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REFERENCIAIS TEÓRICOS E DOCÊNCIA:
ONDE ANDA ESSA RELAÇÃO?
Andrea Rapoport
Resumo
O presente artigo discute a aplicação dos saberes teóricos adquiridos na Universidade por educadores em suas práticas profissionais e o papel dos professores formadores de professores para o estabelecimento da relação entre a teoria e a
prática. A idéia defendida neste trabalho é a da necessidade da
utilização de referenciais teóricos nas ações docentes, aliadas a
processos de reflexão e, não na intuição e na repetição de modelos educacionais vividos pelos professores, conforme demonstram alguns estudos. Portanto, não se deve atribuir integralmente
a responsabilidade pela freqüente inexistência da relação entre
teoria e prática somente aos professores. Existe uma co-responsabilidade por parte dos próprios professores formadores
de professores que, algumas vezes, não relacionam as teorias
apresentadas em suas aulas com o contexto escolar e educacional fora do meio acadêmico.
Palavras chave
cente.
Abstract
Diálogo
Referenciais teóricos, prática docente, formação do-
This article brings a discussion about the applicability
of theoretical knowledge learned in the University by educators
in their professional practices, and the function of the
Professors which are responsible for preparing teachers aiming
at establishing a relationship between theory and practice. The
main focus of this study is to defend the need of using
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theoretical references in the educational activities with
reflection processes instead of the intuition and the repetition
of the educational standards experienced by teachers, according
to many studies on this subject. However, it is not correct to
totally make the teachers responsible for the lack of relation
between theory and practice in their classes. There is a coresponsibility of the Professors who educate teachers once,
many times, they do not relate the studies presented in the
classrooms to the educational context outside the Academy.
Key-words
studies.
Theoretical references, teachers’ practices, teachers’
Introdução
A preocupação com a formação e a qualificação docente tem evocado vários
questionamentos, entre eles, a importância do embasamento teórico na prática docente.
Em relação a essa questão tem-se discutido a relevância dos saberes teóricos e acadêmicos para a prática profissional, a utilização ou não de referenciais teóricos pelos educadores e o papel dos professores formadores de professores nas universidades.
Becker (1993) aponta a incessante situação da separação entre teoria e prática na docência, oriunda de um trabalho justificado pelo senso comum ou pela intuição pessoal. Segundo o autor, muitas vezes a escolha teórica sofre deformações
feitas pela incompreensão do professor, além de observar-se uma repetição de modelos educacionais e práticas vividas pelos próprios professores enquanto alunos.
Em sua pesquisa sobre a epistemologia do professor, o autor encontrou
uma ausência de crítica, docentes que se deixavam levar pelo senso comum e que
executavam um ensino basicamente empirista e/ou apriorista, baseado na repetição,
sem muitas vezes nem saber que estão adotando essas posturas epistemológicas.
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Além disso, verificou um predomínio da epistemologia empirista e, mesmo quando
houve menção a uma epistemologia construtivista, esta foi misturada com versões
empiristas ou inatistas. Segundo o autor, quando a intuição se torna a principal
ferramenta de trabalho o ensino perde sua função de incrementar a aprendizagem,
levando a uma reprodução da informação (BECKER, 1993).
Tal idéia é reforçada também pelo trabalho de Grigoli (1990, citado por
MOURA, AZEVEDO e MEHLECKE, 2005, p. 1):
[...] o professor, via de regra, vai intuitivamente e empiricamente construindo a sua
própria didática calcada nos modelos que conheceu como aluno e no bom senso que ajuda
a filtrar os procedimentos que “funcionam”. Desse processo resulta, com o passar do
tempo, um “jeito” de organizar e conduzir o ensino que geralmente não chega a ser
tomado com reflexão nem pelo professor individualmente e, menos ainda, pelo conjunto
de professores que lecionam um dado curso (http://www2.abed.or g.br/
visualizaDocumento.asp?Documento_ID=17).
Santos (1998 apud SARMENTO, 2006), na Dissertação “Avaliação no pro-
cesso ensino-aprendizagem: uma abordagem Histórico Cultural” investigou as ma-
nifestações avaliativas presentes nas atividades propostas pelo professor, segundo a
perspectiva da Teoria Histórico Cultural. As quatro professoras que participaram
do estudo lecionavam nas séries iniciais do Ensino Fundamental (uma em cada
série) de um Colégio de aplicação de uma Universidade do Extremo Sul Catarinen-
se. Foram realizadas observações das aulas dessas professoras. Santos verificou um
distanciamento entre os discursos das professoras e suas práticas pedagógicas relativas à avaliação. Enquanto suas falas revelaram concepções coerentes com a perspectiva histórico-cultural, os espaços de avaliação apareceram como estanques e
fragmentados, revelando ausência de uma ação processual.
