ESCRÍNIO: A imprensa feminina sul-rio-grandense como produto cultural na construção da história das mulheres Rosa Cristina Hood Gautério (UFSC) 1 Este trabalho apresenta um pouco do resultado, até o momento, das pesquisas de minha tese sobre o periódico Escrínio que compreende uma parte do conjunto da produção intelectual de sua fundadora Andradina América de Andrada e Oliveira. Expressão de grande representatividade no cenário social do seu tempo, a escritora gaúcha é uma voz indissociável da imprensa feminina como referencia da história cultural e literária das mulheres não só no Rio Grande do Sul, mas também no Brasil. Tanto a literatura quanto a história têm dívidas com o jornalismo, porque mais do que emprestar suas páginas para a criação e consequente evolução de alguns gêneros literários no Brasil foi o periodismo um fenômeno de comunicação social2 capaz de revelar a história-social e literária das mulheres e das circunstâncias que envolveram a escrita feminina no contexto do século XIX. Neste, temos um grande número de pesquisadoras que buscam a história contida nas páginas dos periódicos “mudando as tradicionais perspectivas da história da literatura, ao tornar visíveis outros modos de ler e de fazer circular a literatura e a cultura” (BARBOSA, 2007.p, 24), relacionando os jornais às práticas culturais como forma de orientação de suas pesquisas, o que é a proposta deste trabalho em particular. Para o propósito deste trabalho, uniformizar o termo “imprensa feminina” significa dar expressão aos periódicos editados por mulheres, conforme conceito da pesquisadora June E. Hahner, uma vez que na história da imprensa constam vários jornais dedicados ao sexo feminino, mas fundados e dirigidos por homens, como O Espelho Diamantino publicado no Rio de Janeiro em 1827 e O Espelho das Brasileiras em Recife no ano de 1831 que estão entre alguns exemplos. 1 Doutoranda do curso de pós-graduação em Teoria Literária, aliada a linha de pesquisa “Literatura e Mulher”, da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC. 2 Na virada do século a modernidade acena para transformação operada no jornalismo que passa pela transição da pequena para a grande imprensa; expressão que anuncia a passagem de uma imprensa de estrutura simples de empreendimento pessoal para uma empresa capitalista que reflete no plano de produção e circulação dos jornais. (BULHOES, 2007) 516 O século XIX no Brasil foi um período especial para a história da imprensa 3 de modo geral e para a história das mulheres de modo particular; particular porque a conquista do espaço sócio-político passou antes pelos periódicos que contribuíram para a formação de uma consciência que mudou ou mudaria a condição social das mulheres. Nesse sentido, podemos dizer que o primeiro periódico feminino, o Jornal das Senhoras publicado pela argentina Joana Paula Manso de Noronha na cidade do Rio de Janeiro em 1852, foi indispensável na constituição desse processo. Com ideias novas para os padrões morais e sociais da época, a redatora reivindicava uma nova posição para as mulheres na sociedade afirmando que enquanto o homem considerasse a mulher como sua propriedade, ela não teria espaço e valorização social. Recuperar a história das mulheres sul-rio-grandenses a partir da imprensa feminina é um desafio que conta com um recorte temporal entre séculos (final do século XIX e meados do século XX), período que, em princípio, duraram as edições do Escrínio que foi lançado inicialmente na cidade gaúcha de Bagé4. O periódico “HEBDOMADARIO LITERARIO, ILUSTRACTIVO E NOTICIOSO” surge em 2 de janeiro de 1898, tendo como “proprietária e redactora...Andradina de Oliveira” e seguindo informação no título: “Hebdomadário literário”- tratava-se de um periódico semanal. Nesse primeiro número, constituído de quatro laudas, encontramos um texto de apresentação da redatora numa forma de proporcionar aos leitores informações sobre as atividades literárias e motivos pelos quais ela merece prestígio social. Fato compreensível se lembrarmos das dificuldades de uma mulher penetrar nos espaços estritamente masculinos: das letras e do público. Mas, “e quem é D. Andradina de Oliveira?” É a questão da página 2: D. Andradina, a imitação de suas talentosas collegas Riograndenses, DD. Revocata e Julieta de Mello, é uma das mais fatigáveis propagadora das lettras da pátria brazileira, como attestam as sua s innumera s produções, já publicadas e a p p l a u d i d a s p e l a i mp r e n sa h o n e st a d e st e e st a d o . 