O Estado Atual do Planejamento em Municípios de Pequeno Porte Autoria: Ricardo Rocha de Azevedo, André Carlos Busanelli de Aquino Resumo Este artigo analisa o processo de planejamento em 65 municípios de até 50 mil habitantes do Estado de São Paulo por meio de um questionário respondido pelos responsáveis pela sua elaboração. As evidências sugerem que o planejamento atual é uma mera peça formal com fins legais, que não permite a gestão eficiente dos recursos empregados. Com isso, são originados planos que não tem como objetivo desenhar ações para resultados objetivados futuros (e sim para distribuir recursos entre as Secretarias atendendo limites fiscais e legais), portanto é pouco razoável esperar que sejam utilizados para a gestão de resultados de seus governos. 1 1 Introdução Mais de 89% dos municípios brasileiros possuem até 50 mil habitantes. O que poderia ser visto como uma vantagem em termos de proximidade dos representantes ao seus representados, pode ser negativamente balanceado com a falta de estrutura administrativa que é refletida na qualidade do processo de planejamento. Independente do porte, todos os municípios devem seguir as mesmas regras legais que determinam a elaboração de um planejamento local. Não há nenhuma flexibilização do processo pelo seu porte: todos devem estimar suas receitas e definir como os recursos serão aplicados, além de seguir todas as regras fiscais estabelecidas pela LRF. Diversas foram as mudanças recentes no processo de planejamento. Para mencionar apenas as principais, cita-se a criação pela Constituição Federal do atual ciclo orçamentário de quatro anos composto pelo PPA, LDO e LOA; a obrigatoriedade de definição de metas físicas para as ações e de indicadores para os programas governamentais; o estabelecimento de metas fiscais; maior transparência no processo orçamentário, com a apresentação de audiências públicas tanto na fase de elaboração quanto na fase de execução; controle por fontes de recursos, e ainda a definição pelos próprios entes dos programas e ações a serem executados. Nos últimos anos a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e o Conselho Federal de Contabilidade (CFC) têm editado normas para a implantação de novas regras para a contabilidade aplicada ao setor público (NBCASP) e o planejamento público tem recebido diversas inovações na tentativa de transformá-lo em um orçamento de resultados, tendo inclusive sido tema da edição de uma norma técnica especifica sobre o assunto (NBCT 16.3). Essas mudanças no setor público nacional tem acompanhado uma evolução mundial nos princípios de administração, através de um movimento conhecido como NPM – New Public Management, ou Nova Gestão Pública, que tem trazido para a gestão da coisa pública diversos conceitos de administração privada (business like), focando no resultado ao invés de focar no processo, e implementando mecanismos de gestão eficiente de recursos (HOOD, 1995). Dada a considerável quantidade de mudanças no processo orçamentário, o artigo levanta a seguinte questão: como os municípios de pequeno porte tem assimilado essas mudanças, considerando suas dificuldades estruturais, como baixo orçamento e falta de recursos humanos e financeiros para implementar as mudanças? O presente artigo apresenta e discute o tema “planejamento público municipal”, utilizando-se de um questionário aplicado a responsáveis pelo planejamento público de municípios de até 50 mil habitantes do estado de São Paulo, que nos permite concluir que ainda existe uma barreira muito grande para que os pequenos municípios brasileiros consigam implementar o novo modelo de ciclo de planejamento criado. O interesse pelo estudo do planejamento e orçamento dos municípios se justifica pelo volume de recursos movimentado anualmente nessa esfera. O Brasil é considerado um dos países que possuem a maior descentralização fiscal do mundo, colocando-o ao lado de países desenvolvidos, como os Estados Unidos, Canadá e países do norte europeu (GUESS & LELOUP, 2010, p. 202-203). O orçamento público não tem cumprido sua função principal que é de servir como instrumento de controle da sociedade sobre os gastos públicos e como instrumento de discussão das prioridades dos entes (REZENDE & CUNHA, 2013, p. 17), tendo sido colocada em cheque inclusive a sua própria existência como ferramenta de gestão em países desenvolvidos como os Estados Unidos (JOYCE, 2012). 2 2 2.1 Aspectos estruturantes Definição de planejamento O planejamento é um termo ambíguo, que é utilizado de modo diferente e recebe definições de acordo com a área do conhecimento humano que está sendo situado, como a área de exatas, humanas e sociais (TEIXEIRA, 1997). O planejamento pode ser entendido como um processo sistematizado através do qual pode-se atingir uma maior eficiência em uma atividade para num prazo determinado alcançar um conjunto de metas estabelecidas (CARVALHO, 1978). O planejamento tem uma visão sistêmica, onde um conjunto de partes coordenadas entre si visam atingir um objetivo comum. Pode-se definir ainda planejamento como sendo um processo que estabelece objetivos, define linhas de ação e planos detalhados para atingi-los e determina os recursos necessários à consecução dos mencionados objetivos. (LOPES, 1990). Existe uma diferenciação entre planejamento e orçamento. O planejamento deve ser