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LITERATURA- Arcadismo
Soneto XCVIII
Destes penhascos fez a natureza
O berço em que nasci: oh! quem cuidara
Que entre penhas tão duras se criara
Uma alma terna, um peito sem dureza!
Amor, que vence os tigres, por empresa
Tomou logo render-me; ele declara
Contra meu coração guerra tão rara
Que não me foi bastante a fortaleza.
Por mais que eu mesmo conhecesse o dano
A que dava ocasião minha brandura,
Nunca pude fugir ao cego engano;
Vós que ostentais a condição mais dura,
Temei, penhas, temei: que Amor tirano
Onde há mais resistência mais se apura.
Claudio Manuel da Costa. Poemas escolhidos. Rio de Janeiro: Ediouro, 1994. 1. (UnB-2º2012) Considerando o poema acima, o
estilo de época em que ele se insere bem
como a relação entre homem e natureza,
assinale a opção correta.
a) A despeito da forte carga emotiva evidenciada
na revelação da natureza, não se verificam,
nesse poema, elementos neoclássicos.
b) Nesse poema, representativo do Arcadismo
brasileiro, combinam-se elementos da
convenção clássica e um lirismo revelador da
relação tensa entre a subjetividade branda do
eu lírico e a natureza dura das penhas.
c) Nesse soneto, caracteristicamente árcade, a
natureza é retratada como lugar místico e
insólito, conhecido na tradição clássica como
locus amoenus.
d) Esse soneto, de forma tipicamente
neoclássica, apresenta um forte pendor para a
objetividade, recorrendo o poeta ao
universalismo para evitar qualquer relação
subjetiva entre homem e natureza.
Texto I
LXXIX
1 Entre este álamo, ó Lise, e essa corrente,
Que agora estão meus olhos contemplando,
Parece que hoje o céu me vem pintando
4 A mágoa triste, que meu peito sente.
www.tenhoprovaamanha.com.br Firmeza a nenhum deles se consente
Ao doce respirar do vento brando;
7 O tronco a cada instante meneando,
A fonte nunca firme, ou permanente.
Na líquida porção, na vegetante
10 Cópia daquelas ramas se figura
Outro rosto, outra imagem semelhante:
Quem não sabe que a tua formosura
13 Sempre móvel está, sempre inconstante,
Nunca fixa se viu, nunca segura?
Cláudio Manoel da Costa. Apud Domício Proença Filho. A poesia dos inconfidentes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2002, p. 85. Texto II
O espelho
O
espelho: atra
vés
de seu líquido nada
me des
dobro.
Ser quem me
olha
e olhar seus
olhos
nada de
nada
duplo
mistério.
Não amo
o espelho: temo-o.
Orides Fontela. Poesia reunida (1969-­‐1996). São Paulo: Cosac Naify; Rio de Janeiro: 7letras, 2006, p. 212. 2. (UnB-1º2012) Na atmosfera bucólica do
soneto LXXIX, submetida às convenções da
poesia pastoral, a natureza é apresentada
como cenário estático e artificial, no qual o eu
lírico não encontra espaço para manifestar, de
forma mais profunda, as verdadeiras emoções
humanas.
3. (UnB-1º2012) No soneto LXXIX, há
referências ao próprio ato de representação
artística nas seguintes imagens poéticas:
“Parece que hoje o céu me vem pintando”
(v.3) e “Na líquida porção, na vegetante /
Cópia daquelas ramas se figura” (v.9-10).
4. (UnB-1º2012) A adoção de formas clássicas
europeias, tanto na lírica de Cláudio Manoel
da Costa quanto nos épicos Uraguai, de
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Basílio da Gama, e Caramuru, de Santa Rita
Durão, impediu que a realidade da Colônia
fosse inserida na produção literária do
Arcadismo brasileiro.
5. (UnB-1º2012) A temática lírico-amorosa do
soneto LXXIX evoca o mito de Narciso, como
evidenciam os versos em que o eu lírico mira
sua imagem nas águas de uma fonte, o que
se realiza, no entanto, de maneira renovada,
uma vez que, no reflexo artístico produzido
pelos versos, estão associados os conflitos do
mundo interno do eu lírico à instabilidade do
mundo.
GABARITO
1. B 2. E 3. C 4. E 5. C LITERATURA- Barroco
Queixa-se o poeta em que o mundo vay errado, e
querendo
emendâlo o que tem por empreza difficultosa.
1 Carregado de mim ando no mundo,
E o grande peso embarga-me as passadas,
Que como ando por vias desusadas,
4 Faço o peso crescer, e vou-me ao fundo.
O remédio será seguir o imundo
Caminho, onde dos mais vejo as pisadas,
7 Que as bestas andam juntas mais ornadas,
Do que anda só o engenho mais profundo.
Não é fácil viver entre os insanos,
10 Erra quem presumir que sabe tudo,
Se o atalho não soube dos seus danos.
O prudente varão há de ser mudo,
13 Que e melhor neste mundo mar de enganos
Ser louco cos demais, que ser sisudo.
Gregório de Matos. Crônica do viver baiano seiscentista – obra poética completa – códice James Amado. 4.ª ed. Rio de Janeiro: Record, V. 1 1999, p. 347. 1. (UnB-1º2013)
A
oração
“seguir
o
imundo/Caminho” (v.5-6) é aposto da
expressão “O remédio” e evoca, no nível
www.tenhoprovaamanha.com.br semântico e interpretativo, a cura das dores
de que o poeta se queixa.
2. (UnB-1º2013) Há elementos que permitem
interpretar que, no poema, e proposta a
valorização da prudência diante da insânia do
mundo.
3. (UnB-1º2013) No poema apresentado, a
sensibilidade barroca e caracterizada por um
jogo de antíteses, fortemente marcado na
oposição entre as imagens das “bestas” (v.7)
e do “engenho” (v.8).
4. (UnB-1º2013) O tema do “desconcerto do
mundo”, tão caro à estética clássica, esta
representado no texto; no entanto,
diferentemente da postura renascentista,
Gregório de Matos, em seu poema, ironiza a
solução para o mundo desventurado.
GABARITO
1. E
2. E
3. C
4. C
LITERATURA- Modernismo
Barricada
1 Todos os passarinhos da Praça da Republica
Voaram
Todas as estudantes
4 Morreram de susto
Nos uniformes de azul e branco
As telefonistas tiveram uma sincope de fios
7 Só as arvores não desertam
Quando a noite luz
Oswald de Andrade. Primeiro caderno do aluno de poesia
Oswald de Andrade. São Paulo: Globo, 2006, p. 71.
1. (UnB-1º2013) Ao unir verso e desenho,
Oswald criou um espaço de interpretação da
poesia em que associou matéria líricoreflexiva a uma forma quase infantil de
percepção da realidade.
2. (UnB-1º2013) Na poesia oswaldiana, a falta de
pontuação, a predominância do uso de
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substantivo em detrimento do verbo e a
justaposição de imagens confirmam o
exercício critico da linguagem assumido pelo
poeta.
3. (UnB-1º2013) A poesia de Oswald de Andrade
exerceu forte influencia na formacao do
movimento concretista brasileiro, como sugere
a produção do poema Barricada, cujos versos
são entrecortados por imagens.
4. (UnB-1º2013) A partir da representação de
cenas do cotidiano, Oswald de Andrade
construiu um lirismo amoroso fortemente
marcado pela idealização de suas
companheiras durante a vida.
5. (UnB-1º2013) A simplicidade dos versos do
poema Barricada e característica contrastante
com o restante da produção poética de
Oswald de Andrade, em que predominam
cortes elípticos.
Trecho 1: Nhenhem? Eu cacei onça, demais. (...) Eu
não mato mais onça, mato não. Onça meu parente.
Trecho 2: Eu sou onça... Eu-onça! (...) Mecê acha que
eu pareço onça? Mas tem horas em que eu pareço
mais.
Trecho 3: Hum, nhem? Cê fala que eu matei? Eu sou
onça. Jaguaretê tio meu, irmão de minha mãe, tutira...
Meus parentes! Meus parentes!
Trecho 4: De repente, eh, eu oncei... Iá. (...) Levei pra
o Papa — Gente. Papa gente, onça chefe, onço
comeu jababora Gugué.
Trecho 5: Mecê tá ouvindo, nhem? Tá aperceiando...
Eu sou onça, não falei? Axi. Não falei — eu viro onça?
Onça grande, tubixaba.
Trecho 6: Mecê brinca não, vira esse revólver pra lá.
(...) Ói: cê quer me matar, ui?
João Guimarães Rosa. Meu tio, o Iauaretê. In: Ficção completa. V. II. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, p. 825-­‐52. 6. (UnB-2º2012) A obra literária de João
Guimarães Rosa é uma das grandes
realizações da literatura brasileira que tratam
da urbanidade, sendo fortemente influenciada
pelo recurso literário da ironia machadiana.
7. (UnB-2º2012) Guimarães Rosa, no trabalho
metapoético com a materialidade da
linguagem, uma das bases da construção de
www.tenhoprovaamanha.com.br sua ficção, rompe com os padrões
morfossintáticos do português padrão.
Mapa
Me colaram no tempo, me puseram
uma alma viva e um corpo
desconjuntado. Estou
limitado ao norte pelos sentidos, ao sul
pelo medo,
a leste pelo Apóstolo São Paulo, a
oeste pela minha educação.
(...)
Me puseram o rótulo de homem, vou rindo, vou
andando, aos
solavancos.
Danço. Rio e choro, estou aqui, estou ali,
desarticulado,
gosto de todos, não gosto de ninguém, batalho com os
espíritos do ar,
alguém da terra me faz sinais, não sei mais o que é o
bem nem
o mal.
Murilo Mendes. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2006. 8. (UnB-2º2012) Depreende-se dos versos
apresentados que a representação do que
seria propriamente humano no homem inclui,
como limites, a erudição e a religiosidade.
9. (UnB-2º2012) Depreende-se da leitura do
texto que a identidade assumida pelo eu lírico
contrasta com a ideia de orientação
convencionalmente atribuída à palavra mapa.
10. (UnB-2º2012) Um mapa — em geral,
representação convencional da configuração
da superfície da Terra — tem pontos cardeais
como pontos de referência. No poema, essa
representação é feita de forma inusitada,
porque a configuração é o homem. Observe,
nesse mapa, as informações sobre o sul — o
que é o sul? — e compare-as com as do norte
— o que é o norte? Segundo os ensinamentos
da cartografia moderna, interpretar um mapa é
ir além da pergunta “onde?”; na análise do
poema, a interpretação recai, em especial, na
configuração humana. Tendo como base essa
representação, interprete, utilizando a
modalidade padrão da língua portuguesa, os
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versos “(...) Estou/limitado ao norte pelos
sentidos, ao sul/pelo medo”.
O Bicho
Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.
Manuel Bandeira. Estrela da vida inteira. São Paulo: Ática, p. 134.
11. (UnB-2º2012) Assim como alguns poemas de
Manuel Bandeira, também a obra Pauliceia
Desvairada, de Mário de Andrade, é
conhecida pelo registro poético do cotidiano
da cidade, no âmbito do primeiro período do
Modernismo brasileiro.
12. (UnB-2º2012) A integração entre homem e
natureza, demonstrada tanto em O Bicho
quanto no trecho apresentado do romance
Iracema, de José de Alencar, apoia-se no
mesmo pressuposto: o homem se animaliza
quando vivencia uma situação de abandono e
miséria.
13. (UnB-2º2012) O poema de Manuel Bandeira
inclui elementos do mundo animal, propondo
uma visão idealizada da relação que o homem
moderno mantém com a natureza.
14. (UnB-2º2012) Representativo do Modernismo
brasileiro, esse poema chama a atenção para
o fato cotidiano e para o esforço de tradução
poética desse fato por meio de uma linguagem
burilada em formato clássico.
15. (UnB-2º2012) O poema está organizado, nas
duas primeiras estrofes, como uma narrativa,
em linguagem metafórica, do comportamento
do homem, o que potencializa o espanto
registrado pelo narrador no último verso.
Ao longo da história da literatura brasileira,
foram inúmeros os autores que se expressaram
www.tenhoprovaamanha.com.br segundo as diretrizes de uma literatura regionalista.
Uma das grandes estudiosas do fenômeno, Lígia
Chiappini, caracteriza-o assim: “Na verdade, a história
do regionalismo mostra que ele sempre surgiu e se
desenvolveu em conflito com a modernização, a
industrialização e a urbanização. Ele é, portanto, um
fenômeno moderno e, paradoxalmente, urbano.”
Do beco ao belo. In: Revista de Estudos Históricos. Rio de Janeiro, vol. 8, n.º 15, 1995, p. 155. 16. (UnB-2º2012) A partir da leitura do texto
acima, redija uma definição de regionalismo
literário e indique, no mínimo, duas obras da
literatura brasileira que o exemplifiquem.
Preste atenção por favor
na história que vou contar
ela explica o que é cordel
grande manifestação popular.
Paulo Araújo. Internet: <www.bibceuguarapiranga.blogs.com>.
Manifestação popular caracterizada por poesias
escritas em folhetos, a literatura de cordel originou-se
na Europa em meados do século XII. Em Portugal,
escritores amadores usavam cordões para
pendurarem e divulgarem suas produções em lugares
públicos. Com a vinda dos portugueses ao Brasil, a
tradição de contar histórias disseminou-se pela região
Nordeste, tornando-se um dos símbolos da cultura e
memória nordestina. No início, como a maioria das
pessoas não sabia ler e escrever, as poesias eram
apenas decoradas e recitadas em feiras e praças.
Mais tarde, passaram a ser impressas em folhetos,
cujas capas eram ilustradas em xilogravura, e
afirmaram-se como manifestação artística e popular
nas décadas 60 e 70 do século passado. A
importância do cordel não se limita à literatura. O
cordel se expande como registro histórico da cultura
nordestina, reverberando nas manifestações artísticas,
tais como teatro, dança, cinema, música e artes
visuais.
17. (UnB-1º2012) No Brasil dos anos 20, os
organizadores da Semana de Arte Moderna
expressaram evidente paradoxo: ao mesmo
tempo em que defendiam a arte livre das
amarras de um passado cultural dissociado do
Brasil real, apoiavam o regime político vigente,
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por considerá-lo democrático e socialmente
justo.
O espelho
Se quer seguir-me, narro-lhe; não uma
aventura, mas experiência, a que me induziram,
alternadamente, séries de raciocínios e intuições.
Tomou-me tempo. Surpreendo-me, porém, um tanto à
parte de todos, penetrando conhecimento que os
outros ainda ignoram. O senhor, por exemplo, que
sabe e estuda, suponho nem tenha ideia do que seja,
na verdade — um espelho? Decerto, das noções de
física, com que se familiarizou, as leis da ótica.
Reporto-me ao transcendente, todavia...
O espelho, são muitos, captando-lhe as feições;
todos refletem-lhe o rosto, e o senhor crê-se com
aspecto próprio e praticamente inalterado, do qual lhe
dão imagem fiel. Mas — que espelho? Há-os bons e
maus, os que favorecem e os que detraem; e os que
são apenas honestos, pois não. E onde situar o nível e
ponto dessa honestidade ou fidedignidade?
Como é que o senhor, eu, os restantes
próximos, somos, no visível? O senhor dirá: as
fotografias o comprovam. Respondo: que, além de
prevalecerem para as lentes das máquinas objeções
análogas, seus resultados apoiam antes que
desmentem a minha tese, tanto revelam superporemse aos dados iconográficos os índices do misterioso.
Ainda que tirados de imediato, um após outro, os
retratos sempre serão entre si muito diferentes. E as
máscaras, moldadas nos rostos? Valem, grosso modo,
para o falquejo das formas, não para o explodir da
expressão, o dinamismo fisionômico. Não se esqueça,
é de fenômenos sutis que estamos tratando.
Resta-lhe argumento: qualquer pessoa pode, a
um tempo, ver o rosto de outra e sua reflexão no
espelho. O experimento, por sinal ainda não realizado
com rigor, careceria de valor científico, em vista das
irredutíveis deformações, de ordem psicológica. Além
de que a simultaneidade torna-se impossível, no fluir
de valores instantâneos. Ah, o tempo é o mágico de
todas as traições... E os próprios olhos, de cada um de
nós, padecem viciação de origem, defeitos com que
cresceram e a que se afizeram, mais e mais. Os olhos,
por enquanto, são a porta do engano; duvide deles,
dos seus, não de mim. Ah, meu amigo, a espécie
humana peleja para impor ao latejante mundo um
www.tenhoprovaamanha.com.br pouco de rotina e lógica, mas algo ou alguém de tudo
faz brecha para rir-se da gente...
Vejo que começa a descontar um pouco de sua
inicial desconfiança quanto ao meu são juízo.
Fiquemos, porém, no terra a terra. Rimo-nos, nas
barracas de diversões, daqueles caricatos espelhos,
que nos reduzem a mostrengos, esticados ou
globosos. Mas, se só usamos os planos, deve-se a
que primeiro a humanidade mirou-se nas superfícies
de água quieta, lagoas, fontes, delas aprendendo a
fazer tais utensílios de metal ou cristal. Tirésias,
contudo, já havia predito ao belo Narciso que ele
viveria apenas enquanto a si mesmo não se visse...
Sim, são para se ter medo, os espelhos...
João Guimarães Rosa. O espelho. In: Primeiras estórias. Ficção completa. Rio
de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, v. 2, p. 437-55 (com adaptações).
18. (UnB-1º2012) Em relação ao questionamento
“Como é que o senhor, eu, os restantes
próximos, somos, no visível?” (l.11), a
argumentação levada a efeito pelo narrador
acerca da imagem especular aproxima visão
idealizante e crença, evocadas, no texto, a
partir do aparato experimental da ciência.
19. (UnB-1º2012) Há, no trecho selecionado do
conto de Guimarães Rosa, reflexão sobre o
próprio gesto de representação literária, uma
vez que a literatura produz um conhecimento
do mundo que, muitas vezes, convulsiona a
imagem da realidade refletida “nas superfícies
de água quieta” (l.30).
20. (UnB-1º2012) A aproximação entre o discurso
filosófico e o literário, proposta pelo narrador
ao seu interlocutor, produz como efeito
estético a composição de fechamento do texto
em si mesmo, o que impede o leitor de mirarse no espelho da narrativa.
21. (UnB-1º2012) No fragmento de texto
apresentado, extraído de um conto de
Guimarães Rosa, o estilo de composição
diverge esteticamente do verificado na obraprima do autor, Grande Sertão: Veredas,
caracterizada pelo regionalismo pitoresco e
folclórico, avesso a reflexões filosóficas,
transcendentes ou existenciais.