3 Tratamos aqui das várias fases perpassadas pela história da imprensa desde seu surgimento nas modestas instalações no início daquele século, lembrando, inclusive, antes da chegada oficial da Imprensa Régia em 1808, até a implantação das várias oficinas de impressão que se espalharam pelo Brasil (Bahia, Recife Pará, Minas Gerais, Pernambuco, Fortaleza, Rio Grande do Sul, entre outros) a partir do ano de 1821. Ainda, ao final do século, a circulação e a multiplicação de pequenos jornais, geralmente de cunhos políticos, com o advento de dois grandes acontecimentos: a instauração da República e o fim do sistema escravagista no país. O estudo completo da história da Imprensa no Brasil ver: SODRÉ, Nelson Werneck. História da imprensa no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966; e ainda: HALLEWELL, Laurence. O livro no Brasil: sua história. São Paulo: EDUSP, 1985. 4 Há uma hipótese de que esse lançamento tenha sido simultâneo com a cidade do Rio Grande. Informação ainda a ser esclarecida ao decorrer das minhas pesquisas. 517 Avançando além dos estereótipos de rainha- do- lar onde atribuíam o principal papel para a mulher naquele tempo, Andradina de Oliveira (1864-1935) começa a escrever um dos capítulos que lhe coube na história das mulheres. Significantemente, a tarefa de (re) contar a trajetória das ações feministas e suas manifestações no Rio Grande do Sul, cabe ao Escrínio como riquíssima fonte de investigação. Inicialmente, o periódico ocupa-se com a tarefa de ser um colaborador nas atividades das letras como um “cofre amoroso das jóias literárias”. Considerando as dificuldades enfrentadas pelas mulheres nessa atividade, lê-se no edital de lançamento: ESCRINIO O paladino que, hoje surge, na arena escabrosa do jornalismo, é o produto de uma vontade feminil que, jamais, se entibiou no meio das terríveis luctas pela vida; (...) O Escrínio, o modesto Escrínio, será o echo de todos os bons sentimentos, de todas as legitimas essas doutrinas, de todas as nobres tentativas, de todos os levantados commettimentos, de todas as sublimes aspirações; será finalmente, o cofre amoroso das jóias literárias (grifos do jornal) Num outro momento do edital a redatora legitima um espaço onde possibilita dar voz à mulher urbana e educada que começava a interagir com a sociedade e o mundo a sua volta. Demonstrando uma preocupação com a situação social das mulheres no sul do Brasil, escreve: Fundado por uma filha desta encantadora terra, por fervorosa defensora do seu sexo, o Escrínio surge, também como um incitamento á mulher rio-grandense, convidando-a a romper o denso casulo da obscuridade, e vir á tona do jornalismo trazer as perolas da sua cultivada intelligencia !(...) No seguimento do texto, ela reafirma o compromisso argumentando que o periódico instrumentalizará a mulher para melhor exercer sua função na família. Entretanto, o Escrínio está há mais de trinta anos da publicação do Jornal das Senhoras e a situação mudara um pouco na virada do século. Andradina entende que a educação não só prepara a mulher para a missão de “sagrada esposa e mãe”, mas também é um instrumento que lhe permite dar maior independência às mulheres; independência que a intelectual bem 518 conheceu quando se dedicou ao magistério, à edição de livros e conferências pelo Brasil depois da morte do marido e dois filhos para dar sustento. Verificamos: O Escrínio aparece como um verdadeiro propagandista da instrução, do cultivo do espírito feminil. A mulher deve ser instruída, deve ser educada para melhor cumprir a sua missão na Terra- ser mãe. Embora ainda sob a luz positivista que reiterava a doutrina utilitária dando às mulheres valores segundo interesses sociais e que de certa forma foi durante muito tempo um círculo vicioso resultando num longo período de estagnação do pensamento feminino, o Escrínio apareceria também como um periódico “Propagandista da instrução” entendendo que a mulher instruída seria um importante auxilio ao marido nas “lutas pela vida, trabalhar, seja em que for, a seu lado, sem descuidar dos deveres domésticos”. Ao defender a instrução não só como uma ferramenta para melhor educar os filhos, a jornalista ratificar que o trabalho feminino fora do lar não iria afetar a organização familiar, o que não era uma opinião dominante nos discursos, principalmente masculinos. A noção de progresso vinha afinada com as mudanças culturais que se estabeleciam nas esferas brasileiras. Paralelamente, o periódico noticiava as conquistas femininas pelo Brasil e pelo mundo no que diz respeito à carreira profissional e acadêmica, incentivando as