visto como um processo maior, que pode assumir diversas dimensões: planejamento urbano, patrimonial, econômico, financeiro, de investimentos, social. O planejamento é o plano, aquilo que se deseja atingir, enquanto o orçamento é a materialização financeira do que foi planejado, traduzido em fontes de financiamentos (receitas) e aplicações de recursos (despesas) (TEIXEIRA, 1997). Nas diferentes definições sobre planejamento alguns pontos merecem destaque: o planejamento possui uma visão sistêmica e deve se pautar sempre em objetivos préestabelecidos que sejam baseados em um diagnóstico preliminar. Dessa forma, o planejamento traz à luz a condição atual da realidade que se deseja atuar e qual o cenário futuro desejado. A elaboração do planejamento pelos municípios é uma figura relativamente nova, surgida nas últimas décadas, pois até a década de 60 ainda imperava a figura dos órgãos regionais de planejamento, que se encarregavam do planejamento das vilas e municípios das diversas regiões do país. Os municípios eram apenas vistos como unidades de ocupação geográfica, e não eram reconhecidos como uma entidade administrativa para o desempenho de funções locais específicas (COSTA, 1971 - p.371). Até a promulgação da Constituição Federal de 1988, os municípios sequer eram reconhecidos como membros da federação (REZENDE, 1995). A atual metodologia de planejamento adotada pelas entidades públicas possui pouco mais do que uma década. Além de ser ainda uma atividade relativamente recente, o planejamento nos municípios possui algumas particularidades em relação ao planejamento público dos demais entes da federação como o Estado e a União, visto que os municípios possuem grande dependência dos recursos repassados pelos Estados e Governo Federal, dificultando assim a possibilidade de planejar antecipadamente suas ações, pelo fato de que muitos projetos só são conhecidos pelo município quando são disponibilizados em programas do Governo Federal mediante convênios voluntários e outros instrumentos congêneres. Outro problema com o planejamento público é o direcionamento político que o governante aplica. Como o prefeito foi eleito pelo povo utilizando-se de um programa de governo, ele deveria materializar essa plataforma política em programas e ações do seu planejamento formal do município, o que raramente ocorre. Isso se comprova pelos resultados da pesquisa, que mostram que os prefeitos não se interessam em participar da elaboração do planejamento e raramente utilizam esses instrumentos como ferramentas de gestão. Além disso, os vereadores não veem importância em participar desse tipo de audiência pública e assim poder interferir no processo de planejamento. 3 2.2 A evolução recente do planejamento O orçamento público no Brasil passou por diversas regulamentações legais até a publicação da Lei 4320, que trouxe a ‘formatação’ de como o orçamento público deve ser elaborado, focando na estrutura de classificação das receitas e despesas. A partir de 1964 o país passou por muitos anos sem grandes avanços na área de planejamento público, experimentando apenas alguns planos quinquenais no âmbito federal, mas com poucas modificações no processo orçamentário (LOPES, 1990). A Constituição Federal em 1988 criou a atual metodologia de planejamento no país, que passou a conter três instrumentos básicos: O Plano Plurianual (PPA) que é composto por um planejamento de quatro anos, que deve conter todos os investimentos com duração superior a um exercício financeiro, além de suas despesas continuadas; a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que deve definir as estratégias e as metas para a elaboração do orçamento, além do estabelecimento de metas fiscais, e a Lei Orçamentária Anual (LOA), que é o instrumento de execução dos planos previamente planejados e priorizados. A adoção desses novos instrumentos de planejamento pelos municípios não foi imediato: no ano de 1999, 250 municípios não tinham iniciado a edição anual da LDO, e 750 municípios ainda não possuíam um PPA como determinava a Constituição Federal desde 1988 (IBGE, 1999). Faltava regulamentação legal, modelos e compreensão dos conceitos, e como foram criadas muitas regras novas, com a existência de pouca estrutura na área de planejamento, a assimilação da nova metodologia não foi uma tarefa simples. Aliado às dificuldades estruturais, muitos municípios não adotaram inicialmente os novos instrumentos com o argumento da falta da legislação disciplinadora conforme dispõe o art. 165, §9º da Constituição Federal. Na falta da lei complementar, muitos municípios deixaram de atender à elaboração dos instrumentos de planejamento, alguns inclusive apoiados em entendimentos de órgãos de Controle Externo (GIACOMONI, 2004). A Lei de Responsabilidade Fiscal no ano 2000 trouxe capítulos específicos para o Planejamento Público e definiu o conteúdo mínimo que o Plano Plurianual e a Lei de Diretrizes Orçamentárias deveriam possuir, diminuindo as incertezas sobre a nova metodologia a ser seguida. Mas além de trazer as definições que faltavam no planejamento, a LRF trouxe novas mudanças, passando a exigir dos entes a fixação de metas físicas para as ações governamentais, além das metas financeiras que até então eram orçadas, além de exigir a apresentação em audiências públicas periódicas à sociedade as metas que haviam