UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA
DO RIO GRANDE DO SUL /CAMPUS BENTO GONÇALVES
ESPECIALIZAÇÃO EM EDUCAÇÃO PROFISSIONAL INTEGRADA À EDUCAÇÃO
BÁSICA NA MODALIDADE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
O ACESSO DE PESSOAS COM NECESSIDADES EDUCATIVAS
ESPECIAIS NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Jaqueline Bondan de Lima
Bento Gonçalves
2009
1
FICHA CATALOGRÁFICA
___________________________________________________________________________
L732a Lima, Jaqueline Bondan de
O acesso de pessoas com necessidades educativas especiais na Educação de Jovens e
Adultos / Jaqueline Bondan de Lima. – Bento Gonçalves, 2009.
12 f.
Trabalho de conclusão (Especialização) – Universidade Federal do Rio Grande
do Sul. Faculdade de Educação. Programa de Pós-Graduação em Educação.
Curso de Especialização em Educação Profissional integrada à Educação Básica
na Modalidade Educação de Jovens e Adultos, 2009, Porto Alegre, BR-RS.
1. Educação. 2. Educação de Jovens e Adultos. 3. EJA. 5. Portadores de
Necessidades Especiais – Acesso – EJA. I. Título.
CDU 374.7
_____________________________________________________________________________
CIP-Brasil. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação.
(Jaqueline Trombin – Bibliotecária responsável - CRB10/979)
2
O ACESSO DE PESSOAS COM NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS NA
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Jaqueline Bondan de Lima1
Resumo: Há tempos a inclusão vem sendo discutida por todos os segmentos da sociedade. Dessa discussão
nasceram novos paradigmas, novas formas de vê-la, inclusive no âmbito educacional. No entanto, muito há para
se fazer, ainda, principalmente na Educação de Jovens e Adultos, que reúne alunado já tradicionalmente
excluído, pelos mais variados motivos. A Lei prevê a inclusão de todos, no processo educativo. Todos significa
crianças, jovens e adultos com ou sem dificuldades de aprendizagem. Não é exatamente o que acontece. Ainda
existe muita exclusão em todo o território nacional. Há que se ter discernimento suficiente para mudar a situação.
Há que se entender que muito trabalho aguarda os que realmente pretendem incorporar a inclusão, não apenas
como um contrato social, mas como uma filosofia de vida.
Palavras chave: Inclusão – Educação de Jovens e Adultos - Exclusão
Abstract: The inclusion has been discussed by all segments of society for a long time. From that discussion
emerged new paradigms, new ways to see it, including in education. However, there are many things to do, still,
mainly in adult and youth education, which brings together traditionally excluded students, by the most varied
reasons. The Law provides the inclusion of everybody in the educational process. Everybody means children,
youth and adults with or without learning disabilities. It’s not exactly what happens. Although, there is much
exclusion in the whole national territory. We must have enough discernment to change the situation. Is should be
understood that much work awaits those who really want to incorporate the inclusion, not only as a social
contract, but as a philosophy of life.
Key words: Inclusion - Adult and youth education – Exclusion
Introdução
A inclusão tem sido vista, no contexto educacional, já quase como uma exclusão
velada. O aluno incluso é o “diferente”, aquele que precisa de atendimento especializado e
que os professores podem escolher se querem, tê-lo sob sua “responsabilidade”. A visão que
se tem, então, da inclusão, é binária, ou seja, passa apenas e tão somente pelos polos da
“normalidade” e da “anormalidade”’, como bem destaca Carvalho (2007). Acontece que
nenhuma situação na vida é um extremo ou outro. A maioria reside no “meio”, fato
simplesmente ignorado, tanto por quem defende a inclusão (no afã de que todos sejam
tratados da mesma forma e tenham as mesmas oportunidades – utopia?); quanto por quem a
critica (também no afã mesmo, só que visto sob outro ângulo).
