7 Desaposentação: um novo horizonte sobre as perspectivas do aposentado no Brasil Clayane Coelho Aguiar1 RESUMO O trabalho ora em exposição visa traçar algumas considerações sobre um tema que ainda não alcançou a importância merecida por parte dos estudiosos do Direito Previdenciário. A desaposentação é um direito subjetivo, que lembra o direito a aposentação. Consiste no desejo da pessoa de voltar ao status quo ante, ou seja, de renunciar a aposentadoria que recebe a fim de auferir benefício mais vantajoso, a fim de aproveitar o tempo de contribuição para contagem em nova aposentadoria, no mesmo ou em outro regime previdenciário. No entanto, esse direito ainda não é reconhecido até mesmo devido ao fato de que tal instituto não possui previsão legal, dando margem por muitas vezes à negativa na esfera jurídica e administrativa. Contudo, será demonstrada a necessidade de se garantir esse direito, que é um novo horizonte sobre as perspectivas do aposentado no Brasil. Palavras-Chave: Segurado. Benefício. Desaposentação. Aposentação. Renúncia. 1 INTRODUÇÃO O presente artigo tem a intenção de abordar a polêmica temática da desaposentação. Expor as situações que há cabimento e tentar solucionar alguns questionamentos acerca da matéria que leva muitas vezes a indeferimento no âmbito judicial. A Constituição Federal de 1988 garante, em seu artigo 7º, o direito a aposentadoria. Pois bem, a desaposentação seria o ato de renúncia à aposentadoria anteriormente concedida, para fins de aproveitamento do tempo de contribuição em contagem para nova aposentadoria, no mesmo ou em outro regime previdenciário. No entanto, não se reconhece o direito do aposentado de poder renunciar sua aposentadoria e retornar ao status quo ante em favor de uma situação mais benéfica, alegando tanto insegurança jurídica, como também o fato de tal instituto não possuir ainda previsão legal, sendo uma questão controversa. Outra questão muito debatida é a da restituição de valores recebidos anteriormente a desaposentação. O Instituto da desaposentação vem sendo apontado como uma inovação à alternativa de melhoria na renda mensal em uma nova aposentadoria dentro dos procedimentos juridicamente legais. Oportuno salientar que o estudo mais aprofundado do tema é bem oportuno devido ao fato de que até o presente momento não possui regulamentação específica. Além disso, há pouca doutrina a respeito desse instituto, baseando-se mais o estudo na jurisprudência. 1 Aluna concludente do curso de Bacharelado em Direito 2010.2. 8 O método de estudo utilizado para que se possa chegar à conclusão deste trabalho é o de revisão bibliográfica. Tal forma consiste basicamente em comparar as visões de vários autores da doutrina, a fim de se obter, ao final, um raciocínio crítico acerca do que fora pesquisado. O presente artigo expõe, preliminarmente, uma idéia geral do que vem a ser seguridade social e a que direitos se destina assegurar, além de uma noção de previdência social. Em seguida, apresenta-se o direito à previdência, contendo o conceito de aposentadoria e suas espécies. Tratarse-á, por conseguinte, de forma detalhada sobre o enfoque central desse trabalho, a desaposentação, seu conceito, do desfazimento do ato concessório da aposentadoria, dos tipos de desaposentação, da polêmica questão da restituição dos valores recebidos, do projeto de lei n. 7.154/2002 e, por fim, será feito um estudo comparado desse instituto em âmbito internacional. Apesar das divergências doutrinárias, reafirma-se ser o objetivo da obra enfocar o tema, de forma a contribuir para a discussão e reflexão em torno deste, analisando o objetivo principal do instituto e os benefícios para a sociedade que viriam com ele. Além de solucionar inúmeros questionamentos presentes no Sistema Previdenciário Público Brasileiro. 