sido estabelecidas. A LRF criou ainda diversos novos mecanismos de controle fiscal no planejamento, como o estabelecimento de um demonstrativo de riscos fiscais e a obrigatoriedade de fixação de metas fiscais (resultado nominal, resultado primário, e meta máxima de endividamento total). As mudanças no início da década passada incluíram ainda a exigência da criação de um Plano Diretor, com a edição da Lei Federal 10.257/2001. A lei federal definiu que o Plano Diretor deveria ser parte integrante do processo de planejamento municipal, devendo o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e o orçamento anual incorporar as diretrizes e as prioridades nele contidas (artigo 40). As dificuldades na compreensão e adoção do Plano Diretor foram igualmente grandes: apenas recentemente os municípios obrigados passaram a contar com seus planos plenamente definidos: em 2005 apenas 14,5% dos municípios contavam com o plano (IBGE, 2013). No ano de 2001, com o intuito de auxiliar os municípios na compreensão do novo processo de planejamento foi publicado pelo Ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão em conjunto com o BNDES uma cartilha chamada “Manual de Elaboração - O passo a 4 passo da Elaboração do PPA para municípios”, que forneceu um importante auxílio aos municípios na elaboração dos novos instrumentos. Cita-se ainda como importante documento de orientação, no caso do Estado de São Paulo, a publicação no ano de 2005 de três manuais básicos sobre a elaboração do planejamento público, sendo um manual para o PPA, outro pra a LDO e o terceiro para a LOA. Em conjunto com a publicação dos manuais, o Tribunal de Contas fez uma apresentação para os municípios paulistas (AUDESP, 2005), dando uma visão clara de como deveriam ser elaborados os programas, que deveria passar a contar com indicadores, e as ações, que passaram a contar com metas físicas, além das demais regras do novo planejamento. Mas ainda faltava nesse período um ingrediente essencial para a evolução do planejamento: o enforcement por parte dos controles externos, exigindo a adoção do novo método de planejamento. Em 2008 inicia-se a informatização da coleta dos dados de planejamento dos órgãos jurisdicionados pelo Tribunal de Contas. A partir da informatização, o acompanhamento do planejamento passou a ser feito eletronicamente por parte do controle externo, tornando-o muito mais eficiente, visto que as ações, programas, receitas previstas e arrecadadas e as despesas fixadas e executadas passaram a ser acompanhadas por regras de sistema (software), com a emissão de alertas automáticos em caso de descumprimento, sendo os alertas enviados tanto para a entidade quanto para a Unidade Regional do Tribunal de Contas que a fiscaliza. Além disso, os alertas passaram a ser publicados no próprio site do Tribunal de Contas, dando ampla transparência à sociedade. Ao analisar a evolução do processo orçamentário no âmbito municipal, propõe-se a existência de quatro fases distintas: (i) fase orçamentária tradicional; (ii) fase pósconstitucional; (iii) fase de adequação e (iii) fase inicial do orçamento por resultados (Figura 1). Figura 1 - Evolução dos ciclos orçamentários Fonte: elaborado pelos autores A fase orçamentária tradicional compreende o período entre a edição da Lei 4320/64 e a promulgação da Constituição Federal. Nela, o planejamento visava apenas a estimação do orçamento do ano seguinte, com a previsão de receitas e fixação das despesas, com poucas 5 preocupações com os resultados. Na fase pós-constitucional, mesmo após as mudanças no ciclo do planejamento promovidas pela Constituição, ele permaneceu genérico e sem a cobrança de resultados físicos, visando apenas o atendimento aos limites legais. Nessa fase os softwares dos municípios não estavam adequados às mudanças, e havia baixa cobrança pelos controles externos, com pouca orientação sobre como fazer o planejamento. Na fase de adequação, período ocorrido entre a edição da LRF em 2000 até 2005, os softwares de planejamento dos municípios são atualizados para auxiliar na geração das novas informações, e ocorre o início do detalhamento das ações, com a fixação de outputs (metas físicas). Nesse período dá-se o início da cobrança informatizada do planejamento pelo controle externo em alguns estados. Por fim, na fase inicial do orçamento por resultados, de 2006 em diante, começa a adoção de indicadores para os programas de governo e amplia-se a utilização de metas físicas para as ações. Nesse período ocorre a ampliação da cobrança de forma informatizada pelos controles externos nos Estados. 