1
Graduada em Licenciatura Plena em Pedagogia com Habilitação em Magistério para as Séries Iniciais do
Ensino Fundamental.
3
Nesta perspectiva binária, o ‘ser’ e o ‘não ser’ deficientes aparecem como as duas
únicas opções possíveis, uma contrária à outra. Mas... será que poderíamos afirmar
que ser cego é o oposto de ser vidente, que ser deficiente mental exclui a
possibilidade de ter altas habilidades artísticas, por exemplo, que ser surdo é o
negativo de ser ouvinte, e assim por diante? (CARVALHO, 2007, p.41)
A exclusão passa por nuances muito mais sérias que a deficiência (e essa palavra
/adjetivo /rótulo já define uma postura bem clara com relação a essas pessoas).
Educação é processo para o qual convergem inúmeras variáveis, inclusive a
motivação de cada um de nós, somada a crença de que somos agentes de mudanças,
de que a educação é, também, um ato político, do qual somos co-participantes em
busca do exercício da cidadania plena de todos os nossos alunos (CARVALHO,
2007, p.159)
Na educação de Jovens e Adultos não é diferente. Não se ajustar ao encaixe das
“peças” escolares, supostamente todas “iguais” é estar fadado à exclusão. Considere-se que
tais estudantes, mesmo os tidos como “normais” (na batida referência binária), já carregam
um estigma excludente, por não terem concluído os estudos dentro do tempo previsto para os
educandos que freqüentam regularmente as escolas, até seu ingresso no Ensino Superior. Ora,
as razões são as mais diversas, desde a necessidade de ajudar nas despesas da casa para o
sustento da família até o “desajuste” nas “peças” do Sistema Educacional, todo ele tão
“certinho”.
1 – Inclusão
A efetiva inclusão passa por fatores e aspectos os mais variados. Há, porém, dois
deles, que merecem destaque e é onde se percebe a maior necessidade de motivação: o
professor e o aluno, no contexto escolar. Não se pode negar que aí é que está o ponto mais
importante de toda a discussão que envolve a inclusão de alunos com necessidades
educacionais especiais, na Educação de Jovens e Adultos. Se, e ainda que todo o resto do
processo se desenrolasse a contento, de nada adiantaria se, na sala de aula, nem professor nem
alunos estivessem dispostos a aprender. O que se vê, comumente, é o oposto: todo o processo
lindamente documentado e baseado na legalidade; prática contrária à lei, ou que “tenta”
colocá-la a serviço do educando – sem muito sucesso; discursos bonitos sem acreditar no que
se diz; recursos poucos – como quase tudo no país; insuficiência de atendimento especializado
4
paralelo à escola; isso sem falar de todas as condições sócio-econômicas deficitárias e
excludentes, tão reais na nossa sociedade; enquanto isso, cá na ponta, professores e alunos
tentando e se esforçando para dar o melhor de si.
[...] a educação inclusiva pode ser considerada como um processo que permite
colocar valores em prática, sem pieguismos, caridade, filantropia, pois está
alicerçada em princípios que conferem igualdade de valor a todas as pessoas.
TODAS. (CARVALHO, 2007, p.81)
Para que a inclusão seja um fato “consumado”, há que todos os agentes envolvidos
estejam realmente comprometidos com ela.
[...] o convívio entre pessoas, independentemente de ser estimulado para garantirem
direitos ou para “aparar” arestas, é sempre oportuno e necessário, pois, no mínimo,
permite que se construam vínculos, levando-nos a ver outro em nós mesmos e viceversa. (CARVALHO, 2007, p.45)
Se o caminho para a inclusão passa pela escola antes de passar pela sociedade, e se é
ela (a escola) que começa e efetiva esse processo, então a responsabilidade é muito maior do
que parece.
