Qualidade e Segurança em Saúde: o fio condutor de várias iniciativas Manuel Cardoso de Oliveira Professor Catedrático Escola de Estudos Pós-Graduados e de Investigação – UFP [email protected] A questão dos sistemas de Saúde não é apenas um business case. Para que os sistemas de saúde sejam seguros (quanto possível), efectivos, eficientes e acessíveis torna-se imperioso dispor de líderes preparados para levar a bom termo uma verdadeira revolução, pois são estes os maiores responsáveis e a melhor garantia para uma nova cultura organizacional. Em íntima ligação com a liderança está a gestão. Ainda que alguns não estabeleçam diferenças entre elas é prudente reconhecer a sua importância. A gestão é em grande parte um fenómeno do Sec. XX que emerge com a criação de grandes organizações e está especialmente relacionada com a implementação de decisões; percorre um caminho de cima para baixo, servindo-se de ferramentas explicitamente analíticas e de tomada de decisão, e baseia-se em técnicas de racionalidade. A gestão preocupa-se principalmente em mudar as estruturas e em organizar processos de trabalho, sendo um atributo dirigido aos desempenhos. A liderança está mais relacionada com ideias, oferecendo novas abordagens para velhos problemas; os líderes nem sempre são sinónimos de posição hierárquica, procuram relacionar e reforçar padrões de relações sociais já existentes e influenciam o relacionamento interpessoal. Digamos, como Neil Goodwin, que “liderança e gestão, sendo diferentes, não se excluem mutuamente”. Para além da gestão e da liderança muitas outras áreas ganharam especial atenção. Entre elas destacamos - Sistemas de Informação em Saúde, Bioestatística, Epidemiologia, Psicologia, Sociologia e Antropologia Médicas, e Economia em Saúde, entre outros. Pela sua própria natureza a Universidade tem a missão de educar, criar e aplicar conhecimentos. Para isso necessita de um suporte (recursos humanos, equipamentos e planos de acção) que possa dar respostas adequadas a estas exigências. A missão social da Universidade e a criação e difusão da cultura numa interdisciplinaridade que defendemos são também componentes fundamentais dos seus deveres e valores. A área de trabalho que elegemos – gestão de risco clínico, melhoria da qualidade e segurança dos doentes – só muito recentemente tem sido encarada (e apenas nos centros mais diferenciados) com a profundidade que a sua importância justifica. As suas potencialidades para a inovação e o desenvolvimento conferem-lhe as características de uma área emergente, de grande sentido social, em que, com custos aceitáveis e justificados e aplicação prática evidente, se pode efectuar investigação muito meritória. A formação e o treino dos profissionais mais directamente ligados à Saúde é uma componente fundamental para que mais facilmente se possam atingir os objectivos definidos. Necessitamos de um número crescente de pessoas que, nos diversos sectores onde estão a trabalhar, possam ser porta-vozes deste mundo, razoavelmente novo, no sector da Saúde e da Educação para ela. Os tipos de oferta possíveis são múltiplos e de duração variável, o que reforça a ideia da necessidade de tempo e disponibilidade, que muitas vezes não é possível com rotinas de elevada exigência profissional. Torna-se, realmente, necessário, na sequência de experiências internacionais com provas dadas, criar infra-estruturas que sirvam de suporte para iniciativas de diferenciação crescente, ficando assim criado um ambiente próprio para o desenvolvimento das áreas já referidas. Não se pense que é uma tarefa dada a protagonismos individuais excessivos. Bem pelo contrário, temos de estimular o aproveitamento das tecnologias de informação e promover as mudanças organizacionais adequadas à implementação de planos operacionais executáveis com um carácter multidisciplinar evidente que ajude a melhorar comportamentos e a permitir uma melhor e mais humanizada integração de cuidados. Os cenários de diferentes tipos de investigação (básica, de translação e clínica) foram enriquecidos nestes últimos anos com a emergência da qualidade clínica e sua melhoria contínua, bem como da Segurança dos Doentes, o que tem obrigado a uma profunda alteração das mentalidades e uma especial atenção de que alguns se têm alheado. Esta incapacidade é ainda mais lamentável e perigosa quando algumas destas personalidades estão em centros de decisão ou posições de liderança que podem fazer perigar iniciativas meritórias numa área delas tão carecida. Os cuidados de Saúde têm muito a ganhar se as portas da ciência pragmática se abrirem a métodos disciplinados de aprendizagem a partir da reflexão da prática. Estes métodos de partilhar a aprendizagem mediante registos transparentes têm sido enaltecidos por Davidoff e Batalden (2005), duas grandes figuras mundiais destas áreas emergentes nos cuidados de saúde e na sequência deles a versão SQUIRE (Standards for Quality Improvement Excellence) é um complemento muito bem elaborado que contou com a colaboração de consagrados especialistas. Perante estas áreas emergentes da Saúde decidimos organizar vários cursos PósGraduados que satisfizessem muitas das exigências que são colocadas aos profissionais da Saúde. Começámos em Janeiro de 2009 por um curso sobre “Controlo e Melhoria da Qualidade em Unidades de Saúde” de que estamos actualmente a arrancar com a 3ª Edição. Atendendo a que a Segurança dos Doentes está louvavelmente a revolucionar as unidades de Saúde neste início do Século XXI, criámos um curso “O Imperativo da Segurança dos Doentes” que vai actualmente na 2ª Edição. Sabendo-se que a Comunicação em Saúde é uma especialidade emergente na grande área da Comunicação, e conhecidas as suas enormes potencialidades, organizámos também um curso “Gestão do Conhecimento e Comunicação em Saúde” que vai na 2ª Edição. Sendo actualmente reconhecido que as feridas constituem um importante sector do Sistema Nacional de Saúde, não só pelas repercussões nos doentes e na sociedade, como pelo peso dos seus custos, impunha-se criar um curso que contemplasse o Controlo e Melhoria da Qualidade nesta área, onde assistimos a desenvolvimentos multidisciplinares de grande relevância. Na mesma linha de pensamento e numa perspectiva de desenvolvimento profissional contínuo, criámos um curso na área do Trauma com o mesmo tipo de preocupações. Todos estes cursos foram realizados em parceria com o Departamento de Formação do Conselho Regional do Norte da Ordem dos Médicos, assim se evidenciando que este tipo de parcerias tem potencialidades que importa expandir. A Gestão é uma área de intervenção da Enfermagem com uma grande importância estratégica e primordial para a qualidade dos serviços prestados por qualquer unidade de saúde. Nas equipas multidisciplinares destas unidades os Enfermeiros Gestores constituem uma estrutura fundamental para a garantia da qualidade dos cuidaos de Saúde prestados à população. Assim sendo torna-se fundamental desenvolver competências de gestão para que estes profissionais assumam a liderança que o seu papel de gestores determina na sua área de intervenção. Este curso foi idealizado em parceria com a Secção Regional do Norte da Ordem dos Enfermeiros e espera-se que cumpra os objectivos que foram delineados, tanto mais que despertou entre os profissionais uma enorme adesão. Na sequência de todas estas iniciativas decidimos constituir uma Associação Para A Segurança dos Doentes (APASD) que, pelo seu carácter multidisciplinar e envolvência dos doentes, tem características inovadoras que esperamos possam vir a garantir o seu alcance social. Finalmente, sempre com o apoio constante, sentido estratégico e inovador e pensamento estruturado da Reitoria, está em vias de ser criado um Centro de Investigação e Desenvolvimento nas diversas áreas das nossas iniciativas. Verifica-se assim um fio condutor em todas elas, de acordo com as responsabilidades de uma Universidade moderna. Revista UFP 2011; 12:39-42