A Cabanagem – Episódio 2
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A CABANAGEM : discursos, línguas,
memórias.
EPISÓDIO 2
Acontecimento, memória e autoria na escrita e na oralidade
ESTA É UMA OBRA DE FICÇÃO BASEADA LIVREMENTE EM RELATOS
HISTÓRICOS...
LOCAL: BELÉM DO PARÁ, 1985
PERSONAGENS: PEDRO, BIBLIOTECÁRIA, MARIA, FRANCISCO, CARLÃO, DONO DE
BARRACA DE SUCOS (FIGURANTE), PADRE THORLBY, DONA MORENA, DONA
FLOR, SEU AMOR.
VINHETA DE ABERTURA – 15”
CENA 1 –
BIBLIOTECA ESTADUAL – BELÉM DO PARÁ
CENÁRIO VIRTUAL:
IMAGEM DA ANTIGA BIBLIOTECA ESTADUAL (FOTO). SOBRE A IMAGEM APARECE
TEXTO: BELÉM DO PARÁ, JUNHO DE 1985..
FADE OUT. CORTA PARA A PRÓXIMA CENA.
CENA 2 –
DENTRO DA BIBLIOTECA
CENÁRIO VIRTUAL:
VÁRIAS ESTANTES COM LIVROS E PERIÓDICOS. NA FRENTE DAS ESTANTES,
VÁRIAS MESAS DE TRABALHO, CADA UMA COM QUATRO CADEIRAS (COMO AS DO
PALCO). ESTUDANTES ESTÃO PESQUISANDO. HÁ MOCHILAS PENDURADAS NAS
CADEIRAS E NO CHÃO AO LADO DAS MESAS.
PALCO:
NA LATERAL ESQUERDA HÁ UM BALCÃO DE BIBLIOTECA. A BIBLIOTECÁRIA ESTÁ
ATRÁS DO BALCÃO, DE PÉ, LENDO UM LIVRO. NO OUTRO LADO, HÁ DUAS
MESAS DE TRABALHO, CADA UMA COM QUATRO CADEIRAS. NUMA DAS MESAS
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ESTÃO MARIA, FRANCISCO E CARLÃO. AS MOCHILAS DELES ESTÃO PENDURADAS
NAS CADEIRAS E NO CHÃO. SOBRE AS MESAS HÁ MATERIAL DE PESQUISA
(LIVROS, REVISTAS, PAPÉIS − VER ANEXOS). TODOS LEEM E ESCREVEM,
FAZENDO SUAS PESQUISAS.
PEDRO ENTRA DEVAGAR NA BIBLIOTECA E ESBOÇA UM SORRISO AO VER MARIA
(QUE ESTÁ DE COSTAS), PENSANDO QUE ELA É CAROLINA.
PEDRO
Carolina! É você? Que bom!
PEDRO VAI SE APROXIMANDO DA MOÇA, QUE PERMANECE IMÓVEL E CONTINUA
LENDO UMA REVISTA SEM RESPONDER
PEDRO (falando alto)
Deixa de onda Carol!
BIBLIOTECÁRIA (baixinho)
Silêncio!
PEDRO TOCA O OMBRO DA MENINA. ELA SE VIRA E OLHA PARA PEDRO,
SURPRESA, SEM ENTENDER O QUE ESTÁ ACONTECENDO.
MARIA (falando baixo)
Meu nome não é Carol!
PEDRO (falando baixo)
Caramba... Desculpa.
OS DOIS SE OLHAM E PEDRO SE AFASTA, SEM GRAÇA. MARIA RETOMA SUA
LEITURA. CHATEADO, PEDRO PEGA SEU MP4 DA MOCHILA, COLOCA OS FONES
NO OUVIDO E TENTA SINTONIZAR UMA EMISSORA LOCAL.
PEDRO (falando para si mesmo)
Não acredito! Tá pegando!
ELE COMEÇA A ESCUTAR UMA MÚSICA, BALANÇANDO A CABEÇA. A MÚSICA
“VAZA” DO MP4 E PODE SER OUVIDA BAIXINHO: GERAÇÃO COCA-COLA, DA
LEGIÃO URBANA. FRANCISCO OLHA PARA PEDRO E O APARELHO E SE LEVANTA
PARA FALAR COM ELE.
FRANCISCO
Oi, posso ver? Que marca que é o teu walkman?
