EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: EXPECTATIVAS E DIFICULDADES
Ioneide Sales Soglia 1
Cleide Selma Pereira dos Santos 2
RESUMO: Neste trabalho apresentamos dados coletados em entrevistas e observação realizadas
numa sala de aula de Jovens e Adultos, analisando as necessidades educacionais destes alunos e as
dificuldades encontradas por eles no processo de aprendizagem, bem como a motivação que os levou a
retornarem à sala de aula e as expectativas destes em relação ao curso, pontuando os avanços e
retrocessos ocorridos nessa modalidade de ensino. A partir da observação e das entrevistas realizadas
constatamos que, não obstante a Educação de Jovens e Adultos ter obtido avanços ao longo de sua
história e apesar das garantias instituídas por lei, o seu cumprimento não ocorre efetivamente, pois, as
instituições não têm oferecido um ambiente propício para a aprendizagem e permanência desses
alunos, os recursos didáticos utilizados na aula são escassos, não há materiais específicos para esse
público e os conteúdos trabalhados não são contextualizados com a realidade dos alunos. Com isso, as
dificuldades encontradas são muitas e acabam por provocar um alto índice de evasão, e o
desenvolvimento desses sujeitos ficam aquém das suas expectativas e da proposta da EJA.
Palavras-chave: Dificuldades. Educação de Jovens e Adultos. Expectativas.
Introdução
Ao refletirmos sobre a Educação de Jovens e Adultos (EJA), podemos perceber que no
decorrer de sua história houve alguns progressos no que se refere à legislação que rege esta
modalidade de educação, especialmente nas últimas duas décadas com a promulgação da
Constituição Federal de 1988 e a LDB 9394/96. Contudo, apesar dos amparos legais, que
determinam as características e objetivos desta modalidade de ensino, sabemos que a mesma
ainda não garante uma educação de qualidade para os sujeitos que buscam na EJA uma
oportunidade de ascensão social – melhores empregos e salários –, ou mesmo uma satisfação
pessoal em elevar o nível de conhecimento.
1
Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB, Professora do Ensino
Fundamental I na Escola Municipal Dom Jairo. Jequié-BA. E-mail: [email protected]. Lattes:
http://lattes.cnpq.br/9622588173749319
2
Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB. Assistente de alunos
IFBA. Jequié-BA. E-mail: [email protected]. Lattes: http://lattes.cnpq.br/2628188379664604
Buscando compreender melhor a realidade do funcionamento desta modalidade de
ensino, escolhemos uma escola para realizar um estudo de caso, porque “quando queremos
estudar algo singular, que tenha um valor em si mesmo, devemos escolher o estudo de caso”
(LÜDKE e ANDRÉ, 1986, p.17). A escola escolhida para realização da pesquisa é uma
instituição pública localizada no município de Jequié, que atende alunos desta modalidade da
5ª a 8ª séries do nível fundamental no turno noturno. A turma na qual se realizou a pesquisa
possui 44 alunos matriculados, sendo que apenas 27 continuam freqüentando as aulas. Porém,
na ocasião da entrevista apenas 8 alunos estavam presentes. No que se refere à formação
docente, de acordo com o relato da professora, esta tem formação em Magistério e fez
especialização para trabalhar com Educação de Jovens e Adultos.
O trabalho teve como objetivo, coletar informações acerca das expectativas e
dificuldades dos alunos da modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA) desta escola,
bem como, descobrir a motivação que os levou a retornarem à escola, os avanços alcançados
por essa modalidade de ensino e as dificuldades encontradas para a efetivação do acesso e
permanência destes alunos na escola.
A metodologia utilizada para a produção deste trabalho foi a pesquisa qualitativa,
sendo que a coleta de dados foi feita por meio de observação das aulas ministradas e do
espaço físico da escola – especialmente as salas reservadas à EJA – , entrevistas com a
professora, em que foram pesquisados os conteúdos trabalhados em classe, a metodologia
aplicada no curso, o material didático utilizado, a formação do professor que atua nessa
modalidade de ensino, a assiduidade dos alunos e a questão da evasão, e com o público alvo
(os alunos da EJA), foi aplicado um questionário para analisar as expectativas e dificuldades
encontradas pelos alunos e também a motivação que os levou a retornarem à escola.
