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ENTREVISTA
D117 - OAB Barueri
AGOSTO/SETEMBRO
ENTREVISTA
A visão profissional e a experiência de
Dr. Fábio Peccicacco
Quatro décadas de uma carreira calcada na ética e na dedicação e uma opinião sobre o cenário jurídico atual
Marcos Ferreira
[email protected]
E
m seu escritório de
advocacia, localizado
na agitada Alameda
Rio Negro, em Alphaville, o
veterano Dr. Fábio Antonio
Peccicacco recebeu o Destaque 117 para falar de sua
vida profissional, que começou nos anos 60, quando o
Regime Militar tomava conta do Brasil.
Com 41 anos de atuação
na advocacia, o vice-presidente da 117ª Subseção da
Ordem dos Advogados do
Brasil sustenta, em seu tom
de voz incisivo, o poder da
oratória, atributo que construiu ainda criança, com muita leitura e recitais de poesia,
frutos da educação que recebera de sua mãe.
Para o advogado Fábio
Peccicacco, sua carreira se
define em um misto de muita luta acompanhado por um
pouco de sorte ao encontrar
tutores certos que lhe apoiaram nos primeiros anos da
profissão. “Eu trabalhei com
gente muito importante do
ponto de vista jurídico, pessoas que me ajudaram a ter
uma boa formação”, pontua.
Com a experiência adquirida em tantos anos, o advogado revela que, no papel de
padrinho de muitos jovens,
procura transmitir a conduta
ética e profissional. “No começo da carreira, trabalhei
com o advogado criminalista Tales Castelo Branco
e depois com o grande civilista Flavio Oscar Belio.
Graças a eles, eu consegui
ter essa formação ética que
hoje eu procuro transmitir
aos meus colegas”.
O paulistano Dr. Fábio
interpreta a escolha pela profissão como algo natural. Na
infância, recitava poesias e
fazia discursos a pedido de
sua mãe, que era professora
de oratória, o que lhe propiciou uma facilidade de comunicação. “Eu fazia parte
de um grupo de amigos no
colégio, eu e mais três, e todos tinham o desejo de fazer
Direito. Fizemos o vestibular juntos e seguimos um
processo natural”
Ao refletir sobre os tempos em que fez vestibular
para bacharel na Universidade de São Paulo, USP, Dr.
Fábio percebe uma piora no
aspecto de engajamento dos
alunos bem maior que no
lado técnico. “Eu frequentei a faculdade na época
da ditadura. Nós éramos
muito mais engajados na
política se comparado aos
estudantes de hoje. Atualmente, vemos acontecer
barbaridades em todos os
níveis de governo, mas são
raras as iniciativas em prol
de reverter o quadro”.
Para ele, o cenário universitário vivia um engajamento político que não
ocorre nos dias de hoje em
nenhum setor da sociedade. “Na época em que eu
estudava, existiam grupos
a favor do governo e grupos totalmente contra o
governo. Eu tive colegas
que foram presos e perseguidos e também colegas
que perseguiram”.
Fazendo um balanço da
carreira de advogado, Dr.
Peccicacco apontou alguns
pontos negativos enfrentados
na advocacia. Ele destaca
o não reconhecimento por
parte do cliente. “Você passa
um orçamento de honorários
e inviavelmente o cliente o
questiona, sempre embasado
que um outro profissional faria o mesmo serviço por um
valor menor. Isso acaba por
desvalorizar o seu trabalho”.
Outra situação que o incomoda é a situação “precária” do judiciário nacional.
Para ele, a situação do estado de São Paulo é preocupante. “Não há estrutura,
não há recurso, nem pessoal.
Se não fosse o apoio das prefeituras certamente o judiciário já teria parado”.
Ele reflete que, estando
na linha de frente, o advogado é, na maioria das vezes,
responsabilizado pela demora nos casos. “Você começa
um processo hoje e não sabe
quantos anos ele vai levar até
o seu término e nem como
vai terminar. Por mais relevante que seja o seu direito”.