Texto I
LXXIX
1 Entre este álamo, ó Lise, e essa corrente,
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Que agora estão meus olhos contemplando,
Parece que hoje o céu me vem pintando
4 A mágoa triste, que meu peito sente.
Firmeza a nenhum deles se consente
Ao doce respirar do vento brando;
7 O tronco a cada instante meneando,
A fonte nunca firme, ou permanente.
Na líquida porção, na vegetante
10 Cópia daquelas ramas se figura
Outro rosto, outra imagem semelhante:
Quem não sabe que a tua formosura
13 Sempre móvel está, sempre inconstante,
Nunca fixa se viu, nunca segura?
Cláudio Manoel da Costa. Apud Domício Proença Filho. A poesia dos inconfidentes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2002, p. 85. Texto II
O espelho
O
espelho: atra
vés
de seu líquido nada
me des
dobro.
Ser quem me
olha
e olhar seus
olhos
nada de
nada
duplo
mistério.
Não amo
o espelho: temo-o.
Orides Fontela. Poesia reunida (1969-­‐1996). São Paulo: Cosac Naify; Rio de Janeiro: 7letras, 2006, p. 212. 22. (UnB-1º2012) Os poemas LXXIX e O espelho
abordam tema semelhante de maneira
bastante diferente. Considerando que o
soneto de Cláudio Manoel da Costa foi escrito
em 1768 e o poema de Orides Fontela, em
1986, redija um texto, na modalidade da
língua escrita padrão, abordando as
diferenças formais (verso, rima etc.) e
temáticas (configuração do eu lírico diante do
espelho) entre as duas obras.
www.tenhoprovaamanha.com.br Manifesto Antropófago
Só a antropofagia nos une. Socialmente.
Economicamente.
Filosoficamente. (...) Tupy or not tupy, that is the
question. (…) Só me interessa o que não é meu.
Lei do homem. Lei do antropófago. (...) Contra
as elites vegetais. Em comunicação com o solo. (...)
Antes
dos portugueses descobrirem o Brasil, o Brasil
tinha descoberto a felicidade. A alegria é a
prova dos nove. (...) A peste dos chamados povos
cultos e cristianizados. É contra ela que estamos
agindo.
Oswald de Andrade
Ano 374 da deglutição do bispo Sardinha
Tarsila deu de presente de aniversário a Oswald um
quadro poderoso, perturbador, onírico, ancestral.
Oswald se transfigurou. “O que será isso?”, quis saber.
Oswald achou que deveria tratar-se de um gigante e
sugeriu que o batizassem com “um nome selvagem”.
Tarsila arranjou, então, um dicionário de tupi e, nele,
encontram “aba” (homem) e “poru” (que come). Nascia
Abaporu, o Antropófago. Estava fundado um novo
movimento: o Movimento Antropófago.
História do Brasil. São Paulo: Publifolha, 1997, p. 206 (com adaptações). 23. (UnB-2º2011) Redija um texto, na modalidade
padrão da língua portuguesa, relacionando o
Movimento Antropófago à Semana de Arte
Moderna de 1922 e esclarecendo a
contribuição do principal fundamento desse
movimento para a análise da cultura brasileira.
Não se sabe ao certo quando os primeiros
escravos africanos foram trazidos para o Brasil. No
entanto, é somente a partir do alvará de D. João III de
29 de março de 1549, que faculta o “resgate e
recebimento de escravos da costa da Guiné e da ilha
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de São Tomé” para auxílio da cultura da cana e do
trabalho dos engenhos, que a importação de escravos
africanos para o Brasil cresce de forma vertiginosa. Já
no final do século XVI, os africanos ocupavam
majoritariamente a base da sociedade colonial
brasileira, o que iria acentuar-se no século XVII. É
possível que os primeiros escravos africanos tenham
tido contato com a língua geral, mas, com a redução
da presença indígena na zona açucareira, pode-se
dizer que os escravos passaram a ter contato, desde
cedo, com o português. Os escravos que eram
incapazes de se comunicar nessa língua eram
chamados de boçais, em oposição aos que
demonstravam conhecer o português, que eram
chamados de ladinos. No decorrer do século XVIII,
com o ciclo do ouro, aumentou a onda migratória vinda
de Portugal, e o tráfico negreiro também se orientou
para as demandas cada vez maiores de mão de obra
para a mineração, tendo aumentado, portanto, o
acesso dos escravos africanos à língua portuguesa.
Dante Lucchesi. História do contato entre línguas no Brasil. In: Dante Lucchesi, Alan Baxter e Ilza Ribeiro (Org.). O português afro-­‐brasileiro. Salvador: EDUFBA, 2009, p. 47-­‐8 (com adaptações). O gramático
Os negros discutiam
Que o cavalo sipantou
Mas o que mais sabia
Disse que era
Sipantarrou.
Oswald de Andrade. Poesias reunidas. 5.aed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978 24. (UnB-2º2011) Considerando, de um lado, a
questão linguística referida no texto e, de
outro, as intenções propostas por Oswald de
Andrade no Manifesto Pau-Brasil, pode-se
apontar que, no poema, há tematização de
aspectos relativos ao contato linguístico no
Brasil colônia, como evidenciado na dicotomia
“boçais”/“ladinos” (l.10-11).
25. (UnB-2º2011) Ainda que se desconheça o
significado dos verbos que são objeto de
comparação no poema de Oswald de Andrade
ou, ainda, admitindo-se a hipótese de que tais
vocábulos não pertençam ao léxico da língua
portuguesa, é correto inferir que, na discussão
a que o poema se refere, os interlocutores
demonstram capacidade de aplicar elementos
estruturais da morfologia da língua
portuguesa.
www.tenhoprovaamanha.com.br Erro de português
Quando o português chegou
Debaixo duma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena! Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
O português
Oswald de Andrade. Poesias reunidas. 5.ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978. Quando aqui aportaram os portugueses, há
mais de 500 anos, falavam-se, no país, mais de mil
línguas indígenas; tal profusão linguística constitui-se
numa situação semelhante à que ocorre, hoje, nas
Filipinas (com 160 línguas), na Índia (com 391 línguas)
ou, ainda, na Indonésia (com 663 línguas).
Gilvan Müller de Oliveira. Brasileiro fala português: monolinguismo e preconceito linguístico. In: Revista Linguagem. Internet: <www.letras.ufscar.br> (com adaptações). 26. (UnB-2º2011) No poema, o par opositivo
vestir/despir representa metaforicamente a
interação entre o colonizador português e o
indígena.
27. (UnB-2º2011) No poema, Oswald de Andrade
empregou a técnica modernista da colagem,
como evidencia a transposição, para o formato
de blague do poema-piada, de informações
factuais presentes em textos da literatura
quinhentista.
28. (UnB-2º2011) O emprego da redondilha
menor, metrificação típica das formas literárias
populares, estabelece proximidade formal e
linguística do poema Erro de português com
as modalidades coloquial e popular da língua
portuguesa.
29. (UnB-2º2011) No título do poema, a expressão
“de português” admite dupla interpretação,
que se mantém nos versos.
GABARITO
1. C
2. C
3. C
4. E
5. E
6. E
7. C
8. E
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Português
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TIPO D
C
E
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E
C
TIPO D
E
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C
E
E
TIPO D
TIPO D
C
C
C
E
E
E
LITERATURA- Pósmodernismo
No descomeço era o verbo.
Só depois é que veio o delírio do verbo.
O delírio do verbo estava no começo, lá onde a
criança diz: Eu escuto a cor dos passarinhos.
A criança não sabe que o verbo escutar não funciona
para cor, mas para som.
Então se a criança muda a função de um verbo, ele
delira.
E pois.
Em poesia que é voz de poeta, que é a voz de fazer
nascimentos —
O verbo tem que pegar delírio.
quanto designar uma das categorias
gramaticais.
3. (UnB-1º2013) A relação entre “verbo” e
“descomeço” guarda, de forma inversa,
intertextualidade com a Bíblia, o que
metaforicamente pode aludir a analogia entre
o surgimento do mundo e o nascimento da
poesia.
[...]
1 uma dança
de espadas
esta
4 escrita
delirante
lâminas cursivas
7 a lua
entre dois
dragões
10 com uma haste
de bambu
passar
13 por entre lianas
sem desenreda-las
Haroldo de Campos. Signância quase céu. Melhores poemas de Haroldo de
Campos. Seleção de Inês Oseki Dépré. 3.ª ed. São Paulo: Global, 2000, p. 82.
4. (UnB-1º2013) Das associações presentes no
fragmento do poema, depreende-se que a
“escrita delirante”, ou seja, a produção de um
poema, requer minucioso cuidado.
Manoel de Barros. O livro das ignorãças – poesia completa. São Paulo: Leya, 2010, p. 301.
1. (UnB-1º2013) A poesia e definida no poema
apresentado como uma linguagem em delírio,
o que indica, portanto, que a invenção poética
deve seguir as vias da loucura, e não as da
razão.
2. (UnB-1º2013) No poema apresentado, Manoel
de Barros usa de forma ambígua o vocábulo
“verbo”, que tanto pode significar palavra
www.tenhoprovaamanha.com.br In: Haroldo de Campos (Org.). Ideograma: lógica, poesia, linguagem. 4.ª ed. São Paulo: EDUSP, 2000, p. 57. 5. (UnB-1º2013) No poema acima, Haroldo de
Campos, por meio da técnica ideogramática,
busca aproximar-se da lógica metafórica dos
ideogramas chineses. A união do ideograma
que significa “coração” com o que significa
“meio” resulta no sentido de “lealdade”.
Considerando esse contexto, redija um texto,
8
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Português
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na modalidade padrão da língua, definindo
metáfora. Apresente um exemplo extraído do
trecho do poema contido na obra Signância
quase céu, de Haroldo de Campos, seguido
de interpretação.
7 O ônibus sacoleja. Adeus, Rimbaud,
relógio de lilases, concretismo,
neoconcretismo, ficções de juventude, adeus,
que a vida
eu a compro à vista aos donos do mundo.
Ao peso dos impostos, o verso sufoca,
a poesia agora responde a inquérito policial-militar.
Digo adeus à ilusão
mas não ao mundo. Mas não à vida,
meu reduto e meu reino.
Do salário injusto,
da punição injusta,
da humilhação, da tortura,
do terror,
retiramos algo e com ele construímos um artefato
um poema
uma bandeira.
10 13 [...]
1 o ar
lapidado: veja
como se junta esta palavra
4 a esta outra
linguagem: minha
consciência (um paralelogramo
7 de forcas não uma simples
equação a uma única incógnita): esta
linguagem se faz de ar
10 e corda vocal
a mão que intrinca o fio da
treliça o fôlego
13 que junta esta aquela
voz: o ponto
de torção
16 trabalho diáfano mas que
se faz (perfaz?) com os cinco
sentidos.
Haroldo de Campos. Educação dos cinco sentidos. Melhores poemas de Haroldo de Campos – seleção de Inês Oseki Dépré. 3.a ed. São Paulo: Global, 2000, p. 92. 6. (UnB-1º2013) A referência à exclusão de uma
das linguagens formais evoca a ideia de
opção por uma composição poética em que se
recusa o mistério e, assim, denuncia-se o
esvaziamento da capacidade de comunicação.
7. (UnB-1º2013) No verso 17, a duvida do poeta
quanto a pertinência do emprego da forma
verbal “perfaz” deve-se a perda da função da
linguagem no que se refere a junção das
palavras no poema.
Agosto 1964
Entre lojas de flores e de sapatos, bares,
mercados, butiques
viajo
num ônibus Estrada de Ferro – Leblon
Volto do trabalho, a noite em meio,
fatigado de mentiras.
1 4 www.tenhoprovaamanha.com.br 16 19 22 Ferreira Gullar. Dentro da noite veloz. In: Toda poesia. Rio de Janeiro: José Olympio, 2000. Depois de 21 anos de regime militar, o Brasil
finalmente teria um presidente civil. O político mineiro
Tancredo Neves vencera Paulo Maluf no Colégio
Eleitoral e assumiria o poder no dia 15 de março de
1985. No entanto, um dia antes da posse, com fortes
dores abdominais, ele teve que ser internado no
Hospital de Base, em Brasília. Após sete cirurgias,
Tancredo morreu em 21 de abril, deixando a nação em
choque.
Douglas Attila Marcelino. A despedida de um mártir. In: Revista de História da Biblioteca Nacional, março/2010, p. 58 (com adaptações). 8. (UnB-2º2011) Os elementos em que se baseia
a força lírica do poema podem ser,
corretamente, esquematizados da seguinte
forma:
9. (UnB-2º2011) Nos versos “que a vida/eu a
compro à vista aos donos do mundo” (v.1011), o emprego de pleonasmo confere maior
vigor ao que neles é expresso.
10. (UnB-2º2011) O tratamento lírico de evento
histórico indica que o poema é representante
de uma das tendências da literatura brasileira
dos anos 1960 e 1970, o Neoconcretismo.
9
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Português
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11. (UnB-2º2011) Ao propor, nos dois últimos
versos, relação de equivalência entre “poema”
e “bandeira”, o poeta nega a possibilidade de
a poesia apresentar-se como veículo de
protesto contra as ignomínias referidas no
poema.
12. (UnB-2º2011) Diante dos fatos que relata, o eu
lírico do poema manifesta otimismo, que não o
deixa abandonar os sonhos e a poesia.
GABARITO
1. E
2. C
3. C
4. C
5. TIPO D
6. E
7. E
8. E
9. C
10. E
11. E
12. E
LITERATURA- Realismo,
Naturalismo e Parnasianismo.
Conto de escola
A escola era na Rua do Costa, um sobradinho
de grade de pau. O ano era de 1840. Naquele dia ―
uma segunda-feira, do mês de maio ―, deixei-me
estar alguns instantes na Rua da Princesa a ver onde
iria brincar a manha. Hesitava entre o morro de S.
Diogo e o Campo de Santana, que não era então esse
parque atual, construção de gentleman, mas um
espaço rústico, mais ou menos infinito, alastrado de
lavadeiras, capim e burros soltos. Morro ou campo?
Tal era o problema. De repente disse comigo que o
melhor era a escola. E guiei para a escola.
[...]
Raimundo recuou a mão dele e deu a boca um
gesto amarelo, que queria sorrir. Em seguida, propôsme um negócio, uma troca de serviços; ele me daria a
moeda, eu lhe explicaria um ponto da lição de sintaxe.
Não conseguira reter nada do livro, e estava com
www.tenhoprovaamanha.com.br medo do pai. E concluía a proposta esfregando a
pratinha nos joelhos...
Tive uma sensação esquisita. Não e que eu
possuísse da virtude uma ideia antes própria de
homem; não e também que não fosse fácil empregar
uma ou outra mentira de criança. Sabíamos ambos
enganar ao mestre. A novidade estava nos termos da
proposta, na troca de lição e dinheiro, compra franca,
positiva, toma lá, da cá; tal foi a causa da sensação.
Fiquei a olhar para ele, a toa, sem poder dizer nada.
Machado de Assis. Conto de escola. Internet:<www.dominiopublico.org>. 1. (UnB-1º2013) No fragmento apresentado, é
relatada uma situação que corresponde a um
processo de incorporação de um valor social
que gera conflito no narrador-personagem.
Esse valor social é a liberdade de troca entre
indivíduos.
Razão contra Sandice
Já o leitor compreendeu que era a Razão que
voltava a casa, e convidava a Sandice a sair,
clamando, e com melhor jus, as palavras de Tartufo:
— La maison est a moi, c’est a vous d’en sortir.
Mas e sestro antigo da Sandice criar amor as
casas alheias, de modo que, apenas senhora de uma,
dificilmente lha farão despejar. E sestro; não se tira
dai; ha muito que lhe calejou a vergonha. Agora, se
advertirmos no imenso numero de casas que ocupa,
umas de vez, outras durante as suas estações
calmosas, concluiremos que esta amável peregrina e o
terror dos proprietários. No nosso caso, houve quase
um distúrbio a porta do meu cérebro, porque a
adventícia não queria entregar a casa, e a dona não
cedia da intenção de tomar o que era seu. Afinal, já a
Sandice se contentava com um cantinho no sótão.
— Não, senhora, replicou a Razão, estou
cansada de lhe ceder sótãos, cansada e
experimentada, o que você quer e passar
mansamente do sótão a sala de jantar, dai a de visitas
e ao resto.
— Esta bem, deixe-me ficar algum tempo mais,
estou na pista de um mistério...
— Que mistério?
— De dois, emendou a Sandice: o da vida e o
da morte; peco-lhe só uns dez minutos.
A Razão pôs-se a rir.
10
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Português
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— Hás de ser sempre a mesma coisa... sempre
a mesma coisa... sempre a mesma coisa.
E, dizendo isto, travou-lhe dos pulsos e
arrastou-a para fora; depois entrou e fechou-se. A
Sandice ainda gemeu algumas suplicas, grunhiu
algumas zangas; mas desenganou-se depressa,
deitou a língua de fora, em ar de surriada, e foi
andando...
Machado de Assis. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Ateliê, 2001, p.84-­‐5. 2. (UnB-1º2013) A estrutura frasal do enunciado
“Já o leitor compreendeu” (l.1) permite que o
conteúdo seja interpretado como um pedido
de informação que o narrador-autor dirige ao
interlocutor, no sentido de chamar a atenção
para fatos anteriores e, então, continuar o
relato.
3. (UnB-2º2013) Com base no capitulo
apresentado da obra Memórias Póstumas de
Brás Cubas, de Machado de Assis, e em
relação às características da produção literária
brasileira do século XIX, assinale a opção
correta.
a) A disputa alegórica entre a Razão e a
Sandice representa um dos motivos
temáticos do estilo machadiano, em que
se evidencia a preferência pelos sãos, em
detrimento dos loucos.
b) A ironia, presente no fragmento
apresentado, revela a preocupação do
narrador-personagem em, entre a Razão
e a Sandice, sobrevalorizar a Razão, o
que
constitui
uma
característica
tipicamente machadiana.
c) A escrita alegórica, característica típica do
Realismo, evidencia a critica social, muito
presente nos textos de Machado de Assis.
d) A escrita irônica de Machado de Assis,
expressa, no fragmento apresentado, pela
alegoria Razão e Sandice, revela a
postura critica do narrador-personagem,
que convoca o leitor a se inteirar do
destino da Sandice.
O emplasto
www.tenhoprovaamanha.com.br Um dia de manhã, estando a passear na
chácara, pendurou-se-me uma ideia no trapézio que
eu tinha no cérebro.
Uma vez pendurada, entrou a bracejar, a
pernear, a fazer as mais arrojadas cambalhotas. Eu
deixei-me estar a contemplá-la. Súbito, deu um grande
salto, estendeu os braços e as pernas, até tomar a
forma de um X: decifra-me ou devoro-te.
Essa ideia era nada menos que a invenção de
um medicamento sublime, um emplasto antihipocondríaco, destinado a aliviar a nossa melancólica
humanidade.
