1 Formação de professores de arte e perspectivas de atuação política Maria Cristina da Rosa Fonseca da Silva1 UDESC e-mail: [email protected] 1. Apresentação A idéia de analisar as políticas públicas que atingem a formação de professores de artes surgiu da proposta de um capítulo de livros intitulado “Proposições interativas: Arte, Pesquisa e Ensino”2. Nesse capítulo a professora Dolores Alcaide Diaz apresenta o contexto da formação de professores na Espanha e eu apresento a formação de professores no Brasil. O caminho da escrita desse texto me fez pensar na perspectiva de atuação da FAEB – Federação de Arte Educadores do Brasil e das Associações Estaduais que tem buscando ampliar a movimentação política em torno do ensino e da docência em arte. Da mesma forma o momento atual da atuação política dos professores de artes vem ao encontro da política da atual diretoria da FAEB que propõe a realização dos ENREFAEB’s (Encontro Regional da Federação de Arte-educadores do Brasil) como modo de fortalecimento das Associações Estaduais. É para continuar a reflexão sobre a formação de professores de artes no Brasil que apresento o presente texto. Acreditamos que o trabalho nos auxiliará a compreender as estratégias utilizadas na formação de professores dessa matéria - Artes - e de como, com ela, se coloca na ordem do dia como um tema relevante para a compreensão das mudanças ocorridas na conjuntura brasileira a partir da década de 1980. É possível afirmar que existe um projeto estratégico de formação de professores no contexto dos países capitalistas? Se houve, que papel desempenha a legislação nesse contexto? 1 Professora Maria Cristina da Rosa Fonseca da Silva doutora atuando na área de ensino de arte e formação de professores. É professora associada da UDESC e atua na Linha de investigação Ensino de Arte do Programa de Mestrado em Artes Visuais do CEART. Líder do Grupo de Pesquisa Educação, Arte e Inclusão. Autora do Livro Formação de Professores de Arte: diversidade e complexidade pedagógica. Vice-presidente da Federação de Arte-Educadores do Brasil – FAEB. 2 O livro é produção do Grupo: Arte e Educação do CNPq, liderado pela profa. Dra. Sandra Regina Ramalho e Oliveira (UDESC). 2 Oliveira (2003) informa que nos anos de 1990 muitos estudos se dedicaram às reformas educacionais na América Latina. Avolumando-se, produziram, consequentemente, consideráveis mudanças educacionais. A autora constatou que desses estudos poucos foram os que se dedicaram a investigar como as reformas educacionais atingiram as relações de trabalho. Embora nossa pretensão seja apresentar a inter-relação da formação docente em Arte e as legislações e reformas que atingiram os professores nos últimos anos no Brasil, ressalvamos que outros pontos tangenciam essa problemática, como, em particular, a pressão a que são submetidos os professores de Artes nas rotinas de trabalho nas escolas públicas. Podemos de antemão afirmar que as reformas educativas brasileiras atribuem a esse profissional uma carga maior de tarefas que a todos os demais, porém com uma remuneração pouco atrativa. No campo da educação em geral esse fenômeno é chamado de proletarização da atuação docente. 2. Formação de Professores de Arte: uma caminhada Na trajetória das investigações sobre a formação de professores de artes pouco tem sido escrito acerca das políticas públicas. Isso acontece porque na maioria das vezes essas políticas mudam de um governo pro outro e não temos conseguido desenvolver pesquisas sobre as modificações que essas políticas imprimem na formação docente em artes. Na maioria dos estudos o foco se dá sobre a prática de sala de aula sem que haja uma relação dessa prática com a legislação. Analisamos a conjuntura das políticas públicas que incidem sobre a formação de professores de Artes a partir da década de 1980. Neste período, o Brasil, no campo educacional, revisa sua lei educacional maior, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 4024/613. Essa lei é reformulada em 1968 (Lei, 5.540/68 reforma do ensino superior) e em 1971 (Lei 5692/71 - reforma da educação básica), a partir de um acordo entre o Ministério da Educação brasileiro e o estadunidense. Desse acordo, chamado MEC-USAID, surge a lei 5692/71, que cria a disciplina de Educação Artística. 3 Essa lei foi a primeira LDB brasileira; foi utilizada até 1996, tendo sofrido apenas as duas reformas acima apontadas. 