Como já foi dito anteriormente a Educação de Jovens e Adultos obteve alguns avanços
em termos legais, pois, tornou-se um direito garantido na Constituição Federal de 1988, onde
foram estabelecidas algumas diretrizes para esta modalidade de ensino, assim enunciadas:
[...] garantia de educação básica, para os jovens e adultos das camadas
populares; inserção orgânica da educação de jovens e adultos no sistema de
ensino do país; a locação de dotação orçamentária para o desenvolvimento
dos serviços educacionais para jovens e adultos no conjunto do sistema
nacional de ensino; construção da identidade própria da educação de jovens
e adultos; garantia de habilitação e profissionalização dos educadores de
jovens e adultos; exercício da gestão democrática na educação de jovens e
adultos (Fundação Educar, 1988, p.18-19).
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB 9394/96) também contribui para a
implementação da Educação de Jovens e Adultos definindo-a como “a educação destinada
àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na
idade própria” e também ao afirmá-la como uma modalidade de ensino, conforme está
estabelecido no Art. 4º, inciso VII:
O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a
garantia de [...] oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com
características e modalidades adequadas às suas necessidades e
disponibilidades, garantindo-se aos que forem trabalhadores as condições de
acesso e permanência na escola (LDB 9394/96).
Com isso, podemos compreender que a educação de jovens e adultos estabelecida
como uma modalidade de ensino lhe confere uma identidade própria, em que toda a sua ação
deve ser elaborada e posta em prática pensando nas necessidades dos sujeitos a que essa
educação se destina, conforme o artigo 37, inciso II, que estabelece que os sistemas de ensino
devam assegurar “gratuitamente aos jovens e adultos, que não puderam efetuar os estudos na
idade regular, oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do
alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho”. Nesse sentido, a EJA não é
considerada apenas um nível de ensino, mas uma categoria específica que abrange diversos
níveis, como explica Mamed:
[...] a existência de uma modalidade pressupõe a existência de uma
organização maior à qual pertença, pois modalidade significa modo
particular de ser, uma subcategoria dentro de uma categoria. Entender a EJA
como uma modalidade, ou uma subcategoria, do ensino fundamental ou
médio é assumir que ela faz parte de um ou outro nível e abordá-la como
possuidora de todas as qualidades e benefícios que caracterizam estes níveis,
mas que não ferem suas especificidades garantidas em Lei [...] (MAMED,
2004, p.161).
A LDB ainda garante, no artigo 37, que “o Poder Público viabilizará e estimulará o
acesso e a permanência do trabalhador na escola, mediante ações integradas e
complementares entre si”. No entanto, verificamos que, nesse aspecto, o poder público tem
garantido apenas o acesso desses sujeitos à escola, mas não a sua permanência, uma vez que o
índice de evasão tem sido muito alto (cerca de 39% na escola pesquisada), sendo que, dos
61% que continuam freqüentando não há assiduidade, ou seja, uma freqüência contínua.
Segundo o diretor da escola, todos os anos mais da metade dos matriculados evadem,
principalmente após o período de recesso junino, e a escola não tem nenhuma estratégia que
busque sanar esse problema. A causa desta evasão se encontra muitas vezes no fato de a
escola não atender às expectativas do público de EJA, como assevera Naif (2005, p. 402):
[...] a escola muitas vezes encontra dificuldades para compreender as
particularidades desse público, no qual os motivos que os levam à evasão,
ainda no início da juventude, e as motivações que envolvem sua volta à sala
de aula são informações preciosas para quem lida com a questão. Deixá-los
escapar leva à inadequação do serviço oferecido e a um processo de exclusão
que, infelizmente, não será o primeiro na vida de muitos desses alunos.
De fato esses aspectos parecem não ser levados em consideração, pois, verificamos
por meio das observações realizadas, que a instituição não tem oferecido um ambiente
propício para a permanência dos alunos nesta escola no que diz respeito à infra-estrutura e
metodologia pedagógica. O perfil dos alunos entrevistados é de pessoas jovens, entre 22 e 35
anos, sendo que todos já passaram pela escola e retornaram motivados pela família ou pela
necessidade de se qualificarem para o mercado de trabalho. No entanto, as aulas são
ministradas de forma mecânica e repetitiva, o que pode estar contribuindo para desestimular
estes alunos e para a não permanência destes na escola. Além disso, o espaço físico e os
materiais (melhor dizendo, a falta deles) também são fatores relevantes para justificar a
grande evasão desses sujeitos.
