CAPITÃO-DE-MAR-E-GUERRA ENGENHEIRO-HIDRÓGRAFO ANTÓNIO ARTUR
BALDAQUE DA SILVA
António Artur Baldaque da Silva nasceu em Lisboa, oficialmente e de acordo com o seu
processo de Marinha, a 28 de Dezembro de 1852. No entanto, anotações de um caderno de
observações de campo indicam 1853 como o verdadeiro ano do seu nascimento. De acordo
com informações dadas pelos seus descendentes, teria falsificado a data de nascimento para
poder assentar praça na Marinha um ano mais cedo.
No que respeita ao seu nome completo, existem documentos que o identificam como
António Artur Baldaque Pereira da Silva, nomeadamente a sua lista de curso do Colégio Militar e
uma fotografia tirada na sua juventude, o que leva à suposição que terá deixado de usar o
penúltimo nome do seu pai na altura em que se alistou na Marinha, muito provavelmente com
uma intenção de afirmação da sua independência.
Foram seus pais Francisco Maria Pereira da Silva e Isabel Maria da Nóbrega Pereira da
Silva.
Francisco Maria Pereira da Silva, que viveu no período entre 1814 e 1891 e que, desde
muito jovem, se distinguira nas Lutas Liberais em numerosas acções contra as forças inimigas
no Douro, Tejo e Sado, tornou-se uma figura de inegável importância nas áreas da balizagem e
farolagem do país. Foi oficial de Marinha e Engenheiro Hidrógrafo, tendo na sua carreira
atingido o posto de Vice-Almirante. Posteriormente viria a chefiar a Direcção-Geral dos
Trabalhos Geodésicos do Ministério das Obras Públicas, após a morte do seu antecessor, Filipe
Folque.
Francisco Maria Pereira da Silva, cuja atividade hidrográfica o conduziu à Figueira da
Foz, cidade pela qual se apaixonou, foi o responsável pela realização das primeiras obras da
barra e do porto da Figueira da Foz, pela construção do farol do Cabo Mondego, e pela
realização do levantamento hidrográfico da enseada da Figueira e da planta dos campos
inundados do Mondego. Também naquela cidade projetou o seu Bairro Novo e o mercado
municipal, tendo adquirido um palacete junto ao mar, situado na atual esplanada António da
Silva Guimarães.
António, o sexto filho de um grupo de dez, mostrou desde muito cedo, ser uma criança
irreverente e algo turbulenta, tendo os seus primeiros anos de existência sido divididos entre as
cidades de Lisboa e da Figueira da Foz. Apesar de ter frequentado um colégio de padres em
Quiaios, o seu futuro passaria pelo ingresso no Colégio Militar no ano de 1864, onde lhe foi
atribuído o nº18.
Jovem nitidamente avesso a ordens, Baldaque da Silva nunca se adaptou à rígida
disciplina do Colégio Militar, apesar de se ter revelado um aluno bem sucedido no campo
académico, de tal forma que o Diretor da Instituição, um velho amigo do seu pai, chegou a
suplicar que este retirasse o seu filho daquele estabelecimento de ensino, antes que se visse
forçado à sua expulsão. Tal situação acabou, porém, por não acontecer e, a 17 de Outubro de
1870, António, muito provavelmente inspirado pelo pai, assentava praça na Armada como
Aspirante Extraordinário. Nos registos oficiais ficou a idade de 16 anos mas, acreditando na
informação lavrada pelo seu próprio punho no caderno de apontamentos anteriormente referido
e em memórias dos seus familiares, terá assentado praça um ano mais cedo do que deveria ter
sucedido, situação que muito provavelmente resultou de uma grande influência paterna junto
da Instituição e que terá permitido regularizar a sua situação. Julga-se que esta decisão terá
tido o propósito de não prolongar por mais tempo a sua penosa estadia no Colégio Militar.
Entre 17 de Outubro de 1870 e 17 de Julho de 1872, Baldaque da Silva efetuou o Curso
Preparatório de Marinha na Escola Politécnica, tendo passando à situação de Aspirante no
Quadro e completado o Curso de Marinha Militar na Escola Naval em 11 de Junho de 1874.
