UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO
ESCOLA DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS
VICTOR DOS SANTOS MORAES
AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM:
UMA DIALETIZAÇÃO À PEDAGOGIA WALDORF PARA A
PROBLEMATIZAÇÃO DE CONCEPÇÕES NATURALIZADAS
GUARULHOS
2014
VICTOR DOS SANTOS MORAES
AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM:
UMA DIALETIZAÇÃO À PEDAGOGIA WALDORF PARA A
PROBLEMATIZAÇÃO DE CONCEPÇÕES NATURALIZADAS
Trabalho de conclusão de curso apresentado
como requisito parcial para obtenção do título
de Licenciado em Pedagogia
Universidade Federal de São Paulo
Área de concentração: avaliação da
aprendizagem
Orientação: Magali Aparecida Silvestre
GUARULHOS
2014
Moraes,Victor dos Santos.
Avaliação da Aprendizagem : uma dialetização à
Pedagogia Waldorf para a problematização de concepções
naturalizadasa problematização de concepções
naturalizadas / Victor dos Santos Moraes.
Guarulhos,2014.
83 f.
Trabalho de conclusão de curso (Licenciatura em
Pedagogia) – Universidade Federal de São Paulo, Escola
de Filosofia, Letras e Ciências Humanas,2014.
Orientação: Magali Aparecida Silvestre.
1. Avaliação da aprendizagem. 2. Pedagogia Waldorf.
3. Práticas avaliativas. I. Magali Aparecida
Silvestre. II. Avaliação da Aprendizagem: uma
dialetização à Pedagogia Waldorf para a
problematização de concepções naturalizadas.
VICTOR DOS SANTOS MORAES
AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM: UMA DIALETIZAÇÃO À PEDAGOGIA
WALDORF PARA A PROBLEMATIZAÇÃO DE CONCEPÇÕES NATURALIZADAS
Trabalho de conclusão de curso apresentado
como requisito parcial para obtenção do título
de Lincenciado em Pedagogia
Universidade Federal de São Paulo
Área de concentração: avaliação da
aprendizagem
Aprovação: ____/____/________
Profa. Dra. Magali Aparecida Silvestre
Universidade Federal de São Paulo
Prof. Dr.Edna Martins
Universidade Federal de São Paulo
Prof. Dr. Umberto de Andrade Pinto
Universidade Federal de São Paulo
RESUMO
Este trabalho apresenta, inicialmente, resultado de pesquisa que objetivou
compreender quais fundamentos têm subsidiado as práticas avaliativas desenvolvidas em
classes dos anos iniciais do ensino fundamental a partir de pesquisa bibliográfica de autores que
discorrem sobre a temática da avaliação da aprendizagem, produzida a partir de Iniciação
Científica intitulada Avaliação da Aprendizagem: uma problematização de concepções
naturalizadas concluída em março de 2014. Na sequência, subsidiando-se por este referencial
teórico estudado, principalmente por autores como Freitas (2009), Luckesi (2011) e Veiga
(2004), cujos resultados dispuseram que a avaliação da aprendizagem é um “tema silenciado” e que práticas sistematizadas de avaliação são quase inexistentes, e aquelas que são explicitadas
fundamentam-se, ainda, em um modelo de avaliação autoritário e classificatório que não tem
contribuído para a construção da autonomia das crianças e para o alcance da qualidade do
ensino na escola pública, sentiu-se a necessidade de realizar uma entrevista com um membro da
equipe gestora de uma instituição educativa cujo sistema pedagógico busca romper, em sua
filosofia de ensino, com a realidade do problema anunciado, no sentido de fomentar um debate
dialético que visou problematizar concepções naturalizadas de avaliação de aprendizagem: uma
das Escolas Waldorf do município de São Paulo.
Palavras-chave: Avaliação da aprendizagem. Pedagogia Waldorf. Práticas avaliativas.
ABSTRACT
This paper presents, initially, the result of a research whose purpose was to
understand which fundaments has supported the evaluation process developed on classrooms in
the early years of elementary school, from researching studies from authors who discuss the
issue of the evaluation of learning, produced from Scientific Initiation research entitled
Learning Assessment: a problematization of naturalized conceptions, completed in march
2014. By using this study as a reference and using studies from Freitas (2009), Luckesi (2011)
and Veiga (2004) it presents results of analysis of interviews conducted with a member of the
management team of one of the Waldorf Schools in São Paulo, whose educational system tries
to break in their teaching philosophy with the reality of the issue announced. The main
objective is to foster a dialetic debate between the resuls achieved on the previous research and
the principles who controls another proposal of evaluation, to problematize naturalized
conceptions of learning asessment. This perspective emerged because the previous results had
shown that the evaluation of the learning is a "silenced theme" in current research and studies.
Sistematized practices of evaluation are almost nonexistent in the daily life of the schools
surveyed, and those who are explicited are founded also in a model of an authoritarian and
classificative evaluations that has not been contributing for building authonomy on children and
for a better quality of teaching on public schools.
Keywords: Learning assessment. Waldorf Pedagogy. Assessmentpractices.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 1: ESQUEMATIZAÇÃO DO CONCEITO
DE AVALIAÇÃO FORMATIVA
30
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO
7
2 METODOLOGIA
12
3 ESTUDOS SOBRE O TEMA AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM
17
3.1 CONCEITOS
17
3.2 HISTÓRICO EVOLUTIVO DAS CONCEPÇÕES DE AVALIAÇÃO
22
3.3 A AVALIAÇÃO EM RECORTES DE ANÁLISE: INSTRUMENTOS E
DIMENSÕES ENCONTRADOS
27
3.4 AVALIAÇÃO NA PEDAGOGIA WALDORF
31
3.4.1 UM POUCO SOBRE A ANTROPOSOFIA
31
3.4.2 ASPECTOS GERAIS DA ESCOLA WALDORF
34
3.4.3 CONCEPÇÃO DE AVALIAÇÃO NA PEDAGOGIA WALDORF
37
4 PRÁTICAS AVALIATIVAS EM SALA DE AULA SOB O OLHAR
DO SUJEITO DE PESQUISA
39
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
54
REFERÊNCIAS
57
LEGISLAÇÃO CONSULTADA
61
APÊNDICE A –TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA
62
APÊNDICE B – QUADRO DE CATEGORIAS DE ANÁLISE
76
ANEXO A –BANCO DE DADOS – LINKS DE ACESSO
78
7
1 INTRODUÇÃO
Dentre as inúmeras verbalizações analisadas durante a realização de pesquisa de
Iniciação Científica intitulada Avaliação da Aprendizagem: uma problematização de
concepções naturalizadas concluída em março de 2014, a qual motivou e subsidiou a
produção deste presente trabalho pelas inquietações provocadas, cabe destacar as que
discorrem sobre o tema avaliação educacional a partir de um olhar crítico subjacente à tese
que defendem, encontrando-se diversos apontamentos de teóricos da educação tecendo sobre
a necessidade de problematizar o atual cenário da realidade brasileira perpassado pelo
processo avaliativo escolar.
Compreender, pois, o debate sobre avaliação educacional implica em situá-lo,
inicialmente, ao menos em três dimensões, intrinsicamente integradas, mas cada uma
possuidora de um “protagonista principal” (FREITAS, 2009, p.35), motivo pelo qual a
maioria dos estudos trata o tema focalizando uma dessas dimensões, sem desconsiderar a
contextualização que há entre elas.
Assim, as discussões sobre o tema avaliação educacional são estimuladas por um
conjunto de estudos que permeiam os núcleos conceituais: avaliação em larga escala ou
avaliação externa, tendo o Estado como protagonista; avaliação institucional que acontece na
escola e com os segmentos que a compõem e avaliação da aprendizagem, aquela praticada
pelo professor e que pode ou não ser protagonizada pelo aluno a depender da forma como é
concebida e implementada na sala de aula.
Partindo dessa perspectiva, encontraram-se, na pesquisa bibliográfica realizada
anteriormente a este trabalho, importantes contribuições a serem explanadas como subsídio
norteador da discussão engendrada. Luckesi (2011) explica que o conceito de avaliação
implica numa noção processual da ação docente em sala de aula, subsidiadora do
planejamento e replanejamento do ensino e que permite ao professor estruturar sua
intervenção pedagógica, no processo de ensino-aprendizagem, atrelada aos objetivos
propostos.
Dessa forma, o autor desconstrói a tradicional tendência em que, ao instrumentalizar o
planejamento, insere-se, de uma forma geral, a avaliação no final do processo como medida
paliativa na verificação dos resultados (pois estes não são construídos e concebidos como a
produção de um trabalho, mas apenas diagnosticados numa formalidade institucional) e a
descola da proposta pedagógica como um todo.
8
Souza (2010) vai ainda mais além nessa análise quando se remete à avaliação em larga
escala, uma vez que sistematiza de maneira bem contundente a deturpação que vem sendo
feita ao redor dessa concepção ao longo de décadas. Sua crítica consiste, pois, em atentar-se
para a aplicação da avaliação externa como um instrumento de controle e coerção, em que se
classifica o aluno por princípios de meritocracia e desemboca-se em dois processos inócuos à
melhoria desse cenário: concorrência e repetência. Essa proposição pode ser vista como algo
que reflete e explica o fenômeno descrito por Luckesi (2011) no âmbito da sala de aula.
Freitas (2009), por outro lado, nos chama a atenção para o fato de que a avaliação
institucional, que ocorre no âmbito da instituição escolar, pode induzir à construção de uma
escola reflexiva e, como consequência, possibilitar a construção de uma escola mais
autônoma e propositiva, principalmente porque essa dimensão da avaliação possibilita “[...]
que o coletivo da escola localize seus problemas, suas contradições; reflita sobre eles e
estruture situações de melhoria ou superação” (p.38).
Essas ideias sobre as dimensões da avaliação educacional, que tem por base um
conjunto de análises sobre o que vem sendo praticado no sistema - avaliação interna e externa
à escola - precisam ser compreendidas em sua articulação justamente porque diversos estudos
tem indicado, por exemplo, o quanto as avaliações externas tem impactado nas práticas
pedagógicas dos professores desenvolvidas em sala de aula, ou ainda, o quanto a escassez de
práticas de avaliação institucional no interior da escola retira a possibilidade do coletivo
desvelar, entre outras coisas, consequências de um processo de avaliação da aprendizagem
excludente.
Esta inquietação ganha outra dimensão quando reconhecemos que as práticas
avaliativas, sejam elas externas ou internas à escola, têm estado muito mais a serviço da
exclusão do que da construção da autonomia tanto do estudante como da própria escola.
Autonomia que deve ser construída precipuamente de outra condição pertencente à linhagem
de uma educação não classificatória, mas emancipatória: a independência, desde a Educação
Infantil.
Essa reflexão remete-nos à concepção de Bourdieu (1999) sobre aqueles que são
“excluídos do interior”, do interior de um sistema que permite o acesso, mas que seleciona
condições para a continuidade das carreiras escolares, baseando-se em critérios incompatíveis
à realidade social dos estudantes, pois avaliar não é julgar nem medir, mas sim integralizar as
etapas de um processo educativo como apreciação de um trabalho desenvolvido para e com o
aluno, e não uma cobrança formal daquilo que ele não pode apresentar.
9
Baseando-se em Freitas (2009), buscou-se entender, dessa forma, num âmbito ainda
geral da avaliação da aprendizagem, até que ponto o juízo de valor docente deve incidir na
composição da avaliação para que o professor não a utilize a serviço da exclusão escolar.
Faz-se necessário, portanto, definir mais claramente as dosagens conceituais aplicadas
no momento generalizado da avaliação, amparando-se ao que Veiga (2004) afirma a respeito
do conceito de autonomia escolar. Reportando seu discurso à autonomia da figura genérica do
professor em sala de aula, pode-se afirmar que esta também é de natureza relativa, a qual
determina, a partir do objeto a ser avaliado (nesse caso o conhecimento e não o
comportamento e os valores), o grau de subjetividade aí envolvido, ou seja, indica até que
ponto essa “independência” ou essa autonomia se estabelece de modo a não ultrapassar suas
obrigações a serem prestadas à instituição e ao sistema como um todo, uma vez que é
condicional.
Dada a relevância à responsabilidade ética e social dessas ações, não se procurou
propagar aqui mais um jargão pertencente ao discurso do senso comum ao enfatizar os
perigos que decorrem do descomprometimento de um professor para com sua avaliação em
sala de aula, principalmente quando este passa a apropriar-se de preconceitos, verdades
absolutas e percepções pessoais, muitas vezes de forma naturalizada. Trata-se, portanto, de
recorrer sempre a um alerta que nunca se desgasta na tentativa contínua de promover uma
educação emancipatória.
É, pois, concernente à lógica desse pensamento que se buscou referências da
Pedagogia Waldorf como campo investigado, na tentativa de entender um pouco este universo
em termos de concepções de educação e de práticas avaliativas para dialetizá-lo ao discurso
dos autores já estudados. Recorrendo-se brevemente ao aporte teórico desse sistema
pedagógico escolar, especificamente no que se refere à avaliação da aprendizagem, percebeuse claramente que a concepção adotada coaduna-se perfeitamente à abordagem aqui utilizada.
Segundo Lanz (1986), a metodologia avaliativa defendida por essa filosofia de ensino vai de
encontro à utilizada nas escolas tradicionais, em que “o rendimento de cada aluno em cada
matéria é quantificado e comparado com um ideal que não existe na prática” (p.91). Esta abordagem, contrária à explanada pelo autor, delega à nota uma responsabilidade que,
intrinsecamente aos princípios de uma educação emancipatória, não deveria ser dela:
determinar o destino de sua carreira escolar, bem como sua respectiva aprovação ou não, o
encaminhamento de suas futuras trajetórias nos percursos acadêmico ou profissional. Trata-se,
pois, de um sistema tão fortemente arraigado à ideologia educacional de nossa sociedade que
ninguém questiona sua lógica nem emite dúvidas a respeito, mas que por isso mesmo, sente-
10
se, como justificativa científica para a construção desta pesquisa, a necessidade de
problematizar esse estereótipo conceitual.
Além disso, o autor enfatiza a dimensão formativa da avaliação que é tão valorizada
por essa teoria pedagógica, consubstanciando-se numa perspectiva que se caracteriza pela
seguinte ideia:
Um sistema pedagógico escolar que visa a formação, e não o fichamento
cadastral dos jovens, tem de entender por avaliação algo totalmente oposto.
Ele avaliará a personalidade e caracterizará suas várias facetas em vez de
apenas medir o seu rendimento. Se julga os resultados, fá-lo comparando-o
não com modelos abstratos, mas com a potencialidade do aluno (LANZ,
1986, p.91).
Essas análises permitem-nos, assim, enxergar que, por trás de toda ação professoral, de
toda tomada de decisão, atitude ou opção a ser assumida em seu trabalho pedagógico, há uma
dada concepção de educação subjacente aos princípios adotados pelo educador.
Percebeu-se, dessa maneira, a ausência de processos avaliativos que subsidiem novas
decisões dos professores de escolas públicas e particulares, campo de atuação para os quais os
estudantes de Pedagogia são formados, sobre o ensino na perspectiva de melhor mediar a
aprendizagem de crianças em processo de escolarização. Verificou-se ainda que a avaliação
na escola, quando explicitamente presente, tem servido muito mais à exclusão do que à
tomada de novas decisões, deixando de exercer a crítica ao percurso de uma ação, como
explica Luckesi (2011).
Indaga-se, então, sobre o que os cursos de Pedagogia tem realizado para formar
professores que consigam compreender as dimensões e as intenções das práticas avaliativas
para que com esse conhecimento consigam romper com a lógica perversa de práticas de
avaliação em sala de aula muito mais segregadoras do que formativas, como defendem os
teóricos da Pedagogia Waldorf, das quais ele é o protagonista. Uma lógica que, ao naturalizar
o fenômeno educativo, desconsiderando portanto suas determinações históricas e sociais,
acaba por naturalizar o fracasso das crianças frente aos conhecimentos escolares, desonerando
os professores de qualquer responsabilidade.
Diante dessas inquietações, passou-se a querer compreender como o estudo de uma
metodologia de ensino especificamente definida, como já mencionado anteriormente, pode
contribuir no sentido de subsidiar essa discussão teórica problematizadora de concepções
naturalizadas nos diversos contextos escolares, objeto de investigação desta pesquisa.
Assim, o objetivo principal desta pesquisa foi fomentar um debate dialético entre os
resultados alcançados na pesquisa de iniciação científica, anteriormente realizada, e os
11
princípios que regem uma outra proposta de avaliação, para problematizar concepções
naturalizadas de avaliação da aprendizagem. Esta perspectiva surgiu porque os resultados
anteriores dispuseram que a avaliação da aprendizagem é um “tema silenciado” em estudos e pesquisas atuais e que práticas sistematizadas de avaliação são quase inexistentes no cotidiano
das escolas pesquisadas, e aquelas que são explicitadas fundamentam-se, ainda, em um
modelo de avaliação autoritário e classificatório que não tem contribuído para a construção da
autonomia das crianças e para o alcance da qualidade do ensino na escola pública.
Diante do exposto, a questão-problema que norteia esta pesquisa é investigar quais as
contribuições de alguns dos princípios e fundamentos da Pedagogia Waldorf para analisar
criticamente este fenômeno de deficiência no processo avaliativo das escolas em geral
deflagrado pelos autores da área. Este desafio consubstanciou-se, assim, em: sistematizar, no
primeiro capítulo, a metodologia utilizada; apresentar, no segundo capítulo,os resultados da
pesquisa bibliográfica construída na Iniciação Científica que buscou compreender quais
fundamentos tem subsidiado as práticas avaliativas desenvolvidas em classes dos anos iniciais
do ensino fundamental, segundo o aporte teórico selecionado e estudado, para que se pudesse,
então, no terceiro capítulo, dialetizá-los aos de uma perspectiva na qual se encontrou sucesso
do ponto de vista emancipatório, formativo e não excludente de avaliação: a Pedagogia
Waldorf. O trabalho é encerrado pelas considerações finais do autor após a análise anunciada.
12
2 METODOLOGIA
Faz-se necessário explicitar, neste momento, como instrumento de trabalho intrínseco
ao processo de investigação desta pesquisa, bem como à posterior compreensão da análise
realizada, o método utilizado.
A escolha por uma abordagem qualitativa para desenvolver esta pesquisa relaciona-se
ao objeto a ser investigado. Essa escolha permite interpretar a realidade em que as
informações foram coletadas – uma escola do município de São Paulo que segue a
PedagogiaWaldorf – de uma maneira mais abrangente, considerando os sujeitos que
produziram as práticas pedagógicas – os professores – e o sujeito que as interpretaram – a
coordenadora1 entrevistada. Nesse caso, uma pesquisa cuja abordagem fosse quantitativa não
ajudaria a atingir os objetivos concebidos no projeto inicial.
A forma como a pesquisa foi desenvolvida teve como base, inicialmente, o resgate dos
resultados obtidos pela Iniciação Científica descrita anteriormente sobre o tema da avaliação
da aprendizagem e a leitura, análise e interpretação do livro “A Pedagogia Waldorf: caminho para um ensino mais humano” de Rudolf Lanz, o que, de acordo com Sá-Silva, Almeida e
Guindani (2009) caracteriza-se como pesquisa bibliográfica.
Em função dessa escolha, a primeira etapa da pesquisa consistiu em uma revisão
bibliográfica com o objetivo de revisitar os autores da Iniciação Científica que discutem de
uma maneira bem contundente a temática avaliação da aprendizagem e quais são os conceitos
do ponto de vista sociológico, político, pedagógico e ético que norteiam as ideias por eles
defendidas.
Cumpriu-se então, nessa primeira etapa da pesquisa, como previsto no projeto inicial,
a revisão do aporte teórico da Iniciação Científica que foi subsidiador das ações das etapas
subsequentes, a elaboração de uma nova pesquisa bibliográfica sobre a avaliação da
aprendizagem na Pedagogia Waldorf, entrevista à sujeito de pesquisa de instituição de ensino
do município de São Paulo regida pela Pedagogia Waldorf e posterior análise dos dados
coletados.
Sabendo que os dados utilizados nesta primeira etapa originaram de documentos de
domínio científico, e que a forma como foram analisados deve responder ao objeto de estudo
1
Este termo foi comumente adotado para se referir ao sujeito de pesquisa por estar relacionado às atividades e
competências da educadora, mas que na Escola Waldorf não é utilizado por se tratar de uma instituição que
possui uma organização escolar diferenciada.
13
investigado, os dados coletados por meio da entrevista, na segunda fase, foram transcritos
(Apêndica A), organizados e analisados tendo como base este referencial teórico adotado pelo
pesquisador.
Este perfil metodológico motivou a escolha por utilizar a pesquisa bibliográfica como
forma de coletar os dados, os provenientes do banco de dados da referida Iniciação Científica
e os novos. Sá-Silva, Almeida e Guindani (2009, p. 5-6) explicam, em sua paráfrase à
Oliveira (2007) que:
Para essa autora a pesquisa bibliográfica é uma modalidade de estudo e
análise de documentos de domínio científico tais como livros, periódicos,
enciclopédias, ensaios críticos, dicionários e artigos científicos. Como
característica diferenciadora ela pontua que é um tipo de “estudo direto em fontes científicas, sem precisar recorrer diretamente aos fatos/fenômenos da
realidade empírica” (p. 69). Argumenta que a principal finalidade da pesquisa bibliográfica é proporcionar aos pesquisadores e pesquisadoras o contato
direto com obras, artigos ou documentos que tratem do tema em estudo: “o mais importante para quem faz opção pela pesquisa bibliográfica é ter a
certeza de que as fontes a serem pesquisadas já são reconhecidamente do
domínio científico” (p. 69) (…) a pesquisa bibliográfica remete para as
contribuições de diferentes autores sobre o tema, atentando para as fontes
secundárias, enquanto a pesquisa documental recorre a materiais que ainda
não receberam tratamento analítico, ou seja, as fontes primárias.