3 Na década de 1980, desgastada pelos movimentos populares que se reorganizam e propõem um forte movimento de mudança do contexto anterior, ou seja, da política educacional do governo militar, as organizações educacionais e culturais da sociedade civil iniciam uma pressão por mudanças nesse campo. Este é o pano de fundo do qual destacamos a LDB, a Lei n. 9394/96, que tramitou no Congresso por cerca de doze anos e que atualmente, também passa por reformas. Destacamos, em particular, as leis n. 10639/2003 e 11.645/2008, que atingem diretamente a formação de professores de Artes. As Resoluções do Conselho Nacional de Educação/CP 01, de 10/02 de 2002, a de 19/02 de 2002 e a n. 01 de 16 de janeiro de 2009, que instituem as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação Artes Visuais, também assinalam caminhos para a formação de professores nos cursos superiores nas licenciaturas em geral e também de Artes. A partir da LDB em vigor, várias legislações foram criadas com a intenção de ampliar as atividades docentes para além das atividades pedagógicas tradicionais. A nova LDB ainda muda o lugar do ensino de arte: transforma-a de atividade, com um cunho tecnicista, como era na Lei 5692/71, para componente curricular. O mesmo acontece com relação à concepção de polivalência na educação: dá lugar a um pensamento cognitivista da nova lei, mais adequado ao pensamento educacional da década de 1990. A LDB 9394/96 foi construída a partir da correlação de forças entre as políticas neoliberais e as principais lutas do movimento associativo organizado. Avaliamos que na década de 1990 houve um movimento de acréscimo de atribuições ao professor, além das já existentes. Por outro lado, a contrapartida nos investimentos de infraestrutura não se consolidou da mesma forma na implementação de ações políticas por parte do governo brasileiro. Mesmo o capítulo da LDB, que trata da valorização docente, não foi validado em todo o território nacional. Transvestidas de uma pretensa participação dos educadores, foram aos poucos barateando sua força de trabalho. O professor de Arte acabou integrado a esse cenário, ora nas atividades artístico-culturais da escola, ora nas atividades de produção de documentos educacionais. A Federação dos Arte-Educadores do Brasil - FAEB – foi o instrumento de resistência dos arte-educadores na concretização do modelo de ensino da Arte na 4 década de 19904. Poucos são os documentos que registram essa participação, porque ainda é pequena a tradição de registrar a história dos arte-educadores no Brasil. Barbosa, a partir das produções de 1978,1982, 1985, 1986, 1990 e 2008 foi pioneira nessa tarefa. Podemos identificar os textos de 1986 e 2008 como o marco desse movimento de escrita histórica, mas com certeza ainda há muito que registrar, pela própria autora e por outros educadores do País que a acompanharam nas últimas décadas. Na esteira dos movimentos da década de 1990, a polivalência no ensino de Arte propagada pela Educação Artística5 fundamentou o discurso na defesa da multiplicidade de conteúdos com o qual profissional dessa área deveria trabalhar. Os pressupostos do Movimento Escola Nova, dos quais Darci Ribeiro6 era signatário, foram alvo de um longo combate na construção da LDB 9394/96. A lei, que demorou cerca de dez anos para ser aprovada, vivenciou momentos de grandes conflitos entre o Fórum em Defesa da Escola Pública 7, no qual a FAEB tinha assento, e os interesses dos empresários do ramo educacional. Saviani (1996) relata a entrada do projeto Darci Ribeiro que propõe flexibilizar o ensino de arte, tirando-o da matriz curricular e colocando-o como atividade extraescolar e, por consequência, não-obrigatória. A concepção modernista que deu sentido à proposta de Darci Ribeiro sustentava-se na prática de ateliê. Foi a FAEB que buscou mostrar aos parlamentares a necessidade de garantir o acesso ao Ensino de Arte nas escolas na matriz curricular obrigatória. É importante ressaltar a ligação do senador Darci Ribeiro com os pressupostos da Escola Nova, posto que esse era o argumento utilizado pelo educador para defender a idéia de que o Ensino de Arte deveria acontecer no espaço extracurricular. Por outro lado, para os arte-educadores, a proposta parecia temerária, por entenderem que fora da matriz curricular a disciplina poderia ter enfraquecida sua ação educativa. Por falta de estrutura das escolas públicas em 4 Sobre o tema, ver Richter (2008). Nomenclatura substituída por Ensino de Arte a partir do Parecer do Conselho Nacional de Educação. (CNE/CEB – 22/2005). 6 Senador proponente do projeto que depois de aprovado figura como a atual LDB a lei 9394/96. 