e exige que os cursos superiores disponham desse material em suas bibliotecas como fonte de apoio para todos os que sentirem necessidade. Observamos que os livros didáticos do Ensino Médio, distribuídos gratuitamente para os estudantes, são avaliados por uma comissão do Ministério da Educação e escolhidos pelos professores, o que permite identificar a proposta mais ampla do trabalho do professor que tem a possibilidade de modificar a ordem e complementar a organização apresentada no livro, utilizando-o como material de apoio ao estudante. É com essa concepção que estudamos as possíveis relações institucionais existentes para a introdução da noção de juros simples e compostos no Ensino Médio. Igualmente, consideramos como instrumento de análise os livros didáticos do Ensino Superior, pois eles, quando indicados nos planos de ensino, permitem uma identificação das escolhas das instituições, representando uma das fontes para o desenvolvimento das disciplinas a que se destinam. Sendo assim, optamos por analisar três livros indicados para o Ensino Médio e dois para o Ensino Superior, para os quais faremos uma breve justificativa da escolha a seguir. A primeira obra escolhida para compor as análises das relações institucionais existentes para o Ensino Médio é Matemática, volume único de Luiz Roberto Dante 108 (na sequência denominado apenas Dante, 2008), avaliado e novamente aprovado pelo Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio (PNLEM, 2009), que, segundo os avaliadores, traz uma abordagem inovadora dos conteúdos a serem trabalhados no Ensino Médio. Os avaliadores observam ainda que o autor distribui o conteúdo em uma sequência lógica privilegiando uma integração harmoniosa entre os tópicos, ou seja, articulando conhecimentos prévios e novos conhecimentos. Isso nos conduziu a escolher essa obra para análise, levando em conta principalmente a questão da articulação de conhecimentos e a forma como o autor introduz as noções associadas à Matemática Financeira, em particular, as noções de juros simples e compostos que são trabalhadas após a introdução dos conceitos de função afim e exponencial e progressões aritméticas e geométricas. Isso possibilita uma revisita a esses conhecimentos tornando-os assim mais estáveis. Além do resultado da avaliação, observamos se a obra atende às orientações institucionais de preparar o estudante para exercer de forma autônoma a cidadania, sendo capaz de tomar decisões tanto para a solução de problemas pessoais como para os que envolvem o campo profissional, uma vez que estamos interessados em identificar as relações institucionais esperadas e existentes para o trabalho com as noções de juros simples e compostos na transição entre o Ensino Médio e Superior, ou seja, que conceitos trabalhados no Ensino Médio podem servir como conhecimento prévio para o desenvolvimento da disciplina de Matemática Financeira no Ensino Superior. Com o mesmo critério escolhemos a segunda obra, Matemática aula por aula, de Claudio Xavier da Silva e Benigno Barreto Filho, et al., 2005, terceiro ano, também reavaliada e aprovada pelo PNLEM (2009). A justificativa dessa seleção se deve ao fato de ela apresentar uma proposta em que se revisitam conhecimentos prévios para a introdução de novas noções e se utiliza a história da Matemática e as outras ciências para propor aplicações e motivar os estudantes, ou seja, trata-se de uma obra que atende às propostas institucionais para o desenvolvimento da Matemática no Ensino Médio. Ainda em relação ao Ensino Médio, selecionamos a obra Matemática completa, de José Ruy Giovanni e José Roberto Bonjorno, et al., 2005, primeiro ano, que também compõe a lista dos livros analisados e aprovados pelo PNLEM (2009). 109 Observamos que, assim como as obras anteriores, o livro didático escolhido também foi reavaliado em 2009, ou seja, as três obras compõem as diferentes listas do PNLEM e vêm sendo utilizadas e aperfeiçoadas continuamente. Ressaltamos ainda que sua escolha está associada também à proposta de revisitar conhecimentos que se supõem tenham sido trabalhados no Ensino Médio e ao papel de destaque dado ao uso de calculadoras, em particular, quando se introduzem as noções de Matemática Financeira, ou seja, dentro da proposta institucional de trabalho no Ensino Médio a obra atende às expectativas institucionais apresentadas anteriormente. Apresentadas as justificativas de escolha das três obras do Ensino Médio, passamos a breve descrição sobre a escolha das duas obras destinadas ao Ensino Superior. A primeira obra escolhida é Matemática financeira, de José Dutra Vieira Sobrinho na sequência designado de Sobrinho et al., 2000, em que percebemos que na abordagem proposta existe pouca preocupação de justificar as técnicas desenvolvidas por meio de tecnologias que mostram a possibilidade para o cálculo das diferentes aplicações financeiras, em particular, quando se trabalha com a noção de juros compostos. No geral, justificam-se os termos utilizados no mercado financeiro e a ênfase é dada à associação dos elementos da fórmula com esses termos para a identificação e aplicação imediata. Ou seja, trata-se de um curso em que a Matemática Financeira é trabalhada por meio da prática usual do mercado financeiro, isto é, reconhecimento dos elementos que compõem uma fórmula e aplicação da mesma, não é feita uma revisita de conhecimentos anteriores, isto é, os conhecimentos prévios são supostos disponíveis. Passamos à segunda obra, Matemática financeira, de Abelardo de Lima Puccini, et al., 2008. Sua escolha está associada ao fato de se tratar do livro didático contemplado nas bibliografias básicas de duas das quatro universidades para as quais analisamos, via planos de ensino, as relações institucionais esperadas para o desenvolvimento da disciplina de Matemática Financeira nos cursos de Administração de Empresas. Outra motivação para essa escolha é que, em geral, utilizamos essa obra nos nossos cursos de Matemática Financeira com as turmas de Administração de Empresas, curso superior focado nesta pesquisa. 110 Observamos ainda que nesse livro o conteúdo de Matemática Financeira é desenvolvido especificamente para cursos de administração e gestão, focando o uso da calculadora HP12C, ou seja, trabalha-se com as aplicações cotidianas que fazem parte das operações financeiras das instituições que compõem o mercado, em que as noções de juros, em particular, juros compostos, estão constantemente em jogo. Além disso, o autor articula os conhecimentos de juros simples e compostos desenvolvidos no Ensino Médio quando justifica as técnicas empregadas para os exemplos resolvidos, ou seja, existe uma preocupação de justificar técnicas desenvolvidas por meio de tecnologias que mostram as diferentes possibilidades para o cálculo das aplicações financeiras, em particular, quando se trabalha com a noção de juros compostos. Após essa breve justificativa das escolhas dos livros a serem analisados, indicamos na tabela 2 as obras examinadas neste trabalho e observamos que o ano indicado na tabela para as obras do Ensino Médio correspondem à primeira publicação da obra, que já havia sido avaliada e que foi novamente indicada pelo PNLEM (2009), ou seja, trata-se de obras que vêm se consolidando em função das expectativas institucionais que correspondem às propostas indicadas nos PCNEM (1998) e Parâmetros Curriculares Nacionais PCN+ (2005). Para as obras do Ensino Superior consideradas neste trabalho indicamos apenas o ano da edição utilizada nesta pesquisa. Livro Ano PNLEM Etapa 1ª Matemática- Dante- Dante et al., Volume Único 2008 2009 EM 2ª Matemática- aula por aula- Xavier & Barreto et.al., 3ª série 2005 2009/2010/2011 EM 3ª Matemática- Completa – Giovanni, Giovanni & Bonjorno et al., 1ª série 2005 2009 EM 1ª Matemática Financeira- Sobrinho et al. 2000 ES 2ª Matemática Financeira Puccini et al. 2008 ES Tabela 2: Obras analisadas na pesquisa Uma vez escolhidas as obras a serem analisadas, para efeito de análise, consideramos a introdução teórica, os exercícios resolvidos e os exemplos de 111 aplicações como a parte a ser desenvolvida pelo professor (“topos” do professor), ficando a cargo dos estudantes os exercícios propostos (“topos” do estudante). Para melhor identificar a proposta dos diferentes autores utilizamos a grade de análise apresentada no capítulo anterior, que possibilita evidenciar a ênfase dada à aplicação direta do conceito de juros simples e compostos ou da articulação desses conceitos com as noções de função afim e exponencial e progressão aritmética e geométrica respectivamente. Delineada a forma como será apresentada a análise, expõe-se a seguir as questões que a norteiam: Quais os conhecimentos sobre a noção de juros simples e compostos desenvolvidos no Ensino Médio que podem ser considerados como conhecimentos prévios disponíveis? Quais as articulações entre esses conhecimentos e os conhecimentos matemáticos necessários para o controle e justificativa das técnicas que lhes são associadas? Qual o papel esperado do professor no trabalho com as noções de juros simples e compostos? Qual o papel esperado dos estudantes no trabalho com as noções de juros simples e compostos? Existe uma coerência entre as relações institucionais esperadas, ou seja, o que é proposto para o Ensino Médio e Superior e as relações institucionais existentes? Iniciamos assim nossas análises pelas obras do Ensino Médio, seguindo a apresentação das justificativas da escolha, ou seja, a primeira obra é a de Dante (2008). 