Conselho Nacional de Justiça
Procedimento de Controle Administrativo n. 20091000011895
Requerente: José Ferreira de Paiva
Requerido: Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
EMENTA:
PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO.
PROVIMENTO DE SERVENTIA EXTRAJUDICIAL POR
REMOÇÃO
SEM
CONCURSO
PÚBLICO
APÓS
A
CONSTITUIÇÃO
DE
1988
(1996).
TITULAR
ANTERIORMENTE INGRESSADO POR CONCURSO.
1.
Remoção
sem
concurso
público
é
inconstitucional. Artigos 236, § 3º e 37, II
da Constituição Federal. O instituto da
transferência é ilegal.
2.
Existência
de
decisão
jurisdicional
suspensa em sentido idêntico à do Conselho
Nacional de Justiça.
3.
Recurso
Administrativo
improvido.
Determinação de (i) retorno do titular à
serventia regularmente provida na comarca de
Porangatu; (ii) declaração de vacância da
serventia irregularmente provida na comarca
de Rio Verde.
RELATÓRIO
O SENHOR CONSELHEIRO JOAQUIM FALCÃO:
Trata-se de requerimento avulso questionando decisão monocrática
de arquivamento do pedido, tomada nos seguintes termos:
Sem adentrar ao mérito da questão, que já se
encontra decidido na decisão proferida aos 30/04/
2009,
indefiro
monocraticamente
o
recurso
administrativo com base no artigo 25 do Regimento
Interno do CNJ:
Art. 25. São atribuições do Relator:
(...)
IX - indeferir, monocraticamente, recurso
quando
intempestivo
ou
manifestamente
incabível;
O presente recurso é manifestamente incabível pois
baseado em dois argumentos já pacificados neste CNJ:
(i) necessidade inafastável, conforme determinação
constitucional, de realização de concurso público
para provimento de serventias extrajudiciais após
1988,
para
ingresso
ou
remoção.
Remoção
inconstitucional deve ser desfeita, determinando-se
o retorno do titular à sua serventia de origem.
(...)
(ii)
a
jurisdicionalização
de
questão
também
submetida ao CNJ não impede sua análise por este
enquanto não houver trânsito em julgado.
O requerente contrapõe referida decisão alegando:
(i) necessária
Plenário.
submissão
de
recursos
administrativos
ao
(ii) que o julgamento por este Conselho, nos termos da
monocrática,
estaria
antecipando
apelação
judicial
interposta, sem poderes jurisdicionais para tanto.
Pediu apreciação do Plenário, o que ora realizo.
Este
PCA
trata
da
questão
de
provimento
de
serventia
extrajudicial por remoção sem a realização de concurso público.
Historiando os fatos, requerente afirmou na inicial que:
(i) em 1963 ingressou no serviço notarial por meio de
concurso público, assumindo o cargo na comarca de Pedro
Afonso;
(ii) ainda em 1963 foi transferido, por permuta, para a
comarca de Porangatu;
(iii) em 1996 fora transferido, por decreto judicial,
para a comarca de Rio Verde, na qual permaneceu até
2008, quando foram desconstituidos, pelo Decreto nº 525,
os atos administrativos de efetivação irregular de
titulares nos serviços notariais e de registro.
Alegou que suas duas remoções foram regulares pois não haveria
necessidade de concurso de provas e títulos para tais. A
exigência já teria sido cumprida pelo requerente em seu ingresso
em 1963.
Pediu a desconstituição do Decreto 525/08, que declarava a
vacância de serventias extrajudiciais do Estado de Goiás, em seu
caso específico e reintegração na comarca de Rio Verde.
Solicitado a prestar informações, o TJGO informou que o pedido
de remoção foi deferido com base no instituto da transferência,
"com fundamentação no art. 19 da Lei 10.459/88, que modifica e
complementa a legislação relativa à Organização Judiciária
Estadual".
Informou ainda que a serventia da comarca de Porangatu encontrase desprovida de titular, sendo que em junho de 2008 foi
publicado edital para provimento da vaga pelo critério de
ingresso.
Em decisão monocrática observei que o requerente encontrava-sa
irregularmente investido na serventia extrajudicial de Registro
de Imóveis, Pessoas Jurídicas, Títulos, Documentos e Protestos
da comarca goiâna de Rio Verde. Isso em decorrência de sua
transferência em 1996, sem o necessário concurso de provas e
títulos, conforme estabelecido pela Constituição Federal e pela
Lei 8.935/94, na redação do art. 16 então em vigor.