Todos estes argumentos expostos justificam assim a opção em utilizar a pesquisa
bibliográfica, seguida de entrevista semi-estruturada, como forma coerente aos princípios da
pesquisa de interpretação dos dados. Pesce & Barsottini (2012, p.6) corroboram este
argumento, explicando então que:
A pesquisa bibliográfica é inerente a todo e qualquer trabalho científico e se
caracteriza como atividade de localizar e consultar diversas fontes de
informação escrita, com o objetivo de coletar dados acerca de um
determinado tema a ser investigado (ALMEIDA JÚNIOR, 1989). Costuma
apresentar as seguintes etapas: identificação e localização de fontes,
compilação das informações delas emanadas.
Concluída a primeira etapa, procedeu-se a leitura, análise e interpretação de dados
coletados por meio de ida a campo em uma escola de São Paulo que aceitou participar desta
pesquisa, dentre as três procuradas na cidade, que adota a filosofia antroposófica como
metodologia de ensino e utiliza a Pedagogia Waldorf como teoria pedagógica de modo a
entender, como guia de temas desse trabalho investigativo, as práticas avaliativas de seus
professores sob a ótica do sujeito de pesquisa entrevistado, coordenadora da escola, o que é
denominado, por sua vez segundo Pesce & Barsottini (2012), entrevista semi-estruturada.
14
Vale ressaltar que este instrumento metodológico de pesquisa científica aufere “um
grau médio de liberdade e aprofundamento sobre o tema em estudo” (PESCE &
BARSOTTINI, 2012, p. 10), porém sempre levando em conta a relevância dos depoimentos
dos entrevistados para a pesquisa, a franqueza na descrição dos propósitos do trabalho e na
condução da entrevista e o respeito pelos entrevistados e por suas posições.
Nessa etapa procurou-se obedecer fielmente as fases descritas por Pesce & Barsottini
(2012, p. 11):
A introdução é a fase em que o pesquisador fornece explicações sobre a
entrevista, deixando bem claro o objetivo da entrevista. É também importante
assegurar o anonimato e o sigilo das respostas que os sujeitos de pesquisa
darão, bem como explicitar que as opiniões e experiências do entrevistado
são extremamente relevantes para a investigação. O entrevistado também
deve ser notificado de que é livre para interromper, a qualquer momento. Se
a entrevista usar o recurso da gravação sonora ou da vídeo gravação, é
necessário solicitar autorização ao sujeito de pesquisa, antes de dar início à
gravação.
O início da entrevista deve ser utilizado para conhecer as características
sócio-demográficas dos sujeitos de pesquisa. Para facilitar para o
entrevistado, esta etapa inicial pode ser apresentada em folha e deve conter os
dados usuais, tais como nome do entrevistado; data e local da entrevista;
idade e sexo do entrevistado (se for relevante para a temática de
investigação); nível de escolaridade; endereço; naturalidade; profissão ou
ocupação.
Feita a entrevista, o pesquisador parte para a etapa da transcrição, sem a qual
não é possível analisar os dados coletados. De modo geral, o pesquisador
gasta para transcrever o dobro do tempo da entrevista. Em entrevistas não
diretivas, não mais que 20, pela complexidade da análise.
Assim, partindo-se da posse dos dados recuperados e coletados em ambas as fases da
pesquisa, respectivamente, e providenciada a sua organização, iniciou-se a etapa de
organização, tratamento, análise e discussão dialética entre eles, sabendo que a forma como se
analisa os dados deveria responder ao objeto de estudo que estava sendo investigado.
Tratando-se de uma pesquisa que previu, essencialmente, o desenvolvimento de
entrevista semi-estruturada, nenhum material a mais foi necessário. O que poderia trazer
algum tipo de dificuldade seria estabelecer o contato com a equipe gestora das escolas
procuradas para a realização da entrevista. Contudo, buscou-se vencer essas dificuldades
processualmente no intuito de atingir os objetivos propostos para a pesquisa.
O referencial de análise fundamenta-se no definido pelo estudo de Almeida, Guindani
& Sá-Silva (2009), bem como ancora-se nas contribuições de Szymanski (2002). Tais autores
acabaram por ajudar, de alguma maneira, a compreender o procedimento imparcial da
entrevista semi-estruturada sobre os dados coletados, assim como é feito neste trabalho.
15
Szymanski (2002) vai ainda mais além quando especifica umas das potencialidades
deste método da entrevista semi-estruturada, como instrumento de pesquisa, como sendo a de
mapear a trajetória investigativa do pesquisador. Esta constatação vai diretamente ao encontro
de um dos principais objetivos desta pesquisa que é o de conhecer o contexto dos caminhos
percorridos pelos professores da Escola Waldorf visitada a partir da visão panorâmica, de um
só sujeito, que os abarca – a coordenadora pedagógica – para a elaboração de um parecer
científico sobre as práticas avaliativas desenvolvidas em sala de aula, bem como a produção
decorrente de seus papeis como avaliadores, resultante de questões elaboradas sobre a sua
atuação (a dos professores) na escola.
Procedendo, então, no momento propício, à análise dos referidos depoimentos da
entrevistada, etapa prevista no projeto de pesquisa, procurou-se tratá-los como relatos que
trariam respostas para a questão problematizadora que buscava identificar as práticas
avaliativas e suas concepções com vistas a apresentar aspectos que poderiam fomentar
discussões sobre a elaboração de ações que repensem as práticas avaliativas em voga nas
escolas brasileiras.
Faz-se necessário explicitar que a análise resultou da interpretação do olhar da
entrevistada sobre os fenômenos investigados, no qual se percebeu claramente, nos relatos
apresentados sobre o cotidiano da escola-campo, a realidade educacional diferenciada que os
alunos vivenciam durante o período letivo, que a maior parte da avaliação que efetivamente
acontece em sala de aula se dá de maneira implícita, pertencendo à lógica de um currículo
oculto (SILVA, 1999), o que caracteriza o perfil desta análise como investigativo e revela o
caráter exploratório e qualitativo (BOGDAN & BIKLEN, 1994) da pesquisa, pois resulta
também da atribuição de sentido aos dados coletados.
A complexidade desta modalidade de pesquisa ganha destaque, inclusive, quando
perpassa pela subjetividade da entrevistada, correndo o risco de ser indutiva demais quando se
considera suas dimensões exploratória, descritiva e interpretativa, além de seus resultados
dependerem do pesquisador que a constrói, diferentemente do que acontece na pesquisa
quantitativa.
Dessa forma, as informações encontradas nos depoimentos transcritos à luz do aporte
teórico estudado, por meio de diversas leituras flutuantes realizadas, foram selecionadas e
organizadas em um quadro. Tendo por base essa organização, passou-se para uma análise
mais aprofundada das informações, reorganizando-as em categorias, em um segundo quadro,
desvelando aos poucos as tendências contidas nas práticas de avaliação dos professores
16
segundo a coordenadora, traçando um paralelo com as que ainda vigoram no sistema
educativo brasileiro segundo os autores pesquisados.
Nessa direção, quando se considerou que todas as informações organizadas pela
entrevista realizada ofereceram aspectos importantes para identificar e interpretar as práticas
de avaliação desenvolvidas pelos professores, na visão da gestora, passou-se a elaborar um
texto, discutindo os dados sistematizados tendo como base o referencial teórico adotado nesse
estudo, constituindo-se assim na etapa que se denomina, no Plano de Trabalho, de
interpretação dos dados.
Pretendeu-se, assim, conhecer como são as práticas de avaliação desenvolvidas na
Escola Waldorf visitada e identificar, na prática da entrevista, o quanto elas ainda se
aproximam de uma tendência tradicional de ensino em que a avaliação serve à classificação e
à exclusão, ou se distanciam dessa perspectiva, fundamentando-se mais por uma tendência
emancipatória de avaliação, cujo objetivo é desenvolver a autonomia do aluno, conforme
estabelece a biliografia estudada sobre as Escolas Waldorf. Desta maneira, buscou-se
comprovar ou refutar esta concepção pelo depoimento da profissional da educação que atua
nessa instituição, tendo consciência de que não se representou aqui um discurso generalizado
dessa teoria pedagógica, mas que se tratou de um recorte investigativo direcionado
especificamente para esta pesquisa.
Objetivou-se, neste trabalho, que a análise e interpretação, que já haviam sido feitas,
dos dados coletados sobre o tema auxiliassem a traçar um panorama significativo sobre como
essas práticas de avaliação vem sendo desenvolvidas em classes dos anos iniciais do ensino
fundamental tradicional em relação ao de uma escola da Pedagogia Waldorf.
17
3 ESTUDOS SOBRE O TEMA AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM
3.1 Conceitos
Objetivando explorar a trajetória conceitual acerca da discussão sobre avaliação da
aprendizagem, foi possível identificar nos artigos analisados na Iniciação Científica o
delineamento de uma evolução teórica das concepções, em que os autores esclarecem o
caráter polissêmico do tema tratado que ainda perdura na atualidade. A complexidade do
conceito de avaliação evidencia-se, inclusive, nas contradições encontradas entre algumas
definições.
Pedro Ferreira de Andrade (2001) discorre sobre a necessidade de uma dimensão mais
qualitativa a ser empregada às práticas avaliativas, considerando expectativas, atitudes, modos
de pensar, capacidade de adaptação pessoal e social do aluno, todos estes aspectos intrínsecos
e inter-relacionados com a construção do conhecimento. Seus apontamentos ancoram-se aos
trazidos pela Lei de Diretrizes e Bases (1996), pelas Diretrizes para a Formação de
Professores2 e pelos Parâmetros Curriculares Nacionais3,utilizando, inclusive, as significações
adotadas no texto destes documentos sobre o tema da avaliação para justificar a posição que
assume neste conflituoso campo. Tais documentos enfatizam o caráter qualitativo e
processual da avaliação, sendo intrínseca ao processo educacional e contrapondo-se à
avaliação tradicional4 como julgamento de sucesso ou fracasso.
Outra perspectiva que se encaixa na abordagem de Andrade (2001) é a de Ana Cristina
Muscas Caldeira (2004) que adota uma teoria construtivista de avaliação, problematizando,
2
As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior,
em curso de licenciatura, de graduação plena, constituem-se de um conjunto de princípios, fundamentos e
procedimentos a serem observados na organização institucional e curricular de cada estabelecimento de ensino e
aplicam-se a todas as etapas e modalidades de educação básica (BRASIL. 2013).
3
Os PCN’s foram elaborados para difundir os pincípios da reforma curricular e orientar os professores na busca de novas abordagens e metodologias. Eles traçaram, na década de 1990, época de sua edição, um novo perfil
para o curículo, apoiado em competências básicas.
4
Avaliação tradicional entendida aqui como meramente verificar se os objetivos foram formalmente atingidos,
sem levar em consideração o processo que o aluno percorreu, pois o foco não está na aprendizagem do aluno,
mas na suposta assimilação do que o professor quis ensinar, ou seja, está no conteúdo e não no desenvolvimento
das competências dos alunos. Faz-se necessário diferenciar, neste sentido, os métodos de avaliação tradicionais
das concepções tradicionais e superar a associação, feita recorrentemente, entre avaliação tradicional e avaliação
retrógrada, classificatória, excludente. Deste modo, este complexo conceito deve ser a todo momento
relativizado sob o olhar do leitor que, tendo este cuidado, saberá interpretá-lo segundo o contexto em que for
utilizado neste trabalho.
18
em seu texto, a concepção mecanicista proposta por Bloom 5. Caldeira (2004) defende a ideia,
assim como Bloom, de que o foco deve estar no conhecimento do desenvolvimento cognitivo
do aluno e não da elaboração de instrumentos ou estratégias pré-definidas. No que concerne a
este entendimento, faz-se necessário explicitar que esses dois modelos ainda coexistem na
sala de aula e que o professor, mesmo querendo apropriar-se de uma postura construtivista,
encontrará barreiras tanto teóricas, de má formação docente, quanto práticas, em termos da
não atualização organizacional e estrutural das instituições frente às novas demandas da ação
docente pela não sustentação do modelo tradicional.
Contudo, pode-se dizer ainda que ambos teóricos contrapõem-se, em suas
conceituações, a uma análise mais contemporânea feita por Lilian Anna Wachowics (2005) e
Mirian Silva Monteiro (2004). Avaliar, para essas autoras, significa não valorar (a - não;
valiar – atribuir valor), não atribuir valor ao que está sendo valorado, ou seja, podemos
descrever a aprendizagem e suas manifestações, mas não podemos atribuir-lhes um valor, um
julgamento, pois seria uma atitude muito arbitrária, uma vez que o processo de aprendizagem
é muito mais complexo para ser categorizado. Monteiro (2004) vai ainda mais além nessa
reflexão quando admite que a avaliação inclui sim uma dimensão julgadora da aprendizagem
do aluno, mas que, quando se avalia, não se avalia somente para julgar o outro, mas também
todo o conhecimento sistematizado produzido conjuntamente com ele, realizando trocas de
experiências nos âmbitos social, político e educacional, além de estar ciente da posição
ocupada pelo educador ou educando no ato educativo, para que os discursos possam se
responder uns aos outros e as expectativas sejam correspondidas reciprocamente: o professor
esperando que o aluno efetivamente aprenda e o aluno que o professor lhe explique e lhe
ensine da forma que ele quer e precisa.
Sendo assim, subentende-se que o medir, o excluir e o selecionar vão dando espaço
para o interagir e para o construir na ação do avaliador. Essas constatações deparam-se
diretamente às primeiras ideias apresentadas, segundo as quais, conforme trecho dos
Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental extraído por Andrade (2001, p.6):
“[...] do contraste entre os critérios de avaliação e os indicadores expressos na produção dos 5
Benjamin Samuel Bloom (21 de fevereiro de 1913 - 13 de setembro de 1999) foi um psicólogo educacional
americano que fez contribuições para a classificação dos objetivos educacionais e para a teoria do domínio de
aprendizagem. Ele também dirigiu uma equipe de pesquisa que realizou uma grande investigação sobre o
desenvolvimento de talentos excepcionais, cujos resultados são relevantes para a questão da eminência,
realizações excepcionais e grandeza.
19
alunos surgirá o juízo professoral que por sua vez se constitui na essência da avaliação
[...]”.
Esse movimento problematizador das concepções tratadas e que, por sua natureza, está
presente e previsto na pesquisa, é ainda mais acentuado quando é encontrado em Perrenoud e
em Mazzeto (1991; 2003 apud WACHOWICS, 2005), na interpretação de Wachowics, outro
apronfundamento teórico. Os autores apontam a possibilidade de uma avaliação ser contínua
sem ser formativa, o que geralmente é pretensamente esperado por muitos que defendem essa
função da avaliação, mas que não ocorre, ou seja, a avaliação só será verdadeiramente
formativa se contribuir para a individualização dos processos de aprendizagem, e não apenas
por ser realizada em vários momentos ao longo dele, pois isto será apenas uma fragmentação
da famigerada avaliação final e geralmente punitiva e classificatória. Trata-se de uma divisão
de um momento concentrado que é a avaliação final, mas que, por si só, não resolverá o
problema se não assumir de fato um papel orientador e regulador do processo de ensino em
prol de uma aprendizagem significativa e não apenas que responda às competências exigidas
institucionalmente ao professor. Desta forma, a avaliação estará sendo, segundo a autora,
frequente, sem ser dinâmica, constante, sem pertencer efetivamente ao processo educacional
engendrado, dividida, mais ainda assim pontual.
Deve-se entender, portanto, que essas mudanças acima citadas são meramente técnicas
e não representam sinônimos de objetividade e imparcialidade na educação, mas puramente
de um atendimento a formalidades institucionais. Cabe pensar, pois, como nos sugere
Andrade (2001), que o ato de avaliar
[...] exige um posicionamento político, pois atrela-se a concepções
pedagógicas que se relacionam às mais distintas vertentes ideológicas,
implicando em princípios e valores subjacentes” (ANDRADE, 2001, p.8).
Partindo-se dessa tentativa de superar essa má interpretação das práticas avaliativas
escolares identificada nas análises contempladas da literatura bibliográfica clássica sobre o
conceito de avaliação, faz-se necessário desmistificar, segundo Depresbiteris (1996), em sua
paráfrase à Popham (1983), a diferença entre o ato de medir e o ato de avaliar. Segundo essa
abordagem da autora, a medida representa o nível quantitativo das habilidades escolares do
aluno enquanto a avaliação informa sobre o valor qualitativo dessas habilidades. Nesta visão,
Depresbiteris (1996) contrapõe-se, pois, à de Wachowics (2005), a qual considera que a
avaliação inclui medidas e critérios que devem ser usados para julgar o desempenho.
20
Tomaz (2010) baseou-se na teoria moscoviciana das representações sociais ao estudar
as interpretações de estudantes de Pedagogia, entre estagiários e já atuantes na rede oficial de
ensino, sobre o ato da avaliação. Seu trabalho serviu para entender que seus entrevistados, os
quais representam o perfil de muitos professores e futuros professores, sem generalizar a
questão, dividem categoricamente o conceito entre avaliação tradicional, tida como injusta e
avaliação progressiva, sem atentar-se para a complexidade que o tema requer, o qual vai
muito além dessa simples dicotomia, pois, como já se pôde observar, os métodos avaliativos,
sejam eles tradicionais ou progressistas, nem sempre atrelam-se diretamente as suas
concepções, podendo haver instrumentos avaliativos tradicionais como a prova ou o exame
que são empregados de maneira justa e com uma finalidade emancipatória (não
classificatória) e vice-versa.
Vale dizer que esta é apenas uma tentativa de exemplificar o argumento, pois a
avaliação também não se restringe apenas a essas categorias pré-fixadas, ou seja, o trabalho
dos educadores em sala de aula é complexo, dinâmico e socialmente construído, o que nos
impede de enquadrar rigorosamente as suas posturas em tais classificações. Só depois de
analisá-las é que poder-se-á elaborar uma concepção de educação mais exata que reflete como
o perfil de cada professor delineia-se no exercício da docência e em prol de quais princípios.
Almeida (2008) objetiva compreender, especificamente em sua tese, os sentidos
atribuídos pelas professoras que vivenciam o contexto dos ciclos em escolas de Fortaleza-CE
ao papel do avaliador, buscando identificar, então, as práticas avaliativas que se aproximam
de uma perspectiva menos classificatória e mais associada à aprendizagem dos alunos e às
intervenções pedagógicas para a melhoria desse processo. A orientação metodológica de que
se valeu a autora para isso foi baseada nos pressupostos da entrevista compreensiva,
referendada nos estudos do sociólogo francês Jean Claude Kaufmann. Essa teoria compreende
a palavra como elemento central na consolidação do objeto de estudo, daí a importância das
professoras mencionadas participarem da pesquisa e das discussões sobre avaliação.
Houve, portanto, neste trabalho de campo, que traz o discurso de uma realidade
recortada, mas que se enquadra a esta tentativa presente de explorar um panorama geral sobre
a atual situação em que se encontra o papel da avaliação nas escolas, bem como entender
como chegamos até ele e como podemos superá-lo, a apreensão de sentidos atribuídos à
avaliação da aprendizagem dissociados do paradigma tradicional. Esses sentidos foram
formulados entre o saber e o não saber das professoras que interagem (ou se adequam) com as
mudanças impostas pela obrigatoriedade do regime de ciclos, buscando estratégias de autoorganização como consequência da busca por novos saberes inerentes à docência.
21
Concluiu-se, assim, tendo por base estas pesquisas, que, seja qual for a concepção de
avaliação adotada, inclusive “mista” (tradicional e mesmo assim emancipatória ou moderna, porém classificatória), essa conscientização sobre por qual caminho se está trilhando precisa
estar bem clara e definida, pois este é o primeiro passo para que o comprometimento social do
professor com a educação se efetive. Agir arbitrariamente, sem a devida ideia sobre o que os
seus atos refletem, simplesmente respondendo ao que a voz do sistema requer e não a do
aluno, é fechar os olhos diante da preocupação com a formação (integral) do educando que
está ou deveria estar por trás de toda e qualquer prática avaliativa.
Desemboca-se, dessa forma, numa banalização da postura do avaliador, pois acaba-se
por gerar muita arbitrariedade no trabalho daqueles que devem apresentar resultados
importantes, inclusive para a continuidade do processo de formação com os futuros
professores.
Esta formação deve e precisa, portanto, ser reproblematizada, uma vez que da forma
como é dada pode nascer esse ciclo vicioso descrito. É preciso que a dicotomia avaliação
qualitativa versus avaliação quantitativa seja mais discutida na formação, pois a prática da
avaliação escolar é contínua, passando por avaliações de grande escala. Propõe-se também a
inserção de uma disciplina específica sobre avaliação na grade curricular do curso,
reafirmando a importância do lugar que ela ocupa (ou deveria ocupar) na instituição.
Entende-se que está mais do que provado que o modelo sustentado pela abordagem
tradicional da avaliação frustra a realização de novas práticas avaliativas, continuadas e
inclusivas, coerentes com uma visão de aprendizagem como processo constituído na interação
entre os elementos sociais que fazem parte do ato educativo: aluno-professor-conhecimento.
Explorando agora, sob o olhar desta pesquisa, essas diferentes teorias naquilo que elas
tem em comum, percebeu-se assim que se deve elencar três funcionalidades essenciais na
prática avaliativa durante a ação docente:
Mediação: um princípio que toma por base a avaliação como uma atividade que faz
com que o aluno seja instigado a desenvolver seu processo cognitivo, tendo em vista
que a maioria das escolas, juntamente com seus professores, considera a avaliação
ainda como um sistema “classificatório de ensino de qualidade” (HOFFMANN, 2003, p.12).