5.2 ANÁLISE DA OBRA DE DANTE ET AL. (2008) 5.2.1 COMENTÁRIOS E ANÁLISE O autor inicia mostrando a importância das noções de Matemática Financeira para aplicações do cotidiano como: cálculo de prestações, pagamento de impostos, rendimento de caderneta de poupança, entre outros, e motiva seu estudo por meio 112 de um exemplo em que o sujeito deve escolher entre deixar seu dinheiro aplicado na caderneta de poupança e efetuar o pagamento da compra de um bem de consumo à vista ou a prazo.A partir dessa observação, o autor introduz a noção de números proporcionais, o que corresponde a revisitar as noções de fração, equivalência de frações, grandezas diretamente e inversamente proporcionais, como podemos observar no quadro abaixo. Fonte: DANTE, 2008, p. 332. Como exemplo de divisão em partes proporcionais, o autor considera a criação de uma sociedade em que os sócios investem quantias diferentes e, portanto, devem receber diferentes partes do lucro, como mostra o exemplo abaixo. Fonte: DANTE, 2008, p. 333. No exemplo acima identificamos a forma como o autor articula conhecimentos prévios com novos conhecimentos, ou seja, ele introduz as questões associadas ao mercado financeiro para motivar e nivelar os estudantes que tenham ainda 113 dificuldades em aplicar as noções identificadas acima como necessárias para o desenvolvimento dos conceitos de Matemática Financeira. Atentamos que a introdução de números proporcionais e grandezas direta e inversamente proporcionais só são trabalhadas na obra do Dante, ou seja, trata-se de uma abordagem específica desse autor que tem a preocupação de revisitar conhecimentos prévios articulando-os com os novos conhecimentos. Ressaltamos a importância dessa revisitação tanto do ponto de vista da possibilidade de tornar os conhecimentos prévios mais estáveis e, portanto, disponíveis como da motivação do trabalho a ser efetuado posteriormente, em que as noções apresentadas servem de ferramenta explícita para o desenvolvimento das técnicas associadas à noção de juros simples. Além dos conceitos de números proporcionais e divisão em partes proporcionais, o autor revisita a noção de porcentagem, não ostensiva desenvolvida no Ensino Fundamental e que se supõe possa ser evocada pelos estudantes do Ensino Médio, o que leva à rápida apresentação e manipulação dos ostensivos de representação escrita associados, ou seja, 9% é o mesmo que 9 100 ou 0,09. Nesse caso, o autor supõe que os estudantes do Ensino Médio possam mobilizar o conceito de porcentagem e de suas diferentes formas de representação, o que será considerado como conhecimento prévio disponível para o Ensino Superior. Após essa rápida observação, o autor introduz as aplicações que envolvem o cálculo da porcentagem de uma determinada quantia. Ainda nesse caso, o trabalho apresentado deixa evidente que o autor supõe que os estudantes já disponham desses conhecimentos, o que lhe faz considerar a questão dos aumentos e descontos, assim como dos aumentos e descontos sucessivos, e a propor problemas que envolvem porcentagem e outros conhecimentos prévios, como a noção de equação, para encontrar uma solução, conforme mostra o exemplo abaixo. 114 Fonte: DANTE, 2008, p. 333. A partir da articulação entre conhecimentos prévios e conceitos de aplicações para cálculo de aumentos e descontos que fazem parte do cotidiano do mercado financeiro e da vida do cidadão, o autor introduz novos termos de Matemática Financeira associando-os com seu significado e com a representação que permite escrever as fórmulas que serão utilizadas para manipulá-los, como: capital, taxa de juros, montante e período (tempo), como mostra o exemplo do quadro abaixo: Fonte: DANTE, 2008, p. 337. Essa introdução dos termos importantes de Matemática Financeira facilita a introdução da noção de juros simples por meio de uma tarefa para a qual a técnica utilizada é justificada adotando o conceito de porcentagem e aumentos sucessivos, que corresponde à noção de juros simples, cuja fórmula que pode ser aplicada em qualquer situação do mesmo tipo é generalizada. Percebemos que o autor trabalha a passagem da representação em língua natural para a representação algébrica que permite a manipulação da técnica e, consequentemente, sua descrição, explicação e justificativa por meio de um discurso associado à teoria que o sustenta. Da mesma forma, para a noção de juros compostos o autor apresenta um exemplo articulado 115 com os componentes envolvidos na fórmula, que corresponde ao ostensivo de representação algébrica que possibilita a manipulação da técnica, como mostra o exemplo abaixo: Fonte: DANTE, 2008, p. 338. Após essa introdução dos conceitos de juros simples e compostos, o autor articula esses novos conhecimentos com as noções de função afim e exponencial respectivamente, mostrando a importância do ostensivo de representação gráfica para a visualização do trabalho algébrico desenvolvido no cálculo de juros por meio da fórmula. As noções de funções afim e função exponencial são supostas disponíveis para o estudantes do Ensino Médio e consequentemente para os estudantes do Ensino Superior. Ressaltamos que as noções de Matemática Financeira são propostas para serem trabalhadas após a introdução das noções de função afim, quadrática, exponencial, logarítmica e trigonométrica, ou seja, a Matemática Financeira é considerada uma aplicação em que são essas noções que permitem justificar o trabalho matemático em jogo.Observamos que essa articulação proposta por Dante para ser trabalhada no Ensino Médio é importante para os estudantes de Administração de Empresas, pois o ostensivo de representação gráfica permite uma rápida visualização dos resultados, o que se espera que se apresente aos interessados a evolução e o desempenho da empresa no mercado de forma simples e objetiva.O autor introduz ainda a noção de equivalência de capitais destacando que o valor de uma quantia dependerá do momento em que ocorrer a operação. Apresenta um exemplo dando ao estudante condições de realizar 116 escolhas ao trabalhar com a aplicação de capital em determinado tempo, como é apresentado no exemplo abaixo: Fonte: DANTE, 2008, p. 340. Observamos finalmente que o autor é fiel à proposta dos documentos oficiais, pois no capítulo destinado às progressões aritméticas e geométricas a articulação é feita no sentido oposto, ou seja, os conhecimentos de Matemática Financeira e função afim e exponencial são articulados com as noções de progressões aritméticas e geométricas, ou seja, existe a preocupação constante de revisitar conhecimentos prévios e utilizá-los como apoio para a introdução de novos conhecimentos. Logo, fica a cargo dos professores e estudantes interpretar, descrever, explicar e justificar a articulação entre os conhecimentos de juros simples e compostos e as noções de função afim e exponencial e progressões aritméticas e geométricas, uma vez que a obra apresenta as condições necessárias para esse trabalho. A seguir, apresentamos a parte do trabalho que consideramos para efeito de análise como a ser desenvolvida pelo professor (“topos” do professor) e pelo estudante (“topos” do estudante). 117 5.2.2 O “TOPOS” DO PROFESSOR E DO ESTUDANTE Contextualizando as aplicações da Matemática com as necessidades do mercado financeiro, deixando claro e evidente a necessidade do conhecimento da Matemática Financeira para todos na sociedade, o autor destaca exemplos do cotidiano de compra e venda, fazendo uma revisitação nas aplicações de números proporcionais e porcentagem de uma quantia. Percebemos nessa breve introdução realizada pelo autor a necessidade de o estudante possuir o domínio dos quadros numérico e algébrico considerados no capítulo anterior. O exemplo sobre aplicações de fator de atualização, aumentos e descontos sucessivos coloca em evidência a necessidade dos conhecimentos associados aos dois quadros acima, que, em geral, são desenvolvidos no Ensino Fundamental. Fonte: DANTE, 2008, p. 335. É importante observar que é necessário que o professor, ao introduzir os conceitos de proporcionalidade e de porcentagem, tenha a preocupação de mostrar a relação entre a Matemática e as aplicações financeiras, uma vez que os conceitos matemáticos sustentam os cálculos associados Fonte: DANTE, 2008, p. 335. a essas aplicações. 