7 O Fórum em Defesa da Escola Pública foi um espaço ocupado por um projeto democrático de educação que tinha ação nos estados e também um Fórum Nacional, com representantes das entidades de base nacional. Eram os representantes desse fórum que negociavam as mudanças no Projeto de Lei de Diretrizes e Bases com os parlamentares. Na época, Maria Cristina da Rosa, estudante de Licenciatura em Artes da UDESC, na condição de presidente da UCE -União Catarinense dos estudantes, representava-os no Fórum em Defesa da escola pública em Santa Catarina. 5 5 atender os projetos extracurriculares, as oficinas também teriam pouca sustentação. Havia ainda, e não menos preocupante, a ameaça de que por economia aos cofres públicos e privados pudesse ser aventada a extinção da disciplina nas escolas. A necessidade do oferecimento do ensino de arte não-polivalente, a partir da formação de professores por área (música, teatro, artes visuais, dança) e a defesa do espaço da Arte como componente curricular obrigatório garantiram o texto da atual legislação, que, longe de ser o que os educadores desejavam, retrata esse contexto de correlação de forças entre o movimento civil organizado e as bases políticas representadas pelos parlamentares. Embora a década de 1990 tenha sido marcada pela construção da LDB, outras políticas do governo brasileiro interferiram no ensino de Arte. Não podemos negar igualmente que os educadores, as universidades e as instituições culturais e sociais tenham desempenhado um relevante papel ao inserir nas políticas educativas e culturais dos governos municipais, estaduais e federal importantes modificações. As transformações relativas ao fazer pedagógico dos professores de Arte, a partir da entrada da imagem e do seu processo reflexivo, são reconhecidas a partir introdução no cenário educativo brasileiro da Proposta Triangular por Barbosa (1992). Da mesma forma, não podemos esquecer do conjunto de mudanças na arte contemporânea que paulatinamente foram sendo inseridas nos centros culturais fora do eixo Rio-São Paulo, movimento que ampliou as possibilidades de divulgação da produção de pólos culturais mais afastados do centro do País. Igualmente, não podemos, ignorar o amplo desenvolvimento da pós-graduação e do mercado de livros de arte e de ensino de arte, além de uma política mais constante de diálogo com centros internacionais, como demonstra Barbosa (1997). Igualmente, não é possível ignorar o amplo desenvolvimento da pós-graduação, que ampliou a formação de pesquisadores na área de arte e seu ensino de forma eficiente a fim de suprir as universidades de profissionais qualificados e preparados para atuar na conjuntura educacional, artístico-cultural do país. Inicia-se o processo de construção dos PCN’s – Parâmetros Curriculares Nacionais. Barbosa (1995) posiciona-se em relação aos modelos de importação de mudnaças curriculares. Esse texto trata-se de um dos raríssimos documentos na área de Ensino de Arte 6 com uma posição política sobre os PCN’s e o modelo de intervenção curricular envolvido nesse processo. Quanto à formação de professores de arte, quais das mudanças apontadas no contexto dos PCN’s irão se desdobrar nos anos seguintes? Ainda não temos um estudo que tenha refletido de forma mais ampla esse impacto no Ensino de Arte no Brasil. 3. O modelo deformação em artes no século XXI Este tópico tem como proposta desenvolver uma breve síntese dos principais documentos que orientam a formação de professores de artes visuais nos anos mais recentes. A resolução do CNE/CP1, de 18 de fevereiro de 2002, institui as Diretrizes Curriculares para a Formação de Professores da Educação Básica em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena. O documento institui um conjunto de princípios, fundamentos e procedimentos a serem observados na organização institucional e curricular para toda Educação Básica. No Brasil, a Educação Básica compreende desde os anos iniciais da Educação Infantil até os anos finais do Ensino Médio, agora abrangendo o arco que vai dos seis aos quatorze anos. A regulamentação (CNE/CP1) atinge todas as licenciaturas, propondo em seu artigo 2º sete itens que devem ser previstos na formação de professores de artes, a saber: o ensino visando à aprendizagem do estudante; o acolhimento e o trato da diversidade; o exercício de atividades de enriquecimento cultural; o aprimoramento em práticas investigativas; a construção de projetos e o desenvolvimento de conteúdos