Na petição de privilégio que então redigi,
chamei a atenção do governo para esse resultado,
verdadeiramente cristão. Todavia, não neguei aos
amigos as vantagens pecuniárias que deviam resultar
da distribuição de um produto de tamanhos e tão
profundos efeitos. Agora, porém, que estou cá do
outro lado da vida, posso confessar tudo: o que me
influiu principalmente foi o gosto de ver impressas nos
jornais, mostradores, folhetos, esquinas e, enfim, nas
caixinhas do remédio, estas três palavras: Emplasto
Brás Cubas. Para que negá-lo? Eu tinha a paixão do
arruído, do cartaz, do foguete de lágrimas. Talvez os
modestos me arguam esse defeito; fio, porém, que
esse talento me hão de reconhecer os hábeis.
Assim, a minha ideia trazia duas faces, como as
medalhas, uma virada para o público, outra para mim.
De um lado, filantropia e lucro; de outro, sede de
nomeada. Digamos: — amor da glória.
Um tio meu, cônego de prebenda inteira,
costumava dizer que o amor da glória temporal era a
perdição das almas, que só devem cobiçar a glória
eterna. Ao que retorquia outro tio, oficial de um dos
antigos terços de infantaria, que o amor da glória era a
coisa mais verdadeiramente humana que há no
homem e, consequentemente, a sua mais genuína
feição.
Decida o leitor entre o militar e o cônego; eu
volto ao emplasto.
Machado de Assis. Memórias póstumas de Brás Cubas. Obra completa, v. I. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992, p. 514-­‐5 (com adaptações). 4. (UnB-1º2012) O compromisso do narrador
com a verdade dos fatos, honestidade
decorrente da vida além-túmulo, e o seu
interesse pela ciência e pela filosofia
aproximam a narrativa de Memórias Póstumas
de Brás Cubas da forma de narrar do
11
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Português
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Naturalismo, ou seja, da descrição objetiva da
realidade.
5. (UnB-1º2012) As “arrojadas cambalhotas” (l.3)
da ideia inventiva de Brás Cubas relacionamse à forma como Machado de Assis compôs
esse romance, no qual o narrador intercala a
narrativa de suas memórias com divagações
acerca de temas diversos, o que produz
constante vaivém na condução do enredo.
6. (UnB-1º2012) A narrativa das diferentes faces
de uma mesma ideia expressa a singularidade
do realismo machadiano, que ultrapassa as
convenções realistas — focadas em desvelar
as razões econômicas das causas
humanitárias — e alcança dimensão mais
profunda: a de desnudar o cinismo com que
filantropia e lucro são reduzidos a caprichos
do defunto autor em sua “sede de nomeada”
(l.17).
7. (UnB-1º2012) A partir de Memórias
Póstumas de Brás Cubas, o conjunto da
obra machadiana divide-se em duas fases: a
primeira é constituída por obras em que o foco
narrativo é em terceira pessoa e o tema revela
interesse pela sorte dos pobres, como em
Helena, por exemplo; a segunda é formada de
obras construídas a partir da perspectiva do
narrador-personagem associado à classe
dominante local, a exemplo de Dom
Casmurro.
Vaso grego
Esta, de áureos relevos, trabalhada
De divas mãos, brilhante copa, um dia,
Já de aos deuses servir como cansada,
Vinda do Olimpo, a um novo deus servia.
Era o poeta de Teos que a suspendia
Então e, ora repleta ora esvazada,
A taça amiga aos dedos seus tinia
Toda de roxas pétalas colmada.
Depois... Mas o lavor da taça admira,
Toca-a, e, do ouvido aproximando-a, às bordas
Finas hás de lhe ouvir, canora e doce,
Ignota voz, qual se da antiga lira
www.tenhoprovaamanha.com.br Fosse a encantada música das cordas,
Qual se essa a voz de Anacreonte fosse.
Alberto de Oliveira. Poesias completas. In: Crítica. Marco Aurélio de Mello Reis. Rio de Janeiro: EDUERJ, 197, p.144. 8. (UnB-1º2012) No período em que o
Parnasianismo se destacou, o Brasil,
especialmente o Rio de Janeiro, vivia forte
influxo de modernização tardia em relação aos
centros europeus, o que incentivou o consumo
de mercadorias culturais luxuosas, mas
desligadas da realidade local. Assim, verificase que a recorrência a temas advindos da
Antiguidade Clássica era a correspondência
estética dessa tendência manifestada na
objetividade social brasileira.
9. (UnB-1º2012) O refinamento da linguagem e
as formas labirínticas dos versos do soneto
Vaso grego atestam o quanto a poesia
parnasiana no Brasil, país de desigualdade
social, asseverou a distância entre a língua
falada e a escrita.
10. (UnB-1º2012) A temática abordada no soneto
Vaso grego é representativa da tendência
atribuída
pela
crítica
literária
ao
Parnasianismo no Brasil: a descrição
apaixonada de objetos antigos, por meio da
qual se expressava, de forma evidente, a
subjetividade do eu lírico.
11. (UnB-1º2012) A partir da leitura do soneto
Vaso grego, assinale a opção correta a
respeito do tratamento estético conferido aos
mitos antigos pela poética parnasiana.
a) A recorrência a temas mitológicos atraía o
leitor comum e amenizava os efeitos de
distanciamento impostos a ele pelo
rebuscamento da linguagem parnasiana.
b) Os mitos antigos são atualizados na
poesia parnasiana e recebem um
significado poético novo, que promove a
ruptura efetiva com o passado e a tradição
mítica.
c) O tratamento estético dos mitos gregos na
poesia parnasiana aproxima o antigo
mundo mitológico dos problemas
12
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Português
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imediatos e concretos da vida social
brasileira.
d) A presença de elementos da arte e da
mitologia gregas no soneto apresentado
está de acordo com uma máxima do
Parnasianismo: a arte pela arte.
10 de abril
Grande novidade! O motivo da vinda do barão é
consultar o desembargador sobre a alforria coletiva e
imediata dos escravos de Santa-Pia. Acabo de sabêlo, e mais isto, que a principal razão da consulta é
apenas a redação do ato. Não parecendo ao irmão
que este seja acertado, perguntou-lhe o que é que o
impelia a isso, uma vez que condenava a ideia
atribuída ao governo de decretar a abolição, e obteve
esta resposta, não sei se sutil, se profunda, se ambas
as coisas ou nada:
— Quero deixar provado que julgo o ato do
governo uma espoliação, por intervir no exercício de
um direito que só pertence ao proprietário, e do qual
uso com perda minha, porque assim o quero e posso.
Será a certeza da abolição que impele SantaPia a praticar esse ato, anterior de algumas semanas
ou meses ao outro? A alguém que lhe fez tal pergunta
respondeu Campos que não. “Não, disse ele, meu
irmão crê na tentativa do governo, mas não no
resultado, a não ser o desmantelo que vai lançar às
fazendas. O ato que ele resolveu fazer exprime
apenas a sinceridade das suas convicções e o seu
gênio violento. Ele é capaz de propor a todos os
senhores a alforria dos escravos já, e no dia seguinte
propor a queda do governo que tentar fazê-lo por lei.”
Campos teve uma ideia. Lembrou ao irmão que,
com a alforria imediata, ele prejudica a filha, herdeira
sua. Santa-Pia franziu o sobrolho. Não era a ideia de
negar o direito eventual da filha aos escravos; podia
ser o desgosto de ver que, ainda em tal situação, e
com todo o poder que tinha de dispor dos seus
bens,vinha Fidélia perturbar-lhe a ação. Depois de
alguns instantes, respirou largo, e respondeu que,
antes de morto, o que era seu era somente seu. Não
podendo dissuadi-lo, o desembargador cedeu ao
pedido do irmão, e redigiram ambos a carta de alforria.
Retendo o papel, Santa-Pia disse:
— Estou certo que poucos deles deixarão a
fazenda; a maior parte ficará comigo, ganhando o
www.tenhoprovaamanha.com.br salário que lhes vou marcar, e alguns até sem nada —
, pelo gosto de morrer onde nasceram.
Machado de Assis. Memorial de Aires. In: Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2007. 12. (UnB-2º2011) A forma como a narrativa se
desenrola no trecho apresentado demonstra
claramente que o romance Memorial de Aires
integra a fase romântica da obra de Machado
de Assis.
13. (UnB-2º2011) O personagem narrador mostrase simpático à ideia de Santa-Pia libertar os
escravos antes que o Governo o fizesse.
14. (UnB-2º2011) Por meio da apresentação de
um debate entre irmãos relatado por uma
terceira pessoa, a narrativa dá forma a uma
contradição básica da formação da sociedade
brasileira: a dominância dos interesses
privados nos assuntos públicos.
15. (UnB-2º2011) No trecho apresentado, está
clara a intenção de Machado de Assis de
estabelecer intertextualidade com a obra
romântica de José de Alencar, especialmente
com o romance Senhora, cuja intriga central
gira em torno da abolição dos escravos.
16. (UnB-2º2011) A expressividade literária do
texto deve-se, em parte, à combinação das
vozes dos personagens (em discurso direto)
com os comentários sutis do narrador, na
discussão de um tema grave, como é o da
escravidão no Brasil.
17. (UnB-2º2011) De acordo com o narrador, o
personagem Santa-Pia
a) está certo de que os escravos deixarão a
sua propriedade rapidamente, a fim de
procurarem melhor condição de vida na
cidade.
b) considera a abolição um ato do governo
cuja legalidade é inquestionável.
c) está decidido a libertar os escravos e
consulta o desembargador, seu irmão,
apenas para aperfeiçoar a redação do ato
de libertação dos escravos.
d) tem como principal propósito prejudicar a
própria
filha,
deixando-a
sem
propriedades.
GABARITO
1. C
2. E
13
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Português
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3.
4.
5.
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7.
8.
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11.
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13.
14.
15.
16.
17.
D
E
C
C
C
C
C
E
D
E
E
C
E
C
C
LITERATURA- Romantismo
Iracema
Além, muito além daquela serra, que ainda
azula no horizonte, nasceu Iracema.
Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha
os cabelos mais negros que a asa da graúna, e mais
longos que seu talhe de palmeira.
O favo da jati não era doce como seu sorriso;
nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito
perfumado.
Mais rápida que a ema selvagem, a morena
virgem corria o sertão e as matas do Ipu, onde
campeava sua guerreira tribo, da grande nação
tabajara. O pé grácil e nu, mal roçando, alisava
apenas a verde pelúcia que vestia a terra com as
primeiras águas.
Um dia, ao pino do Sol, ela repousava em um
claro da floresta. Banhava-lhe o corpo a sombra da
oiticica, mais fresca do que o orvalho da noite. Os
ramos da acácia silvestre esparziam flores sobre os
úmidos cabelos. Escondidos na folhagem os pássaros
ameigavam o canto.
Iracema saiu do banho: o aljôfar d’água ainda a
roreja, como à doce mangaba que corou em manhã de
chuva.
Enquanto repousa, empluma das penas do
guará as flechas de seu arco, e concerta com o sabiá
da mata, pousado no galho próximo, o canto agreste.
A graciosa ará, sua companheira e amiga,
brinca junto dela. Às vezes sobe aos ramos da árvore
e de lá chama a virgem pelo nome; outras remexe o
uru de palha matizada, onde traz a selvagem seus
perfumes, os alvos fios do crautá, as agulhas da juçara
www.tenhoprovaamanha.com.br com que tece a renda, e as tintas de que matiza o
algodão.
Rumor suspeito quebra a doce harmonia da
sesta. Ergue a virgem os olhos, que o sol não
deslumbra; sua vista perturba-se.
Diante dela e todo a contemplá-la está um
guerreiro estranho, se é guerreiro e não algum mau
espírito da floresta.
Tem nas faces o branco das areias que bordam
o mar; nos olhos o azul triste das águas profundas.
Ignotas armas e tecidos ignotos cobrem-lhe o corpo.
Foi rápido, como o olhar, o gesto de Iracema. A
flecha embebida no arco partiu. Gotas de sangue
borbulham na face do desconhecido.
De primeiro ímpeto, a mão lesta caiu sobre a
cruz da espada; mas logo sorriu. O moço guerreiro
aprendeu na religião de sua mãe, onde a mulher é
símbolo de ternura e amor. Sofreu mais d’alma que da
ferida.
O sentimento que ele pôs nos olhos e no rosto,
não o sei eu. Porém, a virgem lançou de si o arco e a
uiraçaba, e correu para o guerreiro, sentida da mágoa
que causara.
A mão que rápida ferira, estancou mais rápida e
compassiva o sangue que gotejava. Depois Iracema
quebrou a flecha homicida: deu a haste ao
desconhecido, guardando consigo a ponta farpada.
O guerreiro falou:
— Quebras comigo a flecha da paz?
— Quem te ensinou, guerreiro branco, a
linguagem de meus irmãos? Donde vieste a estas
matas, que nunca viram outro guerreiro como tu?
— Venho de bem longe, filha das florestas.
Venho das terras que teus irmãos já possuíram, e hoje
têm os meus.
— Bem-vindo seja o estrangeiro aos campos
dos tabajaras, senhores das aldeias, e à cabana de
Araquém, pai de Iracema.
José de Alencar. Iracema. São Paulo: Ed. Ática, 1991, p. 23. 1. (UnB-2º2012) Nesse fragmento, mecanismos
de descrição consagrados pelo Romantismo
representam simbolicamente o encontro entre
índio americano e explorador europeu.
2. (UnB-2º2012) A personagem Iracema é
revelada pelo narrador como um ser
totalmente integrado ao ambiente selvagem,
que, por sua vez, é estetizado como fonte de
harmonia.
14
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Português
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3. (UnB-2º2012) A figura do índio apresentada
por José de Alencar em Iracema e a criada
por Mário de Andrade em Macunaíma são
semelhantes e fortemente influenciadas pelo
conceito do bom selvagem, formulado por
Rousseau.
4. (UnB-2º2012) O narrador descreve Iracema
estabelecendo, do segundo ao quarto
parágrafos do texto, comparações entre suas
características e elementos da fauna e da flora
brasileiras.
5. (UnB-2º2012) No Romantismo brasileiro, a
natureza
tropical
é
caracterizada
literariamente
como
expressão
da
nacionalidade, o que se verifica no romance
Iracema.
É somente nos meados do século XIX, com
Varnhagen, que a língua do Brasil assume contornos
de
problema
de
interesse
nacional
e,
concomitantemente, passa a constituir objeto de
cogitação, para registro de uma realidade já
consistente e documentável. Varnhagen afirma a
unidade de língua nos dois domínios — o que, a seu
ver, justificava o estudo dos clássicos e a
impossibilidade de separação das duas literaturas —,
mas ressalta, todavia, a diversificação da língua
falada, notadamente na prosódia e no léxico, o que
atribui ao acastelhanamento do português na América.
A caracterização da língua do Brasil como um
português diferenciado — esboçada em Varnhagen —
representa, entre outros aspectos, uma das posições
que delimitarão os debates em torno da língua até o
final do século XIX.
Edith Pimentel Pinto (Org.). O português do Brasil – textos críticos e teóricos – 1820-­‐1920: fontes para a teoria e a história. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1978, p. XVI-­‐XIX (com adaptações). 6. (UnB-2º2011) A caracterização linguística
advogada pelos românticos ficcionistas da
segunda geração corresponde ao que propõe
Varnhagen a respeito da vigência de uma
variante brasileira da fala que se assemelha à
língua portuguesa do período clássico.
www.tenhoprovaamanha.com.br Ainda que aparentemente movida apenas pelo
sentimento geral de lusofobia, característico da época,
a geração romântica, fundamentada nas concepções
evolucionistas da linguística da época, segundo as
quais as línguas se comportavam como seres vivos e,
portanto, nasciam, cresciam, envelheciam e morriam,
aspirou a uma língua própria, a chamada língua
brasileira, instalando uma polêmica, que será
retomada, de forma mais radical, pela primeira
geração modernista, a da Semana de Arte Moderna,
de 1922. Enquanto os românticos — apesar de
acreditarem que o nascimento da chamada língua
brasileira era fato contra o qual não se poderiam
insurgir — não reivindicavam mais que o direito a certa
originalidade, os escritores modernistas serão os que,
de fato, buscarão, na realidade linguística brasileira, as
formas que constituirão a sua expressão.
Tânia C. F. Lobo. Variantes nacionais do português: sobre a questão da definição do português do Brasil. In: Revista Internacional de Língua Portuguesa. Lisboa, dez./1994, p. 9-­‐15. Internet: <www.aulp.org> (com adaptações). 7. (UnB-2º2011) O anseio por uma língua própria
foi representado no romance Iracema, obra
em que José de Alencar inseriu vocábulos e
expressões indígenas, a fim de distinguir o
português literário do Brasil daquele utilizado
em Portugal.
GABARITO
1. C
2. C
3. E
4. C
5. C
6. E
7. C
GRAMÁTICA- Colocação
pronominal.
Esta história começa numa noite de março tão
escura quanto é a noite enquanto se dorme. O modo
como, tranquilo, o tempo decorria era a lua altíssima
passando pelo céu.
15
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Português
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Fora para o lado do mar que aquele homem
pretendera ir, antes mesmo de ter encontrado por feliz
acaso o hotel. Mas — sem mapa, conhecimento ou
bússola — embrenhara-se terra adentro.
“Hoje deve ser domingo” — chegou mesmo a
pensar com certa glória, e domingo seria o grande
coroamento de sua isenção. Tratava-se de seu
primeiro pensamento claro, desde que deixara o hotel.
Na verdade, desde que fugira, era o primeiro
pensamento que não tinha mera utilidade de defesa.
De início, aliás, Martim até não soube o que fazer com
ele. Apenas agitou-se à novidade, e coçou-se voraz
sem parar de andar.
Foi mais além que estacou diante do primeiro
passarinho. O passarinho negro estava pousado num
ramo baixo, à altura de seus olhos; com mão pesada e
potente, o homem pegou-o sem machucá-lo, com a
bondade física que tem uma mão pesada.
Com o leve peso a carregar, o homem
continuou sua marcha entre pedras.
— Não sei mais falar, disse, então, para o
passarinho, evitando olhá-lo...
Só depois pareceu entender o que dissera, e
então olhou face a face o sol. “Perdi a linguagem dos
outros”, repetiu, então, bem devagar, como se as
palavras fossem mais obscuras do que eram, e de
algum modo muito lisonjeiras.
Alguma coisa estava lhe acontecendo. E era
alguma coisa com um significado, embora não
houvesse um sinônimo para essa coisa que estava
acontecendo. E não havia sinônimo para nenhuma
coisa...