A 2 de Outubro de 1874 foi promovido a Guarda-Marinha, tendo desde essa data
embarcado em diversos navios com missões atribuídas tanto no Continente, como no Ultramar,
tendo tido inclusivamente a oportunidade de percorrer África, o Extremo-Oriente e a América
do Sul.
Foi neste período que foi proporcionada a Baldaque da Silva a sua única experiência de
comando, quando, na sequência do destacamento do seu Comandante, exerceu o comando
interino da canhoneira “Rio Minho” entre 31 de Janeiro e 19 de Fevereiro de 1878. Um episódio
dessa curta mas intensa experiência, em que amplamente demonstrou a sua coragem, firmeza
de carácter, capacidade de liderança e aptidão de marinheiro, foi o trânsito que efectuou entre
S. Tomé e Luanda, sob condições de mar extremamente adversas e com o navio apresentando
um elevado estado de degradação, não oferecendo quaisquer garantias de segurança para
navegar. Este feito valeu a Baldaque da Silva uma menção de apreço por parte do Governador
de S. Tomé.
Completados os três anos de embarque fora dos portos do Continente, que na altura
eram exigidos no posto de Guarda-Marinha, Baldaque da Silva efetuou com sucesso, a bordo da
corveta “Rainha de Portugal”, o exame prático de promoção a Segundo-Tenente.
Em 24 de Agosto de 1878, Baldaque da Silva foi mandado apresentar-se ao DirectorGeral dos Trabalhos Hidrográficos, tendo sido colocado a coadjuvar os trabalhos geodésicos
nacionais. Nessa altura os oficiais da Direção Geral dos Trabalhos Hidrográficos encontravam-se
empenhados em trabalhos de campo nada relacionados com a atividade hidrográfica. Tudo
indica que, já naquela fase da sua vida, Baldaque da Silva demonstrava interesse pela
hidrografia, muito provavelmente inspirado pela carreira do pai, o qual poderá ter tido alguma
influência nesta sua colocação.
É então que Baldaque da Silva, com o desconhecimento dos seus superiores
hierárquicos, inicia em 1879 o Curso de Engenheiro Hidrógrafo na Escola Politécnica e é apenas
um ano depois, em 21 de Agosto de 1880, que apresenta o requerimento formal para ser
autorizado a concluir o curso, alegando ter já completado quatro das oito cadeiras que lhe
correspondem. A este comportamento correspondeu a hierarquia da Marinha com desagrado,
tendo interpretado a frequência não autorizada do curso, como uma falta de dedicação às
tarefas que lhe haviam sido atribuídas. Assim, o despacho do requerimento foi negativo,
justificado através do argumento de que as vagas no quadro de Engenheiros Hidrógrafos se
encontravam preenchidas. Provavelmente Baldaque da Silva estaria perfeitamente ciente deste
facto, mas mesmo assim decidira tentar a sorte, o que demonstra a sua persistência e
tenacidade. No entanto, por portaria de 27 de Agosto, a autorização acabaria por ser
concedida, o que leva à suspeita de que teria ocorrido uma intervenção paterna, mesmo não
tendo esta, eventualmente, sido solicitada.
Baldaque da Silva conclui o curso no ano de 1881 e, uma vez mais, um requerimento
por si elaborado, solicitando que lhe fosse concedido o tirocínio, tem parecer negativo, com a
justificação de que ainda não existiam vagas no quadro de Engenheiros Hidrógrafos e que só
havia verba disponível para abonar os dois oficiais que, na altura, já se encontravam a efetuar
esse tirocínio. Tudo indica que Baldaque da Silva não caíra nas boas graças dos seus
superiores, mas é então que o inesperado acontece e, sem justificação aparente, é-lhe
concedido o tirocínio na Direcção dos Trabalhos Geodésicos, no Observatório Astronómico da
Tapada da Ajuda e no Observatório Meteorológico de Lisboa, situação em que permanecerá até
Novembro de 1883. No entanto só conseguirá vaga no quadro passados nove anos.
