UnP – UNIVERSIDADE POTIGUAR PRÓ – REITORIA DE PESQUISA E PÓS – GRADUAÇÃO LATO SENSU ALQUIMY ART/SP CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ARTETERAPIA SORAYA DELÚZIA FERRAZ LIMA BAHIA ARTETERAPIA E DANÇA CIRCULAR: UM CAMINHAR DANÇANTE NATAL / RN 2006 SORAYA DELÚZIA FERRAZ LIMA BAHIA ARTETERAPIA E DANÇA CIRCULAR: UM CAMINHAR DANÇANTE Monografia apresentada á Universidade Potiguar, RN e ao Alquimy Art de SP, como parte dos requisitos para obtenção do título de Especialista em Arteterapia. Orientadora: Esp. Márcia Bertelli Bottini NATAL / RN 2006 SORAYA DELÚZIA FERRAZ LIMA BAHIA ARTETERAPIA E DANÇA CIRCULAR: UM CAMINHAR DANÇANTE Monografia apresentada á Universidade Potiguar, RN e ao Alquimy Art de SP, como parte dos requisitos p a r a obtenção do título de Especialista em Arteteerapia Aprovado em: ____/ ____/ ____ Prof. Att. Márcia Bertelli Bottini Orientadora Prof. Dra. Cristina Dias Allessandrini Coordenadora do Curso de Especialização em Arteterpia Prof. MsC. Deolinda M.C.F. Fabietti Coordenadora do Curso de Especialização em Arteterapia Aos meus amores Da minha Roda do Dia a Dia Zezito - Bárbara - Letícia AGRADECIMENTOS Agradeço, reconheço e celebro na minha Roda da Vida! Adalberto, Cleonice, pai, mãe, absolutamente fundamentais... Zezito, esposo, absolutamente companheiro... Bárbara, Letícia, filhas, absolutamente encantadoras... Beto, Idinha, irmão, irmã, família, absolutamente presentes... Professoras, Esp. Márcia Bertelli Bottini, Esp. Cristina Osélia, MsC Deolinda Fabietti, Dra. Cristina Dias Allessandrini, afetuosamente orientadoras... Turma B do curso de Especialização em Arteterapia, UnP Natal/RN, afetuosamente companheira... Grupo de Estudo, “ As Marias”: Betânia, Lídia, Luzia, Nerialba, Rosineide, Leda, Marta afetuosamente colegas-amigas... Grande parceira, Rosineide, afetuosamente amiga ... Dançantes, Ana Paula, Catarina, Elisângela, Lídia, Lili, Márcia, Maurício, Nísia, Regineide, Simone, Telma, Uiara, Zita, alegremente presentes... A todos minha gratidão. Eu Louvo a Dança Eu louvo a Dança, pois liberta o ser humano do peso das coisas – une o solitário à comunidade. Eu louvo a Dança, que tudo pede e tudo promove: Saúde, Mente Clara e uma Alma Alada. Dança é transformação do espaço, do tempo e do ser humano, este constantemente em perigo de fragmentar-se, tornando-se somente cérebro, vontade ou sentimento. A Dança, ao contrário, pede o ser humano total, ancorado no seu centro. A Dança pede o homem liberto, vibrando em equilíbrio com todas as forças. Eu louvo a Dança Ser humano, aprenda a Dançar! Senão os anjos no céu Não saberão o que fazer de você. Aurelius Augustinus (354-430) RESUMO A intenção deste trabalho monográfico, é situar a Dança Circular no caminho da Arteterapia, através de vivências pessoais. A Dança, trilha nos caminhos da Arteterapia, quando cria possibilidades para um contato maior com nosso ser interior, o ser íntegro, e assim amplia a percepção que temos sobre nós mesmos, a percepção que temos sobre o mundo. Ao permitir o interagir do cognitivo, afetivo, pensamento, sentimento, razão e emoção, desperta e estimula o ser sensível, consciente e cultural, para um viver de modo criativo. Nos passos da Dança, encontra-se história, tradição e expressão dos sentimentos e desejos individuais e coletivos. Na Arteterapia a emoção de lidar, é um revelar de emoções através do contato com materiais e técnicas expressivas. Arteterapia e Dança Circular, um caminho para o aprendizado, crescimento, conhecimento e desenvolvimento do Ser Humano Palavras chave : Humanismo, Entusiasmo, Arteterapia. RESUME L’intention cet travail monografique, est replacer la Danse Circulaire au chemin de l’Artethérapie, confirmé par l’expériences personnelles. La Danse, marche au chemin de l’Artethérapie, est possible quand il y a plus de contact avec nos être interne, l’être honnête et ainsi elargir la perception qui ont sur nous même, la perception qui ont sur le monde. Permettre l’interation de cognitive, afetive, pensée, sentiment, raison et émotion réveiller l’être sensible, conscient et culturel par um mot criative de vivre. La marche de la Danse se trouve historique, tradition et expression des sentiments et désirs individuells et colective. A l’Artethérapie une emouvoir, est un reveler des émotiones par le contact avec materiaux et techniques expressives. L’Artethérapie et la Danse Circulaire, un chemin pour l’apprentissage, expansion et dévellopement du l’être humain. Mots: Humanisme. Enthousiame. Artethérapie. LISTA DE FIGURAS Figura 1: Um toque de Carinho, Oficina em período de estágio.................................... 39 Figura 2: Brincadeiras de Criança, oficina em período de estágio.................................. 39 Figura 3: Construção do Personagem, oficina em período de estágio.............................. 40 Figura 4: Diversão com o barro, oficina em período de estágio....................................... 41 Figura 5: Construção de mandalas. Oficina em período de estágio.................................. 41 Figura 6: Semente. Trabalho de finalização do Módulo do Barro.................................... 52 Figura 7: Qual é o meu caminho?..................................................................................... 53 Figura 8: Árvore da Vida, realizada no módulo Funções Junguianas............................. 54 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO............................................................................................ 10 1.1 TRAJETORIA: anDANÇAS COM A ARTE, COM A DANÇA....................... 10 1.2 CHEGAR AO TEMA: UM CAMINHAR DANÇANTE................................... 16 2 DE MÃOS DADAS COM A ARTETERAPIA.............................................. 19 3 NOS PASSOS DA DANÇA CIRCULAR..................................................... 26 4 E NAS RODAS DA VIDA............................................................................ 29 4.1 O DESENHO DAS MANDALAS.................................................................. 29 4.2 O FOGO DA CRIATIVIDADE...................................................................... 32 4.3 O TEMPO DO BRINCAR............................................................................ 34 5 RODAS POR ONDE ANDEI....................................................................... 43 5.1 RODAS ITINERANTES............................................................................... 44 5.2 TRÊS VIVÊNCIAS LOCAIS......................................................................... 45 5.3 QUATRO ENCONTROS NACIONAIS........................................................ 48 6 DANÇAR A ARTETERAPIA – EMOÇÃO DE LIDAR ................................ 50 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................ 60 REFERÊNCIAS................................................................................................... 62 10 1 INTRODUÇÃO 1.1 TRAJETORIA : anDANÇAS COM A ARTE, COM A DANÇA Nasci numa cidade do interior da Bahia, Vitória da Conquista. Sou Conquistense! Quantas conquistas, ao longo dos meus 45 anos! Quantas mais virão? Quantas perdas e ganhos, alegrias e tristezas, realizações e frustrações. Vivi intensamente minha infância: livre, leve e solta, fazendo muita “Arte”! E vez por outra a pergunta: - O que vai ser, quando crescer? Queria ser diferente, atraente, inteligente. Ver muitas coisas, ir a muitos lugares, conhecer muitas pessoas. Queria ser artista: dançarina, cantora, professora. Para tanto, busquei, fui em muitos caminhos, e hoje tenho certeza que a vida é a mais pura emoção para ser vivida com Arte, então: Cantei... em coral infantil, de igreja, de trabalho, de ópera, para ninar minhas filhas e canto hoje, para embalar minha vida; Desenhei... em papel, risquei parede, chão, e hoje procuro fazer o mais belo dos desenhos, com o movimento da minha vida; Representei... fiz teatro, drama, comédia, e hoje atuo com propriedade, no papel de mulher que acredita na beleza da vida; Pintei... porta, papel, parede, “pintei o 7”, e hoje me entrego na fluidez de uma aquarela; Dancei... “atrás de um trio elétrico, só não vai quem já morreu”, e danço hoje de mãos dadas em qualquer roda, que posso estar para celebrar a alegria de viver; Estudei... em colégio público, particular, cursinho pré-vestibular. Fiz 11 faculdade de Educação Artística, faço Arteterapia, e continuarei estudando sempre; Contei... inventei histórias, e vou contar um pouco da minha: “Mulher de Fases”, ressaltar as relações, “Complicada e Perfeitinha” de família, amizade, trabalho, amor, de quando criança, adolescente, e de criança evoluída, como fui chamada recentemente, por um colega. Infância, lugar tranqüilo, quanta saudade, da minha terra querida... Viver numa cidade do interior é poder exercer a liberdade que toda criança deseja: correr na rua, de noite de dia, ir nas praças, ouvir as bandinhas tocando nos coretos, ir nos parques. E, era assim que me sentia, totalmente segura. Podíamos ter os nossos esconderijos e brincar em todos os lugares. Lembro-me bem das rodas de Ciranda Cirandinha, que fazíamos na calçada da minha casa, das prendas de Cair no Poço, dos Cozinhados nos quintais, com comidas com gosto de queimado, feitas em panelinhas de barro compradas nas feiras, das competições de corrida, e da correria quando passavam as vacas. Cresci aprendendo o valor dos laços e relações de afeto que unem uma família. Os encontros aos domingos, em casa da minha avó materna, as brincadeiras com os primos, as brigas, que tem que ter, a melancia de depois do almoço, a jaca dura, mole eu não gostava, o peru bêbado do Natal, o grito do leitão, antes de cair na faca, são lembranças boas... Dos meus avós, gosto de saber suas histórias, quando nasci eles já não estavam mais aqui. Dos muitos amigos de infância, guardo muitas lembranças e a certeza da intensidade dos momentos vividos juntos. Dos amores de infância, perdidos nas lembranças... os, da adolescência, lembrados vez por outra. Adolescência, tão esperada, outras tantas muDanças... Aos quatorze anos, me mudei para Salvador, isso era legal, morar na capital!. Mas as coisas eram 12 diferentes: cidade grande, tudo longe, poucos