Gomes (2006, p. 4) destaca a importância do docente “tomar atitudes cons-
cientes quanto à sua opção conceitual filosófica de homem, mundo e educação, que
sejam mais adequadas para dirigir, organizar e transformar sua opção pedagógica”.
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Entretanto, o autor alerta que, para que isso ocorra, deve-se questionar se a formação universitária dos professores foi significativa para levar ao rompimento com a
formação escolar à qual foi submetido.
Muitos professores recém-formados, segundo Vasconcellos (2003), consideram-se especialistas, adotando uma postura arrogante “quando sequer há o domínio dos conteúdos básicos a serem ministrados em sala de aula” (p. 13). Outras
vezes, destaca o autor, o professor sai da faculdade com uma série de teorias e idéias,
mas ao enfrentar resistências repete práticas arcaicas que já estão regularizadas.
Entretanto, torna-se necessário desvencilhar-se de paradigmas ultrapassados e vislumbrar novos horizontes.
Enfim, quer seja por um despreparo teórico, por posturas arrogantes e fechadas à aprendizagem, deficiências em conteúdos básicos ou limitações institucionais,
todas essas questões podem ser superadas, através da educação, do desejo do professor e de seu empenho em romper com práticas equivocadas e antiquadas. Entretanto,
a formação e qualificação docente é um processo que nunca está concluído. Isso quer
dizer que requer uma constante atualização, um repensar, um contato com a realidade
de forma sistematizada através da prática da pesquisa, de atualizações teóricas conscientes de que muito se tem a aprender e muito se tem a desvendar.
Carmo e Chaves (2001) também destacam que, para construir uma prática
pedagógica capaz de atender a todas as demandas do sistema educacional, necessitase de instrumentalização teórico-prática do profissional da educação. Nóvoa (apud
CARMO e CHAVES, 2001) enfatiza ser necessário que os professores se apropriem dos seus saberes e os trabalhem do ponto de vista teórico e conceptual.
Mews (1998), em sua Dissertação “A Teoria Histórico-Cultural nas séries
iniciais: Da teoria à prática – um estudo de caso” analisou as práticas docentes de
dez professores que atuavam com as séries iniciais do Ensino Fundamental de uma
escola pública. O autor objetivou instrumentalizar teoricamente os professores,
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a fim de que estes pudessem qualificar suas práticas educativas. Desse número de
professores, cinco possuíam formação somente em nível de Ensino Médio. Foram
realizadas 14 sessões de estudos para discutir os fundamentos da Psicologia Histórico-cultural, assim como foram feitas avaliações com os alunos desses professores.
A autora verificou que os professores esperavam uma receita mágica vinda de algum dos teóricos da educação mundial e que pudesse ser aplicada na sala de aula ao
invés de discutir e analisar a realidade da aula. Mews concluiu que “[...] os professores trabalham na sala de aula, a partir de seus próprios princípios, sem seguir linha
pedagógica clara ou definida e que o cotidiano do aluno raramente é levado em
conta [...]” (MEWS, 1998, p. 86).
Embora existam argumentos fortes e consistentes a favor da relevância da
prática docente ter um embasamento teórico, alguns autores, a exemplo de Tardif,
(apud DUARTE, 2003), questionam essa questão. O que se tem talvez seja um
duelo entre questões inseparáveis, pois teoria e prática não existem uma sem a outra. A teoria é um suporte que deve passar, não só por um processo de reflexão e
crítica do docente, como também pela relação com a prática nos diferentes contextos de atuação do professor. Já a prática, quando cientificamente investigada, é a
promotora das teorias, tanto as existentes, como aquelas que devem ser constantemente criadas e recriadas.
Talvez, por um viés radical, alguns autores têm criticado a relevância dos
conhecimentos acadêmicos se comparados aos conhecimentos profissionais. Segundo Duarte (2003), Tardif, em seu artigo “Saberes profissionais dos professores
e conhecimentos universitários: elementos para uma epistemologia da prática profissional dos professores e suas conseqüências em relação à formação para o magistério” procura mostrar que a formação de professores nas Universidades está centrada no saber acadêmico, teórico e científico, o que não atende aos saberes profissionais necessários para sua atuação. O argumento de Tardif objetiva mostrar que
conhecimentos teóricos, acadêmicos, científicos têm pouco valor do ponto de vista
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da atuação profissional. Para Duarte, Tardif defendeu a idéia não só da irrelevância
do saber cientifico, teórico, acadêmico, mas de seu caráter prejudicial na formação
de professores. Essa proposição, se interpretada em seu sentido literal, pode trazer
sérias distorções para aqueles que acreditarem que somente sua prática e intuição
são importantes para atuar na docência.