Aquele homem rejeitara a linguagem dos outros
e não tinha sequer começo de linguagem própria. E,
no entanto, oco, mudo, rejubilava-se. Assim, ao
remexer agora com fascínio ainda cauteloso na
linguagem morta, ele tentou, por pura experiência, dar
o título antigamente tão familiar de “crime” a essa
coisa tão sem nome que lhe sucedera.
Clarice Lispector. A maçã no escuro. Rio de Janeiro: Rocco, 1998 (com adaptações). 1. (UnB-2º2012) Admite-se como forma variante
de colocação pronominal no trecho “Alguma
coisa estava lhe acontecendo” (l.19) a posição
proclítica do pronome ao verbo auxiliar.
www.tenhoprovaamanha.com.br GABARITO
1. C
2. E
3. E
GRAMÁTICA- Concordância
No processo da Revolução Francesa, quando
destruíram os últimos resquícios do feudalismo na
eufórica noite de 4 de agosto de 1789, os deputados
concordaram em manter o dízimo da Igreja, em vez de
simplesmente aboli-lo sem qualquer compensação.
Mas, desde então, houve sinais de que a promessa
seria abandonada. “Eles desejam ser livres, mas não
sabem ser justos”, reclamou o abade de Seyès,
referindo-se a alguns colegas da Assembleia.
Robespierre não era nem antipadres nem anticlerical;
é difícil determinar sua posição quanto ao futuro da
Igreja na Revolução. Às vezes, era veemente crítico e,
em outras vezes, retornava à interpretação da doutrina
cristã, pois, a seu ver, o cristianismo era a religião dos
pobres e daqueles de coração puro — riqueza
chamativa e luxo não deveriam fazer parte dele. Os
pobres, segundo ele, eram oprimidos não apenas pela
fome, mas também pelo espetáculo escandaloso de
clérigos
autoindulgentes,
que
esbanjavam
insensivelmente o que pertencia aos pobres por
direito.
Ruth Scurr. Pureza fatal: Robespierre e a Revolução Francesa. Rio de Janeiro/São Paulo: Record, 2009, p. 140-­‐1 (com adaptações). 2.
(UnB-1º2012) A estrutura “pertencia aos
pobres por direito” (l.12-13) pode ser
substituída corretamente por era um direito
dos pobres.
A crise da Europa é hoje o maior risco para a
economia mundial, disse o secretário do Tesouro dos
Estados Unidos da América, referindo-se à tensão
entre os bancos e os governos endividados. Disse,
ainda, que a China e outros países emergentes com
superávit nas contas têm espaço bastante para
estimular o consumo interno, aumentar as importações
e compensar a fraca demanda nas economias
desenvolvidas. Para isso, os governos desses países
deveriam deixar suas moedas valorizar-se. Em outras
palavras, o câmbio subvalorizado da China resulta em
16
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Português
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valorização real das moedas de outros países
emergentes, torna seus produtos mais caros e diminui
seu poder de competição no comércio internacional.
Rolf Kuntz. O Estado de S.Paulo, 25/9/2011. 3. (UnB-1º2012) No que se refere a aspectos
semânticos e morfossintáticos, “bastante” (l.4)
equivale ao adjetivo suficiente e concorda
com o substantivo que o antecede, ainda que
apenas em número.
Texto I
Não só os índios foram vítimas da política
linguística dos Estados lusitano e brasileiro. Os
imigrantes — que chegaram a partir de 1824 — e,
principalmente, seus descendentes também sofreram
com ela. O Estado Novo, de Getúlio Vargas, por meio
do chamado processo de nacionalização do ensino,
marcou o ponto alto da repressão a línguas de
imigrantes — línguas alotóctones —, a qual teve
repercussão direta na região Sul do país, em virtude
da presença das comunidades alemã e italiana, que
falavam sua língua materna.
Gilvan Müller de Oliveira. Brasileiro fala português: monolinguismo e preconceito linguístico. In: Revista Linguagem. Internet: <www.letras.ufscar.br> (com adaptações).
Texto II
A Declaração Universal da Diversidade Cultural,
recentemente assinada pelo Brasil, reconhece o povo
brasileiro como plural e diverso e, ainda, a pluralidade
linguística. É essa visão acerca de questões
linguísticas que está expressa na Declaração
Universal dos Direitos Linguísticos, em tramitação na
Organização das Nações Unidas (ONU) e que havia
orientado, em 2008, o Ano Internacional das Línguas,
proposto pela UNESCO, cuja ação pretendeu chamar
a atenção dos governos e das sociedades para os
perigos do desaparecimento acelerado da riqueza
linguística do mundo e para os direitos linguísticos das
comunidades constitutivas dos Estados Nacionais.
Nenhum dos integrantes do BRIC aparece entre
os 70 países com a melhor infraestrutura do mundo. O
ranking leva em conta dados quantitativos — como o
número de linhas telefônicas em relação ao total da
população e de cargas transportadas nos portos — e
opiniões de 13.000 empresários de todo o mundo.
Exemplos recentes comprovam que nem a
impressionante taxa de investimento chinesa,
equivalente a 44% do PIB, tem livrado o país de
gargalos estarrecedores. Na Índia, a lista de
problemas é infindável. O país foi protagonista do
maior apagão da história, quando, em 2001, mais de
225 milhões de pessoas ficaram no escuro por mais
de 12 horas no norte do país e na capital.
F. A. Carneiro. Corrida do BRIC. In: Anuário Exame Infraestrutura. São Paulo: Ed. Abril, dez./2010, p. 35 (com adaptações). 5. (UnB-2º2011) O particípio “transportadas” (l.3)
poderia ser substituído por transportado,
visto que a concordância com o núcleo
nominal “total” (l.3) atende ao que prescreve a
gramática normativa.
GABARITO
1. E 2. C 3. E 4. E GRAMÁTICA- Interpretação de
texto
.
Idem, ibidem
4. (UnB-2º2011) No segmento “política linguística
dos Estados lusitano e brasileiro” (texto I; l.1),
os dois últimos adjetivos poderiam,
corretamente, estar flexionados no plural.
www.tenhoprovaamanha.com.br Manuelzinho Salustiano. Estandartes de Maracatu. O maracatu era preconceituosamente chamado
“coisa de negro”. Hoje, virou inspiração de
17
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Português
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compositores brasileiros, de compositores do mundo
todo, de bandas de rock, de artistas plásticos e de
escritores. E tema de tese de mestrado e de
doutorado.
Chega-se a falar em diáspora do maracatu, já
que existem tantos grupos imitando o maracatu pelo
mundo todo.
Eu acredito que essa migração do maracatu
deve-se a muitos fatores: a difusão através da
imprensa, as políticas publicas, aos artistas famosos e
também a disposição dos próprios grupos de sair em
busca de novos espaços.
No entanto, a gente não pode confundir
maracatu com grupo de percussão. Maracatu e um
complexo cultural que envolve religião, envolve
comunidades, envolve séculos de tradição. E preciso
distinguir o maracatu tradicional dos grupos de
percussão.
Depoimento de Climério de Oliveira (com adaptações). 1. (UnB-1º2013) Para sintetizar informações
mencionadas no 1.o e 2.o parágrafos, o
autor do depoimento emprega, no inicio do
3.o parágrafo, a expressão “essa migração
do maracatu” (l.6), mecanismo coesivo que
possibilita inferir que o sentido de “diáspora”
(l.4) esta associado à dispersão,
disseminação.
Por volta de 12 mil anos atrás, quando
começaram a cultivar a terra e a domesticar os
animais, os seres humanos assumiram o controle.
Começaram o que hoje se denomina “seleção
artificial”. Em vez de a natureza escolher e disseminar
os espécimes mais bem-sucedidos no ambiente
natural, os seres humanos começaram a escolher,
produzir e criar aqueles que melhor lhes servissem.
Christopher Lloyd. O que aconteceu na Terra? A história do planeta, da vida e das civilizações, do big-­‐bang até hoje. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2011, p. 111. 2. (UnB-1º2013) O autor do texto interpreta um
processo histórico, com base nos princípios
do darwinismo social.
A história das chamadas relações entre
sociedade e natureza e, em todos os lugares
habitados, a da substituição de um meio natural, dado
a uma determinada sociedade, por um meio cada vez
www.tenhoprovaamanha.com.br mais artificializado, isto e, sucessivamente
instrumentalizado por essa mesma sociedade.
Milton Santos. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: EDUSP, 2008, p. 233-­‐4 (com adaptações). 3. (UnB-1º2013) Assinale a opção que
sintetiza, de forma mais adequada, o
fragmento de texto apresentado.
a) As circunstâncias de desenvolvimento
de uma sociedade são determinadas
pelas condições naturais do território
que ela habita.
b) Atualmente, ainda existem lugares
desabitados e desconhecidos pelo
homem, como o Ártico e o Deserto do
Saara.
c) Estados Unidos da América, China,
Índia, Rússia e Japão são países
industrializados que, por terem adotado
política de preservação do meio
ambiente, tem abandonado as fontes de
energia suja, como petróleo e carvão
mineral.
d) As grandes cidades são lugares onde o
meio artificial predomina, pois são
ambientes construídos pelo homem no
espaço geográfico, no transcorrer do
tempo histórico.
Razão contra Sandice
Já o leitor compreendeu que era a Razão que
voltava à casa, e convidava a Sandice a sair,
clamando, e com melhor jus, as palavras de Tartufo:
— La maison est a moi, c’est a vous d’en sortir.
Mas e sestro antigo da Sandice criar amor às
casas alheias, de modo que, apenas senhora de uma,
dificilmente lha farão despejar. E sestro; não se tira
daí; há muito que lhe calejou a vergonha. Agora, se
advertirmos no imenso número de casas que ocupa,
umas de vez, outras durante as suas estações
calmosas, concluiremos que esta amável peregrina é o
terror dos proprietários. No nosso caso, houve quase
um distúrbio a porta do meu cérebro, porque a
adventícia não queria entregar a casa, e a dona não
cedia da intenção de tomar o que era seu. Afinal, já a
Sandice se contentava com um cantinho no sótão.
— Não, senhora, replicou a Razão, estou
cansada de lhe ceder sótãos, cansada e
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Português
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experimentada, o que você quer e passar
mansamente do sótão a sala de jantar, daí a de visitas
e ao resto.
— Esta bem, deixe-me ficar algum tempo mais,
estou na pista de um mistério...
— Que mistério?
— De dois, emendou a Sandice: o da vida e o
da morte; peco-lhe só uns dez minutos.
A Razão pôs-se a rir.
— Hás de ser sempre a mesma coisa... sempre
a mesma coisa... sempre a mesma coisa.
E, dizendo isto, travou-lhe dos pulsos e
arrastou-a para fora; depois entrou e fechou-se. A
Sandice ainda gemeu algumas súplicas, grunhiu
algumas zangas; mas desenganou-se depressa,
deitou a língua de fora, em ar de surriada, e foi
andando...
Machado de Assis. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Ateliê, 2001, p.84-­‐5. 4. (UnB-1º2013) Considerando-se a estrutura
sintática do trecho “e convidava a Sandice a
sair, clamando, e com melhor jus, as
palavras de Tartufo” (l.1-2), verifica-se que a
Razão empreendeu grande esforço para
convencer a Sandice a deixar a casa
repetindo as palavras de Tartufo.
[...]
1 uma dança
de espadas
esta
4 escrita
delirante
lâminas cursivas
7 a lua
entre dois
dragões
10 com uma haste
de bambu
passar
13 por entre lianas
sem desenreda-las
Haroldo de Campos. Signância quase céu. Melhores poemas de Haroldo de
Campos. Seleção de Inês Oseki Dépré. 3.ª ed. São Paulo: Global, 2000, p. 82.
www.tenhoprovaamanha.com.br 5. (UnB-1º2013) Considerados sob o ponto de
vista de propriedades gerais dos infinitivos,
os versos “passar/por entre lianas/sem
desenredá-las”
(v.12-14)
conservam
analogia com sentenças de texto de gênero
instrucional, em que a estrutura “sem
desenreda-las” representaria, no nível
semântico, uma condição para a realização
da ação aí indicada.
6. (UnB-1º2013) No trecho “passar/por entre
lianas” (v.12-13), “por” indica movimento, e
“entre”, a ideia de limite.
Barricada
1 Todos os passarinhos da Praça da Republica
Voaram
Todas as estudantes
4 Morreram de susto
Nos uniformes de azul e branco
As telefonistas tiveram uma sincope de fios
7 Só as arvores não desertam
Quando a noite luz
Oswald de Andrade. Primeiro caderno do aluno de poesia
Oswald de Andrade. São Paulo: Globo, 2006, p. 71.
7. (UnB-1º2013) No que se refere a elementos
da estruturação linguística e sua relação
com elementos discursivos, o contraste
semântico estabelecido por meio de formas
verbais que indicam movimento e estado
garante, no que se refere à praça, uma linha
divisória dentro/fora.
O conto Meu Tio, o Iauaretê — publicado, em
1961, na revista Senhor, e republicado, em 1969, em
Estas Histórias — representa, a nosso ver, o estágio
mais avançado do experimento de Guimarães Rosa
com a prosa. O conto é um longo monólogo-diálogo (o
diálogo é pressuposto, pois um só protagonista
pergunta e responde) de um onceiro, perdido na
solidão dos gerais, que recebe, em seu rancho, a visita
inesperada de um viajante. Filho de pai branco e de
mãe índia, o onceiro, que fora contratado por um
proprietário de terras para ‘desonçar’ suas
propriedades, arrependido de ter matado ‘seus
parentes’, passa a matar gente. A fala do onceiro é
tematizada por um ‘Nhem?’ intercorrente, que é, antes,
19
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Português
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um ‘Nhennhem’ — do tupi, Nhehê ou nheeng —, que
significa, simplesmente, ‘falar’. Rosa cria também o
verbo ‘nheengar’, de pura aclimatação tupi, e, juntando
a ‘jaguaretê’ — tupinismo para onça verdadeira — a
terminação nhennhém, ou nhem, como se fora uma
desinência verbal, forma outras palavras, para exprimir
o linguajar das onças. O texto fica, por assim dizer,
mosqueado de nheengatu, e esses rastros que nele
aparecem preparam e anunciam o momento da
metamorfose (...): o tigreiro, em seu rancho encravado
na “jaguaretama”, enquanto conta para seu hóspede
os ‘causos’ de caçada e morte, está também falando
uma linguagem de onça. À medida que a história flui,
tudo vai convergindo para o clímax metamórfico. Este
não é apresentado, mas presentificado pelo texto: o
onceiro acaba, arrastado por sua narrativa,
transformando-se em onça, diante dos olhos do
interlocutor (e dos leitores). A transfiguração se dá no
momento em que a linguagem se desarticula, quebrase em resíduos fônicos, que soam como um rugido ou
um estertor, pois o interlocutor virtual, tomando
consciência da metamorfose, dispara contra o homemiauaretê o revólver que mantivera engatilhado durante
toda a conversa. Neste Iaueretê, não é a história que
cede o primeiro plano à palavra, mas a palavra, que,
ao irromper em primeiro plano, configura a
personagem e a ação, desenvolvendo a história.
Haroldo de Campos. A linguagem do Iauaretê. Metalinguagem & outras metas: ensaios de teoria e crítica literária. 4.ª ed. São Paulo: Perspectiva, 2010, p. 57-­‐64 (com adaptações). 8. (UnB-2º2012) Depreende-se do texto que a
estrutura do conto Meu Tio, o Iauaretê, que
representa, na visão do crítico Haroldo
Campos, a fase rosiana de experimentação
linguística do tupi, aproxima-se da narrativa
das fábulas.
9. (UnB-2º2012) Por meio do emprego da
expressão “um só”, na oração “pois um só
protagonista pergunta e responde” (l.4), o
crítico ratifica o traço de “monólogo”
identificado no conto.
10. (UnB-2º2012) A partir da oposição
estabelecida em “Este não é apresentado,
mas presentificado pelo texto” (l.16-17), o
crítico literário realça a qualidade narrativa
da obra analisada, sugerindo a
possibilidade de aceitação do clímax do
conto narrado (transformação do onceiro
em onça) como fato ocorrido.
www.tenhoprovaamanha.com.br Iracema
Além, muito além daquela serra, que ainda
azula no horizonte, nasceu Iracema.
Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha
os cabelos mais negros que a asa da graúna, e mais
longos que seu talhe de palmeira.
O favo da jati não era doce como seu sorriso;
nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito
perfumado.
Mais rápida que a ema selvagem, a morena
virgem corria o sertão e as matas do Ipu, onde
campeava sua guerreira tribo, da grande nação
tabajara. O pé grácil e nu, mal roçando, alisava
apenas a verde pelúcia que vestia a terra com as
primeiras águas.
Um dia, ao pino do Sol, ela repousava em um
claro da floresta. Banhava-lhe o corpo a sombra da
oiticica, mais fresca do que o orvalho da noite. Os
ramos da acácia silvestre esparziam flores sobre os
úmidos cabelos. Escondidos na folhagem os pássaros
ameigavam o canto.
Iracema saiu do banho: o aljôfar d’água ainda a
roreja, como à doce mangaba que corou em manhã de
chuva.
Enquanto repousa, empluma das penas do
guará as flechas de seu arco, e concerta com o sabiá
da mata, pousado no galho próximo, o canto agreste.
A graciosa ará, sua companheira e amiga,
brinca junto dela. Às vezes sobe aos ramos da árvore
e de lá chama a virgem pelo nome; outras remexe o
uru de palha matizada, onde traz a selvagem seus
perfumes, os alvos fios do crautá, as agulhas da juçara
com que tece a renda, e as tintas de que matiza o
algodão.
Rumor suspeito quebra a doce harmonia da
sesta. Ergue a virgem os olhos, que o sol não
deslumbra; sua vista perturba-se.
Diante dela e todo a contemplá-la está um
guerreiro estranho, se é guerreiro e não algum mau
espírito da floresta.
Tem nas faces o branco das areias que bordam
o mar; nos olhos o azul triste das águas profundas.
Ignotas armas e tecidos ignotos cobrem-lhe o corpo.
Foi rápido, como o olhar, o gesto de Iracema. A
flecha embebida no arco partiu. Gotas de sangue
borbulham na face do desconhecido.
De primeiro ímpeto, a mão lesta caiu sobre a
cruz da espada; mas logo sorriu. O moço guerreiro
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Português
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aprendeu na religião de sua mãe, onde a mulher é
símbolo de ternura e amor. Sofreu mais d’alma que da
ferida.
O sentimento que ele pôs nos olhos e no rosto,
não o sei eu. Porém, a virgem lançou de si o arco e a
uiraçaba, e correu para o guerreiro, sentida da mágoa
que causara.
A mão que rápida ferira, estancou mais rápida e
compassiva o sangue que gotejava. Depois Iracema
quebrou a flecha homicida: deu a haste ao
desconhecido, guardando consigo a ponta farpada.
O guerreiro falou:
— Quebras comigo a flecha da paz?