Determinei, portanto, o seu retorno ao 1º Tabelionato de Notas e
Registro de Imóveis da Comarca de Porangatu, última serventia
pelo requerente regularmente ocupada.
O requerente recorreu, fundamentando seu pedido baseado em
informação nova, trazida aos autos apenas neste recurso: haveria
decisão jurisdicional favorável a seu pleito, e que a decisão
monocrática por mim proferida a afrontaria.
É o relatório.
VOTO
O SENHOR CONSELHEIRO JOAQUIM FALCÃO:
Mantenho
o
proferidas.
entendimento
tido
nas
decisões
monocráticas
São dois os questionamentos trazidos a apreciação deste Conselho
pelo requerente:
(i)
necessidade
de
concurso
para
provimento
serventias extrajudiciais vagas por remoção e;
de
(ii) possibilidade de julgamento, deste CNJ, de questão
jurisdicionalizada sem trânsito em julgado.
Passemos à análise dos pontos, ambos já pacificamente decididos
por este Conselho:
(i) a necessidade de realização de concurso público para
provimento de serventias extrajudiciais após 1988, para ingresso
ou remoção é inafastável. É determinação constitucional. Remoção
inconstitucional deve ser desfeita, determinando-se o retorno do
titular à sua serventia de origem.
Cito o PP 200810000009720 de relatoria do Conselheiro Antônio
Umberto, cujo voto foi acolhido pela maioria do Plenário:
PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. SERVENTIAS EXTRAJUDICIAIS.
REMOÇÃO SEM CONCURSO PÚBLICO. NULIDADE. Irregular a
remoção
de
titular
de
serventia,
no
ambiente
constitucional atual, ainda que respaldada em lei
local, sem a realização do respectivo concurso.
Exigência constitucional de concurso tanto para os
provimentos originários (ingressos) quanto para os
provimentos derivados (remoções). Pedido acolhido.
(...)
a) o retorno de LENIR DE CASTRO RIBAS para o posto
de titular efetivo do REGISTRO CIVIL DE PESSOAS
NATURAIS, acumulando precariamente O REGISTRO DE
TÍTULOS E DOCUMENTOS E DE PESSOAS JURÍDICAS DA
COMARCA DE TELÊMACO BORBA e o oferecimento do
REGISTRO DE IMOVEIS DE TELÊMACO BORBA em concurso
público no prazo estabelecido no art. 16 da Lei nº
8.935/94 e
Assim, quanto à necessidade de realização de concurso público
para
ingresso
e
também
para
remoção
em
serventias
extrajudiciais, a questão é pacífica: após 1988 são nulos os
atos de transferência, permuta ou qualquer outra forma de
ingresso ou de mudança de serventia extrajudicial que não seja
através de concurso público.
(ii) a jurisdicionalização de questão também submetida ao CNJ
não impede sua análise por este enquanto não houver trânsito em
julgado. Cito decisão conjunta dos PCAs 323, 618, 5398, 3869 e
6822:
I) Matéria
deste CNJ
preliminar:
possibilidade
de
atuação
O TJCE alega que o CNJ não pode atuar no presente
caso porque a questão já estaria jurisdicionalizada.
Questões jurisdicionalizadas podem, sim, ser objeto
de apreciação por este Conselho quando ainda não
houver decisão com trânsito em julgado.
Reitero a posição já adotada pelo Plenário deste
CNJ, no PCA 14942, de minha relatoria, e em cuja
decisão se lê:
"Em resumo: as decisões judiciais de caráter
administrativo do CNJ são decisões dotadas de
eficácia e cogência, e, como já pisado e
repisado,
de
presunção
de
legalidade,
de
veracidade, são imperativas e auto-executáveis."
Logo, não havendo decisão transitada em julgado, não
há nada que impeça a apreciação deste caso pelo CNJ.
Rejeito a preliminar apontada pelo TJCE, não vendo
impedimentos para análise do mérito.
(PCA 200810000005398. Decisão monocrática. Relator
Conselheiro Joaquim Falcão)
A possibilidade de julgamento administrativo de questão já
submetida à análise jurisdicional também encontra eco na decisão
da Reclamação Disciplinar 200810000007954, com voto do Ministro
Gilson Dipp em tal sentido, acolhido por unanimidade.
Assim, a jurisdicionalização da questão,
julgado, não obsta a atuação deste CNJ.
sem
trânsito
em
Interesse público e interesse privado
O requerente, em seu recurso administrativo, trouxe um "fato
novo" ao conhecimento deste Conselho. "Novo" porque só foi
informado quando se mostrou interessante para o requerente.