Formação: componente indispensável e indissociável da prática pedagógica. Suas
múltiplas funções se consubstanciam na orientação e regulação do processo de ensinoaprendizagem no âmbito da aprendizagem significativa. Para o aluno, essa
funcionalidade consiste em fornecer subsídios para que ele compreenda o seu próprio
22
processo de aprendizagem e o funcionamento de suas capacidades cognitivas
subjacentes na resolução de problemas. Dentro desse escopo, o foco se desloca do
nível do desempenho para o da competência, aproximando-se aqui ao que Wachowics
(2005) explica sobre a importância de não valorar o desempenho do aluno, mas sim de
potencializar a qualidade de sua aprendizagem, adquirindo e apropriando-se, assim, de
novos conhecimentos, capacidades e competências. Para o professor, a avaliação
formativa orienta e regula a prática pedagógica, uma vez que se propõe analisar e
identificar a adequação de ensino com o verdadeiro aprendizado dos alunos. É um
processo bidirecional entre professor e aluno para aprimorar, regular e orientar a
aprendizagem. É a função de dar um “feedback” na aprendizagem. É um processo que
ajuda o aluno a reconhecer os seus processos de aprendizagem.
Emancipação: Nos tempos em que vivemos, nos quais a avaliação vem assumindo
uma perspectiva cada vez mais classificatória e hierarquizadora dos conhecimentos e
das pessoas, é fundamental estarmos atentos para outras perspectivas de avaliação,
progressistas, libertadoras, justas e emancipatórias. Sem esquecer que precisamos
reivindicar, em cada uma das escolas, condições de trabalho que garantam as
possibilidades de realização de outras formas de avaliar, comprometidas com os
processos de emancipação dos sujeitos sociais. A emancipação, especificamente neste
contexto, seria então aquele fenômeno capaz de possibilitar a autonomia dos
indivíduos em meio ao processo de desenvolvimento intelectual e social.
3.2 Histórico evolutivo das concepções de avaliação
Direcionando os estudos para uma necessária explanação da trajetória histórica que
explica os avanços da legislação brasileira no campo da educação no período de 1950 a 1996,
as concepções a eles adjacentes e como desembocaram nas atuais teorias da avaliação da
aprendizagem, consubstanciou-se numa análise feita por Giusti & Lopes (2007), em que foi
possível identificar uma evolução da concepção tecnicista de avaliação – baseada na
capacidade avaliada de saber fazer algo no final de uma etapa de estudos – para uma
concepção mais formativa (WACHOWICS, 2005) – saber ser, fazer, conviver durante o
processo de ensino-aprendizagem para que melhor se possa regular esse processo com vistas a
garantir a aprendizagem do aluno. Segundo os autores, esta evolução conceitual foi
proveniente, em certa medida, de uma qualificação da mão de obra ocorrida durante a época
avaliada pelos autores.
23
Em 1942 tem-se a promulgação da Lei Orgânica no Ensino Secundário advinda da
Reforma Capanema em que a avaliação era tida apenas como uma mensuração do que o aluno
aprendeu, uma medida do quanto o aluno sabe de determinado conteúdo. Essa concepção
ganhou força nos anos 30 com a adoção dos testes padronizados para medir o desempenho
dos alunos, tendo em vista os objetivos curriculares. Aqui percebe-se, segundo Giusti &
Lopes (2007), a forte definição de uma concepção classificatória, pois para aprovação não
eram considerados outros fatores além daquele momento específico da realização das provas,
o que não significava, necessariamente, apreensão dos conhecimentos mínimos necessários
previstos para determinada etapa de estudo.
Já em 1960 tem-se a Lei 4024/61 – Lei de Diretrizes e Bases para Educação Nacional,
um documento no qual a avaliação é apresentada sem um texto específico na possível
tentativa de imprimir um caráter mais descentralizador à organização do ensino. Concernente
aos Pareceres, do extinto Conselho Federal de Educação, o qual foi instituído pela lei referida
acima, no que diz respeito à avaliação, esta aparece como um procedimento para julgar o
aproveitamento do aluno mediante suas mudanças de comportamento frente a um
determinado grau estabelecido pelo professor (evolução em relação à legislação anterior).
Outro avanço foi a consideração de variáveis que pudessem interferir no processo de
avaliação, havendo sugestões para a utilização de outros instrumentos avaliativos, pois
começa a intensificar a preocupação com a aprendizagem e com a possibilidade de melhor
verificar seu rendimento. Desta forma, pode-se considerar também como um avanço, ainda de
acordo com Giusti & Lopes (2007), o fato de que o conceito de medida estava começando a
englobar o ato de avaliar para além de mensuração do desempenho escolar do aluno,
classificando-o em conceitos numéricos, mas sim dentro de um padrão de expectativa em que
o professor deveria considerar também as mudanças de comportamento do aluno ocorridas no
ano.
Ainda segundo os autores, surge, na sequência, a Lei de Diretrizes e Bases 5692, de
1971, trazendo a profissionalização do Ensino Médio e considerações ainda genéricas sobre
avaliação. Em seguida, o Parecer 360/74 do Conselho Federal de Educação que requer uma
nova configuração do sistema escolar, em regime não seriado, refletindo em alterações tanto
sobre a formação inicial de professores quanto a continuada. Consequentemente, Giusti &
Lopes (2007) explicam que há uma diminuição da importância da prova como único
instrumento para verificação do rendimento do aluno.
Progressivamente, a avaliação é concebida pela primeira vez, em 1989, dentre a
legislação que rege a educação brasileira, ainda como um sistema contínuo de verificação do
24
desempenho escolar, mas que prevê a mudança do comportamento do aluno no decorrer do
processo de ensino-aprendizagem.
Analisando esses avanços, ao menos nas novas formas de enxergar a avaliação e nas
novas concepções que vão se instaurando, como as novas abordagens que começavam a
superar a ideia de medida ou mera técnica de verificação de resultados, no cumprimento de
regimentos burocráticos, a noção de avaliação vai, paulatinamente, tomando novos rumos e
assumindo diferentes vertentes na constituição de um conceito, amplo, dinâmico, complexo e
atrelado ao tempo histórico.
Ela encarna, segundo os autores (GIUSTI & LOPES, 2007), os diferentes papeis
presentes num ciclo pedagógico: o de diagnóstico (contínuo nas trocas entre o avaliador e o
avaliado); o dialético (que possibilita uma transformação no plano pessoal e social do aluno),
o formativo (perspectiva mais descritiva e prescritiva de construção do conhecimento e
mecanismos de aprendizagem do aluno, no sentido de trazer uma descrição analítica do
percurso traçado por cada aluno no processo de ensino-aprendizagem, esboçando perfis e
ritmos de aprendizagem e possibilitando os encaminhamentos de futuras intervenções na
continuidade do ato educativo) e, por fim, emancipatório (acentuando seus aspectos políticos
e sociais).
Pode-se então dizer que, de acordo com os autores, já em 2001 cria-se uma
perspectiva do ensino por competência (atrelado ao perfil de conclusão do curso), em que a
avaliação passa a ser finalmente prevista como procedimento integrador e estimulador que
garanta a aprendizagem com autonomia.
Se passou-se portanto a ter, a partir de então, de acordo com o que argumenta Giusti &
Lopes (2007), uma proposta de avaliação qualitativa, deve-se ter em mente que o
aproveitamento seja verificado no processo e já possibilite as intervenções necessárias para a
recuperação do aluno, não ficando apenas para o final. É o que se denomina de avaliação
processual.
Ludke & Sordi (2009) contribuem, em outra vertente, para esse pensamento da
evolução das concepções avaliativas com o passar do tempo, esclarecendo sobretudo algumas
relações estabelecidas entre as dimensões da avaliação, as quais também são importantes para
se entender melhor como se enquadra o foco deste trabalho que é a avaliação da
aprendizagem na escola e qual o seu papel nessa instituição.
Compreendendo a avaliação institucional como mediadora entre a avaliação da
aprendizagem e a de sistemas, as autoras apontam, logo de início, que desde o momento que
se passou, então, a assumir esta concepção (cuja mudança é instaurada ao longo da história)
25
nas práticas pedagógicas, melhorou-se a participação dos professores nos projetos da escola e
a aprendizagem dos alunos. Daí se percebe, desde já, a importância de que a concatenação
entre essas dimensões esteja muito bem articulada, o que prevê uma sintonia muito grande
entre a equipe gestora e o corpo docente no seu trabalho com os alunos.
Sabe-se que, de acordo com esta discussão, a avaliação da aprendizagem apresenta
uma alta força indutora nas formas de agir dos atores escolares e, talvez por este motivo,
pode-se destacar, no trabalho feito pelos autores citados, que os professores identificam-se,
aproximam-se pela ideia de que a avaliação é um tema complexo. O problema, porém, é que
ao se deparar com tal complexidade, acabam afastando-se das propostas de solução para o
problema, eximindo-se de uma responsabilidade que também é deles e cumprindo as ações
relacionadas à avaliação como meros aspectos formais ou por mera burocracia, sem trazer
nenhuma transformação ao ato educativo que emprega, ou seja, reproduz a voz de um
discurso carregado de tradições e perpetua a cadeia do insucesso escolar, este composto
também por diversos outros fatores, mas que se intensifica na passividade da ação docente.
Dessa forma, ainda dentro da lógica de uma concepção pragmática e utilitarista da
avaliação (centrada muito mais na nota do que no quanto esta possa ser expressão da
apropriação do conhecimento – avaliação descolada do processo de ensino-aprendizagem),
Ludke & Sordi (2009) nos levam a crer que os estudantes passam a se acostumar a juízos de
valor externos que os expropria da participação de um processo que deveria desenvolver
ações de co-responsabilidade, isto é, alguém atribui valor sobre o trabalho do outro sem o
outro ter a oportunidade de se manifestar sobre o processo vivido e suas eventuais
idiossincrasias, esvaziando da prática avaliativa o seu sentido formativo.
Atrelando esta discussão ao objeto de seu respectivo projeto que é a avaliação da
aprendizagem, faz-se necessário entender que esta mentalidade se incorpora de tal forma que
começa a se naturalizar a ideia de que o trabalho pedagógico pertence apenas ao professor,
não cabendo nenhum tipo de controle social sobre como se desenrola, mesmo quando este
ocorre de forma disjuntiva com o projeto da escola.
A arbitrariedade do professor, por sua vez, sem controle externo e sem interferências
induz a uma não profissionalidade, sobrecarregada de subjetividades de um único responsável
por um todo que é o ato educativo, ou mesmo o processo de ensino-aprendizagem que é
complexo e envolve outros diversos atores sociais, banalizando assim a importância de um
trabalho muito sério que é o do educador e prejudicando o comprometimento com a formação
de inúmeros estudantes que depende previamente dessa conscientização. A autonomia do
26
docente não pode ser confundida, então, com a autonomização, como bem nos alerta Ludke &
Sordi (2009).
Outro tema referente às dimensões da avaliação é o fato de que,
[...] ao deixarem de ser apenas avaliadores e começarem a ser também
objetos de avaliação (externa e de sistemas), os profissionais da escola são
desafiados a desenvolver ações mais maduras com a avaliação e com os
avaliadores de seu trabalho, sob pena de não acrescentarem qualidade política
ao processo (LUDKE & SORDI, 2009, p. 317).
Os professores e gestores reagem aos processos de avaliação de seu trabalho e
assemelham-se aos estudantes diante da emissão de suas notas, confirmando a força da cultura
avaliativa, assimilada como currículo oculto da escola. Contudo, o que há infelizmente é uma
indiferença aos dados trazidos pela avaliação, à verdadeira expressão do que ela representa
em termos de possibilidades de revisão e aprimoramento do trabalho docente e uma
supervalorização às boas notas, o que explica que, intrasubjetivamente, os professores
internalizam essa prática tradicional de avaliação (muitas vezes pela educação que também
receberam) e refletem essa ideia em sala de aula, mesmo que nos moldes e padrões da escola
moderna, agora com seus alunos.
O fato é que o resultado de avaliações externas tem inspirado políticas públicas e
definido prioridades no processo de alocação de verbas, via ranqueamento das escolas,
professores e alunos ainda de forma descontextualizada, confirmando o princípio
meritocrático de recompensas e punições (nem sempre explícito) adotado pelas escolas e que
desemboca na conclusão das atuais teorias da avaliação de que a avaliação da aprendizagem é
dissociada da escola pelos professores e ocorre independentemente do entorno social.
Diante deste dilema, aponta-se, conjuntamente aos autores estudados, a formação
inicial de professores com qualidade (uma vez que geralmente é a única) como uma das
formas desse profissional superar esta trama nada inocente que ocorre nas escolas e que vem
se naturalizando historicamente.
Se a avaliação sempre escondeu, portanto, mesmo com todas as transformações por
que passou nos documentos legislativos, as quais refletiam as concepções que vigoravam em
cada período histórico, um campo de interesses fortemente antagônicos que buscam legitimar
uma determinada concepção de qualidade que nem sempre é aquela detentora de pertinência
social em relação às políticas da avaliação externa, há mais uma razão para que os professores
ampliem sua visão de avaliação para além da aprendizagem de seus alunos e assumam uma
27
visão de totalidade do fenômeno que justifica a compreensão dessas dimensões da avaliação
sempre em relação.
3.3 A avaliação em recortes de análise: instrumentos e dimensões encontrados
Projetando agora o discorrer desta discussão especificamente para o campo das
concepções de avaliação, justamente o foco deste estudo, encontrou-se nos artigos da
Iniciação Científica, como em Boruchovitch & Souza (2010), o apontamento do mapa
conceitual como uma importante ferramenta para compreender a dimensão formativa que a
avaliação deve conter, uma vez que ele é favorável à regulação do ensino e à auto-regulação
da aprendizagem, além de ser pertinente como estratégia de ensino/aprendizagem,
assegurando que o aluno aprenda e se desenvolva.
Essa constatação das autoras é confirmada quando refletimos sobre a principal função
da avaliação formativa como uma remedição de discrepâncias constatadas entre o estado real
e o desejado do desempenho apresentado pelos alunos frente às expectativas do educador para
uma formação plena, integral e de qualidade para seus estudantes, favorecendo o
acompanhamento e o aperfeiçoamento do processo de ensino-aprendizagem por propiciar o
mapeamento das aprendizagens efetivadas e daquelas ainda em curso e regulando o
funcionamento cognitivo do aluno.
As autoras defendem que se valendo do mapa conceitual como instrumento
pedagógico em sala de aula, ter-se-á um ensino centrado mais no aluno e nas suas percepções
sobre o processo de construção do conhecimento protagonizado por ele, dando vazão a uma
aprendizagem significativa e inter-relacionada, uma vez que leva em consideração os
conhecimentos prévios para ligá-los aos novos no cotidiano6.
Corroborando a ideia de que a avaliação formativa, que é fortalecida com a utilização
dos mapas conceituais, potencializa as aprendizagens do professor e do aluno, Méndez (2002,
p.14) explica que:
O professor aprende para conhecer e melhorar a prática docente em sua
complexidade [...]. O aluno aprende sobre e a partir da própria avaliação e da
correção, da informação contrastada que o professor oferece-lhe, que sempre
será crítica e argumentada, nunca desqualificadora, nem punitiva.
6
O conceito de aprendizagem significativa, segundo Boruchovitch & Souza (2010), pressupõe alterações na
estrutura cognitiva de quem aprende, mudando os conceitos preexistentes e formando novas ligações entre os
conceitos, que passam a não ser mais facilmente esquecidos.
28
Analisando o posicionamento do autor, percebe-se que se trata de uma proposta, na
prática avaliativa, de apreciação qualitativa das informações coletadas no intuito de desvelar
as razões subjacentes aos erros constatados para que se possa enunciar as dificuldades de
aprendizagem a serem enfrentadas pelos alunos (função retroativa da avaliação).
Boruchovitch & Souza esclarecem que, para isso, é preciso, segundo Perrenoud (2000; 2001
apud BORUCHOVITCH; SOUZA, 2010), um ensino pautado em variabilidade didática e
uma aprendizagem vinculada à resolução de tarefas complexas, investindo na utilização de
instrumentos pedagógicos diversos, como o mapa conceitual.
Os mapas conceituais permitem, desta forma, a compreensão da situação do aluno ao
gerarem a identificação e a análise dos erros, juntamente com a promoção de um diagnóstico
mais apurado do funcionamento cognitivo envolvido. Eles contribuem, portanto, para a
aquisição, o armazenamento e a utilização do conhecimento. Partindo-se de uma nova
interpretação dada ao erro através do mapa conceitual como ferramenta avaliativa, ele
configura-se, então, como indicador diagnóstico para orientar ações destinadas à promoção de
superações e avanços.
Concebidos como estratégia de organização da aprendizagem na abordagem das
autoras, eles favorecem, agora em relação ao educando, uma avaliação contínua do que se está
realizando e, em consequência, aprender apenas o que se enuncia como possibilidade.
Pinto & Silva (2006) aparecem nesta discussão para confirmar, em seu artigo, que a
dimensão formativa deve ser reforçada, pois é um fator fundamental na efetivação da
aprendizagem necessária ao sucesso da escolarização dos alunos social e culturalmente
marginalizados. Entendendo a exclusão como categoria do processo pedagógico desenvolvido
na escola, como uma dimensão da experiência escolar dos alunos, as autoras tecem uma
interessante crítica ao que ainda se vem observando nas escolas brasileiras.
A escola, ao mesmo tempo em que afirma a igualdade de todos, a igualdade entre os
indivíduos, afirma também a desigualdade de seus desempenhos, mantendo em seus
processos pedagógicos inúmeros mecanismos internos de exclusão, mantém princípios
meritocráticos. Além disso, as políticas públicas brasileiras não tem garantido o sucesso
escolar dos alunos porque não afetam estruturalmente a escola, consolidando a política da não
retenção: não atingem a principal finalidade da avaliação que é uma aprendizagem efetiva dos
conhecimentos básicos e acabam produzindo obstáculos para o aluno continuar os estudos e
ingressar no mercado de trabalho.
Ao final do Ensino Médio, a escola outorga um certificado esvaziado de valor social
que atesta mais a incompetência do que a competência tanto para o estudo quanto para o
29
trabalho. Perpetua-se, portanto, a contabilização dos erros e dos acertos produzidos pelos
alunos mesmo com as políticas públicas de redemocratização.
A escola cultua a curva da “normalidade”7, distribuindo os alunos na famosa curva de
Gauss em que os bons aparecem no topo, “médios” e “regulares” no meio e os “ruins” na base, propagando uma pedagogia dos resultados que toma a nota como um alerta para o aluno
do que pode acontecer com ele.
Concernente aos instrumentos avaliativos, as autoras também reiteram, mencionando
Focault (1991), o papel certificativo, classificatório e punitivo dos exames escolares. O
exame, nesta abordagem, é um mecanismo regulador da distribuição desigual do
conhecimento pela instituição escolar.
Refletindo mais detidamente sobre esses dados trazidos pelas autoras, pode-se afirmar
que, na trajetória da utilização desses instrumentos, passou-se do exame aos testes e agora
predomina a avaliação múltipla em seus usos que muitas vezes podem ser implícitos.
Tendo em vista que todos esses discursos teóricos atentam para o controle empregado
pelas economias dominantes na cultura civilizatória que nos aprisiona e que nos resvala em
nossas ações docentes, faz-se necessário, segundo o entendimento desta pesquisa,
ressignificar a prática do profissional da educação como religação dos elos perdidos entre o
compromisso docente e a formação do aluno, ou seja, agir e trabalhar para além ou sem
responder apenas aos regimentos burocráticos, mas fazendo-se cumprir uma funcionalidade
que supera qualquer formalidade do ofício.
Sabe-se que, valendo-se da avaliação formativa, como aqui já foi apontado, ter-se-á
um olhar voltado para os processos utilizados pelos alunos na resolução de suas situaçõesproblema. É o conhecimento situado que estará em processo de julgamento e não o aluno. Os
erros, por sua vez, serão considerados como momentos na aprendizagem e não como falhas
repreensíveis ou manifestações patológicas (dislexia ou discalculia, por exemplo).
A avaliação formativa faz-se, dessa forma, uma avaliação qualitativa, descritiva e
indutiva, impossível de ser reduzida a escala numérica (nota).
A avaliação da aprendizagem deve ser comprometida também com o conhecimento
informal, para além dos objetivos da escola, logo, sua dimensão formativa torna-se ainda mais
complexa, pois envolve subjetividades.
7
Pinto & Silva (2006) citam Barriga (1999) para explicar que este conceito está relacionado a uma ideia de
“medidas exatas” que justifica o acesso à escola pelas condições individuais – “violência epistemológica” que diz o lugar social que cada um deve ocupar.
30
Segundo Hadji (2001), a avaliação só será formativa se for informativa e só é
informativa se responder a perguntas. Partindo-se da perspectiva do autor, deve-se passar de
uma pedagogia da resposta que homogeneíza, classifica, hierarquiza e exclui para uma
pedagogia do problema, em que o espaço da avaliação é mais complexo, mas na qual o que
interessa ao professor são as operações mentais dos alunos, as deduções e induções que
realizam e a dialetização que as relaciona.
O grande desafio do professor é, portanto, traduzir os conteúdos de aprendizagem em
procedimentos de aprendizagem. É preciso conhecer a natureza da atividade intelectual a ser
desenvolvida e buscar as condições que garantam seu êxito.
Esquematizando este último pensamento sobre a avaliação formativa, tem-se:
Avaliação Formativa
Behaviorista
Programar o ensino
para que não haja
Cognitivista
Adaptar o ensino às
dificuldades do aluno
erros
Figura 1: esquematização do conceito de avaliação formativa
O esquema acima permite afirmar que a perspectiva behaviorista deturpa a noção
formativa de avaliação ao focalizar a organização do trabalho docente para que apenas as
expectativas do professor sejam correspondidas, ou seja, verifica apenas se o ato de ensinar
obteve sucesso de acordo com o que foi previsto. Já a visão cognitivista procura elaborar o
ensino de modo a fazê-lo ir ao encontro das necessidades dos educandos, trabalhando nas
competências e capacidades que precisam ser desenvolvidas e nas dificuldades que precisam
ser superadas.