curriculares; o uso de tecnologias da informação, da comunicação e das inovações no âmbito escolar e, por último, o desenvolvimento do trabalho em grupo. Esses eixos poderiam auxiliar na qualificação de vários problemas na escola pública; no entanto, a resolução carece de estrutura financeira para auxiliar na aplicação das diretrizes8. Pode-se dizer que há um pequeno número de publicações no Brasil sobre o ensino de Artes Visuais nas licenciaturas. Pimentel (1999), Rosa (2005) e Biasoli 8 De fato, o artigo aqui apresentado não nos permite discorrer profundamente sobre a problemática. Oliveira (2003) nos oferece alguns argumentos de aprofundamento do tema a partir das reformas educacionais na América Latina e da formação docente. 7 (1999) são alguns deles que tratam da perspectiva da formação curricular, mas ainda precisamos de estudos que aprofundem o olhar nos últimos anos, a partir das mudanças dos parâmetros de formação de professores de Artes Visuais. Um exemplo seria o estudo do impacto das 800 horas de estágio obrigatório por força da Resolução CNE/CP 2, de 19/02/2002. Seria possível dizer que diminuiu a antiga dicotomia entre licenciatura e bacharelado? Será que nas licenciaturas os currículos vêm sendo desenhados para a inserção da Arte na escola? Haveria também uma melhor compreensão dos problemas nesse contexto? Ainda na esteira das mudanças resultantes da tensão do movimento associativo e o Estado, no governo Lula foi criado um conjunto de políticas públicas para recuperar a dívida do governo brasileiro para com os africanos e seus descendentes. A lei 10.639/2003 propõe o ensino da história e da cultura brasileira pela ação pedagógica do professor de Arte, juntamente com a do professor de História e de Língua Portuguesa. Mais tarde, o ensino da cultura indígena também vai fazer parte da reformulação da LDB 9394/96, com a Lei n. 11.645/2008. Uma falha que podemos apontar no texto dessa lei é que mantém a nomenclatura Educação Artística, contrariando o Parecer CNE/CEB n. 22/2005. Cresce nas escolas a ampliação da seleção dos conteúdos para além da arte branca, dominante e machista. Várias abordagens na década de 1990 ganham espaço na escola. Tanto a estética do cotidiano, como as imagens publicitárias, a produção de grupos locais, a arte de diferentes povos e de diferentes regiões do País começam a ser introduzidas nos conteúdos escolares. Da mesma forma, a Arte Contemporânea é inserida aos poucos no espaço da ação docente nos programas escolares. A cronologia rígida da História da Arte perde lugar para os temas, as problemáticas e projetos articulados. Mesmo que o quadro apontado pareça ufanista diante da real situação das escolas, parece-nos que o movimento intelectual dos arte-educadores se adianta em relação às transformações na escola, pois essas mudanças, por força do movimento organizado, nos próximos anos farão parte da realidade. A resolução que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Artes Visuais foi aprovada no ano de 2009. Trata da organização dos Projetos Políticos Pedagógicos dos Cursos de Artes Visuais, prioritariamente da 8 formação dos bacharéis em arte, embora remeta as questões da licenciatura para a Resolução e o Parecer do CNE/CES n. 280/2007, específicos sobre a formação de professores nas licenciaturas. O único artigo em que a resolução tem proposta direcionada à licenciatura é o oitavo, que trata do Trabalho de Conclusão de Curso. Podemos observar que a Resolução das Diretrizes de Artes não diferencia a formação artística do professor da do bacharel em Artes. Ambos devem ter uma compreensão dos aspectos da formação para a produção, a pesquisa, a crítica e o ensino das Artes Visuais. Ainda segundo o art. 3º, a formação visa: [...] o desenvolvimento da percepção, da reflexão e do potencial criativo, dentro da especificidade e do pensamento visual, de modo a privilegiar a apropriação do pensamento reflexivo, da sensibilidade artística, da utilização de técnicas e procedimentos tradicionais e experimentais e da sensibilidade estética através do conhecimento de estilos, tendências, obras e outras criações visuais revelando aptidões indispensáveis à atuação profissional na sociedade, nas dimensões artísticas, culturais, sociais, científicas e tecnológicas, inerentes à área de artes visuais. Além do domínio de conteúdos técnico-científicos da área de Arte, a resolução aponta temas que durante muito tempo foram pouco valorizados como potencial criativo e sensibilidade artística e estética9. Da mesma