Em 1882, talvez para demonstrar a sua competência na área da Hidrografia, publica, às
suas custas, a sua primeira obra, Sondas e Marés, que pretende que seja um manual de
referência para os levantamentos hidrográficos que eram realizados pelos oficiais de Marinha
durante as suas comissões no Ultramar.
O facto de não poder, ainda, ingressar no quadro de Engenheiros Hidrógrafos não
impede que, em 10 de Janeiro de 1884, receba guia para se apresentar na Direção dos
Trabalhos Geodésicos. É no dia 8 de Abril que recebe aquela que será a sua primeira e maior
tarefa no âmbito específico da hidrografia: proceder à organização do Roteiro das Costas e
Portos do Continente do Reino, missão que o vai ocupar durante mais de dois anos. A 11 de
Junho de 1884 é promovido a Primeiro-Tenente.
No dia 6 de Maio de 1885, Baldaque da Silva casa com Júlia Pereira Pestana, com quem
terá três filhos, de seu nome: António, Júlia e Eva. Muda-se, na altura, para a Estrada de
Campolide, local onde residirá até falecer.
No âmbito da sua missão de levantamento da costa portuguesa, efetua entre 7 de
Agosto e 2 de Outubro de 1885 um cruzeiro na costa algarvia, a bordo da canhoneira “Bengo”.
Entre 22 de Outubro do mesmo ano e 20 de Agosto de 1889, ano em que é publicado o
Tomo I do Roteiro Marítimo da Costa Ocidental e Meridional de Portugal, referente à costa do
Algarve, efetuaria mais 126 dias de serviço hidrográfico a bordo do vapor “Lidador”, onde,
durante um curto período, de 15 de Junho a 7 de Julho de 1888, viria a exercer, por
impedimento do Comandante, as funções de Encarregado de Comando. A meio desta comissão,
entre 11 de Maio e 7 de Setembro de 1886, integrou os trabalhos da Comissão de Limites LusoEspanhola para a Zona Marítima e em 25 de Novembro de 1886 é mandado efetuar o
levantamento urgente da planta hidrográfica da costa, entre o Cabo Espichel e Setúbal, na zona
onde se encontravam as armações da pesca da sardinha. Esta terá sido a sua primeira tarefa
oficial no âmbito das pescas. O reconhecimento da sua competência técnica começava a ser um
facto.
Em 4 de Junho de 1889 Baldaque da Silva é nomeado vogal da Comissão das Pescarias
onde, durante oito anos, devido em grande parte, aos seus profundos conhecimentos na
matéria, adquiridos nos anos dedicados à atividade hidrográfica, desenvolve um trabalho
notável, organizando os serviços, dirigindo inquéritos, emitindo pareceres sobre questões
científicas e administrativas, elaborando estatísticas de produção e implementando nas zonas
de pesca comissões departamentais e locais, de forma a habilitar o poder central a tomar
medidas práticas, introduzir métodos inovadores e resolver diferendos entre armadores. No
âmbito da elaboração daquela que será a sua obra mais conhecida, o Estado Actual das Pescas
em Portugal de 1891, reuniu uma coleção de modelos de embarcações e de aparelhos de pesca
única no País. Da sua ação, que o credita como uma autoridade nacional indiscutível na
matéria, resultará um forte incremento no sector pesqueiro que, nos anos vindouros, não
voltará a ter paralelo.
Baldaque da Silva revela ser um observador cuidadoso, com uma escrita adequada às
exigências de clareza e concisão do género relatório e um sentido positivista aplicado ao
tratamento dos assuntos, deixando transparecer um olhar que transcende o do técnico, ou do
especialista, nos temas da hidrografia da pesca e expõe o do investigador atento às questões
sociais.
