Nº 94605/2015 – ASJCIV/SAJ/PGR
Suspensão de Segurança 5.021 - BA
Registrado:
Ministro Presidente
Requerente:
Estado da Bahia
Requerido:
Juiz de Direito da 6ª Vara da Fazenda Pública
da Comarca de Salvador
Interessado (a/s): Charles Edgard Silva Freitas e outro (a/s)
SUSPENSÃO
DE
SEGURANÇA.
ADMINISTRATIVO.
CONVOCAÇÃO DE POLICIAIS MILITARES INABILITADOS
EM AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA PARA CURSO DE
FORMAÇÃO DE PILOTOS. APROVAÇÃO DENTRO DO
NÚMERO
DE
VAGAS
PREVISTO
NO
EDITAL.
INCOMPETÊNCIA DO SUPREMO PARA AVALIAR A
LEGALIDADE DA AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA. AUSÊNCIA DE
DEMONSTRAÇÃO DE RISCO DE LESÃO ÀS ORDENS
PÚBLICA, JURÍDICA E ECONÔMICA. PERIGO DE DANO
INVERSO.
1 – Pedido de contracautela ajuizado com vistas a suspender
decisão que determinou a convocação de policiais militares
considerados inaptos na avaliação psicológica, mas classificados dentro do número de vagas previsto no edital do processo seletivo, para a realização de curso de formação de
pilotos.
2 – Refoge do alcance da suspensão de segurança e da
competência do Supremo Tribunal Federal a análise da legalidade ou não da desclassificação dos candidatos na avaliação psicológica, questão de índole infraconstitucional
(Precedente: Suspensão de Segurança 3.644).
3 – Existe direito subjetivo à nomeação dos candidatos
aprovados dentro do número de vagas previsto no edital de
abertura do concurso (Precedentes: Recurso Extraordinário
598.099 e Recurso Extraordinário 607.590).
PGR
Suspensão de Segurança 5.021 - BA
4 – Visou a garantir a ordem classificatória do processo seletivo a decisão que determinou a convocação dos candidatos,
de forma que maiores prejuízos teria o Estado se, após o
trânsito em julgado do writ, confirmada a segurança, tivesse
que restabelecer a ordem classificatória, não havendo, portanto, falar em risco de lesão à ordem econômica, mas sim
em perigo de dano inverso.
5 – Parecer pelo indeferimento do pedido de suspensão.
Trata-se de pedido de suspensão formulado pelo Estado da
Bahia, para afastar os efeitos da decisão do Juiz de Direito da 6ª
Vara da Fazenda Pública da Comarca de Salvador que concedeu a
ordem, no Mandado de Segurança 0328304-64.2014.805.0001,
para determinar a imediata convocação dos impetrantes para participarem do Curso de Capacitação na Área de Aviação Policial da
Polícia Militar do referido Estado.
Segundo o requerente, os policiais militares foram aprovados
no processo seletivo para piloto de helicóptero, mas contraindicados na avaliação psicológica, por isso não foram convocados para o
curso de formação.
Defende que a própria natureza das atividades a serem desempenhadas por um aviador policial militar requer do candidato
habilidades que vão além das exigidas para a atividade policial ordinária.
Diante disso, sustenta que a decisão impugnada afronta a ordem, a segurança e a economia públicas, por: (I) permitir que can-
2
PGR
Suspensão de Segurança 5.021 - BA
didatos não habilitados pilotem aviões e helicópteros, colocando
em risco a segurança de todos os cidadãos e os caros equipamentos
utilizados no curso; (II) impor ao Estado um gasto de R$
2.664.202,00 (dois milhões, seiscentos e sessenta e quatro mil, duzentos e dois reais) – correspondente ao valor total do curso de
formação dos oito candidatos – que, no caso de denegação da ordem após o julgamento dos recurso, dificilmente poderá ser ressarcido pelos interessados e terá de ser novamente despendido para a
realização do curso pelos candidatos, de fato, habilitados.