2.3 Dificuldades estruturais dos pequenos municípios Ao analisar o estado atual do planejamento municipal dos pequenos municípios, os resultados sugerem que esses possuem dificuldades na organização dos setores responsáveis pelo controle e geração de informação: no ano de 2012 apenas 1.434 municípios (25,7% do total) possuíam valores executados na Subfunção Controle Interno (FINBRA, 2012). Considerando o papel que a Secretaria Federal de Controle (SFC) exerce no Governo Federal, de monitorar as políticas públicas e gerar informações sobre a execução orçamentária que são utilizadas pelo Ministério de Planejamento (OLIVIERI, 2010, p. 145), a falta desse setor nos municípios brasileiros traz prejuízos ao processo de planejamento, na medida em que um importante ator do ciclo orçamentário é inexistente ou pouco estruturado. O sistema de controle interno poderia funcionar como um “reforço positivo” do sistema de monitoramento e avaliação do planejamento. Existem também dificuldades na criação de um setor específico para a elaboração do planejamento nos municípios. Adotando-se como proxy para a existência do setor de planejamento o valor empenhado na Subfunção de Governo “121 - Planejamento e Orçamento, aponta-se a existência desse tipo de gasto em apenas 1.295 municípios no ano de 2012, ou 28,24% do total (FINBRA, 2012). Existem ainda deficiências técnicas na instituição e cobrança das suas receitas próprias, como os impostos, as taxas e contribuição de melhoria. Faltam sobretudo recursos humanos em número suficiente na área administrativa, além de capacitação. Uma evidência da falta de estrutura de arrecadação pode ser obtida ao se analisar os seus cadastros mobiliários, que muitos não mantêm atualizados, sendo que esses dados servem como base de dados para a cobrança dos impostos (MELLO, 2001). A extensão das dificuldades estruturais dos municípios pode ser evidenciada na análise da sua estrutura de arrecadação apresentada pelo IBGE (2009), que aponta a existência de 365 municípios que não cobravam IPTU nessa data; 1.544 não possuíam a planta genérica de valores, e 341 municípios não cobravam nenhuma taxa (Tabela 1). 6 Tabela 1: Estrutura de Arrecadação dos municípios Estrutura de Arrecadação Cadastro imobiliário – existência Cadastro imobiliário informatizado - existência O município cobra IPTU Planta Genérica de Valores – existência Planta Genérica de Valores informatizada - existência Cadastro ISS – existência Cadastro ISS informatizado – existência O município cobra taxa de: Iluminação pública O município cobra taxa de: Coleta de lixo O município cobra taxa de: Limpeza pública O município cobra taxa de: Poder de Polícia O município cobra taxa de: Outras Não cobra nenhuma taxa Sim 5.207 4.628 5.200 4.021 3.124 4.664 3.783 3.894 2.754 2.381 3.079 2.410 341 Não 358 578 365 1.544 896 901 881 1.671 2.811 3.184 2.486 3.155 5.224 N 5.565 5.206 5.565 5.565 4.020 5.565 4.664 5.565 5.565 5.565 5.565 5.565 5.565 Nota. Fonte: Elaborado a partir de IBGE (2009). Perfil dos Municípios Brasileiros - Pesquisa de Informações Básicas Municipais. Rio de Janeiro, 2009. Os municípios também possuem dificuldades na obtenção de autorização para contratar Operações de Crédito. A partir da publicação da LRF todas as Operações de Créditos Internas devem ser aprovadas previamente pela STN (art. 32 da LRF), e as Externas devem ser aprovadas pelo Senado Federal. No período de 2002 a 2012, 31,6% dos processos dos municípios analisados pela STN foram arquivados, sem terem sido concluídos pelos municípios (Tabela 2). Tabela 2: Análise das operações de crédito dos municípios Movimentação 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 TOTAL % Arquivado 16 38 143 16 87 342 910 346 191 181 233 2.503 22,9 <=100.000 hab 10 26 130 8 66 254 827 303 158 160 201 2.143 <=300.000 hab 4 9 7 2 6 47 62 31 18 18 20 224 >300.000 hab 2 3 6 6 15 41 21 12 15 3 12 136 Devolvido 1 116 419 345 73 954 8,7 <=100.000 hab 1 100 292 285 46 724 <=300.000 hab 7 69 50 20 146 >300.000 hab 9 58 10 7 84 Análise Concluída 473 382 580 147 888 1012 1047 404 1073 741 731 7.478 68,4 <=100.000 hab 377 306 478 116 718 722 897 358 928 600 628 6.128 <=300.000 hab 61 58 64 25 92 155 80 28 81 74 57 775 >300.000 hab 35 18 38 6 78 135 70 18 64 67 46 575 Total Geral 489 420 723 163 975 1.354 1.958 866 1.683 1.267 1.037 10.935 100 Nota. Fonte: elaborado a partir de dados da STN (2013) A mesma análise feita com os Estados mostra que apenas 7,84% dos processos foram arquivados, o que demonstra a dificuldade que os municípios possuem no levantamento e apresentação dos documentos, que pode indicar falta de organização ou até a inexistência de estruturas de geração de informação. 7 3 3.1 Procedimentos metodológicos Método e Amostra O presente artigo discute aspectos relacionados ao estado atual da elaboração do planejamento público no Estado de São Paulo a partir da percepção dos gestores dos pequenos municípios responsáveis pela elaboração do planejamento. O questionário foi direcionado apenas aos municípios que se encontravam na faixa populacional de até 50 mil habitantes, visto que o foco da análise da pesquisa era os pequenos municípios, que representam mais de 80% dos municípios Paulistas e mais de 89% do total de municípios do país. O questionário foi elaborado com 46 questões fechadas utilizando-se escalas likert, nominal e ordinal. A aplicação do questionário foi feita no final de 2012, por meio de formulário disposto na internet, com contato feito com os municípios utilizando-se de correio eletrônico para divulgação da pesquisa. O questionário ficou disponível para coleta das respostas por três meses. As questões procuraram analisar os seguintes aspectos: (a) organização interna da estrutura de planejamento; (b) participação legislativa e popular na elaboração do planejamento; (c) nível de maturidade na mensuração do orçamento; (d) metodologia de elaboração do orçamento. Foram coletadas 148 respostas, sendo que as respostas repetidas do mesmo município foram eliminadas, assim como as respostas de municípios com faixa populacional acima de 