conhecidos, aliás, nenhum conhecido! Entretanto, logo estávamos fazendo parte do grupo de jovens da igreja. Melhorou! Vieram as participações no coral, teatro, as paqueras, as festas. Ir para a missa aos domingos, era bom. Melhor ainda era depois da missa, os encontros na pracinha. Morávamos na Lapinha... “Quando eu morrer me enterrem na Lapinha...” Em Salvador, morei em quatro lugares. Se nasci e morei até os quatorze anos na mesma casa, nos quatorze anos seguintes, morei em quatro apartamentos, quatro bairros, quatro lugares diferentes. Diferentes, desencontrados, eram os sentimentos nessa época. Só gostava de quem não gostava de mim, complexo e dor por ter acne, auto estima baixa, timidez. Nem me lembro até quando perduraram. Mas, se não foram de todo solucionados, melhoraram, não deixaram marcas tão profundas. Nem a acne! E o tempo que não para? Não para! Chegara a hora de trabalhar. Trabalhar no Banco Econômico, proporcionou-me grandes encontros. Fiz grandes amigos e lá, conheci o meu marido. Um dia ele chegou e sentou no seu birô. Quando levantou para ir até o arquivo, nos olhamos... Gostei do seu olhar. Daí para começar um romance, foi fácil. Uma carona um dia, outro dia, todo dia... Mas, providencial fora uma transferência para a agência central do banco. Era o lugar que mais me agradava, o contato com o público, a diversidade das pessoas que passavam por lá, aposentados, os que recebiam salários pelo banco, e simplesmente, todos os funcionários do Banco “desfilavam” na agência: o mais velho, já com quase oitenta anos, lúcido, tornou-se meu amigo, diretores, presidente, e Irmã Dulce. Nossa! É desejo do povo baiano, a beatificação de Irmã Dulce... Conheci, então a regente do coral do Banco. Realmente minha vida deu um salto. Cantar e encantar, muitos lugares com o coral. Viajei fisicamente e 13 espiritualmente. Tinha novamente encontrado meu grupo. E ai a luz: fazer vestibular para Música. Fiz o teste de aptidão, eliminatório, e passei. Tinha tentado três vezes vestibular, para áreas diversas, que nem me lembro mais. Demorei para entender, que estava ali, na Música, o meu caminho. Era o reencontro com a magia, a emoção, com a alegria de estar em contato com a Arte. E no caminho, hora de decisão ou indecisão: casar! Imagina vir acompanhada de tantas muDanças: outra cidade, outro estado, Natal, Rio Grande do Norte. Sair de um ambiente conhecido, deixar amigos, pai, mãe, família, e ir só com uma pessoa construir uma vida nova. Seria outra Dança!!! É claro, não foi fácil, mas tudo conspirou. Consegui transferência do banco e da faculdade. Aí, já tinha três atividades: trabalhar no banco, fazer faculdade e ajudar meu marido no seu negócio, uma pequena lanchonete. Atividade que gostava muito, pois novamente o contato com as pessoas me fazia bem, e era uma forma de conhecer a cidade. Então me tornei sua sócia, dona do meu próprio negócio. Idéia que, de inicio, parece ser fácil, logo se revela num grande desafio. São muitas as obrigações, responsabilidades. Somos nosso próprio chefe, fazemos nosso horário, ninguém nos manda. Para quem militou em sindicato bancário, parece ser um sonho, mas ver o outro lado da moeda, se torna um grande exercício de tolerância, de doação, de aprendizado em todo o tempo, em cada momento. Estar grávida, quanta emoção! O resultado positivo do exame, a primeira mexida do nenen na barriga, o barulho do coração na primeira ultra, saber o sexo, escolher o nome, a barriga crescendo, crescendo... O momento do nascimento... Escolhi a maneira mais rica de lhe dizer através de versos e prosas quanto eu amo você 14 Quando mamãe anunciou Que o nenen ia nascer Primeira vez Que isto ia acontecer Menino ou menina Ela não sabia dizer Todos nós sentimos Uma alegria de envaidecer Eu tinha que Para todos contar Não sabia como Alguém ia chegar Para depois Bárbara se chamar Cleonice Ferraz, avó materna. Novamente, grávida! E a avó novamente poetizou: Novamente a notícia Desta vez Bárbara deu Na barriga da mamãe Está o nenen que ela prometeu Nove meses: Letícia nasceu Gorda e branquinha Ficamos muito contentes Bárbara tinha uma irmãzinha! Ser mãe... ser mãe suficientemente boa... Grande desafio! Desafio foi fazer 40 anos... mas como? Já? Parecia ontem ter 15... Resolvi, então, não tinha jeito mesmo, festejar, e desde muito antes, anunciava: - Esse ano vai ter festa! Contratei uma banda, comprei um vestido maravilhoso, e o dia chegou. Realmente, foi uma festa maravilhosa! Sempre gostei de fazer surpresas, nos aniversários dos meus amigos, e olhem só, me pregaram uma peça, no dia do meu: os meus colegas do curso de francês, uma turma bem unida, combinaram de se vestirem de branco, como baianas, com adereços, lenços, contrataram um grupo de capoeira e chegaram na festa, todos com velas nas mãos, água que diziam ser benta, fazendo o maior barulho. Parou a festa, afastaram as cadeiras e o grupo de capoeira fez uma apresentação em minha homenagem, uma grande Roda. Lembro-me, envaidecida, 15 de um comentário: - Não é toda pessoa que tem uma manifestação de carinho dessas, não! E a festa continuou até de manhã. Desde então, comemoro todos os anos, com alegria, o ano que passou e o que estar por vir. E nesse ano de 2000, mais um grande encontro em minha vida: A Dança Circular Sagrada. A imensa alegria que senti, quando na Dança, me reportei aos tempos de criança e dançava nas brincadeiras de roda. Quantas histórias, quantos sentimentos, quantas expressões são vividas na Dança. Tinha encontrado a minha prática de vida, trabalhar a totalidade: corpo, mente e espírito. E a partir desse encontro venho fortalecendo o meu ato de dançar, através de estudos, pesquisas, contato com outras pessoas e grupos que dançam. E principalmente a certeza de que dançar, é viver a alegria de estar e fazer parte de um Todo, a alegria de estar só e acompanhada, de estar em paz, em harmonia, união, comunhão. Consciente que dançar é celebrar a vida. E caminhando nessa direção, em 2004 vou encontrar a Emoção de Lidar, no curso de Arteterapia. Desenvolver uma atividade que certamente trará benefícios não só para mim, mas para minhas relações, me faz sentir estar sempre re-ligando com algo maior. E essa possibilidade de transformação, adaptação, contato com sentimentos expressados verdadeiramente, revelados através da Arte me fascina. É ver o mundo colorido, florido, com muitos sons, muitos sabores, muitos amores. É acreditar que tudo vale a pena, que a beleza está na presença do ser e que tudo conspira para o bem da humanidade. Eu fico com a beleza da resposta das crianças é a vida é bonita... é bonita... e ... é bonita. (GONZAGUINHA, 1999) 16 1.2 CHEGAR AO TEMA: UM CAMINHAR DANÇANTE O Ser humano é um nó de relações, voltado em todas as direções – para cima, para o sonho; para o alto, para Deus; para dentro de si, para o seu coração; para os lados, para os seus irmãos e irmãs; para baixo, para a terra, para a natureza. Relações em todas as direções. E o ser humano só se realiza, se ele agiliza, se ele articula as relações. (LELOUP, 1997, p.86). Diante dessa reflexão, encontro plenamente as respostas para os meus questionamentos: Qual o sentido da vida? Quem sou eu? Quem é você? Somos quem podemos e queremos ser, exercendo a arte de se relacionar. E tecendo com passos um caminho, trançando laços fortes de sentimentos, tramando redes de envolvimentos, buscar a alegria de ser nos movimentos, que ampliam, aprofundam e transformam. Perceber que existem, nesses movimentos, mil possibilidades de criação, de reação e relação, pois que nada é imutável, tudo no mundo, muda, a todo tempo a todo momento, e nas minhas anDanças, sempre caminhei, dancei nessa direção. Sempre quis estar em contato, com muito tato, com as pessoas que encontro, com a família, com os amigos, um conhecido, um desconhecido. Tecer laços com o meu mundo exterior, que me rodeia, como também ir em direção ao meu mundo interior, na busca de um auto-conhecimento, de transformações, de crescimento como ser humano. Essa foi e é uma prática no meu dia a dia. Gostar de conversar, de olhar, de sorrir, de observar, de refletir, de caminhar, de dançar: Savoir sourire A une iconnue qui passe N’en garder aucune trace Sinon celle du plaisir * (PAGNY, 2000) *saber sorrir a um desconhecido que passa, não olhar nenhum traço, a não ser aquele do prazer. 17 Querer estar presente e ser presente, contribuir através das minhas ações, para construção de uma sociedade ativa e dinâmica, exercendo uma cidadania que respeite as crenças, os costumes, as tradições, as manifestações que emana das pessoas. E estando aberta a novas experiências, descobrir, tentar, acertar, errar, sofrer, mas sair fortalecida dessas experiências. Acredito ser a Arteterapia um meio para esse caminhar. O que vale na vida, não é o ponto de partida e sim a caminhada caminhando e semeando, no fim terás o que colher (CORALINA, 2006) Nesse caminhar precisamos do conhecimento, da pesquisa, do estudo, do desenvolvimento individual, histórico e cultural. Precisamos reconhecer o potencial que cada um traz dentro de si, e sua contribuição para construção de uma Sedes Sapientiae (Sede da Sabedoria). É o ser sensível, cultural e consciente revelando sua vida como uma valiosa obra de arte. Arte que está presente nos momentos importantes da vida do ser humano. Arte que está na criação e na evolução. Arte como desejo, necessidade e vontade para expressão dos sentimentos mais puros, fortes e verdadeiros. E que pela arte, através de arte, o ser humano possa revelar todas as emoções de sua alma. E sendo a arte, facilitadora desse processo, seus benefícios são relatados na história da humanidade, em todas as manifestações do viver. Então, a Arteterapia com a Dança Circular, pode e deve ser um movimento revelador das emoções do Ser Humano. Do Ser que se relaciona, se articula, se emociona. Do Ser Dançante! Porque eu danço! É o momento que reservei para mim. É o meu momento. A vida é muito corrida, e nem sempre se reserva um tempo para introspecção, meditação, para nos voltarmos para dentro. Só depois podemos nos 18 dar, pois acumulamos ”algo” para dar . (C.N. artista plástica, Natal/RN, 2004). Antes de dançar, estava com um pouquinho de depressão e quando terminou a dança, tinha passado, eu fiquei alegre. (Chaguinha, funcionário público, Natal/RN, 2004). 