118 Na sequência, o autor introduz as noções de capitalização linear, juros simples, contextualizando com aplicações bancárias em que destaca o uso de quadro numérico e algébrico para identificar as incógnitas na resolução das tarefas propostas. As tarefas estão associadas às aplicações financeiras como operações de compra-venda e aplicação bancária, o que exige um estudo específico tanto do professor como do estudante, pois as aplicações financeiras, em geral, na são trabalhadas nos cursos de Matemática e exigem assim que professores articulem diferentes conhecimentos, ou seja, trata-se aqui de tarefas que ultrapassam a aplicação da Matemática no desenvolvimento de outras noções matemáticas. As noções associadas aos quadros numérico e algébrico servem de ferramentas explícitas para o desenvolvimento de tarefas do quadro da Matemática Financeira que necessita do conhecimento de termos e representações próprios para o seu desenvolvimento. Fonte: DANTE, 2008, p. 338. A tarefa abaixo se centra em uma aplicação bancária, em que professor e estudante devem associar o enunciado às respectivas representações para aplicarem a fórmula de cálculo de montante que na Matemática pode ser considerada como uma função exponencial ou uma progressão geométrica. Fonte: DANTE, 2008, p. 338. 119 Depois de apresentar as possibilidades de utilização das noções associadas à Matemática Financeira colocando, em jogo os ostensivos que permitem manipulá-las e os não ostensivos matemáticos que, ao serem evocados, descrevem, explicam e justifica essa manipulação, o autor introduz o conceito de equivalência de capital, que é muito usada em aplicações financeira bancárias e comerciais, demonstrando por meio de algumas tarefas as possibilidades de articulação entre o numérico, algébrico e geométrico. Além disso, no desenvolvimento desse trabalho o autor apresenta exemplos em que é necessário utilizar a noção de logaritmo e suas propriedades, que se supõe mobilizável, pois deve ter sido introduzida quando da definição de função logarítmica e sua associação coma noção de função exponencial. O autor finaliza o capítulo mostrando que os conceitos introdutórios de equivalência de capitais podem ser mais bem compreendidos quando se trabalha no quadro geométrico, o que facilita a introdução de fluxo de caixa em uma relação de capital no tempo. Observamos que, ao relacionar prazo e capital, o autor espera que o estudante disponha de conhecimentos das noções associadas aos quadros considerados na pesquisa, pois esses conhecimentos podem facilitar a interpretação das tarefas propostas, seja em aplicação em regime de capitalização linear, seja em regime de capitalização exponencial, como é possível visualizar nos exemplos abaixo: Suponhamos o capital de R$ 800,00 aplicado à taxa de 40% ao ano. Qual seria a representação gráfica quando obtemos os juros em função do tempo de aplicação por meio da equação. J=320t Essa função apresenta uma equação do tipo função linear Fonte: DANTE, 2008, p. 339. Fonte: DANTE, 2008, p. 339. 120 Os exemplos acima e abaixo correspondem à articulação entre a noção de juros simples e a noção de função linear e afim, ou seja, o autor mostra como a noção de função pode auxiliar a visualizar o resultado da operação financeira considerada. Fonte: DANTE, 2008, p. 339. O exemplo que segue foi introduzido pelo autor para mostrar a articulação entre a noção de juros compostos e a função exponencial. Esse trabalho auxilia a compreender mais rapidamente a variação das duas funções e deixa evidente que o gráfico da função exponencial cresce mais rapidamente que o da função afim, deixando clara a escolha da aplicação a juros compostos pelo sistema financeiro. Fonte: DANTE, 2008, p. 340. Após a explicitação do trabalho, que para efeitos de análise é considerado como a parte do professor, certamente considerando que o mesmo se realiza em 121 uma ação orquestrada com seus estudantes, passamos à verificação das tarefas propostas que são aqui reputadas como a parte a ser desenvolvida pelos estudantes. Tendo por referência nossa grade de análise apresentada no capítulo anterior, indicamos abaixo a relação entre o número de tarefas que se supõe comporem o trabalho do professor e do estudante no desenvolvimento das questões associadas às noções relativas aos conteúdos de Matemática Financeira. Resolvidas Propostas Tarefa Quantidade % Tarefa Quantidade % Tarefa 1 4 29 Tarefa 1 3 14 Tarefa 2 2 14 Tarefa 2 8 36 Tarefa 3 8 57 Tarefa 3 11 50 Tarefa 4 0 0 Tarefa 4 0 0 Total 14 1 Total 22 1 Tabela 3: Tarefas resolvidas e propostas na obra de Dante,2008. Ainda para efeito de análise, consideramos as tarefas resolvidas como a parte que corresponde ao trabalho (“topos”) do professor, e as tarefas propostas são identificadas como pertencentes ao desenvolvimento dos conhecimentos de forma autônoma (“topos”) pelos estudantes. Atentamos que nessa obra o tipo de tarefa 1, “Situação Matemática para Cálculo de Acrescimo ou Desconto”, apresenta 29% das tarefas resolvidas pelos autores, possibilitando aos estudantes uma visão do uso da matemática para trabalhar em situações do cotidiano diante de transações comerciais de varejo e em situações de investimentos por instituições financeiras. Observamos também que na obra se propõe 14% desse tipo de tarefa como trabalho a ser realizado pelos estudantes, o que é compreensível, pois essa questão corresponde a uma revisita aos conhecimentos já trabalhados no Ensino Fundamental, e aqui se trata apenas de aprofundá-los e mostrar sua aplicabilidade. 122 A análise permite identificar que nessa obra a tarefa 2, “Situação Matemática para Cálculo de Juros Simples”, foi privilegiada em apenas 14% das tarefas resolvidas.Acreditamos que tal fato esteja associado a sua pouca utilidade quando se consideram as aplicações financeiras, ou seja, aqui ela é útil para ilustrar as noções matemáticas de função linear e afim e progressão aritmética.Isso fica mais evidente quando se observa que 36% das tarefas propostas aos estudantes são do tipo 2, proporcionando uma revisita aos conteúdos já trabalhados anteriormente, isto é, existe uma intenção de tornar os conhecimentos prévios mais estáveis e mostrar a aplicabilidade e importância deles. A tarefa 3, “Situação Matemática para Cálculo de Juros Compostos”, pode ser considerada como a mais importante para o trabalho com Matemática Financeira, pois 57% do que se considera como a parte a ser desenvolvida pelo professor é composta de tarefas desse tipo, e a parte, que segundo a forma de análise fica a cargo dos estudantes, corresponde a 50% de tarefas do tipo 3. A ênfase dada a esse tipo de tarefa está associada a sua importância nas aplicações financeiras, cujo regime de capitalização é o de juros compostos. Observamos que a tarefa do tipo 3, além de ser a que corresponde às aplicações do mercado financeiro, possibilita a revisita das noções de função exponencial e logaritmo e suas propriedades permitindo assim uma articulação entre a Matemática Financeira e as noções matemáticas que servem de ferramenta para a sua sobrevivência.A tarefa 4, “Situação matemática para Cálculo de Juros sobre Depósito à Vista – o Método Hamburguês”, não é trabalhada, pois trata-se de uma aplicação específica que representa a premiação do cliente que mantém um capital em conta corrente.Finalmente, podemos considerar que nessa obra o autor utiliza a Matemática Financeira como exemplo de aplicação das noções de função afim, linear e exponencial, da noção de logaritmo e suas propriedades e dos conceitos de progressão aritmética e geométrica, o que lhes permite articular diferentes quadros e manipular as técnicas que lhe são associadas por meio de ostensivos de representação que permitem descrevê-las, explicá-las e justificá-las, evocando os não ostensivos que os sustentam. Na sequência, apresentamos uma breve análise da obra de Giovanni e Bonjorno et al. (2005). 123 5.3 ANÁLISE DA OBRA DE GIOVANNI & BONJORNO ET AL. (2005) 5.3.1 COMENTÁRIOS E ANÁLISE Os autores iniciam a obra revisitando o conceito de porcentagem, destacando a etimologia da palavra e articulando com operações varejistas do cotidiano das pessoas.O exemplo abaixo mostra o tipo de tarefa utilizado para motivar os estudantes no estudo da noção de porcentagem que se supõe tenha sido trabalhada no Ensino Fundamental, e aqui servirá de suporte para o desenvolvimento das noções de juros simples e compostos. Fonte: GIOVANNI E BONJORNO, 2005, p. 286. Observamos, por meio da tarefa acima, que implicitamente os autores consideram os conceitos de equação e proporcionalidade como disponíveis, assim como a noção de porcentagem, ou seja, eles apresentam um exemplo em que essas noções são utilizadas como ferramentas explícitas do trabalho matemático a ser desenvolvido. O novo conceito é a aplicação das noções matemáticas em exemplos da vida cotidiana. Notamos também que entre as tarefas propostas existe a preocupação em proporcionar ao estudante, por meio do encarte abaixo, o papel da taxa de juros realizado pelo Banco Central no controle de emissão ou redução da moeda. 