50 mil habitantes. Para a eliminação das respostas duplicadas de um mesmo município foi adotado o critério de selecionar respondentes ligados à Prefeitura Municipal, e que preferencialmente exercessem atividade de desenvolvimento dos instrumentos de planejamento. Assim que o prazo de coleta das respostas se expirou, os dados foram analisados por meio do software Microsoft® Excel, onde as respostas foram agrupadas e analisadas. Após as eliminações das duplicidades nas respostas de um mesmo município e dos municípios respondentes que estavam fora da faixa populacional de interesse, restaram 65 municípios do Estado de São Paulo, cujos respondentes atuam diretamente com a atividade de planejamento público (Tabela 3). Tabela 3: Características dos respondentes Respondentes N = 65 % Contador 40 61,5 Chefe de Departamento 11 16,9 Assessor 6 9,2 Secretário 4 6,2 Outros 4 6,2 O pré-teste do questionário foi realizado com dois consultores da área contábil / financeira que trabalham com municípios, além de dois servidores públicos responsáveis pelo planejamento público em seus municípios. O interesse pelo planejamento dos pequenos municípios de até 50 mil habitantes se justifica pela sua predominância no Estado de São Paulo (80%), que acompanha a situação no restante do país (89%). A amostra da pesquisa demonstra ser bem equilibrada para a faixa populacional analisada (Tabela 4). 8 Tabela 4: Características dos municípios da amostra População (mil hab.) <= 10 de 10 a 25 de 25 a 50 >50 Total Municípios do País N % 2.514 45 1.742 31 700 13 612 11 5.568 100 Municípios do Estado de SP N % 278 43 152 24 88 14 127 20 645 100 Municípios da amostra N % 29 45 21 32 15 23 65 13 % amostra 10 14 17 10 Nota. % amostra: relação percentual entre o número de municípios da amostra em comparação com os municípios do Estado de São Paulo, por faixa populacional. A estatística descritiva apresenta que a maior parte dos pequenos municípios paulistas tem poucos anos de fundação (Tabela 5), o que também é seguido pela amostra. Também é possível notar que existem grandes diferenças no tamanho da área entre os municípios, o que pode levar a maiores gastos com a manutenção da sua zona rural e com o transporte de alunos para alguns casos. Tabela 5: Estatística descritiva População (mil hab.) Distância da Capital (km) PIB / Hab. (R$ mil) Orçamento (R$ milhões) Orçamento/Hab. (R$ mil) Área (km2) Idade (anos) Amostra (n=70) Todos os municípios paulistas (n=645) Média Desv.Pad. Mín. Máx. Média Desv.Pad. Mín. Máx. 16 12 1,7 43 114 1.628 0,8 41.252 409 167 60 800 344,64 185,94 12 800 17.2 11 7 90.5 20.8 18.1 6.3 241 37.8 25.1 9.7 104.3 167.510 1.351.656 6.844 32.086.363 2.9 1.2 1.6 7 2.6 1.1 0,9 11 885 2.1 28 13.597 384,8 319,74 5,4 1.977,40 71 28 15 138 86 66 15 467 Nota. Fonte: SIAPNET – Tribunal de Contas do Estado de São Paulo Existe uma grande variação na geração de riqueza nos municípios do Estado de São Paulo: podem ser encontrados casos com PIB de R$ 6.3 mil até R$ 241 mil por habitante. Da mesma maneira, existe uma grande variação no orçamento: os orçamentos vão desde 0,9 mil a 11 mil por habitante. O comportamento da amostra dos municípios respondentes assemelha-se ao comportamento dos municípios do Estado para essas duas variáveis (Tabela 5). O tamanho do orçamento de alguns municípios pode ajudar a explicar a dificuldade de constituir uma equipe de planejamento com dedicação exclusiva à essa atividade, visto que uma equipe dedicada e qualificada requer recursos financeiros que os pequenos municípios não possuem, e não existem auxílios financeiros (Federal ou Estadual) para o desenvolvimento desses setores. 3.2 Análise dos dados A primeira investigação do questionário sobre o processo de planejamento foi sobre a estrutura dos responsáveis pela elaboração do planejamento no município. Os resultados mostram que na maior parte da amostra o planejamento está sob a responsabilidade do contador e alocado na Secretaria da Fazenda, sem possuir um setor específico para isso. O ponto principal não é especificamente a formação da pessoa que o elabora, e sim, a dedicação exclusiva à essa atividade. Como a maioria dos municípios não possui um setor de planejamento, e esse é elaborado pela contabilidade, conclui-se que a elaboração tem sido 9 executada pelo próprio contador da Prefeitura, que por alguns dias compartilha o tempo de suas atividades para se dedicar ao processo de elaboração, o que torna o processo frágil e impreciso (Tabela 6). Os resultados mostram que o planejamento é elaborado de forma centralizada, com pouco envolvimento das demais unidades no processo, além de ser dedicado pouco tempo a essa atividade: 70% dos respondentes declararam investir no máximo um mês por ano em atividades relacionadas ao planejamento. Tabela 6: Análise da organização interna da estrutura de planejamento Questões 1 Respostas em % 2 3 4 5 Estrutura do setor responsável pela elaboração do planejamento Formação de quem elabora o planejamento 83,1 1,5 4,6 3,1 7,7 (1-contador; 2-economista; 3-administrador; 4-advogado; 5-outros) Setor responsável pela elaboração do planejamento público (PPA/LDO/LOA)? (1-Secretaria de Administração; 2- Secretaria da Fazenda / Contabilidade; 3-Setor 3,1 87,7 9,2 de Planejamento) Frequência de capacitação do Setor de Planejamento (1-não recebem treinamento; 2-eventualmente