Em cada canto uma dor
Terezinha Hueb de Menezes
É uma terça-feira. Aguardo, no último banco de uma das alas da igreja, o início da
missa. Poucos fiéis, neste momento.
Distraidamente,
olho à
minha
direita,
na
outra
ala
dos
bancos;
quase
na
extremidade, vejo uma bela moça, loira, de cabelos compridos. Observo melhor a
desconhecida e vejo que chora, o rosto congestionado, profundamente triste.
Sinto-me
incomodada.
Geralmente,
lágrimas
simbolizam
dor.
A jovem,
com
certeza, está sofrendo. Não me contenho. Sento-me a seu lado e lhe pergunto se
posso ajudá-la. Recebo, como resposta, um frágil não. "Não quer conversar?"
insisto. Outra negativa. Digo-lhe, então, da necessidade de nos agarrarmos com
Deus e da força da oração nos momentos difíceis. "Por isso estou aqui", ouço-a em
meio ao pranto.
Torno a insistir: "É caso de morte? De doença?" Mais uma negativa. Aventuro-me,
então, a novas palavras: que não sendo problemas de doença ou de morte, a
solução seria mais fácil; que ela tivesse fé; que no dia seguinte, possivelmente,
aquilo que lhe parecia, naquele momento, sem solução poderia resolver-se. Deixolhe, enfim, meu nome e local de trabalho, caso ela quisesse conversar em algum
momento.
Volto ao meu lugar. De vez em quando, observo a moça triste. Ela não está no
templo para participar da missa. Permanece o tempo todo assentada, absorta ,
talvez,
nos
problemas
que
a
afligem,
possivelmente
num
turbilhão
de
pensamentos, ou em compasso de espera, espera desanimada e triste.
Tenho a impressão de que a sua ânsia, naquele momento, se traduz por um canto.
Um lugar onde pudesse chorar, quietinha, onde conseguisse ouvir o silêncio de
Deus em sua alma aflita, onde conseguisse isolar-se do mundo. E o lugar era a
casa de Deus.
Passado um tempo, quase ao final da celebração, não mais vislumbro a moça triste.
Desaparecera, indo, talvez, ao encontro de sua dor. Ou, talvez, buscando outro
rumo para dela fugir...
Fico pensando: há tantos motivos no mundo para alegrar um ser humano; mas há
tantos outros a entristecê-lo. O que causaria tanta tristeza naquela jovem? Tanto
silêncio? Tanto pranto? Seria um amor frustrado, desfeito por motivos alheios aos
seus? Atritos no seio familiar, gerando conflitos, cuja solução estivesse fora de suas
possibilidades? Uma gravidez inesperada, talvez, cavando medos e dúvidas em seu
íntimo ou a falta de coragem para enfrentar namorado, família, sociedade?
São intrincados os meandros da vida humana. E é profunda a solidão de quem
sofre, porque a dor, muitas vezes, exige intimidade do ser consigo mesmo,
impossível de ser compartilhada. Principalmente quando não se encontram saídas e
parecem empanar-se as nuvens da esperança.
A dor é solitária, intransferível, e por mais que queiramos ajudar uma pessoa que
sofre, em algum lugar de seu coração, de seu íntimo, ela, com certeza, saberá que
o cerne de sua história de dor só poderá ser digerido por si própria, na alternância,
nem sempre fácil, de suas forças e fragilidades, escoradas, sempre, no sopro de
Deus.
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