124 Fonte: GIOVANNI E BONJORNO, 2005, p. 299. A obra trata as noções de lucro e prejuízo via tarefas contextualizadas de operações rotineiras de compra e venda e pequenos investimentos. Além disso, na obra encontramos diferentes técnicas para resolver as tarefas associadas às noções de acréscimos e descontos sucessivos, juros simples e compostos, enfatizando que para o estudo dos juros composto é preciso dispor do conceito de logaritmo e suas propriedades. Nas tarefas resolvidas é possível identificar um discurso que justifica a técnica empregada, assim como os não ostensivos utilizados para evocar os ostensivos manipulados no desenvolvimento dessas técnicas. Os ostensivos orais e gestuais estão implícitos no desenvolvimento da tarefa, cabendo ao professor recuperá-los. No exemplo abaixo, quando os autores indicam que estão utilizando o não ostensivo logaritmo, o professor deve usar ostensivos oral e gestual (dos dois lados da igualdade) para explicitar a aplicação da propriedade. 125 Fonte: GIOVANNI E BONJORNO, 2005, p. 300. Finalizam o capítulo oferecendo aos estudantes uma tabela demonstrando o valor das parcelas de uma compra de um carro e descrevendo as variações para negociação a prazo. Essa tarefa incentiva o estudante a usar a calculadora. Observamos também que os autores deixam a cargo do professor a elaboração de um discurso tecnológico adequado para justificar as diferentes técnicas. Certamente isso se deve ao fato de que o livro será utilizado por estudantes que se encontram em diferentes níveis em relação aos conhecimentos prévios necessários para a execução da tarefa. Consideramos aqui os níveis técnico, mobilizável e disponível definidos por Robert (1997). Para melhor identificar o trabalho a ser realizado por professores e estudantes, apresentamos uma breve descrição do que se supõe que esteja a cargo dos mesmos em função da grade de análise desenvolvida no capítulo anterior. 5.3.2 O “TOPOS” DO PROFESSOR E DO ESTUDANTE Na sequência fazemos a análise do “topos” do professor e do estudante considerando a tabela abaixo, em que, para efeito de análise, as tarefas resolvidas são da incumbência do professor e as propostas, dos estudantes. 126 Resolvidas Propostas Tarefa Quantidade % Tarefa Quantidade % Tarefa 1 5 36 Tarefa 1 10 19 Tarefa 2 4 29 Tarefa 2 14 27 Tarefa 3 5 36 Tarefa 3 28 54 Tarefa 4 0 0 Tarefa 4 0 0 Total 14 100 Total 52 100 Tabela 4: Tarefas resolvidas e propostas na obra de Giovanni e Bonjorno, 2005. A tarefa 1, “Situação Matemática para Cálculo de Acrescimo ou Desconto”, que corresponde a 36% das resolvidas e 19% das propostas, exige apenas que os estudantes disponham de conhecimentos sobre as operações de multiplicação, divisão e a noção de proporcionalidade e porcentagem. Já na tarefa 2, “Situação Matemática para Cálculo de Juros Simples”, a obra apresenta uma situação contextualizada, e 29% das tarefas propostas ficam a cargo do professor, e quase na mesma proporção é esperado o empenho dos estudantes, uma vez que 27% das tarefas propostas são do tipo 2.Verificamos assim que as tarefas 1 e 2 são utilizadas como uma nova forma de revisitar conhecimentos associados às noções de operações com números racionais, proporcionalidade, porcentagem e equação do primeiro grau.A tarefa 3, “Situação Matemática para Cálculo de Juros Compostos”, como na obra anterior, é privilegiada, pois cabe ao professor desenvolver 36% das tarefas propostas, e para os estudantes ela corresponde à mais da metade do trabalho a ser desenvolvido. Como já discutido nas análises da obra anterior, essa ênfase pode ser vista como a possibilidade de utilização da Matemática desenvolvida no Ensino Médio como ferramenta para o cálculo das aplicações financeiras, atualmente muito usadas pelos profissionais dessa área. A tarefa 4, “Situação matemática para Cálculo de Juros sobre Depósito à Vista – o Método Hamburguês”, como na obra anterior, não é abordada nessa obra.A grande diferença entre essa obra e a anterior é que não existe uma preocupação dos autores em articular as noções de função afim, linear exponencial e progressões aritméticas e geométricas com os conceitos de Matemática Financeira, ou seja, revisitam-se apenas a noção de logaritmo e suas 127 propriedades para desenvolver os cálculos necessários.Os autores distribuem equitativamente o trabalho do professor no desenvolvimento das três tarefas, mas dão ênfase à tarefa 3 quando se considera o “topos” do estudante.Seguimos apresentando uma breve análise da obra de Xavier e Barreto et al. (2005). 5.4 ANÁLISE DA OBRA DE XAVIER E BARRETO ET AL. (2005) Os autores iniciam a obra fazendo um comentário sobre a importância da Matemática Financeira, explicitando seu vínculo com a economia de mercado e destacando a necessidade desse conhecimento para melhor interpretar os mecanismos das operações financeiras com as quais nos confrontamos diariamente. Após revisitar os conceitos de proporcionalidade e porcentagem, indica-se a representação percentual em forma de fração como essencial para o trabalho a ser desenvolvido na obra. Apresenta como exemplo motivador uma questão da prova do Enem, exposta abaixo, em que se utilizam ostensivos de representação numérica. Fonte: XAVIER E BARRETO, 2005, p. 19-20. 128 Essa escolha em apresentar temas sociais e econômicos do cotidiano é sentida no desenvolvimento da obra. Notamos uma preocupação dos autores em mostrar as diferentes formas de representação das porcentagens, o que permitirá a aplicação mais adequada quando necessário. bO encaminhamento dado às questões de Matemática Financeira na obra segue as orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais, mas os exemplos retirados do Enem, em geral, são artificiais e pouco ajuda na introdução do novo conceito. O exemplo abaixo deixa evidente a falta de articulação entre a situação contextualizada e o conceito de porcentagem que se deseja introduzir. Não existe um discurso que justifique como tratar os dados da tabela. Fonte: XAVIER E BARRETO, 2005, p. 20. Para tratarem da noção de juros simples, os autores associam os dados da tarefa aos elementos da fórmula e calculam os juros sem apresentar um discurso que descreva, explique e justifique o trabalho matemático realizado. A noção de equação é suposta disponível e o discurso sobre o desenvolvimento da técnica fica a cargo do professor. 129 Fonte: XAVIER E BARRETO, 2005, p. 23. No exemplo acima fica mais evidente que os autores consideram os conhecimentos sobre porcentagem e suas representações, assim como a noção de equação do primeiro grau como disponíveis utilizando apenas um discurso que justifica os termos de Matemática Financeira dados na tarefa e os elementos da fórmula que permite efetuar os cálculos. Como já descrito para os exemplos anteriores, as tarefas desenvolvidas na obra sobre aumentos e descontos sucessivos seguem a mesma abordagem, ou seja, converte-se o enunciado nos elementos da fórmula e efetuam-se os cálculos, podendo utilizar uma calculadora. O exemplo abaixo de aumentos sucessivos ilustra a forma de trabalho própria da obra. Fonte: XAVIER E BARRETO, 2005, p. 28 A noção de juros compostos não é introduzida nessa obra. Verificamos que os autores introduzem a Matemática Financeira como um novo conteúdo, utilizando como conhecimentos prévios as operações com números racionais, as noções de proporcionalidade, porcentagem, equação do primeiro grau, supondo-as como disponíveis. A articulação entre as noções de juros simples com os conceitos de função afim, linear e progressões aritméticas não é trabalhada nessa obra; 130 encontramos esse trabalho apenas na primeira obra analisada neste estudo. Na sequência, apresentamos uma breve descrição do trabalho esperado de professores e estudantes segundo nossa proposta de análise. 