recebem; 3-no mínimo 3,2 20,6 73 3,2 anualmente; 4-A participação em treinamentos é incentivada) Tempo dedicado em média à elaboração do planejamento 15,4 55,4 26,2 3 (1-até uma semana; 2-até um mês; 3-até dois meses; 4-permanente) Grau de Centralização na elaboração do planejamento Participação dos setores na elaboração do planejamento (1-praticamente não existe participação; 2-alguma participação na fase final; 3- 43 alguma participação durante o processo; 4-todas participam) Nível de independência da administração indireta no processo de planejamento (1-O planejamento é centralizado na prefeitura; 2-A entidade elabora mediante 50 regras da prefeitura; 3-A própria entidade elabora seu planejamento) Quantidade de pessoas que exercem atividade de planejamento 9,4 (escala: de 1 a 5, sendo que 5 representa 5 ou mais) Quantidade de pessoas que exercem atividade de planejamento com nível superior 14,5 (escala: de 1 a 5, sendo que 5 representa 5 ou mais) 15,4 35,4 6,2 17,9 32,1 23,4 31,3 21,9 14 33,9 24,2 14,5 12,9 Esses resultados nos permitem concluir que nos pequenos municípios os instrumentos de planejamento tem sido elaborados para o cumprimento da legislação e de prazos, sendo difícil que ele se transforme efetivamente em um plano coordenado para o atingimento de objetivos pré-estabelecidos, como é a definição geral de planejamento, e seja utilizado como posteriormente como ferramenta de gestão. Mesmo com esses resultados insatisfatórios, a maioria dos respondentes afirmou participar de treinamentos sobre planejamento no mínimo anualmente, o que pode indicar uma futura melhora no processo. Com relação às técnicas de elaboração dos instrumentos de planejamento, o estudo encontrou uma tendência a se utilizar o método incremental, que é aquele onde as receitas e despesas são estimadas a partir de cálculos nas séries históricas. Esse método possui uma forte tendência a perpetuar o nível de gasto das unidades, visto que os gastos de determinada unidade em um exercício acabam retornando para aquela unidade no orçamento do ano seguinte (SCHICK, 1983). As respostas mostram uma boa notícia: já se nota nos municípios uma preocupação em elaborar um planejamento voltado a resultados, com a utilização de metas físicas nas ações e indicadores nos programas governamentais. Ressalta-se que a adoção desses mecanismos no 10 planejamento dos municípios de São Paulo podem estar relacionados à informatização da coleta dos dados por parte do Tribunal de Contas pelo Projeto AUDESP (AUDESP, 2014), que além de cobrar os dados ainda os disponibilizam para o Controle Social por meio de um portal chamado Portal do Cidadãoi. Assim, a divulgação dos dados e a cobrança pelo órgão de Controle pode ter induzido os municípios a elaborarem seus instrumentos com a utilização de produtos no planejamento. Também é possível observar a preocupação dos pequenos municípios em efetuar a previsão dos investimentos, tanto para os custeados com recursos próprios quanto com recursos vinculados que dependem de convênios com a União e o Estado, que pela falta de informações completas, são mais difíceis de serem estimados, o que pode indicar uma maior preocupação em tornar transparente os investimentos planejados (Tabela 7). Tabela 7: Nível de Maturidade na estimação do orçamento Respostas em % 1 2 3 Questões Estimação das receitas (1 – Elaboração automática pelo sistema; 2 – a partir de série histórica de anos anteriores; 3 – cálculo individualizado por receita) Estimação das despesas com pessoal (1 – pela média dos últimos anos; 2 - outros; 3 – mediante informações do setor de RH) Estimação dos gastos com custeio (1 – pela média dos últimos anos; 2 - outros; 3 – mediante informações dos setores) Metas físicas das ações (1 – Não possui; 2 – metas estabelecidas para algumas ações; 3 – metas para todas as ações) Indicadores dos programas de governo (1 – Não possui; 2–adota para alguns programas; 3–adota para todos os programas) Estimação dos investimentos (1 – Poucos investimentos são previstos no orçamento inicial; 2-São previstos apenas os custeados com recursos próprios; 3 – recursos próprios e convênios) 10,9 54,7 34,4 65,6 3,1 31,3 80 6,2 13,8 6,6 41 52,5 11,3 38,7 50 26,2 21,5 52,3 A investigação sobre o nível de participação popular no processo de planejamento mostra que as audiências públicas realizadas ainda são inexistentes ou apenas realizadas formalmente. A legislação determina a realização de audiências públicas na fase de elaboração e de aprovação dos instrumentos de planejamento (LRF, art. 48, Estatuto das Cidades, art. 44). Porém esses instrumentos de participação popular ainda cumprem apenas um caráter simbólico e cerimonial na maioria dos municípios, com baixa adesão da população. (SANDER & PETRALLI, 2013). Segundo os respondentes, quando as audiências ocorrem, a adesão da sociedade é baixa. Além da baixa participação popular, as respostas mostram que a participação do Legislativo no processo de planejamento também tem sido baixa, com pouca presença dos vereadores nas audiências públicas: em 70% dos municípios ocorre uma participação média de até 2 vereadores. Esse número está de acordo com a percepção dos respondentes quanto à importância dada pelos vereadores em relação às audiências, onde 85 % acreditam que o Legislativo não vê importância na sua participação desse tipo de evento. Além da pouca participação, o acompanhamento Legislativo no processo de discussão e aprovação é também baixo, com 86% dos respondentes afirmando não terem sido apresentadas emendas ao projeto inicialmente apresentado pelo Executivo. Também se verificou que os pequenos municípios praticamente não tem adotado técnicas de orçamento participativo (Tabela 8). 