Em contra partida, o advogado deixa claro o seu
reconhecimento aos profissionais que trabalham para
o funcionamento do sistema
judiciário. Ele analisa que a
ausência de recursos, falta
de estrutura e os baixos salários dos profissionais são
responsáveis pela demora
na justiça ao lado de problemas burocráticos impostos
pelo governo.
Especializado em direito imobiliário empresarial e
pós-graduado em direito tributário, na PUC, o advogado
integrou o departamento jurídico de empresas de grande
porte por vários anos. Ele
explica que a especialização
na área tributarista foi um
desejo que o acompanhou
desde o início da carreira,
porém considera que a vida o
levou para o direito imobiliário, fato que não o incomoda,
pois considera que foi uma
transição espontânea.
Em pauta há muitos anos,
o exame nacional da OAB,
que bateu recorde de reprovação de 90,26% em sua última edição - o que significa
que nove em cada dez candidatos não passaram na prova,
também foi comentado pelo
vice-presidente da Ordem.
Para Dr. Fábio, o problema
começa desde a base estudantil, que, em seu entendimento, está em declínio
em termos de qualidade. “A
criança não tem o aprendizado que devia ter”, disse.
Ele critica a progressão
continuada, pois entende que
o aluno tem muitas facilidades em passar o ano letivo
sem o devido conhecimento.
Dr. Peccicacco demonstra
preocupação com o desinteresse das pessoas em ler, escrever e pesquisar, devido às
facilidades da internet.
Em seu entendimento,
algumas universidades não
prestam a devida assistência
ao aluno, que já inicia a vida
acadêmica com um vestibular que não exige do candidato um preparo educacional
condizente para ingressar nos
cursos superiores. “A OAB
está certíssima. Para mim a
prova deveria ser ainda mais
rigorosa. Eles acertaram em
fazer uma prova unificada
em todo o país, pois exige
do candidato uma preparação
uniforme”, disse.
Entre tantos casos que
permeiam a vida profissional
de Fábio Peccicacco, uma
situação ocorrida em 1988 é
considerada por ele como o
mais marcante de sua carreira. Ele explica que advogava
para uma empresa paulista
que possuía uma fazenda
no norte do estado de Mato
Grosso, na região do município de Colíder.
“Um belo dia, durante a
campanha eleitoral da cidade, um candidato prometeu a
doação de terras para os eleitores. Porém essas terras
pertenciam a essa empresa
Leandro Nunes
Dr. Fábio Peccicacco fala sobre sua carreira na área jurídica
de São Paulo. Esse candidato foi eleito e pouco
depois, aproximadamente
200 pessoas invadiram a
fazenda”, conta.
O advogado lembra que
na época ainda não existiam
organizações como o Movimento sem Terra (MST) e
nem outros levantes do gênero. Para tentar a retomada
do território, Dr. Peccicacco lembra que teve de ficar
mais 40 dias acampado com
uma equipe tentando recuperar a fazenda.
“O juiz local estava absolutamente amedrontado,
porque entramos com uma
ação de reintegração de
posse e ele nos falou textualmente que não liberaria a
ação, pois temia por sua integridade física”, disse.
Ele se recorda que o fato
que mais o chocou durante
esse período foi ver os invasores demarcar a terra
e vender os lotes, além de
derrubar árvores centenárias para conseguir dinheiro
para sobreviver.
“O primeiro recurso que
essas pessoas encontraram
foi derrubar a floresta. Era de
doer o coração você ouvir à
noite o som das motoserras
derrubando as árvores. Por
outro lado, essas pessoas tinham sido enganadas por um
político sem escrúpulos. Eu
cheguei a conversar com alguns deles e a versão era uma
só: ‘Nós precisamos sobreviver’”, contou ele.
Para a nova geração de
advogados, Dr. Fábio Peccicacco dá quatro dicas embasadas nos valores construídos
em mais de 40 anos de profissão. “Sempre adote uma postura ética. Seja independente
de magistrados, pessoas no
poder e até mesmo de clientes. Estude muito para se
sobressair e, por último, boa
sorte porque a concorrência
não será fácil”.
Quando questionado sobre uma possível aposentadoria, ele é rápido na resposta. “Não. Irei até onde
for possível. Penso em diminuir o ritmo, pois advogar é uma rotina estressante. Mas parar jamais! ■
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