[...] a inclusão, como desejável e necessário movimento para melhorar as respostas
educativas das escolas, para todos, com todos e para toda a vida, deve preocupar-se
com a remoção das barreiras para a aprendizagem e para a participação
(promovendo a integração entre os colegas de turma, da escola... e, por certo, com
os objetos do conhecimento e da cultura). (CARVALHO, 2007, p.112)
O aluno com necessidades educativas especiais, se submetido apenas ao atendimento
educacional especializado, acaba por se retrair cada vez mais e por viver cada vez mais à
margem da sociedade.
Esperar por políticas públicas suficientes para efetivar a inclusão é imiscuir-se da
responsabilidade de cada um, enquanto cidadão.
O preconceito contra o aluno com necessidades educacionais especiais é um
preconceito histórico e só será possível romper com o círculo que impede a inclusão,
encarando o problema sem medo e compreendendo que o direito à cidadania é um direito de
TODOS e que a cidadania prevê o direito à educação, inclusive dos jovens e adultos.
5
Quando a inclusão existe, a escola é que se adapta ao aluno, ela é que muda, para
abrigar e acolher esse aluno, como abriga e acolhe a todos os outros.
Nas situações de integração escolar, nem todos os alunos com deficiência cabem
nas turmas de ensino regular, pois há uma seleção prévia dos que estão aptos à
inserção. Para estes casos, são indicados: a individualização dos programas
escolares, currículos adaptados, avaliações especiais [...]. Em suma: a escola não
muda como um todo, mas os alunos têm de mudar para se adaptarem as suas
exigências. (MANTOAN, 2003, p.23)
É justamente o que se vê nas escolas: o aluno que precisa de atendimento diferenciado
ou especial acaba por ter que dar conta do mesmo currículo, da mesma maneira e ser avaliado
da mesma forma, ele acaba por ser integrado e não incluso; ele está freqüentando a sala de
aula e convivendo com os demais, mas não têm garantidos os seus direitos de aprendizagem.
Discurso perfeito, lei boa. E a prática?
1.2 – Educação de Jovens e Adultos e o PROEJA
O Programa de Educação de Jovens e Adultos pretende contribuir para a construção de
uma sociedade em que todos possam ter oportunidades iguais, ou, ao menos, que possam
competir em níveis menos absurdos, no que se refere à educação escolar.
Com o PROEJA busca-se resgatar e reinserir no sistema escolar brasileiro milhões
de jovens e adultos possibilitando-lhes acesso à educação e a formação profissional
na perspectiva de uma formação integral. [...] Ele, certamente, será um poderoso
instrumento de resgate da cidadania de toda uma imensa parcela de brasileiros
expulsos do sistema escolar por problemas encontrados dentro e fora da escola.
(BRASIL, 2006).
Os alunos da Educação de Jovens e Adultos, em grande parte, não tiveram acesso ao
estudo sendo, portanto, já, excluídos. Se esse mesmo aluno tiver algum tipo de necessidade
educativa especial, terá sido duplamente excluído.
Para FREIRE (2003) nenhuma condição concreta é suficiente para criar algum tipo de
natureza incompatível com a necessidade de escolarização. Condições desfavoráveis e/ou
dificuldades de aprendizagem, sejam elas quais forem, não são desculpas para a exclusão de
quaisquer alunos, sejam crianças ou adultos.
6
Um grande número de alunos da EJA vem com uma história longa de insucesso
escolar ou de não continuidade nos estudos, também por necessidade de trabalho para o
sustento ou a ajuda no sustento da família. Sabe-se que o Ensino Fundamental é obrigatório e
que há fiscalização forte quanto a isso; também se procurou garantir o acesso de todos à
escola, inclusive com programas de ajuda às famílias, para que os jovens não tenham que
trabalhar. No entanto, ainda há muito que fazer, no sentido de conferir qualidade a essa
mesma escola, garantindo que as crianças e os jovens tenham vontade de permanecer nela e,
mais que isso, aprendam.
Enquanto isso não acontece, os jovens retornam aos bancos escolares, após
perceberem que a falta de escolaridade abre uma lacuna importante em suas vidas, e que é por
causa disso que alguns empregos lhe são negados. Dessa forma, desobrigam “o sistema
capitalista da responsabilidade que lhe cabe pelo desemprego estrutural.” (BRASIL, 2006, p.
