RELATÓRIO DE PESQUISA Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada – CEPEA / ESALQ / USP ANÁLISE PROSPECTIVA DOS MERCADOS DA FIBRA E DO CAROÇO DE ALGODÃO EM RELAÇÃO À QUALIDADE: O PONTO DE VISTA DA PRODUÇÃO E DO BENEFICIAMENTO Coordenação: Prof. Joaquim Bento de Souza Ferreira Filho Jean-Louis Belot Catherine Marquié Equipe: Carlos Eduardo Carneiro Ballaminut Lucilio Rogerio Aparecido Alves Luis Felipe Tiene da Silva Piracicaba, São Paulo, Brasil Junho de 2005 SUMÁRIO LISTA DE TABELAS.............................................................................................................. 1 RESUMO .................................................................................................................................. 1 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 1 2 OBJETIVOS GERAL E ESPECÍFIC0S......................................................................... 3 3 JUSTIFICATIVA .............................................................................................................. 4 4 METODOLOGIA E HIPÓTESES .................................................................................. 5 5 ESTUDO DO MERCADO................................................................................................ 6 6 5.1 A COTONICULTURA BRASILEIRA .................................................................................... 6 5.2 A COTONICULTURA MUNDIAL ........................................................................................ 8 RESULTADOS E DISCUSSÃO: ANÁLISE QUALITATIVA DOS DADOS ECONÔMICOS .............................................................................................................. 11 6.1 SEGMENTAÇÃO DAS EMPRESAS SOBRE A BASE DAS ESTRATÉGIAS ECONÔMICAS .......... 11 6.2 AS ALGODOEIRAS E AS COOPERATIVAS ........................................................................ 15 6.3 CRITÉRIOS DE ESCOLHA DAS VARIEDADES ................................................................... 16 6.4 TIPOS DE FIBRAS E SEU DESTINO .................................................................................. 18 6.5 ESTRATÉGIA RELACIONADA À QUALIDADE .................................................................. 21 6.6 O CAROÇO DO ALGODÃO.............................................................................................. 23 6.7 PERCEPÇÃO DAS FIBRAS DIFERENCIADAS (LONGA, COLORIDA E ORGÂNICA)................ 24 6.8 ESTRATÉGIA DE COMERCIALIZAÇÃO DA FIBRA............................................................. 25 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................ 28 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 31 LISTA DE TABELAS Tabela 1. Quadro de suprimento de algodão em pluma no Brasil (em 1.000 toneladas)........... 8 Tabela 2. Produção e consumo de algodão em pluma nos principais países (em 1000 ton.)..... 9 Tabela 3. Importação e exportação de algodão em pluma pelos principais países (em 1.000 ton)..................................................................................................................................... 10 LISTA DE FIGURAS Figura 1. Evolução da produção brasileira de algodão em pluma por regiões, 1990/91 a 2003/04 ................................................................................................................................ 6 Figura 2. Evolução da produção de algodão em pluma por estados, 1990/91 a 2003/04 .......... 7 Figura 3. Evolução da produtividade do algodão em caroço nos principais estados produtores no Brasil, safras 1990/91 a 2003/04. ................................................................................... 7 Figura 4. Cadeia agroindustrial do algodão, com destaque para os primeiros elos ................. 12 RESUMO Este trabalho reporta os resultados de uma pesquisa que teve como objetivo identificar a necessidade de novas ações de pesquisa e desenvolvimento, visando melhorar a eficiência técnico-econômica da cadeia algodoeira no Brasil, especialmente nos estados do Mato Grosso e São Paulo, enfatizando os padrões de qualidade exigidos pelo mercado. O enfoque foi na absorção de novas tecnologias por parte do segmento produtivo, envolvendo produtores, algodoeiras (beneficiadoras) e esmagadoras de algodão. A metodologia utilizada corresponde a um estudo de mercado “clássico”. Para isso, foram realizadas consultas a agentes representativos do setor, bem como realizadas pesquisas sobre a utilização de fibras diferenciadas de algodão. Em termos gerais, os resultados apontam para o fato de a qualidade do produto brasileiro ter boa aceitabilidade nos mercados interno e externo e de ainda não haver remuneração diferenciada para o produto de melhor qualidade, mas apenas melhor comercialização em anos de oferta excedente no mercado interno. Para os produtores, a busca é por mecanismos e ações que reduzam o custo de produção, podendo até ser a utilização do produto transgênico, com pouca atenção para a qualidade intrínseca da fibra. Palavras-chave: algodão em pluma, qualidade, Brasil, tecnologia, caroço de algodão 1 1 INTRODUÇÃO Em termos gerais, o cultivo e o desenvolvimento da cultura de algodão requer investimentos pesados e específicos. Os custos elevados de produção, somados ao alto risco próprio da atividade, incertezas de mercado e competitividade com outros países produtores, cuja cultura é altamente tecnificada e/ou subsidiada, são responsáveis por aumentar consideravelmente o risco dessa atividade. A fim de minimizar estes riscos, é importante para os produtores otimizem os dispositivos de produção para reduzir os custos, destacando-se pela qualidade de seus produtos em relação à oferta mundial, para responder da melhor forma possível, aos mercados internos e externos. Produzir uma qualidade especial de algodão para responder a nichos de mercados mais lucrativos, ou uma melhor valorização dos subprodutos da cadeia algodoeira, poderiam ser soluções para aumentar a renda dos produtores e dos industriais. Os institutos de pesquisa nacionais ou internacionais podem trazer ajuda aos diferentes atores das cadeias algodoeiras, fazendo propostas de inovações técnicas para tornalas mais eficientes e competitivas no mercado internacional. Mas para que a difusão destas inovações técnicas seja rápida e melhorem significativamente o funcionamento das cadeias, é preciso, de um lado, explicitar a demanda de cada ator e, de outro, estudar o funcionamento das cadeias levando em consideração as relações entre todos os atores técnicos e institucionais. Dentro das perguntas de pesquisa mais importantes que permitiriam obter inovações técnicas, uma trata da “qualidade”. A palavra qualidade não tem o mesmo sentido quando é usada por um produtor, por um industrial do beneficiamento ou por um industrial têxtil. Porém, a qualidade é o resultado do conjunto dos elementos da cadeia algodoeira e têm que atender as exigências dos mercados. Quando o algodão oriundo do campo possui muitas impurezas, o industrial terá que aumentar os processos de limpeza tentando manter a qualidade intrínseca da fibra. Além disso, a qualidade dos produtos têxteis produzidos dependerá da qualidade da fibra fornecida pelo beneficiador e, a preservação e/ou a melhoria da qualidade têm um custo. Quando há inserção de inovações tecnológicas, é imprescindível que a margem esperada nesta implementação compense o custo globalmente e também individualmente, para cada agente da cadeia. Uma inovação técnica que melhora a qualidade da pluma só poderá ser difundida no caso de o comprador querer pagar mais caro e ele atender mercados 2 mais lucrativos. Nestas condições, não basta atender a uma demanda pontual de qualidade. É indispensável detalhar uma demanda coletiva para identificar as inovações técnicas a serem desenvolvidas para um objetivo comum de cada cadeia. 3 2 OBJETIVOS GERAL E ESPECÍFIC0S Diante do contexto supracitado, o objetivo geral deste trabalho é identificar a necessidade de novas ações de pesquisa e desenvolvimento, visando melhorar a eficiência técnico-econômica da cadeia algodoeira no Brasil, especialmente nos estados do Mato Grosso e São Paulo, enfatizando os padrões de qualidade exigidos pelo mercado no curto, médio e longo prazo. O enfoque está na absorção de novas tecnologias por parte do segmento produtivo, envolvendo produtores, algodoeiras (beneficiadoras) e esmagadoras de algodão. Especificamente, buscam-se: a) detalhar a oferta e a demanda nacional e internacional da fibra de algodão; b) definir ações de pesquisas a serem desenvolvidas para obtenção de inovações, enfocando, em especial, atributos de qualidade; c) identificar aspectos de que devem ser considerados para que os produtores possam estar dispostos a produzir algodão de melhor qualidade; d) identificar os fatores tecnológicos e sócio-econômicos a serem resolvidos para uma fácil apropriação das novidades pelos agentes. 