PEDRO
Não é walkman, é MP4.
FRANCISCO
MP4? Isso toca fita ?
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PEDRO
Não. Tem memória digital.
PEDRO ENTREGA O APARELHO A FRANCISCO QUE O OBSERVA COM INTERESSE E
SURPRESA AO PERCEBER AS IMAGENS DO VIDEOCLIPE RODANDO NA TELA.
FRANCISCO
Olha! Tem vídeo!
PEDRO
Você não sabe o que é um MP4? Em que ano nós estamos?
FRANCISCO
Tu não sabes?
PEDRO
É sério, não sei.
FRANCISCO (olhando para as roupas de Pedro)
Tu és esquisito, mano!
PEDRO
É uma longa história... Mas me diz, em que ano nós
estamos?
FRANCISCO (irônico)
Meu amigo, tu estás em Belém do Pará, em junho de
1985 da era cristã!...
PEDRO
Qual é, cara?!
PEDRO FICA CHATEADO COM O DEBOCHE, PEGA O APARELHO DE VOLTA E
COLOCA UM DOS FONES DE OUVIDO.
FRANCISCO SORRI E APONTA PARA A MOÇA A QUEM PEDRO TINHA CHAMADO DE
CAROLINA.
FRANCISCO
Ela parece com alguém que tu conheces?
PEDRO
De costas lembra a Carolina, uma amiga minha.
MARIA E CARLÃO LEVANTAM A CABEÇA E OLHAM PARA OS DOIS.
FRANCISCO
Qual é o teu nome?
PEDRO
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Pedro. E o seu?
FRANCISCO
Francisco. E esses dois aí são o Carlão e a Maria. A gente
tá fazendo uma pesquisa.
CORTA PARA A CENA SEGUINTE.
CENA 4 –
DENTRO DA BIBLIOTECA – MESMO CENÁRIO
PEDRO E FRANCISCO ESTÃO SENTADOS COM MARIA E CARLÃO.
PEDRO (vendo nas anotações em cima da mesa)
Cabanagem. O que é isso?
MARIA
Tu não sabes o que é Cabanagem? Desde a inauguração
do Memorial da Cabanagem, em janeiro, não se fala em
outra coisa por aqui!
MARIA LEVANTA UM JORNAL DA MESA, MOSTRANDO PARA PEDRO UMA
FOTOGRAFIA DO MONUMENTO À CABANAGEM. CLOSE NA FOTO.
PEDRO
Parece uma ponte quebrada...
MARIA (com o jornal nas mãos)
Quase!... O projeto é do Oscar Niemeyer. Olha o que ele
diz aqui: “O pedaço do monumento que jaz no chão
representa a ruptura do processo revolucionário da
Cabanagem, a sua derrocada”. E olha que belo final:
“Mas como a Cabanagem continua viva na memória do
povo paraense, o bloco continuará subindo para o
infinito.”
CARLÃO (com ironia)
Haja imaginação! Só pode ser discurso pra comemoração
dos 150 anos da Cabanagem!
MARIA
É mesmo! Mas se não fosse pela comemoração, a
Cabanagem continuaria esquecida.
MARIA CONFERE SUAS ANOTAÇÕES DE CIMA DA MESA
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MARIA
Ou pior, circularia só a versão que fala dos cabanos como
“horda de bárbaros” e "facções desvairadas"!
FRANCISCO PEGA UM LIVRO DE CIMA DA MESA PARA MOSTRAR UM TRECHO.
FRANCISCO
É verdade. Olha o que diz o Raiol sobre os cabanos:
"Requinta então a perversão moral. O sentimento
sedicioso desperta os maus instintos da plebe, eleva a
escória social, assanha os malfeitores, produz
abomináveis cenas de sangue e aviltamento! Homens,
mulheres, propriedades, lar doméstico, tudo foi
sacrificado ao furor satânico dos sicários que infestaram
a cidade"
CARLÃO (irônico)
Textinho complicado!...
MARIA
É que foi escrito no século XIX, pelo Raiol, um político −
e historiador − cujo pai foi morto pelos cabanos. A gente
pode até não gostar da versão dele, mas é a que ficou
para a história.
CARLÃO
Isso é que é objetividade!
PEDRO
Parece o jeito que falam do MST numa matéria que eu li.