Outro autor que também aborda a questão epistemológica no debate sobre
formação de professores é Philippe Perrenoud. O livro intitulado “A prática reflexiva no ofício de professor: profissionalização e razão pedagógica” sugere que para
formar professores reflexivos a Universidade deveria, segundo Perrenoud (apud
DUARTE, 2003, p. 6), abandonar quatro ilusões sobre “o estado dos saberes teóricos e sua pertinência para fundar uma prática profissional”: a “ilusão cientificista”,
a “ilusão disciplinar”, a “ilusão da objetividade” e a “ilusão metodológica”.
Entretanto, Perrenoud (1999, p. 7) esclarece que a competência do professor estaria na “[...]capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de situação, apoiada em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles”. Segundo o autor, o
profissional deve saber analisar e explicitar sua prática, tomando assim consciência
de suas ações e permitindo uma lucidez profissional.
Inúmeras vezes, o professor se depara com situações para as quais não tem
respostas pré-elaboradas, o que pode levar à criação e construção de uma nova
realidade que vai além das regras, fatos, teorias e procedimentos conhecidos e dis-
poníveis (DUARTE, 2003). Entretanto, sabe-se que, para criticar e poder elaborar
revisões do que já está posto teoricamente, precisa-se conhecer este saber cientificamente elaborado e propor novos saberes, articulados com a prática, mas também
com caráter científico e não meramente intuitivo.
A problematização do poder da teoria na explicação do real seria decorrente
da constatação da infinitude do real e dos processos de expansão e revisão do conhecimento, conforme coloca Lelis (2001, p. 1):
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Em que pese a fertilidade da produção acadêmica há, contudo, zonas de sombra que
precisam ser desvendadas, se considerarmos os desafios de uma escola de massa e o lugar
que nela desempenha o trabalho do professor, especialmente em sociedades como a nossa
que não equacionaram o problema da desigualdade social e escolar.
A partir das questões expostas, que revelam diferentes olhares sobre a im-
portância do embasamento teórico na prática docente, apresentam-se a seguir alguns resultados de um estudo anterior (RAPOPORT e SILVA, 2006) e de outro em
andamento (RAPOPORT et al., 2007), buscando demonstrar a utilização ou não de
referenciais teóricos na prática docente.
Na pesquisa realizada por Rapoport e Silva (2006), para investigar a utiliza-
ção de referenciais teóricos na prática docente, foram entrevistados 34 professores.
Os participantes tinham idade média de 37,1 anos, iniciaram a atividade docente
entre 1975 e 2002 e lecionavam entre 20 e 52 horas (M=36; dp=9,13). Todos estavam atuando na docência em instituições de ensino públicas (62%), particulares
(15%) ou em ambas (23%). Destes, 76% eram do sexo feminino e 23%, do masculino. A escolaridade predominante foi superior (71%). Os professores atuavam principalmente no ensino fundamental (47%) e fundamental e médio (32%), graduados
ou graduandos em 11 diferentes licenciaturas.
Na análise geral das respostas sobre a utilização ou não de algum referencial
teórico, 65% dos docentes responderam que não utilizavam algum referencial teórico, utilizavam vários (sem especificar) ou referiram basear-se em livros didáticos.
Os que apontaram seguir como padrão o livro didático justificaram sua opção pela
atualidade, contextualização, criticidade, diversidade, quantidade de informações,
como auxiliar da aprendizagem e cumprimento dos conteúdos.
Aqueles professores, que disseram não seguir um referencial, deram justificativas que foram classificadas como: intuição, prática, experiências anteriores, diversidade para manter a aula agradável, conhecimentos prévios dos alunos e ancoragem. Outros, provavelmente por não saberem responder, disseram apenas vários e
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justificaram com falas que indicam novamente o uso da intuição, dos conhecimentos prévios, da prática e da diversidade para manter a aula agradável. Surgiram como
novas categorias a realidade particular de cada educando e a falta de opção.
Dentre aqueles que definiram algum referencial teórico (35%), observou-se
um predomínio de Piaget (43,47%) em relação aos demais teóricos citados, que
foram Paulo Freire, Vygotsky, Emília Ferreiro, Perrenoud e Sara Paim.