Trata-se de decisão jurisdicional sobre a mesma matéria remoção do requerente -, que por ter sido desfavorável a ele foi
ocultada deste CNJ, apesar de ter sido proferida em 9 de
setembro de 2008.
Os
fatos
trazidos
administrativo são:
a
este
Conselho
apenas
no
recurso
(i) o Ministério Público do Estado de Goiás, ajuizou ação
civil pública contra a remoção do requerente sem concurso da
comarca de Porangatu para Rio Verde em 10 de novembro de
1997, há mais de 10 anos, portanto;
(ii) o Poder Judiciário de Goiás, entendeu nula a remoção do
requerente para a comarca de Rio Verde, determinando o seu
retorno para a comarca de Porangatu em 12 de julho de 2007;
(iii) em 9 de setembro de 2008, após apelação do requerente,
a decisão jurisdicional que determinou o seu retorno à
comarca de Porangatu foi suspensa;
(iv) o Conselho Nacional de Justiça, sem ter sido informado
pelo requerente na inicial da existência de tais ações, por
decisão monocrática por mim proferida, também entendeu nula
a transferência do requerente, determinando, de forma
idêntica à decisão de primeiro grau da justiça goiâna, o
retorno de José Ferreira de Paiva para a comarca da
Parangatu.
Ou seja, não há um único entendimento favorável à tese do
requerente. Nem mesmo a apelação interposta por este, já que não
há pronunciamento de mérito, mas apenas suspensão da decisão de
primeiro grau. Por enquanto todas os entendimentos de mérito do
Poder Judiciário, seja na esfera jurisdicional, seja na
administrativa,
são
de
irregularidade
e
de
nulidade
da
transferência realizada em 1996. Todas as análises de mérito,
seja na esfera jurisdicional, seja na administrativa, determinam
o retorno do requerente para a comarca na qual estaria
corretamente investido.
Assim:
a) não existe decisão jurisdicional com trânsito em julgado
sobre a questão, de forma que não vejo impedimento para sua
apreciação por este CNJ, conforme os precedentes apontados;
b) a única decisão jurisdicional de mérito existente é
perfeitamente compatível com a decisão deste CNJ. O entendimento
é absolutamente o mesmo;
c) a decisão jurisdicional em sede de apelação não é de mérito,
apenas suspendeu, sem anular ou reformar a decisão de primeiro
grau. Não há incompatibilidade entre a decisão deste CNJ e a
decisão em apelação porque o mérito não foi analisado nesta
última;
d) o requerente ocultou tais informações em sua inicial. O
requerente se contradiz em sua estratégia ao propor este PCA
junto a este Conselho sem informar da jurisdicionalização da
questão para, apenas após decisão que lhe foi desfavorável,
alegar que o fato encontra-se sub judice.
É preciso, como já disseram as ministras Ellen Gracie e Cármen
Lúcia quando do julgamento da ADI 4140, considerar, além do
interesse individual do requerente, o interesse público em ver
regularizada a situação das serventias extrajudiciais do Estado
de Goiás.
Aqui não se está julgando um direito exclusivamente privado: se
José Ferreira de Paiva tem ou não direito de permanecer como
titular da serventia de Rio Verde.
O que se está discutindo aqui é se o princípio do concurso
público presente no art. 37 da Constituição Federal foi ou não
cumprido. Está se analisando se a obrigatoriedade dos concursos
para ingresso e para remoção em serventias extrajudiciais
previstos na mesma C.F., art 236, desde 1988 - foi cumprida.
E parece que os princípios constitucionais não foram devidamente
resguardados.
Isto posto, considerando que o interesse público encontra-se no
sentido de regularizar a situação das serventias extrajudiciais
do Estado de Goiás através de seu provimento por concurso
público, em respeito aos arts. 37 e 236 da Constituição Federal,
conheço mas nego provimento ao recurso administrativo, mantendo
as determinações da decisão monocrática, quais sejam:
(i) a reintegração do requerente no 1º Tabelionato de Notas
e Registro de Imóveis da Comarca de Porangatu e;
(ii) a manutenção da declaração de vacância do Cartório de
Registro de Imóveis, Pessoas Jurídicas, Títulos, Documentos
e Protestos da Comarca de Rio Verde.
Brasília, 09 de junho de 2009.
JOAQUIM FALCÃO
CONSELHEIRO
Download

FALCÃO, Joaquim. PCA n. 11895