11 Tabela 8: Participação popular e Legislativa no processo de planejamento Questões 1 Respostas em % 2 3 4 Participação popular Número de Audiências Públicas na fase de elaboração (1-não adotadas; 2-não é prática comum; 3-apenas uma é realizada; 4-alguma 3,1 33,8 56,9 4,6 iniciativa de realização em diversos locais; 5-realizada em diversos bairros) Número médio de participantes da sociedade nas audiências públicas de planejamento 44,3 1,6 18 1,6 (Escala: de 1 a 5, sendo que 5 representa 5 ou mais participantes) Nível de utilização de técnicas de orçamento participativo (1-não são adotadas; 2-por meio do envio de correspondência aos cidadãos; 3- 92,3 1,5 3,1 3,1 participação via web; 4-utiliza com uso de votação dos cidadãos). Engajamento Legislativo Respostas em % Questões 1 2 3 4 Percentual médio de vereadores presentes nas audiências públicas de planejamento 52,3 20 9,23 9,23 (Escala: de 1 a 5, sendo que 5 representa 5 ou mais) Emendas propostas por parte do legislativo 85,7 14,3 (1-raramente apresentam emendas; 2-quase sempre o legislativo emenda) Os vereadores não veem importância em participar das audiências públicas do planejamento 57,7 17,3 11,5 7,7 (1=Concordo Plenamente; 2=Concordo Parcialmente; 3=Indiferente; 4=discordo parcialmente; 5=discordo totalmente) 5 1,6 34,5 5 9,23 5,8 Por fim, buscou-se a percepção dos respondentes sobre eventuais dificuldades no processo de planejamento (Tabela 9). As respostas indicam que em geral o gestor não vê importância no planejamento, visto que não o utiliza para tomada de decisão e dessa forma não faz esforços para participar de seu processo de elaboração. Tabela 9: Entendimento dos respondentes sobre as dificuldades em relação ao planejamento do pequeno município Questões 1 Respostas em % 2 3 4 5 As informações sobre os indicadores dos programas e as metas físicas das ações 18 24 10 34 14 são utilizadas gerencialmente por parte das entidades O município já discute a elaboração de um planejamento de no mínimo 20 anos 54,9 9,8 15,7 15,7 3,9 O Plano Plurianual é uma importante ferramenta estratégica para as entidades 5,7 3,8 5,7 32 52,8 As regras implementadas pela LDO são respeitadas na elaboração da LOA 3,8 5,8 2 53,8 34,6 O gestor não dá a atenção devida ao planejamento público no momento da 5,9 2 2 35,3 54,9 elaboração e não o utiliza como instrumento de gestão A LOA, em geral, é gerada diretamente a partir dos dados do PPA original, sem 47,1 17,6 3,9 27,5 3,9 preocupação com uma revisão anual. O excesso de arrecadação elevado é recorrente pois o planejamento é subdimensionado (a receita é prevista a menor do que a capacidade real de 28,6 22,4 4,1 30,6 14,3 arrecadação). (1=discordo totalmente, 2=discordo parcialmente; 3=Indiferente; 4=Concordo Parcialmente; 5=Concordo Plenamente) Não houve consenso entre os respondentes sobre a utilidade das informações dos indicadores dos programas e das metas físicas das ações alocadas no planejamento (questão 1 da tabela 10). Essa resposta deve ser analisada com a resposta apresentada na Tabela 7, que indicou uma grande adesão dos municípios no estabelecimento das metas físicas e 12 indicadores. Analisando-as em conjunto, pode-se concluir que os municípios tem adotado a elaboração do planejamento por resultados, mas não tem utilizado essa informação para direcionar as decisões. Segundo os respondentes, tanto o PPA quanto a LDO são respeitados hierarquicamente no momento de se elaborar o projeto de lei do orçamento público. Também segundo eles não se discute um planejamento de longo prazo nos pequenos municípios, permanecendo o espaço temporal de 4 anos do PPA como sendo o limite planejado. Mesmo não havendo consenso sobre a elaboração intencional de um orçamento subdimensionado, observa-se que boa parte dos respondentes confirmou a adoção dessa estratégia que pode estar sendo adotada para se obter excesso de arrecadação no exercício seguinte, que pode estar levando ao Prefeito uma liberdade para decisão na alocação ex-post de gastos. A falta de importância dada pelos Prefeitos ao processo de planejamento pode ser decorrente da falta de reprovações de contas em decorrência desse tipo de falha. Isso pode ser observado nos dados das reprovações das contas dos municípios fiscalizados pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo no período de 2002 a 2009, que mostram que esse não tem sido um dos motivos de reprovação de contas nos municípios. (Tabela 10). Tabela 10: Motivos de reprovação de contas e apontamentos pelo TCE-SP EXERCÍCIO 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 Total 644 644 644 644 644 644 644 644 644 Desfavoráveis 78 118 210 310 179 217 256 218 77 Motivos desfavoráveis 143 220 575 728 350 403 536 541 135 Ensino 42 37 53 72 29 48 114 101 31 Ensino fundamental 13 21 30 37 18 23 2 0 0 Ensino magistério 4 10 13 31 15 14 54 50 26 Déficit elevado 6 18 116 81 28 36 45 38 24 LRF/restos a pagar 19 20 93 186 18 15 8 85 1 Pessoal 13 10 25 17 8 5 17 14 9 