mão-de-obra especializada eliane cunha CAPA Especiais e RAROS O toque particular de padeiros, açougueiros e peixeiros faz a diferença nas lojas. Mas a situação é preocupante: eles estão sumindo do mercado Açougueiro comunicativo é um bom vendedor POR EVELYN PEDROZO 24 SuperVarejo | Janeiro/fevereiro 2008 paulo pepe/nau J á não se encontra mão-de-obra como antigamente. Os supermercadistas que o digam, pois é uma batalha que se trava diariamente para ter bons profissionais na loja, em especial aquele grupo conhecido como “eiros”. Padeiros, açougueiros, peixeiros, confeiteiros, cozinheiros e cartazeiros com boa formação e experiência são cada dia mais escassos. E há também a preocupação com a contratação dos “ores”, como os repositores, empacotadores, vendedores e operadores de empilhadeira. PROFISSIONAIS MAIS PROCURADOS EM São Paulo Vagas disponíveis em 23/01/2008 O Centro de Apoio ao Trabalho (CAT), órgão ligado à Secretaria Municipal do Trabalho de São Paulo, é um dos locais procurados pelos varejistas para reposição de mão-de-obra especializada para supermercados. O CAT tem seis unidades na cidade. Açougueiro: 9 vagas Ajudante de açougueiro: 5 vagas Ajudante de cozinha: 52 vagas Ajudante de padeiro: 4 vagas Ajudante de pizzaiolo: 2 vagas Auxiliar de confeitaria: 4 vagas Auxiliar de cozinha: 34 vagas Auxiliar de cozinheiro: 2 vagas Auxiliar de nutrição e dietética: 3 vagas Balconista de açougue: 6 vagas Balconista de frios: 7 vagas Balconista de padaria: 5 vagas Cartazeiro: 2 vagas Chefe de cozinha: 6 vagas Confeiteiro: 10 vagas Cozinheiro geral: 29 vagas Encarregado de frios: 1 vaga Nutricionista: 5 vagas Padeiro: 7 vagas Padeiro confeiteiro: 1 vaga Peixeiro: 6 vagas Pizzaiolo: 7 vagas Repositor: 8 vagas Saladeira: 8 vagas Salgadeira: 6 vagas Janeiro/fevereiro 2008 | SuperVarejo 25 CAPA mão-de-obra especializada Uma das explicações para a carência desses trabalhadores especializados no mercado é o interesse geral por carreiras tradicionais, como Direito, Engenharia, Medicina, Odontologia, entre outras, impulsionado pelo maior acesso às universidades. As pessoas estão mais voltadas à tecnologia e a cursos de outras áreas mais modernas. É a busca por maior status. Por isso, ano a ano aumenta a dificuldade para se encontrar profissionais especializados. “Há muita divulgação na mídia para os cursos superiores, enquanto a formação de nível médio fica de lado”, conta o diretor do Centro de Apoio ao Trabalho (CAT), Enoch Romano. Ele acredita que os meios de comunicação deveriam destacar a importância da formação dos “eiros”. “Muitos trabalhadores preferem ser operadores de telemarketing do que botar a mão na massa”, diz. Essa situação quase não se justifica, haja vista que as empresas, devido à necessidade, aceitam pessoas com nível de escolaridade fundamental e pagam remuneração média de R$ 700. No CAT há relação de um candidato por vaga nessas funções. Não há desemprego para os “eiros”. A disputa por eles é enorme, de acordo com Romano. “O que eu enxergo para um futuro próximo é a alta dos salários para esses cargos técnicos e uma pior remuneração perfil de cargos O supermercado deve definir o perfil dos cargos e jamais abrir mão dos requisitos na hora do recrutamento. Seguem alguns exemplos determinados para uma empresa varejista: PADEIRO Escolaridade: ensino médio completo, de preferência Imprescindível: comprometimento, equilíbrio emocional, postura, honestidade e noções básicas de higiene Muito desejável: responsabilidade, facilidade no relacionamento interpessoal e no trabalho em equipe, disciplina, pontualidade, organização, limpeza, disponibilidade, atenção, senso de economia Desejável: conhecimento técnico Atividades principais: dominar a arte da panificação; zelar pela exposição dos produtos à venda; cuidar para que eles não bloqueiem a saída de ar do balcão refrigerado; higienizar e sanitizar constantemente o material e o local de trabalho para as formações superiores devido ao excesso de mão-deobra. Aí, então, voltará o interesse para a função dos ‘eiros’”, observa o diretor do CAT. Para fazer frente a essa situação, a solução mais recomendada por consultores é a implantação de uma cultura de educação de profissionais