7-8).
Nota-se que os alunos de EJA são, em grande número, negros, quilombolas, mulheres,
indígenas,
camponeses,
pescadores,
idosos,
desempregados,
enfim,
pessoas
“tradicionalmente” tidas como excluídas da sociedade, pelos mais variados motivos, mas que
chamam a atenção pela sua cor, etnia, sexo, condição sócio-econômica, entre outros.
Apesar de não ter garantias de emprego, ao “se formar” na EJA os alunos terão
maiores possibilidades de alcançar suas metas. A passagem pela EJA acrescenta-lhes
experiências não apenas educacionais, mas culturais, sociais, históricas, laborais, como Paulo
Freire defendeu: o conhecimento e a compreensão do mundo para interferir nele.
Há toda sorte de inclusão na sociedade e nos bancos escolares, se não há, de fato, ao
menos existem alguns movimentos nesse sentido. Porém, percebe-se que, apesar do discurso
ser de inclusão e de ser muito bem aceito, difundido e dito por vários segmentos da sociedade
– e aqui nos interessa o âmbito escolar – as práticas são claramente contrárias.
De acordo com SOUZA in Brasil (2006):
[...] nem sempre o que é produzido para ser visto, lido e ouvido, por todos ao
mesmo tempo, assim o será. Isso ocorre porque existem pessoas que não vêem mas
ouvem, as que não ouvem mas vêem, e ainda aquelas que não ouvem, vêem, mas
não compreendem a totalidade da mensagem veiculada por esses meios, em virtude
de possuírem uma outra forma de comunicação, ou seja, uma língua diferente.
(BRASIL, 2006, p.25)
7
A essas, soma-se toda uma gama de ouras necessidades educacionais especiais, tendo
que dar conta de aprender conteúdos que são ensinados da mesma forma para toda a sala de
aula. Não se trata de integração, mas de inclusão efetiva, que prevê essas particularidades,
respeitando-as e, mais do que isso, agindo, de acordo com elas.
Os sujeitos de aprendizagem são muito diversos. Dentro de uma sala de aula com 25
alunos há um rico universo de diferenças, desde baixa visão (ou mesmo uma pequena
alteração na visão) até deficiências viscerais, desfiguradoras, gerais ou múltiplas
(VALLEJO,1998). Todos esses alunos estarão recebendo as mesmas informações, da mesma
forma, sendo avaliados segundo os mesmos parâmetros, sem que se pense em suas
particularidades. Quaisquer que sejam as deficiências apresentadas por eles, não serão levadas
em consideração. Entre as quatro paredes de uma sala de aula, todos são iguais, o currículo
tem que ser respeitado, mantido e vencido, não importando a diversidade, que se limita ao
discurso bonito, não ‘vazando’ para a prática.
Isso vai direta e fortemente de encontro a tudo o que se estuda e se entende (ao menos
teoricamente) sobre a importância da inclusão. E ela não é importante apenas para os que
apresentam esta ou aquela diferença – deficiência, mas para toda a sociedade, visto que a
inclusão enriquece a todos. O que pode ser reafirmado pela opinião de Vallejo (1998) que
pensa que quando a organização escolar e a didática em uso permanecem prisioneiras dos
grupos homogêneos, e os livros didáticos são os principais recursos, quando a colaboração
dos profissionais no ensino e na avaliação do alunado com necessidades especiais está longe
de se produzir. Portanto, será possível a eliminação das etiquetas e será possível uma
avaliação com as características descritas acima quando o sistema educativo estiver disposto a
admitir todos os alunos que a ele chega, sem exclusões e adequar o processo de ensino –
aprendizagem a qualquer e a cada um desses alunos.