forma, revela aptidões para atuação profissional. Outro ponto já bastante estimulado na formação de professores de artes diz respeito à ideia de reflexão e inovações tecnológicas que perpassa tanto o texto das diretrizes, quanto o da resolução para a formação nos cursos de licenciatura. Grande parte da resolução ressalta um conjunto de competências 10 e habilidades exigidas na formação de professores de Artes, que destacamos no quadro abaixo. Diretrizes de Formação em Artes Visuais: Competências e Habilidades Diretrizes de Formação nas Licenciaturas: Competências e Habilidades Interagir com as manifestações culturais, Competências referentes ao 9 Referimos- nos aqui à dicotomia entre o pensamento de base essencialista e contextualista, que por vezes aparece dividindose no pensamento sobre fazer e ensinar arte. 10 Existe uma crítica bastante contundente nos fóruns da ANPED acerca do uso da concepção de competência/versus incompetência do professor. Concepção trazida para o Brasil a partir de Perrenould (educador da Universidade de Genebra). 9 demonstrando sensibilidade e excelência na criação, transmissão e recepção do fenômeno visual. comprometimento com os valores inspiradores da sociedade democrática. Desenvolver pesquisa científica e tecnológica em Artes Visuais, objetivando a criação, a compreensão, a difusão e o desenvolvimento da cultura visual. Competências referentes à compreensão do papel social da escola. Atuar, de forma significativa, nas manifestações da cultura visual, instituídas ou emergentes. Competências referentes ao domínio dos conteúdos a serem socializados, aos seus significados em diferentes contextos e sua articulação interdisciplinar. Atuar nos espaços culturais, em articulação com instituições de ensino específico de Artes Visuais. Competências referentes ao domínio do conhecimento pedagógico. Estimular criações visuais e sua divulgação como manifestação do potencial artístico, objetivando o aprimoramento da sensibilidade estética dos diversos atores sociais. Cultura geral e profissional. Conhecimentos sobre crianças, adolescentes, jovens e adultos, aí incluídas as especificidades dos alunos com necessidades educacionais especiais e as das comunidades indígenas. Para a Licenciatura, devem ser acrescidas as competências e habilidades definidas nas Diretrizes Curriculares Nacionais referentes à Formação de Professores para a Educação Básica. Conhecimentos sobre dimensão cultural, social, política e econômica da educação; áreas de conhecimento que serão objeto de ensino. Conhecimento pedagógico. Conhecimento advindo da experiência. Quadro elaborado a partir do texto das Resoluções n◦ 01, de 2009, e CNR/CP1, de 2002. Considerando as habilidades previstas nos dois documentos, os desafios da formação de professores de Artes para as universidades são grandes, pois articulam a formação de conteúdo e a formação pedagógica. O perfil profissional desejado do egresso das licenciaturas em Artes Visuais é o de um profissional reflexivo, criativo, que apresente considerável conhecimento sobre a realidade artístico-cultural, sobre a arte em diferentes tempos, espaços e proposições e que aponte um viés multicultural-crítico. Dele ainda se exige que tenha o domínio pedagógico de como ensinar, seja articulado com as instituições culturais e a comunidade e que, fundamentalmente, conheça o processo de aprendizagem. Da mesma forma, esse perfil precisa de uma formação cultural mais ampla e que de fato mantenha interlocução com a sociedade. Que modelo de formação artístico-cultural e pedagógica os cursos de formação de professores de artes necessitam ter? Em que espaços da formação na universidade encontramos estudantes que se destacam na atuação como arteeducadores crítico-reflexivos? São de fato as universidades públicas que têm o suporte necessário para uma formação de maior qualidade, pelas possibilidades de 10 vida acadêmica que os estudantes usufruem nos espaços públicos. Como elas se têm apropriado dos recursos financeiros para formação de professores? E como os cursos de Artes têm atuado nesse contexto? É no espaço universitário que o estudante de Artes tem maior acesso ao cenário das artes visuais no País? E fora dele, na escola, como acontece? O que acontece com a formação artística do professor de arte depois de formar-se na licenciatura? Outro aspecto bastante ressaltado nas resoluções são as inovações educacionais, tecnológicas, as mídias e suas interfaces. Esse fenômeno também não é específico da área de