Previdência 15 13 37 17 7 16 12 6 2 Precatórios 3 18 40 86 100 135 158 99 5 Saúde 4 6 8 37 15 9 17 20 1 Outras irregularidades 24 67 160 164 112 102 109 128 36 Nota. Fonte: Tribunal de Contas do Estado de São Paulo Ressalta-se, porém, que mesmo não havendo histórico anterior de reprovação de contas em decorrência do orçamento, em períodos mais recentes já é possível notar uma mudança no comportamento dos Tribunais, pois já são encontradas contas reprovadas em decorrência da imprecisão no orçamento, como é o caso da Prefeitura de Cássia dos Coqueiros/SP, que teve as contas do exercício de 2011 reprovadas devido a esse motivoii. As respostas da Tabela 6 e da Tabela 9 mostram que os pequenos municípios acabam tendo seus instrumentos de planejamento elaborados pelos burocratas (técnicos), com pouco envolvimento político no processo, visto que os gestores participam pouco do processo por não verem importância no planejamento público como ferramenta de gestão. Com isso, há uma transferência das escolhas orçamentárias para os burocratas, e ocorre um déficit de democracia (REZENDE & CUNHA, 2013, p. 272) visto que os burocratas não tem suas decisões responsabilizadas por meio da eleição, como ocorre com os agentes políticos. Como o planejamento é um instrumento político, mas também é um instrumento técnico elaborado por burocratas, a discussão sobre o controle dos burocratas é importante, pois os burocratas também participam da tomada de decisões e das escolhas nas políticas públicas (LOUREIRO, ABRUCIO & PACHECO, 2010, p. 113). Essa relação entre as escolhas 13 públicas sendo feitas pelos burocratas, que não são politicamente responsabilizados, é deixada como sugestão para pesquisas futuras. 4 Considerações finais Os pequenos municípios possuem dificuldades técnicas e estruturais em aspectos importantes como a instituição e arrecadação das receitas próprias, obtenção de autorização para contratar Operações de Créditos, e na criação de setores vitais para a geração de informação, como o setor de controle interno, além de poucos possuírem um setor para a elaboração do planejamento público. Com a pouca existência de um setor específico para a elaboração do planejamento, essa tarefa acaba sendo executada por outros setores, sem dedicação exclusiva. A consequência é uma baixa disponibilidade de tempo para as atividades de planejamento, que acaba concorrendo com as próprias atividades dos setores, que na maioria dos respondentes é o setor de contabilidade. Além disso, a falta da existência de um setor exclusivo leva à centralização na elaboração, pois como o tempo de elaboração é reduzido, não há tempo suficiente para que ocorra uma arena de negociações com as demais áreas, sendo elaborado um plano que leva em conta quase que exclusivamente as decisões da Secretaria da Fazenda. A inexistência desse setor pode ser resultado da falta de atenção dada pelo Prefeito ao processo de planejamento, como os próprios respondentes afirmaram que o gestor não tem interesse pelo planejamento público no momento da elaboração, além de não utilizá-lo como instrumento de gestão. Com relação à metodologia de elaboração do planejamento, há predominância da elaboração do orçamento do tipo incremental, que é aquele em que se analisa a série histórica de receitas e despesas para se projetar o próximo orçamento. Esse tipo de metodologia favorece o aumento do gasto público, visto que os setores não tem incentivos para a economia de despesas, pois isso poderá levar à diminuição de seu orçamento no próximo exercício. Os resultados sugerem ainda que o Legislativo municipal possui participação quase nula no processo de elaboração e aprovação do orçamento, que são quase sempre aprovados sem a apresentação de emendas, e com baixa participação dos vereadores nas audiências públicas, que seria uma importante arena de discussão. A maior parte dos municípios declarou já adotar metas físicas e indicadores de acompanhamento nos programas e ações governamentais, o que poderia ser um bom indicador, porém como a maioria dos municípios declarou que essas informações não são utilizadas para a tomada de decisão, pode-se concluir que sua utilização tem sido apenas para a fins de compliance e até de legitimação do processo de cobrança instituído pelo Tribunal de Contas do Estado. A partir das respostas ao questionário conclui-se que o planejamento dos pequenos municípios paulistas tem sido elaborado apenas para o atendimento à demanda legal e prazos, sem seguir o princípio básico do planejamento, que requer um diagnóstico prévio e estabelecimento de ações para atingir aos objetivos. Como o questionário foi aplicado a pequenos municípios do Estado de São Paulo, que conta com uma cobrança eletrônica do planejamento por parte do Tribunal de Contas do Estado, que determina a transmissão ao AUDESP dos três instrumentos de planejamento, como sugestão para pesquisas futuras recomendamos que o questionário seja aplicado em outros estados da federação onde não existe informatização por parte do controle externo, para verificar se o grau de maturidade e desenvolvimento do planejamento público dos pequenos municípios apresenta diferenças significativas em relação a municípios de um estado com controle externo informatizado. 14 Referências bibliográficas AUDESP. 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