mulheres para o desempenho de funções públicas. Em edição do dia 16 de outubro de 1909, lemos: Sahirão este anno da faculdade de Agronomia de Buenos Ayres, diplomadas com o titulo de engenheiros agrônomos, as senhoritas Célia Silva Lynch e Amália Vicentini. Commentando a noticia diz La Verdad, importante revista portenã: “assim se inicia um novo rumo para as actividades femininas na mais nobre das carreiras, a que nos ensina a fazer produzir a mãe terra. Amanhã o espírito intuitivo da mulher fará da terra uma paraizo” (p. 59) Vae solicitar da Assembléia dos Representantes, uma subvenção para completar, na Europa, os seus estudos, de pintura, a senhorita Ana Rorecke, possuidora de um precioso talento artístico. A delicada pintora expõe, num dos salões da Assembléia, várias das suas telas, executadas em Porto Alegre, onde tem realizado, até esta data, os seus estudos. (p. 68) Da mesma forma em publicação do sai 5 de fevereiro de 1910, o periódico registra em suas páginas a “festejadíssima” intelectual francesa: 519 A grande oradora francesa Séverine é incontestavelmente uma das mais notáveis escriptoras contemporâneas. Romancista e conteuse de alto valor, jornalista vigorosa, Ella é a mais apreciada e empolgante oradora francesa, e o Brazil, este anno, conforme noticias vindas de Paris, terá occasião de ouvi-la pois tenciona Ella trazer uma tournée de conferencias atravez do nosso paiz. (p. 63). Na mesma edição na coluna “Letras e Artes”, encontramos a nota sobre: Sarah Bernhardt A grande Sarah acaba de ser contratada por um teatro londrino para representar uma scena todas as noites, (...). A empreza do Colyseum espera auferir lucros extraordinários (p. 68) Ideias defendidas, idéias aceitas! Parece que essa premissa foi uma estratégia constante de propaganda no periódico. O direito à educação e o direito à instrução que reivindicava para as mulheres, garantia a atualização de valores diferentes daqueles que eram impostos pela sociedade patriarcal e ao mesmo tempo, o periódico permitia um diálogo indispensável para a organização efetiva de algumas mulheres. Acreditando que o progresso poderia partir dos exemplos, o Escrínio contemplou durante algumas edições uma seleção de personalidades femininas. Na seção “Galeria Rio-grandense” que estampava uma foto acompanhada de um longo artigo, relatava as conquistas de cada uma das intelectuais que eram expoentes na sociedade. Entre as homenageadas está a gaúcha Luciana de Abreu (1847-1880) que foi um ícone na luta pelo reconhecimento da capacidade intelectual entre homens e mulheres. A república como sinônimo de democracia e a democracia como sinônimo de igualdade foram pensamentos que reproduziram um campo fértil para definir mais uma bandeira levantada pelo Escrinio: a participação política da mulher. Ao proporcionar uma reflexão das condições sociais e políticas das mulheres, o periódico representava-se como um produto social, uma vez que permitia uma reflexão coletiva sobre a identidade de um determinado grupo, transformando-se numa condição favorável à formação de discursos. De alguma forma o periódico ocupou seu espaço servindo de instrumento de informação para as gaúchas permitindo a interação com mulheres de outras partes do Brasil, como intercâmbio de conhecimento em redes colaborativas para uma materialidade do pensamento numa escala maior. É o que verificamos em notas da edição de 12 de fevereiro de 1910, na coluna “Registros”: A mulher e a política 520 Um numeroso grupo de senhoras fluminenses, constituído em comitê, lançou manifesto declarando que a mulher deve interessar-se pela política da pátria. E como consequência, as organizadoras que já incorporaram crescido número de consórcios, iniciaram activamente e com enthusiasmo a propaganda da candidatura do dr. Ruy Barboza à presidência da república. (p. 84) Desta bandeira para a bandeira da igualdade civil entre homens e mulheres deu-se um curto passo. A instituição do casamento deveria também, acompanhar as mudanças pelas quais seguia a sociedade republicana. Publicado originalmente nas páginas dos folhetins do Escrínio, o romance O Perdão, escrito pela redatora do jornal, conta com uma narrativa metafórica da evolução dos tempos quando perpassa pelas contradições contidas na sociedade patriarcal, contida numa voz narrativa que “não impõe verdades sociológicas ou psicológicas. Antes propõe um jogo, distribuindo cartas abertas sobre a mesa (...)” (MAIA, 2010, p.33). No início do século XX, o Escrínio transferiu-se para a capital gaúcha, Porto Alegre, onde foi relançado em 12 de