Vale ainda discorrer um pouco mais a respeito da subjetividade no ato de avaliar. Neto
& Aquino (2009) tratam sobre o tema encontrando um ponto em comum com os outros textos
pela constatação de que esta subjetividade é ainda mal administrada, fazendo com que a
avaliação se torne pontual, classificatória, seletiva e autoritária.
31
Seus apontamentos contidos no artigo “A Avaliação da aprendizagem como um ato amoroso: o que o professor pratica?” baseiam-se em Luckesi (2005) ao elucidarem a função
ontológica da avaliação que é diagnosticar a situação de aprendizagem, tendo em vista
subsidiar a tomada de decisão para a melhoria do desempenho do educando. Há a
necessidade, para isso, de que a avaliação seja (mais uma vez) processual, dinâmica, inclusiva
e democrática. Só assim ela poderá acolher a realidade como ela é, seja satisfatória ou não,
uma vez que a disposição para acolher é o ponto de partida para a intervenção pedagógica do
educador.
Sendo assim, ainda segundo o mesmo artigo, a avaliação também pode ser interpretada
como um ato amoroso (já que pressupõe o acolhimento do aluno), um estado psicológico
oposto ao de exclusão, cuja uma das formas, por sua vez, é a reprovação, usada como um álibi
para explicar o fracasso escolar.
Visando superar estes fenômenos que transformam o funcionamento do sistema
escolar num dilema, as autoras encontram em Furlan (apud NETO; AQUINO, 2009) a mesma
necessidade do professor aproximar o que os alunos já sabem àquilo de que necessitam saber,
pensando nas características do aluno ao planejar e executar suas ações. Essa proposta
pressupõe a dimensão mediadora da avaliação, aquela realizada no interstício entre uma etapa
possível de produção pelo aluno e de um saber enriquecido, o que leva a pensar que, sendo
empregada desta forma, ela não terá a característica de julgamento. Os julgamentos
aparecerão, todavia, para dar curso à vida (à ação) e não para excluí-la, como se observa que é
o que tem acontecido segundo as pesquisas e realidades consultadas.
3.4 Avaliação na Pedagogia Waldorf
3.4.1 Um pouco sobre a Antroposofia
Faz-se necessário explicitar, inicialmente, que o âmbito deste trabalho não ultrapassa
uma explicação dos princípios fundamentais da filosofia antroposófica que viabilize a
compreensão da teoria de avaliação da Pedagogia Waldorf segundo Rudoph Lanz (1986),
autor adotado para esta seção do referencial bibliográfico.
Lanz (1986) apresenta uma abordagem bastante contextualizadora em seu livro “A Pedagogia Waldorf: caminho para um ensino mais humano” sobre a linha de pensamento que
originou os primeiros estudos dos defensores da antroposofia, justificando-os pela
necessidade da existência uma visão de ser humano que ultrapassasse àquela estabelecida
32
pelas leis vigentes na Química, na Física, na Biologia e na psicologia animal e o enfocasse,
desta forma, “sob um ângulo mais amplo, embora seu raciocínio e seus métodos não deixem de ter o mesmo rigor científico” (LANZ, 1986, p.13).
Admitindo que a entidade humana seja constituída por “algo” a mais que as substâncias do mundo mineral, por uma força vital que permeia os seres orgânicos, o autor
nomeia este elemento como o principal diferenciador entre seres vivos e não-vivos,
destacando o homem com o único ser pensante. Amparando-se a este entendimento, pode-se
supor, resumindo-se o percurso reflexivo percorrido pelo autor para chegar as suas conclusões
aplicadas no campo da educação e também para aproximá-lo à temática deste trabalho, que a
figura humana, especialmente dotada de razão e emoção, torna-se digna, neste contexto, de
uma formação que acompanhe o seu desenvolvimento integral, fomentando globalmente este
conjunto de forças vitais do qual é constituída.
Esta formação, antecipadamente citada a toda descrição do autor sobre os fundamentos
antroposóficos, é associada, em sua paráfrase a Rudolph Steiner, a uma ciência espiritual que
condiciona ao homem o domínio destes sentidos superiores que possibilitam a interpretação
de fenômenos elevados, daí a dificuldade pressuposta em formar e educar este ser tão
complexo, imbuído de subjetividade.
No que diz respeito à avaliação, neste contexto, é maior ainda o desafio que representa
para esta teoria filosófica: avaliar de maneira justa o desempenho de indivíduos tão diferentes
na sua essência não-física, pois os alunos são muito mais do que aquilo que apresentam no
momento da avaliação, são vidas das quais a escola faz parte e toda esta integralidade deve ser
levada em conta pelo professor que busca um parecer panorâmico de quem são as pessoas que
ensina e não apenas a medição de capacidades.
O caminho de uma educação que cresce junto com a criança, defendido por Lanz
(1986), é identificável no trecho em que diz “[...] as faculdades mentais, a circunspeccção e o domínio de si são plenamente desenvolvidos, atingindo um ponto culminante na serenidade e
na sabedoria contemplativa da velhice” (p. 17), justificando a lógica de um ensino próprio a cada fase da vida, que prepara a infância para o mundo adulto 8 sem antecipá-lo ou
comprometer a sua essência, mas imbuindo o seu currículo de noções e responsabilidades que
8
Faz-se necessário explicar que, neste aspecto, não se está falando aqui de um ensino propedêutico, introdutório,
que prepara ou habilita a criança para um ensino mais completo, escolarizando a Educação Infantil. Trata-se sim
de uma concepção de educação globalizante, que forma a criança para a vida, instrumentalizando-a para que
possa enfrentar aquilo que a espera no mundo, tornando-a um ser mais independente e ávido por descobertas,
potencializando assim a sua aprendizagem cotidiana.
33
a acompanharão ao longo de toda a sua vida e serão plenamente aperfeiçoadas em sua etapa
final (daí a necessidade de serem cultivadas desde o início) e por isso ele deve ser integral
para abarcar todas as suas instâncias. Neste sentido, o autor aponta a Antroposofia como o
campo de saber que acrescentará uma descoberta de suma importância: o caminho que
permitirá ao homem despertar todas essas funcionalidades da educação pouco a pouco. Este
argumento pode ser relacionado, em outra instância, à dimensão processual da avaliação
formativa concebida por Wachowics (2005) que permite uma análise mais completa da
trajetória escolar do aluno para que o professor possa ter a credibilidade de avaliá-lo segundo
os princípios qualitativos da sua produção e não classificá-lo descontextualizadamente ao
processo social ao qual pertence.
A ciência espiritual mencionada por Lanz (1986), admitida aqui como a formação
educacional oferecida, na sua gênese, pela Pedagogia Waldorf é dominada (domínio este que
cabe à figura do professor), segundo o autor, pelos indivíduos que atingiram um certo grau de
clarividência. Remetendo-se este conceito, segundo a perspectiva deste trabalho, ao de
esclarecimento segundo Kant (2005), tem-se a associação a um estado de um homem livre da
condição de menoridade, não detendo, portanto, preguiça, covardia e falsidade e não
renunciando em pensar por si mesmo ou ainda, em outra análise, ao de Adono (2009),
referindo-se a uma dedução mais óbvia da situação de uma imaginável sociedade emancipada
ideal, liberta dos princípios da sociedade burguesa9.
Partindo-se dessa perspectiva, entende-se que a formação antroposófica visa um
alcance cada vez maior, ao longo do desenvolvimento humano, de uma conscientização, a
qual se dá as custas de suas energias vitais presentes em seu corpo, em seu intelecto, em seus
sentimentos, presentes em seu todo, uno e indivisível que é o homem, competindo à educação
o compromisso de integralizar todas essas suas capacidades, perfeitamente habilitadas,
durante a trajetória escolar, para que o estado de clarividência de Lanz (1986) e o de
esclarecimento de Kant (2005) e Adorno (2009) seja atingido.
3.4.2 Aspectos gerais da Escola Waldorf10
9
Embora se saiba que os referenciais destes autores partam de correntes teóricas distintas, o fato de convergirem
sobre uma mesma ideia de um estado ao qual o homem pode chegar ao longo de sua existência tornou viável a
consideração desta associação.
10
Escola Waldorf representa, aqui, as escolas Waldorf como um todo segundo Lanz (1986) e não uma instituição
especificamente.
34
Prioritariamente voltada para o primeiro e segundo graus11, abrangendo a faixa etária
de sete a dezoito anos, Lanz (1986) explica, logo no início do capítulo “A Escola propriamente dita” de seu livro já aqui mencionado, que o sistema Waldorf possui uma característica principal:
[...] a de ser um corpo vivo, suscetível de assumir formas e aspectos
diferentes, de acordo com as circunstâncias concretas de um determinado
meio social, de um país, de uma legislação vigente em matéria de educação,
etc (LANZ, 1986, p. 100).
Apropriando-se desta caracterização apresentada pelo autor, vale dizer, para um
entendimento geral dos princípios que regem o funcionamento da Escola Waldorf, que a
instituição, apesar de todas as suas especificidades aqui descritas, também está inserida num
sistema educacional composto por todas as unidades escolares que devem obedecer e estão
submetidas a um conjunto de normalizações imposto pela rede de ensino.
Compreendendo doze séries que são divididas em dois ciclos de quatro e oito séries
cada uma, além de um jardim de infância que engloba vários grupos, conforme estabelecido
no projeto inicial das escolas Waldorf por seu precursor, elas ainda podem apresentar,
dependendo do país cuja regulamentação julgue necessário, uma 13ª série que servia, em sua
gênese, como um ano letivo preparatório para os exames oficiais de conclusão dos seus
antigos cursos de 2º grau, o que suscita o entendimento, analisando-se o histórico trazido por
Lanz (1986), de que desde a sua origem, as escolas Waldorf nunca existiram como uma rede
regulada por modelos-padrão de funcionamento, o que acarreta, por sua vez, uma maior
flexibilidade ao setor pedagógico e, consequentemente, à aplicabilidade da avaliação.
Calcando teoricamente este pensamento, temos em Lanz (1986, p.157) que
Embora unidas pela colocação das suas metas e pela pedagogia que aplicam,
divergem entre si em aspectos relevantes da sua constituição. Sua razão de
ser é a aplicação de um método pedagógico.
Concernente, contudo, aos princípios pré-estabelecidos para todas as escolas
Waldorf, o autor traz uma interessante compilação daqueles que são inerentes à existência
dessas instituições, tornando-os válidos para ser transcritos neste momento:
11
Esta é a nomenclatura utilizada pelo autor na época da produção da referida obra para se referir ao Ensino
Fundamental e Médio, respectivamente, e que foram preservadas neste trabalho para se coadunar à época em que
as escolas Waldorf foram concebidas.
35
1) A liberdade quanto às metas de educação: deve ser possível conceber
essas metas da forma mais ampla possível. A escola Waldorf quer ser
algo mais do que as escolas tradicionais; se fosse incapacitada para
desempenhar essas funções adicionais ela não poderia existir.
2) A liberdade quanto ao método pedagógico é a pedra de toque da sua
existência, pois é principalmente pelo seu método pedagógico que ela se
distingue das outras escolas. Esse método é a sua razão de ser.
3) Embora o currículo tenha, em comparação com o método, uma
importância menor, ele constitui, não obstante, uma das características da
escola Waldorf. A liberdade quanto ao currículo não significa que
matérias exigidas pelos programas oficiais de ensino não sejam aí
ensinadas; significa, ao contrário, que matérias adicionais possam ser
incluídas no seu programa, e sobretudo que cabe à escola determinar a
época em que as matérias devam ser ensinadas (LANZ, 1986, p. 157).
Além disso, faz-se necessário dizer que a Escola Waldorf respeita a legislação sobre a
laicidade determinada sobre as instituições de ensino, uma vez que Lanz (1986) também
elucida sobre o fato de, apesar dela ser engajada à Antroposofia quanto ao método de ensino
que aplica, não ensina nem propaga esta doutrina filosófica que não é uma religião, “deixando os alunos e os pais inteiramente livres quanto à escolha e prática – dentro da escola! – de suas
respectivas religiões” (p.158).
O autor ainda esclarece, logo em sequência a este dado, que a pedagogia criada por
Rudolph Steiner não obedece ao princípio da meritocracia (SOUZA, 2010) no tratamento aos
seus alunos, oferecendo uma educação completa como um direito inalienável a todo cidadão,
independentemente de classe social, religião e raça. Esta premissa está intimamente ligada ao
modo de conceber a avaliação, uma vez que ela imputa à sala de aula, ao menos teoricamente,
uma prática pedagógica que busque romper com a realidade segregadora da escola, pois as
crianças “não podem, de forma alguma, ser eliminadas com base num princípio de seleção ou elitismo; injusto e anti-social no mais alto grau” (LANZ, 1986, p.101).
Este preceito advogado pela Pedagogia Waldorf legitima-se por nela acreditar-se que é
a escola quem deve estar a serviço da criança e não o contrário, provendo-a de uma formação
que propõe, sobretudo, o pleno desenvolvimento de sua personalidade humana e não apenas o
preparo profissional, uma vez que, após a oferta desse ensino geral, o sistema também prevê,
nos anos finais, uma vertente de especialização do ensino, seja para o mercado de trabalho,
seja para o ingresso no Ensino Superior de acordo com os dons e capacidades de cada aluno.
A justificativa para toda esta argumentação vem logo em seguida, quando o autor
esclarece que essa possibilidade de uma educação igual para todos permite o “[...] acesso a
todos os valores culturais humanos”, sendo “[...] a melhor garantia contra os sentimentos de
angústia, de frustração e de ódio que estão na origem das tensões sociais” (LANZ, 1986,
p.101).
36
O currículo é outra temática abordada nos aspectos gerais das escolas Waldorf,
caracterizando-se e ganhando destaque frente aos currículos oficiais ao ser considerado mais
amplo e rico pelo fato de que:
A escolha das matérias, o quando e a metodologia do seu ensino dependem,
de um lado, das sugestões feitas por Steiner e das experiências acumuladas
durante o tempo transcorrido desde então, e de outro, das exigências
curriculares feitas pela legislação dos respectivos países [...] Todas as
matérias são obrigatórias para todos os alunos – podendo, às vezes, haver
opções entre as várias atividades artísticas e entre línguas estrangeiras. As
escolas Waldorf não são consideradas como instituições que distribuem
chances de carreira profissional (LANZ, 1986. p. 101; 102).
Pode-se observar na citação que o autor exime a Escola Waldorf da falsa idéia que
pode haver de que ela tenha caráter profissionalizante só porque assume essa vertente como
parte integrante de uma educação completa, sendo concernente à avaliação, neste aspecto, o
momento em que o autor acrescenta (LANZ, 1986, p. 102):
A pedagogia Waldorf recusa essa seleção (se é que o sistema atual das
provas, exames, vestibulares, etc, é realmente uma seleção eqüitativa), pois
considera que o ensino primário e médio deve proporcionar a mesma
formação humana e as mesmas chances a todos!
A responsabilidade delegada ao professor é automaticamente associada a este perfil
avaliativo traçado pelo autor, em que se presume o direito de inovar em seus métodos
pedagógicos sob todos os apectos, aludindo a sua autonomia docente relativa (VEIGA, 2004)
utilizada com senso de responsabilidade justamente pelo compromisso que ele assume em seu
papel de avaliador, atuando como veículo, segundo os princípios antroposóficos, da criança
rumo à plena realização de suas faculdades e enxergando-a, para tanto, como um ser em
formação que confia a ele o seu desenvolvimento humano com profundo respeito.
Lanz (1986) finaliza esta seção sobre os fundamentos gerais que regem as condições
ideais para o funcionamento de uma escola Waldorf na tentativa, então, de justificar o sucesso
desta perspectiva emancipatória, formativa e não excludente de avaliação:
O fato de o movimento Waldorf existir,vivo e ativo, e de estar em plena
expansão após sessenta anos de existência, demonstra sua atualidade e seu
vigor, em compensação com muitos sistemas “novos”, dos quais se faz muito alarde e que morrem de inanição após uma curta trajetória de voga artificial
(LANZ, 1986, p.104).
3.4.3 Concepção de avaliação na Pedagogia Waldorf
37
Tratando a Pedagogia Waldorf como “um sistema pedagógico que visa a formação, e
não o fichamento cadastral dos jovens” (LANZ, 1986, p.91), o autor acredita que a sua avaliação deva superar aquela das escolas que classifica como tradicionais por atribuir maior
importância à perspectiva quantitativa da nota, transformando a essência da prática avaliativa
numa formalidade de verificar o desempenho dos alunos por resultados obtidos em suas
provas e anulando o potencial problematizador (MONTEIRO, 2004) da avaliação sob o
desenvolvimento cognitivo e social do educando. Desta forma, determina que o real objeto da
avaliação deva ser a personalidade do aluno, caracterizando “suas várias facetas em vez de medir o seu desempenho. Se julga, fá-lo comparando-o não com modelos abstratos, mas com
a potencialidade do aluno” (LANZ ,1986, p. 91).
Esta necessidade que o autor confere à avaliação da Pedagogia Waldorf de estar
imbuída de uma caracterização qualitativa exime a escola do compromisso de expressá-la em
números ou notas, “realçando o que há de positivo e criticando o negativo só em relação ao
que o aluno seria capaz de produzir. Nunca um aluno é friamente arrasado” (LANZ, 1986, p. 91).
A responsabilidade institucional exigida pelas autoridades do ensino, requer, contudo,
a realização de uma avaliação quantificada. A solução deste paradoxo é encontrada, nas
escolas Waldorf, por documento produzido em sigilo que é disponibilizado aos pais somente
ao fim da trajetória escolar do educando para que isto não comprometa o bom andamento da
sua carreira educativa, ou seja, trata-se de algo que não é direcionado ao aluno, o qual, por sua
vez, tem acesso a uma avaliação que é construída junto com ele e que serve para balizar as
suas habilidades e competências mediante as suas conquistas e dificuldades ao longo do seu
processo de escolarização.
O autor encerra a discussão sobre esta temática explicando a importância, para as
escolas Waldorf, de evitar o fenômeno da repetência (SOUZA, 2010) em suas instituições por
considerar a sua ineficácia como consolidação formativa de um ser em desenvolvimento, sem
promover, ao mesmo tempo, uma progressão automática pelas séries escolares:
Já foi dito que a repetência é evitada devido as suas conseqüências
desastrosas. Executam-se apenas os casos em que há consenso entre todos os
professores que lidam com o aluno, entre o médico escolar e os pais, de que o
aluno está retardado em todo o seu desenvolvimento (intelectual, psíquico e
físico), mas sem constituir um caso patológico grave. É só nesses casos que
se decide rebaixar um aluno de uma classe. Todas as escolas conhecem
inúmeros casos de alunos que simplesmente despertaram em determinadas
disciplinas ou atividades mais tarde do que os seus colegas, recuperando
facilmente o que lhes faltava, numa época posterior. Impondo a tais alunos a
repetência ou outra medida seletiva, eles seriam não somente traumatizados,
38
mas ainda excluídos, para sempre, do ensino que corresponde a sua idade
(LANZ, 1986, p. 92).
39
4 PRÁTICAS AVALIATIVAS EM SALA DE AULA SOB O OLHAR DO SUJEITO DE
PESQUISA
A análise consubstancia-se propriamente a partir de entrevista semi-estruturada
realizada com sujeito de pesquisa do departamento pedagógico de uma Escola Waldorf de São
Paulo (EW), em que muitas vezes será necessário reproduzir fielmente essas falas no corpo do
trabalho, na intenção de propiciar uma compreensão coerente à discussão que se realizará
simultaneamente à apresentação dos dados que comprovam os argumentos conclusivos.
As categorias de análise foram definidas a partir das respostas estudadas e dos dados
de avaliação extraídos que serviram para subsidiar a discussão sistematizada desses dados e a
compreensão dos conceitos abordados. São elas: concepção de avaliação; avaliação no
âmbito da formação de professores; aplicabilidade dos resultados obtidos pela avaliação/
papel e funcionalidade da avaliação; instrumentos avaliativos.
Antes de proceder ao debate sobre as categorias de análise investigadas e
estabelecidas para esta pesquisa, a educadora contextualizou a conversa falando um pouco
sobre o perfil predominante do alunado atendido pela escola, contando, inclusive, sobre o
porquê acredita que as famílias procuram uma escola Waldorf para matricular seus filhos:
Então, são diversos públicos. Você tem uma vez um público que conhece a
Pedagogia Waldorf, conhece a antroposofia, então um público simpatizante,
talvez até ex-alunos, nós temos muitos ex-alunos já que procuram a
Pedagogia Waldorf, isso é um grupo. Mas você tem um outro grupo grande,
um crescente grupo que são as pessoas que estão insatisfeitas com as escolas
ditas tradicionais [...] Então, as pessoas insatisfeitas com essa metodologia,
elas procuram algo diferente que possa desenvolver um ser humano integral,
o ser humano como um todo e não apenas essa qualidade que é um dia
resolver satisfatoriamente uma prova de aptidão de vestibular [...] Tem
também mais um grupo que são as crianças que não se dão bem nas outras
escolas (ENTREVISTADA EW, 2014, p.1).
Ainda nesse âmbito do público-alvo de uma escola Waldorf, tem-se a contribuição
de Lanz (1986, p.105) que indiretamente dialoga com o relato da entrevistada,
complementando sua explicação:
Ao escolher uma escola Waldorf, os pais já deveriam saber que não chegou,
para eles, a hora de descansar e de deixar à escola todo o fardo (e toda a
responsabilidade...) da formação dos seus filhos. A escola costuma fazer um
grande esforço para cultivar o contato com os pais, quando estes ou os
professores considerarem últil, assim como reuniões periódicas de todos os
pais de uma classe com todos os professores da mesma.