19 2 DE MÃOS DADAS COM A ARTETERAPIA Como se fora brincadeira de roda ... memória Jogo do trabalho na dança das mãos ... macias No suor dos corpos, na canção da vida ... História No suor da vida no calor de irmãos ...magia Como um animal que sabe da floresta ... memória Redescobrir o sal que está na própria pele ... macia Redescobrir o doce no lamber das línguas ... Redescobrir o gosto e o sabor da festa Vai o bicho homem fruto da semente...memória Ver nascer da própria força própria luz e fé ...memória Entender que tudo é nosso, sempre esteve em nós ... História Somos a semente ato e voz ... magia Tudo principia na própria pessoa ... Vai como a criança que não teme o tempo ...mistério Que é como fosse dor ... magia Como se fora brincadeira de roda ... Redescobrir ( Elis Regina. 1988) Trago os versos dessa canção de Gonzaguinha, numa relação direta com a Dança, como registro de um povo, com seus sentimentos e sua história. Pois há de estar na memória, a história de qualquer coisa que queira se contar, há de estar no sentimento a magia do encontro, há de estar no homem o fruto da semente que germinará, há de estar na própria pessoa o conhecimento e a possibilidade de sempre se Redescobrir... ... MEMÓRIA Está na emoção de contar sua história, que a humanidade busca esse registro e a Dança de Roda sempre foi um desses meios. Sua origem se confunde com a própria origem da humanidade. O homem antigo dançava em círculo para seus deuses, numa prática diária e espontânea, num ato de celebração de todas as passagens e ciclos de sua vida. O homem moderno, perdeu muito dessa prática, apesar de vários movimentos estarem buscando esse resgate, como acontece com as Danças Circulares dos Povos, onde há a possibilidade de experimentar um bem 20 estar, um prazer de compartilhar, um conhecimento e desenvolvimento como ser humano. Um caminho para encontrar sua totalidade. Bernhard Wosien, bailarino, coreógrafo, alemão polonês, preocupado para que não ficasse só na memória e fossem esquecidas, em 1952 iniciou uma pesquisa sobre as danças folclóricas da Europa Velha e adaptou-as a forma circular originando ao que hoje chamamos de Danças Circulares dos Povos. Ele foi em busca da Dança como manifestação popular, como movimento revelador das emoções do ser humano, como celebração e alegria. Dizia que de todas as danças populares que tinha estudado, as suas preferidas eram as que ainda tinham suas raízes na fé. Nessas danças, todos os membros da comunidade participam, há um momento de construção, onde todos decidem, uma produção simbólica ativa, estabelecendo um pacto entre as gerações, de manutenção da tradição. A forma da dança está ligada a qual família pertence, cria-se um movimento próprio revelador de uma identidade Ariano Suassuna, escritor brasileiro, faz uma citação na abertura do DVD Lunário Perpétuo do multiartista Antônio Nóbrega, que vejo total relação com o que Wosien fez com as Danças de Rodas da Europa: Tem um momento em que a pessoa é arrebatada pela própria invenção, pela própria imaginação. Esses são os grandes momentos, os outros servem de sustentáculo a esse. Mas esses são realmente os grande momentos, e Antonio Nóbrega tem. (SUASSUNA, 2003) Houve esse grande momento, também na vida de Wosien, quando ele, aos sessenta anos de idade, tem essa arrebatação pela dança, como um caminho esotérico, em grego esoteros hodos, caminho interior. E a partir de então passa a fazer esse seu caminho: Dança - Um caminho para Totalidade, título do livro que é o resultado de um trabalho póstumo, desenvolvido por sua filha, Maria-Gabriele 21 Wosien. O livro traz a trajetória brilhante desse artista, fala das suas experiências pessoais, e o seu caminho na dança, do conhecimento das raízes, das origens, dos mitos e símbolos , dos exercícios de bale clássico, da dança palaciana, do folclore europeu, até a religiosidade dessa arte. “Nossa oração devia ser a nossa dança, porém não só no caminhar silencioso do andante mas também nos saltos alegres do allegro vivo. (WOSIEN, 2000, p.119). Então, Bernhard, inicialmente com um repertório pequeno, uma coletânia de danças, em 1976 irá a Findhorn, uma comunidade em forma de vilarejo, situada na Escócia, com um extenso programa de cursos voltados para o desenvolvimento humano, e vivenciará a força dessa oração, dessa meditação em movimento. Dessa semente, germinará muito frutos, que se espalharão por vários lugares do planeta. Então acarinhada por essa idéia da dança como uma forma de oração, meditação em movimento, esse caminhar, passa a ser também o de sua filha, MariaGabriele Wosien: dar continuidade ao que desenvolvera com seu pai. Assim, privilegia em seu trabalho, o estudo dos mitos, das origens religiosas e ritualísticas, se tornando um grande expoente de pesquisa e divulgação da Dança Circular Sagrada, no âmbito mundial. Suas andanças pela Índia, seus estudos dos rituais dos Dervixe Mevlevi, suas pesquisas sobre os contos folclóricos Russos, seus estudos sobre os símbolos sagrados de uma criação e de uma história, ampliará, cada vez mais, essa rede de meditação pela dança. Meditação para alcançar um estado de entrega: Para mim, o ponto alto da Dança é o momento em que libertos da coreografia, conseguimos alcançar um estado de “abandono ou entrega”, que possibilita a abertura de nosso íntimo e proporciona a exaltação da nossa condição humana. ( CARVALHO, Apud RAMOS, 2002, p.05) É de Carlos Solano Carvalho, essa reflexão, um dos primeiros 22 focalizadores de Danças Circulares no Brasil. Ele fora residente em Findhorn por seis meses e retornando ao Brasil, de início dançava em reuniões com os amigos evoluindo para um trabalho mais organizado. E como ele mesmo diz, “a Dança Sagrada pode - e deve - contribuir para a aproximação dos indivíduos”(Apud RAMOS, 2000, p.08), e o aproximou de Renata Ramos, que maravilhada pela Dança organiza o livro, Danças Circulares Sagradas - Uma Proposta de Educação e Cura. Livro essencial para quem quer ser um dançante. Traz relatos de um grupo de doze pessoas de diferentes áreas profissionais, com bagagens culturais e religiosas diferentes, mas que tem na Dança laços fortes de união. São depoimentos de experiências vivenciadas, revelando o quanto é possível agregar a Dança em outras práticas profissionais. O quanto o movimento de dançar facilita a comunhão das pessoas entre si e com elas mesmas. Um tema, desse livro, tratado com muito carinho, é o papel do focalizador, nome dado as pessoas que facilitam as danças. As qualidades, citadas por Ramos, de um focalizador se adequam tão bem as de um arteterapeuta; - qualidade da clareza de expressão - clareza de intenção - começo, meio e fim - saber uma dança com todo seu corpo - flexibilidade, simplicidade e humildade - ritmo e sensibilidade musical - bagagem cultural e espiritual. - O focalizador se prepara, e daí se entrega, para que seu trabalho deslize como um surfista desliza nas ondas do mar. (RAMOS, 2002, p.193). 23 ...JOGO DO TRABALHO NA DANÇA DAS MÃOS... MACIAS “Saber uma Dança com todo seu corpo.” (RAMOS,2002, p.191), e não há como falar desse corpo físico, esse corpo que também conta uma história, sem falar do autor Jean Ives Leloup, e o seu livro O Corpo e seus Símbolos. E, de toda essa simbologia contida nesse corpo, gostaria de destacar o DAR E RECEBER DAS MÃOS NO CÍRCULO, “Através das mãos comunicamos nossa energia, nosso coração” (LELOUP,2004, p.124). Uma mão com a palma virada para cima, NO GESTO DE RECEBER, a outra que virada para baixo, NO GESTO DE DAR, equilibra toda uma energia ao mesmo tempo sutil e potente. E nesse gesto, nesse ritual de dar as mãos numa roda que sentimos toda a força do elo que se forma, do firmamento de uma relação, de um conhecimento. MÃO - que guia, que conduz, ampara, afaga, apaga. Que faz um primeiro contato, num aperto de mão: “Muito prazer”... MÃOS QUE DANÇAM !!! Mãos que estão no trabalho do artista, do artesão, do homem do campo, do doutor de graduação, mas sendo sempre um instrumento de manifestação de uma idéia, de uma criação, do belo artístico e do belo como expressão. ...TUDO PRINCIPIA NA PRÓPRIA PESSOA E, na Arteterapia, também tudo não principia na própria pessoa? A Arte estando presente desde os primórdios da história da humanidade, levando a mudanças, proporcionando a transmissão do conhecimento, o registro de uma trajetória do tempo, e a Arteterapia, não estaria também presente, através do contato com técnicas e materiais expressivos, como uma forma de experimentar a verdade dos sentimentos, da expressão com emoção? A Arte como Emoção de Lidar, presente no trabalho da Doutora Nise da Silveira, pioneira no Brasil, com a utilização da expressão artística, numa ação 24 terapêutica, e de tantos outros profissionais, em todo o mundo, que utilizaram e utilizam a Arte no tratamento terapêutico, como expressa muito bem, Andrade, em seu livro, Terapias Expressivas: “É condição “sine qua non” que a arte esteja no centro do trabalho para este poder ser considerado como arte terapia. A Arte é portanto a coluna vertebral da arte terapia” (ANDRADE, 2000, p.165). Coluna que é fortalecida pelo trabalho de Allessandrini (1996), também arrebatada por um momento de criação, quando organiza uma metodologia específica: as Oficinas Criativas. Esse processo segue etapas que proporcionam alcançar o objetivo desejado. Então, as Oficinas Criativas, se desenvolvem, num espaço, que na Arteterapia, chamamos Ateliê Terapêutico. Num primeiro momento, a Sensibilização: um convite para a pessoa se abrir a experiência que virá, conectando seu mundo interno. A Expressão Livre é a concretização do trabalho, através do contato com materiais artísticos variados. Ainda no nível não verbal, passamos para a Elaboração da Expressão, observação a partir de um novo ângulo, dando abertura para significações. Na Transposição de Linguagem, é a hora da palavra escrita, relato do que viveu. E a Avaliação que, finaliza, para o saber consciente das etapas processuais. E, a Dança Circular, trilha também e tão bem os caminhos dessa ação terapêutica. Pelo movimento