junho de 1901, como um “Jornal dedicado à mulher Rio Grandense”. Seguindo os mesmos caminhos do periódico Corymbo, editado na cidade do Rio Grande desde 1884, pelas irmãs Julieta de Mello Monteiro e Revocata Heloisa de Mello companheiras de letras de Andradina, o Escrínio não ficou só numa produção local, ao contrário, publicava com uma colaboração mútua entre as literatas de todo o Brasil e fora dele. É o que verificamos nessa edição que conta com mais de quarenta nomes de escritoras dos estados de Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Goiás, Bahia, Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Norte, Maranhão e colaboradora do Chile. Entre os colaboradores homens havia Caldas Júnior (o proprietário do Correio de Povo) e o poeta Zeferino Brasil, entre alguns nomes masculinos. Na edição de 12 de junho de 1901, Andradina agradecia o intercâmbio que reforçava o vínculo entre as intelectuais do Sul e outras regiões do Brasil na divulgação da produção literária, além de constituir-se como uma forma de articulação entre os grupos que se identificavam ideologicamente. Escreve: Fora do nosso adorado Rio Grande do Sul, encontrou elle também lisonjeiro acolhimento. A sua permuta, com grande número de importante jornaes de todos os Estados da collosal República Brazileira, attesta que a folha consagrada às grandes conqustou sympathia dos seus colegas. (grifos do jornal) (p. 2) 521 A missão do periódico contava com uma atuação no âmbito literário e das artes em geral. Numa “espécie de rede feminina” (SOARES, 1980, p.145), o periódico compreendia um tipo de apoio recíproco entre as várias escritoras e funcionava como um instrumento de organização e divulgação das ações culturais. São exemplos as notas de divulgação da abertura da “Escola profissional para o Sexo Feminino” em Rio Pardo; da “Associação artística-literária” de Itabira (M.Gerais); de um espetáculo na “Sociedade dramática LuzoBrazileira” e do “movimento litterário” pelo estado, entre outras pequenas notas. Em 26 de fevereiro de 1910 podemos identificar o espaço que o periódico propiciou no intercâmbio entre escritoras de outras regiões demonstrando a existência de uma organização paralela na busca da valorização e legitimação da mulher nas letras. Destacamos no Escrínio o momento em questão na página 79: Cartas do Rio Inicio hoje, para o “Escrínio”, as “Cartas do Rio”, como fazia outrora para a “Mensageira”, de São Paulo, a bella e scintillante revista de minha incomparável amiga Prisciliana Duarte de Almeida, um dois maiores talentos femininos da literatura contemporânea. Tenho saudades daquelle tempo e daquella revista que teve mais mérito do que sorte. Num outro momento, em edição de 16 de abril de 1910, o Escrínio aborda temas sociais como os problemas na área da saúde por falta de políticas públicas e a inspeção sanitária escolar na cidade do Rio de janeiro com medidas de segurança contra a grave tuberculose. Direitos sociais, educação, instrução e reflexão sobre a representação da mulher na sociedade não bastavam às edições. O Escrínio, “revista illustrada, literária, artística, scientífica, educativa e noticiosa”, em caráter de empreendimento, também introduziu as “belas artes” como expressão intelectual feminina no contexto literário quase que exclusivamente masculino. Do campo das artes ocupava-se em fazer um chamamento às artistas-leitoras na forma de incentivar o ingresso de desconhecidas (os) no mundo das letras, como vemos na edição de 5 de fevereiro de 1910: Acompanhando as revistas e “magazines” modernas, o Escrínio vae iniciar uma série de concursos em que possam tomar parte todos os leitores. Versarão sobre assuntos os mais variados; haverá concursos literários, musicaes, photographicos, de desenho, etc.(...) (p. 64) 522 Nesse caráter de empreendimento, as páginas do periódico contavam com textos enviados para a redação evidenciando sua atuação prestigiosa na sociedade. Eram contos, artigos, poesias, crônicas e conferências que contavam em colunas próprias como na “Secção poética”, “Contos”, “Letras e artes”. No encontro dessa articulação o periódico constantemente divulgava as produções literárias, principalmente femininas anunciando lançamento de livros, como é o exemplo do livro de Julieta de Mello e Ibrantina Cardona, um romance de uma escritora francesa chamada Cecilia Cassot e dos autores masculinos Coelho Netto e Lindolpho Collor, entre outros. Firmando um compromisso com a literatura, a redatora agradece aos “distinctissimos escriptores brazileiros de reputação formada, entre elles illustres e talentosos prosadores e poetas rio-grandenses, tem expontaneamente lhe trazido o seu bello contingente litterário”. (Escrínio, 12 de junho de 1901, p. 2). Mas não só de escritores ilustres construíam-se as páginas do jornal: “Muitos juvenis talentosos da esperançosa mocidade gaúcha que enche ardorosa e promettedora (...)