40
Remetendo-se propriamente às categorias de análise, é interessante esclarecer,
inicialmente, que a importância do tema deste trabalho, a avaliação da aprendizagem,
evidenciou-se inúmeras vezes na fala da entrevistada pela constância com a qual é tratada na
EW. Numa observação comum, foram facilmente identificados diversos momentos em que a
avaliação é discutida pelos professores fora da sala de aula, em reuniões oficiais ou não,
destacando o aspecto da concepção de avaliação, a primeira categoria de análise averiguada.
Esta categoria representa o embasamento teórico da dimensão prática do exercício docente (o
tipo de avaliação empregado em sala de aula, o qual pode sofrer distorções do modelo
idelizado pela corrente educacional adotada que, neste caso, é a Pedagogia Waldorf) para
momentos focalizados, desatrelados do contexto, ou para aqueles momentos em que a
avaliação deva aparecer.
Segundo a análise da entrevistada, a avaliação deve aparecer sempre e por isso
considera que as discussões entre o corpo docente e a equipe gestora sejam tão profícuas neste
sentido de entender como os princípios das teorias pedagógicas podem ser absorvidos e
aplicados no cotidiano da sala de aula. Este dado revela que a avaliação ocupa um espaço
significativo nas atribuições dos professores, justamente por demonstrarem esta preocupação
com os resultados que ela apresenta, independentemente de ser classificatória ou formativa,
tradicionalou não (ANDRADE, 2001), mesmo que não seja criteriosa oficialmente e muitas
vezes não cobrada qualitativamente na prática dos alunos, mas apenas exigida pela
formalidade, esse dado revela o papel essencial da avaliação no processo de ensinoaprendizagem.
Analisando mais detidamente a fala da colaboradora desta pesquisa, pode-se dizer
que, sob sua perspectiva, a avaliação deve ser contínua, diária e incessante; não deve ser
formal (ANDRADE, 2001) sob o ponto de vista dos instrumentos comumente conhecidos
pelos alunos, ou seja, ela é mais sutil para as crianças, porém consciente pelos professores até
o 5º ano do Ensino Fundamental. Já nos anos finais do Ensino Fundamental, passa a assumir
formatos mais tradicionais mediante a demanda externa que pressiona uma formação voltada
para os vestibulares e o mundo do trabalho. Além disso, entende que avaliação representa o
acompanhamento da trajetória escolar de cada aluno mediante a dimensão processual pela
qual é concebida na escola; possui flexibilidade de acordo com cada criança e com os
diferentes ritmos de aprendizagem; é individual, não tem prazos rígidos e é variável; a
avaliação é integral, perpassando por três dimensões que compõem o ser humano: intelectual,
emocional e comportamental.
41
Todos esses aspectos que constituem a concepção avaliativa defendida pela
interlocutora são identificados na passagem que diz:
Então, a avaliação eu acho que ela é diária, contínua e incessante. Só que ela
não é uma avaliação formal, ela até chega a ser formal, mas essa avaliação
contínua é o acompanhamento desse aluno [...] Certamente eu tenho um
prazo, mas esse meu prazo varia conforme minha avaliação, ou seja, minha
avaliação é flexível também de acordo com a criança, de acordo com cada
tipo de criança, ritmo de aprendizagem, tempo de aprendizagem, tipo de
criança, capacidades da criança [...] Então ela é muito individual, não tem um
prazo e ela é variável. O que ajuda muito é ter um professor que segue a
criança (ENTREVISTADA EW, 2014, p.1).
A entrevistada ainda acrescenta, nos desdobramentos decorrentes desta mesma
questão, sobre o perfil do papel avaliador do professor neste contexto, esclarecendo que:
Então a gente tem um professor de classe que segue a criança. Então esse
professor de classe, como ele conhece muito bem a criança, ele sabe todo dia
se a criança está bem, se a criança não está bem, se conquistou alguma
coisinha a mais ou se está há um mês sem conquistar nada e aí precisa sim ser
tomada alguma atitude, se está há um semestre sem conquistas ou conquista
todo dia um grãozinho de areia, está bom, não vai chegar a meta que eu
imaginaria, mas está todo dia conquistando alguma coisa e está chegando,
partindo de uma heteronomia e está indo em direção a uma autonomia
(ENTREVISTADA EW, 2014, p. 2)
Este trecho da fala da entrevistada coaduna-se exatamente ao que é dito por Lanz
(1986) - que revela, inclusive, uma crítica ao sistema tradicional avaliativo das escolas como a
coordenadora também vem fazendo - e que também pode ser identificável com várias outras
falas ao longo da análise da entrevista, refletindo a estreita relação que a instituição visitada,
representada aqui pela fala da coordenadora, mantém com os fundamentos de Rudolph
Steiner, quando o autor afirma que na Pedagogia Waldorf:
[...] a repetência é praticamente excluída, e como o professor conhece a fundo
seus alunos, não há necessidade de provas e exames para a avaliação do seu
rendimento. Isso evita todos os traumas ligados a notas, sabatinas e exames, e
põe fim, de modo peremptório, à quantificação do aluno cujo valor costuma
ser expresso em notas e frações decimais, certamente um dos aspectos mais
degradantes nesse sistema (LANZ, 1986, p. 2).
Uma última característica desta temática da avaliação encontrada na entrevista
remete-se, ainda, à relação que pode ser estabelecida entre a filosofia antroposófica e as
práticas avaliativas adotadas pela Pedagogia Waldorf:
42
Então esses três âmbitos são sempre levados em consideração em cada aula,
em cada momento que todos passam por todos esses âmbitos do ser humano,
que ele não é só exigido intelectualmente, mas ele também é exigido no seu
fazer, na sua corporalidade e também é solicitado no seu sentir, na sua
psique, isso também sempre é abordado (ENTREVISTADA EW, 2014, p.5).
Esta passagem refere-se à visão integral da imagem do homem à luz da antroposofia
(LANZ, 1986), ressaltando-se aqui o caráter humanista e não classificatório da avaliação, uma
vez que a a razão de ser da formação que a criança recebe em qualquer escola, na qual o
processo avaliativo está inserido, não deve servir para humilhar, dividir, mas para exaltar a
existência humana e o progresso na aprendizagem. Supõe-se, portanto, que isso deva implicar
numa avaliação também integral deste homem nas escolas que adotam a Pedagogia Waldorf
como metodologia de ensino, o que é explicado pela educadora em outro momento da
entrevista:
Então todo professor que trabalha aqui, ele tem uma concepção de ser
humano, do que que é constituído o ser humano, ao que ele veio, ao que ele
se presta, para onde ele vai, ou seja, algumas perguntas assim esses
professores se colocam na sua formação e chegam então a uma visão do que
consiste esse ser humano e ao que ele se presta na Terra, qual é a nossa
utilidade. Então isso é o que nos… Então essa visão do ser humano né, isso é
importante para esse professor que está ligado a essa ideia antroposófica, mas
a partir daí a Pedagogia Waldorf trabalha com práticas que atuam muito
nesse desenvolvimento dessa criança de uma maneira adequada a cada faixa
etária e que desenvolva a criança nesse panorama integral, ou seja, uma parte
intelectual, que a gente acha super importante, uma parte mais psíquica, mais
ligada ao sentimento e uma parte mais da atividade, ou seja, do atuar, do
fazer (ENTREVISTADA EW, 2014, p.5).
Este trecho permite a inferência de que, na referida escola-campo, todo professor
traz para o exercício da docência as suas concepções e isso influi de diversas maneiras em seu
trabalho. Uma delas é através da subjetividade implicada no ato de avaliar (LUDKE &
SORDI, 2009). Além disso, ele apresenta forte relação com a citação de Lanz (1986) deste
trabalho em que o autor discorre sobre a importância da educação que cresce junto com a
criança, apropriando-se a ela a cada fase de sua vida, fomentando o seu desenvolvimento
como um ser integral, em todas as esferas, que ultrapassam a do aluno em sala de aula. Este
argumento concatena a teoria estudada com o discurso coletado da entrevistada, atribuindo
sentido a esta pesquisa e atingindo os objetivos inicialmente traçados de responder as
hipóteses intrasubjetivamente lançadas.
Partindo-se da perspectiva de que ainda não se veem na maioria das escolas,
generalizadamente, as disciplinas curriculares de forma contextualizada, como um meio para
o aluno compreender-se no mundo e poder criticá-lo, mas sim como conteúdos estanques,
43
acaba-se avaliando também à moda antiga tão criticada pelas teorias contemporâneas de
avaliação, dentre as quais, algumas foram já discutidas no primeiro capítulo deste trabalho.
Estes conteúdos estanques dominam-se muito mais pela memorização, não levando em conta
o conhecimento e as informações que o aluno traz para a escola e que dão um tom diverso
àquilo que ele recebe ou troca com o professor e sim vê-se o aluno como uma tábula rasa a ser
preenchida (LOCKE, 1983).
Desta forma, entende-se, a partir da entrevista, que mudar a forma de avaliar
pressupõe também mudar a relação entre ensino e aprendizagem (LUCKESI, 2011):
É, é a ideia do balde vazio né que a gente vai encher esse balde de
conhecimento né. Pois é, isso é muito sério, cidadãos críticos a gente não vai
conseguir se a gente encher um balde, passivamente enchendo esse balde e
não levando em conta que eles tem um conhecimento tácito, eles já tem um
conhecimento de vida, eles já tem vivências, experiências, eles trazem
características pessoais, são indivíduos e por isso a visão de ser humano é
uma coisa que nos ajuda na nossa prática diária que a gente não acha que ele
é uma tábula rasa, ele tem um porquê de existir e nesse sentido explorar, acho
que o conteúdo, ele não é um fim, o conteúdo é um meio e se eu penso o
conteúdo como um fim, eu vou enfiar esse conteúdo goela abaixo, o tanto que
eu preciso, no tempo que eu preciso e vou abrir a boca do passarinho e enfiar
conteúdo goela abaixo e vai descer o que deu, deu, o que não deu, não deu
(ENTREVISTADA EW, 2014, p. 8).
A entrevistada supera, ao menos naquilo que concebe teoricamente e diz aplicar
fielmente na prática, a concepção quantitativa e de verificação do desempenho de avaliação
ao discorrer, qualitativamente, sobre possibilidades de engendrá-la na sala de aula:
Se pelo outro lado, eu trabalho esse conteúdo com uma possibilidade de
desenvolvimento dessa criança em seus múltiplos aspectos e não apenas o
cognitivo e se esse conteúdo ajuda que essa criança se desenvolva também na
sua psique, nos sentimentos, ajuda com que ela tenha valores, ajuda na
passagem de valores, de tradição, de princípios, de aspectos de encarar o ser
humano, de encarar o desenvolvimento da humanidade, se ela também
proporciona que essa criança possa, a partir de si, elaborar os conteúdos, ou
seja, uma aula, assim vamos dizer socrática, onde eu trago o estímulo e a
partir desse estímulo nós vamos elaborar alguma coisa, aí eu estou formando
um ser humano crítico e bem preparado (ENTREVISTADA EW, 2014, p. 8).
Este paradoxo entre concepções quantitativa e qualitativa de avaliação é muito mais
complexo, como já se discutiu aqui amparando-se na literatura sobre o tema, do que o que é
propagado pelo discurso do senso comum que banaliza a questão numa escolha simples por
uma ou outra vertente. A própria realidade da sala de aula da escola em geral, intensamente
afetada pela estrutura institucional da qual faz parte e pelo meio social no qual está inserida,
contrapõe-se a esta teoria. O sistema de ensino estabelece que é importante que se tenha como
44
quantificar os dados obtidos na avaliação do aluno. A escola precisa saber quantos alunos
estão em determinada situação (avançando, aquém das expectativas...). Faz-se necessário,
para isto, instrumentos como notas ou conceitos. À medida que se complexifica e deixa de ser
uma cobrança do que foi ensinado, e passa a ser uma prestação de contas, a avaliação torna
mais difícil também a quantificação dos resultados, ao mesmo tempo em que as redes
escolares precisam dessa quantificação.
Esta problemática também é discutida pela educadora, que a caracteriza como um
verdadeiro impasse e se vê diante de inúmeras dificuldades para a mudança das concepções
avaliativas atuais, bem como de suas respectivas concretizações, dado que confirma a
complexidade do tema debatido durante a entrevista:
Completamente, muito complicado você ter essa transformação, muito, e nos
outros países a gente também não tem grandes transformações né, é tudo
muito mais ligado a uma prova, a um resultado formal. Eu gostaria muito de
mudar a maneira de se fazer, mas ela é muito complicada e muito
problemática porque eu tenho que pegar alguns aspectos da criança e não só
um e isso acho que seria bem difícil, exigiria muito mais tempo, muito mais
gente, muito mais tabulação, muito mais trabalho, uma abertura maior nesses
conceitos (ENTREVISTADA EW, 2014, p.14).
Outra categoria de análise diz respeito à avaliação no âmbito da formação de
professores, identificada pelas diversas vezes em que as falas da entrevistada relataram, no
que concerne a esse aspecto, que o corpo docente possui um programa próprio de formação de
professores – programa de implemento de atualização e reciclagem (catálogo de cursos
disponibilizado no momento da entrevista ao pesquisador). É uma forma de revisitar aspectos
da pedagogia, dentre eles, a avaliação da aprendizagem. Há o reconhecimento, contudo, de
que há a necessidade da avaliação ser mais trabalhada, ser sempre aperfeiçoada dada a sua
importância na busca pela qualidade na educação. Nesses debates do programa de formação
de professores mencionado, constatou-se ainda que se avalia muito erroneamente na EW e
que ela deve ser encarada como mais um momento de aprendizagem e como uma
demonstração de tudo que se aprendeu até momento, sem a conotação coercitiva de avaliação
que inibe o desempenho do aluno e não permite que ele apresente seu real domínio sobre
determinado conteúdo.
A compilação da constatação da entrevistada acerca desta categoria da avaliação no
âmbito da formação de professores foi extraída do seguinte depoimento:
Quando um professor fala que está ótimo, que faz tudo certo, que ele é
perfeito, está na hora de ele ir embora (risos), se aposentar ou ir embora
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porque a gente nunca está bom o suficiente para lidar com criança. Acho que
universitários é outro papo porque a gente se defende do mundo, mas com
criança o cara precisa estar eternamente em retrabalho. Talvez ele não precise
ir num curso, mas ele precisa trabalhar em si, se informar, precisa
aperfeiçoar, se atualizar, “Por que que eu não dou conta desse menino?”, se perguntar, se analisar criticamente, se ele não faz isso, acho que não tem
como estar na frente de criança (ENTREVISTADA EW, 2014, p. 10).
O modo como a entrevistada concebe a importância do exercício da reflexão
constante na carreira docente para o contínuo aperfeiçoamento das concepções pedagógicas (e
dentre elas, a de avaliação) fundamentam sua ação, reflexão esta que, ao ver desta análise,
também deve estar presente na formação de professores. Tal como a coordenadora explica,
com suas palavras, assim se dá o posicionamento de Lanz (1986) referente à mesma questão,
no contexto da Escola Waldorf:
Os professores são a alma viva de uma escola Waldorf. Se deixam de crescer
e de se desenvolver, a escola pára e definha. Nunca devem cair numa rotina
didática, considerar sua matéria como definitivamente assimilada e perfeita
para ser transmitida aos alunos. A autocrítica constante e até uma dose de
frustração são, pois, a atitude mental constante de todo professor. Ele vive
comparando a aula realmente dada com o ensino tal como sonhava ministrálo (LANZ, 1986, p. 103).
A ponderação da educadora, contudo, vem logo a seguir, revelando-se um ponto
positivo de contribuição da Escola Waldorf para este debate de problematização de
concepções naturalizadas, uma vez que se trata de um reconhecimento constante, ao longo da
entrevista, de que a avaliação empregada na sala de aula é um tema de extrema importância a
ser discutido entre os educadores, tratado com clareza e naturalidade por estes com os seus
alunos e, por este motivo, precisa ser sempre aperfeiçoado em prol de um ensino de qualidade
e uma aprendizagem significativa (ANDRADE, 2011):
Contudo, acho que precisa ser mais porque eu acho que nós erramos muito
nas avaliações que fazemos. Eu te falei, acho que fazer uma prova bem feita é
muito difícil, é muito difícil, a gente faz coisa muito burra, desculpa a
palavra, mas é muito simplório, é muito restrito e é limitante, não é para
desenvolver porque se numa prova o cara “ta” aprendendo, melhor ainda, de repente, ou com dicionário, ou com uma calculdadora... Eu não sei, ou em
dupla, ou seja, se eu proporciono... Se ele está ali pressionado para apresentar
um resultado com perguntas restritas, o estudo para preparação dessa prova
torna-se artificial e chato (ENTREVISTADA EW, 2014, p.10).
Relacionando este pensamento à terceira categoria de análise identificada,
aplicabilidade dos resultados obtidos pela avaliação/ papel e funcionalidade da avaliação,
aqui situa-se outro ponto importante para esta discussão, pois a interlocutora traz uma
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concepção alternativa da funcionalidade da avaliação em sala de aula muito interessante que
está preocupada, antes de tudo, com o desenvolvimento integral do educando (LANZ, 1986),
além de apresentar a proposta de uma metodologia diferenciada para a aplicação dos
instrumentos avaliativos tradicionais segundo os princípios que defendem (fala em nome da
escola) – categoria a ser melhor analisada mais adiante. Esta proposta de visão sobre a
avaliação compreende ainda uma necessária diferenciação entre autoridade e autoritarismo no
momento em que o professor assume o seu papel na hierarquia existente em sala de aula e que
é melhor entendida nas palavras da própria entrevistada:
Poder é péssimo, acho que não tem outra coisa pior, acho que o professor ele,
dentro de uma sala de aula, ele pode ter uma autoridade, mas é uma
autoridade natural, não é uma autoridade de caneta, não é um autoritarismo.
Ele pode ser uma autoridade porque ele sabe trazer um conteúdo porque ele é
uma pessoa interessante, no sentido de referência por valores internos,
valores de conquistas, valores de transformação, valores humanos, valores de
referência. A criança precisa de referenciais e o professor deve ser um
referencial, então ele tem uma autoridade interna, nata, não é uma autoridade
externa ou autoritarismo de caneta, ou essas coisas (ENTREVISTADA EW,
2014, p. 15).
Nesta mesma categoria de análise, foi possível identificar, ainda, nos relatos
analisados, que a avaliação não tem um objetivo único; é elaborada tendo sempre em vista
metas claramente delimitadas ao início de todo ano letivo. Além disso, o acompanhamento
contínuo do desempenho apresentado pelas crianças, propiciado através da avaliação, permite
ao professor um conhecimento permanente e sempre atualizado sobre a situação de seus
alunos e subsidia a sua intervenção pedagógica em processos que apresentam dificuldades de
aprendizagem.
Especificamente no que diz respeito à dimensão da aplicabilidade dos resultados da
avaliação desta categoria de análise, faz-se necessário destacar a atuação da avaliação, nesse
sentido, como subsidiadora da intervenção pedagógica (LUCKESI, 2011) que é claramente
identificada nas seguintes palavras:
Então, eu vou interferir, eu vou proporcionar mais, vou proporcionar uma
ajuda, vou chamar essa criança, vou fazer um jogo diferente, vou atendê-la de
uma maneira que ela possa se apropriar desse conhecimento. Então, a
avaliação é contínua e a ação para reparar ou para atender a criança também é
continuada (ENTREVISTADA EW, 2014, p. 3).
Questionada sobre as novas formas de avaliar que são vistas pelos professores como
tentativas de se camuflarem resultados ruins e como imposição de que se aprovem mesmo os
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“maus alunos”, a entrevistada aponta uma interessante solução para este dilema no sentido de superar esta visão:
Se a avaliação for inserida dentro do processo de ensino-aprendizagem como
algo natural que faça parte do dia-a-dia, algo que está inserido na sua prática
[...] Então esse professor, se ele se engaja com os seus alunos, se realmente
está interessado nos seus alunos, ele vai fazer isso acontecer e ele vai fazer
uma educação continuada e vai fazer a criança que não está bem passar de
ano, mas vai fazer com que ela melhore ou num momento vai falar “não dá mais”, ou seja, o professor precisa estar muito comprometido com a função dele, extremamente comprometido com essas crianças de maneira a carregar
ou não carregar por conta das condições que são possíveis e ele pode avaliar
e pode conduzir (ENTREVISTADA EW, 2014, p. 15; 16).
Pressupondo, ainda, que a avaliação permanece realizando-se mais como forma de
condenar o aluno do que para que se descubra em que pontos frágeis é preciso ajudá-lo, a
entrevistada afirma “eu acho que é o que acontece e também aqui dentro ele acaba
acontecendo, não sempre, mas é um perigo, é um problema que acontece bastante e a ideia é
você tentar ver onde ele está e tentar dali ajudá-lo, ajudar a transformar” (ENTREVISTADA
EW, 2014, p.7; 8). Ao ser indagada sobre esta problemática, ao mesmo tempo em que
reconhece a sua existência dentro de sua própria instituição, creditando, assim, o seu relato
com uma abordagem realista e não escamoteada dos fatos, a educadora entrevistada concebe
que a intencionalidade da avaliação, segundo o formato estabelecido pela escola tendo em
vista o entendimento do para que se avalia na concepção da Pedagogia Waldorf, visa superar
sobretudo esta realidade cultural estabelecida no cenário educacional desde há muito tempo
no qual todos os alunos estão, indiscriminadamente, inseridos. Essa abordagem retrógrada da
avaliação existente na tradicional configuração das provas escolares aparece, ainda, na
entrevista sob a seguinte análise direcionada às necessidades da faixa etária que compreende a
infância:
Eu acho que essa forma de medir, então, esse desempenho compromete a
qualidade da avaliação, distorce um resultado e tendencia um resultado, é
completamente classificatória e eu não acho muito simpático com as crianças
assim, eu acho que a gente está nivelando também de uma certa maneira. Eu
entendo completamente a necessidade de ter, mas eu acho que ela teria que
ser diferente por se tratar de crianças, seres em desenvolvimento, eu acho que
a gente tem que ter mais respeito com ser em desenvolvimento
(ENTREVISTADA EW, 2014, p. 13).