2 SEGURIDADE SOCIAL A Seguridade Social trata-se de uma proteção social constituída de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar direitos relacionados à saúde, à previdência e à assistência social do indivíduo. Tal instituto encontra-se regulamentado pela lei n. 8.212/1991. A Previdência Social é organizada sob forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observando critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial. Para Vianna (2008, p.53): [..] O sistema previdenciário constitui-se em um direito protetivo, garantindo a seus segurados contribuintes meios de subsistência quando de períodos de improdutividade financeira, tais como doença, maternidade, idade avançada e inavlidez. Dois princípios básicos sustentam a previdência social: a compulsoriedade e a contributividade. O princípio da compulsoriedade está presente ao obrigar aos trabalhadores (que exercem atividade remunerada lícita) a se filiarem a um regime de previdência social. E, o princípio da contributividade significa dizer que, para ter direito a qualquer benefício da previdência social, é necessário ser segurado, devendo para isso, contribuir para manutenção do sistema previdenciário. Vale destacar, que até mesmo o aposentado que volta a exercer atividade profissional remunerada, é obrigado a contribuir com o sistema. Pelo princípio da uniformidade e equivalência, expressos na Constituição Federal, os benefícios e serviços às populações urbanas e rurais devem ser oferecidos de maneira uniforme e equivalente, sem qualquer distinção. Porém, a previdência social possui 3 (três) regimes distintos 9 que abrangem, cada um, uma classe de indivíduos distintos, separados em razão da relação de trabalho ou categoria profissional que se vinculam. No art. 9º da Lei n. 8.213/91, determina-se que os regimes da Previdência Social são: o regime geral da previdência social, o regime próprio de previdência social dos servidores públicos e o regime próprio de previdência social dos Militares. 3 DO DIREITO À PREVIDÊNCIA A Previdência Social através do Regime Geral de Previdência Social – RGPS, mediante contribuições daqueles que se filiam, obrigatoriamente ou facultativamente, observando critérios que mantenham o equilíbrio financeiro e atuarial do sistema, garante a seus beneficiários o direito a benefícios e serviços, dentre eles a aposentadoria. A aposentadoria é um direito garantido pela Constituição Federal: “Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social; [...]; XXIV – aposentadoria;”. Segundo Ibrahim (2007, p.7): A aposentadoria é a prestação pecuniária por excelência, visando garantir os recursos financeiros indispensáveis ao beneficiário, de natureza alimentar, quando este já não tenha condições de obtê-los por conta própria, seja em razão de sua idade avançada ou mesmo por incapacidade permanente do trabalho. A aposentadoria é, portanto, um direito social dos trabalhadores, destinada a sua subsistência, no caso de eventualidades que os impossibilite de auferir seu sustento e de seus familiares, ou ainda, amparar, em caso de morte ou prisão, quem destes depender economicamente. Existem algumas formalidades para que essas aposentadorias sejam concedidas. Primeiramente, o beneficiário (segurado ou dependente) deverá entrar com um requerimento. Este será analisado e, constando todos os requisitos legais necessários e toda a documentação completa, será deferido o benefício previdenciário. Nesta linha de raciocínio pode-se afirmar que, concedida a aposentadoria, esta nasceria com o ato de aposentação e terminaria com a desaposentação ou com a morte do segurado. Vale destacar ainda que, aposentação e aposentadoria, apesar de serem freqüentemente utilizadas como expressões sinônimas, possuem significados distintos, sendo a primeira o ato pelo qual há a mudança do status previdenciário do segurado, de ativo para inativo, enquanto a segunda trata-se da nova condição jurídica assumida pelo indivíduo. 3.1 Espécies de aposentadoria 3.1.1 Aposentadoria por invalidez 10 A aposentadoria por invalidez encontra-se prevista do artigo 42 ao 47 da Lei nº 8.213/91, é concedida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo-lhe paga enquanto permanecer nesta condição. A concessão desse benefício é condicionada pela verificação da condição de incapacidade, mediante exame médico-pericial a cargo da previdência social, podendo o segurado as suas custas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança. Nos casos em que a incapacidade decorre de acidente de qualquer natureza ou causa, a carência é dispensada. Malgrado, se o benefício for decorrente de qualquer outra enfermidade, a carência mínima é de 12 (doze) contribuições mensais. O beneficiário que recupere sua capacidade laboral e volte voluntariamente á atividade terá sua aposentadoria automaticamente cessada, a partir da data do retorno, não necessitando neste caso de