Porém, como tornar o mencionado acima realidade, quando o próprio governo avalia a
situação do ensino no País a partir de provas-testes ou coisa que o valha, elaborados sem
considerar as diferenças? Quando considera suficiente que se coloque observação na prova do
referido aluno, destacando que se trata de um caso de inclusão, e avalia toda uma escola a
partir desse único instrumento manco? E vincula o envio de verbas públicas à nota alcançada
pelo município nessa prova? E os alunos com suas particularidades sociais, que não são
oficialmente inclusos, mas que exigem estratégias de ensino e olhares especiais, tanto quanto
os de baixa visão, os com síndrome de down ou os surdos? E por que se fala tão pouco dos
alunos com altas habilidades, quando se trata de inclusão? Eles também acabam por desistir
de uma escola que não lhes oferece desafios suficientes, e, por vezes, são erroneamente vistos
8
como bagunceiros ou desinteressados quando, na verdade, não são estimulados o bastante lhes
sendo oferecido apenas um terço do desafio que procuram.
Em concordância com as idéias de Glat (1998) entendemos que não há uma receita
para a Inclusão e que exportar experiências e modelos de outras realidades educacionais não
resolve o problema. As ações dos dirigentes da educação deveriam ser no sentido de um
acompanhamento e uma avaliação sistemática dos projetos de implantação de novos modelos
ou propostas educacionais, reformulando o que não deu certo e reproduzindo as experiências
bem sucedidas.
Quando a Constituição Federal (BRASIL, 1988) garante o direito à escolarização e o
atendimento especializado às pessoas com deficiência, e que seja preferencialmente na rede
regular de ensino, mesmo que esse “preferencialmente” gere alguma polêmica e/ou que dê
margens a diversas interpretações outras, que pretendem diminuir a abrangência dessa
inclusão, é impossível evitar a necessidade de atendimento dessas pessoas, e de respeito às
suas diferenças.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (BRASIL, 1996) reserva um capítulo
exclusivo para a educação especial, sendo que, nesse capítulo destaca e reafirma o direito à
educação, pública e gratuita, das pessoas com alguma deficiência, condutas típicas e altas
habilidades.
Apesar do registro legal, por si só, como dito anteriormente, não garantir o acesso a
esses direitos, ele já ensaia um discreto crescimento da área em relação à educação geral, nos
últimos 20 anos.
Abrem-se, nos últimos anos, cada vez mais discussões sobre o tema, contribuindo para
um maior conhecimento sobre ele.
Os discursos da educação para todos e da escola inclusiva ocorrem num contexto de
exclusão social ampliada, o que aumenta os desafios para assegurar os direitos das
pessoas denominadas portadoras de necessidades especiais. (FERREIRA, 1998, p.
14)
Ainda há um longo caminho a ser percorrido. Vários passos importantes foram dados.
Vários passos mancos também foram e estão sendo dados. Tudo é uma questão de disposição
para acertar, coragem de tentar, estudo e fé. Ganharemos todos nós, partes importantes de
uma mesma sociedade.
9
2 – A Concepção de um Educando Incluso na Educação de Jovens e Adultos
No intuito de conhecer melhor a realidade, conversou-se com I. V.2, uma aluna que
ficou trinta e três anos fora de uma sala de aula em razão de na sua adolescência ter perdido
gradativamente a visão, passando por vários processos de exclusão, um por não conseguir
completar os estudos e outro por ter a deficiência visual. A mesma relatou que só sentiu-se
confiante em retornar aos bancos escolares após dominar o Braille, codificação universal para
leitura e escrita de cegos. A aluna relatou inicialmente ter enfrentado dificuldades adaptativas
tanto da estrutura escolar, como de alguns de seus professores, que por vezes tiveram suas
ações orientadas pela aluna, e que hoje em dia a instituição está em processo de adaptação
para receber e atender adequadamente a diversidade de seus alunos.