harmonioso que se estabelece ao dançar, se reconhece, nesse movimento, a vida, a verdade da expressão corporal, sentimental e cultural. Se estabelece um contato não verbal, mas intenso na revelação de emoções e sentimentos. Dança como uma poesia, como a Arte do gesto. A Arte do gesto de lidar. Eu canto (DANÇO) porque O instante existe E a minha vida 25 Está completa. Não sou alegre Nem sou triste ...Sou Poeta (MEIRELLES, 2006) 26 3 NOS PASSOS DA DANÇA CIRCULAR Dançar, quer dizer Acima de tudo Comunicar-se, unir-se, encontrar-se Falar com o próximo E sobre a profundidade do seu ser Dançar é união de pessoa a pessoa de pessoa com o Universo de pessoa com Deus. ( BÉJART, 2006) As Danças Circulares, Danças de Roda, Danças Sagradas, tem raízes nas Danças Folclóricas e Tradicionais dos Povos. São danças, originariamente ou adaptadas, para serem dançadas em círculo aberto ou fechado, de mãos dadas, com passos e ritmos que expressam a cultura, a história, a tradição de um povo. Dançar é uma celebração à vida, nos seus ciclos, com alegria, beleza e bem estar. É descobrir ou redescobrir possibilidades de novos encontros, como forma de manifestar presença e continuidade, como forma de expressão dos sentimentos, desejos, individuais e de uma coletividade. A humanidade dançou e dançará os momentos solenes de sua existência. A Dança, como presença importante, reveladora de momentos e movimentos da humanidade, como um ritual, uma oração feita com o corpo. E ao dançar junto com seu povo, em comum unidade, sentimentos são despertados e relações são firmadas. Relação de continuidade, manutenção e respeito às tradições, que facilmente identificamos nas comunidades pobres, com suas danças populares, com raízes na fé, onde pessoas tão simples no modo de viver, com tantas dificuldades materiais, mas que ao dançar se transportam para um modo glamouroso de se mostrar, como um meio para registrar e perpetuar sua história. Ou tão somente uma 27 relação de enorme prazer e entrega, presentes nas festas atuais, da modernidade, num encontro para dançar livremente, numa reunião entre muitas pessoas. Segundo Wosien (2000, p. 26), “Na dança, o ser humano consegue exprimir todos os altos e baixos de suas sensações. Assim, a dança é simplesmente vida intensificada”. No dançar em roda, nos posicionamos em um Círculo, poderoso símbolo de igualdade, perfeição, unidade, totalidade, símbolo para o princípio da criação. E estando todos eqüidistantes de um ponto central, que é o lugar de convergência de todas as partes do grande Círculo, o coração da roda, nos olhamos num mesmo nível, sentindo o acolhimento desse olhar. De mãos dadas, evoluímos com movimentos no sentido horário e antihorário, o relógio nos mostra o curso do sol do nascente ao poente, então fazemos um caminhar em direção a luz, nossa mão direita com a palma voltada para cima recebe e a mão esquerda com a palma virada para baixo, transmite, passa a luz adiante. É o dar e receber, desenvolvendo atitudes de cooperação e integração, acolhendo a todos que queiram entrar na roda. Nos sentimos apoiados com essas atitudes. Ainda no Círculo, percebemos o nosso limite, com a necessidade de ocupar e/ou ceder um lugar no espaço: “Eu me apresento e te saúdo, eu te considero, te dou espaço enquanto ocupo o meu espaço, eu sigo o meu caminho”, movimento presente na dança grega Kos. Nos sentimos respeitados em nossas diferenças. Assim, as Danças Circulares dos Povos, são simples e fáceis de aprender, não necessitando de nenhuma experiência anterior, pois a intenção maior é participar, vivenciar. Os passos, geralmente uma seqüência rítmica e cadenciada, as músicas étnicas, clássicas, new age, os cantos tradicionais, o contato com uma 28 linguagem simbólica, possibilitam momentos de plenitude, onde não se pensando em nada, fazemos uma meditação em movimento. Ampliamos nossa consciência de sermos parte de um todo. Então, o ato de dançar, desenvolve um processo onde trabalhamos e estimulamos as funções do pensamento, sentimento, intuição, percepção, sensação, fazendo emergir o criativo na revelação da condição humana: acertos, erros e tentativas. E a Arteterapia também como facilitadora desse processo, cria um espaço sagrado para realização das sessões, o ateliê terapêutico. Será o local onde dará condições de segurança e acolhimento, necessárias para que o cliente supere suas dificuldades, e se descubra inteiro, tendo a compreensão de todo o seu universo humano. É possível, encontrar esse espaço sagrado, fazendo Um Caminhar Dançante com a Arteterapia e a Dança Circular: Na realidade, a Dança Circular se torna Sagrada a partir do momento em que os participantes entram em contato com sua essência, em contato com a parte de seu ser que está intimamente conectada com algo transcendental. No momento desse contato temos a união do espírito e matéria e a possibilidade da criação . O ser humano portanto, se torna um ser íntegro quando se torna criativo. (TRIOM, 2002) 29 4 E NAS RODAS DA VIDA 4.1 O DESENHO DAS MANDALAS Todo o Poder do Mundo sempre trabalha em círculos e tudo tenta ser redondo... O céu é redondo e eu ouvi dizer que a Terra é redonda como uma bola e também as estrelas. O vento, no momento de seu maior poder, gira... Os pássaros fazem seus ninhos circulares, pois eles têm a mesma crença que nós... Mesmo as estações formam um grande círculo de mudanças que sempre retornam ao seu início. A vida de um homem é um círculo que vai da infância a infância e assim é em tudo onde o poder atua. (BOLEN, 2003 p.117) Com essa compreensão da força, do poder do círculo, como uma imagem espelhada do Universo, um Homem Santo dos Oglala Sioux, índio da América do Norte, descreve um campo de força e expressão de totalidade, presentes também nas mandalas. Mandala, palavra que tem sua origem no sânscrito e significa, roda, círculo mágico. Mandalas, como símbolos de expressão da totalidade psíquica, inclui em seu simbolismo toda imagem, toda circunferência ou quadrado, organizadas das mais variadas formas, a partir de um ponto central, um ponto de origem. Ponto que passa a ser um veículo de ligação, de união, de equilíbrio entre os elementos componentes dessa formação circular. Segundo, Nise da Silveira (1981, pág.100), “o centro da mandala representa o núcleo central da psique (self), núcleo que é fundamentalmente uma fonte de energia”. A médica, se correspondeu com Jung, mandando desenhos dos seus pacientes, querendo saber se eram mandalas, e recebendo resposta positiva, reforçou sua observação, de que aqueles desenhos traziam centramento e calma para quem os realizava. Jung, deu uma atenção especial para os desenhos de mandalas, no 30 estudo do processo de individuação. Estudo que expandiu o conhecimento sobre a natureza humana e seu desenvolvimento psicológico, fazendo uma descrição completa das imagens universais ou arquétipos, da relação mútua do consciente com o inconsciente para formar um indivíduo inteiro, que encontra a si mesmo, encontra o seu verdadeiro eu, o seu verdadeiro self. A energia do ponto central manifesta-se na compulsão quase irresistível para levar o indivíduo a tornar-se aquilo que ele é, do mesmo modo que todo organismo é impulsionado a assumir a forma característica de sua natureza, sejam quais forem as circunstâncias. ( JUNG, Apud NISE, l981, p. 100) Mandalas, como forma de representação artística ou emocional, podem aflorar do inconsciente, nas mandalas espontâneas ou nas mandalas dirigidas com uma intenção, como são as com determinado número de elementos, combinação de cores e desenho de imagens. Segundo Fioravanti (2004), as mandalas estão presentes em cada passo do seu trabalho, da sua caminhada espiritual. Utilizou para melhorar a energia de sua casa, como recurso terapêutico, aliadas a respiração para tratar problemas espirituais e criou o baralho intitulado 32 Caminhos de Sabedoria, como uma forma mais prática de trabalho, permitindo muitas outras formas de aplicação. São 32 cartas com desenhos, onde cada mandala tem uma estrutura numérica, um esquema de cores, visando um campo de vibração e representa através dos números, um caminho de sabedoria. Trilhar por um Caminho de Sabedoria é cumprir uma etapa evolutiva. Assim, um Caminho de Sabedoria leva a um Estado de Consciência que lhe corresponde, pois não é possível chegar a outro nível de consciência a não ser àquele para qual o caminho conduz. ( FIORAVANTI, 2004 p. 07) Mas é certo que, esses desenhos, presentes desde os primórdios da evolução humana, não possuem limites étnicos, geográficos ou temporais. Está presente nas culturas orientais, em seus templos de meditação, visando propiciar um 31 estado ampliado de consciência, até mesmo fazendo parte de rituais, movimentar energias de divindades como também, nas belas figuras usadas em projetos arquitetônicos e decorativos, nas culturas ocidentais. Ao olhar uma dança circular, podemos perceber que os participantes estão fazendo desenhos com seus corpos ao redor de um centro, portanto estão também fazendo mandalas. Estão através dessa linguagem corporal, criando movimentos que com suas vibrações, transformam um espaço, num determinado tempo. Nas mandalas que se formam ao fazermos as Danças de Roda, mesmo havendo uma repetição dos passos, cada vez é diferente na expressão, no fluir das emoções, na vibração tecida pelas relações estabelecidas, se constituindo assim em mandalas vivas e criativas. E se formos mais atentos, veremos essa formação circular se manifestando em nosso ser e na natureza. O nosso corpo físico, poderíamos até dizer, ser constituído de mandalas. Muitas das nossa células têm sua formação circular, com todo seu material mais importante no núcleo, no centro. A nossa íris do olho é tão reveladora nos estudos de iridologia e é uma mandala, a nossa impressão digital, tão individual e absoluta, também é uma mandala. E na natureza, na beleza de uma flor que entreabre, a partir de um centro, ou quando os animais querem se comunicar, passar uma informação, caso da abelha que se coloca ao centro para executar um movimento, com as outras posicionadas circularmente ao seu redor, que atentas a dança executada decodificam a informação e localizam uma fonte de alimento, uma fonte de vida: Dança... Alimento... Vida ! 