reavaliação médico-pericial. No entanto, se tiver agido de má-fé, deverá devolver os valores recebidos ao INSS. Este benefício consiste numa renda mensal de 100 % (cem por cento) do salário-debenefício, sem a aplicação do fator previdenciário, de forma que não poderá ser inferior ao saláriomínimo e será mantido enquanto perdurar a incapacidade. Nos casos em que o segurado necessite da assistência permanente de outra pessoa, o valor da aposentadoria será acrescido de 25% (vinte e cinco por cento). Ressalta-se ainda, que nesta espécie o beneficiário se encontra obrigado, a qualquer tempo e independentemente da sua idade, sob pena de suspensão do benefício, a submeter-se a exame médico a cargo da previdência social, processo de reabilitação profissional por ela prescrito e custeado e tratamento dispensado gratuitamente, exceto o cirúrgico e a transfusão de sangue, que são facultativos. A previdência com o objetivo de verificar a continuidade da condição, atenuação ou o agravamento da incapacidade para o trabalho, realiza perícias escalonadas a cada dois anos, sob pena de sustação do pagamento. 3.1.2. Aposentadoria por idade A aposentadoria por idade está prevista nos artigos 48 a 51 da Lei nº 8.213/91, será concedido ao segurado, que, cumprida a carência exigida, completar sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta se mulher, reduzidos esses limites para sessenta e cinqüenta e cinco anos de idade para os trabalhadores rurais respectivamente, bem como para os segurados garimpeiros que trabalhem, comprovadamente, em regime de economia familiar. 11 Este benefício tem por intuito garantir a subsistência do segurado e de sua família quando sua idade avançada não lhe permita continuar laborando. E, para a sua obtenção é necessário o cumprimento da carência e a implementação da idade mínima. A carência exigida nesta espécie de aposentadoria é de 180 contribuições mensais. No entanto, para os segurados inscritos no Regime Geral de Previdência Social - RGPS até a data de 24/07/1991, deverá seguir a tabela prevista no art. 142 da Lei n. 8.213/91: Ano de implementação das condições Meses de contribuição exigidos 1991 60 meses 1992 60 meses 1993 66 meses 1994 72 meses 1995 78 meses 1996 90 meses 1997 96 meses 1998 102 meses 1999 108 meses 2000 114 meses 2001 120 meses 2002 126 meses 2003 132 meses 2004 138 meses 2005 144 meses 2006 150 meses 2007 156 meses 2008 162 meses 2009 168 meses 2010 174 meses 2011 180 meses A renda mensal da aposentadoria por idade é equivalente a 70% (setenta por cento) do salário-de-contribuição, mais 1% a cada grupo de 12 contribuições mensais, até o máximo de 30%, totalizando assim, em 100%, com a aplicação facultativa do fator previdenciário. 3.1.3. Aposentadoria por tempo de contribuição A aposentadoria por tempo de serviço prevista nos artigos 52 a 56 da Lei nº 8.213/91, foi substituída pela atual aposentadoria por tempo de contribuição pela EC nº 20/98. Tal aposentadoria tem suas regras definidas conforme a data de inscrição do segurado no sistema, respeitando-se, também, o princípio do direito adquirido. 12 Cabe pontuar que para a obtenção da aposentadoria por tempo de contribuição é necessário comprovar 35 anos de contribuição para o homem e 30 anos de contribuição para a mulher. Há redução de 5 anos para professor(a) que comprove, exclusivamente, tempo de efetivo exercício em função de magistério na Educação Infantil, no Ensino Fundamental ou no Ensino Médio. Não se exige limite mínimo de idade, porém, terão que comprovar o tempo de contribuição e o cumprimento da carência exigida pela legislação. Neste caso, a renda mensal corresponde a 100% do salário-de-benefício. Os segurados inscritos no sistema até 15/12/1998, que tenha 30 anos de serviço e 53 anos de idade para o homem e 25 anos de serviço e 48 anos de idade para a mulher, além da comprovação da carência e o cumprimento do “pedágio”, este último que corresponde a 40% do tempo que faltava, em 15/12/1998, para atingir o tempo de serviço previsto. Neste caso, opta-se pela aposentadoria proporcional. Nesta o benefício proporcional corresponde a 70% do salário-debenefício mais 5% para cada ano de contribuição que ultrapassar os 30 anos de serviço se homem ou 25 anos se mulher. 