Este pensamento é fundamental para esta discussão de problematização das
concepções avaliativas que ainda imperam no contexto escolar atual, cuja perspectiva ignora a
funcionalidade da avaliação na trajetória educativa dos alunos, bem como o espaço que deve
48
ocupar, e o modo por meio do qual este fenômeno se dá, no processo de ensinoaprendizagem.
A última categoria de análise, instrumentos avaliativos, é uma das que mais
aparecem na entrevista com a coordenadora dos anos iniciais do Ensino Fundamental da EW,
cuja abordagem põe em cheque, nas falas transcritas do sujeito de pesquisa, o embate entre as
práticas
avaliativas
classificatórias/excludentes/tradicionais
e
as
progressistas/formativas/qualitativas, o qual (o referido embate), como já pudemos observar
na teoria, não se delineia simplesmente num umbral maniqueísta em que o certo e o errado
são claramente separados em lados opostos, mas que essas concepções adotadas são
cotidianamente postas em prática simultaneamente em sala de aula, pelo mesmo professor,
numa mesma atividade, daí a complexidade do tema da avaliação. Neste âmbito da discussão,
a prova aparece, segundo a concepção da gestora, como o instrumento avaliativo mais
proeminente no desencadeamento desta questão, a qual se dá de maneira formal, pontual e
explicitamente reguladora do comportamento, o que os fez não optar por sua utilização em
suas turmas até o 5º ano do Ensino Fundamental.
Partindo-se dessa perspectiva, é priorizada, nesse contexto da escola-campo, a
variedade de instrumentos avaliativos aplicada especificamente para esta etapa da Educação
Básica em que foi destacado o boletim descritivo: uma compilação da análise avaliativa do
desenvolvimento de cada criança nas diversas disciplinas escolares direcionada aos pais e aos
próprios alunos. Lanz (1986) disserta especificamente sobre este instrumento avaliativo em
seu livro, e que se enquadra exatamente ao que é relatado pela entrevistada, quando fala sobre
a tendência da Pedagogia Waldorf em não avaliar por meio de números, mas sim através de
uma caracterização qualitativa, esclarecendo que
Essa atitude se manifesta principalmente nos boletins anuais em que o
professor de classe faz um relato bastante extenso sobre a “biografia” escolar do aluno durante o ano, havendo, em seguida, breves caracterizações do
resultado, do comportamento e do esforço, por todos os professores que
deram aulas na classe em questão. O boletim é dirigido aos pais, e estes têm,
através dele, uma imagem fiel de seu filho (LANZ, 1986, p. 91).
Este cenário reverte-se, contudo, pela própria linha de raciocínio que norteia os
ideais educacionais da equipe gestora da escola, nos anos finais do Ensino Fundamental e no
Ensino Médio, nos quais passam a serem pregadas provas formais e tradicionais, simulados e
testes baseados nos modelos estipulados pelos processos seletivos para ingresso no Ensino
Superior como podemos comprovar nas palavras da coordenadora:
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[...] a gente não faz prova para os pequenos, então até o quarto ano a gente
não tem avaliação formal, mas a gente tem ditado, a gente tem ditado de
números, a gente tem contas que eles fazem que a gente acompanha, que a
gente vê fazer, a gente está o tempo inteiro com eles… Lição de casa, né? [...]
mas nós estamos tendendo cada vez mais a entrar na maré do que o mundo
está pedindo aí fora. Está certo por um lado? Está certo porque ele vai fazer
vestibular, a gente precisa preparar, então a partir do 5º, 6º ano tem provas,
começa a ter nota, blábláblá e o colegial vai fazer prova como todas as outras
escolas para se preparar para fazer múltipla escolha, para preparar para fazer
12
isso, para fazer aquilo, para fazer aquilo outro (ENTREVISTADA EW,
2014, p. 3;7).
A própria fala da voluntária nos remete a uma análise sobre o sentido da avaliação,
empobrecido ao ser restringido ou até mesmo totalmente deturpado para a simples e mera
preparação para o vestibular. A educadora chega até mesmo a reconhecer, em seu
depoimento, a adoção desta concepção na prática da escola a partir dos anos finais do Ensino
Fundamental, ao mesmo tempo em que critica esta realidade, revelando um posicionamento
maduro e consciente acerca da complexidade que envolve a aplicabilidade da avaliação em
uma sala de aula. Essa perspectiva pragmática e utilitarista da avaliação já discutida por
Giusti & Lopes, (2007) se estende não apenas ao ingresso ao Ensino Superior, um dos canais
mais visados pela formação escolar, mas também ao mercado de trabalho, cuja vertente é
assumida prioritariamente pela Educação Profissionalizante, mas essa segunda categoria não
foi comentada pela entrevistada e que, naturalmente, não foi mencionada para não induzi-la a
um encaminhamento artificial da entrevista, desrespeitando a metodologia adotada e fugindo,
assim, do foco da pesquisa, o que revela uma particularidade da EW bastante encontrada em
muitas escolas particulares, descaracterizando-a, neste aspecto, como uma escola alternativa
conforme, inicialmente, suposto no momento de escolhê-la como campo de investigação.
A continuidade do excerto demonstra ainda o entendimento de que esta redenção às
demandas externas não é, todavia, passivelmente aceita pela coordenadora, revelando-se
desconfortável às imposições do sistema às quais estão submetidos, justificando, inclusive, os
casos de dificuldades existentes entre seus alunos frente aos modelos avaliativos empregados
pelos processos seletivos, o que é devido, justamente, a maior diversidade de instrumentos
12
Esta fala da entrevistada é um perfeito reflexo da seção do capítulo bibliográfico que discorre sobre os
fundamentos da Pedagogia Waldorf de Rudolph Steiner segundo a visão de Lanz (1986), em que, mesmo na
atualidade, a educadora adepta ao sistema educativo reproduz o pensamento de seu precursor: ensino geral
voltado aos anos iniciais e com maior diversidade de práticas avaliativas, e ensino de especialização - vestibular
e preparo profissional - com maior foco nos instrumentos avaliativos tradicionais (provas e testes) nos anos
finais da escolarização.
50
com os quais estão acostumados a trabalhar em sua escola, ainda que mais extintos nos anos
finais da escolarização:
Então a gente vai entrar nisso para preparar o aluno, está certo, agora eu sinto
que toda a vez que a gente entra com uma prova assim formal é difícil fazer
uma avaliação bem feita, é muito difícil fazer uma avaliação bem feita, uma
correção bem feita, a não ser que seja múltipla escolha e faz aquela coisa lá e
acabou, que eu acho que agrega muito pouco, mas uma avaliação ela
precisa… construir né, fazer, realizar, formatar uma boa avaliação, depois
uma boa correção e eu acho que quando a gente vai para avaliações que
restringem, a gente está perdendo muitas qualidades dos alunos, muitas
qualidades individuais, muitas potencialidades, está uniformizando,
padronizando, passando a régua e passa a régua por baixo né, a gente passa a
régua abaixo da média mais interessante e restringe [...] Então os alunos
daqui muitas vezes vão fazer provas lá fora e eles se dão mal porque
escrevem um monte e escrevem o que é interessante e o que poderia ser mais
um adendo, ou seja, eles são criativos e querem trazer uma diversidade ao
conteúdo e não se restringem muitas vezes ao que é perguntado que é muito
raso muitas vezes. Então a gente entra muito na maré porque é o que o
mundo está pedindo, é o que o vestibular pede, o ENEM, “papapi”, “papapá”… Então a gente acaba entrando nisso também (ENTREVISTADA
EW, 2014, p. 7).
Outra fala ilustra este panorama de mudança dos instrumentos avaliativos de acordo
com a modalidade de ensino e a demanda externa presente em cada uma delas descrito pela
educadora, corroborando definitivamente, assim, o seu posicionamento diante desta questão:
A avaliação começa sem nada de avaliação e devagar a gente vai
introduzindo ele nesse mundo como ele é. Mesmo assim [...] a gente preza
muito formas de avaliação que não sejam essas tradicionais, muito, muito,
muito, muito... Se não tivesse vestibular com esse formato, a gente faria mais
diferente ainda do que a gente já faz porque eu não acho isso de valia assim
para avaliar um ser humano, talvez seja o mais prático, o mais rápido que se
encontrou até agora, eu compreendo isso [...] (ENTREVISTADA EW, 2014,
p. 9).
Ao ser indagada, ainda, sobre qual a metodologia avaliativa utilizada pela Pedagogia
Waldorf, se há um formato padrão utilizado pelas escolas ou cada instituição tem a liberdade
de particularizar as suas práticas avaliativas, se há instrumentos determinados por uma
política interna e, sem sim, quais seriam eles pressupondo-se que a tradicional prova, que se
faz periodicamente, seria condenável neste contexto, a entrevistada respondeu:
Eu acho que ela tem um papel, mas como um dos instrumentos de avaliação,
não o instrumento, mas um dos instrumentos de avaliação, ela tem a sua
função. O problema é que muitas vezes ela é o único, mas se ela é um dos e
se a minha criança pequena não está sofrendo com isso eu acho que não tem,
não é um problema, mas ela não pode ser o único. Se ela é o único, aí eu acho
que ela não tem qualidade, mas como um todo, eu acho que não está errado
desde que as crianças não estejam sofrendo, por isso que com os pequenos a
51
gente não faz porque acaba tendo uma conotação muito de ter um resultado
que ela tem que apresentar e que muitos não estão em condições ainda. Isso
marca, isso traz traumas, resultados... Não gosta daí da escola, não gosta do
professor, não vai bem, não consegue e fica rotulado, você fica com aquele
rótulo “não sei fazer matemática” que não é verdade, todo mundo sabe fazer matemática de uma ou de outra maneira [...] Tem o boletim que todo
professor escreve sobre seu aluno e para os alunos a gente dá também um
impresso. A escola também não está presa a um modelo da Pedagogia
Waldorf, o professor pode falar “olha, eu acho que a minha classe precisa de uma avaliação, eles estão se achando, estão não sei o que, não estão dando
atenção, eu vou colocar todo mundo numa avaliação para que eles percebam
um pouco como eles estão” (ENTREVISTADA EW, 2014, p. 11;12).
Essa variedade de instrumentos avaliativos valorizada pela entrevistada é igualmente
perceptível na visão de Lanz (1986) no momento em que explica que:
[...] as escolas Waldorf não se baseiam em provas, testes, sabatinas e exames
em que a matéria já é preparada de forma a servir facilmente para fins
estatísticos. Elas julgam todos os fatores que permitem avaliar a
personalidade do aluno, e que seriam: o trabalho escrito, a aplicação, a forma,
a fantasia, a riqueza de pensamentos, a estrutura lógica, o estilo, a ortografia,
e, além disso, obviamente, os conhecimentos reais. Mas o julgamento geral
sobre o aluno levará em conta o esforço real que fez (ou não fez) para
alcançar tal resultado, seu comportamento, seu espírito social (LANZ, 1986,
p.91).
A análise feita pela coordenadora apresenta, desta forma, uma defesa por uma
concepção de avaliação crítica (WACHOWICS, 2005) ao instrumento formal da prova, mas
também ao conceber que a Escola Waldorf “peca” ao não avaliar para os pais quando diz “Eu acho que a Escola Waldorf peca as vezes um pouco por não trazer suficientes avaliações,
resultados de avaliações para os pais e eles se enchem de ansiedade, então isso é um
problema” (ENTREVISTADA EW, 2014, p. 6). Esta consideração pode ter suas raízes na
concepção que Lanz (1986), como estudioso da Pedagogia Waldorf, já dispunha sobre a
importância da participação dos pais no trabalho da escola, e talvez seja exatamente por isto
que entrevistada sinta esta necessidade de dar um retorno aos pais de tudo que é feito com os
alunos através da avaliação, ou seja, por compartilhar do mesmo entendimento, tão bem
descrito pelo autor, de que:
Todo esforço da pedagogia Waldorf na escola seria vão se não fosse apoiado
pelos pais dos alunos, isto é, no lar. Nada mais prejudicial do que a existência
de duas escalas diferentes de valores, de uma falta de unidade na educação.
Por esse motivo, o contato entre a escola e o lar é uma preocupação constante
(LANZ, 1986. p. 105).
52
Cabe a esta análise o papel de ponderar até que ponto este “avaliar para os pais” seria benéfico, uma vez que é irrefutável, no cenário educacional, a representação deste
público também como uma demanda externa e aí pode-se-á estar avaliando não pelo
desenvolvimento do aluno, mas pela transformação da avaliação em resultados oficiais a
serem apresentados aos responsáveis. Este fenômeno seria supostamente compreensível, uma
vez que a lógica da avaliação tradicional, que quantifica o desempenho como demanda
externa, está incrustrada em nossa sociedade, é ideologicamente aceita e aparece inclusive nas
palavras da própria entrevistada na seguinte passagem em que aproveita para explicar a
preocupação deles em manter os pais a par da avaliação que é feita de seus filhos:
Eu acho que a gente sempre tem mudanças porque as crianças são outras, os
pais tem demandas diferentes, o mundo tem… Gerações diferentes… Então tudo isso muda e a gente também muda, tanto que temos feito mais
avaliações, mais devolutivas para os pais que demonstram uma ansiedade em
relação a saber como seu filho está, como ele se desenvolveu, então a gente
tem feito mais avaliações formais para os pais, para que eles se sintam mais
tranquilos em relação ao processo (ENTREVISTADA EW, 2014, p. 4).
A dimensão quantitativa da avaliação tradicional mencionada e que é combatida pela
Pedagogia Waldorf também é discutida por Lanz (1986), corroborando o argumento
anteriormente explanado:
Nas escolas tradicionais, o rendimento de cada aluno em cada matéria é
quantificado e comparado com um ideal que não existe na prática. O
quoeficiente dessa divisão consitui sua nota, a qual decide sobre sua vida
escolar, isto é, sobre concessão ou não-concessão de diplomas, sobre
aceitação ou não-aceitação do aluno para determinados estudos e profissões.
Sistema tão arraigado que ninguém questiona sua lógica nem emite dúvidas a
respeito (LANZ, 1986, p. 91).
Outra preocupação apresentada pela educadora diz respeito à valorização do
conhecimento espontâneo trazido pelos alunos no momento da avaliação (daí a importância
da diversificação de instrumentos para viabilizar o despertar dessa pluridade de contribuições,
dada à heterogeneidade de toda e qualquer turma) pelo fato de acreditar que o professor
muitas vezes “entra bitolado em sala de aula, mas os alunos tem uma riqueza muito maior. A gente tem só a aprender com eles”(ENTREVISTADA EW, 2014, p.14). A ideia que se pode
depreender desta fala é realizar o ensino exatamente a partir dessa valorização em busca do
grande potencial da avaliação que é proporcionar ao professor um conhecimento profícuo e
aprofundado de seus alunos.
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Desta forma, a constatação da entrevistada para esta categoria de análise dos
instrumentos de avaliação revela, em suma, uma realidade que a instituição na qual atua vem
buscando superar ao longo dos anos de sua existência, através dos princípios defendidos pela
filosofia antroposófica, que é a de que as práticas pedagógicas e avaliativas, nas escolas em
geral, ainda se encontram impregnadas de características da avaliação tradicional,
classificatória e seletiva. Este dado confirma mais uma vez a atual situação enfrentada pelos
educadores e pesquisadores na tentativa de problematizar essas práticas escamoteadoras de
uma realidade perversa que se perpetua no discurso do sistema, mas que amplifica a crise da
má qualidade na educação, na qual a avaliação externa é um indicador, em outra dimensão da
análise, para aprofundar um olhar que busque respostas do funcionamento do sistema sobre a
postura reproduzida pelos professores em sala de aula, ou então sobre o que a ausência dessas
respostas pode significar para a compreensão dessa problemática no cenário educacional.
54
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Depreende-se, ao final deste trabalho, que a compilação dos fundamentos educativos
trazidos pela Pedagogia Waldorf foram essenciais, sobretudo, na sistematização dos eixos
norteadores da pesquisa que se referem à visão integral sobre o ser humano no papel de
educando e consequentemente sobre aquilo que ele apresenta para ser avaliado pelo professor.
Este entendimento, vasto e amplo num primeito momento, tem várias implicações na
realidade da sala de aula para que se torne possível no campo da educação e, mais
especificamente, da avaliação da aprendizagem.
Sendo o aluno este ser em desenvolvimento tão complexo e uno, ou seja, que assume
vários papeis sociais ao mesmo tempo, os quais são trazidos para a escola, entende-se que a
avaliação deve abarcar todas as competências e capacidades que apresenta em todas as esferas
e não apenas aquelas típicas do âmbito escolar. Esta noção de integralidade definida pela
Pedagogia Waldorf é o que permite a construção de uma educação que acompanha a
formação da criança e, consequentemente, atribui qualidade ao processo avaliativo.
A variabilidade de instrumentos avaliativos e a autonomia concedida ao professor,
propostas defendidas pela Pedagogia Waldorf, são, desta forma, elementos fundantes que
fazem parte deste rol de implicações, os quais remetem a reflexões conclusivas cruciais a este
trabalho pelo potencial que apresentam no combate às fragilidades do processo avaliativo da
escola de uma forma geral.
Ficou claramente evidente, ao longo da pesquisa realizada, que há, dentre as práticas
analisadas e pela literatura estudada, uma forte tendência à burocratização do ensino,
inclusive pela questão dos instrumentos avaliativos utilizados, em que se preocupa muito em
“correr com a matéria” para dar conta dos conteúdos a serem cobrados na prova - avaliação
não formativa e sim, somativa (WACHOWICS, 2005). Há a exigência, de acordo com a
análise teórica feita sobre o panorama geral do sistema de ensino das escolas, de um
comprometimento com as aulas por conta da existência de uma prova, como se este
comportamento se deva dar só em função de uma prova ao final do processo de ensinoaprendizagem. Isso é uma concepção naturalizada de avaliação que precisa ser
problematizada, cabendo-se discutir se é este o sentido da avaliação, como aqui se pretendeu
fazer. Este pensamento exemplifica-se bem nas palavras da entrevistada:
[...] eu acho que ela tem o seu papel, tem a sua contribuição, mas ela precisa
ser bem empregada e bem pensada porque nem prova é fácil de aplicar, fazer.
Então tem que ser muito bem feito, muito bem pensado e aí cada escola, as
55
escolas tem uma certa autonomia, a direção, o corpo pedagógico pensa um
pouco, discute, mas é muito esse papel de estar discutindo e conversando
sobre o assunto nas suas reuniões como fazer, “vamos fazer mais, vamos fazer menos, estamos indo bem, estamos indo mal”, ou seja, a avaliação da situaçao da escola e se der, fazer mais ou menos, como também cada
professor tem um pouco essa autonomia,“minha classe está traumatizada, está péssima em negócio de prova, não vou fazer por enquanto, vou fazer outras
maneiras, ditado, a gente vai brincar, vamos fazer aqueles negócios de
taboadas...” [...] Então ele justifica o porquê ele está fazendo isso, mostra para os pais “vou fazer isso por causa disso, disso e disso ou não vou fazer esse ano”, é de acordo com as necessidades do grupo. Ele tem essa autonomia
desde que ele saiba justificar, não é que cai do céu e por isso que a avaliação
deve ser flexível, sempre flexível e cada escola tem a sua maneira, cada
escola tem essa autonomia e cada classe, cada professor também tem
(ENTREVISTADA EW, 2014, p. 12).
A visão da entrevistada, que se coaduna à desta pesquisa neste aspecto, põe em jogo,
como questão crucial deste debate, aquilo que realmente deva ser avaliado em sala de aula, o
objeto para o qual a avaliação deva-se voltar, a depender das necessidades de cada turma,
pensando-se em transformar a avaliação da aprendizagem em uma avaliação para a
aprendizagem, ao mesmo tempo em que propõe uma forma para alcançar esta mudança de
pensamento através de uma relação mais profícua entre avaliação da aprendizagem e
avaliação institucional (dimensões interligadas), além de contar com a autonomia do
professor (VEIGA, 2004). Tudo isso implica numa mudança de cultura escolar e no modo
como o professor concebe a produção do conhecimento, o seu processo e o seu resultado
(ambos são igualmente importantes porque constituem um ciclo), isto é, o professor precisa
avaliar, assim, para que o aluno aprenda. Isso permite, por sua vez, elaborar a avaliação
diagnóstica que possibilita o crescimento do aluno, remetendo-se novamente à ideia de ciclo
(ALMEIDA, 2008).
Infelizmente, a escola ainda delega ao professor responsabilidades que não são dele,
mas que competem, a um trabalho profícuo, integrado e resultado da relação comprometida
entre professores, equipe gestora e família (responsáveis)/comunidade escolar com o
progresso dos alunos. A proposta de solução para este processo desajustado da dimensão
institucional do sistema de ensino é problematizar a questão da organização do regimento
escolar, tirando a sobrecarga de responsabilidades sobre o professor para que este exerça o seu
papel como docente mais livremente, criando um sistema de equilíbrio de responsabilidades
entre professor, equipe gestora institucional e rede de ensino.
Esse acúmulo de funções sociais na escola e no professor, que faz com que o docente
se sinta saturado nesse processo de pressão social, vem gerando, segundo os resultados
obtidos pela entrevista e pelas contribuições da Pedagogia Waldorf, uma distorção da
56
avaliação para a aprendizagem no contexto escolar e aí está a importância, portanto, da
variedade de instrumentos para uma avaliação justa e fidedigna aos princípios aqui
defendidos, valorizando e potencializando as diferentes capacidades dos alunos que os coloca
no mesmo patamar de sujeito em formação, para além de respeitar os diferentes tempos de
aprendizagem das crianças: escrita; seminário (capacidade de disposição, organização das
ideias, oralidade), trabalho em grupo (iniciativa, organização, liderança, lidar com a
diferença); estudo com o meio (aluno pesquisador, interação direta com o meio), entre outros.