nos supermercados para se investir na formação. “O primeiro cliente da loja é o funcionário. É preciso ajudá-lo a se desenvolver. Se o trabalhador ama a sua empresa, todo o cenário muda”, afirma Carlos Alberto Reani, da Alberto Reani & Consultores Associados. Reani lembra que o comércio é encarado como trampolim para um emprego melhor. “O ideal é oferecer a oportunidade de uma carreira competitiva no comércio, para que as pessoas entendam que é possível chegar a qualquer posição na empresa.” Um ambicioso projeto de Recursos Humanos pode dar cabo de problemas causados pela falta de funcionários de qualidade. Segundo Reani, deve-se quebrar o paradigma de que o RH tem a função de apenas selecionar e contratar. “A empresa define a estratégia, e esta deve chegar aos funcionários em uma via de mão dupla”, explica. A gestão deve ser feita na empresa como um todo. Para começar, é traçado um bom plano de captação de 26 SuperVarejo | Janeiro/fevereiro 2008 eliane cunha Pessoas investem nas carreiras que dão maior status AÇOUGUEIRO Escolaridade: ensino médio completo, de preferência Experiência anterior: de quatro a seis anos na função Imprescindível: comprometimento, equilíbrio emocional, postura, honestidade e facilidade de comunicação Muito desejável: destreza manual e digital, atenção, concentração, boa memória, higiene pessoal, senso de economia, educação, iniciativa e organização Desejável: simpatia Atividades principais: verificar e zelar pelo bom estado de funcionamento, conservação e manutenção dos equipamentos e utensílios da seção; manter as informações dos produtos por meio das tabelas de preços e cartazes; abastecer balcões de atendimento e de auto-serviço; controlar a temperatura das câmaras frias, congeladores e balcões; realizar a desossa e a preparação de carnes para o balcão de atendimento e de auto-serviço; manter limpos e higienizados todos os equipamentos da seção REPOSITOR eliane cunha Escolaridade: ensino médio completo Imprescindível: comprometimento, equilíbrio emocional, postura, honestidade e facilidade de comunicação Muito desejável: senso de economia, concentração, responsabilidade, disciplina, raciocínio lógico Desejável: conhecimento técnico Atividades principais: verificar a qualidade dos produtos (embalagens, data de validade, limpeza dos produtos e da gôndola); buscar no depósito os produtos necessários para reposição; fazer a reposição pelo sistema PEPS (primeiro que entra primeiro que sai); retirar da área de vendas as embalagens dos produtos EMPACOTADOR Escolaridade: ensino médio completo Imprescindível: comprometimento, equilíbrio emocional, postura, honestidade, facilidade de comunicação Muito desejável: organização, agilidade, cautela, cooperação, economia, higiene pessoal, limpeza Requisitos físicos: faz esforço psicomotor com média freqüência utilizando simultaneamente os olhos, pés, pernas, mãos e atenção mental na execução do trabalho; trabalha em pé e andando, em pé e parado Compleição física: altura mínima de 1,60 metro; peso entre 45 e 65 quilos Atividades principais: embalar a mercadoria, planejando a distribuição de peso entre os pacotes para evitar que sejam danificados ou que possam gerar desconforto aos clientes paulo pepe/nau Escolaridade: 4ª série do ensino fundamental e curso básico de qualificação profissional com 200 horas-aula Imprescindível: seguir normas de segurança, higiene, qualidade e proteção ao meio ambiente Atividades principais: preparar movimentação de carga e movimentá-la; organizar a carga, interpretando a simbologia das embalagens e armazenando de acordo com o prazo de validade do produto; realizar manutenções previstas nas empilhadeiras PEIXEIRO eliane cunha arquivo OPERADOR DE EMPILHADEIRA Escolaridade: ensino fundamental completo Imprescindível: conhecimentos específicos para reconhecimento de cada tipo de peixe e de suas condições Atividades principais: montagem de balcão; arrumação da ilha de congelados; colocação de placas de preço e promoção; recepção e limpeza de peixes; lavagem e higienização do pescado; escamação e cortes; limpeza de camarão; conservação de temperaturas corretas Janeiro/fevereiro 2008 | SuperVarejo 27 CAPA mão-de-obra especializada