Um dos aspectos observados que chamou especial atenção foi a localização e a
estrutura da sala destinada à turma de EJA. A sala visitada fica localizada em um porão no
fundo da escola, com iluminação insuficiente, onde há uma coluna de sustentação no centro
da sala, o que impossibilita a organização do grupo em círculo para uma melhor socialização
dos saberes, dificultando também a visão do quadro negro e da professora.
Além dessas problemáticas, a localização da sala no subsolo faz com que esta sofra
interferência com o barulho da sala situada no pavimento acima. Daí vê-se a necessidade de
investimento no espaço físico da escola para que proporcione um ambiente agradável e
propicio para a permanência desses sujeitos e também uma aprendizagem mais significativa,
que atraia a atenção do aluno e os instigue para a busca do conhecimento. Corroborando com
este pensamento, Morales (2000, p.56) afirma que “um ambiente de segurança, de paz, de
confiança é necessário para aprender e internalizar o que vai aprendendo”
Os recursos didáticos utilizados na maioria das aulas são apenas quadro negro e giz,
não se faz uso de recursos tecnológico, apesar de a escola possuir alguns. O retroprojetor, por
exemplo, fica na sala e não pode ser utilizado por falta de instalação elétrica adequada,
necessitando utilizar outra sala quando se quer fazer o uso deste recurso.
O horário estabelecido para a aula é das 19h00min às 22h00min, mas, de acordo com a
professora, os alunos só assistem aula até às 21 horas, pois os mesmos acabam saindo antes
do término da aula alegando estarem cansados. Nesse contexto, consideramos ser necessário
oferecer-lhes uma aula dinâmica, contextualizada e significativa, de forma que contribua para
a motivação dos alunos no que se refere a sua permanência e sucesso na vida escolar.
Vale ressaltar, contudo, que nosso objetivo com este trabalho não é culpabilizar os
educadores pelo fracasso da aprendizagem e não permanência desses alunos na escola, mas
sim, revelar as dificuldades ainda existentes no que se refere à Educação de Jovens e Adultos
e que acabam interferindo na motivação dos alunos e consequentemente os levando a
desistirem diante das muitas dificuldades encontradas. Com isso, compreendemos que é
colocado um grande desafio para os professores de EJA, pois precisam inovar suas aulas
tornando-as atrativas e motivadoras para que ajude o aluno a vencer essa dificuldade e isso
não é tarefa fácil devido às dificuldades de espaço e recursos pedagógicos como já foi
exposto.
Apesar dos desafios encontrados, é imprescindível que o educador assuma uma
postura radical frente à educação burguesa que se efetua no sistema de ensino, a qual promove
a reprodução das desigualdades sociais, utilizando como estratégia o sucateamento da
educação, em especial da modalidade EJA, que consequentemente repercute na motivação dos
educandos fazendo com que estes desistam do seu direito a uma educação de qualidade. Dessa
forma, é também incumbência dos educadores buscarem inculcar nos educandos a
importância da educação para a sua formação pessoal, social e política.
Segundo Canário (2006) desde 1960 tem se generalizado um sentimento de
insatisfação em toda a sociedade com relação à educação, pois as reformas educacionais
ocorridas nas últimas quatro décadas não conseguiram traduzir-se em uma resposta pertinente
aos problemas educacionais. A educação tem vivenciado uma crise, onde no epicentro desta
se encontram os professores que veem abalados a sua identidade profissional, a
desvalorização docente e a sua responsabilidade tem crescido intensamente.
Neste contexto, é imposto à educação o desafio de propor novas concepções e práticas
pedagógicas que valorizem uma função crítica e emancipatória. No entanto, para que isso
aconteça faz-se necessário uma ruptura com a concepção bancária de educação, que por sua
vez implica uma superação da forma escolar e do modo como esta concebe os processos de
aprender e ensinar.
Voltando a atenção especificamente para a educação oferecida aos jovens e adultos,
percebemos que além de não haver uma preocupação com uma educação que forme um
sujeito crítico, verificamos ainda que a educação oferecida a esses sujeitos está referenciada
no currículo elaborado para crianças e adolescentes, o que contraria a sua especificidade
estabelecida nas leis que regem a Educação de Jovens e Adultos. Nesse contexto, o principal
objetivo da EJA que deve ser formar indivíduos emancipados e atuantes na sociedade, por
meio da promoção da dialogicidade de conteúdos relevantes e atuais, buscando um
aprimoramento do senso crítico de cada sujeito não se concretiza. Esse é outro fator que
inviabiliza uma educação adequada e de qualidade para o público da EJA, conforme afirma
Pierro.