32 4.2 O FOGO DA CRIATIVIDADE Na busca de uma totalidade de Ser, o Ser Humano, se percebe flexível em suas atitudes: pensar, sentir, transcender. É nessa busca, na procura de um saber como fazer e regular, que encontra o equilíbrio das partes que compõem a sua totalidade. E usando a razão, o sentimento, a intuição, a percepção, sem medo de ousar, experimentar, vivenciar, desenvolve uma consciência maior, da importância dos seus valores humanos. O mundo inteiro, fica dentro de nós mesmos, e se soubesse olhar e aprender, então a porta está diante de ti e a chave em sua mão. Ninguém, no mundo, pode dar-te a chave e a porta a abrir, a não ser, você mesmo. (J.KRISHNAMURTI, Apud EDWARDS, 1984 p.100) O movimento, a ação de criar, se abre para as possibilidades de, desenvolver esse mundo que fica dentro de nós mesmos, encontrar uma forma de conectar o corpo – mente - espírito na construção de um Ser Íntegro. É o desafio de abrir portas, sempre, com um olhar atento e observador no passo a passo do caminho percorrido, na elaboração de um conteúdo aprendido, e ao final a avaliação de um resultado alcançado. Segundo Ostrower, Criar representa um intensificação do viver, um vivenciar-se no fazer; e, em vez de substituir a realidade, é a realidade; é uma realidade nova que adquire dimensões novas pelo fato de nos articular-nos, em nós e perante nós mesmos, em níveis de consciência mais elevados e mais complexos. Somos nós, a realidade nova. Daí o sentimento do essencial e necessário no criar, o sentimento de um crescimento interior, em que ampliamos em nossa abertura para a vida. (OSTROWER, 1977, p.28). No projeto criativo, uma invenção do sujeito, o ato criador, está relacionado a tantas outras funções e ele será melhor realizado se tiver a liberdade para criar, livre de regras e convenções. Então, o Ser criador, é construído ao longo de sua vida, num ciclo que não tem fim, pois sempre haverá uma busca à algo novo, 33 que inquieta e desperta a criação, o conhecimento e a evolução. Sempre haverá a chama do fogo, que com seu caráter socializante reúne pessoas ao seu redor, dá aconchego, esquenta, aquece, mas também sendo rápido e fugaz, transforma. É um sentimento de existir, de se encontrar todo dia com um mundo novo, está presente na experiência de vida de cada um. É o fazer a partir do ser. E no ato de fazer, o criativo se torna presente na medida que interage o cognitivo e o afetivo, pensamento e sentimento, razão e emoção e tantas outras polaridades. É um processo que reconhece e valora as diferenças de cada pessoa, rumo ao seu desenvolvimento e crescimento pessoal. Utilizando a metodologia das Oficinas Criativas (Allesssandrini, l996), seguindo suas etapas, o fazer criativo pode ser alcançado, na medida em que o ateliê terapêutico, se torne um lugar sagrado e o cliente se sinta seguro, se perceba e se reconheça nas suas infinitas possibilidades de construção, individual e/ou coletiva. O cliente é despertado, através do contato com materiais artísticos, para seu processo maior de expressão: estar feliz e realizar-se como pessoa. E o Ser Consciente, mais sensível, pressupõe uma disponibilidade para entrega, movido pela curiosidade, pela opção de fazer escolhas, necessidade de estabelecer relações de trocas e desejo de expressão do que realmente é: Ser Humano Criativo, ser “Pessoas que se fazem perguntas” (OSTROWER, l977, p.06). - Lá na curva, o quê que vem, o quê que tem, quero saber? Saber como fazer um viver de modo criativo? - Não precisa necessariamente de nenhum talento especial. Precisamos fortalecer o prazer do sentimento de estarmos vivos! Segundo Winnicott (1989, p.28), o ser saudável é alcançado se vivido de um modo criativo que pode ser experienciado em suas três vidas: A Vida no Mundo, 34 que se localiza nas relações interpessoais e com o ambiente; A Vida da Realidade Psíquica Pessoal, chamada as vezes de vida interna, na qual uma pessoa é mais expressiva criativamente do que outra e A Área de Experiência Cultural, que vivida através de uma realidade compartilhada pode conduzir ao domínio da herança humana: artes, relacionamentos externos, sonhos, mitos, mistérios, história. Então na Arteterapia, no Brincar e na Dança Circular a pessoa é convidada para ser um Ser Saudável. É convidada para um caminhar, uma brincadeira, uma dança, por uma estrada de mudanças, uma estrada criativa, que tenha na emoção a medida para expressão dos seus mais variados e intensos sentimentos. Dance ... Brinque... Viva ... 4.3 O TEMPO DO BRINCAR Natural e universal o brincar não teme o tempo, idade ou lugar, estando presente em todas as culturas, em todas as etapas da vida, da infância a infância do ser humano. Da primeira infância, de criança, do tempo cronológico, linear e do retorno a infância na lembrança, da eterna criança no tempo circular. É o encontro da experiência com a alegria, do riso e a descontração, do real com o imaginário, do que é com o que gostaria que fosse. O brincar como uma maneira de comunicação, uma linguagem, uma expressão. Então o jogo, a brincadeira conduz a relacionamentos grupais, relacionamentos duais ou tão somente uma relação consigo mesmo. Nos jogos de competição, havendo o envolvimento de equipes, é possível trabalhar o respeito aos 35 limites, as escolhas, a diversidade, através de regulamentos onde existam regras pré-estabelecidas. Na relação de dois, num jogo de bate e volta, num ping pong entre o terapeuta e o paciente, o arteterapeuta e o cliente, a criança e o amigo imaginário, facilitando indiretamente a resolução de conflitos pessoais, o crescimento, a ação terapêutica se dará nessa liberdade de ir e vir, um ao encontro do outro. Esse brincar, uma atividade lúdica iniciada ainda bebê, o ser humano poderá experimentar durante todo o seu viver. De início o brincar com seu corpo, descoberta dos sons que emite e mais tarde com a participação de um elemento facilitador: o brinquedo, das mais diversas e variadas formas. (WINNICOTT, 1975). E como num passe de mágica, o brinquedo recebe um sopro de vida, e começa a falar, pular, brincar, se torna um companheiro presente, um parceiro de estrepolias, um amigo confidente, um protetor. Todas as crianças brincam, jogam, é sua forma de expressão, de linguagem. Estão de tal modo entrelaçados, o brincar e a criança, que praticamente um não existe sem o outro. As crianças sentem o mundo de uma forma singular, não tem medo de aprender brincando, pois toda brincadeira não é mais do que uma imitação transformada das emoções e das idéias, atribuindo novos significados a realidade. Aquele que brinca cria uma linguagem simbólica. Os adolescentes podem ser altamente motivados pelo jogo teatral, um improviso que estimula a imaginação para uma representação, com liberdade de expressão proporcionando um clima relaxado para o aparecimento de mensagens que podem ser identificadas pelo arteterapeuta. Então o adulto, a qualquer momento, na sua roda da vida, pode trazer a sua criança interior para a roda da dança e se permitir experimentar, revisitar seus 36 recantos escondidos e despertar um estado de alegria, um jeito inocente e autêntico muitas vezes preso e submetido aos padrões externos de comportamento. Experiências dentro de casa: Minha filha mais velha, então com mais ou menos 01 ano de idade, ganhou um boneco de pelúcia, o Mickey. Iniciou-se daí uma relação interessante: ela, seu pai e o Mickey. Os três estavam sempre a brincar, e o pai começou a dar uma fala para o Michey, fingia ser o brinquedo que falava. Conversavam com o brinquedo como se ele tivesse vida, Mickey de tudo participava, ia para todos os lugares, viajava, brincava de dirigir o carro, de esconde-esconde, de cantar, de pular. Um dia, fui deixá-la na escola e Mickey foi também, quando ela desceu o brinquedo ficou no carro, sentado no banco do carona e quando dei por mim estava eu a conversar com Mickey, fazendo-lhe confissões... Mickey foi presença por muito tempo em nossas vidas; Minha outra filha, sempre muito independente, desde pequenininha, quando dava o sono, ia para o seu quarto, dizendo: - Vou dormir no meu quarto! Confesso que muitas vezes até queria niná-la. E aí se deitava e começava a brincar com suas mãozinhas, tão pequeninas e tão ágeis, onde cada uma assumia um papel e conversavam entre si, relatavam uma para a outra as coisas que tinham acontecido, e ali ela ficava tranqüila até adormecer; Meu pai, com 90 anos de idade, motivo de muito orgulho para mim e de atenção maior, pois sempre fora ativo e agora quer continuar fazendo as coisas que sempre fez, mas é limitado pela idade e não se conforma. Fico a procurar uma forma para lhe estimular. Após um período com umas complicações, umas dores, ele veio passar uns dias comigo e num dia eu peguei uma caixa cheia de brinquedos e dei a ele, foi quando descobriu um pião. Disse que tinha sido muito bom com o pião e 37 começou a tentar jogá-lo. De início nada conseguia, mas era desafiador, e ele tentou até conseguir, fato que nenhum de nós conseguira. A sua satisfação era tanta, que corria parecendo um menino atrás do pião, e o brilho do olhar? Fizemos um acordo: ele treinar, para quando eu for em sua casa ele pegar o pião no canto da unha! Experiências fora de casa: Estágio com o projeto: Arteterapia: O Encontro do Lúdico com o Criativo. O estágio foi realizado em uma instituição não governamental, que trabalha um público com uma infância violentada. Atendemos um grupo de meninas de 07 a 18 anos. Descobrir como a Arteterapia poderia ajudar a melhorar a auto-estima, a auto-imagem, a agressividade e assim contribuir na qualidade de vida dessas meninas, foi o nosso propósito. E encontramos o fio condutor desse trabalho no brincar, o lúdico na ação terapêutica. Nos primeiros encontros nossa intenção foi fortalecer uma identidade, através de atividades de apresentação de seus nomes, na confecção dos crachás e na brincadeira de Jogar o Rolo... Rolar o Nome, brincadeira inventada por nós, como forma de se soltarem mais. Sentamos em círculo e com um rolo de linha, íamos jogando, uma para a outra, falando ou cantando nossos nomes. Depois, fizemos o combinado de