- hão espargidos pelas modestas colunas do Escrínio” (idem. p. 2). Numa ligação direta com o feminismo e demonstrando um discurso socialmente situado com as reivindicações do seu tempo, o periódico apresentou um retrospecto da história das mulheres sob o título: “A mulher através dos tempos” em edições sucessivas. Tais edições divulgavam o que, na verdade, tinha sido uma conferência realizada em 30 de junho de 1906, por Andradina no teatro São Pedro na cidade de Porto Alegre. Em edição de 25 de junho de 1910, encontramos a história da mulher na “Epocha Moderna”; vejamos: Libertae a mulher brazileira desses preconceitos e prejuízos que lhe pesam esmagadoramente sobre o cérebro enfraquecido por séculos de escravatura e humilhações!Dae-lhe a consciência dos seus deveres; dae-lhe o conhecimento dos seus direitos; dae-lhe a pose de si mesma! Libertae-a! Educae-a as filhas como educaes os filhos, preparando-as para a vida, tornando-as aptas a cooperara no preparo do porvir! Instrui a mulher para quando chegarem os tempos que estão próximos!” (p. 297-299) O periódico garantiu, “no meio das terríveis luctas da vida”, um espaço na história das mulheres Rio-grandenses emprestando suas páginas na atuação entre o eixo da educação e da cultura “conquistando applauso e o apreço do seu povo sempre gentil e cavalheiresco”. Recebendo o reconhecimento significativo nos estudos feministas, como os que focalizam pesquisas sobre a história da mulher brasileira na luta pelos seus direitos 523 realizada pela professora de História da Universidade do Estado de Nova York, June E. Hahner aponta Andradina como uma das mulheres mais atuantes na história de “Emancipação do sexo feminino” (2003) 5; prestando-lhe referencia ao trabalho, cita: “Emília Moscovo (...) e Andradina América Andrada de Oliveira, uma editora de jornal no Rio Grande do Sul, defenderam publicamente a legislação do divórcio e apoiaram suas ideias em nome da família e da moralidade”(p. 253) Jornalismo, literatura e história. Três áreas conectadas com o processo de formação de imagens e de representação das mulheres no Rio Grande do Sul, no Brasil e no Mundo. Misturando linguagens comuns na produção de textos direcionados ao entretenimento, o Escrínio responde a uma espécie de fusão entre um veículo de divulgação literária e a trajetória das histórias e das ideias de um tempo. A época era de mudanças e ao período do entreséculos, estava ligada a ordem de igualdade e da liberdade. O grande desafio era adequar ao discurso um código de mudança do comportamento social. Baseado na dicotomia “público” e “privado” a história das mulheres foi em grande parte um produto germinado nas páginas de um periódico Sul-rio-grandense chamado Escrínio. BIBLIOGRAFIA BARBOSA, Socorro de Fátima Pacífico. Jornal e literatura: a imprensa brasileira no século XIC. Porto Alegre: Nova Prova, 2007. BULHÕES, Marcelo. Jornalismo e literatura em convergência. São Paulo: Ática, 2007. HAHNER, June Edith. Emancipaçãao do sexo feminino: a luta pelos direitos da mulher no Brasil, 1850-1940. Tradução de Elaine Lisboa. Florianópolis: Ed, Mulheres; Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2003. MAIA. Henriques Lucia. O Perdão, de Andradina de Oliveira: romance urbano na Belle Époque Rio-grandense. 91 p. Dissertação. Instituto de letras. Universidade Federal do Rio Grande do sul. Porto alegre, 2010. 5 HARNER, June Edith. Emancipação do sexo feminino: a luta pelos direitos da mulher no Brasil, 18501940. Tradução de Elaine Lisboa. Florianópolis: Ed. Mulheres; Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2003. 524 MEYER, Marlyse. Folhetins: uma história. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. HALLEWELL, Laurence. O livro no Brasil: sua história. São Paulo: EDUSP, 1985, p 25313. LIMA SOBRINHO, Barbosa. Os precursores do conto no Brasil. São Paulo: Civilização brasileira, 1960. SOARES. Pedro Maia. Feminismo no Rio Grande do Sul: primeiros apontamentos (18351945). In BRUSCHINI, Maria Cristina A; ROSEMBERG, Fúlvia (orgs). Vivência: História, sexualidade e imagens femininas. São Paulo: Brasiliense, 1980, p.122-149. SODRÉ, Nelson Werneck. História da imprensa no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966. 525