Ao focalizar a escolaridade não realizada ou interrompida no passado, o
paradigma compensatório acabou por enclausurar a escola para jovens e
adultos nas rígidas referências curriculares, metodológicas, de tempo e
espaço da escola de crianças e adolescentes, interpondo obstáculos à
flexibilização da organização escolar necessária ao atendimento das
especificidades desse grupo sociocultural (PIERRO, 2005)
Em relação aos alunos, foi pesquisada a motivação que os levou a retornarem à escola
e as suas expectativas em relação ao curso, suas dificuldades e participação nas atividades.
Através dos relatos dos alunos, pode-se constatar que as transformações ocorridas na
sociedade têm influenciado para que as pessoas retornem à escola, pois, no atual mundo
globalizado, não há mais possibilidade de se manter inserido no mercado de trabalho sem ser
escolarizado. Aqui percebemos que há uma contradição na ideologia do sistema capitalista,
pois não são oferecidas condições adequadas de aprendizagem e permanência na escola,
porém, há uma exigência para que não apenas os indivíduos saibam ler e escrever, mas
também que se eduquem ao longo da vida. Quanto a isso, Delors coloca que:
[...], o progresso científico e tecnológico e a transformação dos processos de
produção resultante da busca de uma maior competitividade fazem com que
os saberes e as competências adquiridos, na formação inicial, tornem-se,
rapidamente obsoletos e exijam o desenvolvimento da formação profissional
permanente (DELORS, 2001).
Outra razão que colabora para o regresso destes alunos à escola é o desejo de realização
pessoal. Segundo Delors (2001, p.103) “ninguém pode pensar adquirir, na juventude, uma
bagagem inicial de conhecimentos que lhe baste para toda a vida, porque a evolução rápida do
mundo exige uma atualização contínua dos saberes”. Percebe-se assim, que estes sujeitos
estão vencendo o estigma da vergonha e da culpa, que são fatores que muitas vezes impede
estes sujeitos de retornarem à escola.
As expectativas desses alunos ao buscarem a EJA são de avançar nos níveis de
conhecimento que eles já possuem e também se sentirem preparados para alcançar melhores
lugares no mercado de trabalho. Entretanto, compreendemos que educação seja muito mais do
que simplesmente adquirir o conhecimento das disciplinas constantes no currículo, como; ler,
escrever e realizar cálculos matemáticos para conseguir empregos, mas é, principalmente,
desenvolver as competências de compreender, analisar, refletir, transformar o conhecimento e
saber fazer o uso social desses saberes. Para isso, o conhecimento deve ser concebido como
um movimento dialético, como explica Ferreira (1990):
O conhecimento é o movimento da síncrese (sensorial-concreto), passando
pela análise (abstração), chegando à síntese (o concreto-pensado, um novo
concreto mais elaborado). A atividade analítico-sintética é indispensável ao
avanço do conhecimento. A análise é a separação dos elementos particulares
de um todo. A síntese é a reunificação dos elementos analisados.
(FERREIRA, 1990, p. 51)
Nesse sentido, percebemos que a educação oferecida para esses sujeitos está muito
aquém do que é esperado para eles, pois a metodologia aplicada nas aulas não levam os
educandos à reflexão das suas realidades enquanto sujeitos históricos e transformadores da
sociedade. Embora a professora tenha especialização em Educação de Jovens e Adultos, a
metodologia aplicada nas aulas não condiz com a necessidade desses educandos. A educadora
afirma que trabalha as disciplinas de Língua Portuguesa, matemática, ciências, geografia e
história, sendo que esta última aborda apenas as datas comemorativas. Compreendemos que o
fato de ser trabalhado apenas com datas comemorativas ou outros conteúdos que exigem
apenas memorização torna os conteúdos das disciplinas mecânicos e superficiais, não
contribuindo para a formação de cidadãos críticos, uma vez que, para se compreender as
questões sociais é fundamental que se conheça o contexto histórico dos fatos. Para isso, é
necessário elaborar todo um processo de problematização do conhecimento que, ainda
segundo Ferreira, ocorre em três etapas assim classificadas:
1º - Partir da prática concreta - Perguntar, problematizar a prática. São as
necessidades práticas que motivam a busca do conhecimento teórico. Tais
necessidades constituem o problema, aquilo que é necessário solucionar.