revelarmos os nossos apelidos, da mesma forma, jogando o rolo. Dissemos que os apelidos eram para serem chamados, dentro do ateliê e com a aceitação da pessoa. Foram revelando pouco a pouco os apelidos, mais engraçados, o que provocou risos e momentos de descontração. Procurando um resgate de uma infância perdida, atitudes de cooperação e construção de vínculos, pois até o simples fato de dar as mãos se configurava em conflito, partimos para um Brincando com o Corpo (fig.2), estimular um contato 38 com seu corpo, com o corpo da colega e com um corpo coletivo. Passamos por uma série de brincadeiras infantis já conhecidas: pular corda, esticar o elástico, andar de perna de pau, bambolê. Na oficina Acorda com a Corda, foi uma explosão de energia. Iniciamos com uma música energizante em que tinha o comando de vamos pular, pular, pular, trabalhamos quase a exaustão o corpo depois vieram as trocas de pular e bater a corda. Iniciava um movimento em direção a um trabalho conjunto. Fato também constatado na ajuda das maiores para que as menores se equilibrassem na perna de pau. Através das brincadeiras, íamos adquirindo mais intimidade, mais confiança, para ir além. Em um Explorando Sensações (fig.1), com intenção de despertar delicadeza, com toques sutis, massagens com cremes, iam tocando seus corpos e os das colegas. Estabeleceu uma relação de trocas afetivas, um toque de carinho, na revelação de suas emoções ao serem tocadas. Nos impulsos do brincar, a modalidade da construção é altamente estimulada. No Brincando e Criando (fig. 3), construir personagens, petecas, bonecas de jornal, se lançaram com mais intensidade nas atividades. É impressionante como fica marcante o traço de cada uma em seus personagens. Quando construiu sua personagem, uma menina desatou-se a rir, dizendo que a boneca tinha uma boca muito grande. Não era a boca da boneca, era, a dela. 39 Fig.1: Um Toque de Carinho, oficina em período de estágio. Fonte: Própria Fig. 2: Brincadeiras de Criança, oficina em período de estágio. Fonte: Própria 40 Fig. 3: Construção do Personagem, oficina em período de estágio Fonte: Própria No Visitar o mundo da Imaginação, criaram fantasias, um faz de conta, ao visitarmos um espaço cultural da cidade e quando assistimos um conto da atualidade, uma novela, fizeram reflexões sobre o comportamento de uma personagem, emitiram opiniões, censuras, fizeram relações com suas vidas, seus sonhos. Participaram ativamente desse jogo dramático. E se fortaleceram num Encontrando “Nós com Vos(z)”, no trabalho centrado da construção das mandalas (fig.5), e na diversão catártica do barro (fig.4). 41 Fig.4: Diversão com o barro, oficina em período de estágio. Fonte: Própria. Fig. 5: Construção de mandalas. oficina em período de estágio. Fonte: Própria 42 Então o brincar constitui um estado saudável do ser. “É com base no brincar, que se constrói a totalidade da existência experiencial do homem” (WINNICOTT, 1975, p.93). O brincar é fantasia, é movimento, é sentimento, é percepção, é pensamento, é descoberta, é aprendizado, é experimento, é sabedoria, é vida ... É Brincadeira de Roda ... 43 5 RODAS POR ONDE ANDEI A Dança Circular Sagrada, é um dos PRESENTES mais valiosos que a vida me deu. Um PRESENTE, que não é só meu ! Um PRESENTE, que eu tenho que dividir, tenho que ... PARTILHAR em tantos pedaços... COMPARTILHAR, com tantas pessoas com tantas pessoas... E, Quanto mais eu o divido, mais ele cresce Quanto mais o compartilho, mais aprendo Quanto mais o uso, mais bonito ele fica ... Que mais pessoas, TODAS AS PESSOAS DO MUNDO, possam ganhar um PRESENTE, como este, ao longo de suas vidas, e quanto mais cedo... melhor! Que possam ser alimentadas e iluminadas pelas Danças Circulares Sagradas... Partilhando e compartilhando desse desejo, necessidade, vontade de levar as Danças em muito lugares, vivenciá-las com muitas pessoas, saímos por ai, num caminhar dançante, eu e Lídia Quaresma, parceira de muitas rodas, como uma roleta, rodando-rodando, girando-girando, dançando... Fazer os relatos a seguir, é como contar sobre o quê os olhos não podem ver, mas o coração pode entender. 44 5.1 RODAS ITINERANTES Éramos um grupo pequeno e dançávamos sempre. Eu e Lídia Quaresma, amiga, parceira da roda da dança, da roda da vida, tínhamos feito oficinas, com vários focalizadores, e participado de dois encontros nacionais de danças, 2002 e 2003 em São Paulo, o que nos remexera profundamente e portanto a necessidade de levar a emoção, as possibilidades de aplicação, os benefícios, a essência da Dança, para mais pessoas... Nasceu então a Roda Mandalas da Vida, e a idéia das Rodas Itinerantes: Levar a Dança aonde o povo está. Foi envolvente e desafiador, mas topamos!!! Cada semana éramos convidadas para um local: uma casa, uma escola, um espaço aberto, fechado, ao ar livre. Era o inesperado, uma experiência diferente em cada lugar, mas sempre recebidas com alegria, sentíamos que crescíamos em número e qualidade. Tivemos o apoio de dançantes mais constantes: Lala, Meminha, Lili, Zanza, Dora. Preparávamo-nos, cuidadosamente, na escolha do repertório como também no conteúdo teórico. De início, fazíamos danças mais simples, passo a passo, falando da origem, da tradição, da simbologia de cada uma. Quando sentíamos o grupo mais confiante, arriscávamos uns passos mais saltitantes e fazíamos outras danças mais elaboradas. Como procedimento, rotina, chegávamos ao local, com uma certa antecedência, e aguardávamos a chegada das pessoas. Olhávamos o espaço, sentíamos a energia e escolhíamos um ponto para ser o centro, onde colocávamos nossa mandala-símbolo, as vezes com velas, com flores ... Dávamos as mãos, ao redor desse centro, para iniciarmos a Roda. Essa introdução, como um momento de chegada, de sensibilização, fazíamos de várias 45 maneiras: com poesias, mensagens trazidas pelas pessoas, uma meditação, uma improvisação. Após dançarmos, o repertório preparado, quando tinha tempo fazíamos mais algumas, as pessoas sempre tem umas preferidas, e então para fechamento conversávamos e abríamos para quem quisesse relatar algo, se expressar livremente. Combinávamos o próximo ENCONTRO... Agradecíamos... fazíamos uma dança de despedida e íamos para nossas casas... pensando... Durante seis meses, cumprimos esse projeto, trajeto, movimento. Houve uma agregação de pessoas afins, e hoje o grupo é maior. Pessoas preocupadas na preservação das Danças, querendo saber mais, com consciência e responsabilidade na sua aplicação. Acreditamos ter cumprido uma meta. Lançamos várias sementes e já podemos ver alguns bonitos frutos. Essa experiência foi relatada em 2004 no Encontro Anual de Danças Circulares Sagradas em São Paulo. Fizemos uma exposição em forma de instalação, criada por Lídia Quaresma, que é artista plástica: Uma “roda gigante”, saindo de uma tela, com casinhas, girando de verdade, e ao abrir as portinhas, dentro descrevíamos as etapas de nossa experiência itinerante. Ao fundo, na tela azul, um desenho de uma mandala, com fotos das nossas rodas. A idéia, desse painel, fora fazer algo com um apelo visual e que tivesse um toque de interatividade, as pessoas podiam olhar, girar a roda, abrir e fechar as casinhas, ler o que estava escrito. Fizeram a Roda girar bastante! 5.2 TRÊS VIVÊNCIAS LOCAIS Três dias de intensa vivência com as Danças Sagradas; quinta feira, na 46 casa de Cna, sexta-feira uma oficina no Encontro Holístico, e sábado, a convite de uma amiga, Mma. em uma Vila Feliz. Na casa de Cna, recém-chegada na nossa Roda, mas já tão entusiasmada, uma recepção linda!!! Estávamos num lugar iluminado: a luz de velas. Velas, acesas, em todos os cantos do jardim; a luz da lua e o brilho das estrelas. A noite nos brindou com uma lua radiante num manto estrelado. Dançamos com plenitude. Vivemos um momento mágico... O Encontro Holístico, é organizado pela professora N.F., grande colaboradora na difusão de uma Cultura de Paz, e que acredita na Dança, como um meio para essa realização. Mas para começar a oficina, apesar de várias inscrições, éramos 3... eu, Apê, parceira de muitas rodas, e uma novata. Mas começamos!!! Me ocorreu a simbologia do número 3 - unidade, trindade. Logo chegou mais uma pessoa, um estudante, meio desconfiado, e formamos um quarteto: as quatro direções. A todo instante, outros alunos chegavam, olhavam, pareciam interessados, sorriam e eu os convidava para entrar e dançar. Entravam! Diziam que não podiam ficar muito tempo, pois estavam em outras atividades. Dançavam duas ou três danças, sempre sorrindo, diziam ter gostado muito, mas que precisavam sair... Aconteceu umas três vezes, e o último grupo, alunas do Serviço Social, permaneceram mais tempo, até quase o final. Retornamos ao quarteto e sugeri que fizéssemos uma reflexão, de todo aquele movimento vivido ali. Disseram ter gostado, se referindo até que aquele movimento era como o movimento da nossa vida: a todo momento pessoas entram, ficam, passam e saem da nossa Roda da Vida!!! A Dança é o retrato dinâmico da história humana. Ela nos relata a 47 experiência do entusiasmo, da presença plena e atemporal que une o ser humano com o divino. (WOSIEN,G, 2002, p. 07). No Sábado: Vila Feliz .... Só poderia ser um feliz ENCONTRO. E foi !!! Era uma festa da comunidade. A Vila Feliz é um conjunto de casas, num terreno grande, com a natureza muito presente, e todos os anos eles festejam junto com a comunidade do bairro. É uma tradição. Vêm pessoas de todas as idades, fazem comidas típicas e apresentações, dançam, se confraternizam. Ao chegarmos, nesse dia estava somente eu e Lda, Mma nos recebeu muito gentilmente, e o forró “comia solto”, um trio tocando, com um som nas alturas. Tremi nas bases. Como quebrar aquele ritmo? Perguntei, a um organizador da festa: Será que dá, para fazer uma Dança Circular... Sagrada? Dá sim, respondeu!!! Então nos apresentou, e me passou o microfone... Falamos da celebração da vida, através da Dança e meio timidamente, convidamos as pessoas para fazermos uma Roda. Foram se aproximando, muitos, adultos, crianças e dando as mãos formamos um grande Círculo. Meu coração disparou, e nos entregamos totalmente àquele momento. Foi tão maravilhoso, tão belo, tão envolvente, tão