Após manifestação dos interessados, os autos vieram à Procuradoria-Geral da República para parecer.
Esses, em síntese, são os fatos de interesse.
A matéria discutida no mandamus evidencia a competência
dessa Suprema Corte para examinar o pedido de suspensão, uma
vez que se refere ao regime jurídico constitucional de provimento
de cargos públicos (artigo 37, II e IV, da Constituição).
No presente caso, é essencial para o deslinde da controvérsia a
circunstância de o juízo a quo ter fundamentado a ordem concessiva da segurança com base no reconhecimento de que (I) o teste
psicológico foi realizado “em clara discordância com os parâmetros legais e jurisprudenciais que lhe confeririam validade”; (II) os interessados
foram aprovados dentro do número de vagas previsto no edital.
Em relação ao primeiro fundamento da decisão, verifica-se
que a Suprema Corte já decidiu ser possível a realização do teste
psicológico, desde que adotados critérios objetivos e seja
3
PGR
Suspensão de Segurança 5.021 - BA
expressamente previsto em lei, sendo insuficiente a previsão da
exigência no edital de abertura do concurso. A questão, aliás, foi
sumulada em 2009 e teve repercussão geral reconhecida em 2010,
assentando o Supremo o seguinte:
Súmula 686 - Só por lei se pode sujeitar a exame
psicotécnico a habilitação de candidato a cargo público.
(DJe, 13 out. 2003).
Questão de ordem. Agravo de Instrumento. Conversão
em recurso extraordinário (CPC, art. 544, §§ 3º e 4º).2.
Exame psicotécnico. Previsão em lei em sentido material. Indispensabilidade. Critérios objetivos. Obrigatoriedade. 3. Jurisprudência pacificada na Corte. Repercussão
Geral. Aplicabilidade. 4. Questão de ordem acolhida para
reconhecer a repercussão geral, reafirmar a jurisprudência do Tribunal, negar provimento ao recurso e autorizar
a adoção dos procedimentos relacionados à repercussão
geral. (AI 758.533 QO-RG, Relator o Ministro GILMAR
MENDES, DJe, 13 ago. 2010)1.
De todo modo, a legalidade ou não da exigência da avaliação
psicológica e da inabilitação dos interessados é questão de índole
infraconstitucional, que deve ser analisada nos autos da ação de
origem, refugindo do alcance da suspensão de liminar e da
competência do Supremo Tribunal Federal. Nesse sentido: SS
3.644, Relator o Ministro GILMAR MENDES, DJe, 21 de out. 2008.
Em relação ao segundo fundamento da sentença – fato de os
interessados figurarem entre os quinze primeiros classificados no
concurso –, vale destacar que a jurisprudência pacífica do
1 No mesmo sentido: ARE 851.261 AgR, Relator o Ministro LUIZ FUX, DJe,
4 mar. 2015.
4
PGR
Suspensão de Segurança 5.021 - BA
Supremo Tribunal Federal está no sentido de que existe direito
subjetivo às nomeações de candidatos aprovados dentro do
número de vagas previsto no edital do processo seletivo2.
A teleologia da norma advinda do citado entendimento
jurisprudencial é perfeitamente aplicável ao caso, embora não se
trate aqui de concurso público para o provimento originário de
cargos públicos, mas para a participação em curso de formação,
etapa necessária para o exercício de cargo específico dentro da
carreira policial.
2 O Supremo reconheceu a repercussão geral da questão no RE 837.311,
em que discutido direito subjetivo à nomeação de candidatos aprovados
para as vagas surgidas no prazo de validade do concurso. “EMENTA:
RECURSO
EXTRAORDINÁRIO.
ADMINISTRATIVO.
CONTROVÉRSIA SOBRE O DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO
DE CANDIDATOS APROVADOS FORA DO NÚMERO DE VAGAS
PREVISTAS NO EDITAL DE CONCURSO PÚBLICO NO CASO DE
SURGIMENTO DE NOVAS VAGAS DURANTE O PRAZO DE
VALIDADE DO CERTAME. TEMA 784. REPERCUSSÃO GERAL
RECONHECIDA.” (RE 837.311, Relator o Ministro LUIZ FUX, DJe, 2 dez.