5.4.1 O “TOPOS” DO PROFESSOR E DO ESTUDANTE Semelhante ao processo que estamos desenvolvendo nas obras anteriores, fazemos uma análise do “topos” do professor e do estudante considerando as tarefas resolvidas atribuídas ao professor e as tarefas propostas conferidas aos estudantes. Resolvidas Propostas Tarefa Quantidade % Tarefa Quantidade % Tarefa 1 2 50 Tarefa 1 5 45 Tarefa 2 2 50 Tarefa 2 6 55 Tarefa 3 0 0 Tarefa 3 0 0 Tarefa 4 0 0 Tarefa 4 0 0 Total 4 100 Total 11 100 Tabela 5: Tarefas resolvidas e propostas na obra de Xavier & Barreto, 2005. A tabela acima mostra que apenas as tarefas do tipo 1 e 2 são desenvolvidas na obra. Destacamos a proporcionalidade encontrada no trabalho do professor e do estudante. Considerando as propostas institucionais, observamos que o professor e o estudante devem procurar outros materiais para desenvolver e estudar a noção de juros compostos, que não é abordada explicitamente na obra e pode ser um fator de dificuldade para aqueles que continuarem seus estudos, em particular, nos cursos de Administração. Consideramos que a obra não apresenta explicitamente a noção de juros compostos, mas esta é tratada por meio de uma tarefa complementar sobre a trajetória histórica do cálculo de juros na Babilônia. Além disso, os autores tomam em conta a noção de “juros sobre juros” que na realidade corresponde à noção de juros compostos, permitindo assim que o professor escolha se deve ou não aprofundar o tema. Isso mostra que os autores tentam contemplar as exigências 131 institucionais, mas algumas necessitam de um aprofundamento que depende das diferentes turmas, e que fica a cargo do professor. Certamente, cabe ao professor escolher e adaptar o trabalho apresentado na obra em função de sua turma e das exigências institucionais de sua região, o que é indicado nos Parâmetros Curriculares Nacionais e mostra a importância das diferentes obras, que possibilitam uma flexibilidade no trabalho do professor, que pode adequá-las em função dos conhecimentos prévios de seus estudantes. Continuando a nossa análise, passamos aos livros por nós escolhidos e que fazem parte das ementas dos cursos superiores de Administração considerados neste trabalho, em que é oferecida Matemática Financeira. 5.5 ANÁLISE DA OBRA DE SOBRINHO ET AL. (2000) 5.5.1 COMENTÁRIOS E ANÁLISE O autor inicia a obra agradecendo o sucesso dela entre os profissionais que militam no mercado financeiro, demonstrando assim a recepção apropriada do livro entre os técnicos, gerentes executivos e estudantes dessa matéria. O livro é composto de onze capítulos e dois apêndices, sendo que o apêndice A traz uma revisão sobre potências, progressões e interpolação, e o apêndice B apresenta as tabelas financeiras. No capítulo 1, apresenta os conceitos de juros, capital e taxa enfatizando a relação entre possuir o capital para a compra de bens de consumo ou serviços e a possibilidade de emprestá-lo, assim como os riscos dessa segunda opção. Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 19. 132 Após mostrar a importância do uso do capital e suas consequências, o autor faz a exposição do trabalho algébrico que permite manipular os cálculos associados ao regime de capitalização linear, ou juros simples. Na sequencia, é apresentada uma série de tarefas resolvidas e propostas em que se espera que o estudante disponha de conhecimentos sobre o conjunto dos números naturais, racionais, inteiros e suas operações, noção de cálculo algébrico e de equações do primeiro grau e mobilize os novos conhecimentos associados à identificação dos elementos dados no enunciado com os conceitos e as representações usados nas fórmulas para os cálculos de juros, montante, capital, prazo e taxa. Ainda no capítulo 1, o autor apresenta o método hamburguês mostrando que algum tempo atrás os bancos pagavam juros sobre os depósitos à vista, propiciando assim uma reflexão entre oferta e demanda de capital pelos bancos. É interessante destacar que o método hamburguês é um dos precursores do cheque especial de hoje, em que se efetua o cálculo de juros sobre o saldo devedor. Essas contas eram denominadas contas garantidas. Isso auxilia professores e estudantes a entender melhor o desenvolvimento do sistema financeiro e até mesmo das influências econômicas no País e principalmente a importância do conhecimento da Matemática nesse contexto, propiciando condições de exercer plenamente a cidadania consciente ao se relacionar com instituições financeiras. Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 29. 133 No capítulo 2, “Capitalização Composta”, é trabalhada o conceito de Montante e valor atual para pagamento único. O autor inicia o capítulo apresentando os conceitos e simbologias utilizados para manipular as fórmulas que permitem executar os cálculos associados a esse regime de capitalização. O trabalho é realizado quase que exclusivamente no quadro algébrico e os conhecimentos prévios de álgebra elementar como o conceito de equação do primeiro grau de funções linear, afim e exponencial, assim como de logaritmos e suas propriedades são supostos disponíveis. O discurso que acompanha as tarefas resolvidas, em geral, explicita a conversão dos dados do problema para as representações algébricas correspondentes, ou seja, trata-se principalmente da identificação dos termos: prazo taxa valor futuro, valor presente, representação gráfica na relação do valor futuro com taxa possibilitando uma melhor visualização e interpretação dos resultados. Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 27. O autor apresenta diversas situações-problema detalhando suas respectivas soluções. É abordada também a questão da “Equivalência de taxas”, noção importante para o estudo do processo da variação da taxa em função do prazo. O exemplo abaixo deixa evidente que na obra o objetivo é descrever, explicar e justificar os conceitos de Matemática Financeira, e a Matemática subjacente é 134 suposta disponível, ficando a cargo do professor e estudante explicitar esse trabalho quando necessário. Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 27. Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 42. O autor incentiva o uso da calculadora financeira HP12C e mostra a necessidade de explicitar a forma como se calculam os juros de um empréstimo quando se introduz essa nova ferramenta no curso, ou seja, a calculadora exige uma nova técnica e consequentemente um novo discurso que a justifique. Observamos que, ao introduzir a calculadora, o professor deve estar consciente da importância de descrever, explicar e justificar a nova forma de cálculo que faz uso de outros ostensivos de representação que precisam ser identificados nos botões da calculadora, como é possível observar nos exemplos abaixo. 135 Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 347 Fonte: SOBRINHO, 2000, p. 349. Na sequencia, apresentamos as análises sobre o que se espera de professores e estudante em função da nossa proposta de estudo do papel desses dois atores na ação que se desenvolve no processo de ensino e aprendizagem. 5.5.2 O “TOPOS” DO PROFESSOR E DO ESTUDANTE De acordo com a grade de análise criada no capítulo anterior, diante das tarefas resolvidas e propostas no livro analisado, procuramos identificar a relação entre o que corresponde à parte a ser desenvolvida pelo professor e o que fica a cargo do estudante, ou seja, o “topos” do professor e o “topos” do estudante. A tabela abaixo mostra a distribuição das tarefas de juros simples e compostos na obra. 136 Resolvidas Propostas Tarefa Quantidade % Tarefa Quantidade % Tarefa 1 0 0 Tarefa 1 0 0 Tarefa 2 10 59 Tarefa 2 23 49 Tarefa 3 05 29 Tarefa 3 21 45 Tarefa 4 02 12 Tarefa 4 03 6 Total 17 100 Total 47 100 Tabela 6: Tarefas resolvidas e propostas na obra de Sobrinho, 2000. Observando a tabela, verificamos que a tarefa 1, “Situação Matemática para Cálculo de Acrescimo ou Desconto”, não é trabalhada na obra, o que permite supor que se trata de um conhecimento prévio que pode estar disponível e que tenha sido suficientemente trabalhado no Ensino Médio.Quanto à tarefa 2, “Situação Matemática para Cálculo de Juros Simples”, notamos que o autor preocupa em enfatizar aplicações do cotidiano do mercado financeiro deixando a cargo dos estudantes revisitar os conceitos de progressão aritmética e geométrica e fazer a articulação necessária, ou seja, o autor considera esse conhecimento pelo menos mobilizável pelos estudantes, uma vez que ele é tratado apenas no apêndice, que é indicado para estudos complementares. Esse apêndice também é usado para indicar procedimentos para resolução de tarefas com o auxílio da calculadora financeira HP 12C. Em relação ao número de tarefas, conforme nossa proposta de análise, o professor desenvolve 59% das tarefas propostas e o estudante 49%, o que é proporcional, pois o número de tarefas resolvidas é menor que o de tarefas propostas. No tocante à tarefa 3, “Situação Matemática para Cálculo de Juros Compostos”, observamos que existe uma preocupação do autor em deixar a cargo do estudante o desenvolvimento de tarefas como essa, pois entre aquelas resolvidas encontramos 29% associadas a esse tipo, e que se supõe destinadas ao professor, e 45% de tarefas propostas que ficam a cargo do estudante. É importante observar que o autor dá ênfase às tarefas de juros simples e compostos tanto para o desenvolvimento do trabalho suposto do professor como do estudante. 