saudável, tão reparador. Ao final agradecemos e muitas pessoas vieram nos perguntar sobre as danças. Alguém bateu em meu ombro e cochichou: “E preciso acreditar”! Era o organizador... Acreditar que, quanto mais feliz e saudável é um povo, mais ele dança. “Mostrem-me como dança um povo que eu lhes direi se sua civilização está doente ou se tem boa saúde”. (VIVA MELHOR,1. n.14, p 24) 48 5.3 QUATRO ENCONTROS NACIONAIS Acreditar no potencial da Roda, na força da energia transmitida ao darmos as mãos em um grande Círculo, no bem estar que se estabelece nessa união, são sentimentos que compartilhei, ao participar dos EBDCS, Encontro Brasileiro de Danças Circulares Sagradas, São Paulo, nos anos de 2002, 2003, 2004, 2005. Os Encontros, são divididos em vários momentos: celebrações de abertura e fechamento, relatos de experiência, oficinas, palestras, bailes. Nos relatos, profissionais das mais diversas áreas, falam de suas experiências com as Danças; nas oficinas, com um determinado repertório, seguimos uma programação estabelecida, onde aprendemos didaticamente os passos, a origem, o significado de cada dança; palestras com assuntos relacionados à Dança e o desenvolvimento do Ser Humano e a alegria, espontaneidade, o encontro, a brincadeira, num baile noturno, com a grande roda. É bonito ver os relatos: Cristina Bonetti, licenciada em educação física, pós graduada em Técnica em Natação, Ciência do Esporte e Administração na Educação, Desporto e Lazer, folclorista e pesquisadora das festas tradicionais do Brasil e de outros povos, falar do seu dançar com doentes mentais, com mulheres de várias organizações, com os alunos da Universidade Estadual de Goiás, e tantos outros projetos, relacionados com seu caminhar dançante; Andressa Pinheiro, também da área de educação física, usando a Dança para trabalhar um corpo que pode girar em cima dos pés andantes ou, um corpo que precisa da ajuda de uma roda. Que emocionante, saber dessa possibilidade de dançar com cadeirantes! 49 É preciso fazer as oficinas: Momento de aprendermos as danças, de uma forma didática, treinando os movimentos, saber da origem, conhecer a simbologia. É o passo a passo da Dança, que pode estar num passo junta passo, longo curto, num trançar dos pés, na frente e atrás. Experimentar a leveza e doçura de uma oficina com Andréa Leoncini, de uma luz que irradia e nos alumia vinda de Renata Ramos, da dedicação imensa, como uma onda de energia, do tamanho do mar, de Sonia Lima, organizadoras do Encontro Nacional de Danças Circulares... É necessário ouvir: Palestras como as de Paula Falcão, são absolutamente necessárias, para construção do nosso conhecimento. Como quem não quer nada, ela vai se revelando, vai nos mostrando e aplicando todo o seu conhecimento, em vivências inesquecíveis, super criativas, lúdicas, nos virando de cabeça para baixo na brincadeira de “ Um Caminhar nas Nuvens”. E estar nos Bailes Noturnos: No primeiro baile, na grande roda, para celebrar a abertura do Encontro. Momento de muita emoção, muita luz, sempre com velas acesas, momento do primeiro olhar, do primeiro sorriso, do primeiro aperto da mão, momento de apresentação. E nos bailes, das três noites seguintes, momento de muita diversão, aberto para todos que queiram focalizar uma dança de qualquer parte do mundo, momento de encontro da diversidade, das manifestações espontâneas, momento de viajar para muitos lugares do planeta, simplesmente: dançando... dançando.... dançando... 50 6 DANÇAR A ARTETERAPIA: EMOÇÃO DE LIDAR O curso de Arteterapia é um convite para aproximação e desenvolvimento de uma linguagem expressiva, estimulação ao criativo, através do contato com técnicas e materiais artísticos. Vivenciando e ampliando os limites dessa experiência, vamos dançando, a cada módulo. O primeiro passo, é sermos sensibilizados, a esse convite: anfitriões e convidados para uma grande FESTA. FESTA – algo que dá grande prazer ou satisfação; qualquer ação que saia do ordinário, em que haja alguma coisa extraordinária, o conjunto das cerimônias com que se celebra qualquer acontecimento, solenidade, comemoração. (FERREIRA, 1988, p.295). Fazer relação de Arteterapia com uma grande Festa, é poder associar elementos e etapas significativas, podendo configurá-los também, na Dança Circular. Um convite pressupõe reação: de sim, de não , de talvez. Reação que nos levará a uma ação, um movimento, uma direção a ser tomada, refletida e pensada. Então, para o exercício, dessa Festa, rica de símbolos, sentimentos, precisaremos nos entregar, com confiança e motivação. Viveremos etapas significativas, desde o início, com toda uma preparação altamente estimulada pela imaginação, o durante com um desenvolvimento dinâmico e flexível e o depois em uma avaliação consciente de todo o caminho percorrido. Para tanto, experimentaremos diversos momentos, os módulos, uns de intensa entrega a vivência e outros de construção e estruturação do conhecimento. Ser anfitrião e/ou convidado, é se preparar para ser arteterapeuta, experimentando na sua própria pessoa. Seremos bons anfitriões - arteterapeutas, se 51 adotarmos a postura de investigação, análise e observação dos fatos, fortalecido pelo conhecimento adquirido nos módulos. Seremos bons convidados, alunosclientes, se nos abrirmos para essa experiência, em nossa totalidade, com liberdade para sermos sujeitos plenos de desejos, necessidades e vontades. Num primeiro momento, módulo Processos Criativos no Desenvolvimento da Consciência, é a chegada na FESTA! Somos estimulados(as) a uma apresentação da nossa pessoa, ou, da nossa persona. Como gostaríamos de nos apresentar? Quais funções estariam presentes? Que sentimentos revelaríamos? Inicialmente, de uma forma racional, usando a fala, a função do pensamento crítico, elaborando nossa trajetória de vida pessoal e profissional, relatamos nossas características, nossos valores, nossas realizações e expectativas. Partindo para a transposição de linguagem, intuitivamente selecionamos imagens para expressar num trabalho de recorte e colagem, e depois o sentimento expresso na dramatização em grupo onde já se torna possível, revelamos, com mais coragem, imagens mais verdadeiras. É um contato maior se dando com nosso mundo interior, expressando nossos desejos, frustrações, sonhos e sentimentos. Para esse início, da construção da Festa de Arteterapia, dançaria uma ciranda brasileira e uma dança de tradição da Grécia. Uma combinação do jeito inocente, de pura alegria e felicidade presentes nas cirandas brasileiras, conectando nossa criança interna e eterna com o centramento e alinhamento energético, das danças gregas. Uma proposta para estarmos inteiros, naquilo que estivermos fazendo. E as ligações vão acontecendo, tecendo, tramando cenas. O contato, o tato, vai se materializando na matéria, no módulo O Barro Criativo. Momento de fortalecer, nossas bases, nosso chão, adubar nossas raízes, para os encontros ou 52 desencontros, que virão. Começamos a ficar mais a vontade, na Festa. O barro, sendo um material flexível e transformador, vai nos proporcionar uma conexão com o imaginário, com o inconsciente, procurando no nosso interior, nosso verdadeiro self. Numa atitude total de introversão, sem o uso racional da fala, o toque na argila, desperta sentimentos de relações dialéticas, sentimentos de entrega e possibilidades de descobertas. Fig. 6: Semente. Trabalho de finalização do Módulo do Barro. Fonte: própria. Precisamos interagir com o barro, para sua e nossa transformação. Na festa precisamos interagir com as pessoas, para estabelecermos relações de envolvimento e entrega. Na Arteterapia precisamos interagir com o nosso criativo, para que possamos ser sujeitos de nossas atitudes, do nosso próprio destino. Sendo um momento de materialização da criação, dançaria para a mãe terra, um toré indígena com objetivo de agradecimento e celebração, por tudo que uma mãe suficientemente boa, nos doa. E a Festa continua, revelando a beleza das diferenças, das afinidades, das relações e você se percebendo no centro, como centro, buscando seu centro. 53 Momento de questionamentos: vou ficar ou vou sair dessa Festa? Desse caminho? Por que e pra quê estou nessa festa, nesse caminho? Quero saber porquê? Porque SIM... Porque SIM não é resposta!!! Fig.7 .Qual é o meu caminho? Fonte: própria Mas encontramos respostas significativas, na inquietação, investigação, na constatação de que o módulo Terapias Expressivas, vem para sacudir, balançar, e levantar a poeira, que impede a nossa atenção para a renovação da expressão dos sentimentos, para as novas criações, que amplia os limites de tempo e espaço do indivíduo dentro de uma sociedade. O ser humano se percebendo como fator diferencial na natureza, sendo capaz de simbolizar, de interpretar signos, de comunicar-se e relacionar-se. Ser humano que tem na sua individualidade, o valor e a certeza de ser parte integrante de uma coletividade. Ser parte da história, da continuidade e necessidade de se fazer imortal. Nesse momento, de tantos questionamentos, uma dança que nos conecta com os sentidos, com as polaridades da vida: Hassapicos, dança tradicional 54 grega de morte e renascimento. Com os braços abertos, coluna ereta, formando uma cruz, com o nosso corpo, caminhamos para os dois lados do círculo, vamos até o centro e retornamos, projetando também no chão o formato de uma cruz, símbolo de uma árvore da morte e da vida, de uma árvore do conhecimento. Dança que é acompanhada, por uma música vibrante, energética. E a cada hora, módulo Oficinas Criativas e Funções Junguianas, vamos nos entregando, dançando com os tipos psicológicos estudados por Jung. Refletimos um pouquinho mais, nos nossos pensamentos, expressamos um pouquinho mais, nos nossos sentimentos, intuímos, percebemos que vamos precisar estar atentos, o tempo todo, aos novos e velhos movimentos. Aos movimentos de nossas árvores. Construir a imagem das árvores, que somos, é um momento de reconhecimento, de nossas raízes, nosso desenvolvimento, nossa história. Fig.8. Árvore da Vida, realizada no módulo Funções Junguianas. Fonte: própria. 