4 3 JUSTIFICATIVA Estas análises se enquadram na perspectivas que os agentes envolvidos na comercialização possuem com a concorrência internacional do algodão em pluma, assim como de outras fibras substitutas. Alguns pesquisadores, de forma geral, sinalizam para o fato de que somente com produto de melhor qualidade os agentes, e/ou um país, pode manter cativo um determinado mercado, principalmente nos dias atuais, com o fim das cotas do Acordo Multifibras, onde um novo mapa poderá ser delineado no mundo do ponto de vista do mercado. Como um participante deste mercado, o Brasil precisa se posicionar como fornecedor confiável, firmar contratos antecipados em bom número e prazos com as indústrias, e sempre visar produzir fibra de boa qualidade. Esse contexto vale tanto para os produtores da fibra quanto para as indústrias têxteis de forma geral. Contudo, até que ponto os produtores estariam dispostos a produzir uma fibra de melhor qualidade? Quais as ações que a cadeia, de forma geral, deve implementar para viabilizar esse ambiente? O estudo tem como enfoque o funcionamento da cadeia mercadológica, com preocupação direcionada à qualidade. A validação das hipóteses foi feita por meio de entrevistas com atores representativos dos segmentos produtivo, beneficiamento e esmagamento de algodão, nos estados de São Paulo e Mato Grosso. Com esses dados, buscase ter um entendimento sobre a relevância do Brasil desenvolver pesquisas no intuito de obter melhor qualidade da pluma, como a produção de fibra longa ou colorida, por exemplo. Essa análise está sob o enfoque da possibilidade dos produtores adotarem esse tipo de tecnologia. Também será realizado um estudo bibliográfico da cadeia algodoeira, descrevendo as atividades e os produtos das cadeias. Este trabalho é a segunda fase de um projeto geral, no qual se busca fazer uma análise prospectiva da oferta e demanda de fibra de melhor qualidade no Brasil. Na realização deste trabalho, há uma cooperação científica entre a Cooperativa Central Agropecuária de Desenvolvimento Tecnológico Ltda (Coodetec), a Cooperativa dos Produtores de Algodão do Sudoeste do Mato Grosso (Unicotton), o Centre de Coopération Internationale em Recherche Agronomique pour le Développement (Cirad) e o Centro de Estudos Avançados em Economia (Cepea/Esalq/USP). Análise da primeira fase pode ser encontrada em Ferreira Filho, et al. (2004). 5 4 METODOLOGIA E HIPÓTESES A metodologia corresponde a um estudo de mercado “clássico”, permitindo entender melhor o funcionamento da cadeia algodoeira. Foram realizadas consultas a agentes representativos do setor, bem como realizadas pesquisas sobre a utilização de fibras diferenciadas de algodão. Hipóteses sobre o funcionamento da cadeia são sugeridas e analisadas. Para tanto, procedeu-se um estudo bibliográfico. As hipóteses formuladas são as seguintes: 1. O Brasil pode melhorar a qualidade do algodão produzido para facilitar as exportações e melhorar a renda dos produtores? 2. Os produtores estão dispostos a adotar novas tecnologias, alterar máquinas de beneficiamento, assumir novos riscos e custos para que se produza uma fibra de melhor qualidade? 3. Qual(is) poderia(m) ser a(s) nova(s) utilização(ões) do caroço de algodão? Para atender esses objetivos, foram realizadas 15 entrevistas no Estado de São Paulo, sendo consultados nove produtores, seis algodoeiras e dois esmagadoras. No Estado do Mato Grosso também foram realizadas quinze entrevistas, sendo nove produtores que possuíam algodoeiras, quatro produtores sem algodoeira, duas cooperativas de produtores (UNICOTTON e COOPERCOTTON) e uma esmagadora. Em São Paulo, as visitas ocorreram no mês de maio de 2004, e em Mato Grosso, em novembro de 2004. As entrevistas foram guiadas por questionários detalhados, aplicados por dois pesquisadores, um da área tecnológica e outro da área econômica nas visitas realizadas no Estado de São Paulo, e por dois pesquisadores da área econômica nas visitas realizadas no Estado do Mato Grosso. O tempo médio de cada entrevista foi de 1 hora. 6 5 ESTUDO DO MERCADO 5.1 A cotonicultura brasileira Com uma crise ocorrida na década de 1990, houve um decréscimo na área colhida com algodão, que teve seu menor valor no ano safra de 1997/98. Nos anos-safra seguintes, houve melhora e uma retomada do crescimento na cotonicultura nacional, devido à reestruturação da agroindústria produtiva, juntamente com o deslocamento da produção das regiões Sul e Sudeste, para as regiões Centro-Oeste e Nordeste do país, ocorrendo uma ameaça para “cotonicultura tradicional” (São Paulo e Paraná) e o desenvolvimento de uma “cotonicultura empresarial” (Mato Grosso, Bahia, Goiás, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul). Com isso, ocorreu aumento da produção interna, com conseqüente geração de excedentes exportáveis e queda nas importações. Informações sobre a evolução das produções nas principais regiões produtoras do Brasil podem ser vistas na Figura 1. 2003/04 2002/03 2001/02 2000/01 1999/00 1998/99 1997/98 1996/97 1995/96 1994/95 1993/94 1992/93 1991/92 1.275,0 1.200,0 1.125,0 1.050,0 975,0 900,0 825,0 750,0 675,0 600,0 525,0 450,0 375,0 300,0 225,0 150,0 75,0 - 1990/91 Q uantidade (1000 toneladas) Figura 1. Evolução da produção brasileira de algodão em pluma por regiões, 1990/91 a 2003/04 período N O RTE/N O RDESTE C EN TRO /C EN TRO ESTE SUL/SUDESTE TO TAL BRASIL Fonte: Companhia Brasileira de Abastecimento (Conab, 2004) Conforme mostram os dados, no início dos anos 90 os estados de São Paulo e Paraná respondiam por, praticamente, 80% da produção nacional de algodão. Houve quedas desse volume a cada ano e conseqüentes acréscimos da produção nos estados das regiões Nordeste e Centro-Oeste do país. O Estado do Mato Grosso, que em 1990 participava com 3% da 7 produção nacional, passou a representar 45% da produção brasileira de algodão na safra 2003/04 (Figura 2). Ao analisar o desempenho da produtividade nos principais estados produtores, se observa também um desempenho a favor da produção do centro-oeste. Na Figura 3, apresentam-se as evoluções das produtividades de quatro estados, importantes na cotonicultura do Brasil. 2003/04 2002/03 2001/02 2000/01 1999/00 1998/99 1997/98 1996/97 1995/96 1994/95 1993/94 1992/93 1991/92 600,0 550,0 500,0 450,0 400,0 350,0 300,0 250,0 200,0 150,0 100,0 50,0 - 1990/91 Q uantidade (1000 toneladas) Figura 2. Evolução da produção de algodão em pluma por estados, 1990/91 a 2003/04 Período Bahia M ato Grosso M ato Grosso do Sul Goiás M inas Gerais São Paulo Paraná Fonte: Conab (2004) Figura 3. Evolução da produtividade do algodão em caroço nos principais estados produtores no Brasil, safras 1990/91 a 2003/04. 4.000 3.500 3.000 kg/ha 2.500 2.000 1.500 1.000 500 PR Fonte: Conab (2004) MG GO MS MT SP BA 2003/04 2002/03 2001/02 2000/01 1999/00 1998/99 1997/98 1996/97 1995/96 1994/95 1993/94 1992/93 1991/92 1990/91 - 8 Até o ano de 1997, a produtividade evoluía lentamente. Além disso, a produtividade no Mato Grosso era relativamente baixa. A partir da safra 1997/98 o rendimento agrícola deste estado evoluiu expressivamente, passando a ser superior aos dos demais estados na maioria das safras posteriores. No entanto, não se pode deixar de considerar o ganho de produtividade de todos os estados produtores. De acordo com os cálculos das taxas médias anuais de crescimento da produtividade dos principais estados produtores, entre os anos-safra 1990/91 e 2003/04, a evolução do rendimento agrícola da Bahia foi o mais expressivo, o qual cresceu a uma taxa média de 15,6% a.a., seguido do rendimento de Minas Gerais (11,1% a.a.), do Mato Grosso (8,85% a.a.), São Paulo (5,18% a.a.), Goiás (4,92% a.a.) e Paraná (3,70% a.a.). Vale destacar o crescimento médio anual da produtividade brasileira, que ocorreu a uma taxa de 10,92% a.a.. No que se refere ao quadro de suprimento de algodão no Brasil (Tabela 1), observase que a partir da safra 2000/01 a produção nacional passou a superar o consumo interno, proporcionando excedentes exportáveis. Neste sentido, observa-se o volume crescente de algodão em pluma do Brasil em anos recentes. Tabela 1. Quadro de suprimento de algodão em pluma no Brasil (em 1.000 toneladas) Estoque Estoque Produção Importação Suprimento Consumo Exportação Safra Final inicial 1997/98 132,1 411,0 334,4 877,5 782,9 3,1 91,5 1998/99 91,5 520,1 280,3 891,9 806,5 3,9 81,5 1999/00 81,5 700,3 299,9 1.081,7 885,0 28,5 168,2 2000/01 168,2 938,8 81,3 1.188,3 865,0 147,3 176,0 2001/02 176,0 766,2 67,6 1.009,8 805,0 109,6 95,2 2002/03 95,2 847,5 118,9 1.061,6 770,0 175,4 116,2 2003/04 116,2 1.271,5 105,0 1.492,7 880,0 360,0 252,7 Fonte: Conab (2004). 