3.1.4. Aposentadoria especial A aposentadoria especial está prevista nos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213/91, é devida ao segurado que tenha trabalhado 15, 20 ou 25 anos, conforme o caso, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, ou seja, indivíduos que tenha trabalhado com exposição a agentes nocivos, que se presuma produzir a perda da integridade física e mental em ritmo acelerado. Essa espécie de aposentadoria, bem como a aposentadoria por idade e a por tempo de contribuição, comporta carência de 180 contribuições mensais e submete-se a regra da tabela contida no art. 142 da Lei nº 8.213/91. 4 DESAPOSENTAÇÃO A desaposentação é o direito de se renunciar a aposentadoria obtida no Regime Geral de Previdência Social, ou em Regimes Próprios de Previdência de Servidores Públicos, com o intuito de possibilitar o recebimento de benefício mais vantajoso no mesmo ou em outro regime previdenciário. Segundo Martinez (2008, p.28): Desaposentação é ato administrativo formal vinculado, provocado pelo interessa do no desfazimento da manutenção da aposentação, que compreende a desistência com declaração oficial desconstitutiva. Desistência correspondendo a revisão jurídica do deferimento da aposentadoria anteriormente outorgada ao segurado. 13 Desta feita, desde que o objetivo dessa renúncia seja o de melhoria econômica do segurado, tratar-se-á de desaposentação. Nesta, a idéia seria liberar o tempo de contribuição utilizado como requisito para a concessão do benefício, de modo que este fique disponível para uma possível averbação em outro regime ou para nova aposentadoria, no caso do beneficiário ter tempo de contribuição posterior à aposentação, devido ao fato de ter continuidade laborativa. Castro e Lazzari (2000, p.488), afirmam que a desaposentação “é ato de desfazimento da aposentadoria por vontade do titular, para fins de aproveitamento do tempo de filiação em contagem para nova aposentadoria, no mesmo ou em outro regime previdenciário”. Pontual frisar que no Direito Civil, a renúncia é um negócio unilateral, bastando apenas a declaração do titular do direito, independe do consentimento de outrem. Trata-se, portanto, do abandono, da desistência de um direito voluntariamente. No entanto, para alguns doutrinadores o emprego do termo renúncia ocorre de maneira errônea, visto que depende de requerimento e concordância da Administração, excluindo assim a unilateralidade do instituto. Havendo mudança de regime previdenciário, a contagem recíproca entre regimes distintos é assegurada pela Constituição Federal, artigo 201, §9º2 . No caso do segurado querer renunciar a aposentadoria para auferir benefício vantajoso no mesmo regime previdenciário, geralmente o RGPS, é necessário comprovar a continuidade laborativa e manter a contribuição prevista no artigo 12, § 4º, da Lei nº 8.212/91, porém sem nenhum acréscimo em seu benefício. Malgrado, é importante observar preliminarmente, que o instituto da desaposentação não possui previsão legal, sendo ainda uma questão controversa, motivo pelo qual se dá a negativa desse direito na esfera administrativa, com respaldo no Decreto nº 3.048/99, que se posiciona pela impossibilidade dessa renúncia a aposentadoria no RGPS. Quanto a desaposentação nos regimes próprios, há a omissão acerca do tema, tratando apenas da reversão, que diferentemente do instituto ora trabalhado, visa o retorno ao labor remunerado no cargo público com a perda do benefício previdenciário, no interesse da Administração Pública. Contudo, na Carta Magna não existe qualquer vedação ao instituto, nem tampouco existe na legislação específica da Previdência Social dispositivo legal que proíba a renúncia aos direitos previdenciários. Nessa vereda tem-se baseado a maioria dos juristas, no que tange ao fato de que um decreto, como norma subsidiária que é, não pode restringir a aquisição de um direito do aposentado, de forma a prejudicá-lo. Deste modo, por ausência de expressa proibição legal, subsiste a permissão. 2 Art. 201. §9.º Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na Administração Pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos regimes de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei. 14 Não é ocioso destacar, ainda, que a partir da Lei nº 9.796/99, os estudiosos passaram a acreditar na eficácia da desaposentação. Tal lei preceitua que os diferentes regimes previdenciários se compensam financeiramente e, dessa forma, a contagem recíproca se tornou um instrumento lógico da desaposentação, não causando prejuízos a ninguém. Por assim dizer, basicamente, desaposentação seria uma renúncia à aposentação, sem prejuízo do tempo de serviço ou do tempo de contribuição, estes que são irrenunciáveis, seguida ou não de retorno ao trabalho, restituindo-se o que for necessário para a manutenção do equilíbrio financeiro dos regimes envolvidos, sempre que melhorar a situação do segurado e não causar prejuízo a terceiros. 4.1 Do desfazimento do ato concessório da aposentadoria O Direito Previdenciário abrange o ato jurídico perfeito quando da concessão da aposentadoria, assegurando assim ao segurado seu benefício, em razão dos vários anos de trabalho e contribuição. Ocorre, que a denegação de um ato jurídico perfeito contraria a segurança jurídica, gerando assim, uma situação de extrema insegurança ao aposentado, caso seu benefício pudesse ser revisto a qualquer tempo. Portanto, essas garantias constitucionais devem preservar o direito dos aposentados, este que pode e deve ser renunciado em favor de uma situação mais benéfica. Perlustrando a jurisprudência sobre o tema, tem-se: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. RENÚNCIA. CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO. EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO PARA AVERBAÇÃO. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE VEDAÇÃO LEGAL. 1. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, por se tratar de direito patrimonial disponível, é cabível a renúncia a benefício previdenciário, com a expedição da certidão do tempo de serviço respectivo, ainda que visando à obtenção de nova aposentadoria em outro regime previdenciário, na medida em que não existe vedação legal à prática de tal ato pelo titular do direito. (Cf. STJ, AGRESP 497.683/PE, Quinta Turma, Ministro Gilson Dipp, DJ 04/08/2003; RESP 423.098/SC, Quinta Turma, Ministro Gilson Dipp, DJ 14/10/2002, e RESP 370.957/SC, Quinta Turma, Ministro Jorge Scartezzini, DJ 15/04/2002; TRF1, AC 1999.01.00.113171-5/GO, Primeira Turma Suplementar, Juiz Manoel José Ferreira Nunes, DJ 08/05/2003; AC 96.01.56046-7/DF, Segunda Turma, Juiz convocado Antônio Sávio de Oliveira Chaves, DJ 10/08/2001; AC 2000.01.00.063411-9/DF, Primeira Turma, Juiz Antônio Sávio de Oliveira Chaves, DJ 04/06/2001; REO 1998.01.00.074740-8/DF, Segunda Turma, relator para acórdão o Juiz Jirair Aram Meguerian, DJ 31/05/2001; AC 1997.01.00.046010-1/DF, Primeira Turma, relator para acórdão o Juiz Carlos Olavo, DJ 29/05/2000, e AMS 96.01.40728-6/DF, Primeira Turma, Juiz Aloísio Palmeira, DJ 03/05/1999.) 2. Apelação e remessa oficial improvidas. (AMS 1998.01.00.070862-9 /RO, JUIZ FEDERAL JOÃO CARLOS MAYER SOARES (CONV.), PRIMEIRA TURMA SUPLEMENTAR, DJ 11 /09 /2003 P.63). O Tribunal Regional Federal da 1ª Região, através de inúmeros julgados, consolida também esse entendimento, como demonstram os Acórdãos a seguir exemplificados: PREVIDENCIÁRIO. RENÚNCIA À APOSENTADORIA. OBTENÇÃO DE BENEFÍCIO EM REGIME DIVERSO. POSSIBILIDADE. DIREITO PATRIMONIAL DISPONÍVEL. PRECEDENTES. AGRAVO INTERNO REJEITADO. 1. Consoante sólida jurisprudência desta Corte e do STJ, o segurado do INSS pode renunciar à aposentadoria que titulariza, com vistas à obtenção de benefício idêntico em 15 regime previdenciário diverso, sendo desnecessária a devolução dos valores que percebeu enquanto vigorante a aposentadoria renunciada. 2. A intenção do INSS em impedir a consumação da renúncia consubstancia reprovável tentativa de se esquivar do ônus compensatório previsto no art. 94 da Lei nº 8.213/91. 3. Agravo interno rejeitado. (AGAMS 2002.38.00.047765-7/MG; AGRAVO REGIMENTAL NA APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA, DESEMBARGADORA FEDERAL NEUZA MARIA ALVES DA SILVA, SEGUNDA TURMA , 28/09/2009 e-DJF1 p.223). EMENTA - PREVIDENCIÁ RIO. RENÚNCIA À APOSENTADORIA. I-O segurado tem direito de, a qualquer momento, renunciar à aposentadoria. II-Sendo legítimo o direito de renúncia, seus efeitos têm início a partir de sua postulação. III-Apelação e remessa oficial improvidas. (AC nº 1999.01.00.032520-4/M G – RELATOR: EXMO. JUIZ CARLOS OLAVO). “EMENTA - ADMINISTRATIVO - MANDADO DE SEGURANÇA - SERVIDOR PÚBLICO CELETIÁRIO APOSENTADO - RENÚNCIA À APOSENTADORIA PREVIDENCIÁRIA PARA CONCESSÃO DE NOVA, PAGA PELO TESOURO NACIONAL - POSSIBILIDADE - SEGURANÇA CONCEDIDA. 