Supõe, pois, identificar fatos e situações significativas da realidade imediata.
o
2 - Teorizar sobre a prática - Ir além das aparências imediatas, desvelar,
refletir, discutir, estudar criticamente, buscando conhecer melhor o tema
problematizado.
o
3 - Voltar à prática para transformá-la - Voltar à prática com referenciais
teóricos mais elaborados e agir de modo mais competente. (FERREIRA,
1990, p. 52.53)
Outra questão que abordamos se refere às dificuldades encontradas por esses sujeitos
na escola e que os levaram a parar com os estudos. Segundo os relatos dos alunos
entrevistados, eles deixaram a escola por motivo de trabalho, os horários incompatíveis com a
escola, as dificuldades de acesso ou o fato de a escola não atender às suas expectativas, e
estão retornando por necessidade de adquirir novos conhecimentos, pela vergonha de se
perceberem analfabetos numa sociedade letrada, pelas novas exigências do mercado de
trabalho, e pela cobrança ou estímulo da família. Podemos constatar que apesar da educação
desta faixa etária não ser mais de responsabilidade da família, esta ainda influi
significativamente para que os jovens e adultos retornem à escola.
Quanto às disciplinas trabalhadas nesta modalidade de educação, as maiores
dificuldades relatadas pelos alunos são referentes à leitura e operações matemáticas. Em se
tratando de leitura, Silva (1991, p. 79-80) afirma que “A leitura crítica é condição para a
educação libertadora, é condição para a verdadeira ação cultural que deve ser implementada
nas escolas”.
Dessa forma, compreendemos que a leitura, também a escrita e a fala, são habilidades
de extrema relevância na formação do sujeito, pois são atividades que podem promover a
formação do sujeito crítico e reflexivo, uma vez que é através do desenvolvimento dessas
habilidades que os estudantes podem posicionar-se em situações, sejam elas cotidianas ou
não, com autonomia e em seu benefício. Além disso, a leitura e interpretação são habilidades
que proporcionam ao indivíduo à aquisição de saberes de outras disciplinas, inclusive, a
matemática, a qual requer interpretação de dados. Nesse sentido, Ferreira (1990) assevera que
a alfabetização, enquanto aquisição da língua escrita, não é simplesmente um ato mecânico de
decodificação do código escrito, mas ocorre numa construção do conhecimento que envolve
questões de ordens diversas e exige uma postura crítica para que se concretize plenamente.
Alfabetização é a aquisição da língua escrita, por um processo de construção
do conhecimento, que se dá num contexto discursivo de interlocução e
interação, através do desvelamento crítico da realidade, como uma das
condições necessárias ao exercício da plena cidadania: exercer seus direitos
e deveres frente à sociedade global [...] A alfabetização passa por questões
de ordem lógico-intelectual, afetiva, Sócio-Cultural, política e técnica
(FERREIRA, 1990, p. 60).
Nesse sentido, outra característica observada na maioria dos alunos, e que dificulta a
formação do sujeito crítico, é a timidez, o que pode servir de obstáculo para que eles
socializem suas ideias, dificultando, assim, o processo de aprendizagem. Ao serem
questionados a respeito do curso mostraram-se acríticos e com respostas repetitivas. Logo, é
necessário refletir quanto ao papel da educação, especificamente na modalidade de EJA, aqui
referenciada. Será que a educação tem atendido à necessidade de se estar formando cidadãos
críticos, ou tem contribuído para a reprodução do status quo de uma sociedade que produz e
reproduz desigualdade social?
Outro aspecto que chamou nossa atenção foi o fato de que a escola não oferece
material didático como livros ou apostilas. Além disso, outro fator que pode estar
contribuindo para as dificuldades de aprendizagem dos alunos é a restrição de atividades
somente em sala de aula, porque, segundo o relato da professora, os alunos não fazem
atividades extra-classe alegando falta de tempo. Também não se reúnem em grupos em outros
espaços e não tem o hábito de ler nem de escrever. A docente afirma que os alunos têm um
bom relacionamento com a professora e entre si, porém, há uma falta de compromisso quanto
à assiduidade e um grande índice de evasão que ocorre com maior freqüência nos períodos de
festas, acentuando-se após o recesso escolar.