Artes, embora nela exista uma forte base de recepção para as inovações tecnológicas no âmbito da produção artística contemporânea. Nesse campo, existe um grupo de teses de doutorado que aponta para a importância das tecnologias na formação de professores de Artes Duas delas assinalam uma abordagem no campo da teoria crítica: as de Rosa (2004) e Cunha (2008). Ressaltamos que ambos os estudos identificam a importância do uso e da inserção das Tecnologias de Comunicação e Informação (TIC’s) e de uma reflexão crítica para uma fruição qualificada do material produzido no contexto da Rede Mundial de Computadores (WEB). Essa perspectiva também vai de certa forma alterar os processos de formação de professores de arte, tanto pela aprendizagem a partir das tecnologias, quanto pelo que os estudantes nas escolas vão manifestar de interesse e de inserção no mundo da Internet e demais elementos de interatividade, as chamadas TiC’s. 4. Considerações Finais Esperamos que ao longo do tópico tenhamos sido bem-sucedidos ao apontar os principais pontos da legislação brasileira no tocante à formação de professores de artes. Da mesma forma, pretendemos problematizar algumas questões que possam ser ponto de partida para diversos trabalhos sobre o tema, produções com mais fôlego, como dissertações de mestrado e teses de doutorado. Acreditamos que esses estudos possam aprofundar a compreensão da formação de professores de Artes no Brasil. É igualmente necessário ressaltar que o espaço da universidade não encerra a formação de professores, pois, tanto a escola quando, a sociedade nos tornam impregnados de “habitus” culturais e pedagógicos, como aponta Bourdieu (2007). 11 Deduz-se a partir da atuação como professora formadora em cursos de Pedagogia, de extensão e de Pós-graduação que a formação que recebem os professores da Educação Infantil e os dos anos iniciais do Ensino Fundamental em Artes Visuais. A isto é preciso acrescentar as carências formativas que os estudantes trazem para a universidade, muitas vezes porque não tiveram em sua formação anterior contacto reflexivo com a produção artística, local, universal, midiática e de outras culturas. Aspectos de ampliação do seu universo cultural. Essas carências limitam e condicionam suas experiências artísticas, suas idéias e concepções sobre a arte, as obras de arte e as motivações para novas aprendizagens sobre o tema da arte, assim como limitam o entendimento de sua importância em sua formação como pessoas e como futuros professores. Embora no Brasil, as carreiras sejam distintas: uma é a formação para pedagogo e outra, para professor de Artes, na maioria dos casos o professor pedagogo leciona a disciplina de artes na educação infantil e nas séries iniciais. Já os profissionais licenciados em Educação Artística e/ou em Artes Visuais podem lecionar em todas as séries da Educação Básica. No Brasil, o maior problema não é de fato a falta de espaços formativos, mas o grande número de profissionais para fazer essa formação e as dificuldades financeiras de acessar uma carreira docente numa boa universidade. Muitos profissionais necessitam de formação em serviço. Um projeto bastante novo do governo Lula, que busca minimizar o distanciamento existente entre os professores com formação dos sem-formação é a Universidade Aberta do Brasil11 - UAB –, que proporciona formação na modalidade a distância. Entre as instituições que se destacaram na formação para o professor de Artes no Brasil na graduação a distância, temos a Universidade de Brasília – UnB - e a Universidade Federal de Goiás – UFG. A formação artística mais ampla do professor dessa disciplina também é preocupação das agências formadoras no Brasil e essa posição está expressa nos documentos analisados. A qualificação das experiências estéticas é importante para os próprios alunos, como pessoas, que se encontram no período de formação. Em seus estudos os professores, têm a oportunidade de construir outra forma de conceber a atividade artística e os produtos dela derivados. A esse processo 11 Sobre a UAB, ainda existem poucos estudos sobre a qualidade proporcionada na formação de professores nesse modelo. 