Tinha até desenho do diabo!
MARIA
Ah, eu também li essa matéria!
A TRADUTORA DE LIBRAS VIRA A CABEÇA PARA OLHAR MARIA COM SURPRESA,
ANTES DE TRADUZIR.
PEDRO (arregalando os olhos)
Como assim?
MARIA
Saiu semana passada! Aliás, fiz até uma cópia.
ENQUANTO FALA, MARIA PEGA SUA PASTA EM CIMA DA MESA E TIRA DE DENTRO
ALGUMAS FOTOCÓPIAS.
MARIA
Aqui, ó!
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CLOSE NAS FOTOCÓPIAS (VER ANEXO) ONDE SE LÊ A MANCHETE: "SEMEADURA
DE ARMAS. A COLHEITA DA REFORMA AGRÁRIA É UMA TEMPESTADE". PEDRO
OLHA A DATA NA PRIMEIRA PÁGINA.
PEDRO
Deixa ver... 19 de junho de 1985?
PEDRO FALA CONSIGO MESMO, DISFARÇANDO.
PEDRO (em voz baixa)
Não é a que eu li, mas parece que o enfoque é
igualzinho!
A MULHER DE LIBRAS BALANÇA A CABEÇA ENQUANTO TRADUZ A FALA DE
PEDRO.
CARLÃO
E o que dizem os livros sobre o Angelim?
MARIA PEGA UM LIVRO DE TEODORO BRAGA (ANEXO) QUE ESTÁ SOBRE A MESA.
MARIA
Esse livro aqui nem menciona o Angelim na lista de
presidentes do Grão Pará.
FRANCISCO
Mas ele foi o terceiro Presidente cabano!
MARIA
Pois é... Dependendo de quem conta a história, a
verdade é silenciada!
FRANCISCO (para Pedro)
Sabe, o tema da nossa pesquisa é A Cabanagem Hoje.
PEDRO
Hoje? Mas não foi há 150 anos?
MARIA
Claro! Mas a professora quer que a gente pesquise o que
significa a Cabanagem hoje, para nós, o que está
presente como memória, os traços que ficaram dela na
cidade.
FRANCISCO
A gente está pesquisando nome de rua, lugares públicos,
monumentos, festas. Agora vamos tirar fotos. Queres vir?
PEDRO (animado)
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Vamos nessa! Quem sabe eu encontro a Carolina na rua.
ELES COMEÇAM A SE LEVANTAR E A RECOLHER SUAS COISAS DE CIMA DA MESA
PARA SAIR.
CORTA PARA A PRÓXIMA CENA.
CENA 5 –
CLIPE DE FOTOS
A CENA É UMA SUCESSÃO DE FOTOS SUPOSTAMENTE TIRADAS PELOS
ESTUDANTES. ENTRE UMA E OUTRA, OUVE-SE O DISPARADOR DA MÁQUINA,
NUMA ESPÉCIE DE FOTOCLIPE. NAS FOTOS APARECEM PLACAS DE RUAS, DE
PRAÇAS, DE PRÉDIOS, MONUMENTOS, REPRESENTANDO AS FOTOS TIRADAS
PELOS ADOLESCENTES (VER ANEXOS).
CENA 6 –
MERCADO VER-O-PESO – BELÉM DO PARÁ
CENÁRIO VIRTUAL:
AO FUNDO ESTÁ A IMAGEM DO MERCADO VER-O-PESO, VISTO A UMA CERTA
DISTÂNCIA.
PALCO:
BARRACA DE SUCOS, COM O DONO ATRÁS (VER ANEXOS)
FRANCISCO, MARIA, CARLÃO E PEDRO ESTÃO EM FRENTE À BARRACA,
TOMANDO SUCO. FRANCISCO ESTÁ COM A MÁQUINA FOTOGRÁFICA PENDURADA
NO OMBRO.
FRANCISCO
Acho que já deu de foto.
CARLÃO
Isso é invenção da professora de Português. Ela quer que
a gente pense na cidade como um grande texto ilustrado,
pode?
FRANCISCO
Um texto com história.
MARIA
E muitas vozes contando essa história. Relatos, estórias,
mitos, lendas... Até boatos interessam!
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PEDRO (dirigindo-se a Franciscio)
Mas por que a Cabanagem é tão importante?