Quando nos referimos aos profissionais da educação, sejam eles de qualquer nível e/ou
especialidade, há sempre uma cobrança quanto ao seu aperfeiçoamento e preparo para o
trabalho que inúmeras vezes, serve para que o mesmo possa justificar o insucesso em sua
prática de ensino:
A qualidade técnica e profissional do educador está sempre submetida ao controle
social pelos dispositivos legais que lhe atribuem este grau, asseguram-lhe o
exercício da docência e lhe proporcionam meios de constante aperfeiçoamento.
Mas este é apenas um aspecto externo, o condicionamento coletivo que o determina
em sua condição de educador e lhe dá os recursos para se tornar um profissional
cada vez mais competente. Contudo, há outro controle, e este é o que realmente
importa: o que é exercido pela própria consciência do educador. (PINTO, 2003,
p.112-113)
A discente acredita ter aberto as portas para que a inclusão ocorresse naquela
instituição, pois depois dela, outros alunos começaram a freqüentar as aulas na EJA. Além da
escola, I. V. freqüenta e conta com o apoio da ADVBG (Associação dos Deficientes Visuais
de Bento Gonçalves) que no princípio transcreviam os textos, provas e apostilas para o Braille
a pedido da escola, que sempre demonstrou interesse e se responsabilizava por encaminhar
estes serviços à associação. Hoje em dia, as provas e atividades avaliativas são preenchidas na
associação pelos professores de I. V., que responde a elas oralmente; a mesma acha ser mais
profícuo desta maneira, por levar menos tempo.
2
Aluna matriculada na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos de uma escola privada.
10
Salientou I. V. que seu desempenho escolar está bom e que não tem dificuldades em
nenhuma matéria específica. Este é mais um exemplo entre outros de alunos que buscaram
seus direitos e felizmente encontraram uma instituição disposta a enfrentar o desafio da
inclusão e garantir uma educação de qualidade.
Neste momento é oportuno citarmos Mantoan no que se refere à inclusão:
A inclusão não prevê a utilização de práticas de ensino escolar especificas para esta
ou aquela deficiência e/ou dificuldade de aprender. Os alunos aprendem nos seus
limites e se o ensino for, de fato, de boa qualidade, o professor levará em conta esse
limites e explorará convenientemente as possibilidades de cada um. (MANTOAN,
2003, p.67)
Todos os cidadãos podem aprender. Cada um ao seu tempo e ritmo independente de
ter ou não alguma deficiência. O ensino de qualidade não faz uso de artifícios que acentuem
as diferenças, em contrapartida utiliza-se da diversidade para o crescimento do grupo e da
consciência coletiva onde as individualidades não sejam motivos para a sua descaracterização
e as diferenças não sejam a razão de exclusões.
Considerações Finais
O direito que dos cidadãos com necessidades especiais têm, de freqüentar uma escola
regular, mesmo que não o tenham feito na época prevista, mas depois de jovem ou adulto, não
se restringe à permanência na escola, vai muito, além disso, refere-se ao direito ao convívio
social, à troca com o outro, ao prazer de aprender, mas também ao prazer de ensinar; ao
privilégio de ser agente de mudanças, à alegria de estar inserido num grupo e compartilhar de
todas as demandas dele, boas, regulares, não tão boas, e algumas bem desagradáveis. De
poder aventurar-se, descobrir e descobrir-se, construir e construir-se, perceber o outro, mas
também a si mesmo, como parte importante dessa complicada engrenagem que se chama
“vida”. FREIRE (2003) diria que, sem aventura não há nem educação nem existência. As três,
intrinsecamente ligadas.
A educação, de acordo com Pinto deve ser trabalhada em sua totalidade:
A educação é um fenômeno social total. Para atendê-la é indispensável empregar a
categoria de totalidade. Significa que não se pode interpretá-la (nem planejá-la) se
não se tem em vista todo o conjunto de valores reais (sociais) que sobre ela influem
11
e dos efeitos gerais que dela resultam sobre os demais aspectos da realidade social.