137 Além disso, a articulação desses conhecimentos com as noções de progressão aritmética e geométrica, mesmo ficando a cargo do estudante, é proposta em apêndice e pode ser trabalhada pelo professor. A tarefa 4, “Situação Matemática para Cálculo de Juros sobre Depósito à Vista – o Método Hamburguês”, em geral, introduzida no Ensino Superior e que se apoia sobre as noções de juros, em especial, juros compostos, é suposta como o novo conhecimento a ser introduzido, correspondendo principalmente à parte do professor, 12% das tarefas resolvidas e 6% das propostas. Observamos ainda que o autor aprensenta um diferencial quanto à abordagem do Método Hamburguês, pois traz um histórico sobre esse método destacando sua aplicação no Brasil, ou seja, a passagem da conta garantida para o cheque especial atual, em que a incidência e necessidade de manipular juros compostos são evidentes. Além disso, o livro faz referência a temas atuais mostrando por exemplo o papel dos bancos na economia, evidenciando assim a importância da Matemática Financeira tanto para estudantes do Ensino Médio quanto para os do Ensino Superior, pois possibilita a escolha consciente das condições de pagamentos em transanções comerciais e aquisições no mercado financeiro.Verificamos que nessa obra o destaque é para aplicações bancárias e imobiliárias, pois as tarefas pivilegiam essa porção do mercado financeiro, que nos parece a mais operante atualmente.As tarefas são desenvolvidas quase que exlusivamente no quadro algébrico e pouco se utiliza a representação gráfica que permitiria uma melhor visualização dos resultados. Em função da necessidade dos estudantes de conhecer a forma de trabalho do mercado financeiro, a calculadora financeira HP 12C é introduzida no curso, e o autor deixa evidente a necessidade de explicitar o trabalho a ser realizado, pois temos uma nova representação para os objetos de Matemática Financeira. Na sequência apresentamos a segunda e última obra escolhida para nossas análises, lembrando que se trata do material que utilizamos em nossos cursos de Matemática Financeira, bem como é citada nos quatro planos de ensino das universidades discutidos neste trabalho. 138 5.6 ANÁLISE DA OBRA DE PUCCINI ET AL. (2008) 5.6.1 COMENTÁRIOS E ANÁLISE O autor inicia a obra destacando os termos de Matemática Financeira e as representações que possibilitam escrever as fórmulas que permitem manipular as técnicas associadas à resolução das tarefas a serem desenvolvidas no curso.Quanto à abordagem escolhida, o autor esclarece que o presente curso tem como objetivo privilegiar as aplicações do mercado financeiro, o que o conduz a introduzir a calculadora financeira HP12C e planilha eletrônica Excel. Nos nove capítulos iniciais, todo o conteúdo é desenvolvido tendo como princípio a hipótese de aplicação da Matemática Financeira em países onde a moeda é estável, ou seja, a inflação é controlada. A obra traz ainda dois Apêndices – Apêndice “A”, em que faz uma apresentação das principais funções financeiras da calculadora financeira HP12C e um Simulador, auxiliando o estudante no reconhecimento dessa nova forma de representação que implicará uma nova maneira de trabalho com a Matemática. No Apêndice “B” são indicadas as funções financeiras do aplicativo Microsoft Excel. Tais recursos correspondem à outra forma de representar e calcular, diferentes das anteriores, que necessita de um estudo em que explicite a maneira de manipular esse novo ostensivo, mesmo que os não ostensivos que serão evocados sejam os mesmos. O autor se preocupa ainda em contextualizar os conceitos desenvolvidos nos diferentes capítulos por meio de tarefas que são habitualmente usadas pelo mercado financeiro, em particular, o mercado imobiliário e bancário. No capítulo 1, “Conceitos básicos e Simbologia”, são oferecidos os conceitos de juros, unidades de medidas articulados a fluxo de caixa, dando ao estudante uma visão conceitual do valor do dinheiro no tempo e os objetivos da Matemática Financeira. 139 A introdução desse curso necessita de um discurso que justifica o trabalho matemático a ser executado, tornando mais evidente à importância da tecnologia que justifica a técnica. Fonte: PUCCINI, 2008, p. 2. Fonte: PUCCINI, 2008, p. 4. Para introduzir a noção de fluxo de caixa, o autor insere uma nova representação, ou seja, um ostensivo de representação gráfico dado na forma de diagrama que permite visualizar a relação entre os diferentes períodos, enfatizando que eles não são contínuos. Na sequencia, o autor descreve e explica como efetuar os cálculos usando a calculadora financeira HP 12C. Observamos aqui a necessidade de um longo discurso tecnológico quando se introduz essa nova forma de representar os elementos e de calculá-los. 140 Fonte: PUCCINI, 2008, p. 5. Fonte: PUCCINI, 2008, p. 5. No capítulo 2, “Juros Simples e Compostos – Conceitos” segue o autor revisitando os conceitos de juros simples e compostos utilizando situações-problema específicas, para as quais se supõe que as noções de proporcionalidade e porcentagem, números reais, suas representações e propriedade, equações de primeiro grau, função linear e afim, equação exponencial, função exponencial, logaritmos e suas propriedades e suas respectivas representações sejam conhecimentos prévios disponíveis. 141 Apresentamos abaixo o discurso seguido de uma situação contextualizada considerada na obra e que colocam em evidência as afirmações expostas acima. Fonte: PUCCINI, 2008, p. 13. Fonte: PUCCINI, 2008, p. 13. No capítulo 3, “Juros Simples – Fórmulas Básicas” são apresentadas as fórmulas básicas de juros simples, e as tarefas resolvidas e propostas correspondem à manipulação dessas fórmulas, que, como já indicamos acima, exige conhecimentos prévios que se supõe tenham sido desenvolvidos no Ensino Médio, sendo, portanto, disponíveis. O exemplo abaixo justifica nossa interpretação quanto ao nível que se deseja que os estudantes disponham em relação aos conhecimentos prévios necessários para o desenvolvimento do curso. 142 Fonte: PUCCINI, 2008, p. 13. No final do capítulo, o autor retoma o diagrama padrão de fluxo de caixa e utiliza um discurso em língua natural, que poderá ser enfatizado pelo professor para descrever, explicar e apresentar a relação entre o diagrama e a fórmula que possibilita o cálculo dos juros. A obra faz uso de uma tecnologia adequada onde o autor articula os conhecimentos sobre juros simples e suas representações desenvolvidas no Ensino Médio com as novas técnicas e representações propostas no Ensino Superior, e que correspondem à forma de tratamento do mercado financeiro. Fonte: PUCCINI, 2008, p. 25. 143 No capítulo 4, “Juros Compostos – Capitalização e Desconto”, o autor apresenta os conceitos de juros compostos utilizando a mesma abordagem considerada no capítulo anterior, e é a partir desse momento que introduz uma nova forma de cálculo, ou seja, a calculadora financeira HP 12C, que é um novo ostensivo para trabalhar as técnicas associadas à noção de juros compostos. A própria noção de juros compostos, suas representações, as técnicas desenvolvidas no Ensino Médio, assim como os conhecimentos prévios necessários para manipular essas técnicas, são aqui supostos disponíveis. O exemplo abaixo ilustra e justifica as afirmações descritas acima. Fonte: PUCCINI, 2008, p. 48. Apenas os quatro primeiros capítulos tratam explicitamente as noções de juros simples e compostos, portanto nos retivemos nos exames desses capítulos e apresentamos a seguir o que, segundo nossa forma de análise, corresponde ao trabalho do professor e do estudante. 5.6.2 O “TOPOS” DO PROFESSOR E DO ESTUDANTE Como para as obras anteriores, analisamos via grade de análise apresentada no capítulo anterior o que se supõe como “topos” do professor e do estudante, conforme nossa proposta de análise. A tabela abaixo permite distinguir a quantidade de tarefas que correspondem ao trabalho do professor e do estudante e que o 144 número total de tarefas resolvidas é próximo do de tarefas propostas. Isso mostra que o trabalho é distribuído proporcionalmente. Resolvidas Propostas Tarefa Quantidade % Tarefa Quantidade % Tarefa 1 0 0 Tarefa 1 0 0 Tarefa 2 8 40 Tarefa 2 12 46 Tarefa 3 12 60 Tarefa 3 14 54 Tarefa 4 0 0 Tarefa 4 0 0 Total 20 100 Total 26 100 Tabela 7: Tarefas resolvidas e propostas na obra de Puccini, 2008. Analisando a tabela acima, observamos que o autor supõe disponível a tarefa 1, “Situação Matemática para Cálculo de Acréscimo ou Desconto”, isto é, fica a cargo de professores e estudantes revisitar os conhecimentos matemáticos necessários para a sua solução. Para a tarefa 2, “Situação Matemática para Cálculo de Juros Simples”, o autor propõe uma revisitação aos conceitos básicos necessários para sua solução por meio de uma situação-problema que articula o novo conhecimento, ou seja, a noção de fluxo de caixa com os conhecimentos prévios supostos disponíveis. Esse trabalho nos parece interessante, pois permite estabilizar os conhecimentos prévios e dar significado ao novo conhecimento. Observamos ainda que a noção de fluxo de caixa é importante no desenvolvimento do curso de Administração. A diferença dessa obra para a anterior é a proposta do estudo das formas de aplicação do dinheiro no tempo por meio de contextualizações associadas às situações inflacionárias. Essa obra, como a anterior, enfatiza o uso da calculadora financeira HP 12C e, além disso, propõe a utilização do aplicativo Microsoft Excel, dando exemplos de tarefas em que os cálculos são desenvolvidos por meio desse aplicativo. Cabe ao professor escolher a melhor forma de trabalho com seus estudantes. 