5.2 A cotonicultura mundial Em termos mundiais, a China é o maior produtor, o maior consumidor e o maior importador de algodão. Observa-se pela Tabela 2 que é expressivo o déficit de pluma no mercado chinês, que se vê obrigado a comprar algodão para suprir a indústria de seu mercado interno. Com isso, sua demanda passa a influenciar significativamente o mercado internacional da fibra. Os maiores produtores mundiais, em ordem decrescente, são China, Estados Unidos, Índia, Paquistão, Brasil, Uzbequistão e Turquia (Tabela 2). Esses países representaram 80,6% 9 da produção mundial na safra 2003/04. Os maiores consumidores mundiais, em ordem decrescente, são China, Índia, Paquistão, USA, Turquia, Brasil e Indonésia. Esses países representam 74,5% do algodão consumido no mundo. Em termos de exportação, devem ser realçadas as exportações americanas, embasadas em fortes subsídios à produção e exportação. Também não se pode deixar de considerar a crescente participação do Brasil no comércio internacional nos últimos anos. As informações sobre produção, consumo, importação e exportação são apresentadas na Tabela 2 e na Tabela 3. Tabela 2. Produção e consumo de algodão em pluma nos principais países (em 1000 ton.) Produção 1997/98 1998/99 1999/00 2000/01 2001/02 2002/0 2003/04 Mundo 20.037,59 18.584,70 19.075,46 19.330,85 21.473,50 19.231,57 20.578,00 China 4.594,03 4.506,94 3.831,99 4.419,85 5.312,53 4.920,62 4.855,30 Estados Unidos 4.091,74 3.030,32 3.694,38 3.742,28 4.420,50 3.746,86 3.974,60 Índia 2.686,09 2.804,97 2.651,91 2.379,97 2.678,04 2.307,90 3.004,63 Paquistão 1.562,19 1.371,68 1.872,45 1.785,36 1.807,13 1.698,27 1.687,38 Brasil 411,50 520,58 700,21 938,84 766,18 846,96 1.273,70 Uzbequistão 1.138,28 1.001,54 1.127,82 958,00 1.066,86 1.001,54 892,68 Turquia 794,92 840,43 791,22 783,82 865,46 909,88 892,68 Outros 4.758,84 4.508,24 4.405,48 4.322,73 4.556,80 3.799,54 3.997,03 Consumo Mundo 18.975,08 18.431,21 19.814,42 20.073,30 20.589,75 21.480,03 21.535,10 China 4.169,46 4.071,49 4.637,58 5.116,57 5.715,32 6.510,02 6.967,25 Índia 2.759,68 2.747,71 2.949,54 2.948,89 2.890,32 2.895,76 2.939,31 Paquistão 1.564,80 1.524,09 1.665,61 1.763,59 1.850,68 2.046,63 2.090,18 Estados Unidos 2.470,98 2.264,57 2.219,51 1.929,49 1.675,62 1.583,53 1.412,83 Turquia 1.088,63 1.001,54 1.219,27 1.124,99 1.339,02 1.371,68 1.328,13 Brasil 789,48 821,70 922,29 914,45 827,36 783,82 827,36 Indonésia 402,79 479,00 435,45 533,43 500,77 489,89 468,11 Outros 5.729,26 5.521,11 5.765,17 5.741,89 5.790,66 5.798,70 5.501,93 Fonte: National Cotton Council of America (2004) 10 Tabela 3. Importação e exportação de ton) Importação 1997/98 1998/99 Mundo 5.705,74 5.369,57 China 399,31 78,16 Turquia 315,70 247,99 Indonésia 415,86 505,78 México 298,50 309,61 Tailândia 269,11 263,67 Rússia 266,72 185,07 Índia 31,57 110,61 Outros 3.708,97 3.668,68 Exportação Mundo 5.849,66 5.123,54 Estados Unidos 1.632,95 935,79 Uzbequistão 995,01 829,97 Austrália 590,47 661,89 Grécia 217,73 209,89 Mali 179,62 206,84 Brasil 0 5,01 Burquina 119,75 114,31 Outros 2.114,13 2.159,84 algodão em pluma pelos principais países (em 1.000 1999/00 2000/01 2001/02 2002/0 6.124,43 5.737,75 6.451,89 6.580,13 25,47 52,47 97,76 680,83 522,54 381,02 624,44 493,15 452,00 576,98 512,96 485,10 394,74 406,06 449,61 500,77 371,44 342,48 447,86 423,48 348,36 359,25 391,91 359,25 348,36 341,18 519,93 264,76 3.661,52 3.278,31 3.407,42 3.372,79 2003/04 7.424,26 1.922,96 515,58 468,11 404,10 365,35 321,15 174,18 3.252,83 5.906,92 5.757,78 6.290,99 6.610,61 7.185,63 1.469,65 1.467,48 2.394,99 2.590,95 2995,7 892,68 740,27 740,27 762,04 642,29 698,69 850,01 675,17 578,06 470,94 235,14 310,04 217,73 250,39 266,72 195,95 125,19 201,40 185,07 255,83 2,61 68,58 146,75 106,47 209,89 113,22 113,22 141,52 157,85 206,84 2.298,98 2.082,99 1.773,16 1.979,78 2.137,42 Fonte: National Cotton Council of America (2004) 11 6 RESULTADOS E DISCUSSÃO: ANÁLISE QUALITATIVA DOS DADOS ECONÔMICOS Para melhor entendimento dos resultados obtidos nas entrevistas, esta seção do trabalho está subdividida em oito subseções. Na primeira se busca destacar a separação dos entrevistados em grupos, conforme suas estratégias de mercado, categorias de agentes e tamanho/competitividade da empresa e/ou fazenda. Há uma análise mais detalhada da categoria produtores. Na segunda parte, faz-se uma análise separada das algodoeiras. Na terceira se analisam quais os critérios adotados pelos agentes na escolha das variedades que serão utilizadas para plantio. Em seguida (quarta parte) são destacados os tipos de fibras obtidos e meios de comercialização. As estratégias relacionadas à qualidade são analisadas na quinta parte. A utilização do caroço de algodão é enfatizada na sexta parte e a percepção dos agentes quanto a fibras diferenciadas na sétima parte. As estratégias de comercialização da fibra são destacadas na oitava subseção. 6.1 Segmentação das empresas sobre a base das estratégias econômicas A cadeia agroindustrial do algodão pode ser representada, resumidamente, como na Figura 4. Foram com os primeiros elos da cadeia, os quais estão em destaque, que se realizou o levantamento de dados para esta etapa do trabalho. A pesquisa procurou concentrar suas análises nos principais tipos de algodão produzidos nas regiões estudadas, bem como nos problemas citados pelos entrevistados quanto ao processo produtivo (lavoura) e o beneficiamento. De forma mais detalhada, a primeira transação que ocorre na cadeia é entre as indústrias de defensivos, fertilizantes, genética, sementes, máquinas e equipamentos, com os produtores, aqui subdivididos entre “empresariais” (regiões de expansão – Centro-oeste e Nordeste) e ”tradicionais” (regiões Sul e Sudeste). Estes produtores são numerosos e heterogêneos. Após o algodão ser colhido, é necessário passar pelo beneficiamento, onde é obtido o algodão em pluma, sem caroço, podendo ser armazenado. A maioria dos produtores das regiões tradicionais vende seus produtos para as cooperativas e comerciantes, que efetua o beneficiamento e comercializa a pluma e os derivados obtidos. Muitas vezes, as cooperativas, de caráter regional, dão suporte técnico a pesquisas, aprimoramento de técnicas de produção de algodão e fios, beneficiamento, etc. Nas regiões de cotonicultura empresarial, o beneficiamento pode ser feito também via cooperativa, ou pelo beneficiador intermediário, muitas vezes chamado de maquinista, ou pelo “parceiro” – que é aquele que faz o 12 beneficiamento e retorna a pluma para o produtor, que comercializa –, ou, num sistema de integração vertical, onde o beneficiamento é feito pelo próprio produtor. Figura 4. Cadeia agroindustrial do algodão, com destaque para os primeiros elos Insumos agrícolas Cotonicultura Beneficiamento Fiação Tecelagem/malharia Acabamento Confecção Em seguida, estes agentes podem vender o algodão em pluma para comerciantes, para indústria ou exportá-lo. Em muitas dessas transações há a presença do corretor, que é o intermediário entre os agentes envolvidos na transação, recebendo uma comissão. Os comerciantes são agentes que compram e vendem o algodão em pluma, ou seja, diferentemente dos corretores, adquirem o produto para depois vendê-lo. A indústria, por sua vez, é o comprador final da pluma, que efetua a transformação da matéria-prima e vende os produtos acabados ou semi-acabados. O segmento agrícola (produção do algodão em caroço) e a agroindústria beneficiadora (extratora da pluma) são os segmentos diretamente envolvidos na produção da fibra de algodão, que servirá de matéria-prima aos segmentos têxteis. Para melhor entendimento da amostra de dados obtida neste trabalho, procurou-se subdividir os entrevistados (produtores, beneficiadoras e esmagadoras) em grupos conforme suas estratégias de atuações no mercado, classificando-os em seis grupos, quais sejam: A. O Grupo A é formado por produtores de algodão, normalmente possuindo pequenas áreas produtivas, com lavouras de algodão inferior a 200 hectares, sem unidade beneficiadora na propriedade, e não participando de grupos cooperativos que ajude na compra de insumos mais baratos ou que comercializem sua fibra, estando fortemente subordinados a intermediários e 13 algodoeiras. Esse tipo de produtor é mais característico do Estado de São Paulo; B. Esse segundo grupo é formado por produtores de médio porte, com áreas de cultivo variando entre 200 e 800 hectares. Em geral também não possuem unidade beneficiadora, mas terceirizam o beneficiamento e eles próprios comercializam a pluma. Há produtores tanto do Estado de São Paulo quanto do Mato Grosso que se enquadra nesta categoria. Para aqueles do primeiro estado, os principais compradores de sua pluma são as cooperativas e os comerciantes (intermediários/atacadistas). Vale ressaltar que segundo os próprios produtores, é necessário possuir uma área superior a 800 hectares para que se torne viável a implantação de uma unidade beneficiadora que atenda sua própria produção; C. O grupo C é formado pelas algodoeiras que têm vínculo direto com o pequeno e médio produtor, dando, na maioria das vezes, incentivo ao setor produtivo. Estes agentes realizam compras do algodão em caroço e/ou somente da fibra. Muitas vezes esses agentes fornecem os insumos e sementes para os produtores, os quais passam e estar, de certa forma, vinculados às algodoeiras para venda de toda sua produção. Também realizam prestação de serviço no beneficiamento da fibra