O autor, na obra o Estado Actual das Pescas em Portugal, abordava a Pesca Marítima,
Fluvial e Lacustre em Todo o Continente do Reino e refletia o produto da observação e estudo
direto efetuado durante dez anos em todas as águas do reino. Com uma edição original de mais
de quinhentas páginas, aborda em catorze capítulos os aspetos considerados essenciais para a
compreensão das pescas contemporâneas, seguindo uma metodologia idêntica aos grandes
inquéritos que se realizam em toda a Europa marítima.
Segundo Baldaque da Silva, e passo a citar, “o pescador foi sempre, em todos os países
e em todas as épocas, um obreiro incansável, destemido e prestabilíssimo, mas humilde e
desventuroso”, fim de citação. Refere ainda que, apesar do espírito do pescador mandar
capturar até ao último peixe, não podem ser totalmente culpabilizados por tão acutilante
vontade de capturas, por serem o elo mais fraco de uma nação que lhes imprimia, ou mesmo
obrigava, a ter esse espírito de atuação, ou seja, o excesso de capturas no limite da sua
capacidade, produzia riqueza para alguém, mas não para eles, que sempre viveram em parcas
condições, tal como esclarece o autor ao longo de todo o seu trabalho escrito. Torna-se notório
que Baldaque estava sobretudo interessado no entendimento exaustivo, de inspiração
positivista, da pesca portuguesa como um problema social, económico e biológico. O rigor e a
minúcia que colocou nessa tarefa e o convívio prolongado com os pescadores, fazem da sua
obra um instrumento fundamental para o conhecimento propriamente etnográfico das
comunidades costeiras portuguesas da viragem do século.
Baldaque da Silva é promovido a Capitão-Tenente em 2 de Julho de 1891. Nesse
mesmo ano integra a Comissão das Obras do Porto de Lisboa, com o intuito de modificar o
projeto original, de modo a torná-lo melhor e mais económico.
Já em 1888 Baldaque da Silva publicara uma série de artigos a criticar as obras que se
encontravam a decorrer. Esta não seria a sua primeira incursão em projetos de âmbito
portuário, pois já em 1885, fruto do seu levantamento da costa algarvia, assim como dos seus
conhecimentos da ondulação, dos ventos e das correntes marítimas, se apercebera da
necessidade de dotar o Algarve de um porto de abrigo, concebendo então, o projeto de um
porto junto à Ponta do Altar. Três anos mais tarde, respondendo a um concurso internacional
lançado pelo governo belga, publicaria o “Étude Sur L’Ameloration des Ports Établis sur les
Côtes Basses et Sablonneuses”, correspondendo a um estudo sobre os meios e formas de
melhoramento dos portos estabelecidos em cotas baixas e arenosas, que lhe valeria uma
menção honrosa.
Nesta altura tornava-se notório que Baldaque da Silva começava a desenvolver uma
visão muito própria para o desenvolvimento integrado do território português, que se baseava
no estabelecimento de uma cadeia de portos estratégicos, onde viria a incluir mais tarde, o
projeto de porto oceânico do Cabo Mondego e um projeto de um sistema de navegação
interior.
No ano de 1892 a Espanha organiza em Madrid a Exposição Colombiana, destinada a
comemorar o centenário da chegada de Colombo à América. Baldaque da Silva é escolhido para
organizar a representação marítima portuguesa, onde se encontra incluída, com grande
destaque, a sua preciosa coleção de modelos de embarcações e aparelhos de pesca.
Para esta ocasião, de modo a contribuir para a divulgação além fronteiras dos
Descobrimentos Portugueses e para que estes não passem despercebidos face às celebrações
espanholas, Baldaque da Silva apresenta duas obras: O Descobrimento do Brasil por Pedro
Álvares Cabral e Notícia Sobre a Nau São Gabriel em que Vasco da Gama Foi pela Primeira Vez
à Índia.
Em 9 de Março de 1892, na sequência da sua participação na Comissão das Obras do
Porto de Lisboa, Baldaque da Silva é nomeado para proceder à delimitação do terreno municipal
na zona marginal do Tejo desde o reduto do Bom Sucesso até à Ribeira de Algés.