12 reflexivo, adicionaram-se questões que não haviam sido pensadas anteriormente. Elas de fato auxiliam o estudante a reformular suas próprias concepções a respeito do âmbito do saber e da cultura que o rodeia. Valorizar essa formação cultural também é necessário porque, no exercício da função de professor, será porta-voz dessas concepções para seus alunos. Seus ensinamentos estarão sustentados sobre a base de suas considerações pessoais e convicções a respeito das Artes Plásticas como matéria necessária à formação do indivíduo e pelas atitudes que poderá adotar em relação a elas. No Brasil, as diretrizes curriculares e as leis 10.639/2003 e 11.645/2008 enfatizam o aspecto multicultural-crítico por compreender que o trato da diversidade é bastante relevante. No cenário brasileiro existe, no momento político atual, um terreno fértil para o florescimento de novas práticas, embora projetos educativos distintos estejam sempre em correlação de forças antagônicas. As diretrizes são apenas documentos com um posicionamento; resta às universidades fazer a diferença a partir da formação inicial nos cursos de licenciatura em Artes e desempenhar seu papel social na formação continuada dos professores nas escolas e na pós-graduação. Não podemos esquecer, nesse cenário, da sociedade civil, organizada em associações e instituições culturais, por meio das quais cumpre seu papel de denúncia e proposição. Pretendemos concluir este artigo enfatizando a importância da Federação dos Arte Educadores do Brasil estruturar-se como entidade independente, forte e com posicionamentos político, fundamentada na relação entre teoria e prática considerando a inserção no processo de proposição de políticas públicas e de críticas fundamentadas para a qualificação da formação de professores de artes. Da mesma forma as Associações de Arte educadores nos estados atuam como teias, numa visão dialética de troca entre ambos os organismos de representação dos arte-educadores, para analisar, criticar e propor no âmbito estadual as políticas públicas que incidem sobre a formação docente. Ainda para finalizar, ainda que o papel das Associações vem se transformando ao longo dos anos, isso não quer dizer que as lutas políticas 13 acabaram, apenas que os desafios para compreender o papel da arte e do profissional que atua com ela na produção ou no ensino tem sido ampliados vertiginosamente! Da mesma forma, desestruturar as associações, enfraquecê-las e diminuir seu valor de organização social, pode ser compreendido como uma estratégia de ampliação da hegemonia da política dominante. Cabe a cada Associação, a Federação e todos nós construirmos estratégias de resistência as políticas de cooptação. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARBOSA, A. M. Arte-educação no Brasil: das origens ao modernismo. São Paulo: Perspectiva, 1978. __________Recortes e colagens: influência de John Dewey no ensino da arte no Brasil. São Paulo: Autores Associados. 1982. _________Arte-educação: conflitos/acertos.São Paulo: Max Limonad, 1985 _________ História da Arte-Educação . São Paulo: Max Limonad, 1986. ________ e SALES, H. M. O ensino da arte e sua história. São Paulo: MAC. 1990. ________ A imagem no ensino de arte. São Paulo: Perspectiva, 1992. ________ Parâmetros curriculares em geral e para as artes plásticas em particular. In.: Art &educação em revista. Porto Alegre: Rede Arte na escola/Polo UFRGS, 1995. V1, n.1, p. 7-16. ________ (Org.) Arte-Educação: leitura no subsolo. São Paulo, 1997. _________ (ORG.) Ensino da Arte: memória e história. São Paulo: Perspectiva, 2008. BIASOLI, C. L. A. A Formação do Professor de Arte: do ensaio... à encenação. Campinas: Papirus. 1999. BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico.Rio de Janeiro:,11 edição, Bertrand Brasil , 2007. CUNHA, F. P. da. Cultura digital na E-arte/educação: educação digital crítica.277 p. (Tese de doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008. Lei 10639/2003 14 Lei 11.645/2008 PIMENTEL, L. G. Limites em expansão: licenciatura em artes visuais. Belo Horizonte: C/Arte, 1999. RICHTER, Ivone Mendes. Histórico da FAEB: Uma perspectiva pessoal. In.: BARBOSA, A.M. (Org.) Ensino da Arte: memória e história.São Paulo: Perspectiva, 2008. RESOLUÇÃO CNE/CP1 de 18 de fevereiro de 2002. RESOSLUÇÃO CNE/CP2, DE 19 de fevereiro de 2002. RESOLUÇÃO n. 01 de 16 de janeiro de 2009. ROSA, M. C. Formação do Professor de Artes: diversidade e complexidade pedagógica. Florianópolis, Insular, 2005. _______________ A educação de professoras e professores de arte: construindo uma proposta de ensino multicultural a distância. 187p. Tese (Doutorado). Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2004. OLIVEIRA, D.A. Reformas educacionais na América Latina e os trabalhadores docentes.Belo Horizonte, Autêntica, 2003. SAVIANI, D. A nova lei da educação. Campinas, S.P., 1997.