— Quem te ensinou, guerreiro branco, a
linguagem de meus irmãos? Donde vieste a estas
matas, que nunca viram outro guerreiro como tu?
— Venho de bem longe, filha das florestas.
Venho das terras que teus irmãos já possuíram, e hoje
têm os meus.
— Bem-vindo seja o estrangeiro aos campos
dos tabajaras, senhores das aldeias, e à cabana de
Araquém, pai de Iracema.
José de Alencar. Iracema. São Paulo: Ed. Ática, 1991, p. 23. 11. (UnB-2º2012) No trecho “Tem nas faces o
branco das areias que bordam o mar” (l.25),
o emprego do verbo ter (“Tem”) justifica-se
para exprimir o caráter transitório da
característica relativa à cor das faces do
guerreiro.
Esta história começa numa noite de março tão
escura quanto é a noite enquanto se dorme. O modo
como, tranquilo, o tempo decorria era a lua altíssima
passando pelo céu.
Fora para o lado do mar que aquele homem
pretendera ir, antes mesmo de ter encontrado por feliz
acaso o hotel. Mas — sem mapa, conhecimento ou
bússola — embrenhara-se terra adentro.
“Hoje deve ser domingo” — chegou mesmo a
pensar com certa glória, e domingo seria o grande
coroamento de sua isenção. Tratava-se de seu
primeiro pensamento claro, desde que deixara o hotel.
Na verdade, desde que fugira, era o primeiro
pensamento que não tinha mera utilidade de defesa.
De início, aliás, Martim até não soube o que fazer com
ele. Apenas agitou-se à novidade, e coçou-se voraz
sem parar de andar.
www.tenhoprovaamanha.com.br Foi mais além que estacou diante do primeiro
passarinho. O passarinho negro estava pousado num
ramo baixo, à altura de seus olhos; com mão pesada e
potente, o homem pegou-o sem machucá-lo, com a
bondade física que tem uma mão pesada.
Com o leve peso a carregar, o homem
continuou sua marcha entre pedras.
— Não sei mais falar, disse, então, para o
passarinho, evitando olhá-lo...
Só depois pareceu entender o que dissera, e
então olhou face a face o sol. “Perdi a linguagem dos
outros”, repetiu, então, bem devagar, como se as
palavras fossem mais obscuras do que eram, e de
algum modo muito lisonjeiras.
Alguma coisa estava lhe acontecendo. E era
alguma coisa com um significado, embora não
houvesse um sinônimo para essa coisa que estava
acontecendo. E não havia sinônimo para nenhuma
coisa...
Aquele homem rejeitara a linguagem dos outros
e não tinha sequer começo de linguagem própria. E,
no entanto, oco, mudo, rejubilava-se. Assim, ao
remexer agora com fascínio ainda cauteloso na
linguagem morta, ele tentou, por pura experiência, dar
o título antigamente tão familiar de “crime” a essa
coisa tão sem nome que lhe sucedera.
Clarice Lispector. A maçã no escuro. Rio de Janeiro: Rocco, 1998 (com adaptações). 12. (UnB-2º2012) O parágrafo iniciado à linha
16 contém um esclarecimento a respeito do
conteúdo do trecho “Não sei mais falar”
(l.15).
13. (UnB-2º2012) Depreende-se do texto que o
exercício de nomear algo “tão sem nome”
(l.25) resultou de um processo de
deslumbramento
vivenciado
pelo
personagem diante da possibilidade de
retomada da linguagem que julgava ter
perdido.
No processo da Revolução Francesa, quando
destruíram os últimos resquícios do feudalismo na
eufórica noite de 4 de agosto de 1789, os deputados
concordaram em manter o dízimo da Igreja, em vez de
simplesmente aboli-lo sem qualquer compensação.
Mas, desde então, houve sinais de que a promessa
seria abandonada. “Eles desejam ser livres, mas não
sabem ser justos”, reclamou o abade de Seyès,
21
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referindo-se a alguns colegas da Assembleia.
Robespierre não era nem antipadres nem anticlerical;
é difícil determinar sua posição quanto ao futuro da
Igreja na Revolução. Às vezes, era veemente crítico e,
em outras vezes, retornava à interpretação da doutrina
cristã, pois, a seu ver, o cristianismo era a religião dos
pobres e daqueles de coração puro — riqueza
chamativa e luxo não deveriam fazer parte dele. Os
pobres, segundo ele, eram oprimidos não apenas pela
fome, mas também pelo espetáculo escandaloso de
clérigos
autoindulgentes,
que
esbanjavam
insensivelmente o que pertencia aos pobres por
direito.
Ruth Scurr. Pureza fatal: Robespierre e a Revolução Francesa. Rio de Janeiro/São Paulo: Record, 2009, p. 140-­‐1 (com adaptações). 14. (UnB-1º2012) A forma como a autora do
texto refere-se ao abade de Seyès e a
Robespierre permite compreender a
convivência, no auge dos acontecimentos
da Revolução Francesa, de duas
perspectivas, a tradicional e a moderna,
assumidas, inclusive, por um mesmo
indivíduo.
O emplasto
Um dia de manhã, estando a passear na
chácara, pendurou-se-me uma ideia no trapézio que
eu tinha no cérebro.
Uma vez pendurada, entrou a bracejar, a
pernear, a fazer as mais arrojadas cambalhotas. Eu
deixei-me estar a contemplá-la. Súbito, deu um grande
salto, estendeu os braços e as pernas, até tomar a
forma de um X: decifra-me ou devoro-te.
Essa ideia era nada menos que a invenção de
um medicamento sublime, um emplasto antihipocondríaco, destinado a aliviar a nossa melancólica
humanidade.
Na petição de privilégio que então redigi,
chamei a atenção do governo para esse resultado,
verdadeiramente cristão. Todavia, não neguei aos
amigos as vantagens pecuniárias que deviam resultar
da distribuição de um produto de tamanhos e tão
profundos efeitos. Agora, porém, que estou cá do
outro lado da vida, posso confessar tudo: o que me
influiu principalmente foi o gosto de ver impressas nos
jornais, mostradores, folhetos, esquinas e, enfim, nas
caixinhas do remédio, estas três palavras: Emplasto
Brás Cubas. Para que negá-lo? Eu tinha a paixão do
arruído, do cartaz, do foguete de lágrimas. Talvez os
www.tenhoprovaamanha.com.br modestos me arguam esse defeito; fio, porém, que
esse talento me hão de reconhecer os hábeis.
Assim, a minha ideia trazia duas faces, como as
medalhas, uma virada para o público, outra para mim.
De um lado, filantropia e lucro; de outro, sede de
nomeada. Digamos: — amor da glória.
Um tio meu, cônego de prebenda inteira,
costumava dizer que o amor da glória temporal era a
perdição das almas, que só devem cobiçar a glória
eterna. Ao que retorquia outro tio, oficial de um dos
antigos terços de infantaria, que o amor da glória era a
coisa mais verdadeiramente humana que há no
homem e, consequentemente, a sua mais genuína
feição.
Decida o leitor entre o militar e o cônego; eu
volto ao emplasto.
Machado de Assis. Memórias póstumas de Brás Cubas. Obra completa, v. I. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992, p. 514-­‐5 (com adaptações). 15. (UnB-1º2012) Se considerada a noção de
signo linguístico no trecho “até tomar a
forma de um X: decifra-me ou devoro-te”
(l.5), observa-se uma relação não arbitrária
entre o significado de “X” e o seu
significante, assim como acontece com o
signo “ideia” no trecho “a minha ideia trazia
duas faces, como as medalhas” (l.16).
16. (UnB-1º2012) A frase “Decifra-me ou
devoro-te” remete ao enigma da esfinge,
consagrado na tragédia grega Édipo Rei, de
Sófocles. A formulação de um enigma
envolve jogos de palavras e associações
semânticas ambíguas e paradoxais, que
parecem conduzir a respostas impossíveis
ou absurdas. A decifração de um enigma
está associada, portanto, a grande
capacidade de raciocínio e de reflexão e,
não menos, a domínio das palavras e da
língua. Assim, quem decifra um enigma
será considerado um ser superior, de saber
excepcional,
cujas
palavras
serão
respeitadas e seguidas. Com relação às
questões envolvidas na decifração de um
enigma e ao tema a que o texto de
Machado de Assis se reporta, assinale a
opção correta.
a) A resolução, pelo narrador, da situação
enigmática demandou o processo de
uma ideia em evolução e, assim, a
resposta, ou seja, a invenção do
emplasto Brás Cubas, não encerra
22
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Português
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ambiguidade nem paradoxo, ao
contrário do que ocorre com os demais
enigmas.
b) O poder intelectual do narrador
evidencia-se em ações de relevância
humanitária, o que, como enfatiza o
próprio
narrador,
alcança
reconhecimento em instâncias de
representação política.
c) A reação do narrador a comentários dos
tios sinaliza que o embate entre tipos e
âmbitos de poder é resolvido pelo
saber.
d) O episódio da resolução do enigma
evoca um momento vitorioso de Brás
Cubas no que se refere à sua
capacidade de admitir sentimentos
passionais por meio de argumentação
racional.
O espelho
Se quer seguir-me, narro-lhe; não uma
aventura, mas experiência, a que me induziram,
alternadamente, séries de raciocínios e intuições.
Tomou-me tempo. Surpreendo-me, porém, um tanto à
parte de todos, penetrando conhecimento que os
outros ainda ignoram. O senhor, por exemplo, que
sabe e estuda, suponho nem tenha ideia do que seja,
na verdade — um espelho? Decerto, das noções de
física, com que se familiarizou, as leis da ótica.
Reporto-me ao transcendente, todavia...
O espelho, são muitos, captando-lhe as feições;
todos refletem-lhe o rosto, e o senhor crê-se com
aspecto próprio e praticamente inalterado, do qual lhe
dão imagem fiel. Mas — que espelho? Há-os bons e
maus, os que favorecem e os que detraem; e os que
são apenas honestos, pois não. E onde situar o nível e
ponto dessa honestidade ou fidedignidade?
Como é que o senhor, eu, os restantes
próximos, somos, no visível? O senhor dirá: as
fotografias o comprovam. Respondo: que, além de
prevalecerem para as lentes das máquinas objeções
análogas, seus resultados apoiam antes que
desmentem a minha tese, tanto revelam superporemse aos dados iconográficos os índices do misterioso.
Ainda que tirados de imediato, um após outro, os
retratos sempre serão entre si muito diferentes. E as
máscaras, moldadas nos rostos? Valem, grosso modo,
www.tenhoprovaamanha.com.br para o falquejo das formas, não para o explodir da
expressão, o dinamismo fisionômico. Não se esqueça,
é de fenômenos sutis que estamos tratando.
Resta-lhe argumento: qualquer pessoa pode, a
um tempo, ver o rosto de outra e sua reflexão no
espelho. O experimento, por sinal ainda não realizado
com rigor, careceria de valor científico, em vista das
irredutíveis deformações, de ordem psicológica. Além
de que a simultaneidade torna-se impossível, no fluir
de valores instantâneos. Ah, o tempo é o mágico de
todas as traições... E os próprios olhos, de cada um de
nós, padecem viciação de origem, defeitos com que
cresceram e a que se afizeram, mais e mais. Os olhos,
por enquanto, são a porta do engano; duvide deles,
dos seus, não de mim. Ah, meu amigo, a espécie
humana peleja para impor ao latejante mundo um
pouco de rotina e lógica, mas algo ou alguém de tudo
faz brecha para rir-se da gente...
Vejo que começa a descontar um pouco de sua
inicial desconfiança quanto ao meu são juízo.
Fiquemos, porém, no terra a terra. Rimo-nos, nas
barracas de diversões, daqueles caricatos espelhos,
que nos reduzem a mostrengos, esticados ou
globosos. Mas, se só usamos os planos, deve-se a
que primeiro a humanidade mirou-se nas superfícies
de água quieta, lagoas, fontes, delas aprendendo a
fazer tais utensílios de metal ou cristal. Tirésias,
contudo, já havia predito ao belo Narciso que ele
viveria apenas enquanto a si mesmo não se visse...
Sim, são para se ter medo, os espelhos...
João Guimarães Rosa. O espelho. In: Primeiras estórias. Ficção completa. Rio
de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, v. 2, p. 437-55 (com adaptações).
17. (UnB-1º2012) Levando em consideração o
texto em seu nível semântico e, ainda, o
que o narrador postula acerca da reflexão
de imagens em espelho plano, os vocábulos
“fotografias” (l.12), “lentes” (l.12), “olhos”
(l.22 e 23), bem como a expressão
“superfícies de água quieta” (R.44) e os
correlatos, formariam um conjunto lexical e
semântico cujo traço unificador evidenciaria,
na ótica do narrador, uma simplificação da
realidade operada pela visão e pelo
cérebro.
18. (UnB-1º2012) As estruturas “Não se
esqueça, é de fenômenos sutis que
estamos tratando” (l.16-17) e Não se
esqueça, estamos tratando de fenômenos
sutis são análogas no que se refere aos
23
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Português
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constituintes sintáticos, mas se distinguem
quanto a efeitos discursivos: a primeira,
mas não a segunda, evidencia efeitos
obtidos pela focalização de complemento
verbal.
Em A Câmara Clara: Nota sobre a Fotografia,
Roland Barthes investiga, como espectador e não
como fotógrafo, a estrutura da fotografia como
sistema, como código: a linguagem fotográfica,
portanto. E aponta um paradoxo: a imagem fotográfica
é uma cópia do real e uma ficção. No que se refere à
“emoção” de sujeito olhado e de sujeito que olha uma
foto-retrato, o autor argumenta: “diante da objetiva,
faço pose; então, sou, ao mesmo tempo, aquele que
eu me julgo, aquele que eu gostaria que me
julgassem, aquele que o fotógrafo me julga e aquele
de que ele se serve para exibir sua arte. Assim, a
fotografia é o advento de mim mesmo como outro,
uma dissociação astuciosa da consciência de
identidade; a fotografia transforma o sujeito em
objeto.”
Roland Barthes. A câmara clara: nota sobre a fotografia. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, p. 22-­‐3 (com adaptações). 19. (UnB-1º2012) Com base no que está
proposto acerca de retrato/fotografia no
trecho acima, redija um texto, na
modalidade padrão da língua portuguesa,
apresentando sua visão sobre a seguinte
questão: um rosto na foto-retrato —
realidade ou ficção?
É somente nos meados do século XIX, com
Varnhagen, que a língua do Brasil assume contornos
de
problema
de
interesse
nacional
e,
concomitantemente, passa a constituir objeto de
cogitação, para registro de uma realidade já
consistente e documentável. Varnhagen afirma a
unidade de língua nos dois domínios — o que, a seu
ver, justificava o estudo dos clássicos e a
impossibilidade de separação das duas literaturas —,
mas ressalta, todavia, a diversificação da língua
falada, notadamente na prosódia e no léxico, o que
atribui ao acastelhanamento do português na América.
A caracterização da língua do Brasil como um
português diferenciado — esboçada em Varnhagen —
representa, entre outros aspectos, uma das posições
www.tenhoprovaamanha.com.br que delimitarão os debates em torno da língua até o
final do século XIX.
Edith Pimentel Pinto (Org.). O português do Brasil – textos críticos e teóricos – 1820-­‐1920: fontes para a teoria e a história. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1978, p. XVI-­‐XIX (com adaptações). 20. (UnB-2º2011) Haveria perda dos elementos
de ênfase empregados, mas seriam
mantidas a correção gramatical e a
interpretação semântica original, caso o
primeiro período do texto fosse assim
reescrito: A língua do Brasil assume
contornos de problema de interesse
nacional que, concomitantemente, passam
a constituir objeto de cogitação, para o
registro de uma realidade já consistente e
documentável, somente nos meados do
século XIX, com Varnhagen.
21. (UnB-2º2011) No trecho “Varnhagen afirma
a unidade de língua nos dois domínios”
(R.3-4), a palavra “unidade” denota o
reconhecimento de uma língua da nação
brasileira.
Texto I
Não só os índios foram vítimas da política
linguística dos Estados lusitano e brasileiro. Os
imigrantes — que chegaram a partir de 1824 — e,
principalmente, seus descendentes também sofreram
com ela. O Estado Novo, de Getúlio Vargas, por meio
do chamado processo de nacionalização do ensino,
marcou o ponto alto da repressão a línguas de
imigrantes — línguas alotóctones —, a qual teve
repercussão direta na região Sul do país, em virtude
da presença das comunidades alemã e italiana, que
falavam sua língua materna.
Gilvan Müller de Oliveira. Brasileiro fala português: monolinguismo e preconceito linguístico. In: Revista Linguagem. Internet: <www.letras.ufscar.br> (com adaptações).
Texto II
A Declaração Universal da Diversidade Cultural,
recentemente assinada pelo Brasil, reconhece o povo
brasileiro como plural e diverso e, ainda, a pluralidade
linguística. É essa visão acerca de questões
linguísticas que está expressa na Declaração
Universal dos Direitos Linguísticos, em tramitação na
Organização das Nações Unidas (ONU) e que havia
orientado, em 2008, o Ano Internacional das Línguas,
proposto pela UNESCO, cuja ação pretendeu chamar
24
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Português
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a atenção dos governos e das sociedades para os
perigos do desaparecimento acelerado da riqueza
linguística do mundo e para os direitos linguísticos das
comunidades constitutivas dos Estados Nacionais.
.
Idem, ibidem
22. (UnB-2º2011) Da comparação entre os
textos I e II, depreende-se, no que se refere
a propostas de homogeneização linguística
em
determinada
nação,
que
a
implementação de políticas linguísticas
semelhantes às mencionadas no texto I
contrasta, em essência, com o enfoque
linguístico relatado no texto II.
23. (UnB-2º2011) A partir dos textos I e II e
considerando-se, em especial, o contexto
brasileiro, é correto afirmar que discussões
sobre propriedades linguísticas centradas
na relação entre língua e nação —
discussões essas inauguradas, na via da
literatura, em período pós-independência —
alcançaram matérias legais e garantiram
soluções acerca da unidade linguística.
24. (UnB-2º2011) O texto II sinaliza a intenção
da UNESCO de sensibilizar governos e
sociedades relativamente à pluralidade
linguística, sem indicar, no entanto, se tal
intenção se concretizou.
Ode Triunfal
À dolorosa luz das grandes lâmpadas elétricas da
fábrica Tenho febre e escrevo.
Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto,
Para a beleza disto totalmente desconhecida dos
antigos.
Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r eterno!
Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!
Em fúria fora e dentro de mim,
Por todos os meus nervos dissecados fora,
Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto!
Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos,
De vos ouvir demasiadamente de perto,
E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um
excesso
De expressão de todas as minhas sensações,
Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas!