A educação é parte de um conjunto de interações e de interconexões recíprocas e
não pode ser dissociada dele, tratada isoladamente. (PINTO, 2003, p.51)
Quando falamos de educação de Jovens e Adultos remetemos nossa lembrança ao
fracasso escolar e uma série de problemas sociais. E essa mentalidade é que precisa
urgentemente ser transformada. Somente através de políticas educacionais que promovam a
autonomia dos cidadãos e efetivamente promovam a mudança na consciência geral dos
demais aspectos da realidade social, é que poderemos afirmar que a educação cumpriu seu
papel e consequentemente as atitudes de exclusão serão reduzidas.
Este discurso soa, muitas vezes, utópico e essa realidade é cada vez mais gritante em
nossas escolas. Os educadores precisam estar cientes de que a sociedade é quem educa o
educador (PINTO, 2003), e que ela é uma fonte inesgotável de oportunidades de aprendizado
mútuo entre eles e seus educandos, mas para isso é importante salientar, como fora dito
anteriormente, que o professor precisa estar disposto a participar desse processo e
principalmente, precisa estar despido de preconceitos, pois estes vão ser os responsáveis por
futuras atitudes de exclusão que podem levar mais jovens a abandonar a escola antes de
concluir os estudos, ou ainda por impedir que aqueles que não se encaixem (como é o caso de
alunos com deficiências) cheguem a ela.
Demorou demais para se chegar ao momento de se dar um basta à inércia daqueles que
decidem a educação em nosso país. Vivemos em um mundo de acelerada evolução
tecnológica e atraso nas relações sociais. A partir do instante em que esse descompasso for
sanado, discussões como estas acerca das dificuldades enfrentadas por cidadãos com
deficiências para concluírem sua educação não serão mais necessárias. Mas, sobretudo, além
de se conseguir finalmente que as leis sejam postas efetivamente em prática, sem que o
aspecto ditador, das cobranças legais sobressaia precisamos que as iniciativas que temos hoje
em dia, tenham mais apoio e adesão para que se mantenham firmes no propósito de colaborar
para o crescimento social.
12
Obras Consultadas:
BRASIL, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>
Acesso
em
Abr. 2009.
BRASIL, 1996. LDB 9394. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira. Estabelece
as
diretrizes
e
bases
da
Educação
Nacional.
Disponível
em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil/LEIS/L9394.htm> Acesso em Maio 2009.
BRASIL, Ministério da Educação. PROEJA: Programa de Integração da Educação
Profissional Técnica de Nível Médio na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos.
Brasília: 2006.
CARVALHO, Rosita Edler. Educação Inclusiva: com os pingos nos “is”. 5 ed. Porto
Alegre: Mediação, 2007.
FERREIRA, Júlio Romero. A nova LDB e as necessidades educativas especiais. In:
Cadernos Cedes, ano XIX, n°46, setembro, 1998. Campinas: UNICAMP, 1998.
FREIRE, Paulo; GUIMARÃES, Sérgio. Sobre educação (Diálogos). Vol. 2, 3 ed. São Paulo:
Paz e Terra, 2003.
_____. Cartas a Cristina – Reflexões sobre minha vida e minha práxis. 2 ed. São Paulo:
UNESP, 2003.
GLAT, Rosana. Inclusão total: mais uma utopia? In: Revista Integração – ano 8, n° 20. São
Paulo: Centro de Pesquisa da Universidade de São Judas Tadeu, 1998.
MANTOAN, Maria Teresa Eglér. Inclusão Escolar: O que é? Por quê? Como fazer? São
Paulo: Moderna, 2003.
UNISC, Universidade de Santa Cruz do Sul. Reflexão e Ação volume 6, n. 2 (jul./dez. 1998).
Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2000.
13
PINTO, Álvaro Vieira. Sete lições sobre educação de adultos. São Paulo, Cortez, 2003.
VALLEJO, Ramón Porras. Una escuela para la integracióin educativa. Una alternativa al
modelo tradicional. Sevilha: Morón,1998.
14
Download

Jaqueline Bondan de Lima ok