1- Sendo a renúncia, em sentido jurídico, abandono ou desistência do direito, portanto, ato unilateral, independe da anuência de terceiro. 2- Lídimos a renúncia à aposentadoria previdenciária e o cômputo do tempo d e serviço para obtenção da estatutária. 3- Apelação provida. 4-Sentença reformada. 5- Segurança concedida. (MAS Nº 95.01.30804-9/DF, RELATOR EXMO. JUIZ CATÃO ALVES, DJ 14.12.98, P. 71). Em bem verdade, o fato desse instituto não possuir previsão legal, traduz a possibilidade do indivíduo demandar pelo desfazimento de sua aposentadoria e obter êxito na esfera jurídica. 4.2 Das modalidades da desaposentação 4.2.1 Da aposentadoria por tempo de contribuição proporcional para a integral Diante da situação atual do país, de alto índice de desemprego e o fato de grande parte da população encontrar-se com dificuldade financeira, alguns trabalhadores se vêem obrigados a solicitar uma aposentadoria por tempo de contribuição, com renda mensal inicial menor. Estes, numa tentativa de obter melhores condições financeira, já aposentados voltam ao mercado de trabalho e continuam contribuindo, visando uma aposentadoria integral. O entendimento doutrinário é de que se o segurado não tivesse obtido a aposentadoria proporcional antecipadamente, o INSS deveria estar preparado para pagar a aposentadoria integral ao trabalhador. Porém, neste caso, o segurado deverá devolver os cinco anos que auferiu como aposentado proporcional, já que este recolheu por 35 anos, tendo sentido assim, receber dali em diante; além do fato de que sem a devolução poderia haver uma queda de 1/7 das reservas técnicas pessoais do INSS. De fato, em face do RGPS adotar regime de repartição simples e da natureza alimentar da prestação não precisa restituir. 16 4.2.2 Regime Próprio de Previdência Social para Regime Próprio de Previdência Social Devido ao fato dos RPPSs serem considerados nacionalmente, como se fossem único, é permitida a contagem recíproca de tempo de serviço não simultâneos. Assim, nada impede que a pessoa se desaposente num ente federativo da República e se aposente noutro. 4.2.3 Regulamento Geral de Previdência Social para Regime Próprio de Previdência Social Ocorre, geralmente, quando uma pessoa, aposenta-se pelo RGPS, é aprovado em concurso público, e, almejando um benefício mais vantajoso, cancela o benefício atual, migrando do RGPS para o RPPS, contando o tempo de serviço anterior da iniciativa privada. 4.3 Da restituição dos valores recebidos Um dos maiores problemas enfrentados por esse instituto é a restituição dos valores percebidos anteriormente à desaposentação, alegando-se o enriquecimento ilícito do segurado, bem como o ferimento ao princípio da isonomia. Parte da doutrina e da jurisprudência ainda adotam a posição de plena restituição dos valores já recebidos, em busca do equilíbrio financeiro e atuarial do sistema protetivo, desta forma, inviabilizando o instituto em questão. Segundo Duarte (2003): Com a desaposentação e a reincorporação do tempo de serviço antes utiliza do, a autarquia seria duplamente onerada se não tivesse de volta os valores antes recebidos , já que terá que conceder nova aposentadoria mais adiante, ou terá que expedir certidão de tempo de contribuição para que o segurado aproveite o período em outro regime previdenciário. Com a expedição da certidão de tempo de contribuição, a Autarquia Previdenciária terá de compensar financeiramente o órgão que concederá a nova aposentadoria, nos termos dos arts. 94 da Lei nº 8.213/91 e 4º da Lei nº 9.796, de 05.05.99. [...] O mais justo é conferir efeito ex tunc à desaposentação e fazer retornar o status quo ante, devendo o segurado restituir o recebido do órgão gestor durante todo o período que esteve beneficiado. Este novo ato que será deflagrado pela nova manifestação de vontade do segurado deve ter por conseqüência a eliminação de todo e qualquer ato que o primeiro ato possa ter causado para a parte contrária, no caso o INSS. No entanto, a adequada conclusão acerca dessa questão é a de que não há necessidade de devolução dos valores recebidos a título de benefício previdenciário, já que as reservas acumuladas pelo segurado eram direcionadas ao seu sustento durante o restante de sua vida. Com a desaposentação, portanto, o regime previdenciário terá que arcar com menor período de tempo, em