1 25. (UnB-2º2011) No trecho “beleza disto
totalmente desconhecida dos antigos” (v.4),
Fernando Pessoa está sugerindo que,
anteriormente à Revolução Industrial, as
sociedades humanas não dispunham de
máquinas, iluminação e meios de
transporte.
GABARITO
1. C
2. E
3. D
4. E
5. C
6. C
7. C
8. E
9. C
10. C
11. E
12. C
13. C
14. C
15. E
16. C
17. C
18. C
19. TIPO D
20. E
21. E
22. C
23. E
24. E
25. E
4 7 10 13 Fernando Pessoa: Obra poética. Rio de Janeiro: Aguilar, 1972, p. 306. www.tenhoprovaamanha.com.br GRAMÁTICA- Morfologia.
Queixa-se o poeta em que o mundo vay errado, e
querendo
emendâlo o que tem por empreza difficultosa.
1 Carregado de mim ando no mundo,
E o grande peso embarga-me as passadas,
Que como ando por vias desusadas,
4 Faço o peso crescer, e vou-me ao fundo.
O remédio será seguir o imundo
Caminho, onde dos mais vejo as pisadas,
7 Que as bestas andam juntas mais ornadas,
Do que anda só o engenho mais profundo.
Não é fácil viver entre os insanos,
10 Erra quem presumir que sabe tudo,
25
Provas ENEM
Português
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Se o atalho não soube dos seus danos.
O prudente varão há de ser mudo,
13 Que e melhor neste mundo mar de enganos
Ser louco cos demais, que ser sisudo.
Gregório de Matos. Crônica do viver baiano seiscentista – obra poética completa – códice James Amado. 4.ª ed. Rio de Janeiro: Record, V. 1 1999, p. 347. 1. (UnB-1º2013) No verso 11, a inversão de
termos tem como efeito, entre outros, a
descontinuidade do sintagma cujo núcleo e o
vocábulo “atalho”.
[...]
1 o ar
lapidado: veja
como se junta esta palavra
4 a esta outra
linguagem: minha
consciência (um paralelogramo
7 de forcas não uma simples
equação a uma única incógnita): esta
linguagem se faz de ar
10 e corda vocal
a mão que intrinca o fio da
treliça o fôlego
13 que junta esta aquela
voz: o ponto
de torção
16 trabalho diáfano mas que
se faz (perfaz?) com os cinco
sentidos.
Haroldo de Campos. Educação dos cinco sentidos. Melhores poemas de Haroldo de Campos – seleção de Inês Oseki Dépré. 3.a ed. São Paulo: Global, 2000, p. 92. 2. (UnB-1º2013) Depreende-se do poema que o
vocábulo “voz” (v.14) é empregado em
analogia à fala e, assim, remete a acepção de
produção de sons da comunicação humana.
3. (UnB-1º2013) Usado em relação a fatos da
linguagem matemática, o vocábulo “incógnita”
(v.8) conserva, em seu conceito, ou definição,
o sentido do radical presente no verbo
conhecer.
O conto Meu Tio, o Iauaretê — publicado, em
1961, na revista Senhor, e republicado, em 1969, em
Estas Histórias — representa, a nosso ver, o estágio
mais avançado do experimento de Guimarães Rosa
www.tenhoprovaamanha.com.br com a prosa. O conto é um longo monólogo-diálogo (o
diálogo é pressuposto, pois um só protagonista
pergunta e responde) de um onceiro, perdido na
solidão dos gerais, que recebe, em seu rancho, a visita
inesperada de um viajante. Filho de pai branco e de
mãe índia, o onceiro, que fora contratado por um
proprietário de terras para ‘desonçar’ suas
propriedades, arrependido de ter matado ‘seus
parentes’, passa a matar gente. A fala do onceiro é
tematizada por um ‘Nhem?’ intercorrente, que é, antes,
um ‘Nhennhem’ — do tupi, Nhehê ou nheeng —, que
significa, simplesmente, ‘falar’. Rosa cria também o
verbo ‘nheengar’, de pura aclimatação tupi, e, juntando
a ‘jaguaretê’ — tupinismo para onça verdadeira — a
terminação nhennhém, ou nhem, como se fora uma
desinência verbal, forma outras palavras, para exprimir
o linguajar das onças. O texto fica, por assim dizer,
mosqueado de nheengatu, e esses rastros que nele
aparecem preparam e anunciam o momento da
metamorfose (...): o tigreiro, em seu rancho encravado
na “jaguaretama”, enquanto conta para seu hóspede
os ‘causos’ de caçada e morte, está também falando
uma linguagem de onça. À medida que a história flui,
tudo vai convergindo para o clímax metamórfico. Este
não é apresentado, mas presentificado pelo texto: o
onceiro acaba, arrastado por sua narrativa,
transformando-se em onça, diante dos olhos do
interlocutor (e dos leitores). A transfiguração se dá no
momento em que a linguagem se desarticula, quebrase em resíduos fônicos, que soam como um rugido ou
um estertor, pois o interlocutor virtual, tomando
consciência da metamorfose, dispara contra o homemiauaretê o revólver que mantivera engatilhado durante
toda a conversa. Neste Iaueretê, não é a história que
cede o primeiro plano à palavra, mas a palavra, que,
ao irromper em primeiro plano, configura a
personagem e a ação, desenvolvendo a história.
Haroldo de Campos. A linguagem do Iauaretê. Metalinguagem & outras metas: ensaios de teoria e crítica literária. 4.ª ed. São Paulo: Perspectiva, 2010, p. 57-­‐64 (com adaptações). 4. (UnB-2º2012) Segundo o crítico Haroldo de
Campos, o verbo que representa o linguajar
das onças, formado do elemento tupi
“nhennhém” ou “nhem”, equivale, no que se
refere ao léxico da língua portuguesa, a um
verbo que denota estado.
5. (UnB-2º2012) Caso o verbo “nheengar” (l.9),
criado por Guimarães Rosa, fosse incorporado
ao vocabulário da língua portuguesa, ele se
26
Provas ENEM
Português
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encaixaria entre os verbos que se flexionam
como os da primeira conjugação.
Quando ficou claro que a designação de Homo
sapiens não era tão adequada à nossa espécie como
se havia acreditado — porque, afinal, não somos tão
razoáveis como se acreditava no século XVIII, em seu
otimismo ingênuo —, acrescentaram-lhe a de Homo
faber (homem que fabrica). Entretanto, a expressão
Homo ludens (homem que joga) evoca uma função tão
essencial quanto a de fabricar e merece, portanto,
ocupar seu lugar junto à de Homo faber.
Johan Huizinga. Homo ludens. Madri: Alianza, 2001, p. 7 (com adaptações). 6. (UnB-1º2012) Nos trechos “não era tão
adequada à nossa espécie como” (R.2) e “não
somos tão razoáveis como” (R.3), o emprego
de adjetivos em estruturas comparativas
atenua o valor das propriedades negativas
atribuídas à humanidade.
7. (UnB-1º2012) Levando-se em consideração
que o léxico da língua portuguesa passou por
transformações ao longo dos processos
históricos, pode-se justificar a coexistência de
itens lexicais do mesmo campo semântico,
como “sapiência” e “sabedoria”, do latim, e
“filosofia” e “sofista”, do grego.
O emplasto
Um dia de manhã, estando a passear na
chácara, pendurou-se-me uma ideia no trapézio que
eu tinha no cérebro.
Uma vez pendurada, entrou a bracejar, a
pernear, a fazer as mais arrojadas cambalhotas. Eu
deixei-me estar a contemplá-la. Súbito, deu um grande
salto, estendeu os braços e as pernas, até tomar a
forma de um X: decifra-me ou devoro-te.
Essa ideia era nada menos que a invenção de
um medicamento sublime, um emplasto antihipocondríaco, destinado a aliviar a nossa melancólica
humanidade.
Na petição de privilégio que então redigi,
chamei a atenção do governo para esse resultado,
verdadeiramente cristão. Todavia, não neguei aos
amigos as vantagens pecuniárias que deviam resultar
da distribuição de um produto de tamanhos e tão
www.tenhoprovaamanha.com.br profundos efeitos. Agora, porém, que estou cá do
outro lado da vida, posso confessar tudo: o que me
influiu principalmente foi o gosto de ver impressas nos
jornais, mostradores, folhetos, esquinas e, enfim, nas
caixinhas do remédio, estas três palavras: Emplasto
Brás Cubas. Para que negá-lo? Eu tinha a paixão do
arruído, do cartaz, do foguete de lágrimas. Talvez os
modestos me arguam esse defeito; fio, porém, que
esse talento me hão de reconhecer os hábeis.
Assim, a minha ideia trazia duas faces, como as
medalhas, uma virada para o público, outra para mim.
De um lado, filantropia e lucro; de outro, sede de
nomeada. Digamos: — amor da glória.
Um tio meu, cônego de prebenda inteira,
costumava dizer que o amor da glória temporal era a
perdição das almas, que só devem cobiçar a glória
eterna. Ao que retorquia outro tio, oficial de um dos
antigos terços de infantaria, que o amor da glória era a
coisa mais verdadeiramente humana que há no
homem e, consequentemente, a sua mais genuína
feição.
Decida o leitor entre o militar e o cônego; eu
volto ao emplasto.
Machado de Assis. Memórias póstumas de Brás Cubas. Obra completa, v. I. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992, p. 514-­‐5 (com adaptações). 8. (UnB-1º2012) Em “hão de reconhecer” (l.15), o
verbo auxiliar denota tempo futuro e de
obrigatoriedade de ação, o que ratifica, no
nível estrutural, a oposição postulada pelo
autor entre “modestos” (l.14) e “hábeis” (l.15).
Nenhum dos integrantes do BRIC aparece entre
os 70 países com a melhor infraestrutura do mundo. O
ranking leva em conta dados quantitativos — como o
número de linhas telefônicas em relação ao total da
população e de cargas transportadas nos portos — e
opiniões de 13.000 empresários de todo o mundo.
Exemplos recentes comprovam que nem a
impressionante taxa de investimento chinesa,
equivalente a 44% do PIB, tem livrado o país de
gargalos estarrecedores. Na Índia, a lista de
problemas é infindável. O país foi protagonista do
maior apagão da história, quando, em 2001, mais de
225 milhões de pessoas ficaram no escuro por mais
de 12 horas no norte do país e na capital.
F. A. Carneiro. Corrida do BRIC. In: Anuário Exame Infraestrutura. São Paulo: Ed. Abril, dez./2010, p. 35 (com adaptações). 27
Provas ENEM
Português
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9. (UnB-2º2011) As siglas “BRIC” (l.1) e “PIB”
(l.5) representam itens lexicais que, criados a
partir da redução de estruturas nominais
complexas, passam a incorporar o vocabulário
da língua como substantivos que não poderam
receber outros elementos da flexão
morfológica da língua.
GABARITO
1. C
2. C
3. C
4. E
5. C
6. E
7. C
8. E
9. E
GRAMÁTICA- Sintaxe
Conto de escola
A escola era na Rua do Costa, um sobradinho
de grade de pau. O ano era de 1840. Naquele dia ―
uma segunda-feira, do mês de maio ―, deixei-me
estar alguns instantes na Rua da Princesa a ver onde
iria brincar a manha. Hesitava entre o morro de S.
Diogo e o Campo de Santana, que não era então esse
parque atual, construção de gentleman, mas um
espaço rústico, mais ou menos infinito, alastrado de
lavadeiras, capim e burros soltos. Morro ou campo?
Tal era o problema. De repente disse comigo que o
melhor era a escola. E guiei para a escola.
[...]
Raimundo recuou a mão dele e deu a boca um
gesto amarelo, que queria sorrir. Em seguida, propôsme um negócio, uma troca de serviços; ele me daria a
moeda, eu lhe explicaria um ponto da lição de sintaxe.
Não conseguira reter nada do livro, e estava com
medo do pai. E concluía a proposta esfregando a
pratinha nos joelhos...
Tive uma sensação esquisita. Não e que eu
possuísse da virtude uma ideia antes própria de
homem; não e também que não fosse fácil empregar
uma ou outra mentira de criança. Sabíamos ambos
enganar ao mestre. A novidade estava nos termos da
proposta, na troca de lição e dinheiro, compra franca,
www.tenhoprovaamanha.com.br positiva, toma lá, da cá; tal foi a causa da sensação.
Fiquei a olhar para ele, a toa, sem poder dizer nada.
Machado de Assis. Conto de escola. Internet:<www.dominiopublico.org>. 1. (UnB-1º2013) No 3º período do texto, para
apresentar detalhe relativo ao tempo da
narrativa, Machado de Assis utiliza estrutura
sintática de aposto explicativo, que
corresponde ao trecho entre travessões.
Queixa-se o poeta em que o mundo vay errado, e
querendo
emendâlo o que tem por empreza difficultosa.
1 Carregado de mim ando no mundo,
E o grande peso embarga-me as passadas,
Que como ando por vias desusadas,
4 Faço o peso crescer, e vou-me ao fundo.
O remédio será seguir o imundo
Caminho, onde dos mais vejo as pisadas,
7 Que as bestas andam juntas mais ornadas,
Do que anda só o engenho mais profundo.
Não é fácil viver entre os insanos,
10 Erra quem presumir que sabe tudo,
Se o atalho não soube dos seus danos.
O prudente varão há de ser mudo,
13 Que e melhor neste mundo mar de enganos
Ser louco cos demais, que ser sisudo.
Gregório de Matos. Crônica do viver baiano seiscentista – obra poética completa – códice James Amado. 4.ª ed. Rio de Janeiro: Record, V. 1 1999, p. 347. 2. (UnB-1º2013) No verso 10, verifica-se ordem
indireta, visto que o sujeito da oração –
“quem” – esta posposto ao verbo – “Erra”.
3. (UnB-1º2013) No verso 11, a inversão de
termos tem como efeito, entre outros, a
descontinuidade do sintagma cujo núcleo e o
vocábulo “atalho”.
4. (UnB-1º2013) Na oração “que ser sisudo”
(v.14), observa-se elipse da forma
comparativa sintética do adjetivo bom, a qual
esta expressa no verso anterior.
5. (UnB-1º2013) O termo “Carregado de mim”
(v.1), que exerce função adverbial, indica o
modo como o eu lírico anda no mundo.
Razão contra Sandice
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Já o leitor compreendeu que era a Razão que
voltava a casa, e convidava a Sandice a sair,
clamando, e com melhor jus, as palavras de Tartufo:
— La maison est a moi, c’est a vous d’en sortir.
Mas é sestro antigo da Sandice criar amor às
casas alheias, de modo que, apenas senhora de uma,
dificilmente lha farão despejar. E sestro; não se tira
dai; há muito que lhe calejou a vergonha. Agora, se
advertirmos no imenso número de casas que ocupa,
umas de vez, outras durante as suas estações
calmosas, concluiremos que esta amável peregrina é o
terror dos proprietários. No nosso caso, houve quase
um distúrbio a porta do meu cérebro, porque a
adventícia não queria entregar a casa, e a dona não
cedia da intenção de tomar o que era seu. Afinal, já a
Sandice se contentava com um cantinho no sótão.
— Não, senhora, replicou a Razão, estou
cansada de lhe ceder sótãos, cansada e
experimentada, o que você quer e passar
mansamente do sótão a sala de jantar, dai a de visitas
e ao resto.
— Esta bem, deixe-me ficar algum tempo mais,
estou na pista de um mistério...
— Que mistério?
— De dois, emendou a Sandice: o da vida e o
da morte; peco-lhe só uns dez minutos.
A Razão pôs-se a rir.
— Hás de ser sempre a mesma coisa... sempre
a mesma coisa... sempre a mesma coisa.
E, dizendo isto, travou-lhe dos pulsos e
arrastou-a para fora; depois entrou e fechou-se. A
Sandice ainda gemeu algumas suplicas, grunhiu
algumas zangas; mas desenganou-se depressa,
deitou a língua de fora, em ar de surriada, e foi
andando...
Machado de Assis. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Ateliê, 2001, p.84-­‐5. 6. (UnB-1º2013) No trecho “De dois, emendou a
Sandice: o da vida e o da morte” (l.16) está
implícito o substantivo mistérios, que é o
elemento de referencia do aposto.
7. (UnB-1º2013) No processo de coesão textual,
as expressões “esta amável peregrina” (l.7) e
“a adventícia” (l.9) retomam o vocábulo
“Sandice” (l.1 e 4).
8. (UnB-1º2013) No período que se inicia na
linha 8, verifica-se uma relação de causa e
efeito.
www.tenhoprovaamanha.com.br 9. (UnB-1º2013) No trecho “dificilmente lha farão
despejar” (l.5), a flexão do verbo em terceira
pessoa do plural e recurso empregado para
indeterminar o sujeito da oração.
10. (UnB-1º2013) A oração “criar amor às casas
alheias” (l.4) exerce função de sujeito da
oração que a antecede, o que implica dizer
que “sestro antigo da Sandice” (l.4) é
predicativo desse sujeito.
[...]
1 uma dança
de espadas
esta
4 escrita
delirante
lâminas cursivas
7 a lua
entre dois
dragões
10 com uma haste
de bambu
passar
13 por entre lianas
sem desenredá-las
Haroldo de Campos. Signância quase céu. Melhores poemas de Haroldo de
Campos. Seleção de Inês Oseki Dépré. 3.ª ed. São Paulo: Global, 2000, p. 82.
11. (UnB-1º2013) Os versos “uma dança/de
espadas” (v.1-2) antecipam a relação de
predicação entre esse termo e o dos versos
“esta/escrita/delirante” (v.3-5).
[...]
1 o ar
lapidado: veja
como se junta esta palavra
4 a esta outra
linguagem: minha
consciência (um paralelogramo
7 de forcas não uma simples
equação a uma única incógnita): esta
linguagem se faz de ar
10 e corda vocal
a mão que intrinca o fio da
treliça o fôlego
13 que junta esta aquela
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voz: o ponto
de torção
16 trabalho diáfano mas que
se faz (perfaz?) com os cinco
sentidos.
Haroldo de Campos. Educação dos cinco sentidos. Melhores poemas de Haroldo de Campos – seleção de Inês Oseki Dépré. 3.a ed. São Paulo: Global, 2000, p. 92. 12. (UnB-1º2013) No trecho entre os versos 11 e
15, o emprego de orações adjetivas restritivas
que especificam o sentido dos núcleos
nominais “mão” e “fôlego” evidencia a
construção meticulosa realizada “com os
cinco/sentidos” (v. 17-18).
Barricada
1 Todos os passarinhos da Praça da Republica
Voaram
Todas as estudantes
4 Morreram de susto
Nos uniformes de azul e branco
As telefonistas tiveram uma sincope de fios
7 Só as arvores não desertam
Quando a noite luz
Oswald de Andrade. Primeiro caderno do aluno de poesia
Oswald de Andrade. São Paulo: Globo, 2006, p. 71.