2014).
Depois disso, decidiu em sede de Agravo em Recurso Extraordinário que:
“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
CONCURSO PÚBLICO. APROVADOS FORA DO NÚMERO DE
VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. PRETERIÇÃO NÃO
CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE DIREITO SUBJETIVO À
NOMEAÇÃO. PRORROGAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO. ATO
DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO. PRECEDENTES. O
Supremo Tribunal Federal, após reconhecer a existência de repercussão geral da matéria no RE 598.099-RG, julgado sob a relatoria do Ministro
Gilmar Mendes, entendeu que, em regra, apenas o candidato aprovado
entre as vagas previstas no edital de concurso público tem direito
líquido e certo à nomeação. A jurisprudência desta Corte é pacífica ao
afirmar se tratar de decisão discricionária da Administração a questão relativa à prorrogação ou não de concurso público. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento.” (Grifos acrescidos - RE 607.590 AgR,
Relator o Ministro ROBERTO BARROSO, DJe, 9 abr. 2014).
5
PGR
Suspensão de Segurança 5.021 - BA
Confira-se, então, por oportuno, o que assentou o Supremo
no julgamento do Recurso Extraordinário 598.099:
Dentro do prazo de validade do concurso, a Administração
poderá escolher o momento no qual se realizará a nomeação,
mas não poderá dispor sobre a própria nomeação, a
qual, de acordo com o edital, passa a constituir um
direito do concursando aprovado e, dessa forma, um
dever imposto ao poder público. Uma vez publicado o
edital do concurso com número específico de vagas, o ato da
Administração que declara os candidatos aprovados no
certame cria um dever de nomeação para a própria
Administração e, portanto, um direito à nomeação
titularizado pelo candidato aprovado dentro desse número
de vagas. (Grifos acrescidos - RE 598.099, Relator o
MINISTRO GILMAR MENDES, DJe, 17 dez. 2012).
Evidencia-se,
assim,
que
negar
aplicação
à
norma
constitucional que rege os concursos públicos e desconsiderar o
entendimento jurisprudencial do Supremo sobre o tema é que
tumultuaria a ordem jurídica.
Com efeito, estando o entendimento firmado na decisão
impugnada de acordo com a orientação da Suprema Corte, fica
demonstrado o perigo de dano inverso, ou seja, o risco de lesão à
ordem pública, na acepção de ordem jurídico-constitucional,
advindo de eventual deferimento da contracautela.
Ressalte-se, ademais, que a alegação do Estado de que a
decisão impugnada gerará um gasto indevido de R$ 2.664.202,00
(dois milhões, seiscentos e sessenta e quatro mil, duzentos e dois
reais) não é suficiente para o deferimento do pedido, com base em
suposto risco de lesão à ordem econômica.
6
PGR
Suspensão de Segurança 5.021 - BA
Na verdade, a decisão impugnada, ao determinar a
convocação dos candidatos para o curso de formação, visou a
garantir a ordem classificatória do processo seletivo. Maiores
prejuízos teria o Estado requerente se, depois do trânsito em
julgado do writ, confirmada a segurança, tivesse que restabelecer a
ordem classificatória, inclusive afetando outros candidatos que
eventualmente já tenham concluído o concurso de formação e
estejam nomeados e empossados no cargo de piloto. Nesse sentido:
SS 3.583 AgR. Relator o Ministro GILMAR MENDES, DJe, 28 ago.
2009.
Ante o exposto, opina a Procuradoria-Geral da República
pelo indeferimento do pedido.
Brasília (DF), 26 de maio de 2015.
Rodrigo Janot Monteiro de Barros
Procurador-Geral da República
JCCR/BIAA
7
Download

SS 5.021 - Procuradoria