razão da menor expectativa de vida do segurado. Além disso, há o fato de que as contribuições posteriores à aposentadoria não estavam previstas, mantendo assim um equilíbrio financeiro e atuarial do sistema previdenciário, evitando assim, um enriquecimento ilícito por parte da Autarquia. Nesse sentido, existem algumas decisões judiciais: 17 PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA NO REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. DIREITO DE RENÚNCIA. CABIMENTO. POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO PARA NOVA APOSENTADORIA EM REGIME DIVERSO. NÃO-OBRIGATORIEDADE DE DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS. EFEITOS EX TUNC DA RENÚNCIA À APOSENTADORIA. JURISPRUDÊNCIA DO STJ.AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. A renúncia à aposentadoria é perfeitamente possível, por ser ela um direito patrimonial disponível. Sendo assim, se o segurado pode renunciar à aposentadoria, no caso de ser indevida a acumulação, inexiste fundamento jurídico para o indeferimento da renúncia quando ela constituir uma própria liberalidade do aposentado. Nesta hipótese, revela-se cabível a contagem do respectivo tempo de serviço para a obtenção de nova aposentadoria, ainda que por outro regime de previdência. Caso contrário, o tempo trabalhado não seria computado em nenhum dos regimes, o que constituiria uma flagrante injustiça aos direitos do trabalhador. 2. O ato de renunciar ao benefício, conforme também já decidido por esta Corte, tem efeitos ex tunc e não implica a obrigação de devolução das parcelas recebidas, pois, enquanto esteve aposentado, o segurado fez jus aos seus proventos. Inexistindo a aludida inativação onerosa aos cofres públicos e estando a decisão monocrática devidamente fundamentada na jurisprudência desta Corte, o improvimento do recurso é de rigor. 3. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 328101 / SC AGRAVO REGIMENTA L NO RECURSO ESPECIAL 2001/0069856-0, Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (1131), DJe 20/10/2008 RT vol. 879 p. 206). De fato, a restituição dos valores recebidos pelo segurado é apenas mais uma dificuldade alegada pelos que se recusam a admitir a validade deste instituto. Pontual frisar, portanto, que no caso de desaposentação, a restituição dos valores percebidos possui respaldo somente em regimes de capitalização individual pura, o que inexiste no Sistema Previdenciário Público Brasileiro. 4.6 Projeto de Lei O Projeto de Lei n. 7.154/2002, apresentado pelo Deputado Inaldo Leitão, tem por objetivo acrescentar ao art. 54 da Lei n. 8.213/91, o seguinte Parágrafo único: Art. 54 [...] Parágrafo único – As aposentadorias por tempo de contribuição e especial concedidas pela Previdência Social, na forma da lei, poderão, a qualquer tempo, ser renunciadas pelo Beneficiário, ficando assegurada a contagem do tempo de contribuição que serviu de base para a concessão do benefício. Em sua redação final, o projeto, perante a Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania, teve sua modificação transferida para a seção que cuida da contagem de tempo recíproca de tempo de serviço, mediante a alteração do art. 96, com nova redação a um dos incisos e acréscimo de parágrafo único, a saber: Art. 96 [...] III- não será contado por um regime previdenciário o tempo de contribuição utilizado para fins de aposentadoria concedida por outro, salvo na hipótese de renúncia ao benefício; [...] Parágrafo único. Na hipótese de renúncia à aposentadoria devida pelo Regime Geral da Previdência Social, somente será contado o tempo correspondente a sua percepção para fins de obtenção de benefício por outro regime previdenciário, mediante indenização da respectiva contribuição, com os acréscimos previstos no inciso IV do caput deste artigo. 