13. (UnB-1º2013) No primeiro verso do poema, a
expressão “da Praça da República” é um
modificador que estabelece, com o núcleo
nominal “passarinhos” e com os núcleos
“estudantes” (v.3), “telefonistas” (v.6) e
“arvores” (v.7), uma relação de posse, o que
explica ter havido elipse desse sintagma nos
demais versos do poema.
O conto Meu Tio, o Iauaretê — publicado, em
1961, na revista Senhor, e republicado, em 1969, em
Estas Histórias — representa, a nosso ver, o estágio
mais avançado do experimento de Guimarães Rosa
com a prosa. O conto é um longo monólogo-diálogo (o
diálogo é pressuposto, pois um só protagonista
pergunta e responde) de um onceiro, perdido na
solidão dos gerais, que recebe, em seu rancho, a visita
inesperada de um viajante. Filho de pai branco e de
mãe índia, o onceiro, que fora contratado por um
www.tenhoprovaamanha.com.br proprietário de terras para ‘desonçar’ suas
propriedades, arrependido de ter matado ‘seus
parentes’, passa a matar gente. A fala do onceiro é
tematizada por um ‘Nhem?’ intercorrente, que é, antes,
um ‘Nhennhem’ — do tupi, Nhehê ou nheeng —, que
significa, simplesmente, ‘falar’. Rosa cria também o
verbo ‘nheengar’, de pura aclimatação tupi, e, juntando
a ‘jaguaretê’ — tupinismo para onça verdadeira — a
terminação nhennhém, ou nhem, como se fora uma
desinência verbal, forma outras palavras, para exprimir
o linguajar das onças. O texto fica, por assim dizer,
mosqueado de nheengatu, e esses rastros que nele
aparecem preparam e anunciam o momento da
metamorfose (...): o tigreiro, em seu rancho encravado
na “jaguaretama”, enquanto conta para seu hóspede
os ‘causos’ de caçada e morte, está também falando
uma linguagem de onça. À medida que a história flui,
tudo vai convergindo para o clímax metamórfico. Este
não é apresentado, mas presentificado pelo texto: o
onceiro acaba, arrastado por sua narrativa,
transformando-se em onça, diante dos olhos do
interlocutor (e dos leitores). A transfiguração se dá no
momento em que a linguagem se desarticula, quebrase em resíduos fônicos, que soam como um rugido ou
um estertor, pois o interlocutor virtual, tomando
consciência da metamorfose, dispara contra o homemiauaretê o revólver que mantivera engatilhado durante
toda a conversa. Neste Iaueretê, não é a história que
cede o primeiro plano à palavra, mas a palavra, que,
ao irromper em primeiro plano, configura a
personagem e a ação, desenvolvendo a história.
Haroldo de Campos. A linguagem do Iauaretê. Metalinguagem & outras metas: ensaios de teoria e crítica literária. 4.ª ed. São Paulo: Perspectiva, 2010, p. 57-­‐64 (com adaptações). 14. (UnB-2º2012) No período “À medida que a
história flui, tudo vai convergindo para o
clímax metamórfico” (l.15 e 16), a correlação
entre as formas verbais permaneceria
gramaticalmente correta, se a expressão
verbal da oração principal fosse substituída
por convergirá.
15. (UnB-2º2012) No período “não é a história que
cede o primeiro plano à palavra, mas a
palavra, que, ao irromper em primeiro plano,
configura a personagem e a ação” (l.21 e 22),
a oposição conceitual entre “história” e
“palavra” é realçada no nível sintático.
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Trecho 1: Nhenhem? Eu cacei onça, demais. (...) Eu
não mato mais onça, mato não. Onça meu parente.
Trecho 2: Eu sou onça... Eu-onça! (...) Mecê acha que
eu pareço onça? Mas tem horas em que eu pareço
mais.
Trecho 3: Hum, nhem? Cê fala que eu matei? Eu sou
onça. Jaguaretê tio meu, irmão de minha mãe, tutira...
Meus parentes! Meus parentes!
Trecho 4: De repente, eh, eu oncei... Iá. (...) Levei pra
o Papa — Gente. Papa gente, onça chefe, onço
comeu jababora Gugué.
Trecho 5: Mecê tá ouvindo, nhem? Tá aperceiando...
Eu sou onça, não falei? Axi. Não falei — eu viro onça?
Onça grande, tubixaba.
Trecho 6: Mecê brinca não, vira esse revólver pra lá.
(...) Ói: cê quer me matar, ui?
João Guimarães Rosa. Meu tio, o Iauaretê. In: Ficção completa. V. II. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, p. 825-­‐52. 16. (UnB-2º2012) Em “De repente, eh, eu oncei...”
(trecho 4), o verbo, criado a partir do
substantivo designativo de animal, remete a
formas compatíveis com a morfologia flexional
do português e equivale, no que diz respeito
ao sentido, à estrutura eu sou onça.
17. (UnB-2º2012) O trecho “Jaguaretê tio meu,
irmão de minha mãe” (trecho 3) mostra que o
pronome possessivo, em função adjetiva,
comporta-se, no português, como o adjetivo,
que pode estar antes ou depois do
substantivo, sem que haja alteração de
sentido, como em um simples homem / um
homem simples.
18. (UnB-2º2012) A oração inicial do período
“Mecê brinca não, vira esse revólver pra lá.”
(trecho 6) seria também aceitável na língua
portuguesa se a palavra “não” fosse retirada
da posição em que se encontra e colocada
antes de “brinca”, ou se a oração, além do
“não” já existente, recebesse outro não antes
de “brinca”.
Iracema
Além, muito além daquela serra, que ainda
azula no horizonte, nasceu Iracema.
www.tenhoprovaamanha.com.br Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha
os cabelos mais negros que a asa da graúna, e mais
longos que seu talhe de palmeira.
O favo da jati não era doce como seu sorriso;
nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito
perfumado.
Mais rápida que a ema selvagem, a morena
virgem corria o sertão e as matas do Ipu, onde
campeava sua guerreira tribo, da grande nação
tabajara. O pé grácil e nu, mal roçando, alisava
apenas a verde pelúcia que vestia a terra com as
primeiras águas.
Um dia, ao pino do Sol, ela repousava em um
claro da floresta. Banhava-lhe o corpo a sombra da
oiticica, mais fresca do que o orvalho da noite. Os
ramos da acácia silvestre esparziam flores sobre os
úmidos cabelos. Escondidos na folhagem os pássaros
ameigavam o canto.
Iracema saiu do banho: o aljôfar d’água ainda a
roreja, como à doce mangaba que corou em manhã de
chuva.
Enquanto repousa, empluma das penas do
guará as flechas de seu arco, e concerta com o sabiá
da mata, pousado no galho próximo, o canto agreste.
A graciosa ará, sua companheira e amiga,
brinca junto dela. Às vezes sobe aos ramos da árvore
e de lá chama a virgem pelo nome; outras remexe o
uru de palha matizada, onde traz a selvagem seus
perfumes, os alvos fios do crautá, as agulhas da juçara
com que tece a renda, e as tintas de que matiza o
algodão.
Rumor suspeito quebra a doce harmonia da
sesta. Ergue a virgem os olhos, que o sol não
deslumbra; sua vista perturba-se.
Diante dela e todo a contemplá-la está um
guerreiro estranho, se é guerreiro e não algum mau
espírito da floresta.
Tem nas faces o branco das areias que bordam
o mar; nos olhos o azul triste das águas profundas.
Ignotas armas e tecidos ignotos cobrem-lhe o corpo.
Foi rápido, como o olhar, o gesto de Iracema. A
flecha embebida no arco partiu. Gotas de sangue
borbulham na face do desconhecido.
De primeiro ímpeto, a mão lesta caiu sobre a
cruz da espada; mas logo sorriu. O moço guerreiro
aprendeu na religião de sua mãe, onde a mulher é
símbolo de ternura e amor. Sofreu mais d’alma que da
ferida.
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O sentimento que ele pôs nos olhos e no rosto,
não o sei eu. Porém, a virgem lançou de si o arco e a
uiraçaba, e correu para o guerreiro, sentida da mágoa
que causara.
A mão que rápida ferira, estancou mais rápida e
compassiva o sangue que gotejava. Depois Iracema
quebrou a flecha homicida: deu a haste ao
desconhecido, guardando consigo a ponta farpada.
O guerreiro falou:
— Quebras comigo a flecha da paz?
— Quem te ensinou, guerreiro branco, a
linguagem de meus irmãos? Donde vieste a estas
matas, que nunca viram outro guerreiro como tu?
— Venho de bem longe, filha das florestas.
Venho das terras que teus irmãos já possuíram, e hoje
têm os meus.
— Bem-vindo seja o estrangeiro aos campos
dos tabajaras, senhores das aldeias, e à cabana de
Araquém, pai de Iracema.
José de Alencar. Iracema. São Paulo: Ed. Ática, 1991, p. 23. 19. (UnB-2º2012) O trecho “o aljôfar d’água ainda
a roreja, como à doce mangaba que corou em
manhã de chuva” (l.13 e 14) poderia ser
reescrito, recuperando-se o verbo elíptico, da
seguinte forma: o aljôfar d’água ainda a roreja,
como ele roreja a doce mangaba que corou
em manhã de chuva.
20. (UnB-2º2012) Mantém-se a correção
gramatical do trecho “Foi rápido, como o olhar,
o gesto de Iracema” (l.27), caso ele seja
reescrito do seguinte modo: Foi rápido o
gesto, como o olhar, de Iracema.
21. (UnB-2º2012) No trecho “onde campeava sua
guerreira tribo, da grande nação tabajara” (l.7),
“tribo” e “nação” evocam associação
metonímica, desempenhando a expressão “da
grande nação tabajara” função sintática de
aposto.
22. (UnB-2º2012) No período “Diante dela e todo
a contemplá-la está um guerreiro estranho, se
é guerreiro e não algum mau espírito da
floresta.” (l.23-24), a dúvida acerca da
identidade do jovem que contempla Iracema
encontra-se justificada, no trecho, por meio do
adjetivo “estranho”.
www.tenhoprovaamanha.com.br 23. (UnB-2º2012) Em “O moço guerreiro aprendeu
na religião de sua mãe, onde a mulher é
símbolo de ternura e amor” (l.29-30) o verbo
aprender, empregado como intransitivo, tem o
sentido de receber instrução ou educação.
24. (UnB-2º2012) No período iniciado à linha 32,
mantêm-se a correção gramatical e a
interpretação semântica da estrutura
coordenada, caso o trecho iniciado com a
forma de particípio seja colocado, entre
vírgulas, logo após a conjunção “e” que
antecede a forma verbal “correu”: (...) e,
sentida da mágoa que causara, correu para o
guerreiro.
25. (UnB-2º2012) No período “Venho das terras
que teus irmãos já possuíram, e hoje têm os
meus.” (l.42-43), o pronome relativo “que” —
elíptico na oração coordenada — exerce a
função de adjunto, na primeira oração em que
aparece, e de complemento verbal, na
coordenada.
Esta história começa numa noite de março tão
escura quanto é a noite enquanto se dorme. O modo
como, tranquilo, o tempo decorria era a lua altíssima
passando pelo céu.
Fora para o lado do mar que aquele homem
pretendera ir, antes mesmo de ter encontrado por feliz
acaso o hotel. Mas — sem mapa, conhecimento ou
bússola — embrenhara-se terra adentro.
“Hoje deve ser domingo” — chegou mesmo a
pensar com certa glória, e domingo seria o grande
coroamento de sua isenção. Tratava-se de seu
primeiro pensamento claro, desde que deixara o hotel.
Na verdade, desde que fugira, era o primeiro
pensamento que não tinha mera utilidade de defesa.
De início, aliás, Martim até não soube o que fazer com
ele. Apenas agitou-se à novidade, e coçou-se voraz
sem parar de andar.
Foi mais além que estacou diante do primeiro
passarinho. O passarinho negro estava pousado num
ramo baixo, à altura de seus olhos; com mão pesada e
potente, o homem pegou-o sem machucá-lo, com a
bondade física que tem uma mão pesada.
Com o leve peso a carregar, o homem
continuou sua marcha entre pedras.
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— Não sei mais falar, disse, então, para o
passarinho, evitando olhá-lo...
Só depois pareceu entender o que dissera, e
então olhou face a face o sol. “Perdi a linguagem dos
outros”, repetiu, então, bem devagar, como se as
palavras fossem mais obscuras do que eram, e de
algum modo muito lisonjeiras.
Alguma coisa estava lhe acontecendo. E era
alguma coisa com um significado, embora não
houvesse um sinônimo para essa coisa que estava
acontecendo. E não havia sinônimo para nenhuma
coisa...
Aquele homem rejeitara a linguagem dos outros
e não tinha sequer começo de linguagem própria. E,
no entanto, oco, mudo, rejubilava-se. Assim, ao
remexer agora com fascínio ainda cauteloso na
linguagem morta, ele tentou, por pura experiência, dar
o título antigamente tão familiar de “crime” a essa
coisa tão sem nome que lhe sucedera.
Clarice Lispector. A maçã no escuro. Rio de Janeiro: Rocco, 1998 (com adaptações). 26. (UnB-2º2012) Em “De início, aliás, Martim até
não soube o que fazer com ele” (l.9), seriam
mantidas a correção gramatical e a
interpretação, caso a expressão de retificação,
“aliás”, fosse intercalada entre “fazer” e “com
ele”.
27. (UnB-2º2012) No período “O modo como,
tranquilo, o tempo decorria era a lua altíssima
passando pelo céu.” (l.2), o sentido, a
correção gramatical e a coerência
permaneceriam inalterados caso se colocasse
o sujeito “o tempo” entre “como” e a vírgula.
Quando ficou claro que a designação de Homo
sapiens não era tão adequada à nossa espécie como
se havia acreditado — porque, afinal, não somos tão
razoáveis como se acreditava no século XVIII, em seu
otimismo ingênuo —, acrescentaram-lhe a de Homo
faber (homem que fabrica). Entretanto, a expressão
Homo ludens (homem que joga) evoca uma função tão
essencial quanto a de fabricar e merece, portanto,
ocupar seu lugar junto à de Homo faber.
Johan Huizinga. Homo ludens. Madri: Alianza, 2001, p. 7 (com adaptações). 28. (UnB-1º2012) No primeiro período do texto,
encontra-se formulada sintaticamente a causa
www.tenhoprovaamanha.com.br da relativa adequação da designação Homo
sapiens à espécie humana, mas não, a
referência ao valor temporal do elemento
“Quando” (l.1).
Muita gente considera o catch um esporte
ignóbil. O catch não é um esporte, é um espetáculo, e
é tão ignóbil assistir a uma representação da dor, no
catch, como ao sofrimento de Arnolfo ou de
Andrômaca. Existe, no entanto, um falso catch,
pomposo, com a aparência inútil de um esporte
regular; mas esse não tem qualquer interesse. O
verdadeiro — impropriamente chamado catch amador
— realiza-se em salas de segunda classe, onde o
público adere espontaneamente à natureza
espetacular do combate, como o público de um
cinema de bairro. Ao público pouco importa que o
combate seja falseado ou não; o futuro racional do
combate não lhe interessa: o catch é uma soma de
espetáculos, sem que um só seja uma função: cada
momento impõe o conhecimento total de uma paixão
que surge, sem jamais se estender em direção a um
resultado que a coroe.
Assim, a função do lutador não é ganhar, mas
executar exatamente os gestos que se esperam dele.
O catch propõe gestos excessivos, explorados até o
paroxismo da sua significação. Esta função de ênfase
é a mesma do teatro antigo, cuja força — língua — e
cujos acessórios — máscaras e coturnos —
concorriam
para
fornecer
a
explicação
exageradamente visível de uma necessidade. O gesto
de um lutador vencido, significando uma derrota que
não se oculta, mas se acentua, corresponde à
máscara antiga, encarregada de significar o tom
trágico do espetáculo. O lutador prolonga
exageradamente a sua posição de derrota, caído,
impondo ao público o espetáculo intolerável da sua
impotência. No catch, como nos teatros antigos, não
se tem vergonha da dor, sabe-se chorar, saboreiam-se
as lágrimas.
Roland Barthes. Mitologias. Rio de Janeiro:
DIFEL, 2010, p. 15-26 (com adaptações).
29. (UnB-1º2012) Na oração concessiva “sem que
um só seja uma função” (l.8), há elipse do
núcleo nominal do sujeito da oração.
30. (UnB-1º2012) Seriam mantidas a correção
gramatical e a interpretação original do texto,
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se o trecho “os gestos que se esperam dele”
(l.11-12) fosse reescrito como os gestos lhe
são esperados.
31. (UnB-1º2012) Os dois primeiros períodos do
texto continuariam corretos e coerentes com o
texto se fossem parafraseados do seguinte
modo: Embora seja considerado um esporte
ignóbil, o catch é um espetáculo tanto quanto
outros em que há representação da dor, o que
invalida característica que muitos lhe
atribuem.
No processo da Revolução Francesa, quando
destruíram os últimos resquícios do feudalismo na
eufórica noite de 4 de agosto de 1789, os deputados
concordaram em manter o dízimo da Igreja, em vez de
simplesmente aboli-lo sem qualquer compensação.
Mas, desde então, houve sinais de que a promessa
seria abandonada. “Eles desejam ser livres, mas não
sabem ser justos”, reclamou o abade de Seyès,
referindo-se a alguns colegas da Assembleia.
Robespierre não era nem antipadres nem anticlerical;
é difícil determinar sua posição quanto ao futuro da
Igreja na Revolução. Às vezes, era veemente crítico e,
em outras vezes, retornava à interpretação da doutrina
cristã, pois, a seu ver, o cristianismo era a religião dos
pobres e daqueles de coração puro — riqueza
chamativa e luxo não deveriam fazer parte dele. Os
pobres, segundo ele, eram oprimidos não apenas pela
fome, mas também pelo espetáculo escandaloso de
clérigos
autoindulgentes,
que
esbanjavam
insensivelmente o que pertencia aos pobres por
direito.
Ruth Scurr. Pureza fatal: Robespierre e a Revolução Francesa. Rio de Janeiro/São Paulo: Record, 2009, p. 140-­‐1 (com adaptações). 32. (UnB-1º2012) No trecho “houve sinais de que
a promessa seria abandonada” (l.3-4), o
substantivo “promessa” tem como referente o
trecho “em vez de simplesmente aboli-lo sem
qualquer compensação” (l.3).
33. (UnB-1º2012) No trecho “que esbanjavam
insensivelmente o que pertencia aos pobres
por direito” (l.11-12), o complemento direto de
“esbanjavam” é modificado por uma oração
adjetiva.
www.tenhoprovaamanha.com.br 1 Ajustou, na medida, umas talas de cálamo exatas,
E, do dorso através e da pele, enfiou no quelônio
E, conforme pensava, uma pele de boi esticou
4 E dois braços extremos dispôs, por travessa
ajuntados.