Em 29 de Novembro desse ano recebe guia para o Ministério das Obras Públicas, para
servir na Direção de Trabalhos Geodésicos. É no Ministério das Obras Públicas, onde
permanecerá em comissão especial até ao fim da sua carreira de Marinha, que, aproveitando a
sua vasta experiência no sector das pescas, é nomeado para a recém-criada Comissão Central
de Piscicultura, onde durante cinco anos, organiza os serviços, desempenha as funções de
relator do regulamento de pesca em águas interiores e de inspetor dos Serviços de Exploração
das Águas Interiores e concebe a primeira estação aquícola em Portugal: a estação aquícola do
Ave, que viria a ser construída em 1898.
As distinções, porém, tardaram em chegar. A 13 de Fevereiro de 1895 Baldaque da
Silva requereu que lhe fosse atribuída a Medalha de Prata de Bons Serviços, apresentando
como os três serviços extraordinários exigidos para aquela atribuição, as obras; Sondas e
Marés, Planta Hydrographica da Entrada, Barra, Porto de Setúbal e Relatório sobre a Pesca
Marítima e Fluvial n’Esta Localidade, e o Tomo I Roteiro Marítimo da Costa Occidental e
Meridional de Portugal. A Medalha de Prata de Bons Serviços ser-lhe-ia concedida pelo Rei a 13
de Março de 1985. Antes, em 18 de Fevereiro, igualmente após apresentação de requerimento
para o efeito, havia-lhe sido atribuída a Medalha Militar de Prata da Classe de Comportamento
Exemplar, por ter completado 15 anos de serviço sem nada a assinalar de âmbito disciplinar.
No entanto, quando, em 23 de Março requereu a Medalha de Prata de Valor Militar,
sustentando a sua atribuição na sequência do cruzeiro que em 1878 efetuara, como
Comandante da canhoneira “Rio Minho”, entre S. Tomé e Luanda, tendo juntado ao processo a
menção de apreço que lhe fora redigida pelo Governador de S. Tomé, já não obteve parecer
favorável.
Chega então uma altura em que a carreira de Baldaque da Silva se encontrava prestes
a entrar num impasse. Em 1 de Fevereiro de 1895 um decreto extinguira o Corpo de
Engenheiros Hidrógrafos, passando os respetivos oficiais a integrar o quadro de Marinha com a
designação de Hidrógrafos. Até à data os engenheiros hidrógrafos eram considerados adidos ao
Quadro, tendo uma progressão na carreira paralela à dos outros oficiais. Esta alteração iria
significar que os oficiais que antes pertenciam ao Corpo e estavam dispensados do tirocínio de
embarque para promoção, deixavam de estar abrangidos por esta dispensa. Assim, em 11 de
Fevereiro de 1896, Baldaque da Silva requer dispensa do tirocínio para promoção ao posto
imediato, alegando que em 1892 tinha optado pelas novas condições de promoção da sua
classe que o dispensavam desse tirocínio. Em 6 de Março o seu requerimento recebe despacho
negativo, uma vez que a extinção da classe tinha revogado as anteriores condições, pelo que os
requisitos de promoção passavam a ser iguais aos das restantes classes. Apesar de tudo,
volvidos quatro anos seria promovido a Capitão-de-Fragata, a 28 de Março de 1901.
No ano de 1900, à semelhança do que sucedera na Exposição Colombiana de Madrid,
Baldaque da Silva efetua a coleção e organização da secção de pescarias nacionais da
Exposição Universal de Paris e em 1909, na sequência do seu trabalho na Comissão de
Piscicultura e nos Serviços de Exploração de Águas Interiores, é nomeado inspetor dos Serviços
Aquícolas.