18 4.7.1 Críticas ao Projeto de Lei n. 7.154/2002 Ocorre que, o Projeto de Lei ao prever a possibilidade de renúncia a aposentadoria por tempo de contribuição ou especial, deixou uma lacuna aberta a discussões sobre a possibilidade ou não de renúncia à aposentadoria por idade. Esta, que não possui justificativa jurídica para essa diferenciação, implicando até mesmo em ferir o princípio da isonomia, constante no art. 5º, caput, da CF. Há também o fato de que o projeto modificado, no artigo 96, localizado na seção que cuida de contagem recíproca, mistifica uma restrição às situações em que o aposentado optaria por renunciar a aposentadoria e utilizar o tempo para outro regime, excluindo as hipóteses de desaposentação para utilização de tempo para o mesmo regime. Cabe pontuar ainda, a questão de que o projeto de lei não menciona nada a respeito da devolução de valores percebidos, trazendo mais discussões acerca do assunto, já que o projeto sendo convertido em Lei, permanecerá com essa lacuna. Logo, há a necessidade de uma previsão mais extensa da Lei no que tange a possibilidade de renúncia, fato este que solucionará o impasse da desaposentação, beneficiando assim, o Sistema Previdenciário Brasileiro. 4.7 Direito comparado Em Portugal, a aposentadoria é livremente acumulável com rendimentos de trabalho, como no Brasil. Nessas situações, o segurado continua contribuindo e estas contribuições serão responsáveis pelo aumento do montante da aposentadoria, produzindo efeitos a partir de 1º de janeiro de cada ano. Portanto, não há necessidade de renunciar a aposentadoria para auferir benefício mais vantajoso, simplesmente tem o mesmo benefício aumentado. Na Espanha, o retorno do aposentado ao trabalho não é permitido, porém há a opção de um benefício parcial, possibilitando o retorno ao labor e, ao término da atividade remunerada, obtém-se o benefício pleno. Já no Canadá, também se permite a continuação da prática laborativa remunerada após a aposentação, necessitando contribuir durante esse período para fins de recálculo do benefício. E, no Chile, em razão do Sistema Privado de Previdência existente em substituição ao público, o direito à contagem do novo período contributivo é ainda mais evidente. 5. CONCLUSÃO De tudo o que foi visto e debatido, é indubitável o direito dos segurados em renunciar suas aposentadorias, visando uma melhoria de sua condição social, através da desaposentação. Foi 19 comprovado, que tal instituto por mais que não possua previsão legal, é constitucional, ao passo que inexiste qualquer vedação expressa acerca desse direito. Comprovou-se ainda, que o instituto da desaposentação não causa nenhum tipo de prejuízo ao equilíbrio atuarial do sistema, já que as contribuições posteriores à aposentadoria não estavam previstas. Além disso, as reservas acumuladas pelo segurado eram direcionadas ao seu sustento durante o restante de sua vida e, com a desaposentação, o regime previdenciário terá que arcar com menor período de tempo, em razão da menor expectativa de vida do segurado. Desta feita, conclui-se que tais impedimentos não estão presentes na desaposentação, como restou demonstrado. E, nesse aspecto, não se pode negar a existência da desaposentação com base em melhores condições para o segurado, pois não se trata de puro desafazimento do seu benefício, mas sim, obtenção de nova prestação, mais vantajosa do que a anteriormente recebida, melhorando assim, sua qualidade de vida e de seus dependentes. Contudo, vale salientar, não ser pretensão desse artigo dissipar inteiramente o assunto ora exposto, mas sim colher algumas considerações no sentido de ser, eventualmente, utilizado como “base de consulta rápida”. 20 REFERÊNCIAS BRASIL. Lei n. 8.213/91, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Brasília, DF, 1991. DUARTE, Marina Vasquez. Temas atuais de direito previdenciário e assistência social. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. FIGUEIREDO, Antônio Borges de; OLIVEIRA, Marcela Gallo de. Renúncia à aposentadoria (desaposentação) no projeto de Lei nº 7.154/2002. Disponível em: <jus2.uol.com.br/doutrina/imprimir.asp?id=9945>. Acesso em: 07 de outubro de 2009. IBRAHIM, Fábio Zambitte. Desaposentação. Niterói, RJ: Impetus, 2007. KERTZMAN, Ivan Mascarenhas. Curso prático de direito previdenciário. 2. ed. Salvador: JusPODIVM, 2006. KRAVCHYCHYN, Gisele Lemos. Desaposentação. Fundamentos jurídicos, posição dos tribunais e análise das propostas legislativas. Disponível em: <jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10741>. Acesso em: 07 de outubro de 2009. LIMA, Fernando Corrêa Alves Pimenta. Desaposentação. Disponível em: <www.machadofilgueiras.adv.br/downloads/desaposentacao.doc>. Acesso em: 08 de outubro de 2009. MARTINEZ, Wladimir Novaes. Desaposentação. São Paulo: LTr, 2008. VIANNA, Cláudia Salles Vilela. Previdência social: custeio e benefícios. 2. ed. São Paulo: LTr, 2008.