Sete cordas de tripa de ovelha estendeu
harmoniosas.
Ao depois de fazê-lo, tomou do amorável brinquedo
7 E co’um plectro uma a uma provou cada corda, aos
seus dedos
Ressoava tremenda.
Homero. Hinos homéricos. Hino a Hermes, v. 44-53.
Introdução e tradução de Jair Gramacho. Brasília: UnB, 2003.
34. (UnB-1º2012) No verso “Ao depois de fazê-lo,
tomou do amorável brinquedo” (v.6), o
emprego do complemento iniciado por
preposição exemplifica recurso estilístico que
não altera a transitividade da forma verbal
“tomou”.
A crise da Europa é hoje o maior risco para a
economia mundial, disse o secretário do Tesouro dos
Estados Unidos da América, referindo-se à tensão
entre os bancos e os governos endividados. Disse,
ainda, que a China e outros países emergentes com
superávit nas contas têm espaço bastante para
estimular o consumo interno, aumentar as importações
e compensar a fraca demanda nas economias
desenvolvidas. Para isso, os governos desses países
deveriam deixar suas moedas valorizar-se. Em outras
palavras, o câmbio subvalorizado da China resulta em
valorização real das moedas de outros países
emergentes, torna seus produtos mais caros e diminui
seu poder de competição no comércio internacional.
Rolf Kuntz. O Estado de S.Paulo, 25/9/2011. 35. (UnB-1º2012) No segundo período do texto,
as estruturas oracionais com as formas
infinitivas “estimular”, (l.4) “aumentar” (l.4) e
“compensar” (l.4) estão associadas à
possibilidade de não se realizar foneticamente
o sujeito das respectivas orações, o que
assegura, portanto, interpretação ligada à
referência indeterminada do sujeito das
orações que têm como núcleo do predicado
essas formas verbais.
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O emplasto
Um dia de manhã, estando a passear na
chácara, pendurou-se-me uma ideia no trapézio que
eu tinha no cérebro.
Uma vez pendurada, entrou a bracejar, a
pernear, a fazer as mais arrojadas cambalhotas. Eu
deixei-me estar a contemplá-la. Súbito, deu um grande
salto, estendeu os braços e as pernas, até tomar a
forma de um X: decifra-me ou devoro-te.
Essa ideia era nada menos que a invenção de
um medicamento sublime, um emplasto antihipocondríaco, destinado a aliviar a nossa melancólica
humanidade.
Na petição de privilégio que então redigi,
chamei a atenção do governo para esse resultado,
verdadeiramente cristão. Todavia, não neguei aos
amigos as vantagens pecuniárias que deviam resultar
da distribuição de um produto de tamanhos e tão
profundos efeitos. Agora, porém, que estou cá do
outro lado da vida, posso confessar tudo: o que me
influiu principalmente foi o gosto de ver impressas nos
jornais, mostradores, folhetos, esquinas e, enfim, nas
caixinhas do remédio, estas três palavras: Emplasto
Brás Cubas. Para que negá-lo? Eu tinha a paixão do
arruído, do cartaz, do foguete de lágrimas. Talvez os
modestos me arguam esse defeito; fio, porém, que
esse talento me hão de reconhecer os hábeis.
Assim, a minha ideia trazia duas faces, como as
medalhas, uma virada para o público, outra para mim.
De um lado, filantropia e lucro; de outro, sede de
nomeada. Digamos: — amor da glória.
Um tio meu, cônego de prebenda inteira,
costumava dizer que o amor da glória temporal era a
perdição das almas, que só devem cobiçar a glória
eterna. Ao que retorquia outro tio, oficial de um dos
antigos terços de infantaria, que o amor da glória era a
coisa mais verdadeiramente humana que há no
homem e, consequentemente, a sua mais genuína
feição.
Decida o leitor entre o militar e o cônego; eu
volto ao emplasto.
Machado de Assis. Memórias póstumas de Brás Cubas. Obra completa, v. I. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992, p. 514-­‐5 (com adaptações). 36. (UnB-1º2012) No trecho “pendurou-se-me
uma ideia no trapézio que eu tinha no cérebro”
(l.1-2), a combinação dos pronomes “se” e
“me” exemplifica a variante padrão da língua
portuguesa à época do texto. No que se refere
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ao português contemporâneo, uma estrutura
equivalente que manteria a ênfase no sujeito
da oração e a correção gramatical seria a
seguinte: uma ideia pendurou-se no trapézio
que eu tinha em meu cérebro.
(UnB-1º2012) No trecho “Na petição de
privilégio que então redigi” (l.8), o pronome
tem a função de complemento do verbo.
(UnB-1º2012) O termo “tudo” (l.11) especifica
e resume as ideias evocadas na estrutura
após o sinal de dois-pontos.
(UnB-1º2012) O termo “estas três palavras”
(l.13) é complemento direto de “ver” (l.12) e
sintetiza o termo coordenado que antecede
essa expressão.
(UnB-1º2012) No trecho “Ao que retorquia
outro tio, oficial” (l.20), observa-se oração
adjetiva como elemento modificador do
aposto, que inicia o período.
O espelho
Se quer seguir-me, narro-lhe; não uma
aventura, mas experiência, a que me induziram,
alternadamente, séries de raciocínios e intuições.
Tomou-me tempo. Surpreendo-me, porém, um tanto à
parte de todos, penetrando conhecimento que os
outros ainda ignoram. O senhor, por exemplo, que
sabe e estuda, suponho nem tenha ideia do que seja,
na verdade — um espelho? Decerto, das noções de
física, com que se familiarizou, as leis da ótica.
Reporto-me ao transcendente, todavia...
O espelho, são muitos, captando-lhe as feições;
todos refletem-lhe o rosto, e o senhor crê-se com
aspecto próprio e praticamente inalterado, do qual lhe
dão imagem fiel. Mas — que espelho? Há-os bons e
maus, os que favorecem e os que detraem; e os que
são apenas honestos, pois não. E onde situar o nível e
ponto dessa honestidade ou fidedignidade?
Como é que o senhor, eu, os restantes
próximos, somos, no visível? O senhor dirá: as
fotografias o comprovam. Respondo: que, além de
prevalecerem para as lentes das máquinas objeções
análogas, seus resultados apoiam antes que
desmentem a minha tese, tanto revelam superporemse aos dados iconográficos os índices do misterioso.
Ainda que tirados de imediato, um após outro, os
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retratos sempre serão entre si muito diferentes. E as
máscaras, moldadas nos rostos? Valem, grosso modo,
para o falquejo das formas, não para o explodir da
expressão, o dinamismo fisionômico. Não se esqueça,
é de fenômenos sutis que estamos tratando.
Resta-lhe argumento: qualquer pessoa pode, a
um tempo, ver o rosto de outra e sua reflexão no
espelho. O experimento, por sinal ainda não realizado
com rigor, careceria de valor científico, em vista das
irredutíveis deformações, de ordem psicológica. Além
de que a simultaneidade torna-se impossível, no fluir
de valores instantâneos. Ah, o tempo é o mágico de
todas as traições... E os próprios olhos, de cada um de
nós, padecem viciação de origem, defeitos com que
cresceram e a que se afizeram, mais e mais. Os olhos,
por enquanto, são a porta do engano; duvide deles,
dos seus, não de mim. Ah, meu amigo, a espécie
humana peleja para impor ao latejante mundo um
pouco de rotina e lógica, mas algo ou alguém de tudo
faz brecha para rir-se da gente...
Vejo que começa a descontar um pouco de sua
inicial desconfiança quanto ao meu são juízo.
Fiquemos, porém, no terra a terra. Rimo-nos, nas
barracas de diversões, daqueles caricatos espelhos,
que nos reduzem a mostrengos, esticados ou
globosos. Mas, se só usamos os planos, deve-se a
que primeiro a humanidade mirou-se nas superfícies
de água quieta, lagoas, fontes, delas aprendendo a
fazer tais utensílios de metal ou cristal. Tirésias,
contudo, já havia predito ao belo Narciso que ele
viveria apenas enquanto a si mesmo não se visse...
Sim, são para se ter medo, os espelhos...
João Guimarães Rosa. O espelho. In: Primeiras estórias. Ficção completa. Rio
de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, v. 2, p. 437-55 (com adaptações).
41. (UnB-1º2012) Na estrutura “do qual lhe dão
imagem fiel” (l.8), a expressão “imagem fiel”,
em termos semânticos, é a informação nova
do período, tendo em vista que os elementos
“do qual”, “lhe” e “dão” retomam,
respectivamente, referência em constituintes
sintáticos anteriores, a saber: “aspecto próprio
e praticamente inalterado” (l.8); “o senhor”
(l.7); e “todos” (l.7), sujeito da oração.
Que agora estão meus olhos contemplando,
Parece que hoje o céu me vem pintando
4 A mágoa triste, que meu peito sente.
Firmeza a nenhum deles se consente
Ao doce respirar do vento brando;
7 O tronco a cada instante meneando,
A fonte nunca firme, ou permanente.
Na líquida porção, na vegetante
10 Cópia daquelas ramas se figura
Outro rosto, outra imagem semelhante:
Quem não sabe que a tua formosura
13 Sempre móvel está, sempre inconstante,
Nunca fixa se viu, nunca segura?
Cláudio Manoel da Costa. Apud Domício Proença Filho. A poesia dos inconfidentes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2002, p. 85. Texto II
O espelho
O
espelho: atra
vés
de seu líquido nada
me des
dobro.
Ser quem me
olha
e olhar seus
olhos
nada de
nada
duplo
mistério.
Não amo
o espelho: temo-o.
Orides Fontela. Poesia reunida (1969-­‐1996). São Paulo: Cosac Naify; Rio de Janeiro: 7letras, 2006, p. 212. 42. (UnB-1º2012) Na última estrofe do poema O
espelho, nos versos “Não amo o espelho:
temo-o”, o pronome átono exemplifica uma
substituição pronominal caracterizada, na
gramática normativa, como objeto direto
pleonástico.
43. (UnB-1º2012) No poema O espelho, nos
versos “Ser quem me / olha / e olhar seus /
olhos”, o possessivo “seus” tem como
referente à estrutura predicativa “quem me /
olha”.
Texto I
LXXIX
1 Entre este álamo, ó Lise, e essa corrente,
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É somente nos meados do século XIX, com
Varnhagen, que a língua do Brasil assume contornos
de
problema
de
interesse
nacional
e,
concomitantemente, passa a constituir objeto de
cogitação, para registro de uma realidade já
consistente e documentável. Varnhagen afirma a
unidade de língua nos dois domínios — o que, a seu
ver, justificava o estudo dos clássicos e a
impossibilidade de separação das duas literaturas —,
mas ressalta, todavia, a diversificação da língua
falada, notadamente na prosódia e no léxico, o que
atribui ao acastelhanamento do português na América.
A caracterização da língua do Brasil como um
português diferenciado — esboçada em Varnhagen —
representa, entre outros aspectos, uma das posições
que delimitarão os debates em torno da língua até o
final do século XIX.
Edith Pimentel Pinto (Org.). O português do Brasil – textos críticos e teóricos – 1820-­‐1920: fontes para a teoria e a história. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1978, p. XVI-­‐XIX (com adaptações). 44. (UnB-2º2011) Na linha 6, o pronome “que” é
complemento da forma verbal “atribui”.
45. (UnB-2º2011) A estrutura “de separação das
duas literaturas” (l.5), que é complemento do
núcleo nominal “impossibilidade” (l.5), pode
ser substituída, com correção gramatical e
sem prejuízo semântico, por de que separe
as duas literaturas.
Ainda que aparentemente movida apenas pelo
sentimento geral de lusofobia, característico da época,
a geração romântica, fundamentada nas concepções
evolucionistas da linguística da época, segundo as
quais as línguas se comportavam como seres vivos e,
portanto, nasciam, cresciam, envelheciam e morriam,
aspirou a uma língua própria, a chamada língua
brasileira, instalando uma polêmica, que será
retomada, de forma mais radical, pela primeira
geração modernista, a da Semana de Arte Moderna,
de 1922. Enquanto os românticos — apesar de
acreditarem que o nascimento da chamada língua
brasileira era fato contra o qual não se poderiam
insurgir — não reivindicavam mais que o direito a certa
originalidade, os escritores modernistas serão os que,
de fato, buscarão, na realidade linguística brasileira, as
formas que constituirão a sua expressão.
Tânia C. F. Lobo. Variantes nacionais do português: sobre a questão da definição www.tenhoprovaamanha.com.br do português do Brasil. In: Revista Internacional de Língua Portuguesa. Lisboa, dez./1994, p. 9-­‐15. Internet: <www.aulp.org> (com adaptações). 46. (UnB-2º2011) A estrutura “apesar de
acreditarem que o nascimento da chamada
língua brasileira era fato contra o qual não se
poderiam insurgir” (l.6-8) pode ser reescrita,
sem prejuízo semântico, como apesar de
darem crédito ao fato irreprimível do
descobrimento da língua de origem
brasileira.
47. (UnB-2º2011) No primeiro período do texto, as
formas “movida” (l.1), “fundamentada” (l.2) e
“aspirou” (l.4), que se caracterizam como
estruturas sintáticas distintas, estão ligadas,
semanticamente, ao mesmo elemento
referencial.
Não se sabe ao certo quando os primeiros
escravos africanos foram trazidos para o Brasil. No
entanto, é somente a partir do alvará de D. João III de
29 de março de 1549, que faculta o “resgate e
recebimento de escravos da costa da Guiné e da ilha
de São Tomé” para auxílio da cultura da cana e do
trabalho dos engenhos, que a importação de escravos
africanos para o Brasil cresce de forma vertiginosa. Já
no final do século XVI, os africanos ocupavam
majoritariamente a base da sociedade colonial
brasileira, o que iria acentuar-se no século XVII. É
possível que os primeiros escravos africanos tenham
tido contato com a língua geral, mas, com a redução
da presença indígena na zona açucareira, pode-se
dizer que os escravos passaram a ter contato, desde
cedo, com o português. Os escravos que eram
incapazes de se comunicar nessa língua eram
chamados de boçais, em oposição aos que
demonstravam conhecer o português, que eram
chamados de ladinos. No decorrer do século XVIII,
com o ciclo do ouro, aumentou a onda migratória vinda
de Portugal, e o tráfico negreiro também se orientou
para as demandas cada vez maiores de mão de obra
para a mineração, tendo aumentado, portanto, o
acesso dos escravos africanos à língua portuguesa.
Dante Lucchesi. História do contato entre línguas no Brasil. In: Dante Lucchesi, Alan Baxter e Ilza Ribeiro (Org.). O português afro-­‐brasileiro. Salvador: EDUFBA, 2009, p. 47-­‐8 (com adaptações). O gramático
Os negros discutiam
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Que o cavalo sipantou
Mas o que mais sabia
Disse que era
Sipantarrou.
Oswald de Andrade. Poesias reunidas. 5.aed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978 48. (UnB-2º2011) No primeiro período do texto, a
locução “ao certo” (l.1) está ligada, no nível
semântico, à negação observada na oração
principal e reforça a ideia expressa na oração
adverbial temporal, iniciada pela conjunção
“quando” (l.1).
49. (UnB-2º2011) A estrutura do trecho “faculta o
‘resgate e recebimento de escravos da costa
da Guiné e da ilha de São Tomé’ para auxílio
da cultura da cana e do trabalho dos
engenhos” (l.3-5) está centrada em
nominalizações, que — se consideradas as
formas verbais cognatas — correspondem a
estruturas verbais na voz passiva sem agente
explícito.
Erro de português
Quando o português chegou
Debaixo duma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena! Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
O português
Oswald de Andrade. Poesias reunidas. 5.ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978. Quando aqui aportaram os portugueses, há
mais de 500 anos, falavam-se, no país, mais de mil
línguas indígenas; tal profusão linguística constitui-se
numa situação semelhante à que ocorre, hoje, nas
Filipinas (com 160 línguas), na Índia (com 391 línguas)
ou, ainda, na Indonésia (com 663 línguas).
Gilvan Müller de Oliveira. Brasileiro fala português: monolinguismo e preconceito linguístico. In: Revista Linguagem. Internet: <www.letras.ufscar.br> (com adaptações). 50. (UnB-2º2011) No trecho “numa situação
semelhante à que ocorre” (l.2-3), a locução
pronominal poderia, corretamente, ser
substituída por à qual.
www.tenhoprovaamanha.com.br Os representantes do povo francês, reunidos
em Assembleia Nacional e considerando que a
ignorância, a negligência ou o menosprezo dos direitos
do homem são as únicas causas dos males públicos e
da corrupção governamental, resolveram apresentar,
numa declaração solene, os direitos naturais,
inalienáveis e sagrados do homem.
Declaração dos direitos do homem e do cidadão [1789]. In: Lynn Hunt. A invenção dos direitos humanos: uma história. São Paulo: Companhia das Letras, p. 225 (com adaptações). Parece que me encontro diante de uma grande
crise, não apenas francesa, mas europeia e, talvez,
mais que europeia. Considerando-se bem as
circunstâncias, a Revolução Francesa é a mais
extraordinária que o mundo já viu. Os resultados mais
surpreendentes se deram e, em mais de um caso,
produzidos pelos meios mais ridículos e absurdos, da
maneira mais ridícula e, aparentemente, pelos mais vis
instrumentos. Tudo parece fora do normal neste
estranho caos de leviandade e ferocidade, em que
todos os crimes aparecem ao lado de todas as
loucuras.
Edmond Burke. Reflexões sobre a Revolução em França. Brasília: Ed. UnB, 1982, p. 52 (com adaptações). É com pesar que pronuncio a verdade fatal: Luís deve
morrer para que a pátria viva.
Maximilien de Robespierre. Discurso à Convenção Nacional, 3/12/1792. 51. (UnB-2º2011) Seria mantida a correção
gramatical, se a sentença proferida por
Robespierre tivesse sido traduzida como: É
pesaroso que a verdade fatal é
pronunciada por mim: é preciso Luís
morrer para a pátria viver.
52. (UnB-2º2011) No primeiro período do segundo
texto, a ideia de incerteza quanto a aspectos
enunciados pelo autor seria mantida, com
correção gramatical, se o trecho fosse
reescrito como Talvez me encontro diante
de uma grande crise, não francesa, mas
europeia e, mais que europeia, parece.
53. (UnB-2º2011) Na linha 2 do primeiro texto, a
conjunção “ou”, dada a sua natureza
semântica de elemento codificador de
exclusão, indica que o sintagma “dos direitos
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do homem” refere-se apenas ao núcleo
nominal “menosprezo”.
GABARITO
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LITERATURA- Arcadismo