mão-de-obra. Define-se a política de cargos e salários e são estabelecidos benefícios atrativos. “O diferencial da empresa está no desenvolvimento, que possibilita ao funcionário entrar como menor aprendiz e se tornar gerente. Daí, ele é substituído por um outro aprendiz”, propõe Reani. Coop cria curso para vendedor e se dá bem A Coop – Cooperativa de Consumo, com 25 unidades em São Paulo, acredita e investe na formação dos trabalhadores. E uma das maiores dificuldades é encontrar bons vendedores de eletrodomésticos. Por essa razão, em 2007 a empresa criou uma escola interna para formação de vendedores. De 30 pessoas selecionadas para participar do curso, 23 foram aprovadas e 21 foram promovidas. “Os vendedores mais antigos fecharam o ano com resultados de vendas piores do que os novos. A experiência foi muito boa para a empresa porque não há gente preparada no mercado”, conta a coordenadora de RH, Silvana dos Santos Frois. Para trabalhar na padaria, o funcionário ingressa na empresa como auxiliar e, se tiver potencial, a liderança da seção começa a trabalhar para desenvolver as técnicas, informa Silvana. As características imprescindíveis são habilidade técnica e proatividade. É preciso ser rápido para alcançar a produtividade necessária. Os açougueiros, ou preparadores de carne, são recrutados no mercado por meio de currículos e também são formados internamente. Dentro da área de perecíveis, possuem a melhor remuneração. As características exigidas são habilidade técnica, comunicação, comprometimento e proatividade para conquistar clientes. “Um bom atendimento faz o consumidor levar mais produtos do que pretendia inicialmente”, destaca Silvana. Uma outra função bastante valorizada é a de cartazeiro. A Coop busca os profissionais no mercado. Há pouca oferta de mão-de-obra e os requisitos são habilidade técnica e ensino fundamental completo. No cargo de repositores, a empresa contrata aprendizes de 16 a 18 anos de idade sem experiência, ligados a instituições, para depois efetivá-los. Já os operadores de empilhadeira devem ter segundo grau completo, curso de empilhadeira a gás e carteira de habilitação. A Coop desenvolve o sentimento nos auxiliares de se autopreparar para essa função. sas necessitam, não há mesmo saída mais viável do que praticar o recrutamento interno. “O pessoal interno está mais envolvido com a gestão, e a busca por material humano externo à empresa gera grandes conflitos”, diz o consultor Celso Armelim, da C&A Consultores Associados. Um ponto fundamental para a seleção é a definição do perfil do cargo. É com essa ferramenta que a empresa buscará o trabalhador para preencher a vaga. São classificadas as características imprescindíveis, as muito desejáveis e as desejáveis. Inicia-se a procura dentro da companhia e aplica-se um teste àqueles com potencial. “Isso dá resultado porque as pessoas ficam motivadas a melhorar”, destaca Armelim. Além disso, afirma o consultor, é raro encontrar quem pense diferente da empresa, porque todos evoluem com a mesma cultura. No recrutamento externo existe a vantagem dos conhecimentos diferenciados, mas uma grande dificuldade de adaptação do trabalhador à cultura da empresa. “Claro que é viável fazer esse ajuste, mas é preciso muita persistência e a capacidade de destacar o lado bom da empresa ao novo funcionário”, diz. O que pode pôr tudo a perder é o supermercado abrir mão do perfil do cargo para contratar um empregado por conta de sua notada experiência. “Isso não compensa”, garante Armelim. “É um erro contratar um profissional e ficar à mercê de seu conhecimento, pois quando ele vai embora, leva essa bagagem.” Fica mais fácil a definição do perfil do cargo quando a empresa estabelece um padrão. São regras por meio das quais se torna possível transformar um operador de frente de caixa em padeiro. “É claro que não se pode desprezar o talento, o toque especial do padeiro, o domínio da arte da panificação. Mas, apesar disso, os procedimentos definidos bastam para que se faça o pão”, ensina Armelim. Para Romano, do CAT, a grande saída para o varejo é buscar recrutamento por meio dos próprios colaboradores, que convencem os amigos a trabalhar nas lojas. “Os empregados devem estar