FRANCISCO
Olha, foi o único movimento popular na história do Brasil
em que o povo em armas ocupou efetivamente o poder.
MARIA (para Pedro)
Fora os líderes, as pessoas que participaram do
movimento moravam em cabanas muito simples. Daí o
nome Cabanagem. A maioria eram escravos, tapuias e
libertos.
PEDRO
Tapuias? O que é isso?
FRANCISCO
Tapuia era o nome que os índios Tupi davam a todos os
outros índios, os que não falavam Tupi.
MARIA
Tem um padre que está ajudando a gente na pesquisa.
Amanhã, Francisco e eu vamos com ele entrevistar um
grupo de velhos descendentes dos cabanos. Não queres
vir conosco?
FRANCISCO
Boa idéia! Tu podes ficar lá em casa, tem lugar.
PEDRO
Obrigado. Vai ser bom sim!
CORTA PARA A PRÓXIMA CENA.
CENA 7 –
VILA DO CONDE - ENTREVISTAS
CENÁRIO VIRTUAL:
RUA NA BEIRA DE UM RIO. DO OUTRO LADO DO RIO A MATA É ALTA E DENSA
(FLORESTA).
PALCO:
O CHÃO DO PALCO É A RUA.
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PEDRO, FRANCISCO, MARIA E PADRE THORLBY ESTÃO CAMINHANDO DEVAGAR E
CONVERSANDO.
MARIA
Padre, por que as narrativas orais são tão importantes na
nossa pesquisa?
PADRE THORLBY
Minha filha, nós vamos entrevistar descendentes de
índios e negros cabanos. O que eles sabem sobre a
Cabanagem não se encontra nos livros, vem das histórias
que eles ouviram dos antepassados deles, contadas de
geração em geração. Ouvindo o que eles têm a dizer, nós
podemos descobrir outras versões, outros modos de
entender a Cabanagem!
CORTA PARA A PRÓXIMA CENA.
CENA 8 –
CENÁRIO VIRTUAL:
VARANDA DE CASA POBRE NA BEIRA DO RIO, SIMILAR AS ANTIGAS MORADIAS
DOS CABANOS; CENÁRIO SIMULA UMA TÍPICA VARANDA DE CABANAS
RIBEIRINHAS DA VILA DO CONDE, CIDADE QUE FICA A 1H DE BELÉM (TEMPO
JUNHO DE 1985).
PALCO:
2 CADEIRAS E 3 BANCOS RÚSTICOS.
PEDRO, CARLÃO, MARIA, FRANCISCO E PADRE THORLBY ESTÃO NA VARANDA,
CONVERSANDO COM DONA MORENA, DONA FLOR E SEU AMOR. PADRE THORLBY
ESTÁ PREPARANDO UM GRAVADOR DE FITA CASSETE. AS MULHERES USAM
VESTIDOS SIMPLES E DONA FLOR ESTÁ COM UM VELHO AVENTAL COM UM
BOLSO GRANDE, ONDE GUARDA UMA CARTA DE CAROLINA.
DONA FLOR
Padre Thorlby, eu já falei com os meus compadres sobre
a pesquisa do senhor, que vai gravar e tudo.
DONA MORENA
É, padre! Se as estórias da gente for de serventia, é um
prazer ajudar o senhô. Meu nome é Aristotelina dos
Santos. Mas pode me chamar de Dona Morena.
DONA FLOR
Ele é o Seu Amor.
SEU AMOR
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A suas ordens, padre. Meu nome é José dos Santos, mas
todos me conhecem por Seu Amor. Mas olhe, vou logo
avisando, eu num gosto desses cabanos não, viu?
OS MORADORES CONCORDAM COM CABEÇA, MEIO INTIMIDADOS. PADRE
THORLBY POSICIONA O GRAVADOR DE FITA CASSETTE ENQUANTO A CONVERSA
CONTINUA.
PADRE THORLBY
Bem, como eu já tinha explicado para dona Flor, eu
queria que os senhores me falassem sobre a Cabanagem,
o que ouviram dos seus pais e dos seus avós.
DONA MORENA
Sabe, padre, meus pais falavam que a Cabanagem
começou de repente, nos igarapés, nas fazendas. O povo
ficou revoltado com o governador e com a escravidão.
DONA FLOR
Minha bisavó dizia que os brancos eram muito ricos e
viviam maltratando os pretos naquele tempo.