É este o quadro configurado pelas análises feitas, pelas contribuições dos autores
citados e pelas conclusões tiradas através da interpretação dos dados coletados da entrevista
realizada, buscando entender como as práticas pedagógicas tem sido engendradas em termos
de avaliação.
Crê-se que esta estratégia de problematização na discussão sobre a avaliação da
aprendizagem trará ainda mais elementos para que se possa potencializar, por um lado, as
discussões sobre o currículo da formação de professores e o potencial de formação existente
no período de desenvolvimento dos estágios, e por outro, a discussão em favor de um futuro
questionamento sobre propostas pedagógicas que visam o sucesso de seus alunos e não a
sobrevivência do sistema.
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Disponível
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62
APÊNDICE A –TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA
EU: Por que acreditam que as famílias procuram a escola Waldorf para matricular seus
filhos? A que público a escola atende? Qual o perfil predominante?
ENTREVISTADO: Então, são diversos públicos. Você tem uma vez um público que
conhece a Pedagogia Waldorf, conhece a antroposofia, então um público simpatizante, talvez
até ex-alunos, nós temos muitos ex-alunos já que procuram a Pedagogia Waldorf, isso é um
grupo. Mas você tem um outro grupo grande, um crescente grupo que são as pessoas que
estão insatisfeitas com as escolas ditas tradicionais. Então eles veem que a criança está
aprendendo para realizar um vestibular ou para o ENEM ou para ser um empresário ou para
trabalhar no mercado financeiro e compreendem que não é um desenvolvimento de um ser
humano, mas é um treinamento de um ser humano para um objetivo de realizar uma avaliação
na qual ele seja bem-sucedido e que ele chega ao mercado de trabalho. Então, as pessoas
insatisfeitas com essa metodologia, elas procuram algo diferente que possa desenvolver um
ser humano integral, o ser humano como um todo e não apenas essa qualidade que é um dia
resolver satisfatoriamente uma prova de aptidão de vestibular. Então esse é um grupo grande.
Tem também mais um grupo que são as crianças que não se dão bem nas outras escolas.
Então esse também é um grupo que a gente vê que tem umas crianças com dificuldades sérias
e que precisamos ajudar, mas tem crianças que não se adaptam ou também muitas que, com
essa nova lei que as crianças precisam estar no primeiro ano com seis anos, muitas cranças
não suportam isso e elas acabam vindo para cá bastante entristecidas ou bastante estressadas e
com essa metodologia elas conseguem então se desenvolver e a gente vê que são
absolutamente normais, não tem problema nenhum, só que entraram num estado de stress e de
paralisia. Então também tem esse grupo de pessoas.
EU: Qual a concepção de avaliação, em que momentos ela aparece e quais os efeitos
pretendidos através dela segundo os princípios educacionais que defendem?
ENTREVISTADO: Então, a avaliação eu acho que ela é diária, contínua e incessante. Só que
ela não é uma avaliação formal, ela até chega a ser formal, mas essa avaliação contínua é o
acompanhamento desse aluno. Então a primeira coisa que eu acho que é mais importante para
nós é que não tem um objetivo único. Então eu não tenho uma padronização que todos os
alunos precisam realizar certa atividade até o dia 20 de dezembro. Então eu não tenho essa
63
estipulação rígida, não tenho esse prazo rígido. Certamente eu tenho um prazo, mas esse meu
prazo varia conforme minha avaliação, ou seja, minha avaliação é flexível também de acordo
com a criança, de acordo com cada tipo de criança, ritmo de aprendizagem, tempo de
aprendizagem, tipo de criança, capacidades da criança. Uma criança que em matemática é
excelente, dessa eu vou exigir mais. Uma criança que na linguagem tem dificuldades, vou
amparar, vou exigir menos em termos assim de resultados. Então ela é muito individual, não
tem um prazo e ela é variável. O que ajuda muito é ter um professor que segue a criança.
Então a gente tem um professor de classe que segue a criança. Então esse professor de classe,
como ele conhece muito bem a criança, ele sabe todo dia se a criança está bem, se a criança
não está bem, se conquistou alguma coisinha a mais ou se está há um mês sem conquistar
nada e aí precisa sim ser tomada alguma atitude, se está há um semestre sem conquistas ou
conquista todo dia um grãozinho de areia, está bom, não vai chegar à meta que eu imaginaria,
mas está todo dia conquistando alguma coisa e está chegando, partindo de uma heteronomia e
está indo em direção a uma autonomia. Então isso para nós é muito importante.
EU: O que fazem com os resultados obtidos através da avaliação, como é feito esse ato de
auferir o desempenho escolar do aluno? Como encaixam a avaliação no processo de ensinoaprendizagem? Qual a sua relação com o exercício do planejamento? Defendem algum
modelo?
ENTREVISTADO: Então, a gente tem um modelo, a gente tem uma meta, a gente quer
chegar a algum objetivo naquele semestre ou no ano, enfim, essas metas estão bastante claras.
Existe uma avaliação formal, por exemplo, todo final do ano há um boletim descritivo, ou
seja, eu descrevo o desenvolvimento desta criança na matemática, na linguagem, no social, no
grupal, no ritmico, na música, ou seja, em todos os seus…No seu desenvolvimento ela recebe um processo… Uma descrição que os pais recebem. Existem também sempre o processo de
é… O trabalho com os pais, ou seja, durante o ano, pelo menos duas, três vezes, para uma criança que está se desenvolvendo bem, nós temos contato com esses pais e passamos,
conversamos e dizemos para eles o que está acontecendo, esteja ela indo muito bem ou muito
mal, a gente sempre está trabalhando com os pais e contando o que está acontecendo. A
criança, a gente quer que ela atinja um objetivo e ela, como eu disse, ela é avaliada
constantemente, todo dia eu sei o que está acontecendo e se não está acontecendo nada eu
certamente vou atender essa criança imediatamente. Então, num mês que não conseguiu, no
processo de alfabetização, não conseguiu perceber a letra, não conseguiu perceber o fonema e
64
não está conseguindo juntar, silabar, por exemplo e eu achei que já deveria estar silabando e
não está silabando… Então, eu vou interferir, eu vou proporcionar mais, vou proporcionar uma ajuda, vou chamar essa criança, vou fazer um jogo diferente, vou atendê-la de uma
maneira que ela possa se apropriar desse conhecimento. Então, a avaliação é contínua e a ação
para reparar ou para atender a criança também é continuada.
EU: Sempre se entendeu que avaliar o aluno era verificar o quanto ele havia assimilado do
conteúdo a ele passado pelo professor. O que consideram que possa ter feito com que os
educadores repensassem essa forma de avaliar até chegarmos às novas concepções de
avaliação que temos hoje? A escola Waldorf passou, ao longo do tempo, por algum tipo de
transformação de suas concepções (e seus consequentes reflexos na prática) avaliativas? Se
sim, quais e por quê?
ENTREVISTADO: É, o quanto um aluno aprendeu né Victor é tão relativo isso né, é tão
difícil quantificar e é por isso que a gente não quantifica. Uma pergunta pode ter tantas
respostas e a gente tenta ter muito cuidado com isso, que não seja uma maneira de avaliar que
rotule e que feche. Então eu vou fazer uma, não vou dizer que é uma prova porque a gente não
faz prova para os pequenos, então até o quarto ano a gente não tem avaliação formal, mas a
gente tem ditado, a gente tem ditado de números, a gente tem contas que eles fazem que a
gente acompanha, que a gente vê fazer, a gente está o tempo inteiro com eles …Lição de casa, né? Então, não tem assim uma maneira formal, mas a gente está sempre vendo o que eles
estão fazendo e nós estamos sempre indagando, fazendo perguntas, fazendo perguntas da
matéria, do que foi realizado, do que foi feito e sempre existem respostas diferentes. Por
exemplo, vou te dar um exemplo: eu não coloco “dois mais dois” é o quê porque só tem uma resposta. Eu coloco “quatro é igual ao que? E aí ele vai falar “três mais um”, “vinte menos dezesseis”, “cem menos noventa e seis”, enfim, você vê, a possibilidade de respostas é muito maior do que “dois mais dois”, é muito restrito, absurdamente restrito. Então, a gente
proporciona que esse aprendizado seja muito mais amplo e não seja se uma resposta, seja de
várias possibilidades e de abordagens. Então uma criança consegue ver “só isso”, uma criança consegue ver “um monte”, uma criança só vai fazer “dois mais dois”, “quatro” é “dois mais dois”, é o que ela consegue nesse momento, ela não pode passar um ano fazendo isso, mas e o outro falou que é “cem menos noventa e seis”, é que ele já deu um passo imenso e eu vou tentar alimentar esses dois de maneiras diferentes. Mas se a gente teve mudanças… Eu acho que a gente sempre tem mudanças porque as crianças são outras, os pais tem demandas
65
diferentes, o mundo tem…Gerações diferentes… Então tudo isso muda e a gente também
muda, tanto que temos feito mais avaliações, mais devolutivas para os pais que demonstram
uma ansiedade em relação a saber como seu filho está, como ele se desenvolveu, então a
gente tem feito mais avaliações formais para os pais, para que eles se sintam mais tranquilos
em relação ao processo. Mas eles também sabem que para uma criança está muito bom se ela
faz “dois mais dois” e para outra criança que fez “dez menos seis”, poderia ter feito mais e eu vou encher a paciência desse que fez “dez menos seis”, eu vou falar “Victor, você sabe, me faz mais uma vez, faz mais um outros que eu quero, eu quero mais um ‘quatro é o quê’, me dá mais uma ideia aí” porque você sabe que a criança tem outras condições, mas porque eu conheço. Então mudamos, mudamos acho que precisamos sempre. A ideia que uma pergunta
não tem só uma resposta correta eu acho que isso é algo que cada vez mais a gente tem
trabalhado com essa possibilidade de um diálogo maior com o aluno. Então uma resposta
entranha, mas da onde você tirou isso? Como é que você vê isso? Quer dizer, tentar perseguir
o caminho que essa criança está fazendo… A lógica de pensamento, o caminho, que estrutura ele usou, da onde ele partiu, onde ele está chegando, onde ele está, onde você está menino,
deixa eu descobrir onde você está para eu poder te ajudar, não sei onde você foi parar, mas me
conta. Então esse diálogo, esse interpessoal professor-aluno precisa estar bem respaldado,
ancorado para que a gente possa ajudar e mostrar não olha, ele pensou dessa maneira, olha
que legal ou alguém entendeu o que que ele está dizendo, alguém pode ajudar? Ah eu entendi
professora, ele está dizendo isso, isso e isso porque… Ah, entendi, estou conseguindo né porque a gente como professor é “dois mais dois é o quê?” A gente só tem o “quatro” na cabeça, não tem outra coisa, entra bitolado em sala de aula, mas os alunos tem uma riqueza
muito maior.A gente tem só a aprender com eles.
EU: Quais as relações entre a filosofia antroposófica e as práticas avaliativas adotadas pela
Pedagogia Waldorf?
ENTREVISTADO: Eu acho que sempre é… A gente pode aproveitar de todas as filosofias né, todas as linhas pedagógicas sempre tem algo a contribuir e eu acho que a Pedagogia
Waldorf também tem algo a contribuir. A Pedagogia Waldorf, ela passa por uma visão do ser
humano. Então ela tem, muito forte que nos norteia, é uma visão de ser humano que está
ligada à antroposofia. Então todo professor que trabalha aqui, ele tem uma concepção de ser
humano, do que que é constituído o ser humano, ao que ele veio, ao que ele se presta, pra
onde ele vai, ou seja, algumas perguntas assim esses professores se colocam na sua formação
66
e chegam então a uma visão do que consiste esse ser humano e ao que ele se presta na Terra,
qual é a nossa utilidade. Então isso é o que nos…Então essa visão do ser humano né, isso é importante para esse professor que está ligado a essa ideia antroposófica, mas a partir daí a
Pedagogia Waldorf trabalha com práticas que atuam muito nesse desenvolvimento dessa
criança de uma maneira adequada a cada faixa etária e que desenvolva a criança nesse
panorama integral, ou seja, uma parte intelectual, que a gente acha super importante, uma
parte mais psíquica, mais ligada ao sentimento e uma parte mais da atividade, ou seja, do
atuar, do fazer. Então esse três âmbitos são sempre levados em consideração em cada aula, em
cada momento que todos passam por todos esses âmbitos do ser humano, que ele não é só
exigido intelectualmente, mas ele também é exigido no seu fazer, na sua corporalidade e
também é solicitado no seu sentir, na sua psique, isso também sempre é abordado. Então isso
eu acho que é algo que… E a nossa avaliação ela passa por aí também, você entendeu? Então ele está indo bem na matemática? Está indo bem na matemática… Como ele lida com o social, como ele lida com o respirar com os seus amigos, como ele lida com a prática com
seus amigos, como ele recebe as histórias, as narrativas que eu trago? Então tem um lado… Como ele se motiva, no que que ele consegue se motivar com conteúdo, ele consegue se
envolver com a matéria ou ele está apático e não presta atenção, não está nem um pouco
interessado? Então tem algo também do sentimento que está tomando né. E o terceiro âmbito
é o fazer, como é que ele está? Ele está trabalhando? Ele realiza o trabalho? Ele faz um bonito
caderno? Ele faz um desenho? É colorido ou é banco e preto ou… Ele capricha ou é deslexado, ou seja, isso tudo passa por uma avaliação nossa. Então não é só ele faz “dois mais dois”, é uma das muitas possibilidades, mas todo ele é visto como um ser humano, inclusive
físico, ele está se desenvolvendo fisicamente? Ele está crescendo? Ele está colorindo? Ele está
tendo habilidades motoras ou ele está absolutamente restrito? Então é visto integralmente e
não só por suas capacidades cognitivas, não só como papel de aluno. Ele ajuda seus colegas?
Ele ajuda a limpar a classe? Ele se ativa pra isso se eu me ativo? Ele trabalha na jardinagem?
Ele ajuda o aluno que derrubou tudo no chão? Como ele lida com as outras práticas da vida
…Personalidades. No que ele desponta? Ah ele desponta na matemática. Não, ele
absolutamente quando vai na jardinagem, ele trabalha… Isso, mas isso tem valor pra gente. Uma criança que trabalha muito no jardim tem um valor tão grande quanto o sujeito que faz
muito bem a matemática, não é menos. Ele tem essa aptidão e por aí eu posso entrar pra fazer
muitas outras coisas… Vamos fazer conta aqui no jardim… Quantas cenouras tal, se eu dou metade pro Victor, metade pra mim, como é que vai ficar, ou seja, a partir do que ele tem já
67
como uma característica, um perfil psicológico, um perfil também de aptidão pessoal que a
gente procura explorar.
EU: Segundo a perspectiva da escola Waldorf, em que a escola "peca" ao avaliar seus alunos,
hoje?
ENTREVISTADO: Eu acho queEscolaWaldorfpecaas vezes um pouco por não trazer
suficientes avaliações, resultados de avaliações para os pais e eles se enchem de ansiedade,
então isso é um problema. Os alunos entre si, eles não tem essa cultura até o 5º, 6º ano. Então
dentro de sala de aula eles não tem essa preocupação porque eles sabem e a gente mostra no
que eles são bons e a gente mostra, inclusive, isso é uma coisa social. Então veja lá olha o
Victor, ajude o Victor na matemática porque está difícil, então o colega vai lá, mas sabe que o
Victor, quando ele desenha… Olha, ninguém desenha igual. Então, também é uma coisa que socialmente é interessante lidar com essa diversidade e mostra que as pessoas são diferentes,
mesmo assim tem valores indescritíveis. Então entre os alunos não tem essa ansiedade, nos
professores a gente sabe tanto deles que a gente não tem essa ansiedade, mas eu acho que a
gente peca como professor é falta de avaliação para os pais, para a gente a gente sabe onde
eles estão, mas nós estamos tendendo cada vez mais a entrar na maré do que o mundo está
pedindo aí fora. Está certo por um lado? Está certo porque ele vai fazer vestibular, a gente
precisa preparar, então a partir do 5º, 6º ano tem provas, começa a ter nota, blábláblá e o
colegial vai fazer prova como todas as outras escolas para se preparar para fazer multipla
escolha, pra preparar para fazer isso, para fazer aquilo, para fazer aquilo outro. Então a gente
vai entrar nisso para preparar o aluno, está certo, agora eu sinto que toda a vez que a gente
entra com uma prova assim formal é difícil fazer uma avaliação bem feita, é muito difícil
fazer uma avaliação bem feita, uma correção bem feita, a não ser que seja múltipla escolha e
faz aquela coisa lá e acabou, que eu acho que agrega muito pouco, mas uma avaliação ela
precisa… construir né, fazer, realizar, formatar uma boa avaliação, depois uma boa correção e eu acho que toda a gente vai para avaliações que restringem, a gente está perdendo muitas
qualidades dos alunos, muitas qualidades individuais, muitas potencialidades, está
uniformizando, padronizando, passando a régua e passa a régua por baixo né, a gente passa a
régua abaixo da média mais interessante e restringe. Então os alunos daqui muitas vezes vão
fazer provas lá fora e eles se dão mal porque escrevem um monte e escrevem o que é
interessante e o que poderia ser mais um adendo, ou seja, eles são criativos e querem trazer
uma diversidade ao conteúdo e não se restringem muitas vezes ao que é perguntado que é
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muito raso muitas vezes. Então a gente entra muito na maré porque é o que o mundo está
pedindo, é o que o vestibular pede, o ENEM, papapi, papapá… Então a gente acaba entrando nisso também.
EU: Nos três níveis de ensino (fundamental, médio e superior), a avaliação ainda se realiza
mais como forma de condenar o aluno do que para que se descubra em que pontos frágeis é
preciso ajudá-lo, não? Para que se avalia, afinal na concepção da Pedagogia Waldorf? (qual a
intencionalidade da avaliação segundo o formato estabelecido pela escola, para que ela serve
na trajetória educativa dos alunos e que espaço deve ocupar no processo de ensinoaprendizagem, e como?)
ENTREVISTADO: Eu concordo com esse pensamento, eu acho que é o que acontece e
também aqui dentro ele acaba acontecendo, não sempre, mas é um perigo, é um problema que
acontece bastante e a ideia é você tentar ver onde ele está e tentar dali ajudá-lo, ajudar a
transformar.
EU: Mudar a forma de avaliar não pressupõe mudar também a relação ensino-aprendizagem?
Se não se vêem as disciplinas curriculares de forma contextualizada, como um meio para se
chegar a ser um cidadão crítico e bem preparado, mas sim como conteúdos estanques que se
dominam muito mais pela memorização; se não se leva em conta o conhecimento e as
informações que o aluno traz para a escola e que dão um tom diverso àquilo que ele recebe ou
troca com o professor, e sim vê-se o aluno como uma tábula rasa a ser preenchida, acaba-se
avaliando também à moda antiga, não?
ENTREVISTADO: É, é a ideia do balde vazio né que a gente vai encher esse balde de
conhecimento né. Pois é, isso é muito sério, cidadãos críticos a gente não vai conseguir se a
gente encher um balde, passivamente enchendo esse balde e não levando em conta que eles
tem um conhecimento tácito, eles já tem um conhecimento de vida, eles já tem vivências,
experiências, eles trazem características pessoais, são indivíduos e por isso a visão de ser
humano é uma coisa que nos ajuda na nossa prática diária que a gente não acha que ele é uma
tábula rasa, ele tem um porquê de existir e nesse sentido explorar, acho que o conteúdo, ele
não é um fim, o conteúdo é um meio e se eu penso o conteúdo como um fim, eu vou enfiar
esse conteúdo goela abaixo, o tanto que eu preciso, no tempo que eu preciso e vou abrir a
boca do passarinho e enfiar conteúdo goela abaixo e vai descer o quedeu,deu, o que não deu,
69
não deu. Se pelo outro lado, eu trabalho esse conteúdo com uma possibilidade de
desenvolvimento dessa criança em seus múltiplos aspectos e não apenas o cognitivo e se esse
conteúdo ajuda que essa criança se desenvolva também na sua psique, nos sentimentos, ajuda
com que ela tenha valores, ajuda na passagem de valores, de tradição, de princípios, de
aspectos de encarar o ser humano, de encarar o desenvolvimento da humanidade, se ela
também proporciona que essa criança possa, a partir de si, elaborar os conteúdos, ou seja, uma
aula, assim vamos dizer socrática, onde eu trago o estímulo e a partir desse estímulo nós
vamos elaborar alguma coisa, aí eu estou formando um ser humano crítico e bem preparado.
Se eu vou encher goela abaixo, eu estou só passando informações e vou fazer com que ele
decore aquilo e aquilo vai ocupar um espaço desnecessário e o conteúdo é um meio, ela é uma
possibilidade, as coisas tão interessantes que a gente tem pra passar que elas trazem
multicoloridos, não é só ler, escrever e contar que ele precisa fazer ao sair da escola, mas o ler
implica em um montão de coisas, o escrever implica em mais um monte de coisas e o contar
implica em mais muitas coisas. Então acho que o objetivo da pedagogia é criar esse cidadão
íntegro, esse cidadão global, uno, multifacetado e que ele possa contribuir com a sociedade,
mas para isso ele não poder ser preenchido de conceitos e de ideias, ele precisa elaborar, ele
precisa ser ativo, proativo nesse processo. Não pode ser passivo, só passivo.
EU: As demandas são as mesmas nas outras faixas de ensino ou, à medida que vai se
chegando perto de se precisar ocupar uma vaga no mercado de trabalho, a avaliação que a
escola faz de seus alunos deve mudar?