145 Para a tarefa 2, observamos que o número de tarefas resolvidas e propostas são proporcional, o que indica que professores e estudantes são responsáveis pelo bom desenvolvimento da disciplina. A tarefa 3, “Situação Matemática para Cálculo de Juros Compostos”, que corresponde ao trabalho com a noção de juros compostos, também é distribuída proporcionalmente quando se considera o trabalho de professores e estudantes.O autor propõe um curso cuja responsabilidade de seu sucesso depende do trabalho orquestrado de professores e estudantes na ação que se desenvolve no processo de ensino e aprendizagem. Verificamos que nessa obra o destaque é para aplicações bancárias e investimentos, com evidência da utilização das ferramentas, como a calculadora financeira HP 12C e o software Microsoft Excel, que compõem habitualmente a prática dos profissionais da área financeira. Finalizamos apresentando algumas considerações sobre as obras analisadas para mostrar que as relações institucionais existentes são coerentes com as relações institucionais esperadas, e que, se o trabalho existente para ser realizado no Ensino Médio for colocado em prática, os estudantes de Administração terão mais condições de compreender as propostas para o Ensino Superior e desenvolvê-las com maior autonomia. 5.7 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao iniciar a obra Matemática, Dante et al. (2008), especificamente o capítulo 27 – Noções de Matemática Financeira, comentam que entre suas aplicações estão os recursos para auxiliar nas soluções de problemas financeiros. A obra revisita o conceito de proporcionalidade e de juros simples e compostos, utilizando como conhecimentos prévios mobilizáveis as noções de números reais e suas representações, porcentagem e suas representações, equação do primeiro grau, função afim e linear e suas representações, progressão aritmética, equação exponencial, função exponencial e suas representações, logaritmos e suas propriedades. Observamos que essa obra destinada ao Ensino Médio, entre as outras analisadas, é a única que trabalha explicitamente a articulação entre as noções de juros simples e compostos com as noções de funções afim e linear e exponencial e progressões aritméticas e geométricas. 146 Esse trabalho possibilita uma maior estabilidade desses conhecimentos prévios e permitem a utilização de outras formas de tratamento, em particular, as representações gráficas das funções que auxiliam na visualização dos resultados. É importante observar que o autor se preocupa em desenvolver tarefas que correspondem a situações cotidianas de compra e venda e aplicações no mercado financeiro. A obra Matemática completa, de Giovanni e Bonjorno et al. (2005), também inicia revisitando a noção de porcentagem e suas representações e supõe como disponíveis os conhecimentos sobre as noções de números reais e suas representações, porcentagem e suas representações, equação do primeiro grau, equação exponencial e logaritmos e suas propriedades. Nesse caso, revisitar esses conhecimentos fica a cargo de professores e estudantes. Ambos têm a mesma responsabilidade e podem negociar como efetuar esse trabalho. A obra contextualiza os conceitos com aplicações financeiras do cotidiano. Ao compararmos com a obra do Dante, percebemos algumas similaridades, principalmente em relação às tarefas resolvidas e propostas em que se privilegiam as transações bancárias e de varejo. Um detalhe interessante é que na obra de Dante é destacada a importância do contextualizar com o estudante conceitos e aplicações do fator de atualização, conceito não encontrado em nenhuma das outras obras examinadas, nem nas obras sugeridas para o Ensino Superior. Atentamos também que Bonjorno recorre a alguns fatos históricos associados ao conceito tratado e conduz o estudante ao uso da calculadora financeira. Ao considerar a obra de Xavier e Barreto (2005), verificamos que a Matemática Financeira é apresentada como um pequeno apêndice sintetizando conceitos de porcentagem, juros simples, compostos, lucros e descontos. Podemos concluir que, nas três obras indicadas pelo PNLEM (2009), está presente uma preocupação em desenvolver o caráter ferramenta das noções de juros simples e compostos, com exceção da obra de Dante que, ao articular essas noções com as funções e progressões que lhe são associadas, também desenvolve 147 o caráter ferramenta e possibilita a descrição, explicação e justificativa da tecnologia utilizada para efetuar esse mesmo trabalho sobre as técnicas. Ao examinar as obras indicadas para o Ensino Superior, percebemos que na obra de Sobrinho et al. (2000), Matemática financeira, existe a preocupação em apresentar os conceitos essenciais das aplicações de juros, oferecendo os diversos contextos vinculados a essas noções por meio das tarefas resolvidas, que correspondem ao “topos do professor”.Verificamos também nessa obra a preocupação em introduzir a nova forma de representação que corresponde ao trabalho com a calculadora financeira HP12C. Notamos também que o autor não se preocupou apenas em explicitar alguns procedimentos e recursos da calculadora, mas propõe um apêndice em que descreve, explica e justifica tanto os procedimentos necessários para utilizar esse instrumento como a forma de trabalhar com tarefas específicas do mercado financeiro. A outra obra analisada, Matemática financeira, de Puccini et al. (2008), também introduz a nova representação que corresponde à calculadora financeira HP 12C, indo além ao tratar do uso do software Microsoft Excel, atualmente muito utilizado no mercado financeiro. Nas duas obras analisadas, que correspondem ao Ensino Superior, observamos que em relação às noções de juros simples e compostos o trabalho desenvolvido no Ensino Médio é considerado como pelo menos mobilizável para os estudantes que escolhem o curso de Administração. Isso mostra a importância do trabalho a ser realizado pelos professores e estudantes do Ensino Médio para que se possa executar de forma mais satisfatória o que se planeja para ser desenvolvido com os estudantes de Administração do Ensino Superior.Observamos que existem todos os meios para efetuar esse trabalho de forma que os estudantes, ao iniciarem o Ensino Superior, não sejam desestimulados pela falta de conhecimentos prévios e possam pelos menos mobilizar esses conhecimentos quando necessário, isto é, que a transição entre o Ensino Médio e Superior possa se realizar de forma menos traumática e sem tantas dificuldades. 148 CONSIDERAÇÕES FINAIS E PERSPECTIVAS FUTURAS Finalizamos este trabalho com algumas considerações finais e perspectivas futuras para as pesquisas sobre as relações institucionais esperadas e existentes quando se considera a transição entre o Ensino Médio e Ensino Superior, em particular, quando se introduz a noção de juros simples e compostos e quando se revisita essa noção na disciplina de Matemática Financeira no Ensino Superior. Retomamos aqui as questões iniciais que nortearam esta pesquisa e para as quais avançamos alguns elementos de resposta, mas que ainda podem ser trabalhadas e melhor elucidadas por pesquisas futuras associadas à aprendizagem dos estudantes, quando considerados os conhecimentos prévios que podem ser reputados pelo menos mobilizáveis na transição entre o Ensino Médio e Superior para os estudantes, dos cursos de Administração. 1. Quais os conhecimentos prévios sobre a noção de juros simples e compostos são desenvolvidos no Ensino Médio? 2. Quais as articulações entre esses conhecimentos e os conhecimentos matemáticos necessários para o controle e justificativa das técnicas associados às noções de juros simples e compostos? 3. Qual o papel esperado do professor no trabalho com essas noções? 4. Qual o papel esperado dos estudantes no trabalho com essas noções? 