No entanto, os dissabores em relação à sua carreira militar continuavam, agora sem a
sombra protetora do seu pai que falecera em 1891. Em 1908, tendo tido vaga para promoção a
Capitão-de-Mar-e-Guerra, fora preterido na promoção, alegadamente por não ter o
indispensável tirocínio de embarque. Na sequência do sucedido, Baldaque da Silva apresentou
um requerimento solicitando a publicação em Ordem da Armada do motivo pelo qual fora
preterido na promoção, uma vez que o oficial que o ultrapassara, o Capitão-de-Fragata
Carvalho e Vasconcelos, era igualmente hidrógrafo e também não tinha o tirocínio exigido,
embora o facto de se encontrar na situação de Comissão Especial como vogal na Comissão de
Cartografia tivesse sido considerado motivo válido para o dispensar daquele tirocínio. Acontece
que também Baldaque da Silva se encontrava na situação de Comissão Especial! Quais terão
sido as razões para a discriminação de que foi alvo? Os motivos acabam por não estar
devidamente explicitados no despacho do requerimento. Talvez fosse resultado da hostilidade
latente por parte dos altos comandos contra Baldaque da Silva que estivesse agora a emergir,
podendo tal dever-se à sua personalidade demasiado frontal ou às ideias republicanas que
professava. O recurso entretanto interposto acabou por ser resolvido por decreto de 16 de
Março de 1910, em que Baldaque da Silva foi promovido ao posto de Capitão-de-Mar-e-Guerra,
com efeitos retroativos a partir de 27 de Novembro de 1908.
A 21 de Junho de 1910, sendo finalmente reconhecidos os seus valiosos serviços,
Baldaque da Silva é proposto pelo Major-General da Armada para Comendador da Ordem Militar
de Aviz, juntando esta alta condecoração às poucas com que fora distinguido ao longo da sua
carreira.
A sua saúde, entretanto havia-se debilitado significativamente e a 11 de Dezembro de
1911 requereu a reforma por motivos de doença, artritismo, conforme consta no seu processo
individual. A 15 de Dezembro a Junta de Saúde Naval considerou-o incapaz para todo o serviço,
pelo que a 27 de Janeiro de 1912 Baldaque da Silva passava à situação de Reforma. Continuou,
porém, em funções no Ministério das Obras Públicas.
Começava assim uma nova fase na vida de Baldaque da Silva, na qual, liberto das suas
obrigações militares, se começou a envolver na vida política ativa.
Oriundo de uma família tradicionalmente monárquica, embora liberal, como o
testemunha o anterior envolvimento de Francisco Pereira da Silva durante a Guerra Civil,
rapidamente se demarcou da corrente monárquica, motivado pelas suas simpatias republicanas.
Não se sabe exatamente como começaram estas tendências, que poderão de certo modo, estar
relacionadas com o seu carácter rebelde e insubmisso e ter sido reforçadas pela convivência
com as classes menos abastadas, como era o caso dos pescadores, e pelas quais parecia nutrir
um grande carinho. Poderá, também, ter absorvido as suas convicções no meio naval,
conhecido por, ao contrário da conservadora hierarquia do Exército, albergar nas suas fileiras
vários oficiais republicanos. Dos oficiais de Marinha, dizia o Rei D. Carlos, que não eram
monárquicos, mas que serviam com mais lealdade do que muitos que afirmavam sê-lo.
É no entanto de crer que alguns dissabores na carreira de Baldaque da Silva tenham
sido causados por estas simpatias que, provavelmente, não mostrava grande preocupação em
ocultar.
A revolução republicana estava em marcha e, na noite de 4 para 5 de Outubro de 1910,
regressando de uma visita ao Porto com a mulher e as duas filhas, entrando o Tejo a bordo do
vapor
alemão
“Rugia”,
tornou-se,
inadvertidamente,
testemunha
privilegiada
do
bombardeamento naval ao Palácio das Necessidades e dos combates em terra. Entusiasmado
pelo decurso dos acontecimentos, desembarcou com a família, ainda o tiroteio não cessara
completamente. No dia seguinte pela manhã, envergando a espada que o pai usara, aquando
das Lutas Liberais durante o cerco do Porto, apresenta-se ao Ministro da Marinha e,
solenemente, oferece os seus serviços ao novo regime.