cobrando percentual sobre a fibra obtida e o caroço de algodão, ou valores monetários sobre a mercadoria; D. Esse grupo é formado por cooperativas, onde a maioria de seus associados é de produtores da região. Para as cooperativas, o intuito principal é possuir grandes volumes de compra, visando pagar menores preços para insumos e sementes e possuir volume de vendas de fibra que garanta bom preço a esses produtores; E. Aqui se engloba os grandes produtores, os quais possuem áreas de produção superior a 800 hectares e muitas vezes com mais de uma unidade beneficiadora, para suprir sua produção. Realizam outras atividades que agregam valor, como produção de sementes para empresas ou para venda própria e também para utilização nas áreas produtivas da fazenda. F. Esse último grupo é formado pelas empresas de esmagamento de caroço, podendo possuir verticalização nos processos produtivos, como produção e beneficiamento do algodão. Diante desta subdivisão, observa-se que o segmento da produção de fibra é composto por três grupos (Grupos A, B e E), onde se enquadram os pequenos, médios e os grandes produtores. Esses últimos produtores (Grupo E) são os que possuem grandes áreas produtivas, 14 não somente de algodão, mas de outras culturas, principalmente soja, optando pela verticalização dos processos produtivos. Por meio dessa estratégia, compram grandes volumes de insumos, diretamente dos grandes fornecedores ou via cooperativa e associação, geralmente obtendo menores preços por eles. Alguns deles optam pela produção da semente a ser utilizada na fazenda, reduzindo riscos se comparado à compra de sementes no mercado, tais como riscos de preços, quantidade, qualidade, entre outros itens. Essa produção de sementes pode ser feita por sua própria responsabilidade, com marca própria, ou através de parcerias com grandes multinacionais que utilizam as áreas da fazenda para seus campos de produção. Pode-se dizer que a totalidade desses produtores possui assistência técnica especializada, através de consultores que prestam assessoria às propriedades ou agrônomos vinculados diretamente à unidade produtiva. Nessas grandes propriedades, há sempre uma unidade beneficiadora própria, para beneficiamento próprio do algodão produzido. Todavia, há outros produtores (Grupo B), que utilizam menores áreas de produção e não possuem unidades beneficiadoras, terceirizando o serviço de beneficiamento. Não necessariamente estes produtores possuem vínculo com as algodoeiras e em geral apenas pagam pelo serviço prestado. Após o beneficiamento, a pluma pode retornar ao produtor, que efetua a comercialização, ou é vendida para as próprias algodoeiras. Nesta categoria, há propriedade que optam pelo serviço de assistência técnica, terceirizada ou não, apostando em ganhos de produtividade que compensam esse acompanhamento. No entanto, há produtores que dispensam esse serviço, e o acompanhamento da lavoura é feita pelo próprio produtor. Os produtores do Estado de São Paulo, principalmente, em geral não vendem sua produção para as algodoeiras. Porém, possuem forte dependência de intermediadores para negociação dessa pluma, os chamados comerciantes, que possuem contatos de venda, onde negociam a fibra de vários produtores, formando grandes lotes da mercadoria para venda, obtendo melhores preços na comercialização. Esses produtores ficam na dependência dessas negociações, pois não conseguem produzir um volume de fibra suficiente para suprir vendas diretas em grande quantidade para as indústrias. O Grupo A é composto pelos pequenos produtores, cultivando áreas próprias ou arrendadas, onde a produção é guiada por tecnologia considerada “baixa” ou “média”, e os tratos culturais são feitos pela própria família e poucos prestadores de serviços são contratados, não possuindo serviço de assessoria. Normalmente fazem parte de cooperativas, onde fazem a compra dos insumos e a entrega da produção. A quase totalidade da colheita é realizada manualmente, sendo poucos os casos de colheita mecânica, o que pode influenciar 15 na qualidade da fibra. A colheita manual é realizada no sistema chamado de rapa, que proporciona uma fibra de menor qualidade. Em termos gerais, pode-se dizer que a atividade de produção possui diversas características, a depender do tamanho das propriedades e da tecnologia adotada. Os pequenos produtores apresentam maior dependência de fatores externos, como de recursos para financiamento de sua produção, necessidade de venda de sua fibra para os ofertantes de insumos, criando grande dependência. Os médios e grandes produtores já apresentam uma maior autonomia, tanto na produção como nas vendas, obtendo melhores negociações e, conseqüentemente, maior remuneração. Esses últimos produtores estão mais presentes na região Centro-Oeste do país, como é o caso do Estado do Mato Grosso, onde há necessidade de grandes áreas de cultivo, para ocorrer ganhos em escala. Alguns agentes apontam que essa característica é influenciada pelos maiores custos produtivos, comparativamente a outras regiões do país, sendo necessárias áreas maiores para compensar os investimentos. Em São Paulo, concentram-se os produtores de pequeno e médio portes, sendo pequeno o número de produtores que se enquadram no grupo E apresentado anteriormente. 6.2 As algodoeiras e as cooperativas Como ressaltado anteriormente, na categoria algodoeira há aquelas que prestam serviços para outros produtores, aquelas que compram o algodão em caroço para depois comercializar a pluma, aquelas que também compram o algodão em pluma e aquelas ligadas diretamente à produção de um determinado agricultor. As chamadas algodoeiras que prestam serviços de beneficiamento aos pequenos e médios produtores localizam-se principalmente no Estado de São Paulo, mas também há algumas unidades no Estado do Mato Grosso. Estas são em menor proporção e geralmente prestam serviços para os produtores caracterizados como do grupo B. Vale ressaltar que no Mato Grosso há predominância de maiores propriedades, possuindo beneficiadoras próprias ou destinando toda a produção para as algodoeiras de suas cooperativas. Essas prestadoras do serviço, muitas vezes fazem o papel das cooperativas e fornecem para o produtor todos os insumos e sementes, necessários para a produção do algodão. Desta forma, estabelecem um vínculo com esses produtores, que num momento posterior precisarão quitar a dívida da produção, fazendo-a com a entrega de sua pluma. O fornecimento de financiamento aos agricultores faz com que as cooperativas e/ou beneficiadoras possam obter uma margem de lucro sobre essa operação, além de fornecer 16 sementes de interesse da empresa, com melhor rendimento de fibra. Muitas vezes, o produtor vende sua produção de algodão em caroço sem considerar esse rendimento, onde há maior produção de fibra para a algodoeira. Há algodoeiras e cooperativas que não fazem a remuneração por fibra de melhor qualidade, mas somente pelo tipo, não havendo vantagem para o produtor utilizar fibras diferenciadas, como fibras mais longas ou alguma outra característica intrínseca. Porém há unidades que possuem interesse em obter fibras diferenciadas, favorecendo os produtores que conseguem a fibra com boas características intrínsecas, fibras mais limpas, aplicando ágios no pagamento. Esse processo estimula os produtores na busca deste produto. Nesses casos, há serviços de conscientização do produtor para o melhor manejo a ser adotado nas lavouras, como, por exemplo, através de palestras e acompanhamento da lavoura por parte de técnicos. O sistema adotado para classificação do algodão ainda é o chamado visual na maior parte das transações que envolvem algodão em caroço entre produtores e algodoeiras. Dentre as algodoeiras, há aquelas que trabalham exclusivamente com compra de algodão em caroço, chegando a representar 100% do volume de compras, enquanto há outras que também compram o algodão em pluma e/ou prestam serviço de beneficiamento, com o produtor pagando o serviço e vendendo o algodão em pluma. Entre as cooperativas, há aquelas que são formadas por um grupo de produtores que se unem para obtenção de vantagens comerciais, tanto na compra de sementes e insumos, como para possuírem maior volume de fibra para efetuarem melhores vendas no mercado. Com maior quantidade de fibra disponível, pode-se formar lotes homogêneos entre si, com as características desejadas pelos compradores. Com isso, se obtém melhores remunerações nas vendas da pluma e pode-se até mesmo estabelecer parcerias com grandes compradores, formando um vínculo entre compradores e vendedores. Com isso, há garantia de entrega do produto pelo lado dos produtores e recebimento pelo lado dos compradores. Quando essa transação envolve contratos antecipados e formais, também há garantias de preços para ambos os agentes. 