Considerações Finais
Diante do que foi observado e relatado pelos alunos e professora, podemos perceber
que a modalidade de Educação para Jovens e Adultos ainda continua à margem das políticas
públicas, pois há muitas questões a serem revistas pelos órgãos competentes. A localização da
sala visitada evidencia a exclusão desses sujeitos do convívio escolar de forma mais
integrada; os conteúdos trabalhados e a metodologia aplicada não contribuem para formar um
sujeito reflexivo, crítico, participativo e autônomo; a falta de material didático adequado
também contribui para as dificuldades de aprendizagem e a escola não trabalha de forma a
motivar esses sujeitos a permanecer na escola – o índice de evasão evidencia isso.
Percebemos também que ser educador nesta modalidade de ensino se torna um
desafio, uma vez que sem material e metodologia adequados o aluno perde o interesse pela
aprendizagem. Assim, a educação impõe responsabilidades ao professor, pois é sua a
incumbência de buscar outras estratégias para utilizar em sala de aula para motivar seus
alunos e também conscientizá-los da importância da educação, desvelar qual e o real sentido
do que é, para quê e porquê estudar, revelando-lhes que a educação não serve apenas para
conseguir um trabalho melhor, mas para formar cidadãos conscientes de seus direitos e
capazes de exigi-los quando não efetivados.
Nesse contexto, pode-se ver que apesar dos avanços garantidos à EJA, por meio das
leis estabelecidas, esta modalidade de ensino não tem garantido as prioridades da educação
básica, que são a leitura, a escrita e a interpretação textual, uma vez que estes três aspectos da
educação constituem o passo mais significativo para a inserção do indivíduo em um ambiente
letrado. Sem a aquisição do hábito da leitura dificilmente estes alunos terão desejo de educarse por mais tempo, além de interferir na aprendizagem de outras disciplinas, como por
exemplo, a matemática que exige, antes de tudo, a interpretação de dados.
É fundamental que se ofereça condições para que ocorra uma educação emancipatória,
atendendo às necessidades especificas desses sujeitos e procurando formar cidadãos críticos,
participativos e conscientes de seus direitos, para que estes lutem pela efetivação das leis
estabelecidas não somente para a educação, mas também pelos direitos à saúde, à moradia, à
segurança, ao lazer e a tudo o mais que o sujeito necessita para ter uma vida íntegra e feliz.
A partir da observação e das entrevistas realizadas pôde-se constatar que, não obstante
a Educação de Jovens e Adultos ter obtido avanços ao longo de sua história, ainda há muitos
aspectos a serem melhorados, pois o que foi alcançado ainda é insuficiente para atender às
necessidades desses sujeitos. Apesar dos direitos instituídos por lei, o seu cumprimento não
ocorre efetivamente, pois, para que o direito se faça prática é preciso mais que uma declaração
legal, é imprescindível que as políticas públicas disponibilizem verbas suficientes para a
estruturação dos espaços físicos destinados à EJA, para a aquisição de materiais específicos
para a prática pedagógica e também ofereça formação continuada para os educadores que
atuam nessa modalidade de educação, a fim de que seja garantido não somente o acesso, mas
também a permanência desses alunos na escola e fomente nesses sujeitos a motivação para
prosseguir com os estudos por todo o tempo necessário para uma formação plena.
Vale ressaltar que a postura do educador como um transgressor da ideologia burguesa,
através do discurso em coerência com a prática em prol de uma mudança qualitativa nessa
modalidade de ensino, assumem também um papel primordial na educação dos sujeitos da
EJA, pois a sua conduta política e pedagógica influenciam significativamente na formação
desses indivíduos.
Enfim, a Educação de Jovens e Adultos pode concretizar seus objetivos legais se
houver compromisso ético profissional dos educadores em um maior engajamento político em
busca da efetivação dos direitos dos educandos, buscando promover nestes o sentimento de
indignação e mobilizá-los em um movimento de luta contra o sistema vigente, garantindo de
fato seus direitos instituídos por lei. Para isso, práticas pedagógicas voltadas para a leitura e
interpretação de textos, debates acerca de problemáticas que permeiam a sociedade se
constituem em elementos fundamentais para a formação do indivíduo crítico e reflexivo.
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