FRANCISCO E MARIA ACOMPANHAM A CONVERSA ATENTOS E INTERESSADOS.
PADRE THORLBY
E os índios? Os Mundurucus, os Muras?
SEU AMOR
Meu avô dizia que naquela época tinha muito índio
brabo, que só queria saber de briga. Eles entraram na
revolta e virou confusão! Tinha que dar no que deu.
DONA MORENA
Home! Como tu podes falar assim dos índios? Eles tavam
lutando porque num queriam trabalhar a troco de nada.
SEU AMOR
Que isso! Os tapuio era uns preguiçoso mesmo!
PEDRO
Mas quem eram afinal os cabanos?
SEU AMOR
Tinha branco, vermelho, preto e tapuio. Tudo cabôcu.
Andava pra lá, pra cá, invadindo tudo e matando. Uns
bagunceiro! Como Lampião.
DONA MORENA
Minha vó dizia que faltava dinheiro, pão. O pobre não
tinha direito.
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PEDRO
E como é que acabou essa história?
DONA FLOR
Foi triste. O Império brasileiro era mais forte e venceu.
SEU AMOR
Mas tinha também outras histórias, num sabe?
DONA FLOR
Tinha! Minha bisavó contava que apareceu naquele
tempo, do nada, uma mulata jovem, muito bonita. A
menina até sabia ler e escrever. Ela dizia que vinha de
longe, de outro lugar, de outro tempo.
A MEDIDA QUE A SENHORA NARRA A HISTÓRIA PEDRO VAI FICANDO AGITADO,
ANDANDO PRA LÁ E PRA CÁ NA VARANDA.
PADRE THORLBY
Como a senhora ficou sabendo desta moça?
DONA FLOR
Minha bisavó, Ana Nagô, quando era escrava na fazenda
dos Malcher, conheceu a moça. Ela contou para minha vó
e a minha vó me contou que a menina vivia triste ,
porque tinha perdido um amigo. Mas pra encontrar o tal
amigo, ela passava o dia escrevendo cartas, que as
escravas distribuíam nas fazendas e vieram até parar na
cidade. Vixe! A menina dizia que os dois vinham do
futuro!
PEDRO (agitado, falando baixo para Maria)
É a Carolina! É ela!
MARIA (responde baixo para Pedro)
Impossível, isso aconteceu faz 150 anos!!!
DONA FLOR
Pois é. Minha bisavó, Ana Nagô, dizia que a irmã do
Angelim protegia a moça e veio com ela pra capital, pra
Belém.
SEU AMOR
Meu avô também falava dessa menina.
DONA FLOR
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Ainda tenho aqui uma carta dessa moça, que a minha
bisavó guardou.
DONA FLOR TIRA A CARTA DO BOLSO DO VELHO AVENTAL. PEDRO NÃO SE
CONTÉM E CHEGA PERTO DELA PARA VER A CARTA.
PEDRO (com ansiedade)
Eu não acredito!!! Posso ver?
DONA FLOR
Não estou te entendendo, filho. Mas se é importante pra
ti, claro que podes ver .
DONA FLOR PÕE A CARTA NAS MÃOS DE PEDRO. OS OUTROS OBSERVAM COM
ATENÇÃO E CURIOSIDADE.
PEDRO
É a letra da Carolina. Ela pede para deixar informações
sobre mim na Igreja de Nossa Senhora de Nazaré. Olha a
assinatura dela!...
VISIVELMENTE COMOVIDO, PEDRO PASSA SEUS DEDOS SUAVEMENTE SOBRE A
ASSINATURA DE CAROLINA. AO FAZER ISSO, O PAPEL SE ILUMINA, IRRADIANDO
UM FEIXO DE LUZ INCANDESCENTE QUE ENVOLVE PEDRO E O FAZ DESAPARECER
DO LOCAL.
CORTE FINAL.
VINHETA DE ENCERRAMENTO – 15”
CRÉDITOS
Autores:
MONICA GRACIELA ZOPPI FONTANA
IVANIA NEVES DOS SANTOS
Pesquisa:
LETÍCIA CANELAS
MAURÍCIO NEVES CORRÊA
Registros fotográficos: MÔNICA VASCONCELLOS CRUVINEL
Parcialmente baseado na obra A FALA DO POVO de Thiago Thorlby
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