6.3 Critérios de escolha das variedades Uma das etapas mais importantes da instalação da cultura no campo é a boa semeadura, com profundidade de semente e espaçamento adequado, além de boa germinação e emergência das sementes. Logo, é de fundamental importância a adequada escolha dessa semente a ser utilizada. Porém, para a quase totalidade dos produtores entrevistados, o que 17 realmente importa é que a variedade plantada lhe propicie um apropriado retorno econômico ao seu investimento. Para estes agentes, o primeiro aspecto desejável na escolha de uma variedade é a sua produtividade agrícola potencial e estabilidade entre os anos agrícolas. Aliado a isso, há a exigência dessas variedades também apresentarem elevados rendimentos de fibra. Porém, produtores que efetuam suas vendas do algodão em caroço, não dão importância ao fator rendimento da fibra, mas somente ao primeiro aspecto. Como outras características desejáveis para uma variedade de algodão, também foram citados: a resistência a pragas e doenças, precocidade, não ocorrer queda de fibra do capulho no final do ciclo, qualidade da fibra produzida, entre outras. Grande parte dos produtores acredita que não ocorram grandes variações em termos de qualidade da fibra entre as diferentes variedades que são comercializadas atualmente. Assim, nem sempre na escolha da variedade é considerado o rendimento de fibra, pois a maioria das empresas compradoras não aplica ágios sobre suas características intrínsecas. A formação de preço está diretamente ligada ao tipo de algodão obtido, qualificando as características visuais da fibra, havendo diferentes preços para diferentes tipos de algodão. Neste ponto, é conveniente ressaltar que as principais características da fibra, do ponto de vista da indústria de fiação, incluem: comprimento, uniformidade, micronaire (resistência) e cor. As medidas de parte das características podem ser feitas visualmente em comparação com padrões para definir um grau ou tipo e classificar a fibra. Tem-se o tipo 6 como base (na classificação internacional seria o tipo 41-4) , ou seja, tipos como 5/6 (31-4 na classificação internacional) são considerados como de melhor qualidade que do tipo 6, enquanto um tipo 6/7 (51-5) é um produto de pior qualidade. Outra maneira de efetuar a classificação, sendo considerada mais objetiva, é por intermédio de um aparelho automático denominado High Volume Instruments (HVI). Enquanto no mercado interno, a maior parte da classificação e negociação da fibra ainda é efetuada pelo sistema visual, as negociações externas e com grandes empresas no mercado interno já são efetuadas com a pluma classificada pelo novo sistema. Voltando à análise de escolha das variedades, para o produtor interessa somente as vantagens que trará para sua produção, como maior produtividade e resistências a doenças, que proporcionam menores custos de produção. Outra característica desejável citada é o benefício obtido com algodão de ciclo mais curto, que em geral apresenta um menor gasto com a sanidade da lavoura, devido sua precocidade e menor requerimento de aplicações de defensivos. Houve também a citação de que o algodão de fibra mais clara, com poucos 18 contaminantes, é muito mais aceito pelo produtor, pois há casos em que o mesmo recebe o pagamento pelas características externas apresentadas pela fibra. Ainda não há requerimento por parte do produtor de uma fibra com melhores qualidades intrínsecas. Os produtores citaram a elevação dos custos que podem ocorrer com esse tipo de produto, e a possibilidade de produção somente se a indústria estiver apta para compensar essa diferença de valores. Para muitos, a produção de fibras de melhor qualidade, como fibra mais longa, levaria à necessidade de alteração nas máquinas necessárias para beneficiamento, que seria feito a um custo alto. Nas condições atuais, as unidades aptas a beneficiar um algodão com esta característica são em número reduzido. Também houve a citação de produtores que já fizeram testes com algodão de fibra mais longa e não obtiveram resultados favoráveis. Mesmo assim, para muitos, o que importa é a relação custo/benefício, estando disposto a arcar com maiores custos e riscos para a produção de fibra de melhor qualidade desde que se tenha remuneração adequada que viabilize o investimento. É de fundamental importância também, o fato de que há grandes variações de preços pagos a essas fibras ao longo dos anos, sendo que os elevados custos de produção levam o produtor a arcar com elevados riscos. Por isso, é desejável decréscimo nos custos de produção, pois nem sempre a utilização de variedades de melhor qualidade é remunerada de forma adequada, o que aumenta o risco do produtor. Além disso, boa parte da comercialização da fibra é realizada sem a utilização dos testes de HVI, mas somente no sistema visual, e assim o produtor não obtém informações das características do algodão que está produzindo, não aumentando seu estímulo para produção de produto com outras características. Contudo, pode-se dizer que aos poucos o sistema de classificação por equipamento (HVI) está sendo implantado na maioria dos estados e regiões produtoras. Neste caso, há forte influência das associações representativas que “forçam” e adquirem os equipamentos para esta finalidade. Aparentemente, os ganhos deverão ser distribuídos entre produtores e consumidores da fibra, além de favorecer a melhora do produto nacional. 6.4 Tipos de fibras e seu destino Os tipos de fibra produzidos pela cotonicultura brasileira vêm melhorando a cada ano. Contudo, no ano-safra 2003/04 houve maior produção do tipo base (6 ou 41-4) para pior. A cotonicultura no Estado do Mato Grosso, principalmente, enfrentou um ano atípico, onde as chuvas de final de ciclo mudaram o cenário climatológico da região. Tradicionalmente, as chuvas na região se encerram nos meses de abril e maio, época em que o algodão se apresenta nas fases de abertura dos capulhos, onde as fibras começam a ficar expostas na lavoura. 19 Com as chuvas em excesso que atingiram o estado, ocorreram alguns problemas relacionados com a qualidade da fibra, por causa do molhamento das plantas e à maior contaminação das fibras, onde principalmente as fibras do baixeiro do algodoeiro adquiriram manchas. Além disso, por causa do ambiente mais úmido, o manejo da lavoura exigiu um número maior de aplicações de fungicidas, fazendo com que o algodão mantivesse mais suas folhas na planta até o final do ciclo, o que causou alguma contaminação da fibra na hora da colheita, proporcionando maior limpeza e custo para as algodoeiras. O Brasil apresenta uma importante vantagem, que está relacionada às épocas de colheita entre os diferentes estados do país, onde há uma seqüência de maturação da cultura ao longo do ano. As primeiras lavouras a terminarem seu ciclo e colocarem o algodão no mercado são do Paraná, depois do Mato Grosso do Sul, São Paulo, Goiás, Bahia e Mato Grosso. Essa variabilidade é positiva porque permite um suprimento escalonado da matériaprima. Como citado em Ferreira Filho, et al. (2004), entre os problemas citados pela indústria brasileira quanto à qualidade da fibra do Centro-Oeste, em especial do Mato Grosso, estava o elevado índice de fibras curtas e a caramelização. A primeira característica é ocasionada principalmente pela regulagem não adequada no beneficiamento. Na tentativa de melhorar a limpeza e obter maior rendimento de fibra, há danos causados há fibra. Além disso, a colheita do algodão ainda imaturo também contribui nesse sentido. Já a caramelização é atribuída à presença de pragas, como o pulgão e a mosca branca. A ocorrência dessas características, contudo, não pode ser generalizadas entre propriedades, regiões e ao longo dos anos. Estas são influenciadas pelas condições ambientais enfrentadas no ano, tais como índice pluviométrico, pressão de pragas e doenças. Para a safra atual, por causa do excesso de chuva, não se verificaram problemas como os citados acima. Além disso, os produtores, principalmente do Mato Grosso, acreditam estar conseguindo uma melhor regulagem do parque de máquinas para beneficiamento, que propiciam uma melhor limpeza da fibra obtida, compensando a maior quantidade de contaminantes provenientes de folhas que sujaram as fibras e sua coloração. A qualidade final da fibra também é extremamente ligada ao tipo de colheita realizada, manual ou mecanicamente, além do beneficiamento propiciado ao material. A colheita manual em geral conduz à produto de menor qualidade, assim como uma maior contaminação da fibra com polipropileno, devido ao tipo de sacaria utilizada pelos colhedores. 