As justificativas para alguns docentes que responderam seguir múltiplos referenciais teóricos, referindo-os, foram a intuição, a obrigatoriedade e o desenvolvi-
mento dos alunos. Novamente aparece a intuição, mas acrescida da obrigação, devido às exigências institucionais.
Já no estudo que está sendo realizado por Rapoport et al. (2007) com pro-
fessores de primeira série e primeiro ano de uma rede municipal de ensino, investigou-se a utilização de referenciais teóricos como embasamento para o processo de
alfabetização. Participaram do estudo 93 professoras, sendo 32,2% de primeiro ano,
57% de primeira série e 10,8% que atuam em ambos. A idade média dos participan-
tes foi de 39,6 anos. Em relação ao tempo de experiência, este foi, em média, 16
anos em docência e 8,4 anos especificamente em alfabetização. Quanto à formação
destas professoras, 83,9% têm magistério, 77% estão cursando ou já concluíram um
curso de graduação e 29% estão cursando ou concluíram um curso de especialização. A carga horária variou entre 20 e 64 horas (M=38,74; dp=8,96).
As respostas revelaram que 63,4% dos entrevistados disseram utilizar algum referencial teórico, 23,7% não utilizavam e 12,9% não responderam. Dentre os
teóricos citados, encontra-se, com maior percentual Emília Ferreiro (25,8%), tendo
sido referidos também Piaget, Vygotsky, Paulo Freire, construtivismo, Ana Teberosky, Psicogênese, Ester Grossi, Geempa, Magda Soares, Perrenoud e Alícia Fernandes. Chamaram a atenção respostas que, mesmo com percentuais variando entre
1% e 2%, revelaram incompreensão da questão ou falta de conhecimento: livros e
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cursos, planos de estudos, criatividade e variados. Este dado repete o que já ocorreu
no estudo de Rapoport e Silva (2006).
Carvalho (2000), em sua Tese de Doutorado “A relação entre Psicologia e
Alfabetização sob a óptica dos professores”, investigou como o professor alfabetizador utiliza na sua prática pedagógica as teorias psicológicas que embasam o processo de ensino-aprendizagem da leitura e escrita. Participaram de seu estudo vinte
e quatro professoras, com idades entre 30 e 61 anos de idade e que lecionavam na
primeira série do Ensino Fundamental da rede de ensino estadual de São Paulo.
A metade do grupo de professoras possuía formação superior. A coleta de dados
foi realizada através de um questionário e de uma entrevista onde foram investigadas, no questionário, questões relativas à “[...] formação, situação funcional, atualização profissional e conhecimento sobre a Psicologia” (CARVALHO, 2000, p. 93) e
na entrevista sobre a “[...] compreensão sobre a educação e o processo de alfabetização, o modo como elaboram o planejamento didático, como executam o trabalho
em sala de aula e seu conhecimento sobre o desenvolvimento infantil” (p. 93). Carvalho verificou divergências entre os discursos e as práticas educativas.
Já Carvalho (2007) abordou os conhecimentos psicológicos adquiridos por
24 professoras alfabetizadoras na sua formação inicial e em cursos de formação em
serviço, buscando identificar os temas e autores que eram lembrados e se havia uma
identificação do papel da psicologia para o trabalho docente. As educadoras entrevistadas demonstraram dificuldade em lembrar dos conteúdos estudados, limitando-se em grande parte a temas gerais, teóricos clássicos ou livros didáticos utilizados nas disciplinas. Dentre os autores lembrados da área da psicologia, estudados
nos cursos de magistério e pedagogia, estiveram Piaget, Rogers, Skinner, Vygotsky,
Jung e Rogers e da área da educação foram Paulo Freire, Cipriano Luckesi e Mada-
lena Freire. Já dentre os autores que foram citados como estudados em cursos de
atualização profissional estiveram Piaget e Vygotsky (Psicologia), Emília Ferreiro,
Ana Teberosky e Ester Pilar Grossi (contemporâneos da Psicologia), Paulo Freire,
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Mário Pires Aranha e Neide Keiko Nakamura (contemporâneos da Educação). Duas
professoras lembraram apenas o nome do professor que ministrou o curso.