ENTREVISTADO: A avaliação começa sem nada de avaliação e devagar a gente vai
introduzindo ele nesse mundo como ele é. Mesmo assim Victor, a gente preza muito formas
de avaliação que não sejam essas tradicionais, muito, muito, muito, muito... Se, não tivesse
vestibular com esse formato, a gente faria mais diferente ainda do que a gente já faz porque eu
não acho isso de valia assim para avaliar um ser humano, talvez seja o mais prático, o mais
rápido que se encontrou até agora, eu compreendo isso, mas eu acho... Imagine, você não vai
ter um médico, mas que seja um músico, você não vai ter um médico mais que tenha... Você
só tem médicos padronizados, médico é só o cara que gabarita lá a primeira fase da USP. Que
tipo de gente faz isso? Será que um cara que faz 50 pontos não poderia ser melhor ainda,
como um futuro estudante de medicina? Então, assim, tem perguntas que acho que tem
respostas complicadas e teriam outras maneiras de fazer, por exemplo a Escola da Cidade, não
sei se você conhece, que faz arquitetura lá no centro da cidade: ela tem uma prova, uma
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redação como seleção né, processo seletivo, uma redação e uma entrevista, está certo que é
um curso, duzentos candidatos, sei lá eu né, não é uma USP que tem um zilhão de candidatos,
ou seja, ali é diferente que pra mim faz mais sentido, faz muito mais sentido eu conversar com
alguém aqui, ver qual... “Por que que você quer fazer arquitetura? O que que te leva a fazer arquitetura? O que que você já fez relacionado a isso? Qual é a sua motivação? Ah, quero
ganhar dinheiro com isso. Será que é esse cara que eu quero fazendo o meu curso? Não, adoro
desenhar ou fico desenhando em casa ou imagino como vai ser O Palácio do Governo... Não
importa a resposta, mas eu posso avaliar que tipo de relacionamento ele tem com essa futura
profissão que ele está querendo abraçar. Então se o mercado não fosse como ele é, nos
faríamos acho que ainda mais diferente.
EU: Novas formas de organização curricular, como os cursos de formação continuada,
pressupõem novo olhar sobre o aluno, não? Como promover essa mudança de olhar na
escola? (como a avaliação é tratada na formação de professores da Escola Waldorf?).
ENTREVISTADO: Eu acho que falar de... Quando um professor fala que está ótimo, que faz
tudo certo, que ele é perfeito, está na hora de ele ir embora (risos), se aposentar ou ir embora
porque a gente nunca está bom o suficiente para lidar com criança. Acho que universitários é
outro papo porque a gente se defende do mundo, mas com criança o cara precisa estar
eternamente em retrabalho. Talvez ele não precise ir num curso, mas ele precisa trabalhar em
si, se informar, precisa aperfeiçoar, se atualizar, “Por que que eu não dou conta desse menino?”, se perguntar, se analisar criticamente, se ele não faz isso, acho que não tem como estar na frente de criança. Então, é... Eu acho que qualquer professor tem que estar num
processo de educação continuada, assim, talvez não agora, mas amanhã, depois de amanhã,
precisa estar realmente promovendo isso, a gente promove isso aqui na escola inclusive isso
aqui eu vou te dar, esse é o nosso catálogo de programa de implemento de atualização,
reciclagem, é estar revisitando aspectos da pedagogia e a formação também contempla essa
ideia da avaliação, ela sempre precisa ser olhada, trabalhada. Contudo, acho que precisa ser
mais porque eu acho que nós erramos muito nas avaliações que fazemos. Eu te falei, acho que
fazer uma prova bem feita é muito difícil, é muito difícil, a gente faz coisa muito burra,
desculpa a palavra, mas é muito simplório, é muito restrito e é limitante, não é para
desenvolver porque se numa prova o cara “ta” aprendendo, melhor ainda, de repenteou com dicionário, ou com uma calculdadora... Eu não sei, ou em dupla, ou seja, se eu proporciono...
Se ele está ali pressionado para apresentar um resultado com perguntas restritas, a o estudo
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para preparação dessa prova torna-se artificial e chata. Por exemplo, a gente estava fazendo
um exemplo disso num segundo ano que eles fazem muita taboada que é um momento que a
gente acha bem propício para interiorizar a taboada, a gente precisa decorar de alguma
maneira. Então a gente pegou assim quatro, cinco alunos, oito anos de idade e colocamos os
números aqui ó, então “uma vezes três é três, duas vezes três é seis e blablabla”... Agora, vocês, sabendo desses resultados, inventem uma maneira de como a gente pode memorizar
isso ritmicamente, coporeamente. Então assim, tipo, pula “uma vezes dois é igual a dois” (cantando), ou seja, fazendo movimentações ou pulos ou saltos ou um pergunta para o outro,
enfim, no grupo eles resolvem como é que a gente decora esse negócio. Então só desse
trabalho eu estou dando muito mais subsídios para o aprendizado e para já decorar e já fazer a
prova do que se ele tiver em casa decorado e depois eu escrevo as perguntas e ele responde.
Ele trabalha em grupo, ele ganha autonomia em relação ao aprendizado, ele é copartícipe, não
fica chato porque ele está lá com os amigos tentando, pula, salta, bate, joga a bola, “uma vezes três é igual a três”, “duas vezes três é igual a seis”, enfim e depois apresenta para o
grupo ainda. Então eu acho que isso tem muito mais valor do que a porcaria lá “uma vezes quanto é quanto”.
EU: A tradicional prova, que se faz periodicamente, é condenável, hoje, na escola, afinal, ou
tem algum valor? (Qual a metodologia avaliativa utilizada pela Escola Waldorf, há um
formato padrão para as escolas da Pedagogia Waldorf ou cada instituição tem a liberdade de
particularizar as suas práticas avaliativas? Há instrumentos? Quais são eles?).
ENTREVISTADO: Eu acho que ela tem um papel, mas como um dos instrumentos de
avaliação, não o instrumento, mas um dos instrumentos de avaliação, ela tem a sua função. O
problema é que muitas vezes ela é o único, mas se ela é um dos e se a minha criança pequena
não está sofrendo com isso eu acho que não tem, não é um problema, mas ela não pode ser o
único. Se ela é o único, aí eu acho que ela não tem qualidade, mas como um todo, eu acho que
não está errado desde que as crianças não estejam sofrendo, por isso que com os pequenos a
gente não faz porque acaba tendo uma conotação muito de ter um resultado que ela tem que
apresentar e que muitos não estão em condições ainda. Isso marca, isso traz traumas,
resultados... Não gosta daí da escola, não gosta do professor, não vai bem, não consegue e fica
rotulado, você fica com aquele rótulo “não sei fazer matemática” que não é verdade, todo mundo sabe fazer matemática de uma ou de outra maneira. Então eu acho que ela tem o seu
papel, tem a sua contribuição, mas ela precisa ser bem empregada e bem pensada porque nem
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prova é fácil de aplicar, fazer. Então tem que ser muito bem feito, muito bem pensado e aí
cada escola, as escolas tem uma certa autonomia, a direção, o corpo pedagógico pensa um
pouco, discute, mas é muito esse papel de estar discutindo e conversando sobre o assunto nas
suas reuniões como fazer, “vamos fazer mais, vamos fazer menos, estamos indo bem, estamos indo mal”, ou seja, a avaliação da situaçao da escolae se der, fazer mais ou menos, como também cada professor tem um pouco essa autonomia, “minha classe está traumatizada, está péssima em negócio de prova, não vou fazer por enquanto, vou fazer outras maneiras, ditado,
a gente vai brincar, vamos fazer aqueles negócios de taboadas...”. Então ele tem também essa autonomia de não precisar aplicar isso e mostrar um resultado dessa e dessa maneira. Tem o
boletim que todo professor escreve sobre seu aluno e para os alunos a gente dá também um
impresso. A escola também não está presa a um modelo da Pedagogia Waldorf, o professor
pode falar “olha, eu acho que a minha classe precisa de uma avaliação, eles estão se achando, estão não sei o que, não estão dando atenção, eu vou colocar todo mundo numa avaliação para
que eles percebam um pouco como eles estão”. Então ele justifica o porquê ele está fazendo
isso, mostra para os pais “vou fazer isso por causa disso, disso e disso ou não vou fazer esse ano”, é de acordo com as necessidades do grupo. Ele tem essa autonomia desde que ele saiba justificar, não é que cai do céu e por isso que a avaliação deve ser flexível, sempre flexível e
cada escola tem a sua maneira, cada escola tem essa autonomia e cada classe, cada professor
também tem. Para cada criança a gente dá um poema no final do ano, ou seja, digamos, você é
um moleque arteiro, sei lá eu, e eu tento fazer um poema, buscar um poema que fala de
moleque arteiro que tenta dominar os seus ímpetos e tenta... Voltado para o aluno, para a sua
personalidade. É uma maneira lúdica, poética de representar, de alguma coisa que você
precisa trabalhar. Ele consegue se identificar e ver algo que ele precisa transformar... Ou é
uma menina quietinha que não fala nada né, então, como fazer essa menina falar. É até um
feedback para o aluno saber como ele está sendo visto.
EU: Tem alguma proposta sobre como deveriam ser realizadas as avaliações do Estado para a
promoção de uma educação emancipatória e para a composição do IDEB, em que a Pedagogia
Waldorf poderia contribuir para essa discussão? Qual a contribuição que consideram que
podem fornecer para se problematizar as concepções naturalizadas de avaliação? Quais os
problemas? Em que residem, quais suas causas? Deveria haver algum modelo norteador ou
apenas ser seguido um princípio avaliativo sob diversas formas?
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ENTREVISTADO: A pergunta é difícil, é polêmica, bem polêmica, mas é... Ai, eu acho
muito... É que a gente ta lidando com seres humanos né, em desenvolvimento, isso é muito
sério. Se eu pegar os adultos e fazer uma avaliação eu não vejo tanto problema, mas eu estou
pegando seres em desenvolvimento fazendo uma foto de um momento que as vezes sai
descontextualizada, sai fora de foco, sei lá eu né, fazendo careta e ela é unilateral e eu acho
que isso é um pouco desleal com a criança, a gente tirar uma foto apenas do lado cognitivo
dela, se ela saber fazer dois mais dois ou não e naquele momento, naquele dia, naquelas
circunstâncias, naquelas condições sei lá eu o que aconteceu, eles são diferentes, a gente
percebe, tem dia que eles estão ótimos, tem dia que eles estão péssimos, ou seja, eu acho que
é muito sério a gente colocar as crianças numa caixinha assim, eu quase que prefiro... Se o
“Educa Brasil” me escuta ou o “Todos pela Educação” me escuta eles querem me matar porque eu entendo que as pessoas que governam e que orgãos queiram saber e medir a
educação dos países, eu entendo isso, mas eu acho que ela é unilateral, ela não vê a criança
como um todo. Eu acho que essa forma de medir, então, esse desempenho compromete a
qualidade da avaliação, distorce um resultado e tendencia um resultado, é completamente
classificatória e eu não acho muito simpático com as crianças assim, eu acho que a gente está
nivelando também de uma certa maneira. Eu entendo completamente a necessidade de ter,
mas eu acho que ela teria que ser diferente por se tratar de crianças, seres em
desenvolvimento, eu acho que a gente tem que ter mais respeito com ser em desenvolvimento.
Um adulto é outro papo, põe ele lá, avalia, faz o que você quiser ou ele se rebela e sai
correndo, ele tem mecanismos de defesa, mas com uma criança eu acho que não é correto da
maneira com que é feito, acho que precisaria ser um panorama mais amplo, mas que dá muito
mais trabalho, que é muito mais complicado, que envolve um monte de outras questões e mais
a qualidade do que quantidade né. Se tive algo mais qualitativo né.
EU: É importante que se tenha como quantificar os dados obtidos na avaliação do aluno? A
escola não precisa saber quantos alunos estão em determinada situação (avançando, aquém
das expectativas etc)? Não é necessário, para isso, instrumentos como notas ou conceitos? À
medida que se complexifica e deixa de ser uma cobrança do que foi ensinado, a avaliação
torna mais difícil também a quantificação dos resultados, não? Ao mesmo tempo, as redes
escolares precisam dessa quantificação... O que tem a dizer sobre este paradoxo existente nas
discussões sobre a avaliação da aprendizagem?
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ENTREVISTADO: Completamente, muito complicado você ter essa transformação, muito,
enos outros países a gente também não tem grandes transformações né, é tudo muito mais
ligado a uma prova, a um resultado formal. Eu gostaria muito de mudar a maneira de se fazer,
mas ela é muito complicada e muito problemática porque eu tenho que pegar alguns aspectos
da criança e não só um e isso acho que seria bem difícil, exigiria muito mais tempo, muito
mais gente, muito mais tabulação, muito mais trabalho, uma abertura maior nesses conceitos.
Uma criança para resolver problemas da vida, será que isso não seria super interessante? Uma
criança, você dá um problema manual, físico aqui e ela tem que resolver, montar um carrinho
com sete paus... Entende? Outras coisas que não sejam só aquela prova formal porque a
capacidade dessa... A capacidade humana vai muito além de uma prova formal e o que eu
quero estimular no meu aluno é muito mais do que uma prova formal. Então, eu entendo a
necessidade de medir, a gente vê aqui dentro que a gente tem essa medição, a gente sabe o
que está acontecendo, está sempre sabendo se está aquém, se está além, tem que saber, não é
que não tem que saber, tem que saber sempre muito bem o que está acontecendo e tomar
medidas logo.
EU: Consideram que a avaliação seja um espaço em que o docente tenha a oportunidade de
exercer mais incisivamente a sua autoridade frente aos alunos? Como a filosofia Waldorf nos
ajudaria a contra-argumentar este pensamento?
ENTREVISTADO: Não, poder ficar péssimo né, achar que a avaliação é um poder ou que o
prefessor tem um poder sobre o aluno está tudo errado. Se a avaliação tem um aspecto
criativo, eu acho que o aluno pode ser copartícipe, ele pode ser desenvolver, pode aprender,
pode ser participativo na avaliação e tornar aquele momento prazeroso, interessante, aprender,
pode se desenvolver na avaliação, pode até descobrir o quanto ele sabe a esse respeito, pode
cavar e olha, nossa... É um feedback e ele pode descobrir muita coisa e pode aprender muito
dependendo de como a prova é realizada. Poder é péssimo, acho que não tem outra coisa pior,
acho que o professor ele, dentro de uma sala de aula, ele pode ter uma autoridade, mas é uma
autoridade natural, não é uma autoridade de caneta, não é um autoritarismo. Ele pode ser uma
autoridade porque ele sabe trazer um conteúdo porque ele é uma pessoa interessante, no
sentido de referência por valores internos, valores de conquistas, valores de transformação,
valores humanos, valores de referência. A criança precisa de referenciais e o professor deve
ser um referencial, então ele tem uma autoridade interna, nata, não é uma autoridade externa
ou autoritarismo de caneta, ou essas coisas.
75
EU: Novas formas de avaliar são vistas pelos professores como tentativas de se camuflarem
resultados ruins e como imposição de que se aprovem mesmo os "maus alunos". Como mudar
essa visão?
ENTREVISTADO: Se a avaliação for inserida dentro do processo de ensino-aprendizagem
como algo natural que faça parte do dia-a-dia, algo que está inserido na sua prática e não é
algo... Como o ENEM é usado para você ter as melhores escolas de São Paulo, assim, elas
acabam faturando financeiramente com isso né, também distorceu completamente, e elas
mudaram o currículo para se adequar às perguntas do ENEM, quer dizer, o que eles querem
para os alunos deles né, deturpando completamente o sentido. Então acho que isso é muito
nocivo, pelo outro lado é a não reprovação, eu acho interessante desde que essa criança esteja
100% assistida, o que é o professor sabendo, acompanhando, não basta reprovar e abandonar
e também não basta carregar e não fazer nada, por isso a figura do professor é essencial, por
isso todo mundo tinha que investir no professor. Sala de aula a gente arruma mais ou menos,
passa uma pintura, não precisa de laptop, não precisa de computador, não precisa de um
montão de coisas, mas a gente precisa de uma pessoa extremamente capaz, extremamente
capaz e preparada e preparada não é só no mental, ela precisa ter metodologia de aula. Isso é
um pouco uma crítica às formações também que são muito teóricas e pouco ligadas a uma
prática de sala de aula. Então esse professor, se ele se engaja com os seus alunos, se realmente
está interessado nos seus alunos, ele vai fazer isso acontecer e ele vai fazer uma educação
continuada e vai fazer a criança que não está bem passar de ano, mas vai fazer com que ela
melhore ou num momento vai falar “não dá mais”, ou seja, o professor precisa estar muito
comprometido com a função dele, extremamente comprometido com essas crianças de
maneira a carregar ou não carregar por conta das condições que são possíveis e ele pode
avaliar e pode conduzir. Então avaliar para outros fins é o fim da picada né, é o fim da picada,
é usar os meios para os fins, os fins justifam os meios e aí está tudo distorcido, a realidade
completamente equivocada. Por isso eu digo, a avaliação é perigoso, avaliar criança do jeito
que a gente está avaliando acho que é desleal.
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APÊNDICE B – QUADRO DE CATEGORIAS DE ANÁLISE – ENTREVISTA NA
ESCOLA WALDORF RUDOLPH STEINER DE SÃO PAULO
Categoria de análise
Concepção de avaliação
Abordagem da entrevista
A avaliação deve ser contínua, diária e
incessante. Não deve ser formal até o 5º
ano do EF, quando ela então passa a
assumir formatos mais tradicionais
mediante a demanda externa que
pressiona uma formação voltada para os
vestibulares e o mundo do trabalho.
Representa o acompanhamento da
trajetória escolar de cada aluno mediante a
dimensão processual pela qual é
concebida na escola. Possui flexibilidade
de acordo com cada criança e com os
diferentes ritmos de aprendizagem. É
individual, não tem prazos rígidos e é
variável. A avaliação é integral,
perpassando por três dimensões que
compõem o ser humano: intelectual,
emocional e comportamental.
Avaliação no âmbito da formação de Possuem programa próprio de formação
de professores – programa de implemento
professores
de atualização e reciclagem (catálogo de
cursos disponibilizado). É uma forma de
revisitar aspectos da pedagogia, dentre
eles, a avaliação da aprendizagem. Há o
reconhecimento, contudo, de que há a
necessidade da avaliação ser mais
trabalhada, deve ser sempre aperfeiçoada
dada a sua importância na busca pela
qualidade na educação. Nesses debates,
constatou-se que ainda se avalia muito
erroneamente na escola e que a ela deve
ser encarada como mais um momento de
aprendizagem e como uma demonstração
de tudo que se aprendeu até momento,
sem atribuição de sentido ao conteúdo.
Aplicabilidade dos resultados obtidos Avaliação não tem um objetivo único, é
pela avaliação/Papel e funcionalidade elaborada tendo sempre em vista metas
claramente delimitadas ao início de todo
da avaliação
ano letivo. O acompanhamento contínuo
do desempenho apresentado por cada
criança propiciado através da avaliação
permite ao professor um conhecimento
permanente e sempre atualizado sobre a
situação de seus alunos e subsidia a sua
intervenção pedagógica em processos que
77
apresentam dificuldades de aprendizagem.
Instrumento de Avaliação
Variedade de instrumentos avaliativos nos
anos iniciais do Ensino Fundamental.
Exemplo: boletim descritivo, uma
compilação da análise avaliativa do
desenvolvimento de cada criança nas
diversas disciplinas escolares ao longo do
ano direcionada aos pais e aos próprios
alunos. A partir dos anos finais do Ensino
Fundamental até o Ensino Médio,
aplicam-se provas formais e tradicionais,
simulados e testes baseados nos modelos
estipulados pelos processos seletivos para
ingresso no Ensino Superior.
78
ANEXO A –BANCO DE DADOS – LINKS DE ACESSO
Análise Documental
https://www.dropbox.com/s/aww67k1di4wpfsk/Alessandra%20Pimentel.pdf
https://www.dropbox.com/s/d56hbbmm4bl2gcl/Jackson%20Ronie%20S%C3%A1-Silva.pdf
Avaliação e TICs
https://www.dropbox.com/s/ic7g3tnop5zfof9/Caldeira%20PUC%282004%29.pdf
Concepções de Avaliação
https://www.dropbox.com/s/wr3jhqthftihcsc/Andrade%20Revista%20FAST%20Site%20%26
%20Insight%202001%20p.41.pdf
https://www.dropbox.com/s/4hjbwiq374dbt3h/PintoSilva%20PUCPR.pdf
https://www.dropbox.com/s/wbijqdi82dfbrgc/SouzaBoruchovitch2010ed%20em%20revista.p
df
https://www.dropbox.com/s/x6cz9m9lruuco8n/Depresbiteris%201995%20FDE.pdf
https://www.dropbox.com/s/2wdc238fioti46o/Souza%202004%20UEL%20estudos%20em%
20av%20educacional.pdf
https://www.dropbox.com/s/wr2060qikmrmi5g/SouzaBoruchovitch2010ed%20proposi%C3%A7%C3%B5esunicamp.pdf
https://www.dropbox.com/s/utaj2aeugfdefp3/NetoAquino2009ed%20em%20revista.pdf
https://www.dropbox.com/s/9x63cl3ekqwuehd/SouzaBoruchovitch2010%20ed%20e%20pesq
uisa.pdf
https://www.dropbox.com/s/nxpelkococqkarq/Wachowics%20CEE%20PR%20%282005%29
.pdf
Dimensões de Avaliação
https://www.dropbox.com/s/am936iwtz0ivf88/LudkeSordi%282009%29unicamp.pdf
História da Avaliação
https://www.dropbox.com/s/tpx0ksc3bricdqk/GiustiLopes%282007%29puccamp.pdf
Títulos encontrados no Banco de Teses da Capes sobre Avaliação da Aprendizagem Escolar
https://www.dropbox.com/s/buys2elyzn87yzq/T%C3%ADtulos.doc
Download

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO ESCOLA DE