20 A umidade que a fibra apresenta na hora da colheita, além da velocidade empregada pelo operador de colhedora, é extremamente influente na sua qualidade final, havendo contaminação da mesma com partículas provenientes da lavoura, além de problemas como fermentação, caso não ocorra umidade propícia para armazenamento. Esses problemas requerem um beneficiamento adequado, para que a fibra supra as exigências da indústria em termos de qualidade. Segundo os entrevistados, no Estado do Mato Grosso a maior parte da fibra obtida na safra 2003/04 foi do tipo 6,0 (41-4 na classificação internacional) e 6,5 (51-5), também sendo obtido fibra tipo 5,5 (31-4), mas em menor proporção. Essas fibras de melhor qualidade ocorreram de maneira menos acentuada por causa dessas chuvas de final de ciclo, que contaminaram mais a fibra. As algodoeiras mais modernas apresentam maquinário capaz de limpar de maneira satisfatória as impurezas provenientes do campo. Porém, um excesso de limpeza dessa fibra pode ocasionar problemas em sua qualidade, como maior índice de fibras curtas. Apesar disso, devido à boa regulagem dessas máquinas, parte dos produtores não obtiveram reclamações da indústria em relação à qualidade da fibra. Os grandes produtores do Mato Grosso normalmente fazem parte de suas vendas para o mercado externo, geralmente destinando os melhores tipos obtidos para esse mercado, como o tipo 5,5, que foi um dos mais negociados. O mercado externo exige que 100% da pluma fornecida tenham classificação HVI, além de características intrínsecas respeitando os valores pré-estabelecidos de qualidade. Muitas dessas vendas são feitas por contratos antecipados com o produtor ou cooperativas, garantindo um preço para o produtor e um volume de pluma adequada às exigências do mercado externo. Dentre os entrevistados, houve aqueles produtores que não fizeram vendas para o mercado externo, enquanto outros que chegaram a exportar mais de 75% de sua produção. Essas exportações variam de acordo com inúmeros fatores, como preço da fibra no mercado interno, volume de algodão produzido mundialmente, que fazem com que haja uma necessidade desse mercado de garantir seu volume de compras, entre outros fatores. O mercado externo tem exigências maiores em relação à qualidade da fibra, porém nem sempre efetua pagamentos maiores que o mercado interno. Esse mercado remunera pelo tipo de algodão obtido, normalmente requerendo tipos melhores, pela menor quantidade de resíduos existentes nos lotes, fator importante para esse tipo de compra. 21 Em anos em que há normalização das chuvas o tipo de algodão obtido pelos produtores pode ficar pelo menos meio tipo melhor, aumentando a proporção de algodão tipo 5,5 e tipo 5,0. Algodão com essa tipologia é requerido pelo mercado europeu e indústria japonesa, segundo os entrevistados. Há grandes produtores especializados na produção de algodão de melhor tipo, pois conseguiram espaço nesse mercado de fibras diferenciadas, isto é, de tipo melhor. O preço é formado com base na pluma tipo 6,0, com pagamento de ágio para tipos superiores (5,5 e 5,0, por exemplo), e deságios para tipos inferiores (6,5 e 6,0, por exemplo), usando como referência uma tabela de valores de ágios e deságios elaborado pelos corretores associados à Bolsa de Mercadoria e Futuros (BM&F). No Estado de São Paulo, há predominância de colheita manual, principalmente nas pequenas e médias propriedades, sendo que parte da área pode ser colhida mecanicamente. Já nas maiores propriedades, a maior parte da colheita é feita através de colhedoras mecanizadas. Para alguns dos entrevistados do Estado de São Paulo, em algumas regiões do estado há produção de algodão de menor qualidade, que é influenciada pelo tipo de solos das regiões produtoras (mais argilosos e de coloração mais escura) e devido a sua época de colheita (ainda no período de chuvas) que proporcionam manchas na fibra, principalmente as do baixeiro. Diante da predominância de pequenos e médios produtores em São Paulo, grande parte da fibra é comercializada no mercado interno. No entanto, pode ocorrer a comercialização com o mercado externo por parte das cooperativas e de produtores de maior porte, que conseguem formar lotes maiores de fibra e atender aquele mercado. 6.5 Estratégia relacionada à qualidade A fibra produzida no Brasil consegue cada vez mais espaço no cenário mundial, principalmente devido às suas características em termos de qualidade. Produtores brasileiros acreditam que o tipo de fibra obtida nas lavouras brasileiras supre as exigências internacionais. Nem sempre o algodão exportado recebe maior preço do que o mercado interno, porém a vantagem perante esse mercado é o pagamento pela pluma de acordo com seu real tipo. Mais especificamente, o fato de na comercialização brasileira haver classificação visual da fibra facilita a manipulação da classificação, passando o produto a receber menos valorização que seu potencial, segundo alguns dos entrevistados. Para a venda ao mercado externo, por outro lado, exige-se a classificação por equipamento, em que se paga e se recebe o que realmente vale o produto. 22 A região do Meio-Norte mato-grossense, como nos municípios de Sorriso, Lucas do Rio Verde e Nova Mutum, há predominância do algodão “safrinha”, isto é, o plantio é efetuado no início de cada ano, após a colheita da safra de verão. No restante do estado, o plantio ocorre entre início do mês de dezembro e a primeira quinzena do mês de janeiro. Já o algodão da “safrinha” é plantado depois dessa época, em aproximadamente 25% das áreas que estavam ocupadas com a soja de cultivar precoce. A safrinha nessas regiões apresenta uma qualidade de fibra melhor que o algodão plantado na safra normal, pois em geral sofrem menos com a ocorrência de chuvas em excesso no final do ciclo, o que prejudicaria a pluma. Como a qualidade da fibra é diferenciada entre as diversas regiões produtoras, algumas prevalecem. A região noroeste do Estado de São Paulo, por exemplo, apresenta uma qualidade intrínseca de fibra muito boa, demandada pelas fiações e malharias do Brasil. Apesar de os produtores cultivarem, muitas vezes, as mesmas variedades que outras regiões brasileiras e utilizarem o mesmo manejo da lavoura, essas características intrínsecas são superiores, obtendo uma preferência de mercado. Porém essa melhor qualidade não recebe remuneração diferenciada por parte dos compradores, somente garante uma melhor comercialização em anos que a oferta da fibra é grande. Assim, o algodão de diferentes qualidades sofre muita influência da situação do mercado no ano vigente para sua comercialização. Em anos onde a oferta do produto é mais escassa, os preços estão mais altos e há falta de algodão no mercado, o que “diminui” a exigência dos compradores quanto ao tipo de fibra. Porém, em anos em que há produto excedente no mercado, a exigência por qualidade de fibra se intensifica. As características intrínsecas das variedades de algodão cultivadas no Brasil apresentam certa semelhança. Isto é, há faixas de valores requeridos pelas empresas compradoras para cada item de qualidade de fibra, como por exemplo, o comprimento da fibra, a resistência, o micronaire, entre outros. Normalmente, todas as variedades plantadas cumprem essas faixas de exigências de características intrínsecas, onde determinada variedade destaca-se em algumas delas. Se determinada variedade possui uma qualidade superior em determinada característica, não ocorre remuneração por parte da indústria por esse atributo. Por isso, de certa forma, ainda não há interesse do produtor em cultivar o algodão que resulta em fibra de melhor qualidade se não possuir uma garantia de melhor preço por isso. Atualmente, como citado anteriormente, a fibra de tipos melhores apenas tem maior facilidade na comercialização, mas não preços diferenciados que atraia o produtor. 23 Destaca-se também que a etapa do beneficiamento pode causar muitos danos às fibras, principalmente aumentar índices de fibras curtas. As atuais máquinas de beneficiamento são capazes de obter altos níveis de limpeza dessa fibra, isto quando são bem reguladas. O problema ocorre quando o algodão chega com muitas impurezas do campo, havendo maiores perdas no beneficiamento caso deseje maior limpeza dessas fibras, que diminui sua qualidade. A qualidade da fibra obtida no país hoje é satisfatória segundo os agentes envolvidos na produção, não havendo exigências por parte dos produtores de novas ações de pesquisa em relação a melhor qualidade intrínseca da fibra, como maior comprimento. No entanto, o produtor estaria disposto a cultivar o algodão de melhor qualidade se o mercado fizesse uma melhor remuneração para o produto, porém os entrevistados disseram que ainda não é o que ocorre. Há um anseio por linhas de pesquisa direcionadas à redução de custos de produção na lavoura, para que o produtor possa diminuir os riscos envolvidos na produção e na comercialização. Vale ressaltar, que o algodão é uma cultura de elevado investimento inicial, comparativamente às lavouras substitutas e/ou concorrentes em termos de área. O que poderia ser feito para ocorrer uma diminuição desse custo, seria desenvolver materiais com resistências múltiplas a doenças e pragas, onde haveria menor gasto com defensivos. Neste sentido, é quase consenso entre os produtores de que a liberação de uso dos transgênicos é uma das soluções para reduzir os custos produtivos. Não necessariamente se obteria fibra de melhor qualidade. Outra linha a ser trabalhada seria a de variedades com melhor estabilidade de produção. Com esse parâmetro, o produtor poderia fazer um melhor planejamento de investimento para a safra, com estimativa de produtividade e rendimento da lavoura, por exemplo. 