55 Faríamos neste momento, uma dança composta de vários movimentos. Uns mais calmos outros mais vibrantes, uns de mãos dadas outros soltos, uns em direção ao centro, outros por todo o espaço, experimentando o estar seguro, juntos de mãos dadas e a alegria e liberdade nos movimentos individuais mas conectados na roda. A Tília é uma dança da Letônia e é uma árvore que tem um perfume muito agradável. Penso na árvore que somos. Se adubarmos bem nossas raízes, com todos os nutrientes necessários, teremos um caule forte e uma copa cheia de flores coloridas e frutos sadios, que reverteram em sementes para novas árvores. E o ritmo dos passos, da dança, da festa, o pulsar do coração, se encontram em uma melodia harmoniosa, no módulo Sentindo o Som e o Silêncio. Vamos sentindo esse som e esse silêncio, num movimento circular, dentro de nossa alma. Vamos exercendo a liberdade de expressão, criando letras e melodias, como crianças, passando as bolinhas de mãos em mãos, na roda dos eternos “Escravos de Jó”. Vamos fortalecendo nosso repertório sonoro, aprendendo a escutar o som e o silêncio do Universo e ritmar: Com um TUM TUM TUM E com um TÁTÁ TÁ Descobrimos um movimento Diferente no cantar No IÊ Ê Ê ê No IÁ Á Á Á Descobrimos ser possível O som e o silêncio... se manifestar E conhecendo mais o nosso instrumento, através dos toques sutis da Calatonia, módulo Oficina do Corpo, percebemos o quanto nosso corpo fala, 56 revelando-se no desenho dos seus movimentos. Uma criança pode revelar seu mundo, na maneira como distribui seus brinquedos e se movimenta com o seu corpo num espaço. O adulto, com um desenho mais contido, assume uma determinada postura corporal, como reflexo muitas vezes, de uma imagem criada, desejada. Conhecer ou reconhecer nosso desenho, é possível na vivência, no módulo do Grafismo, nas formas e cores reveladas no desenho compartilhado, desenho cego no claro, ou brincantes de velas, no escuro. Devemos desenhar mais, riscar, rabiscar, garatujar mais. Muito mais! Também constatamos a valiosa contribuição das nossas experiências, da bagagem acumulada ao longo dos anos, quando no módulo, Personagens e Histórias de Vida, há a maravilhosa revelação de nós mesmos, através das máscaras e dos bonecos - personagens. Confeccionar a máscara, traz a percepção de: Mascarar ... É preciso ser “mascarado”! As vezes... É preciso ser “des-mascarado”! As vezes... É preciso se deixar, ser... ir... vir... sentir... sonhar... calar... falar... viver... revelar... esconder... entregar... SEMPRE. E mais e mais vamos nos embalando, nessa festa. É chegada a hora das escolhas: Qual é a Dança que faremos? Com qual parceiro(a), partilharemos? Como utilizaremos nossos corpos, nessa missão? Como transmitiremos todo o nosso amor pelo ofício da Arteterapia? 57 Há uma dança israelita, que fala dessa entrega maior, dessa entrega ao amor maior. Tem uma historinha, uma lenda, associada a dança, que foi contada em uma oficina que participei: “ Diz que a morte viria buscar uma pessoa, mas se ela lhe desse um motivo “bastante forte”, teria a oportunidade de viver mais. Então a pessoa se pôs a descrever uma lista imensa de motivos, mas não convencia a morte, tinha que ser algo “bastante forte”. Ai ela disse, - Morte, não posso ir, ainda é cedo pois. ” Od Lo Ahavti Daí” ( Ainda não Amei o Suficiente), e foi o suficiente para a morte, deixá-la viver mais, e mais, e mais... A Festa toma uma forma maior de expressão: Projeto de Estágio! Na preparação de um projeto, momento dual, estágio em duplas. Também, de muitas trocas, revelações, frustrações e realizações. Realmente é a parte da Festa, que não poderemos dançar sozinhos. Precisaremos ser um, em um par. Danças de parceiros nos leva a expressar sentimentos de boa vontade, acolhimento, apoio, respeito, admiração aos que interagem conosco, seja só num simples olhar, no toque cuidadoso, no carinho das palavras. É mistura de muitos sentimentos. De início, parece que não vamos conseguir fazer a dança, pois o erro está sempre no outro. Então só com muita calma, muita troca, experimentaremos a grandeza do saber dar e saber receber. Uma dança irlandesa, como a Mandala, nos seus passos de ir e vir, de frente e de costas, de aproximar e afastar, de ficar e trocar, ou uma dança escocesa, Shetland, onde saudamos com alegria o parceiro que chega, dançamos compartilhando essa alegria, e nos despedimos levando a alegria compartilhada, expressam tão bem essa alquimia, essa magia de um encontro, para dançar. Encontro que está na arte de se relacionar onde precisamos, também, desenvolver atitudes de cooperação, respeito, confiança, amizade. O estágio, 58 seguindo a metodologia das Oficinas Criativas, é o momento para fortalecermos nossa identificação como facilitadores do processo arteterapêutico. As qualidades de um bom anfitrião, de uma grande festa, se revelarão, em todo seu potencial, nesse momento. Ao final valerá a pena, se constatarmos que além de tudo, usamos uma razão com muito amor, trabalhamos com muita entrega e doação e contribuímos de alguma forma, para expressão de emoções e um despertar para um olhar mais consciente e sensível, do mundo que podemos ver, que podemos ter. É o final de estágio, mas não o final da festa! O Grand finale está para começar, onde, traduziremos em palavras, módulo Monografia, todas as sensações, emoções, visões, conclusões, pensamentos, sentimentos, conhecimentos vividos, no percurso do curso de especialização em Arteterapia. Todo o nosso entusiasmo e encanto de viver a ARTETERAPIA. Para registro dessa Festa, dessa História, é preciso organizar, selecionar, escolher as imagens, as cenas, os trabalhos e de uma forma bem pessoal construir um álbum: módulo Construção do Álbum Pessoal. E para finalização dessa grande Festa, honramos e celebramos a Dança de todos os Povos. E, na procura de uma direção a seguir, encontramos uma possibilidade de Um Caminhar Dançante com a Arteterapia e a Dança Circular. Quem quiser o Álbum Pessoal que procure fazer o percurso do curso de ARTETERAPIA Procure juntar os trabalhos e a fotografia 59 revelar as imagens... com coragem colorir as cenas... que não foram pequenas mas que, iluminaram o caminho do aprendizado do crescimento do conhecimento Bota um pouquinho do PENSAMENTO Um bocadinho mais! Bota um pouquinho de SENTIMENTO Um bocadinho mais! INTUIÇÃO... PERCEPÇÃO... SENSAÇÃO Um bocadinho mais !!! Ao final Uma Auto-avaliação Reveja os conteúdos pratique Técnicas Expressivas e Trabalhe com Excelência use a Razão, o Amor Principalmente ... Invista na Arte Na . . . A R T E T E R A P I A ! 60 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS E como finalizar? Agradecendo ... Reconhecendo ... Avaliando. Reconhecer que todo final pode ser um novo começo, um novo ciclo, um novo círculo. O Círculo que não tem começo e não tem fim, mas que tem no seu movimento, possibilidades de novos questionamentos, outras respostas, novas criações. Na Dança do Aprendizado, vamos em busca do novo, do estar atento, de uma tomada de consciência, da nossa capacidade de aprender com as experiências, do que não queremos mais repetir em nossas vidas. E no trabalho arteterapêutico, com sua pluralidade de significados, códigos, imagens, precisamos também de um estado aprimorado de atenção, para um novo que surge, transforma e recomeça. Avaliar e refletir sobre os nossos conteúdos, nossos acertos, nossos erros, nossas ações em busca de um ponto de equilíbrio, flexível e responsável: o nosso centramento. Na Dança da Responsabilidade, a cada passo que damos, para frente, para trás, para o centro, paramos , giramos em torno do nosso próprio eixo e nos centramos. Agradecemos as experiências que vivemos, no passado, e caminhamos, para o centro do círculo, para dentro de nós mesmos, e com mais firmeza, equilíbrio e responsabilidade seguimos para o futuro, para o que desejamos realizar. O arteterapeuta precisa ter clareza de sua competência, habilidade, presença integral, numa relação terapêutica. Agradecer a oportunidade de se tornar um Ser mais sensível, flexível e consciente nas suas atitudes. Um Ser que tenha uma educação sentimental e expresse suas emoções, num encontro com pessoas, em relacionamentos, no 61 contato ao realizar algo que dê prazer, no resgate da alegria genuína do brincar, da nossa criança interior. Um Ser Cultural que contribua para uma construção social e reconheça a importância de um trabalho coletivo que leve à cooperação, integração e equilíbrio. Um Ser que se lance por inteiro na busca do conhecimento, respeitando as tradições, que construa o saber e aprenda ao longo de sua vida, preserve e dê continuidade a história de seu povo. Um Ser que reconheça a beleza do cotidiano e valorize as coisas simples da vida, que tenha fé no homem, que amplie a capacidade de amar, no dia a dia, que tenha na emoção de lidar, no encanto de dançar, na expressão da arte, a medida para pensar, sentir, viver e existir. Um Ser Humano. E dançando, agradecer a ação terapêutica da Arte e da Dança. Uma Dança que pode ser alegre, pode ser triste, pode ser meditativa, pode ser com palavras, pode ser com um canto, pode ser gestual, pode ser da Paz, pode ser uma oração, pode ser Universal: Oração de São Francisco: “Senhor, fazei-me um instrumento da vossa paz. Onde houver ódio que eu leve o amor. Onde houver ofensa que eu leve o perdão. Onde houver discórdia que eu leve a união. Onde houver dúvidas que eu leve a fé. Onde houver erro que eu leve a verdade. Onde houver desespero que eu leve a esperança. Onde houver tristeza que eu leve a alegria. Onde houver trevas que eu leve a luz. Ó Mestre, fazei que eu procure mais Consolar que ser consolado; Compreender que ser compreendido; Amar que ser amado. Pois é dando que se recebe; É perdoando que se é perdoado: E é morrendo que se vive para a vida eterna”. 62 REFERÊNCIAS ALLESSANDRINI, Cristina Dias (org) et al. Tramas criadoras na construção do “ser si mesmo”. São Paulo: Casa do Psicólogo Livraria e Editora Ltda, 1999. ANDRADE, Liomar Quinto de. Terapias expressivas: arteterapia, arte-educação, terapia-artística, São Paulo: Vetor Editora Psico-Pedagógica Ltda, 2000. BÉJART, Maurice. www.danzemeditative,com, acessado 05/2006. BOLEN, Jean Shinoda. 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