Proclamada a República, e uma vez reformado da Marinha, Baldaque da Silva é
convidado pela delegação do partido Republicano da Figueira da Foz a assumir uma postura
política mais activa. Tendo-se, até à data, mantido discretamente afastado das lutas e
discussões políticas, uma vez que a sua atividade técnico-científica o absorvia por completo,
entrega-se de corpo e alma a esta nova atividade, passando a discursar frequentemente em
congressos e reuniões do partido, onde revela os seus dotes de orador e a sua capacidade de
galvanizar as multidões.
É por esta altura que apresenta ao Congresso da República um projeto de construção
de um porto oceânico no Cabo Mondego, que se traduziria na melhoria e ampliação do porto da
Figueira da Foz, projeto esse incluído num plano de desenvolvimento integrado da Região
Centro, o qual contemplaria a união, por canais navegáveis, das redes hidrográficas do Zêzere,
Mondego, Tejo e ria de Aveiro. Prestava desta forma, um serviço à Figueira, que tanto
estimava, enquanto, simultaneamente, apostava na promoção política da sua própria figura.
Este projeto viria a ser aprovado mas, após a morte do seu autor, foi abandonado e a verba
que se lhe destinava foi desviada para a construção do porto de Aveiro.
Em 1914, por ocasião das eleições parciais, Baldaque da Silva é nomeado candidato a
deputado do Partido Republicano pela Figueira da Foz. Não tendo sido eleito, foi colocado à
frente da Comissão Municipal Republicana, sendo posteriormente proposto como candidato a
senador do Congresso pelo distrito de Coimbra, conseguindo desta vez a eleição.
Não o seria por muito tempo. Em Maio de 1915 foi a um almoço do Partido Republicano
na Figueira, apesar de ter recebido cartas anónimas que o aconselhavam a não ir. Pouco tempo
depois adoecia. Teria sido vítima de envenenamento por parte dos seus adversários políticos ou
de alguém que o invejasse? Não há maneira de o saber, pois, após a sua morte, a família não
autorizou a autópsia.
A 21 de Agosto de 1915, na sequência da sua doença, falecia, na sua residência de
Campolide, o Capitão-de-Mar-e-Guerra Engenheiro Hidrógrafo António Artur Baldaque da Silva,
senador da República e uma das mais distintas figuras da sua época. O funeral realizava-se,
dois dias depois, para o cemitério de Benfica, conforme o seu desejo de ser sepultado na sua
área de residência.
Não são muitas as homenagens feitas ao grande homem que foi Baldaque da Silva.
São, porém, de registar os seguintes eventos evocativos:
NRP “Baldaque da Silva” (A 522) (1949-1961)
Construído em Inglaterra em 1942, serviu a Armada Britânica com o nome de Ruskholm, tendo
sido adquirido por Portugal em 1949. Deslocava 704 toneladas e tinha uma guarnição de 36
homens. Esteve ao serviço da Missão de Estudos de Pesca em Angola e Cabo Verde entre 1948
e 1961. Seria, mais tarde, classificado como navio hidrográfico e rebaptizado “Salvador
Correia”.
Curso Baldaque da Silva
Em 1988, Baldaque da Silva foi designado patrono do curso de cadetes que nesse ano
entrou para a Escola Naval.
Registe-se a curiosa coincidência de, em 2003, ano em que se completaram 150 anos
sobre aquela que será a verdadeira data de nascimento de Baldaque da Silva, o curso ter
comemorado 15 anos de entrada para a Marinha e 10 de saída da Escola Naval.
Aguarelas Originais d´ O Estado Actual das Pescas em Portugal
Em 2002, ano em que se completaram 150 anos sobre a data oficial de nascimento de
Baldaque da Silva, foram adquiridos pela Comissão Cultural de Marinha os originais das
aguarelas reproduzidas na sua obra-prima O Estado Actual das Pescas em Portugal, as quais
foram colocadas em exposição no Museu de Marinha.
Rua Baldaque da Silva
Em Fevereiro de 2005, a Câmara Municipal de Lisboa decidiu atribuir o nome de
Baldaque da Silva a uma rua da freguesia de Benfica.
Também em Fernão Ferro, no concelho do Seixal, existe uma rua com o nome deste
ilustre oficial.
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