6.6 O caroço do algodão. A pesquisa também levantou informações sobre a utilização e comercialização do caroço de algodão. Este produto pode ser utilizado para alimentação bovina ou para extração do óleo, obtendo os subprodutos: torta, farelo, línter, casca e o próprio óleo. A extração de óleo do caroço do algodão pode ser feita por processo mecânico e térmico, onde são extraídos 8% a 12% de óleo sem a utilização de solvente. Com a utilização de solvente é possível extrair entre 18% e 20% de óleo, do potencial de 21% presente no caroço. A diferença entre os dois produtos está somente na porcentagem de óleo presente sua 24 composição. A extração de óleo via solvente exige maior investimento da empresa, necessitando de mão-de-obra especializada e uma unidade de esmagamento mais tecnificada. No entanto, a porcentagem do óleo extraído seria maior, podendo proporcionar maior retorno econômico para a esmagadora. No processo de extração do óleo obtém-se a torta e o farelo de algodão. Dentre os produtos obtidos, o óleo bruto normalmente é comercializado no mercado interno, podendo ser refinado e exportado posteriormente. O farelo e a torta normalmente são comercializados no mercado interno para alimentação bovina. Alguns entrevistados ressaltaram que a utilização do óleo vegetal para produção do biodiesel, que é um dos novos projetos do Governo Federal, poderia viabilizar melhor comercialização do caroço de algodão, assim como do óleo bruto de algodão. Também citaram que a venda do caroço sem gossipol poderia aumentar a procura do produto para alimentação de suínos e aves, podendo expandir o mercado para escoamento, assim como ser um agregador de preço. Atualmente, o gossipol limita a utilização de torta para alimentação de ruminantes. Contudo, há necessidade de fazer uma análise de mercado para a farinha sem gossipol, para constatar o preço de comercialização e implantação da unidade para a produção e avaliar sua viabilidade econômica. Para o consumo, haveria necessidade de refino, clarificação e desodorização do óleo de algodão, que conduz a acréscimos no preço desse refino, mas que poderia ser encarado como uma importante via de utilização do caroço e do óleo. 6.7 Percepção das fibras diferenciadas (longa, colorida e orgânica) O cultivo de algodão de fibras diferenciadas, como colorida e orgânica, é uma prática pouco comum no país, sendo realizada em regiões específicas. Esse tipo de algodão demanda condições de manejo diferentes das exigidas pelo algodão tradicional. Existem propriedades que plantam algodão de fibra mais longa em escala comercial (400 ha). Neste caso, o cultivo acarretou em maiores custos de produção, bem como maiores dificuldades no manejo, sendo necessário maior número de aplicações de fungicidas. O mercado para esse tipo de fibra ainda é muito reduzido. Além disso, o tipo de fibra longa produzida no Brasil é de pior qualidade que a fibra longa de outros países, não conseguindo competir no mercado externo. A menor produtividade potencial, a maior incidência de doenças, os maiores custos de produção e a dificuldade de benefício desse tipo de fibra são grandes empecilhos aos produtores. Como ressaltado anteriormente, há necessidade de realizar um beneficiamento 25 específico dessas fibras, e atualmente existem poucas unidades beneficiadoras com essa tecnologia no país. Com isto, seria necessário o transporte por grandes distâncias para efetuar o beneficiamento da pluma, encarecendo o processo. Para alguns entrevistados, a viabilidade econômica do cultivo desse tipo de algodão só ocorreria se a remuneração fosse pelo menos o dobro do preço aplicado para a fibra comum. O preço praticado atualmente é somente 30% superior ao realizado na fibra comum, com o produtor não conseguindo pagar os custos maiores de produção. Além disso, um dos fatores importantes dessa viabilização seria o fechamento de contratos de venda antecipada, onde o produtor teria a garantia de preço e entrega do produto. Os outros tipos de fibra, como a orgânica e a colorida, ainda não são cultivados nas regiões dos estados de São Paulo e do Mato Grosso, havendo necessidade de se realizar um estudo de viabilidade econômica para a instalação dessas culturas. Atualmente, o mercado para esse tipo de material ainda é pequeno no País. 6.8 Estratégia de comercialização da fibra A estratégia de comercialização da fibra por parte dos produtores é semelhante àquele praticado pela indústria, destacado em Ferreira Filho, et al. (2004). Durante ou após a negociação há a classificação dos lotes envolvidos, podendo ser visual ou por equipamento. Para muitos dos entrevistados a classificação realizada somente de forma visual pode favorecer manipulações a favor de um dos lados da negociação. A prática utilizada em relação às exigências de qualidade intrínseca da fibra, é a seguinte: as indústrias exigem que essas características estejam dentro de faixas de valores, para a adequada utilização por parte das empresas. Se a fibra produzida não atender essas especificações, os lotes podem não ser aceitos. Até anos recentes, prevaleciam as negociações da fibra via mercado disponível, para pronta entrega. Muitas indústrias formavam grandes lotes da pluma, que atenderia o consumo por um período considerado ideal. No entanto, esse mecanismo está sofrendo alterações ao longo dos anos, e as indústrias estão passando a firmar contratos antecipados com os vendedores e programando o recebimento da matéria-prima, deixando somente uma parte para compra no mercado disponível. Esse processo também está fazendo com que os custos de carregamento/formação de estoques fiquem sob responsabilidade dos vendedores e não das indústrias, como acontecia em anos anteriores. Com isto, está se tornado comum uma relação mais estreita na comercialização da pluma entre o produtor e a indústria têxtil. Grandes produtores que conseguem formar lotes 26 com volumes expressivos de pluma, fazem grandes vendas aos compradores (indústrias e comerciantes). O que também ocorre na comercialização da fibra, é o fato de algumas empresas terem preferência por fibras de determinados produtores ou determinadas regiões, como acontece com o algodão produzido no noroeste do Estado de São Paulo, com excelentes características intrínsecas da fibra. Essa “parceria”, porém, pode ocorrer através de uma relação informal, estabelecida pelo bom relacionamento entre as partes com o passar dos anos. As empresas dão preferência a esses produtores no momento da compra e esses, por sua vez, conseguem um mercado mais cativo para sua produção. Os preços, porém, são definidos normalmente pelas forças do mercado, variando diariamente. Na maioria dessas relações, parece não haver vantagens de preços concedidas aos produtores. A maior vantagem está na garantia de pagamento e constância de compras. As compras antecipadas estão sendo realizadas, basicamente, em duas situações: i) por grandes empresas têxteis, que atuam no mercado de exportação de produtos acabados e importação de pluma e fio, que, conseqüentemente, têm condições de suportar os problemas macroeconômicos, como as desvalorizações cambiais e os problemas de abastecimento interno; e ii) pelos chamados “comerciantes”, que são agentes que adquirem o algodão dos produtores (já beneficiado ou em caroço, dependendo da situação), formam lotes homogêneos de produto e, oportunamente, comercializam-no com as empresas têxteis. Esses comerciantes apresentam, portanto, um papel importante por um lado, qual seja, o de homogeneizar lotes de matéria-prima e, conseqüentemente o fornecimento em quantidade e qualidade às empresas têxteis. Essa prática também pode ser realizada pelas cooperativas, que possuem grande quantidade de fibra para comercialização (pluma de todos os cooperados). Principalmente os produtores de médio e grande porte (Grupos B e E), fazem parte representativa de suas vendas no mercado externo. Há um fechamento de preço da pluma antecipadamente, com o produtor contabilizando seu custo de produção e adicionando um markup. Com isso, há maior tranqüilidade de produção, pela menor dependência das flutuações do preço da pluma que podem ocorrer na hora da colheita e comercialização do produto. Muitos negócios são realizados dessa maneira no mercado interno também, principalmente vendas para grandes indústrias têxteis, que necessitam de grandes volumes de pluma para seu funcionamento, além de uma garantia de abastecimento ao longo do ano. O restante da fibra é negociado no mercado disponível, seguindo as cotações dos índices de diários de preços. Esse tipo de venda é realizado para comercializar a produção que 27 não tenha sido negociada através de contratos antecipados, caso o produtor não tenha conseguido bons preços pela pluma. Essas vendas podem ser realizadas ao longo de todo o ano, dependendo exclusivamente da situação de cada produtor e de sua necessidade de capitalização. Muitas vezes são fechados contratos antecipados, com formação do valor de acordo com o preço que se espera estar vigente na época da transação. Infelizmente, há casos de não cumprimento ou renegociação dos contratos caso o preço na data de entrega do produto estiver muito diferente daquele acordado. Os produtores de menor porte, não possuem poder de barganha na comercialização da fibra, devido aos seus pequenos volumes de produção obtidos, além da pendência adquirida com as cooperativas, que fizeram o custeio da área produtiva e aceitam como forma de pagamento a pluma do produtor. Com isso, podem ocorrer manipulações de preço, além de manipulações na classificação da fibra, qualificando o produto de modo que haja menor remuneração ao produtor. 