Conforme a análise de Carvalho, em algumas respostas foram constatados
equívocos ao citarem, como se fossem da Psicologia, autores da Filosofia, Sociologia e Educação. Um outro aspecto que se destacou foi, em alguns depoimentos,
uma incompreensão da teoria e a sua relação com a prática. É possível, que um dos
motivos para que este fato esteja na própria formação destas professoras, que pode
ter levado elas a concluir sobre a ineficiência dos saberes teóricos frente às situações
práticas:
Na grande maioria das vezes, os cursos de formação têm por objetivo fornecer conhecimento teórico sobre algum aspecto do desenvolvimento infantil ou orientar a atividade prática das professoras, objetivando a melhor utilização de materiais ou técnicas de
ensino. Não se propõem, portanto, a discutir, realmente, o que acontece na sala de
aula. Esse tipo de formação não propicia a reflexão sobre o fazer pedagógico das
professoras, de modo a levá-las a estabelecer os nexos-causais e as complexas relações
que existem entre os fenômenos psíquicos e as atividades escolares. Na verdade, os
ministrantes pouco sabem sobre o professor ou sobre a realidade da sala de aula, e o
que é pior, isto não tem sido objeto de investigação nos últimos anos (CARVALHO,
2007, p. 8).
Cabe destacar que se deve ir além da reflexão entre utilizar ou não referenciais teóricos para embasar a prática docente ou sobre o conhecimento destes referenciais. Muito acertadamente, alguns estudiosos têm discutido a atuação dos professores formadores de professores, que talvez sejam, em parte, responsáveis pela
dicotomia teoria e prática.
Crisostimo (2003) refere que muitos docentes universitários desconhecem a
realidade escolar na qual atuam os professores que estão em formação, existindo
um “enclausuramento da comunidade teórico-acadêmica” (p. 106). Em decorrência
disso, o formador, que deve conciliar teoria e prática e desconstruir as certezas
fundadas e estabelecidas, vê-se limitado em fazê-lo. São vários os fatores que po-
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dem ser destacados, mas, nesse caso, cabe o questionamento de que se o fato de
alguns professores formadores, por eles próprios terem dificuldade em relacionar
os conteúdos ministrados com a prática, não contribui para o caráter descartável
dos conteúdos “aprendidos”.
Diante desse cenário, Gomes (2006, p. 5) indica a importância de desenvol-
ver pesquisas direcionadas sobre o campo pedagógico dos profissionais que atuam
na formação docente, “[...] investigando o conhecimento pedagógico, com ênfase
na visão do professor para as suas concepções de educação e de contexto educacional
e o que pensam sobre a participação da sua disciplina e da relação teórica e prática
no processo de Ensino e Aprendizagem [...]”. Vasconcelos, Praia e Almeida (2003)
destacam que assim como aprendemos sem, muitas vezes, nos preocuparmos e
com a natureza desse processo, ensinamos sem um apoio teórico explicativo do
processo de ensino-aprendizagem. “Como professores temos alguns referenciais explicativos e, também, de forma implícita ou explícita, orientamos a nossa prática por
tais referenciais” (p. 11).
Considerações finais
A utilização de referenciais teóricos na prática docente deve ser revista,
não no sentido de descartar a sua importância, mas para questionar-se o porquê
muitos professores que estão atuando em sala de aula não embasam suas ações
nas teorias estudadas ao longo da sua formação ou fazem usos equivocados e
distorcidos destas.
Os resultados de alguns estudos revelam, muitas vezes, o uso da intuição, do
senso comum, de experiências pessoais e até de justificativas inusitadas como, por
exemplo, os livros didáticos, planos de estudos e a criatividade. Apesar de evidenciar
esse fato, não se pode generalizá-lo, mas os casos onde o trabalho docente aparece
justificado por reflexões teóricas coerentes não são o foco do presente artigo.
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Ao se verificar que muitos professores formadores de professores fechamse no meio acadêmico e não possuem experiência profissional, coloca-se como uma
possibilidade este professor utilizar a experiência de seus alunos e, em conjunto,
buscarem estabelecer reflexões e embasamento para as ações docentes. Os alunos
têm experiências diversificadas e ricas e, ao envolvê-los na construção destas relações, estar-se-á dando sentido aos conteúdos trabalhados e motivando-os a aplicálos em seu trabalho enquanto professor. De modo recíproco, o professor formador
também estará aprendendo com seus alunos.
É lamentável verificar que esta problemática tem raízes mais profundas,
pois se formou um ciclo que vem, seguidamente, desde o Ensino Fundamental. Já
nas etapas iniciais da escolarização formal os processos de ensino-aprendizagem
têm-se mostrado amplamente deficitários para o desenvolvimento de habilidades
que ultrapassem a mera repetição mecânica de conteúdos muitas vezes sem sentido para os alunos, por também não serem trabalhadas as relações e aplicações
destes.
Dessa forma, ao invés de simplesmente diagnosticar e criticar, deve-se assumir uma responsabilidade consciente e capaz de promover mudanças nesse quadro
que já está estabelecido, mas que não precisa ser permanente.
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