5. Quais as indicações das diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de graduação em Administração para o ensino da noção de juros simples e compostos para o curso de Administração? 6. Existe uma coerência entre o que é proposto para o Ensino Médio e Superior, isto é, os conhecimentos prévios supostos disponíveis são trabalhados no Ensino Médio conforme a expectativa do Ensino Superior? Inicialmente, para esclarecer nossas escolhas tanto do referencial teórico utilizado como das noções matemáticas, ressaltamos que a proposta do estudo das relações institucionais esperadas e existentes quando se consideram as noções de 149 juros simples e compostos na transição entre o Ensino Médio e o Ensino Superior se deve ao fato que se trata de um conceito que é utilizado por todos para o controle da vida pessoal, pois vivemos em um mundo onde em geral tudo varia em função do capital em relação ao tempo. A escolha da Teoria Antropológica do Didático (TAD) como referencial teórico central para as análises propostas na pesquisa permite mostrar a força dessa teoria para esse tipo de análise, pois possibilita compreender melhor as organizações matemáticas e didáticas existentes em função de suas práticas, isto é, dos tipos de tarefas e das técnicas associadas e do discurso que permite descrever, explicar e justificar essas técnicas tanto do ponto de vista tecnológico como teórico. Além disso, complementamos essas análises com as abordagens teóricas em termos de quadro conforme definição de Douady (1984, 1992) e de níveis de conhecimento esperado dos estudantes conforme definição de Robert (1997), que possibilitou identificar a forma como a noção estudada é trabalhada no Ensino Médio e Superior e o nível de conhecimento esperado nas duas etapas da transição. Observamos que a noção de juros simples e compostos é abordada de diferentes formas no Ensino Médio, sendo considerados diferentes quadros e sua articulação com noções reputadas como conhecimentos prévios, pelo menos mobilizáveis, nessa etapa escolar. Dessa forma, ressaltamos que, se realmente o trabalho proposto no Ensino Médio for desenvolvido, as propostas encontradas para o Ensino Superior serão adequadas, pois nesse momento podemos utilizar essas noções apenas como ferramentas do trabalho matemático a ser efetuado e dar mais ênfase à introdução de novas tecnologias, como a calculadora financeira e as planilhas eletrônicas. Para melhor compreender as conclusões apresentadas acima, destacamos que a análise das relações institucionais esperadas para o Ensino Médio e Superior via documentos oficiais, ou seja, Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM) e Nova Proposta do Estado de São Paulo e os planos de ensino de quatro Universidades, sendo duas públicas e duas privadas, respectivamente, mostra que existe uma coerência entre o que é proposto no Ensino Médio e o trabalho a ser realizado no Ensino Superior. Além disso, para o Ensino Médio, o papel do professor e do estudante é bem definido tanto no que se refere às organizações matemáticas quanto o que cada um deve dispor enquanto 150 conhecimento para caminhar em conjunto na introdução de novos conhecimentos, como as organizações didáticas que deixam evidente a necessidade do trabalho individual e autônomo dos estudantes no decorrer do processo de ensino e aprendizagem. A análise das relações institucionais existentes via alguns livros didáticos do Ensino Médio e Superior mostra que há coerência entre as expectativas institucionais e o trabalho que, pela forma como se conduziram as análises, se supõe seja desenvolvido por professores e estudantes. Certamente, para cada obra analisada existem outras questões que poderiam ter sido levadas em conta, mas estas ficam a cargo do professor que pode ou não completar esse trabalho em função do conhecimento prévio de seus estudantes e da participação deles no curso, isto é, se estão interessados em aprender e ser autônomos ou apenas em repetir tarefas próximas para ter sucesso nas provas. Além disso, consideramos que as análises dos livros didáticos possibilitam identificar, de forma geral, qual o nível de conhecimento sobre as noções de juros simples e compostos que podemos reputar como pelo menos mobilizável para os estudantes que terminam o Ensino Médio, ou seja, trata-se do nível mobilizável em relação à nomenclatura e às formulas associadas a esses conceitos. A questão da articulação com as noções de função afim e exponencial e progressões aritméticas e geométricas que poderia auxiliar a melhor compreenderem essas noções é considerada apenas em um dos livros do Ensino Médio avaliado, e não é tratada no Ensino Superior. Portanto, tanto para o Ensino Médio como para o Ensino Superior os conhecimentos matemáticos necessários quando do trabalho com as noções de juros simples e compostos necessitam apenas das noções de proporcionalidade, operações com números reais, equações do primeiro grau, equações exponenciais e a noção de logaritmo e suas propriedades. No entanto, uma articulação entre esses conhecimentos e outros conhecimentos, já discutidos acima, poderia auxiliar a melhor compreender esses conceitos e tornar ambos mais ricos e estáveis. Finalmente observamos, por meio da grade de análise construída para identificar os diferentes tipos de tarefas que sobrevivem tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior, que existe um número 151 reduzido de tarefas e que estas poderiam ser mais bem aproveitadas quando se introduzem as noções de juros simples e compostos no Ensino Superior. Como exemplo consideramos que os conhecimentos de progressão aritmética associados aos processos de crescimento, quando uma série de valores, podem ter sua variação (crescimento ou decrescimento). Os exemplos abaixo colocam em evidência a possibilidade de articulação entre juros simples, proposta aritmética, proporcionalidade e regra de três. Exemplo 1: Qual o montante final de uma aplicação de $2.000,00, a juros simples contratados a 2% ao mês, por 6 meses? Observa-se também que no tratamento de juros simples existe proporcionalidade entre taxa e tempo, em que os juros são lineares. É possível também fazer uso da aplicação de “regras de três”, tal como a tarefa abaixo: Exemplo 2: Qual a taxa mensal de juros simples que, em uma aplicação por 5 meses, elevou um capital de $ 2.000,00 para $ 2.450,00? Dessa forma, sendo a Matemática Financeira uma das formas de aplicar determinados conceitos matemáticos, considera-se que para desenvolver esse trabalho é necessário dispor de conhecimentos associados à articulação de conceitos explicitados acima. É importante destacar que os estudantes não estão partindo do “zero”, dado que possuem alguns conhecimentos como: progressão aritmética (PA), regra de três, função afim, função exponencial, noções logaritmos. Nossa prática deixa evidente que um dos grandes desafios é articular esses conhecimentos na resolução de tarefas que envolvem “juros simples” e “juros compostos”, foco deste trabalho. A articulação entre esses conhecimentos que os estudantes já possuem acreditamos fazer parte do “topos” do professor, que é mediar e demonstrar como utilizar na resolução de novas tarefas. 152 Parece-nos que trabalhar essas tarefas articulando conhecimentos específicos de Matemática Financeira e conhecimentos matemáticos poderiam auxiliar os estudantes, reduzindo o número de fracassos e evasões. Esses conhecimentos são requisitos essenciais aos estudantes egressos dos cursos superiores ao exercerem uma determinada profissão, tais como Gerente Financeiro, Contador ou até mesmo Analista de Investimentos. Isso sugere a necessidade de continuar essa pesquisa, a partir dos resultados encontrados nas análises das relações institucionais esperadas e existentes. Poderse-ia construir uma nova organização centrada na articulação entre os conhecimentos matemáticos desenvolvidos no Ensino Médio e as noções de juros simples e compostos já trabalhadas com as novas tecnologias.Os estudantes dos cursos de Administração devem se apropriar para motivar e dar sentido a estas noções, uma vez que a Matemática Financeira pode ser considerada como uma contextualização de conhecimentos matemáticos desenvolvidos no Ensino Fundamental e Médio.Essa nova proposta mostra mais uma vez a importância das análises das relações institucionais esperadas e existentes ou das organizações praxeológicas para a identificação do que já está construído e do que é possível propor para continuar e melhorar sem começar tudo do zero. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDRADE, Sirlene Neves. Possibilidades de articulação entre as diferentes formas de conhecimento: a noção de função afim. 2006. Dissertação (Mestrado) – UNICSUL, São Paulo. ARTIGUE, M. 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