28 CONSIDERAÇÕES FINAIS O objetivo geral deste trabalho foi identificar a necessidade de novas ações de pesquisa e desenvolvimento, visando melhorar a eficiência técnico-econômica da cadeia algodoeira no Brasil, especialmente nos estado do Mato Grosso e São Paulo, enfatizando os padrões de qualidade exigidos pelo mercado no curto, médio e longo prazo. O enfoque foi na absorção de novas tecnologias por parte do segmento produtivo, envolvendo produtores, algodoeiras (beneficiadoras) e esmagadoras de algodão. Foram realizadas 15 entrevistas no Estado de São Paulo, sendo consultados 9 produtores, 6 algodoeiras e 2 esmagadoras. No Estado do Mato Grosso também foram realizadas 15 entrevistas, sendo 9 produtores que possuíam algodoeiras, 4 produtores sem algodoeira, 2 cooperativas de produtores (UNICOTTON e COOPERCOTTON) e 1 esmagadora. Em São Paulo, as visitas ocorreram no mês de maio de 2004, e em Mato Grosso, em novembro de 2004. Em termos gerais, pode-se dizer que a atividade de produção de algodão possui diversas características, a depender do tamanho das propriedades e da tecnologia adotada. Os pequenos produtores apresentam maior dependência de fatores externos, como de recursos para financiamento de sua produção, necessidade de venda de sua fibra para os ofertantes de insumos, criando grande dependência. Os médios e grandes produtores já apresentam uma maior autonomia, tanto na produção como nas vendas, obtendo melhores negociações e, conseqüentemente, maior remuneração. Esses últimos produtores estão mais presentes na região Centro-Oeste do país, como é o caso do Estado do Mato Grosso, onde há necessidade de grandes áreas de cultivo, para ocorrer ganhos em escala. Alguns agentes apontam que essa característica é influenciada pelos maiores custos produtivos, comparativamente a outras regiões do país, sendo necessárias áreas maiores para compensar os investimentos. Em São Paulo, concentram-se os produtores de pequeno e médio portes, sendo pequeno o número de produtores que se enquadram no grupo E apresentado anteriormente. Os entrevistados apontaram que as algodoeiras e cooperativas não efetuam a remuneração diferenciada por fibra de melhor qualidade. Assim, ainda não há incentivo financeiro para que o produtor utilize fibras diferenciadas, como fibras mais longas ou alguma outra característica intrínseca. Porém há unidades industriais que possuem interesse em obter fibras diferenciadas, favorecendo os produtores que conseguem a fibra com boas características intrínsecas, fibras mais limpas, aplicando ágios no pagamento. Esse processo 29 estimula os produtores na busca deste produto. Nesses casos, há serviços de conscientização do produtor para o melhor manejo a ser adotado nas lavouras, como, por exemplo, através de palestras e acompanhamento da lavoura por parte de técnicos. Contudo, pelo lado dos produtores, o que realmente importa, de acordo com os resultados aqui obtidos, é a escolha da variedade plantada, a qual deve lhe propiciar um apropriado retorno econômico ao seu investimento. Assim, para estes agentes o primeiro aspecto desejável na escolha de uma variedade é a sua produtividade agrícola potencial e estabilidade entre os anos agrícolas. Aliado a isso, há a exigência dessas variedades também apresentarem elevados rendimentos de fibra. Porém, produtores que efetuam suas vendas do algodão em caroço não se preocupam com o fator rendimento da fibra, mas somente com primeiro aspecto. Como outras características desejáveis para uma variedade de algodão, também foram citados: a resistência a pragas e doenças, precocidade, não ocorrer queda de fibra do capulho no final do ciclo, qualidade da fibra produzida, entre outras. Além disso, para muitos entrevistados, a requisição de uma fibra com melhor qualidade intrínseca acarretariam na elevação dos custos, e sua produção só seria viabilizada se a indústria estiver apta para compensar a diferença de valores. Além disso, citou-se o fato de que a produção de fibras de melhor qualidade, como mais longa, levaria à necessidade de alteração nas máquinas necessárias para beneficiamento, que seria feito a um custo alto. Nas condições atuais, as unidades aptas a beneficiar um algodão com esta característica são em número reduzido. Também houve a citação de produtores que já fizeram testes com algodão de fibra mais longa e não obtiveram resultados favoráveis. Mesmo assim, para muitos, o que importa é a relação custo/benefício, estando disposto a arcar com maiores custos e riscos para a produção de fibra de melhor qualidade desde que se tenha remuneração adequada que viabilize o investimento. Um empecilho também citado pelos entrevistados foi o fato de que boa parte da comercialização da fibra é realizada sem a utilização dos testes de HVI, mas somente no sistema visual, e assim o produtor não obtém informações das características do algodão que está produzindo, não aumentando seu estímulo para produção de produto com outras características. De acordo com os produtores os tipos de fibras obtidas nas lavouras brasileiras suprem as exigências dos mercados interno e externo. Assim, não há exigências por parte dos produtores de novas ações de pesquisa em relação a melhor qualidade intrínseca da fibra, como de maior comprimento. No entanto, o produtor estaria disposto a cultivar o algodão de 30 melhor qualidade se o mercado fizesse uma melhor remuneração para o produto, porém os entrevistados disseram que ainda não é o que ocorre. Em geral, há um anseio por linhas de pesquisa direcionadas à redução de custos de produção na lavoura, para que o produtor possa diminuir os riscos envolvidos na produção e na comercialização. Vale ressaltar, que o algodão é uma cultura de elevado investimento inicial, comparativamente às lavouras substitutas e/ou concorrentes em termos de área. O que poderia ser feito para ocorrer uma diminuição desse custo, seria desenvolver materiais com resistências múltiplas a doenças e pragas, onde haveria menor gasto com defensivos. Neste sentido, é quase consenso entre os produtores de que a liberação de uso dos transgênicos é uma das soluções para reduzir os custos produtivos. Não necessariamente se obteria fibra de melhor qualidade. Quanto à comercialização da pluma, aquelas de melhor qualidade produzidas atualmente não recebem remuneração diferenciada que incentive o produtor a melhorar cada vez mais seu produto. No entanto, essa fibra apresenta melhor acessibilidade no mercado, principalmente em anos de excedente de oferta no mercado interno. As estratégias de comercialização, de forma geral, estão se alterando em anos recentes, com bom volume de contratos antecipados entre compradores e vendedores. Quanto ao óleo de algodão, há a consciência da necessidade de busca por novos nichos de mercado para aumentar a proporção de comercializada. Dentre esses mercados, cita-se a possível utilização para produção de biodiesel. A comercialização dos subprodutos em melhor nível também poderia aumentar a remuneração das indústrias moedoras e dos produtores. 31 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS COODETEC. Cooperativa Central Agropecuária de Desenvolvimento Tecnológico e Econômico Ltda; CIRAD. Centro de Cooperação Internacional em Pesquisa Agronômica para o Desenvolvimento; UNICOTTON. Cooperativa dos Produtores de Algodão do Sudeste de Mato Grosso; CEPEA. Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada. Análise prospectiva dos mercados da fibra e do caroço de algodão, em relação com a qualidade : o ponto de vista da produção e do beneficiamento1. Projeto de Pesquisa. 2004. CONAB. Companhia Nacional de Abastecimento. Indicadores da Agropecuária. Disponível em http://www.conab.org.br. Acessado em 11 de out. de 2003. FERREIRA FILHO, J.B. de S.; GAMEIRO, A.H.; BALLAMINUT, C.E.C.; MENEZES, S.M. Análise prospectiva dos mercados da fibra do algodão na indústria têxtil em relação à qualidade. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL, 42., Cuiabá, 2004. Anais. Brasília: SOBER, 2004. (versão na íntegra em CDROWN) NATIONAL COTTON COUNCIL OF AMÉRICA. (http://www.econcentral.com/wcd/picker.htm, novembro de 2004) Country Data