felizes com os patrões, senão deixam de ser recrutadores potenciais para ser maus divulgadores”, afirma. “O bom patrão é o que fideliza o funcionário”, diz ele. FonteS desta matéria Alberto Reani: (11) 4526-1515 C&A Consultores Associados: (11) 4021-1940 CAT: (11) 3347-4048 Coop: (11) 4991-9516 Grupo Pão de Açúcar: (11) 3886-0533 Senai: (11) 3826-6766 Tenda: (11) 6489-2900 [email protected] 28 SuperVarejo | Janeiro/fevereiro 2008 eliane cunha PERFIL - Se o mercado não oferece aquilo de que as empre- A Escola Senai Horácio Augusto da Silveira, especializada na formação de profissionais como padeiros, confeiteiros, pizzaiolos, chocolateiros, sorveteiros e salgadeiros, tem sido um porto seguro para as empresas. É a garantia de que o mercado pode contar com bons profissionais, seja por meio do curso técnico em processamento de alimentos, que corresponde a um estágio anterior ao de engenharia de alimentos, ou pelos cursos de curta duração, que objetivam a rápida inserção no mercado de trabalho. “Os profissionais têm alta empregabilidade”, garante o diretor da escola, Humberto Marzinotto Filho. Na escola há várias situações, como a das pessoas que já estão no mercado e querem crescer, ou daqueles que querem se inserir no setor de alimentação. Há ainda os que desejam abrir ou aprimorar seu próprio negócio. O Senai não dá formulação. Não vende receitas. “O nosso negócio não é gastronomia. Ensinamos a pessoa a como proceder”, diz Marzinotto. O profissional precisa ter conhecimento, habilidade e atitude. “Apesar de haver um padrão, é possível dar um toque especial. Sabemos as mesmas coisas, mas as habilidades são particulares”, destaca. N o Grupo Pão de Açúcar os “eiros” são fundamentais, pois fidelizam os clientes às lojas, afirma a gerente de Atratividade e Seleção do Grupo, Eliana Ponzio. Além dos profissionais mais conhecidos, como os padeiros, açougueiros, peixeiros e cozinheiros, a empresa investe na formação dos atendentes de vinho, uma peça-chave para diferenciar o atendimento da rede. O processo de formação no Pão de Açúcar prevê o treinamento do funcionário contratado por cinco dias no Padrão de Eficiência Operacional e Formação Técnica. A empresa também capacita o líder de cada seção por meio do treinamento técnico operacional, responsável por multiplicar o conhecimento para os demais colaboradores da seção. Eliana observa que é bastante difícil encontrar esses trabalhadores no mercado, uma vez que têm uma formação específica e muitas vezes são formados no próprio ambiente de trabalho, o que dificulta a aplicação da padronização dos procedimentos. A empresa exige experiência de três a cinco anos na função, iniciativa e boa comunicação. paulo pepe/nau eliane cunha Uma escola que alimenta as esperanças “Eiros” fidelizam a clientela do Grupo Pão de Açúcar O funcionário é o melhor cliente O arquivo novo gerente de Recursos Humanos do Tenda, Alexandre Zappelloni, está chegando à empresa com um projeto sério de fidelização do funcionário e com a proposta de criar um ambiente de educação e formação do trabalhador. “Vamos nos envolver fortemente com essas parcerias. Os empregados são nosso melhor cliente”, diz ele. A concorrência é o grande obstáculo encontrado pelo Tenda na busca por profissionais para a seção de carnes de suas nove lojas. Como grande parte dos açougues trabalha na informalidade, esses salários podem ser maiores. Nas empresas formais eles têm benefícios, mas no curto prazo a remuneração cai. Daí a dificuldade em contratar. O profissional que faz a desossa é mais raro do que o que faz cortes simples. Um outro empecilho para o Tenda é a alta rotatividade da mão-de-obra. “Há fidelidade apenas nos cargos de médio e alto escalões. São os estáveis, que não têm vínculo apenas financeiro com a empresa”, afirma Zappelloni. O fato de os supermercados fecharem para atendimento apenas três dias no ano também representa um fator negativo para a solidificação da mão-de-obra. “O sistema de folgas incomoda o trabalhador. Aí as pessoas acabam valorizando as condições oferecidas pelas indústrias, que operam apenas cinco dias por semana em horário comercial e debandam”, afirma o gerente de RH. Janeiro/fevereiro 2008 | SuperVarejo 29